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APOIO

PATROCÍNIO
REALIZAÇÃO
HISTÓRIAS E HISTÓRIA

É o que temos aqui.

Depois de uma grande e linda parceria com a Feira Preta em 2019


para distribuir o Prato Firmeza volume 3, que permitiu que o livro – e
quem fez parte dele – ocupasse novos espaços, o laço se fortaleceu
e o recorte que adotamos na distribuição de ontem passou a pautar
a produção do agora.

Não é de hoje. Falar de periferia sempre foi falar de negri-


tude. Metade das mais de cem empreendedoras e empreendedores
presentes nos livros anteriores se declaram pretas ou pardas. O que
trazemos neste quarto volume é uma obra totalmente dedicada a
mapear empreendimentos gastronômicos de pessoas negras da ca-
pital e da região metropolitana de São Paulo.

Para seguir ampliando o conceito de que existe muita comida boa


espalhada pela cidade, mas, principalmente, para assumir o controle
de nossas próprias narrativas e decolonizar pensamentos, contra um
racismo que de um lado resume no imaginário coletivo a gastronomia
negra apenas à “cozinha da Tia Nastácia” e de outro faz com que
“Donas Bentas” estampem as capas dos livros de receitas.
Não é sobre uma cozinha ser mais ou menos importante do que
outra. A ideia equivocada de alta e baixa gastronomia já ficou para
trás lá no primeiro guia. É sobre uma cozinha que não é mais um
local de servidão, mas sim de criação e manifestação de cultura,
afeto, empreendedorismo, carreira profissional; repleta de referência,
conceito, técnica, embasamento teórico e conhecimento ancestral. É
gastronomia mesmo. Das cozinheiras escolares às chefs estreladas,
aqui todo mundo é Prato Firmeza.

Prato Firmeza Preto.

Algo dessa magnitude não poderia ser feito sozinho. Se o nosso lema
sempre foi descentralizar o rolê, isso acabou se reverberando inter-
namente também. E se já começou coletivo, a gente quis mais: bota-
mos mais água no feijão e convidamos uma galera para produzir
junto e participar de todas as etapas do processo. São cinco veícu-
los de diferentes quebradas. Referências. Cada um dentro do seu
contexto, abordagem e potência, que se encontram na construção
diária e prática de um jornalismo mais diverso e com qualidade.
Do local pro mundo. Nóis por e com nóis.

Os textos que você irá ler foram produzidos por dezessete repórteres,
jovens entre 19 e 45 anos, da Alma Preta, Agência Mural, Perife-
ria em Movimento, Preto Império e Vozes das Periferias, que
se juntaram à Énois para so-
mar de cada canto da cidade
e formar a maior equipe que
já tivemos. Um projeto de mui-
tas mãos. Mãos pretas. Toda a
equipe principal, da reporta-
gem à coordenação, do design
à edição, é composta por pes-
soas negras.

E como produzir um guia gas-


tronômico durante uma pan-
demia que, entre outras conse-
quências gravíssimas e abismos
sociais ainda mais expostos,
provocou o fechamento de tan-
tos estabelecimentos e fez com
que as pessoas deixassem de
sair de casa? Enquanto ma-
terial jornalístico e político, é
importante que ele cumpra seu
objetivo principal de prestar
um serviço relevante ao públi-
co, sem ignorar a situação em
que vivemos. Como aproximar
as pessoas, mantendo esse su-
perpoder que a comida tem,
mesmo estando longe?

Por isso, também nos reinventa-


mos na produção: todas as en-
trevistas foram feitas à distân-
cia e as comidas entregues por
delivery, em uma logística até
então inédita por aqui, para
proporcionar a cada repórter
uma experiência acolhedora e
saborosa em sua própria casa,
com segurança, responsabi-
lidade e cuidado, em todos os
sentidos. As informações de
entrega estão ainda mais de-
talhadas. E agora trouxemos
negócios itinerantes ou que tra-
balham apenas por encomen-
da, além dos estabelecimentos
que recebem o público.
“Cuidado”, palavra da moda, para nós significa olhar para toda a
cadeia que envolve o nosso trabalho. A discussão legítima sobre pre-
carização do emprego da classe dos entregadores – formada em
sua maioria por pessoas negras e periféricas – se intensificou nesses
tempos e a gente chegou junto. Com isso em mente e na contramão
dos aplicativos, montamos a nossa própria equipe de entregadores
e entregadoras, contratados e remunerados de maneira justa, com
suas experiências de trabalho e de vida registradas em um capítulo.

Construir um projeto nesse cenário e trazer a discussão racial para


o centro da nossa pauta possibilitou inclusive a expansão do próprio
conceito de Prato Firmeza: o território, palco da nossa existência,
ganhou novas camadas, outras pluralidades e transcendeu o espaço
físico. Pela primeira vez, o guia não está dividido pelas regiões da
cidade. Em vez disso, temas variados que unem cada uma das 39
histórias aqui contadas, dos territórios às territorialidades. Fomos
até para o centro expandido! Mas com a plena consciência de onde
viemos e para onde – e com quem – vamos.

Vamos longe.

E vamos todes. Nossa cozinha encheu de gente e o prato ficou mais


firmeza do que nunca.
Prato Firmeza Preto

Salve Benedita Ricardo de Oliveira, ou Benê Ricardo, a primeira


mulher a se tornar chef de cozinha profissional no Brasil. Uma mulher
negra.

