Você está na página 1de 10

VIII REACT

ST 01 “E pur se muove! Novas tecnologias de parentesco: a ressurreição de


um campo”
23-25 de novembro de 2021
Link de acesso ao Google Meet: meet.google.com/gyn-rmoa-zdi
Coordenação: Márnio Teixeira-Pinto; Carlos Eduardo Ferreira; Adriana Queiroz Testa
Os estudos de parentesco nascem e se consolidam como campo de controvérsias. A
cena contemporânea continua incendiária, uma vez que o destino desse campo é
disputado por aqueles que, sucedendo às críticas culturalistas, o condenam à morte e
também por aqueles que propugnam sua reabilitação. Diante do vertiginoso
desenvolvimento recente de tecnologias da informação que interferem em todos os
aspectos das nossas vidas, não surpreende que parte dessas tentativas de resgate dos
estudos de parentesco passe pela implosão das fronteiras disciplinares, estimulando o
diálogo entre antropologia e computação. Esse diálogo, ancorado nas teorias do
parentesco e dos grafos, tem investido na criação de métodos computacionais para o
estudo do parentesco e temas conexos, como chefia, xamanismo, ritual, mobilidade
espacial, residência, descendência e circulação de coisas alienáveis e inalienáveis, entre
outros. Esse horizonte de cooperação interdisciplinar também descortina a
possibilidade de retomar, por outros ângulos, relações entre estrutura e história, uma
vez que redes de parentesco são fenômenos que evoluem no tempo e que, em termos
matemáticos, talvez se comportem como sistemas dinâmicos, para os quais a ciência da
computação dispõe de recursos de tratamento. Diante da profusão de potencialidades
que as novas tecnologias informáticas trazem para a antropologia, esse seminário está
interessado em reunir iniciativas que apostam nesta nova fronteira interdisciplinar.

Sessão 1: Experimentos computacionais em redes de parentesco


23/11/2021 – 9:00 às 12:00
Comentarista: Mauro Almeida (UNICAMP – Brasil)
O problema da retificação dos anéis matrimoniais
Marcio Ferreira da Silva (USP - Brasil)
Márnio Teixeira-Pinto (UFSC - Brasil)

Uma experiência com redes de parentesco totalmente coloridas


Álvaro Junio Pereira Franco (UFSC - Brasil)
Marcelo Emilio Vendramin (UFSC - Brasil)

Lo que se ve mejor con computadora, y sin computadora – el caso del sistema de


parentesco chimane (Bolivia)
Isabelle Daillant (CNRS, EREA/LESC - France)
Um novo alento para decifrar a organização social Mẽbêngôkre via PUCK
Juliana P. Lima Caruso (USP - Brasil)
Vanessa R. Lea (UNICAMP - Brasil)
Leandro Mahalem (FGV- Brasil)

Sessão 2: Novos olhares sobre parentesco a partir das ferramentas


computacionais
24/11/2021 – 9:00 às 12:00
Comentarista: João Dal Poz (UFJF – Brasil)
Do todo às partes, das relações aos termos: como ensinar vocabulário de parentesco
a um processador
Márnio Teixeira-Pinto (UFSC - Brasil)

¿La regla que confirma la excepción? Un sistema de primos cruzados con primos
cruzados
Diego Villar IICS (CONICET-UCA/Argentina)
Lorena Córdoba (IICS UCA-CONICET/Argentina)

Metades exogâmicas e outros aspectos do regime matrimonial rikbaktsa


Gabrielle Cardoso Meneses (Museu Nacional/PPGAS/UFRJ - Brasil)

Grafos no Rio Purus: análise exploratória de genealogias apurinã


Mario de Azevedo Brunoro (UFAM- Brasil)

Sessão 3: Circulação, alianças e redes de parentesco


25/11/2021 – 9:00 às 12:00
Comentarista: Miriam Hartung (UFSC – Brasil)
El ayllu peruano sometido a tratamiento computacional: primeros avances
Pablo Federico Sendon (ICSS-UCA/CONICET - Argentina)

Aliança matrimonial e ocupação territorial: um estudo sobre o sul do Amazonas


Edmundo Antonio Peggion (UNESP/PPGAS-UFSCAR- Brasil)

Redes de circulação entre manivas e mulheres nos rios da bacia do Rio Negro
Lorena França (UFSC- Brasil)

