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HARPAGÃO: - Sai da minha frente carne pra forca, voa daqui verme maldito, vamos fora,

fora.
FLECHA: - Nunca vi ninguém tão velhaco como esse velho maldito, se não me engano ele
deve estar com o diabo no corpo.
HARPAGÃO: - Fora daqui!
FLECHA: - Por que me manda embora?
HARPAGÃO: - Mando por que eu quero, ora essa.
FLECHA: - Mas o que foi que eu fiz?
HARPAGÃO: - Fizeste eu querer que saias da minha frente.
FLECHA: - O seu filho senhor, ordenou-me que esperasse por ele aqui.
HARPAGÃO: - Ah é? Pois então espera no meio da rua que é o teu lugar, e não aqui dentro
vasculhando tudo, vendo se tem alguma coisa pra roubar.
FLECHA: - E como eu posso lhe roubar? O senhor é lá homem a quem se roube? Com as
suas coisas fechadas a chave e fazendo sentinela frente elas noite e dia?
HARPAGÃO: - Pois eu passo a chave naquilo que quero e faço sentinela no que muito me
agrada. Desconfio que sabe alguma coisa a respeito do meu dinheiro escondido. Escuta aqui,
não andas espalhando por acaso o boato de que eu tenho dinheiro escondido?
FLECHA: - Tem dinheiro escondido?
HARPAGÃO: - Eu não disse isso. Ai que raiva. Eu perguntei se não andas por acaso,
espalhando o boato de que tenho dinheiro escondido.
FLECHA: - E de que adianta saber se pra mim dá no mesmo?
HARPAGÃO: - Respondão, heim? Pois eu vou te tirar essa mania de responder pelas orelhas,
fora daqui.
FLECHA: - Bem, já vou.
HARPAGÃO : - Espera; não me levas nada?
FLECHA: - O que hei de levar?
HARPAGÃO: - Vem aqui mostrar essas patas.
FLECHA: - Não.
HARPAGÃO: - Vem aqui mostrar essas patas. As outras.
FLECHA: - Que outras?
HARPAGÃO: - As outras, ora essa.
FLECHA: - Veja.
HARPAGÃO: - Não levas nada aí dentro?
FLECHA: - Veja o senhor mesmo.
HARPAGÃO: - Pois é isso mesmo que eu vou fazer, essas calças largas podem muito bem
esconder objetos roubados e muito me agradaria ver na cadeia todos aqueles que praticam
tais atos.
FLECHA: - Como um velho como esse merecia ser roubado e como eu gostaria de roubá-lo.
HARPAGÃO: - Heim? O que dizes aí em roubar?
FLECHA: - Eu disse que poderia me revistar se pensas que eu o roubei.
HARPAGÃO: - Mas é isso que eu vou fazer.
FLECHA: - Que a peste esteja com a avareza e os avarentos.
HARPAGÃO: - Que dizes?
FLECHA: - Que digo?
HARPAGÃO: - A respeito da avareza e dos avarentos?
FLECHA: - Eu digo que a peste esteja com a avareza e os avarentos
HARPAGÃO: - E a quem aludes?
FLECHA: - Aos avarentos.
HARPAGÃO: - E quem são os avarentos?
FLECHA: - Uns vis, uns ladrões.
HARPAGÃO: - Mas eu quero saber quem são os avarentos.
FLECHA: - Por que se preocupa?
HARPAGÃO: - Eu me preocupo com o que eu tenho que me preocupar, ora essa.
FLECHA: - Pensa que eu estou falando do senhor?
HARPAGÃO: - Eu penso o que eu quiser, e quero saber a quem te referes quando falas nos
avarentos.
FLECHA: - Eu falo com os meus botões.
HARPAGÃO: - E não te fale eu com um soco na cabeça.
FLECHA: - Queres me impedir de maldizer os avarentos?
HARPAGÃO: - Não, mas de falares tanta bobagem.
FLECHA: - Bem... se a carapuça lhe serve.
HARPAGÃO: - Cale-se.
FLECHA: - Bem, que remédio.
HARPAGÃO: - Já, agora mesmo.
FLECHA: - Veja senhor, mais outro bolso, não quer revistá-lo também?
HARPAGÃO: - Vamos, passe-me aqui sem que seja preciso eu revistá-lo.
FLECHA: - Passar o quê?
HARPAGÃO: - O que me roubaste.
FLECHA: - Mas eu não roubei nada.
HARPAGÃO: - Tem certeza?
FLECHA: - “bisoluta”
HARPAGÃO: - Então sai da minha vista verme maldito, voa daqui.
FLECHA: - Mas que linda despedida, por minha fé.

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