Salve Mariya Russell, a primeira mulher negra a conquistar uma es-


trela Michelin, com o Kikkō, em Chicago, em 2019. O guia dá estrelas
a restaurantes desde 1926.

Salve Matheus Oliveira, cozinheiro e criador do Prato Firmeza.

Salve Cidinha Santiago.

Salve Andressa Cabral, Carmen Virgínia, Dandara Batista, Danni


Camilo, Icaro Rosa, João Diamante, Kátia Barbosa, Larissa Januário,
Léo Filho, Leticia Cruz, Lili Almeida e Patty Durães.

Salve Laércio Zulu, Rodolfo Bob e Yuri Evangelista.

Salve Pitchou Luambo e tantos imigrantes e refugiados que vivem


e sobrevivem por aqui.

Salve Hailton Arruda e Michele Crispim.

E muitas outras pessoas, irmãos e irmãs, que são referência em suas

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próprias diversidades e fazem
todos os dias, desde sempre, a
gastronomia ter mais a nossa
cor e a nossa cara.

Esse é só o começo!

Guilherme Petro
Editor-chef
UM SALVE DA FEIRA PRETA!

Quando me convidaram para escrever para a edição de 2020 do Pra-


to Firmeza em nome do Afrolab Gastronomia da Feira Preta eu tremi,
mas como boa mulher negra, respirei e vim bater esse papo com vocês.
Neste ano de tantos altos e baixos, emoções à flor da pele e desafios
recorrentes, é muito emocionante ver a seleção de afroempreendedores
presentes nas próximas páginas e acompanhar a força de seus negócios!
E quando falo de força quero que você a perceba pulsando em todos
esses nomes.

O Afrolab existe para dar mais potência ao que já é incrível dentro


dos afronegócios periféricos, abrindo olhares, capacitando e guiando
com ferramentas aprimoradas de planejamento estratégico para o
empreendedorismo e muita afetividade. Pois entendemos os desafios
que surgem a todo momento quando se quer romper barreiras no
cenário do nosso país. E romper barreiras é necessário.

Com o isolamento, mudamos a nossa forma de consumo de alimen-


tos, deixamos de sair para encontrar nossos pares, sentimos a neces-
sidade de aprender a cozinhar mais, de desperdiçar cada vez menos
ao mesmo tempo em que desenvolvemos mais a cultura dos pedidos
de delivery. E precisamos enaltecer o trabalho de quem cruza aveni-
das, sobe ladeiras, desce morros e enfrenta qualquer adversidade
Prato Firmeza Preto

para chegar às nossas casas. Uma salva de palmas para essa galera
destemida das entregas!

Esta edição vem toda preta! Ubuntu: eu sou porque nós somos.
Um trabalho colaborativo entre nós e a equipe da Énois e Prato
Firmeza. Para te guiar por dentro do centro e das quebradas ao
encontro da nossa ancestralidade dentro e além do prato. Para te
despertar para a necessidade de entender a produção do alimento
e também fortalecer o fato de que aqui estamos para também apre-
ciar o mundo do vinho e dos orgânicos. Para mostrar que as nossas
habilidades se desenvolvem nas garagens, nas barracas, nos morros,
nos restaurantes e também na internet. Que aqui estamos para falar
do que nos é mais precioso… lições e receitas familiares guardadas a
sete chaves. Histórias de África, histórias de Brasil. Acarajés, doçarias,
arrozes, temperos, bolinhos e a nossa magia da multiplicação dos
sabores e a preservação dos saberes. Resiliência e alegria!

Então aproveita que esta edição chegou até você e bom apetite.

Patty Durães
Produtora em gastronomia
Mentora do Afrolab Gastronomia
Curadora da Cozinha da Casa Preta Hub

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EQUIPE
EQUIPE

COORDENAÇÃO E EDIÇÃO REVISÃO


1. Guilherme Petro 9. Olívia Tavares

EDIÇÃO FINANCEIRO
2. Jamile Santana E PRESTAÇÃO DE CONTAS
10. Bruna Gonçalves
DIREÇÃO DE ARTE 11. Nadja Aguiar
E DIAGRAMAÇÃO
3. Milo Araújo COLABORAÇÃO
12. Allan Melchiades Barreto
REPORTAGEM 13. Rodrigo Barbosa Fonseca
4. Camila da Silva
5. Gabrielly Oliveira

PRODUÇÃO
6. Amanda Rahra
7. Gabriella Mesquita
8. Jéssica Mota
PARCERIA DE
PARCERIA DE CONTEÚDO
CONTEÚDO

AGÊNCIA MURAL PERIFERIA EM MOVIMENTO


Reportagem: Reportagem:
14. Danielle Lobato 25. Camila Lima
15. Kátia Flora 26. Carolina Messias
16. Thalita Monte Santo 27. Laís Diogo
17. Wesley Galzo Edição:
Reportagem e edição: 28. Aline Rodrigues
18. Eduardo Silva 29. Thiago Borges

ALMA PRETA VOZES DAS PERIFERIAS


Reportagem: Reportagem:
19. Beatriz Mazzei 30. Eduardo Bernardo
20. Guilherme Soares Dias 31. Peterson Prates
21. Juca Guimarães Reportagem e edição:
Edição: 32. Wallace Moraes
22. Nataly Simões

