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Hamr – Mapeamento da Alma pela visão nórdica

A compreensão da alma consiste na fabulosa tarefa de auto desvendar você mesmo,


para, então, olhar através dos véus ilusórios da realidade (o qual nossa alma, nosso ego,
nosso pensamento sempre filtra e cria sua própria perspectiva de mundo). Além do
sentido de espiritualidade que envolve a leitura e compreensão da alma, também
podemos sintetizar através do estudo e da experimentação da retaliação (do separar de
todas as partes da alma) da inexistente individualidade egoísta que comumente
acreditamos possuir. Não somos centros de nada, nem somos como que deuses. Somos
apenas uma manifestação da natureza, um feito da vontade do mundo em suprir suas
próprias necessidades biológicas.

A alma nada mais é do que o somatório de atributos etéreos, físicos, dons, habilidades e
outras características que às vezes são unicamente nossas e outras vezes são
compartilhadas por nós com outros seres, etc.

Este mesmo estudo sobre as subdivisões do ser é fruto da reunião de conceitos aferidos
por durante séculos pelos povos germânicos de grupos diversos. Se alguns chamavam a
alma de Hamr (forma) ou se outro acreditava somente na Fylgja (acompanhante), para
nós, pesquisadores religiosos, hoje, é indiferente, pois interessa-nos somente o objetivo
e a síntese desse sistema. Através da analogia sistemática dos conceitos espirituais de
diversas tribos germânicas podemos partir do pressuposto que existem diversos
atributos que formam o que sugestionavelmente acreditamos ser a alma, o espírito,
consciência, inteligência ou como melhor aprouver.

Assim, interligando seus atributos como uma rede de elementos necessários entre si,
tiramos em um resultado que é o que chamaremos (por um motivo de identificação
cultural e religiosa) de Hamr, que segundo os germanos significava “forma”, e esses
povos usavam o termo para se referir ao seu espírito.

A idéia de “nada” era incabível entre os nórdicos. Todo espaço era ocupado e não havia
uma divisão entre o mundo dos vivos e o dos mortos, ou com qualquer outro mundo.
Todos os mundos eram acessíveis de mútuo convívio. Nada de dimensões astrais ou
planetas, etc. Nada disso. Os mortos conviviam no mesmo mundo que os vivos, às
vezes iam para outros lugares mais longes como o Hel, Asgard, etc. A morte nunca era
tida como uma aniquilação absoluta, mas sim como uma passagem: a consciência, a
alma transcendia seu espaço físico e passava a ocupar um lugar de tutora do clã e
auxiliar do mesmo. O renascimento poderia existir, bem como poderia não ocorrer
dependendo de determinadas condições como vontade e outras imposições espirituais.
O nome de um ancestral, quando perpetuado dentro da família, era tido como o
renascimento daquele ancestral em um novo corpo, uma forma de chamar sua presença
à vida novamente.

Usaremos nesse estudo de várias nomenclaturas e elementos diferentes que aparecem


através dos mitos, sagas e outras referências históricas sobre as crenças espirituais dos
povos nórdicos.

A Hamr pode ser decomposta em oito essências principais (obviamente suas


subdivisões são muitas). São elas Athem, Ferth, Fylgja, Lá, Likh, Mágn, Módr e Önd.
Descreverei eles abaixo:
1 – Athem – O corpo etéreo, nossa manifestação no mundo espiritual; é a forma e
aparência fantasmagórica. É o nosso Athem que enviamos através das experiências
mágicas, xamânicas, como o Seidr e o Spae; é também o Athem que vemos nas
aparições, assim como é ele que se junta à Caçada Selvagem de Odin, depois de nossa
morte, nos invernos. Quando morremos, o Athem é separado do corpo e aguarda a
chegada da Caçada Selvagem (que o levará junto para as hostes de almas). Quando ele
não se separa do nosso corpo, fica preso em Midgard por algum motivo, ele é chamado
de Draukkar(que quer dizer “morto-vivo” ou “vampiro”, “zumbi”, etc.), uma vez que
irá vagar preso neste mundo por motivos diversos, que podem variar da vingança até o
desconhecimento da morte.