Conexões Controversas entre Chefia e Parentesco Guarani


Adriana Queiroz Testa (USP- Brasil)
Resumos

Título: O problema da retificação dos anéis matrimoniais


Autor(es): Marcio Ferreira da Silva (USP); Márnio Teixeira-Pinto (UFSC)
Resumo: “Anel matrimonial” é um conceito forjado em região de fronteira entre os
territórios da matemática discreta e da antropologia do parentesco. Do ponto de vista
antropológico, corresponde a um matrimônio entre pessoas previamente aparentadas.
Do ponto de vista matemático, descreve um caminho em um grafo de Ore que não leva
em conta a direção dos arcos, no qual nenhum vértice tem grau de saída igual a zero, o
último vértice é igual ao primeiro e nenhum vértice entre eles ocorre mais de uma vez.
Enfatizando sua origem mestiça, poderíamos defini-lo como um circuito fechado de
arcos de filiação e arestas de casamento entre vértices (indivíduos) distintos,
representados em uma genealogia, no qual nenhum deles representa uma pessoa
solteira sem filhos. Embora a cristalização deste híbrido corresponda a um fenômeno
relativamente recente, algumas de suas manifestações são objetos antropológicos com
idade provecta, como não desmentem o artigo pioneiro de Tylor (1889), que inaugura a
noção de “casamento de primos cruzados”, as conferências de Rivers (1913) sobre a
relação entre práticas matrimoniais e classificações de parentesco e o tratado de Lévi-
Strauss (1949) sobre os regimes elementares de aliança. Em termos heurísticos, a análise
de uma forma circular como um anel requer, como passo inicial, a sua retificação, ou
seja, a sua projeção em um segmento de reta, com a preservação de todos os seus
vértices. Assim, para estudar um anel, é preciso segmentá-lo em uma de suas conexões
e, por convenção, definir o primeiro vértice desta cadeia orientada como Ego e o último
como Alter. Em tese, um objeto circular pode ser cortado em qualquer vínculo que o
compõe mas, por conveniência, aqui convém cortá-lo numa conexão matrimonial. Neste
caso, Ego e Alter são cônjuges entre si. Ora, a antropologia do parentesco tem explorado
quase que exclusivamente anéis com uma única conexão matrimonial. Nesses casos, sua
retificação corresponde a um procedimento banal. Com a entrada em cena de
ferramentas computacionais, capazes de rastrear exaustivamente circuitos de maior
profundidade, com dois ou mais casamentos, antropólogos e cientistas da computação
voltam a se associar diante deste desafio metodológico de seu objeto híbrido: em um
dado anel que contém dois ou mais casamentos, onde o circuito pode ou deve ser
cortado? A decisão é crucial para relacionar corretamente os casamentos nos anéis de
uma dada rede. Esta comunicação pretende explorar algumas dimensões deste
problema.

Título: Uma experiência com redes de parentesco totalmente coloridas


Autor(es): Álvaro Junio Pereira Franco (UFSC); Marcelo Emilio Vendramin (UFSC)
Resumo: As redes de parentesco são grafos com vértices, arestas e arcos. Na sua forma
natural, as redes de parentesco podem ser utilizadas para identificar os indivíduos e
relações entre esses indivíduos. É comum um arco do vértice u para o vértice v
representar que u é pai (ou mãe) de v; e uma aresta entre u e v representar que tais
vértices são casados. Como consequência, os arcos podem ser rotulados com valores do
conjunto R, sendo seus elementos representando as relações possíveis entres os
vértices (indivíduos): F, M, S, D, H e W. Agora considere um conjunto de cores C.
Podemos enxergar os rótulos dos elementos do conjunto R como cores nos arcos e nas
arestas, desde que exista um mapeamento um-para-um entre os elementos de R e C.
Portanto, podemos usar cores nos arcos e arestas em redes de parentesco sem perder
qualquer informação clássica. Além disso, podemos até sugerir novas relações em redes.
Como exemplo disso, podemos citar um trabalho do Me. Carlos Melo de Oliveira
Paulino, sob orientação do Prof. Dr. Márcio Ferreira da Silva, onde eles trabalharam com
relações diferentes daquelas que aparecem no conjunto R. Isso é equivalente a
considerar novas cores no conjunto C para atender ao mapeamento um-para-um entre
os conjuntos. Sobre este olhar, podemos dizer que as redes de parentesco já estão
coloridas nos arcos e nas arestas. No entanto, podemos pensar em uma extensão das
redes de parentesco colorindo também os vértices. Dessa forma, teremos uma rede de
parentesco totalmente colorida nos vértices, nos arcos e nas arestas. A ideia é que a cor
de cada vértice dependa de um atributo dele mesmo. Como exemplo, a apresentação
deste trabalho propõe um exercício sobre a rede Arara com os dados apresentados pelo
Prof. Dr. Marnio Teixeira-Pinto. Nesta rede, todos os vértices foram coloridos a partir
dos ancestrais mais antigos. Todos os indivíduos mais antigos receberam uma cor
distinta. Consideramos que a cor de um vértice é sempre dada exclusivamente pela sua
mãe (ou exclusivamente pelo seu pai). A ideia aqui é analisar sobre os indivíduos
casados, o impacto dos indivíduos mais antigos aliado com a passagem dessa
ancestralidade a partir das mães (ou dos pais). A análise sobre os indivíduos casados
sempre considera os anéis da rede. Portanto, os anéis cromáticos da rede Arara foram
enumerados. O exercício é finalizado com uma análise quantitativa sobre os anéis
cromáticos dessa rede.