PRETO IMPÉRIO
Reportagem:
23. Priscila Reis
Edição:
24. Simone Freire
1 2 3 4

5 6 7 8

9 10 11 12

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17 18 19 20

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25 26 27 28

29 30 31 32
SUMÁRIO
SUMÁRIO

QUEM FAZ O CORRE 22 BLACK BUSINESS 124


Vandson Oliveira 24 16. 50/25 Cocktail & Co. 126
Terezinha Batista 28 17. Levinho Fit 132
Eduardo Santos 32 18. Mesa Cheia 138
Aline Os 36 19. Sabores de Família 144
20. Lili Comida Saudável 148
RESGATE E ANCESTRALIDADE 40
1. Areté Comedoria 42 NO CENTRO 152
2. Chermoula Cultura Culinária 48 21. Biyou’z 154
3. Baobá Comedoria 54 22. Preto Cozinha 160
4. Mama África Labonne Bouffe 60 23. Toya Vegan 166
24. Free Soul Food 172
ACARAJÉS 66 25. Casa de Ieda 178
5. Akara Refeições 68
6. Cozinha das Pretas 74 DE QUEBRADINHA 184
7. Akará Delivery 80 26. O Chapa Churrasco 186
8. Kitanda das Minas 84 27. Pierry Delivery 190
28. Sônego Bistrô 196
DOCES AFETOS 90 29. Batatas Top Delivery 202
9. Doce Ghetto Brigaderia 92 30. Du Pub 206
10. Amô • Cozinha Afetiva 96 31. Dominga’s Bar 212
11. Quero Churros 100
12. Batuque na Cozinha 106 ALÉM DO PRATO 216
13. Letícia Valias Doceria Artesanal 112 32. Prato Verde Sustentável 218
14. Cakes da Nega 116 33. Matulas da Nega 224
15. Bolos da Vida 120 34. Confraria das Pretas 228
Prato Firmeza Preto

QUEM FAZ
QUEM FAZ OO CORRE
CORRE
O corre da virada

Segundo dados consolidados pela consultoria Análise Econômica,


do total de trabalhadores informais no Brasil, os que prestam
serviço para aplicativos de entrega de refeições saltaram de 250 mil
pessoas em 2019 para mais de 645 mil em junho de 2020, ou seja,
mais que o dobro de pessoas passaram a exercer essa atividade. Eles
são um termômetro social da atualidade e uma classe trabalhadora
que luta para ter seus direitos mínimos reconhecidos. Não são bem
remunerados pelos aplicativos de entrega, servem a classe
média/alta com pratos que nunca experimentaram. Precisam
e merecem receber todo o reconhecimento pelo trabalho, pela
exposição diária que enfrentam. E quando digo reconhecimento,
não me refiro ao social, que é a remuneração digna, carga horária
adequada, direito à descanso, refeição e auxílio em caso de acidente.

Aqui nestas páginas então nos propusemos a mostrar a história


dos entregadores, gente que faz o corre da virada na vida.
É um passo pequeno para que a gente ajude a levantar
o debate social dessa classe. Mas mostramos que tem

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uma galera que ama o que faz,
e, com o perdão do trocadilho,
faz com toda entrega.

Jamile Santana
Editora

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Prato Firmeza Preto

FOCO CONTÍNUO E
MUITO CUSCUZ PARA
REALIZAR SONHOS
VANDSON OLIVEIRA
Por Camila da Silva, da Énois

EM MEIO À PANDEMIA, VANDSON


ENCONTROU NOS APLICATIVOS DE ENTREGA
UMA SAÍDA PARA CONTINUAR CUIDANDO DA
FAMÍLIA E SE MANTER PRÓXIMO DE SUAS RAÍZES

Para alguns um prato favorito é aquele que se come de vez em


quando ou em ocasiões especiais. Para Vandson Oliveira, 28 anos,
filho de Marilza e Vabson, o favorito é o do dia a dia: um bom
cuscuz, seja com ovo, carne ou qualquer acompanhamento chega a

24
Quem faz o corre

ser tão especial quan- no noroeste da África. Carac-


to qualquer prato e datas terístico da população berebe,
comemorativas. “Eu lembro que afro-asiática, distribuída por
quando era mais novo meus cinco países e pelo Saara Oci-
pais brigavam, do tanto que dental, o preparo era feito com
eu comia cuscuz. Era no café, vários cereais e farinhas dife-
almoço e jantar. Um dia minha rentes. No Brasil, a população
mãe foi reclamar para o médi- indígena já fazia esse prato
co, mas ele aprovou e falou que com a farinha do milho, como
era um bom café reforçado”, é até hoje. Seus nutrientes
conta rindo. Esse costume vem tornam o prato completo,
da família que é do Andaraí, sendo considerado uma das
no interior da Bahia, mas que principais fontes de saúde e
vive no Jardim Prainha, na zona energia do povo sertanejo e da
Sul de São Paulo, desde ínicio população indígena há muito
dos anos 2000. tempo. O som produzido pelo
chiado da farinha de milho na
O cuscuz, tradicional em nove cuscuzeira deu nome ao prato
estados da região Nordeste, que conhecemos hoje.
se espalhou por todo o país e
é um prato que carrega raízes Depois de um bom café com o
bem antigas. O primeiro regis- cuscuz e de caminhar com a es-
tro histórico é datado do século posa Edirlane, de trinta anos,
XIII, na região do Magrebe, Vandson sai para fazer suas