2 – Ferth – Mente. É um dos presentes dos deuses no ato da criação; significa


“mente/razão”. É aquilo que rege as cabeça e tudo aquilo é regido por ela. Refere-se
principalmente ao pensamento, à razão e à vontade. É onde ficam armazenados nossos
pensamentos, nosso raciocínio, nossas experiências, nosso saber, nossa memória. O
Ferth divide-se em duas partes: Hügr e Münr.

2.1 – Hügr – Pensamento. É o intelecto ativo, a vontade, o pensamento. O Hügr é uma


das mais fortes expressões da alma, pois ele é o pensamento ativo, nossa mente no
volante das ações. Através do Hügr podemos ultrapassar fronteiras físicas ao
desconhecido e, por isso mesmo, pelo poder que a compreensão pode gerar, ele nos
conecta ao mundo. Todo o mundo está interligado através do Hügr, assim como todos
os seres estão conectados através do Fjör. A crença pagã diz ainda que o próprio mundo
possuía um espírito próprio, também chamado de Hügr. O Hügr pode ser compreendido
se dividido em duas partes: Angit e Sefa.

2.1.1 – Angit – São seus sentidos e percepções. Os portais do corpo por onde entra a
informação e por onde podemos perceber o mundo. Funcionam como um filtro de
informações. Se eles não existissem, ficaríamos loucos com tanta informação que
receberíamos e não conseguiríamos associá-las com destreza. A percepção se dá pelo
cheiro, gosto, tato, visão e audição. É essa percepção a principal causa de nossa
equivocada e individual percepção da realidade. Nunca perceberemos a realidade e a
verdade, mas sim apenas uma parcela dela, ou seja, apenas aquilo que podemos
conceber através do que conhecemos e dentro dos limites de nossas simples
percepções.

2.1.2 – Sefa – É o raciocínio imediato, sagacidade. Depois que o Angit percebe o


mundo, o Sefa é responsável por associar os pensamentos uns com outros e assim gerar
a informação. É a percepção do mundo já realizado. Se, por exemplo, percebemos
através do Angit que ao tomar água ela nos queima a boca, então é o Sefa que lhe diz
que ela está quente, porque associa a informação da queimadura com a informação do
calor, transformando assim tudo em um pensamento: “a água está quente, devo evitá-
la”. O Sefa funcionará desde os níveis físicos mais simples até níveis efêmeros mais
complexos, da consciência à incosciência.

2.2 – Münr – Memória. Pois se todo pensamento do Hügr precisa ser armazenado,
então é no Münr que encontrará sua lotação. O Münr é compreendido melhor quando
dividido em duas partes: Gemynd e Vítand.
2.2.1 – Gemynd – Memória Individual. É a memória de nossa própria vida, onde ficam
guardados nossos próprios pensamentos, nosso passado, nossas lembranças e inclusive
aquelas que esquecemos. Nada escapa à mente. É onde ficam armazenados nossos
orlogs, e é por isso que o Münr sempre está associado ao Orthanc (que veremos logo
adiante o que é). Enquanto o Gemynd é a memória individual de apenas esta existência
e nascimento, o Orthanc recolhe as memórias e heranças de existências passadas, bem
como o passado dos ancestrais.

2.2.2 – Vítand – Sabedoria. Através de nossas próprias experiências, deduzimos muitas


coisas sobre a vida que nos ajuda a viver e a melhorar enquanto indivíduos. A reunião
de todas as conclusões do Sefa fica armazenada na memória para se tornar Sabedoria.