Título: Lo que se ve mejor con computadora, y sin computadora – el caso del sistema de
parentesco chimane (Bolivia)
Autor(es): Isabelle DAILLANT CNRS, EREA/LESC (Francia)
Resumo: Cuando recopilé los datos genealógicos de los chimanes (Amazonía boliviana),
principalmente hace unos 30 años, no existían todavía herramientas informáticas para
analizarlos. No eran necesarias para darse cuenta de que los chimanes respetaban de
manera muy estricta las reglas matrimoniales dravidianas. Sus prácticas resultaban en
una red de parentesco tan ordenada y coherente que las ecuaciones terminológicas
podían propagarse y recorrerla, sin tropezar con las contradicciones que en otras
sociedades suelen estorbarlas. Era algo que se percibía nítidamente en el campo, y con
el tratamiento manual que entonces se podía hacer de los datos. Sin embargo, resultaba
mucho más complicado demostrarlo, ya que, por razones que veremos, tal tratamiento
manual no permitía elaborar estadísticas significativas, y que mostrar casos no daba
cuenta del grado de generalidad de las prácticas, ni de la red en su conjunto. Sobre estos
aspectos, el tratamiento informático que se pudo hacer años después (en este caso con
el software Puck), con sus resultados sistemáticos y casi instantáneos, fue una ayuda
inestimable. No obstante, no sólo permitió confirmar y probar lo que ya se había
detectado a mano: también puso a la luz mecanismos que anteriormente habían
quedado desapercibidos. Pero, por otra parte, la larga y tediosa exploración que se había
hecho anteriormente a mano también había desvelado mecanismos –fundamentales
para el funcionamento del sistema– que, al contrario, no podían ser aprehendidos con
el tratamiento informático, precisamente por el carácter sistemático y exhaustivo de sus
resultados. Se ilustrarán más precisamente ambos casos.

Título: Um novo alento para decifrar a organização social Mẽbêngôkre via PUCK
Autor(es): Juliana P. Lima Caruso (USP); Vanessa R. Lea (UNICAMP); Leandro Mahalem
(FGV)
Resumo: Pela iniciativa de Klaus Hamberger, um dos desenvolvedores do programa
PUCK (Program for the Use and Computation of Kinship data), Lea retomou a primeira
parte de seus dados genealógicos levantados entre o subgrupo Mẽtyktire dos
Mẽbêngôkre (Kayapó), em Mato Grosso, entre os anos de 1978 e 1982. O conjunto de
dados foi publicado no Kinsources em 2020, disponível pelo link:
https://www.kinsources.net/kidarep/dataset-320-mebengokre-kayapo.xhtml. A partir
deste corpus publicado, de outubro de 2020 até maio de 2021 Lea, com a assessoria de
Juliana Caruso, já experiente com o programa PUCK, empreendeu uma série de
partições dos dados que evidenciou alguns achados importantes. Recentemente,
Leandro Mahalem, especialista em análises computacionais e de redes se juntou aos
esforços para analisar este complexo corpus empírico. Os Mẽbêngôkre têm uma
organização sui generis, com Casas matrilineares exogâmicas, uma terminologia Omaha
– algo associada na literatura antropológica com patrilinearidade, e com a herança
vicária patrilinear de amizade formal, algo associada com a prescrição ideal de cônjuges.
Tal caracterização foi rejeitada sumariamente por um pesquisador antecessor (Terence
Turner), mas a análise com o programa PUCK possibilitou a comprovação empírica da
natureza exogâmica dessas matricasas. Os Mẽbêngôkre são um dos povos Jê
Setentrionais, próximos aos Timbira, especialmente os Apinajé, em termos linguísticas,
caracterizados ora por uma terminologia Crow, ora por uma combinação de elementos
Crow e Omaha. A investigação dos dados levantados por Lea, Caruso e Mahalem
pretende contribuir tanto para uma nova compreensão dos Jê Setentrionais quanto à
tipologia Crow-Omaha em termos mais amplos.