25
Prato Firmeza Preto

entregas. Essa rotina começou gue o necessário para sus-


em 2020, assim que perdeu seu tentar a esposa e suas duas
emprego em um estacionamen- filhas, Kauany, de treze anos,
to no centro de São Paulo, por e Sofia, três.
conta da pandemia do coro-
navírus. Ele e outros colegas No início, andar de moto
de trabalho, que esperavam o dia todo pela cidade causou
pelo registro na carteira no preocupação para ele e sua
início do ano, mas ficaram sem família, principalmente quanto
previsão se receberiam o pa- à sua segurança e pelo risco do
gamento devido pelo tempo trânsito, mas Vandson logo se
de trabalho. Além disso, sua habituou com a nova rotina:
esposa, que trabalha como
empregada doméstica, tam- “Hoje eu sei como andar
na moto o tempo todo.
bém ficou temporariamente Ficar nela o dia inteiro
sem emprego. acaba com a coluna, eu não
tinha noção disso. Quem
trabalha com entrega
O valor do auxílio emergen- precisa ter muita atenção
e ficar de olho sempre em
cial não era suficiente para
tudo ao seu redor.”
pagar as contas, então ele
viu uma saída nos aplicati-
Desde jovem ele criou a sua
vos de delivery. Saindo de
própria rotina de trabalho.
casa às 8h e voltando até às
Aos catorze anos, começou
20h da noite, Vandson conse-

26
Quem faz o corre

a trabalhar como cobrador “Papai tem ir que tomar


banho se não o coronavírus
de lotação no Grajaú, aos
entra na sua barriga.”
dezesseis, abandonou a escola.
Depois de alguns anos retomou
Sua meta é ampliar a casa e,
os estudos e fez supletivo com
depois da pandemia, conhecer
o irmão. Juntos concluíram o
Andaraí e poder comer cuscuz
ensino médio com as melhores
em sua terra natal.
notas da turma.

Hoje Vandson busca no tra-


balho de entregas, além do
próprio sustento, uma opor-
tunidade de oferecer uma
educação melhor para suas
meninas. E é com elas, ao voltar
para casa, que é possível deix-
ar de lado a necessidade de
atenção e foco contínuo do tra-
balho. Sofia, que sempre corria
para abraçá-lo e dar uma volta
de moto, agora já sabe que é
preciso ficar longe e, assim que
Vandson chega, ela já alerta:
Foto: Acervo pessoal

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Prato Firmeza Preto

BICICLETA,
CORRERIA
E POCAS IDEIA
TEREZINHA FALCÃO BARRETO
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

PARA TEREZINHA, A BICICLETA É MAIS


DO QUE UM ESTILO DE VIDA: É GANHA PÃO
E LIBERDADE DE SE COLOCAR NO MUNDO
TOMANDO POSSE DO PRÓPRIO CORPO

Terezinha Falcão Barreto, 33 anos, é de Salvador, Bahia, mas


desde 2015 anda de bicicleta por São Paulo. Começou com o
meio de transporte aos treze anos, no trajeto da escola, mas o alto
custo da passagem em São Paulo a levou para a bike novamente.

28
Quem faz o corre

“Comecei a achar libertador. cos. O começo como entregado-


Daí a partir de uns amigos ra não foi fácil e nem sempre ela
passei a entender que eu não foi bem-remunerada.
precisava adoecer mais na ci-
dade e podia gozar de algu- Muita coisa mudou e, com
ma liberdade”, diz. Ela já via- sorriso no rosto, hoje ela en-
jou com amigos de Cananéia, frenta os dias agitados e o de-
no litoral sul de São Paulo, safio de ajustar o ritmo de tra-
até o Uruguai e, desde então, balho e o volume de entregas.
adotou a bicicleta como parte Andando de bike pela selva de
da própria vida, inclusive como pedra, ela precisa enfrentar
fonte de renda. carros, motos, sol e chuva.

Trampando com entregas “Já estou acostumada


e consigo impor respeito de
desde 2019, ela conta que a existir.”
vida é feita de ciclos, e isso é
o que mais faz sentido no mo- Bicicletas também estão na
mento. Enquanto pensa em legislação de trânsito como veí-
outros caminhos, é esse o culo. Nas ruas, o papo é outro.
seu ganha pão. Terezinha é O respeito pela bicicleta como
correria: cursou psicologia, meio de transporte é uma luta
já trabalhou com produção constante e deve ser conquista-
cultural, foi ajudante de cozinha do, assim como o fato de ser
e feirante de produtos orgâni- mulher e trabalhar como en-

29
Prato Firmeza Preto

tregadora. O machismo nesse ficar. Se um lugar não está pa-


meio acontece com gente desa- gando bem, Terezinha simples-
creditando da capacidade dela mente dá os pulos dela, se vira
de carregar peso ou quando e vai pra outro pico, ou anuncia
perguntam se ela vai conseguir o trampo de entregas. Depois
mesmo fazer o trampo. que saiu do último trabalho,
fez novos clientes pelas redes
Terezinha se vira bem e não sociais e continuou trabalhan-
perde mais energia tentando do de forma autônoma. Hoje
provar alguma coisa para as ela trabalha em uma empresa
pessoas ou explicar de forma de e-commerce.
professoral. Mesmo ainda ro-
lando casos assim às vezes, “Sou contratada nessa
multinacional e faço parte
isso tem diminuído, pelo menos da frota própria, sendo a
com ela, que hoje se sente mais primeira mulher do projeto.”
respeitada nas ruas. Ela diz que
quando andava a passeio ou só Ela trampa com entrega de
para deslocamento ouvia mais dia e faz outros freelas à noi-
assédios. Atualmente, a galera te. Segundo Terezinha, “somos
elogia o trabalho, o corre e ela brasileiros e não dá para ter
até acha bom, de verdade. só um trampo”. Mesmo com a
vulnerabilidade da bicicleta e a
Os ciclos começam e terminam pressão dos carros e das motos,
conforme ela decide onde quer ela afirma que quem trabalha

30
Quem faz o corre

na moto passa pelas mesmas coisas que quem trabalha com a bike.
Os sofrimentos são similares e esses trabalhadores se encontram
também no ponto da precarização, na baixa remuneração e no fato
de ter que se desenrolar em mil para fazer a grana do mês.
No entanto, é fato que quem tem moto consegue fazer um volume
maior de entregas.