3 – Fylgja – Acompanhante. É a entidade guardiã de nosso clã, da família, de nós


mesmos. Podemos tanto herdá-la, como adotá-la. Mas ninguém existe sem a Fylgja. Ela
pode ser compreendida como nossos instintos mais selvagens e subconscientes. Em sua
fúria e desejo por vida, a Fylgja usará de todos os artifícios para tentar perpetuar o clã e
a família, como manda as leis da natureza (pois a Fylgja é a representação de toda a
natureza dentro de apenas um ser) e também usará de sua desesperada vontade de viver
para se focar em aspectos mundos inatos ao homem, como o desejo constante de sexo, o
desconhecimento dos benefícios das virtudes ou a ira entorpecente. É independente de
nossa vontade e ao mesmo tempo é o nosso reflexo selvagem. A Fylgja é movida por
instintos que beiram a bestialidade (não é a toa que é representada por um aspecto
animal ou por um humano em bestialidade). Se não controlada, moderada ou
disciplinada, a Fylgja poderá tomar a frente da vontade do indivíduo, acarretando vícios
para este e posteriormente a decadência do mesmo. O sexo será um desejo constante, da
mesma maneira, uma vez que a Fylgja buscará incessantemente questões de
sobrevivência em todos os aspectos da vida, colocando a paixão ardente acima da
sanidade do próprio ser. O medo da morte lhe é desconhecido, pois não sabe o que é
morrer, mas saberá instintivamente quando a morte se aproxima e irá associar isso com
a dor, e por isso, na tentativa de afastar toda dor, ela lutará de todas as formas, inclusive
criando ilusões sobre como o indivíduo perceberá a realidade (por beirar a bestialidade,
deixar a Fylgja tomar a vontade significa se entregar à ignorância e ao sofrimento
posterior). Sua tática de defesa sempre será a ira, a ignorância ou repúdio, que
acontecerão através de “explosões”, buscando sempre romper com a harmonia que o
homem construiu para sua alma. Esta é uma visão bastante pessimista da Fylgja, mas é
o que ela nos representa em sua mais profunda intimidade. Os povos germânicos
acreditavam que ela habitava a nossa sombra, e por isso nosso seguia ou nos guiava.
Mas, nem de todo a Fylgja é algo ruim, uma vez que ela é responsável por estarmos
aqui vivendo e nos ajudará em muitos momentos de dificuldade como uma forma de
defesa, ataque ou cura imediata para questões diversas. Desde que controlada, a Fylgja
será extremamente útil. Nos auxiliará em questões de magia, assim como também
poderá nos ensinar a viver através de pequenas lições. Como um animal que habita
nossa alma, devemos domá-la e saber como usar dela para o bem, ao invés de deixar
que ela use-nos em prol de suas próprias necessidades naturais. Se deixarmos que isso
ocorra, que ela nos tome a alma, então seremos apenas bestas às margens da sociedade
ordinária. A Fylgja pode ser tanto representada visualmente como um animal de poder,
como uma besta, como um ser humano tocado por bestialidade ou selvageria, ou mesmo
poderá ser simbolizada por algum espírito antepassado. Para compreender a Fylgja
melhor, podemos também dizer que ela está associada a outras três essências: Hamingja,
Dísir e Aettarfylgja.
3.1 – Hamingja – Hamr + Fylgja. Forma acompanhante. É a fusão de nossa alma com
nossa Fylgja. Usada em trabalhos xamânicos, é útil ao transe, permitindo que ela tome
controle de uma parcela de nossa vontade, e assim possamos utilizar de seus atributos
mágicos, como a cura, a visão, a viagem, a força, a ira, a rapidez, a lucidez, etc. É esta a
forma que os Berserker ou Ulfedhnar usavam em batalha, mantendo uma parcela de
seus espíritos sempre conectada com sua Fylgja. Esta crença de que saímos do corpo e
que tomamos outras formas talvez remeta ao contato dos escandinavos com os lapões.
Há menções de formas específicas além da Hamingja como o homem transformado em
lobo (Hamrammr, Rammaukin, Eigi Einhamr).

3.2 – Dísir – Ancestrais Femininas. Dísir é o coro espiritual que assiste ao clã. São as
ancestrais mulheres que morreram e agora regem pela sobrevivência e proteção das
famílias, tribo, etc. Em geral, nos referimos a esses espíritos como Dísir, ou Idísir
(singular Dís ou Idísa), mas elas podem assumir outros aspectos, em outros contextos. É
dito que podem ser chamadas também de Walkyrjor (Valquírias) ou ainda de Norn
(apesar de muitos defenderem que as Valquírias e as Nornes compunham um grupo
diferenciado de divindades). São Walkyrjor quando devem reger assuntos de grande
importância como a morte, a vitória na batalha e outros assuntos relacionados a Odin. E
são chamadas de as três Norn quando precisam reger aspectos do destino, como os
orlogs por exemplo. Mas esta é uma concepção individual de como encarar a existência
das Dísir. Pessoalmente, eu encaro as Dísir, as Walkyrjor e as Nornor como corpos
espirituais diferentes.