Título: Do todo às partes, das relações aos termos: como ensinar vocabulário de
parentesco a um processador
Autor(es): Márnio Teixeira-Pinto (UFSC)
Resumo: Todo tratamento computacional de redes de parentesco parece encontrar um
forte limite na passagem entre o cálculo das relações codificadas numa matriz
genealógica e a adoção da linguagem nativa para se referir, mesmo que de modo
aproximado, a estas relações. Longe de ser um acessório não obrigatório ao uso de
ferramentas computacionais auxiliares à análise de redes de parentesco e casamento, o
sistema de termos para as relações de parentesco é fundamental para aproximar as
complexidades analíticas do processamento computacional da realidade prática da vida
nativa. Um Arara, por exemplo, apenas com algum esforço recupera o percurso de
cálculo que faz de uma dada pessoa a "filha da filha do irmão de sua mãe" (uma MBDD,
na 'parlance' analítica antropológica). No entanto, e modo inverso, ele é cotidianamente
levado a não esquecer jamais que aquela pessoa deve ser tratada e referida por uma
específica categoria selecionada no conjunto de termos nativos para as relações de
parentesco. Devemos assumir, portanto, que se aproximar cada vez mais da prática
nativa é um horizonte fundamental do desenvolvimento destas novas ferramentas
computacionais. Esta comunicação apresentará então um experimento inicial de como
ensinar a terminologia de parentesco Arara a uma poderosa engrenagem de cálculo
computacional de relações de parentesco e casamento, a MaqPar.

Título: ¿La regla que confirma la excepción? Un sistema de primos cruzados con primos
cruzados
Autor(es): Diego Villar IICS CONICET-UCA (Argentina); Lorena Córdoba (Doutora em
Antropologia / IICS UCA-CONICET)
Resumo: A partir de la importación del modelo terminológico dravidiano para
comprender las redes de parentesco de los indígenas sudamericanos, los especialistas
no han dejado de destacar los desvíos, los matices y las transformaciones amerindias
con respecto a ese modelo de clasificación parental, presuntamente consistente con el
matrimonio de primos cruzados. En efecto, a través de las décadas, la etnología de las
tierras bajas sudamericanas parece acumular tantas o más excepciones que
cumplimientos a la clásica asociación entre nomenclatura dravidiana y matrimonio de
primos cruzados, comprobando una y otra vez el carácter flexible y adaptable del
sistema y encontrando, en muchos casos, una baja ocurrencia empírica de ese tipo de
alianzas. Sin embargo, a partir de un análisis informático preliminar y exploratorio de la
red genealógica chacobo (Pano) de la Amazonía boliviana, es posible describir una
variación más de esa lógica matrimonial en la cual, no obstante, a través de los años, el
matrimonio bilateral de primos cruzados y con parientes próximos mantiene
efectivamente una notable incidencia estadística.