Ser ciclista em São Paulo é um desafio diário de lidar com todas as


problemáticas de estar exposta diante toda uma cadeia de sujeitos
e objetos que oprimem ou podem vir a oprimir. Para encarar isso,
Terezinha é pocas ideia: “Me imponho com meu corpo na rua e me
sinto uma mulher bem poderosa por isso, e tal conquista se reflete por
todos os âmbitos da minha vida”.

Foto: Acervo pessoal

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Prato Firmeza Preto

NO CORRE
PARA FAZER
UM SOM
EDUARDO SANTOS
Por Camila da Silva, da Énois

DE BICICLETA DO CAPÃO AO CENTRO


DE SÃO PAULO, EDUARDO PEDALA
PARA REALIZAR SEUS PROJETOS

Nascido em Diadema e criado no Capão Redondo, zona Sul de


São Paulo, os corres pela cidade de Eduardo Christian de Jesus
Santos, 28 anos, começaram entre o próprio bairro e as perife-
rias vizinhas, no Embu das Artes, Itapecerica e Taboão da Serra.
Trabalhava como produtor de eventos e fotógrafo, área em que ele

32
Quem faz o corre

atuou desde 2015, antes de Vitória Régia, e a partir dali


começar a realizar trabalhos algumas pessoas começaram a
de entrega. chamá-lo para produzir vi-
deoclipes de bandas locais.
O gosto pela música e por Mas nem só do som e da pro-
esportes sempre esteve pre- dução deu para se sustentar.
sente desde que Eduardo Enquanto fazia as produções,
era criança. Aos quinze anos ele também dava aulas nas es-
cursava percussão na es- colas e estudava à noite, além
cola e logo começou a dar de realizar outros trabalhos
aulas do instrumento em outras temporários, já que morava
instituições da região. sozinho desde os dezesseis anos.

“Eu nem sei quando O dinheiro também significava


realmente comecei a tocar.
Minha mãe brinca e sempre liberdade e investimento em
mostra uma foto minha novos projetos. Por isso, ele
batendo nas panelas dela
com dois anos.” começou a fazer entregas por
meio de aplicativos de delivery.
Eduardo cresceu e não só con- Seu trabalho, que antes era nas
tinuou na música, como tam- periferias, agora se concentra
bém se formou em fotogra- no centro expandido de São
fia. As produções de eventos Paulo, entre Paulista, Itaim Bibi
deram espaço para ele em e Faria Lima.
uma web rádio do bairro, a

33
Prato Firmeza Preto

A rotina começa às 5h da conta. Os aplicativos usados


manhã e termina perto da a trabalho são utilizados para
meia-noite quando a sua meta pedidos para o seu consumo no
diária é atingida. Quando máximo quatro vezes por ano.
percebe que o fluxo de entre-
gas está bom na madrugada, Ao mesmo tempo em que
é certeza que irá virar a noi- quitou e conseguiu sua casa
te trabalhando. Em dias as- própria, esse corre também co-
sim, só volta para casa às 15h, locou a sua vida em risco, não
descansa e retorna ao trabalho apenas no trânsito, mas ao
no horário do jantar, por volta deixá-lo mais exposto ao coro-
das 18h. navírus, que contraiu em março
de 2020. Até o fim de seu isola-
A comida está tão perto e mento, quem segurou as pontas
ao mesmo tempo tão longe. foram familiares e amigos, que
A quantidade que ele pre- o ajudaram com cesta básicas
cisa entregar por dia dita e outros mantimentos.
um ritmo que não permite
paradas para que consiga Estar vivo já é a principal
fazer as suas três refeições: conquista do ano de Eduardo.
café, almoço e jantar. “A única Mas não é só o vírus que o co-
coisa que consigo fazer mes- loca em risco:
mo é almoçar. Para o resto
do dia levo fruta e bolacha”,

34
Quem faz o corre

“O caso de racismo sofrido pelo entregador Matheus Pires


(cujo vídeo se espalhou pelas redes sociais em agosto) é o
exemplo do que um entregador sofre pelo menos uma vez por
dia. Esse tipo de humilhação, filmada ou não, acontecia antes
mesmo da pandemia. Já vi amigos meus levando tapa na cara
de cliente.”

Depois das entregas, preconceitos e perrengues, no final do dia ele


só deseja uma boa lasanha com salada, seu prato preferido, ou um
passeio com seus três filhos, Jennifer, Bryan e Isaac, para Campos
do Jordão, lugar que guarda boas lembranças da família e amigos.
Os corres pelo centro se tornaram a grana fixa para conseguir fazer
o trabalho que gosta na região em que nasceu e cresceu. Enquanto
isso, é o “nós por nós” que segura Eduardo e outros entregadores.