3.3 – Aettarfylgja – Familiar. É o espírito tutelar da família, aquele que é transmitido


através do sangue, obrigatoriamente. Este não pode ser escolhido, uma vez que ele é
herdado pela família, por seus ancestrais. Acompanhará a sucessão familiar e a
protegerá contra seu extermínio. A Aettarfylgja é a uma Fylgja mais complexa com uma
forma efêmera que pode se dividir em Fylgjas “menores” e individuais para cada pessoa
do clã.

4 – Lá – Sangue. O Lá é o sangue, o calor humano, o veículo de vida e poder. Na


mitologia escandinava é o presente de Lódur a Askr e Embla, o primeiro casal humano.
É através do Lá que há a transmissão da vida, de poderes e de todo tipo de herança
física e espiritual. Os orlogs são transmitidos através do sangue e são então chamados
de Orthanc (herança). Quando o sacrifício é feito, é o Lá quem dá o poder para tornar a
divindade forte (os sacrifícios eram feitos para louvar e fortalecer o poder de uma
determinada divindade). O mesmo acontece com o talhar das runas com o próprio
sangue, pois é ali que é transferido o seu poder para as runas e então elas ganham
“vida”. O Lá pode ser decomposto em três partes: Ásdr, Fjör (Wyrd) e Orthanc.

4.1 – Ásdr – É o papiro secreto que a Norn Skuld vela, onde está escrito o dia do
nascimento e o dia da morte de cada ser. O Ásdr está no sangue porque é lá que
acontece toda troca de orlogs entre o ser e seu meio e assim que homens e mulheres
podem aumentar ou encurtar seu tempo de vida em Midgard. O Ásdr não controla
apenas o tempo que viveremos aqui, mas também pode controlar nossa qualidade de
vida, uma vez que as Nornor (distribuindo os orlogs) podem alterar nossa configuração
social de vida. É através do Ásdr que todos os orlogs fazem-se acontecer em nossa vida.
No ásdr está escrito o dia do nascimento, da morte e a se vida será levada com qualidade
ou com decadência.
4.2 – Fjör – ou Wyrd. Destino. O destino nunca é visto como algo fatídico, mas sim
como algo previsível dadas certas condições passadas. Nosso Fjör segue uma direção já
formulada por nossos ancestrais e também por nosso próprio passado. Nossas heranças
como dons, talentos, bênçãos, maldições, qualidades, defeitos, e também nossas atitudes
como desonras e glórias determinam como será o Fjör. Esse mesmo Fjör está em
constante processo de adaptação à nossas possibilidades uma vez que ele é o gerador
dos orlogs. Um orlog é uma conseqüência, uma reação natural do mundo contra
qualquer ação. Toda ação possui uma reação, e essa reação é chamada de Orlog (é
aquilo que o mundo nos devolve). A semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória. Os
orlogs podem ser bons ou ruins e estamos constantemente recebendo-s o tempo todo. O
Fjör é descrito nos mitos como um fio escarlate que a qualquer momento poderá ser
rompido bastante que Skuld diga o dia da morte do homem. O destino é inexorável e
não importa o caminho que tomamos, o que nos foi legado é nosso por direito, sem
fuga.

4.3 – Orthanc – ou Ódal. Herança. Todos os orlogs e atributos de nossos antepassados,


ancestrais e progenitores são passados ao nosso ser, pois não somos nós mesmos, somos
apenas frutos da vontade alheia; somos a continuação dos antigos. Não escolhemos
quem seremos, isto nos é imposto. Não escolhemos nascer humano, não escolhemos
nosso nome, nem escolhemos nossa configuração biológica. Tampouco escolhemos
nossa própria sorte de vida que iremos levar. Tudo é herdado. Se o ser humano existe é
porque houve em algum momento uma vontade transcendental que desse tal impulso. E
se possuímos nomes como Helga ou Erik é simplesmente porque nossos pais assim o
desejaram. Igualmente, se somos saudáveis, ou doentes, se somos inteligentes ou tolos,
se feios ou belos, se ricos ou pobres, é tudo uma questão de herança e destino (isso quer
dizer independe de nossa vontade). Essa verdade sobre a realidade, de que recebemos
uma complexa herança ao nascer é chamada de Orthanc. As glórias e maldições de
nossos ancestrais também serão as nossas. Por isso a união familiar e o sentimento de
fraternidade em um clã é tão importante para todos. Para ser compreendido em detalhes,
o Orthanc precisa ser decomposto em seis partes: Orlog, Forlog, Mjovutdr, Auna, Gaefa
e Afl Okkat.