Título: Metades exogâmicas e outros aspectos do regime matrimonial rikbaktsa


Autor(es): Gabrielle Cardoso Meneses (Museu Nacional/PPGAS/UFRJ)
Resumo: Os Rikbaktsa são um povo de língua Macro-Jê que vive no noroeste do estado
do Mato-Grosso. A população atual do grupo é de cerca de 1800 pessoas divididas em
pouco mais de 30 aldeias (OPAN 2020). Este trabalho pretende abordar a relação entre
metades exogâmicas e regime matrimonial do ponto de vista rikbaktsa. Para tanto,
utilizaremos os dados processados pela MaqPar (Wolthers 2009), o que nos permitirá
ter uma noção mais precisa dos casamentos praticados por essa população ao longo de
um certo período do tempo (6 gerações). Cotejando esses dados com as informações
obtidas por outros antropólogos que trabalharam entre o grupo, perceberemos que a
pertinência das metades exogâmicas para a regulação do casamento é bastante
reduzida. Isso é consequência de um fato mencionado mas pouco explorado na
literatura disponível sobre os Rikbaktsa: as metades são uma invenção recente e, por
isso, seu valor institucional é superficial. Além disso, os Rikbaktsa possuem uma
terminologia com feições crow e omaha. Eles explicam que no passado não só não
existiam metades nem clãs, mas também que costumavam se casar com os primos
(casamento bilateral), algo que não consideram mais correto atualmente. Como
entender a coexistência, dentro de uma mesma sociedade, desses aspectos
interpretados como contraditórios pela literatura clássica? A tentativa aqui é de
elaborar a questão pela história. Nossa hipótese é que o que havia entre os Rikbaktsa
era um sistema supralocal que dispersava blocos adversários por uma região extensa.
Naquele contexto, a aliança se baseava em um regime de troca restrita multibilateral
sem grupos “formais” bem consolidados, ou, nas palavras de Viveiros de Castro & Fausto
(1993:156): “um regime complexo de troca restrita local, que favoriza os ciclos curtos
de reciprocidade e não funciona como um algoritmo de integração global do socius”
(tradução livre). Veremos que é isso o que alguns dados da rede matrimonial rikbaktsa,
quando articulados à história oral, permite supor.

Título: Grafos no Rio Purus: análise exploratória de genealogias apurinã


Autor(es): Mario de Azevedo Brunoro (UFAM)
Resumo: A presente proposta é apresentar o andamento da pesquisa genealógica entre
os Apurinã do Médio Rio Purus. Trata-se de uma análise exploratória, que conjuga
teorias do parentesco com ferramentas computacionais, com o objetivo de realizar uma
primeira aproximação a aspectos do parentesco e da organização social apurinã. Os
Apurinã são um povo internamente diverso e ocupam tradicionalmente um vasto
território que se estende pela região do rio Purus desde o município de Rio Branco (AC)
até Manaus (AM). De acordo com Schiel (2004), existem diferentes formas em que os
Apurinã mobilizam sua identidade coletiva: além das metades patrilineares exogâmicas,
a parentela e a região de residência são marcadores sociológicos fundamentais e
posicionam os parentes em dada rede de alianças. A rede genealógica, resultado da
interligação dos diagramas modelados por Schiel (2004), é composta por 633 pessoas,
das quais 332 são homens e 301 mulheres; e, por 1143 relações, sendo 284 matrimônios
e 859 relações de filiação. Além disso, sabemos ambos avós maternos de 206 pessoas e
paternos de 184. A profundidade geracional da rede é, no máximo, de 7 níveis. Do total
de 284 matrimônios, 176 estão inseridos em 6953 anéis matrimoniais (Silva & Dal Poz,
2008), dos quais 189 são A1C1; 23 A2C1; e 6741 A2C2. Os 189 anéis A1C1 são compostos
por 60 casamentos. Encontram-se casamentos entre primos cruzados em 142 destes
anéis, contrastando com os 47 que representam casamentos entre primos paralelos.
Apenas quatro casamentos são ambíguos e a depender do anel podem ser interpretados
como paralelos ou cruzados. O padrão mais frequente de A1C1 é representado pelo
casamento entre primos cruzados de mesma geração (G 0), correspondendo a 52% dos
A1C1. Já em relação aos 6741 anéis A2C2, encontram-se 108 casamentos envolvidos na
1ª posição e 157 casamentos envolvidos na 2ª posição, sendo que 91 casamentos
aparecem em ambas as posições. O padrão mais frequente deste anel é representado
por duas cadeias afins paralelas de uma mesma geração (G 0) com o tamanho médio de
11 conexões. Como passos futuros da investigação espera-se realizar uma etnografia em
campo visando tanto a atualização das informações genealógicas quanto da
terminologia de parentesco apurinã, cujo material disponível é, até então, incipiente.