Foto: Acervo pessoal

35
Prato Firmeza Preto

QUEM É ESSA
SENHORITA
QUE É CAPAZ
DE FAZER TUDO?
ALINE OS
Por Camila da Silva, da Énois

COLETIVO DE MULHERES
ENTREGADORAS POSSIBILITA INDEPENDÊNCIA
FINANCEIRA POR MEIO DA BICICLETA

Aline Os, 44 anos, é fundadora do Señoritas Courier pensado


para entregadoras mulheres e LGBTQIA+. Ativo des-
de setembro de 2018, o coletivo de entregas é formado por
mais de cinquenta colaboradoras, que fazem entregas de
bicicleta por São Paulo. Nascida na Vila Maria Zélia, região

36
Quem faz o corre

industrial da zona Leste, e equivalente e a carga de tra-


criada em Sorocaba, inte- balho a sobrecarregava. Então,
rior de São Paulo, Aline perce- aos 23, ela decidiu que volta-
beu aos dezessete anos que o ria a estudar para entrar na
trabalho era o ponto principal faculdade de artes plásticas.
para seu o futuro.
Depois de um ano com bolsa
Mesmo com a necessidade de em um curso pré-vestibular,
começar a trabalhar depois do Aline passou na Universidade
Ensino Médio, ela ainda guar- de São Paulo, para a felici-
dava a vontade de ser artista dade do pai, técnico contábil
plástica. Começou a trabalhar e natural de Maceió. Hoje ela
informalmente como babá e é formada em artes plásticas
conseguiu seu primeiro em- e também mestre em poéticas
prego de carteira assinada em visuais na mesma universidade.
uma empresa de fast-food, onde Depois de estagiar na Pinaco-
foi promovida de atendente teca e de trabalhar em alguns
a gerente. estúdios como assistente de fo-
tografia, ela começou a ser pro-
“Eu pensava assim: se não
posso fazer faculdade fessora universitária e lecionou
agora, pelo menos vou até 2017.
ter uma carreira.”

Mesmo com as posições atin- Já com alguma estabilidade


gidas, o salário ainda não era financeira, Aline conseguiu re-

37
Prato Firmeza Preto

alizar alguns sonhos, como o entregas davam um “bom” di-


de viajar pela América Latina, nheiro. Com a resposta de que
e isso a fez pensar na possibi- ele conseguia tirar um salário
lidade da bicicleta na cidade. mínimo, ela saiu à procura de
Foi em Bogotá, na Colômbia, empresas que contratassem en-
após uma imersão andando tregadoras, as ‘bikers’. “A gente
de bicicleta, que ela perce- até contrata, mas as mulheres
beu que nunca tinha anda- geralmente não aguentam
do nem conhecido São Paulo muito tempo” foi a devolutiva
daquela forma. Um ano de- de uma das empresas, que a
pois, em 2014, nasceu o Selim deixou “com sangue nos olhos”,
Cultural (@selim_cultural), pro- como ela mesma diz. Depois do
jeto idealizado por ela e outros teste, sendo a primeira a con-
parceiros, que realiza passeios cluir a rota, ela integrou com
culturais de bicicleta pela mais quatro bikers o grupo de
capital paulista. 144 entregadores.

O que era passeio virou tra- Entre aulas e entregas, Aline


balho depois de um processo conseguiu se manter por mais
de separação e também da de um ano, até que as brinca-
necessidade de ter uma renda deiras machitas e homofóbi-
extra. Após uma sessão de tera- cas começaram a cansá-la.
pia, descendo a rua, ela viu um “O Señoritas surgiu de eu ver
entregador e perguntou se as o tanto que esse trabalho já

38
Quem faz o corre

era desvalorizado, que exer- “Hoje o meu desejo é que


gavam as entregadoras com a gente faça cada vez
mais a mente de trabalho
desprezo. Eu não queria que cooperado. Eu acredito em
fosse assim, pensando nele um negócio que não se ba-
seia somente numa relação
como uma renda extra e não de patrão e empregado, mas
como um ganha pão”, afirma. A que valoriza o trabalho e
principalmente quem está
ideia do coletivo também surgiu
fazendo esse trabalho.”
depois de perceber que mães
solo e outras mulheres que di-
O nome Señoritas Courier, é da
videm trabalho com diferentes
sua relação e trabalho com a
afazeres dificilmente conse-
arte. “Señoritas” vem da ligação
guem encontrar um trabalho
com a cultura espanhola e lati-
fixo com horários flexíveis para
no-americana. Já “Courier” faz
ter independência financeira.
referência a mensageiros e
O serviço de entrega da rede
correios espanhóis. “Eu enxergo
é desenvolvido com horários
as Señoritas, as bikers com essa
preestabelecidos com os cli-
potência, o que representa essa
entes e, depois, ajustado com
senhorita, a pessoa que é ca-
alguma das colaboradoras,
paz de fazer tudo”, finaliza.
que já têm suas próprias bici-
cletas. Tanto os clientes quanto
quem quer participar do coletivo
pode entrar em contato pelas Foto: Acervo pessoal

redes sociais. @senoritas_courier

39
RESGATE E ANCESTRALIDADE
Para desfrutar e aprender

Cozinhar é um ato político. De revolução e resistência. Para quem


é preto, é resgatar a ancestralidade e se reencontrar cultural-
mente. É não deixar uma tradição morrer. Em São Paulo, muitos
empreendedores negros encontraram na culinária essa base
de existência.

Seja na decoração dos restaurantes, que promovem uma recepção


calorosa e uma imersão à cultura africana, como no caso do Mama
África Labonne Bouffe, ou no resgate da identidade negra nos pra-
tos, como o Areté Comedoria.

