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CODIFICAÇÃO/DECODIFICAÇÃO
Marcella Rego Lins Barbosa
Maria Carolina Macari

HALL, Stuart. Codificação/decodificação. In: SONIK, Liv (org.). Da diáspora:


Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. p. 387-
404.

Importante expoente do Centro para Estudos Culturais Contemporâneos da

Universidade de Birmingham, Stuart Hall deixou contribuições significativas na área dos

Estudos Culturais. Em seu artigo “Codificação/Decodificação”, publicado pela primeira

vez em 1980, ele busca construir um modelo do processo comunicativo que deixe de tratar

o receptor como um sujeito passivo, levando em conta as complexidades envolvidas na

construção do discurso emitido pelo produtor da mensagem.

Hall inicia o texto traçando um retrospecto histórico dos Estudos de Mídia, com o

intuito de levantar os pontos falhos nas abordagens conduzidas até então. Para ele, as

pesquisas tradicionais em comunicação em massa preveem o processo comunicativo

apenas como um circuito linear que perpassa pelas seguintes etapas: emissão, mensagem

e recepção.

O autor traz, então, uma nova maneira de pensar o processo comunicativo em

massa, isto é, como uma estrutura de relações complexas. Dessa forma, o circuito é

sustentado e perpassa por momentos distintos e interligados: produção, circulação,

distribuição, consumo e reprodução, se distanciando da visão presente nas pesquisas

tradicionais.

Esse novo modelo toma alguns pontos da teoria desenvolvida por Karl Marx em

Grundrisse e O Capital sobre o “esqueleto da produção de mercadorias” (HALL, 2003,

p. 387). O estudo do produzir, comunicar e espalhar discursos passa a se conectar com as

relações econômicas e produtivas de nossa sociedade.


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Hall enfatiza que a troca discursiva da mensagem tem uma posição privilegiada

dentro do circuito comunicativo. Os discursos não existem sem que a audiência realize

decodificações, ou nas palavras do autor: “Se nenhum sentido é apresentado, não pode

haver consumo” (HALL, 2003, p.388). De maneira simplificada, os produtos circulam

sob a forma de discursos e eles, por sua vez, devem ser decodificados, traduzidos pela

audiência. Assim, os discursos devem ser transformados em práticas sociais para que o

circuito se complete e produza efeitos significativos.

Para explicar e ilustrar essa nova abordagem proposta para estudar o processo

comunicativo, Hall discute as estruturas institucionais de radiodifusão, em especial a

televisão. Os signos televisivos são icônicos, relacionando-se as percepções de realidade

difundidas em uma sociedade ou cultura por meio da formação de códigos. Não existem

discursos televisivos que não são atrelados a uma realidade específica ou destinados a um

público específico que se identifica com essas mensagens. Os códigos são construídos de

forma a que possam ser lidos.

A audiência ao mesmo tempo em que fornece assuntos, agendas, temas etc. para

que as estruturas de produção possam codificar um discurso significativo, ela também é

a responsável por interpretar esses códigos, ou seja, decodificar a mensagem televisiva.

O efeito dessa mensagem depende, precisamente, de sua apropriação como um discurso

significativo, o que ocorre durante o processo de decodificação. Nesse caminho, os

espectadores já não são mais encarados como os sujeitos passivos do modelo básico de

comunicação.

“Antes que essa mensagem possa ter um efeito de satisfação, uma necessidade
ou tenha um uso, deve primeiro, ser apropriada como um discurso significativo
e ser significativamente decodificada. É esse conjunto de significados que tem
um efeito, influencia, entretém, instrui ou persuade, com consequências
perceptivas, cognitivas, emocionais, ideológicas ou comportamentais muito
complexas” (HALL, 2003, p.390).
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Desse modo, a produção e recepção da mensagem televisiva são fases que se inter-

relacionam, mesmo sendo momentos distintos do circuito. Adotando essa perspectiva, a

audiência é, ao mesmo tempo fonte e receptora da mensagem televisiva: “Circulação e

recepção são momentos do processo de produção da mensagem televisiva e são

reincorporados via um certo número de feedbacks indiretos e estruturados no próprio

processo de produção” (HALL, 2003, p.398).

Distanciando-se, por assim dizer, da teoria linguística, Hall expressa que a leitura

dos signos por parte da audiência, durante o processo de decodificação da mensagem

televisiva, deve envolver uma identificação de elementos presentes tanto no nível

conotativo, quanto no denotativo. É fundamental que os receptores leiam os signos de

maneira mais subjetiva – nível da conotação – e, também, a partir de interpretações que

se aproximam a sentidos mais literários – nível da denotação -. Em resumo, Hall afirma

que “Nós não utilizamos a distinção entre denotação e conotação dessa forma. No nosso

ponto de vista, a distinção é somente analítica” (HALL, 2003, p. 394).