4.3.1 – Orlog – Sob a Lei. Lei fixada nas origens. Esta lei é herdada por todos os seres e
ela diz que toda ação terá uma reação. Toda destino retorna a sua origem. Esta é a lei
básica dos mundos, a que nada escapa. Cada ação passada é responsável é originária de
um orlog, uma conseqüência arbitrária e ordinária.

4.3.2 – Forlog – Lei fixada no avanço. Na tentativa de alterar nosso Ásdr, de melhorar
nosso Fjör, podemos lutar contra o orlog e alterar nosso destino. O Forlog então é a
força que geramos para mover nosso destino em outra direção diferente daquela que nos
é herdada. Algumas ações excepcionais podem gerar Forlogs.

4.3.3 – Mjovutdr – Destino que está fixado desde as origens. O Mjovutdr é fardo da
família. Aquilo que, desde a sua origem, as pessoas estão fadadas a carregar consigo por
todas as gerações, aquilo que é imutável, como fato de sermos humanos, ou o fato de
termos determinadas doenças, ou de que por toda uma geração muitos nasceram gênios,
etc. É difícil decifrar o Mjovutdr, pois somente um ancião que conheça bem o Orthanc
da família poderia enunciar o que faz parte ou não do Mjovutdr. O Mjovutdr pode ser
composto por alguns Gaefas (ver a frente).
4.3.4 – Auna – Destino como concessão feita pelos Deuses. A vontade dos deuses é
suprema e assim como transformaram árvores em seres humanos, também podem nos
aniquilar. É dito que os deuses também são regidos pelas mesmas leis de destino que
somos, mas são interminavelmente mais poderosos que a nossa vontade. Apesar dos
deuses não interferirem na vontade dos homens, alguns deles podem ceder ao capricho e
alterar a natureza das coisas. Ou ainda podem fomentar um destino completamente
diferente daquele que o Fjör pretende formar, independente de como é o Orthanc.
Mesmo que não faça parte do Orthanc de uma pessoa ela ter nascido como o dom para a
arte, ali houve uma vontade extraordinária que alterou a predisposição das coisas,
concedendo assim um Auna.

4.3.5 – Gaefa – Presente. O Gaefa é ligado ao ser durante o nascimento, pois é ali que
as Dísir, ou Norn, presenteiam o novo ser com seus talentos, dons e atributos. Um Gaefa
é sempre especial e todo ser possui pelo menos um. O Gaefa não poderá ser diferente
daquele de sua família, mesmo que destacado, a não ser que haja um Auna contra isso.
Pode ser considerado um Gaefa a beleza, a saúde, a força, a inteligência, o talento para a
arte, a perícia com as mãos, etc (também há Gaefa de cunho mágico). O Gaefa se
confunde com o Mjovutdr por serem ambos heranças ancestrais. Para desmistificar isso
podemos dizer que os Gaefas são partes menores do Mjovutdr, se este último pudesse
ser decomposto.

4.3.6 – Afl Okkat – Nossa força. É o somatório das glórias conquistadas por uma
família, tribo ou clã que juntos se transformam em força efêmera e propiciam a sorte, a
prosperidade e a vitória em muitas questões da vida, inclusive garantindo a imortalidade
da alma entre os heróis. Esse dote faz parte do Orthanc porque é uma herança dos
ancestrais a todas suas gerações. Todo membro de um clã sempre contribui para
fortalecer ou enfraquecer o Aett Afl Okkat (A força do clã).

5 – Likh – Corpo. Obviamente é o corpo que faz parte da Hamr e não o contrário, uma
vez que somos a forma pensada pela vontade dos deuses. O Likh é a configuração
física, corporal que assumimos para que a Hamr possa habitar. A saúde do Likh é de
suma importância para o bem estar da Hamr. Está unido à Hamr através do Mágn.

6 – Mágn – ou Meginn. Força, Poder. Está relacionado à saúde, e a força física. É o


Mágn que mantém a alma presa ao Likh e a mantém ali longe do perecimento. Se ele
pudesse ser visto seria brilhante e ardente como o fogo, semelhante à “aura” que os
orientais pregam.