No sabor inconfundível e potente da Chermoula Cultura Culinária,


que tem como protagonistas os pratos Gumbo e Jambalaya, ou nos
métodos de cozimento e temperos no Baobá Comedoria, que traz
Cabo Verde e Moçambique para dentro do prato.

Aqui neste capítulo, você faz um mergulho nessas culturas, cores,


sabores e fazeres e mais do que isso: assimila como se posicionar no
mercado carregando essa an-
cestralidade é um importante
ato de resistência. Foi assim
com a Cozinha Omi Odara,
que junta sabor e consciên-
cia política desde 2015. Pratos
que “furaram a bolha” e são
referências em ambientes pre-
dominantemente brancos. Vire
a página e “sinta com os olhos”
o aroma dos pratos e a força
dos negócios a seguir.

Jamile Santana
Prato Firmeza Preto

O PF PRETO E INDÍGENA
SERVIDO COM REQUINTE

ARETÉ COMEDORIA
Por Weslley Galzo, da Agência Mural

ARETÉ COMEDORIA GARANTE PRATO FEITO


ARRUMADINHO NA ZONA LESTE DE SÃO PAULO

Pequeno e aconchegante, o restaurante Areté Comedoria está


localizado em uma das principais avenidas de São Miguel Paulis-
ta, na zona Leste de São Paulo, com a proposta de oferecer uma
“comidinha caseira feita com carinho. Um prato feito, mas com um
visual diferenciado”.

42
Resgate e ancestralidade

Inaugurado em 30 de setembro ne e muçarela derretida, que


de 2017, é um empreendimen- dão liga.
to familiar com forte apelo aos
traços culturais da negritude, Os pratos principais são acom-
observáveis na decoração do panhados por arroz soltinho e
espaço, com namoradeiras feijão bem temperado. Todos
negras enfeitando o ambi- com gosto de comida casei-
ente, e na figura da dona ra, cuidadosamente organiza-
e das garçonetes que cos- dos para garantir uma bela
tumam utilizar turbantes ao apresentação. Porque comida
servirem os clientes. feita em casa também tem
requinte, como diz o slogan do
O filé de merluza com mol- restaurante: “Seu prato feito
ho de maracujá é o destaque arrumadinho” – e isso a Areté
da casa. O peixe vem em- garante em opções como o
panado e a carne crocan- filé mignon recheado, o filé de
te se desmancha na boca. O pernil e a tradicional feijoada
molho levemente apimentado de quarta-feira.
dá acidez e suculência ao pra-
to. Para os vegetarianos, a Os três anos de operação
Areté oferece um ratatouille bem-sucedidos são fruto do
com abobrinhas, berinjelas e esforço e da inventividade da
pimentões cobertos por cama- ex-professora de história e as-
das de queijo branco, provolo- sistente social Ivone Ferreira da

43
Prato Firmeza Preto

Silva, 59 anos, que nunca havia


pensado em empreender. Todos
os seus anos de trabalho foram
dedicados ao funcionalismo
público. Em 2017, desfrutava
da aposentadoria dos sonhos
e vivia “tranquila fazendo cro-
chês, tricôs e caminhadas”. Mas
num chamado surge a ideia de do pôr do sol “seduziu” Ivone.
abrir um restaurante. Iluminados pelo sol de fim
de tarde, ela e o marido se
Primeira de uma família negra apressaram em pensar em
e numerosa de São Miguel Pau- um nome para o restauran-
lista a cursar o ensino superior, te. Começaram então as bus-
Ivone relutou em criar um em- cas por nomes indígenas para
preendimento, mesmo paque- batizar o lugar. Após algumas
rando um ponto disponível horas de pesquisa chegaram a
para aluguel. “Areté”, que significa “um dia
festivo e alegre”.
Inicialmente, uma amiga co-
municou a intenção de passar Segundo Ivone, festas são um
o ponto em que tinha um bar. traço forte da família. Antes da
Durante uma visita ao esta- pandemia do coronavírus, eram
belecimento, a luz penetrante

44
Resgate e ancestralidade

realizadas rodas de samba na Ivone, que se dizia “sem tino


noite da primeira sexta-feira de para o comércio”, tomou gos-
cada mês no local. to pela gestão do restaurante,
que vem ganhando visibilidade
“Seria muito comum as no bairro, além de se man-
pessoas esperarem um nome
ter estável “resistindo nesta
africano, por conta da nossa
ancestralidade mais visível, pandemia que enfrentamos”,
mas a gente também tem diz. Apesar de uma equipe
uma história indígena.
Embora menos expressiva do pequena, composta por ela,
que a ascendência africana. o irmão Marcelo, cozinheiro
A gente também pensou na
história do bairro.” de mão cheia, e a garçonete

45
Prato Firmeza Preto

Letícia, a Areté manteve a O ambiente plural construído


operação e expandiu o delivery. pela mistura cultural, somado
à comida saborosa, agradam a
Ao narrar o trabalho que hoje clientela.
desempenha com tanto amor,
ela enfatiza que “a culinária “Atendemos o médico
e o peão de obra, e tem
é treta”. “Se a gente pegar a que caber todo mundo.
história desse país, quem sem- Acho que a nossa imagem
promove esse trânsito.”
pre executou os afazeres de ali-
mentação é a figura da mulher
preta, mesmo que no serviço
doméstico ao alimentar o ou-
tro”, conta a empresária que
exalta a ancestralidade na con-
dução dos negócios.