Em seguida, o autor esclarece alguns pontos sobre os elementos dos signos

presentes em cada nível. Enquanto o nível denotativo exibe elementos que sofreram a

atuação de uma ideologia dominante para a normalização do signo - i.e., certos aspectos

que “parecem ser considerados em qualquer comunidade de linguagem e a qualquer

tempo” (HALL, 2003, p. 395), exprimindo um sentido literal - é no nível da conotação

onde as ideologias operam nos discursos, de maneira a alterar e transformar a significação

dos signos.

No nível conotativo, relações estreitas com a cultura, o conhecimento e a história

são estabelecidas, permitindo que os signos se transformem ativamente e assumam

dimensões ideológicas adicionais. Por conceder aos signos elementos que permitem a sua

configuração como potencialmente transformável em mais de uma configuração


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conotativa, observa-se nesse nível uma maior polissemia do que a encontrada no

denotativo, fixado por códigos fechados e naturalizados.

Obviamente existem percepções individuais e particulares, encontrados no nível

da conotação, mas “a percepção seletiva nunca é tão seletiva e tão aleatória quanto o

conceito sugere” (HALL, 2003, p.398). Esse caráter polissêmico não significa que a

audiência pode atribuir qualquer significado, arbitrariamente, aos signos televisivos no

momento da decodificação. A codificação, por parte do emissor da mensagem televisiva,

produz a formação de limites e parâmetros dentro dos quais a decodificação irá operar.

Uma certa correspondência, ou “reciprocidade entre os momentos da codificação e

decodificação” (HALL, 2003, p. 399), deve ser construída, geralmente no nível da

conotação, para que haja uma troca comunicativa efetiva.

Como visto acima, os significados e mensagens não são simplesmente

transmitidos, mas produzidos. Seguindo esse raciocínio, o autor argumenta que já não

existe mais uma correspondência exata entre codificação e decodificação. O emissor já

não pode garantir ou prescrever a forma como a audiência irá decodificar a mensagem

produzida por ele. Sem embargo, é desempenhada uma tentativa de prever as leituras mais

prováveis dentro de uma determinada sociedade e/ou cultura.

Essas leituras preferenciais “t[ê]m, embutida[s], toda a ordem social enquanto

conjunto de significados, práticas e crenças” (HALL, 2003, p. 397). Concisamente, elas

são construídas com base nas classificações do mundo social, cultural e político da

sociedade ou cultura em que o emissor e o receptor operam, i.e., a ordem cultural

dominante.

Apesar do esforço empreendido pelos emissores, em certas ocasiões a audiência

falha em captar o sentido por eles pretendido – a leitura preferencial -. De maneira a

ilustrar as várias articulações que podem ser construídas entre o emissor e o receptor, Hall
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propõe três posições hipotéticas a partir das quais a decodificação de um discurso

televisivo pode ser construída:

1. Posição hegemônica-dominante: O telespectador opera dentro do código

dominante e decodifica a mensagem televisiva desde o mesmo referencial em

que ela foi codificada (leitura preferencial). Esse código dominante é

articulado através do código profissional, ou seja, os aspectos de natureza

técnica e prática que regem os processos de produção e reproduzem a

significação hegemônica dos acontecimentos de forma implícita e

inconsciente.

2. Código negociado: O telespectador reconhece a legitimidade das definições

hegemônicas quanto às significações mais gerais (abstratas), enquanto cria

regras básicas em um nível restrito e situacional (situado). Nessa posição, é

apresentada uma versão da ideologia dominante com algumas contradições.

3. Código de oposição: O telespectador reconhece o código dominante no

discurso televisivo, porém escolhe decodificá-lo desde um quadro alternativo

de referência, fora da ordem cultural dominante.

A falta de simetria observada nas trocas comunicativas ilustra, justamente, o

momento chave em que o modelo de Hall expressa seu caráter inovador. A operação do

telespectador em um código de oposição permite a construção de leituras contestárias

que, de certa forma, desafiam a ideologia dominante, criando potencial para uma “política

de significação – a luta no discurso” (HALL, 2003, p. 402).

Ortografia/vocabulário [1 PT]: 0.8

Estrutura do texto (começo, meio, fim) [ 2 PT]: 2


6

Contextualização do texto ( de onde veio, a que serve, projeto do autor ) [ 2.5 PT

]: 2

Análise (como argumenta, o que mobiliza) [ 2.5 PT] 2.5

Resposta crítica, comentários pessoais [2 PT] 1.5

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