Título: El ayllu peruano sometido a tratamiento computacional: primeros avances


Autor(es): Pablo Federico Sendon (ICSS-UCA/CONICET (Argentina)
Resumo: Existe un consenso generalizado en el campo de los estudios antropológicos
sobre parentesco de las poblaciones indígenas de las tierras altas de los Andes de que
su gran mayoría está –y estuvo– organizada en ayllus. De estricta base parental, los
modelos teóricos más sofisticados sobre este tipo de organización social se produjeron
a partir del análisis de información relativa a la sociedad inca y procuraron ser
identificados, con mayor o menor éxito, en el estudio etnográfico de sociedades
indígenas contemporáneas. Siendo este el caso, paradójicamente, no existe consenso
sobre el modelo indígena de parentesco prehispánico en los Andes, el peso estadístico
sobre el que descansan las conclusiones de la gran mayoría de etnografías dedicadas al
parentesco entre poblaciones indígenas contemporáneas es entre débil y nulo y,
finalmente, no existe hasta la fecha un consenso preciso acerca de lo que es el ayllu –
incluso existiendo explícitos pronunciamientos indígenas sobre la materia–. Ante este
estado de cosas, el objetivo de esta comunicación es presentar y discutir parte de la
casuística relativa a poblaciones campesino-indígenas del sur peruano pertenecientes a
la región del macizo del Ausangate (Cuzco) que, debido al carácter excepcional de la
información de base y al tratamiento al que está siendo sometida, permite brindar una
serie de respuestas positivas a las incertidumbres mencionadas. Primero, dos estudios
de caso de dos poblaciones –organizadas en dos y cuatro ayllus– basados en encuestas
genealógicas que han posibilitado la identificación de dos redes de parentesco de 300 y
1000 individuos distribuidos en 5 generaciones. Segundo, libros parroquiales de
matrimonio (5) y bautismo (13) que, articulados con la información genealógica de la
segunda red, han permitido ampliarla hasta 6000 individuos cubriendo un arco de 7
generaciones. La información en cuestión ha sido volcada en bases de datos para su
análisis en programas computacionales especialmente diseñados para el estudio del
parentesco y la alianza matrimonial cuyas posibilidades exploratorias son inmensas y
constituyen un hecho inédito en el ámbito de los estudios antropológicos de parentesco
en los Andes, los cuales hasta la actualidad se han realizado de manera “artesanal”.

Título: Aliança matrimonial e ocupação territorial: um estudo sobre o sul do Amazonas


Autor(es): Edmundo Antonio Peggion (UNESP/PPGAS-UFSCAR)
Resumo: Os artigos de Claude Lévi-Strauss sobre os povos Kagwahiva que habitavam a
região do rio Machado, em Rondônia, indicavam que os grupos locais tinham dois modos
distintos e interligados de realizar o matrimônio: com afins distantes e com primos
cruzados. Segundo o autor, o primeiro levava a uma regularidade de vínculos entre
primos cruzados nas gerações subsequentes, o que, por sua vez, tornava necessário um
novo ciclo de alianças entre grupos distantes. Em estudo recente, realizado entre os
Tenharin do rio Marmelos, foi possível perceber a constituição de novas aldeias a partir
de dissensões ocorridas entre líderes de grupos domésticos. Percebeu-se que os novos
locais de moradia sempre remetiam a antigas ocupações ou a grandes chefes que ali
viveram. Se em tempos antigos o eixo de referência das aldeias era o rio, hoje é a rodovia
BR-230, Transamazônica. Aparentemente, ocorre uma nova configuração relacional
com primos cruzados que habitam aldeias diferentes (como afins) e os que habitam a
mesma aldeia (como primos cruzados, propriamente), fato que remete às notas de Lévi-
Strauss. Uma reflexão interdisciplinar entre antropologia e computação com registros
genealógicos de médio prazo poderia ser interessante para compreender se, de fato, há
ciclos matrimonias e se eles ocorrem como aqui indicado. Além disso, tais registros
poderão ser instrumentos importantes para a comunidade Tenharin pensar sobre a
ocupação de seu território ao longo das últimas décadas.