7 – Módr – ou Máttr. Bravura, Coragem. O Módr é uma emoção adormecida que em


certas horas de descontrole, ira, ódio, loucura ou paixão desperta elevando o ser acima
de sua própria capacidade. Poderíamos dizer que o Módr eleva o nível de adrenalina no
corpo de tal maneira que superaríamos nossa própria capacidade de força. Por isso tal
bravura, pode ser literalmente traduzida como “ira”. Nas Eddas dize-se que quando
Thor lutou contra a serpente de Midgard, ele invocou o seu Jöttunmódr (Ira de Gigante
ou Bravura de Gigante) para poder elevar a gigantesca serpente acima de si, conjurando
para si sua herança jottun por parte de mãe.
8 – Önd/Od – Respiração/Inspiração Divina. Em uma das Eddas, Önd é um dos
presentes dos deuses, o que foi ofertado por Odin ao primeiro casal de humanos.
Através da respiração concebemos a vida e sem ela não vivemos. Através da respiração
nos comunicamos também como o mundo exterior, uma vez que inalamos coisas para
dentro de si. Pode ser dito que o önd é o sopro divino, a última parte da alma e o
elemento necessário para que haja vida. É o önd que nos diferencia dos seres mortos,
dos fantasmas, etc. Quando o önd se desfaz, nós morremos. Por ser a respiração o ato de
atrair para dentro de nós a força dos deuses é dita ainda que é a inspiração divina (Od).
Em outra Edda ela é chamada de Od, uma força soprada por Odin aos homens, que lhes
dá atributos extraordinários para o hedonismo e o prazer, como a poesia, a música, a
paixão, a ira, a risada, etc. O Önd/Od é a parte mais complexa de se compreender por
ser um atributo ao mesmo tempo efêmero (inspiração divina) e físico (respiração). Diz-
se que o Od permeia todas as coisas e podemos respirá-los quando bem quisermos
desde que tenhamos consciência disso.

Juntamente com nossa Hamr também anda, lado a lado, o Frith que é a paz, mas não a
paz no sentido da guerra, mas sim a paz no sentido da ordem, da felicidade, da
tranqüilidade, do bem-estar do kindred. Talvez este seja nosso objetivo consciente em
vida, atingir o Frith. A meu ver não há outro sentido senão buscarmos o Frith e estarmos
satisfeitos com nosso Ásdr. Frith e Ásdr são como irmãos.

Existem três fontes que geram friths, e são elas: Kenship (parentesco), Healldream
(“alegrias do salão”, que são os atos de lealdade, entre duas partes) e Frithyards (que é o
relacionamento do humano com suas divindades). O relacionamento social entre os
seres humanos é a principal fonte de Frith, mas não a única. A individualidade e a
solidão também sabem mostrar o Frith através da temperança e da disciplina.

O Kenship, é a principal fonte de Frith, nossa família, nosso clã, nosso irmãos, pais,
avós, primos, esposas e maridos, o Sippa em si, são as coisas mais importantes em vida
para nós e por isso precisamos estar em paz com eles, protegê-los, guiá-los no Ritta (Lei
Cósmica) e assim alcançar a felicidade e a paz. Sippa é a principal fonte de Frith, que é
a família. Ritta é a lei cósmica do universo que fala como devemos perceber a realidade
como apenas um ponto de vista e sobre nossa condição humana de lutar contra o
sofrimento.

O Healldream se refere aos atos de lealdade entre um líder e seu povo, entre um mentor
e um aprendiz, entre um senhor e seu servo, entre um vassalo e um suserano, entre um
Jarl e um Karl, entre um amante e sua parceira(o). A lealdade garante a amizade, a
confiança, a honra, a bravura e por isso faz aumentar nosso Ásdr, e logo gera Frith.

E finalmente o Frithyards que se refere ao relacionamento que uma pessoa tem com os
seres divinos e vice-versa. Crer e cultuar uma divindade traz paz, segurança e respostas
para perguntas universalmente questionáveis, e as divindades se agradam disso
provendo fartura, fertilidade e paz, o que também é fonte de Frith.
Este estudo de nenhuma forma irá se tornar um dogma dentro do neopaganismo
nórdico. Ele é síntese de pesquisas sobre a espiritualidade nórdica e sobre os mais
diversos conceitos de alma e vida encontrados entre as muitas tribos germânicas. Da
mesma maneira, por sermos reconstrutivistas, este texto está sujeito a críticas, bem
como alterações mediante novos estudos.

Vagner Cruz

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