Título: Redes de circulação entre manivas e mulheres nos rios da bacia do Rio Negro
Autor(es): Lorena França (UFSC)
Resumo: Na bacia do Rio Negro, paisagem etnográfica de povos indígenas multiétnicos,
existe um sistema agrícola, do qual foram identificadas mais de 300 espécies cultivadas
e mais de centena de variedades da maniot esculenta, a mandioca brava, principal
expoente do cultivo local. O sistema pressupõe uma rede de trocas de manivas – nome
dado à parte aérea da planta que possibilita a sua reprodução por clonagem –, efetivada
principalmente por mulheres. Tal como já argumentado por Chernela (1986), “as
alianças matrimoniais criam canais que possibilitam a troca de cultivares de mandioca
na bacia do Uaupés”. Onde prevalece a regra de virilocalidade, as manivas são doadas
pela mãe e viajam, assim, pelo território com as mulheres. Em outros casos, as mulheres
iniciam suas roças com as manivas recebidas de sua sogra, e depois incrementam com
as manivas de sua mãe, de parentes consanguíneos ou de afins. As visitas a outras
comunidades incluem passeios nas roças de outrem e constituem momentos oportunos
de receber exemplares de manivas ainda desconhecidas. O interesse em aumentar a
própria coleção é guiado pelo valor de ‘beleza’ de uma roça, posto que uma roça bonita
é sempre capinada e com grande variedade de manivas. Cada mulher é a “dona da roça”
responsável por cuidar e alimentar suas manivas, estabelecendo uma relação de
consanguinidade com essas plantas. Neste trabalho, atualizo a discussão levantada por
Chernela e desenvolvida por Emperaire (2010, 2019) com dados de agrobiodiversidade
produzidos durante minha pesquisa de doutorado, expostos em duas redes moduladas
a partir do programa computacional Pajek. Na primeira, as 150 variedades de manivas
identificadas estão em relação com os quatro locais da pesquisa etnográfica no Alto Rio
Negro, a saber: uma comunidade no rio Uaupés, duas no rio Negro, uma no Içana e uma
no rio Aiari. Observar as manivas compartilhadas por duas ou mais calhas de rio ajuda a
refletir sobre as dinâmicas de relações entre as regiões que compõem o Alto Rio Negro.
A segunda rede apresenta uma aproximação dos dados por cada comunidade/rio. Como
podem ser percebidas as circulações de maniva entre as mulheres doadoras? Notamos
que as mulheres que possuem mais variedades de manivas em suas roças são aquelas
que estabelecem quantidade mais expressiva de relações sociais. Nesse trabalho, o
parentesco não é objeto de análise em primeiro plano, mas se inscreve como pano de
fundo das relações que orientam as trocas de cultivares.

Título: Conexões Controversas entre Chefia e Parentesco Guarani


Autor(es): Adriana Queiroz Testa (USP)
Resumo: O papel das relações de parentesco na constituição e no exercício da chefia
política e religiosa ameríndia aparece nos primeiros registros de viajantes e
missionários, flagrando o interesse e até mesmo fascínio despertado por figuras de
chefes políticos e religiosos tupi-guarani. Entretanto, é a partir dos estudos de Pierre
Clastres e Hélène Clastres que os Guarani se tornam referência para a generalização de
um modelo teórico da antropologia política nas terras baixas da América do Sul. O
exame de fontes históricas e etnográficas revela um debate perene, recheado de
controvérsias, sobre as conexões entre parentesco e chefia. Nesse sentido, observa-se
que os modelos analíticos consagrados na etnologia guarani apresentam conclusões
divergentes no que diz respeito à influência do parentesco na transmissão da chefia,
bem como às relações entre a chefia política e o xamanismo. Nessa arena de disputas
acaloradas, esta comunicação propõe que o uso de métodos computacionais pode
ajudar a encontrar novos caminhos para elucidar velhos enigmas. Assim, diante de
modelos teóricos conflitantes e em diálogo com etnografias clássicas e
contemporâneas, este trabalho explora um corpus inédito de informações etnográficas
sobre a chefia guarani com o auxílio das ferramentas computacionais MS-Access,
MaqPar e Pajek. O exercício parte de um banco de dados contendo informações
genealógicas de 1781 indivíduos, nascidos após a segunda metade do século XIX, e
dados sobre o exercício da chefia religiosa e política em cerca de 80 localidades nos
países do cone sul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai). A análise desses dados traz
respostas para três problemas persistentes nos debates sobre a chefia ameríndia: (1) o
peso da hereditariedade na transmissão da chefia; (2) a influência de alianças
matrimoniais na constituição e no exercício da chefia; e (3) a própria natureza das
relações entre a chefia política e religiosa – se elas se desenvolvem como forças opostas,
conforme o modelo clastriano, se são papéis que se concentram em uma única figura,
seguindo as formulações de Curt Nimuendaju e Egon Schaden, ou se os laços de
parentesco constituem vias de conexão entre essas duas dimensões da chefia, indicando
novas perspectivas analíticas.

Você também pode gostar