Inspirada pela negritude ances-


tral da família, Ivone constrói a
identidade visual de sua marca
com influências do povo preto
e indígena, enquanto o irmão
desenvolve o resgate da identi-
dade negra nos pratos.

46
Resgate e ancestralidade

SERVIÇO
Avenida Pires do Rio, 175A,
São Miguel

(11) 2667-7001

R$ 22,00

Cartões de débito, crédito e VR


(Alelo, VR e Sodexo)

Segunda a sábado,
das 9h às 18h

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@aretecomedoria

/aretecomedoria

Sim

Entregas em um raio de 3km


com entregador próprio

Fotos: Anna Beatriz Ferreira

47
Prato Firmeza Preto

DA HISTÓRIA
À GASTRONOMIA
CHERMOULA CULTURA CULINÁRIA
Por Camila da Silva, da Énois

ALINE CHERMOULA REÚNE ANCESTRALIDADE


E PESQUISA NA PRODUÇÃO DE SUAS RECEITAS

Uma viagem entre o sertão baiano, o continente africano e Nova Or-


leans, no Sul dos Estados Unidos. É desse intercâmbio que surgem
dois dos pratos mais queridos da Chermoula Cultura Culinária:
o gumbo e o jambalaya. Mulher negra, baiana e sertaneja, como
se descreve, Aline de Araújo Amorim Souza, 36 anos, hoje tem sua
própria marca, que conecta pesquisa ao desenvolvimento de pratos

48
Resgate e ancestralidade

que resgatam saberes africanos alimentos, já que é uma grande


e sertanejos na cozinha. mistura de ingredientes”, cita
Aline. Naquela época, em
O gumbo é um cozido que leva uma Europa medieval, o cozi-
carne de porco, frango, camarão do, a sopa, era muito presente,
e várias especiarias, como pi- então houve uma assimilação.
menta caiena e cravo. Um pra- No continente africano preva-
to super aromático e saboroso. leciam os assados, com o fogão
Entre seus ingredientes ainda a lenha, que sempre esteve
temos o quiabo, que é um dos muito presente, assim como
mais africanos, da Etiópia. Isso vemos ainda hoje em várias
não quer dizer que ele sempre regiões dos sertões no Norte e
foi muito consumido em alguns Nordeste do Brasil. O cozido
países do continente, mas sim surgiu depois por conta da
que, depois da colonização e de menor reserva de alimentos.
intercâmbios culturais, passou a
ser destaque em muitos pratos. Essas informações e ancestra-
lidade estudadas pela chef
“O cozido é um prato emble- Aline nasceram em 2002,
mático das diversas cultu- quando ela começou a estu-
ras e regiões que receberam dar história na Universidade
africanos como escravos. Isso de São Paulo. Se descobrir ne-
remete a essa explicação de gra, entre a adolescência e a
fusão de culturas e a escassez de fase adulta, foi o decolar para

49
Prato Firmeza Preto

querer entender de onde veio e, A legitimidade padrão pedida


para além disso, construir uma nesses estudos científicos, por
base científica para o futuro da vezes, excluem estudos da cul-
população preta. tura alimentar e produção de
conhecimento gastronômico de
“Eu quero contribuir para outras culturas. Aline começou
deixar um legado.
Na gastronomia temos a produzir essas pesquisas. Do
poucos registros históricos. azeite de dendê ao o gum-
Pra gente acaba ficando
resquícios de informação.” bo, estudou dobrado para
criar novas referências que

50
Resgate e ancestralidade

compartilha criando conteú-


do para as redes sociais, com
o podcast “A culinária da
diáspora africana pelas Améri-
cas” e no seu trabalho como
apresentadora no Rango TV,
um canal culinário on-line.

Por esses meios, ela também fi-


cou muito conhecida por ensinar Além da criação de pratos e
o jambalaya. Espécie de paella, receitas, a pesquisadora e chef
típica de Nova Orleans, com lembra que técnicas culinárias
influências africanas, espanho- também foram produzidas pela
las e ameríndias, é feito com população, como o uso do pilão.
camarão, alho-poró, pimentão,
alecrim, arroz e frango. Um “O pilão é visto como um
instrumento de cozinha,
prato que deixa a sua marca
como uma faca, um batedor
por onde passa, daqueles que de ovos. Mas na verdade,
você para e pergunta: “Nossa, o pilão é uma técnica
culinária, porque
mas o que tem nessa receita?”. transforma o alimento.”
Assim como o gumbo, ele é mui-
to aromático e tem um sabor Para tirar “leite de pedra” e es-
forte e picante. tudar essas histórias se tornan-

51
Prato Firmeza Preto

do chef, o caminho de Aline Aline também já foi professora


começou na necessidade de universitária e chef em vários
ter um trabalho. Ela conta que restaurantes. Além dos pratos,
diferente de muitos colegas de a Chermoula tem uma linha de
faculdade, que começaram a azeites aromatizados, molhos
cozinhar cedo por influência e também trabalha com even-
dos pais, ela iniciou na cozinha tos, coquetéis e jantares corpo-
para ajudar a mãe. Não saber rativos. A lista é grande, né?
cozinhar não era uma opção. Depois dessas raízes construí-
das em mais de catorze anos
Depois de um tempo com os es- de trabalho, Aline sonha em
tudos em história percebeu que romper os limites de território e
queria ser tornar chef e deixou ser referência na pesquisa an-
o curso logo após conseguir uma cestral pelo continente base de
bolsa integral pelo ProUni. As seu trabalho.
vivências majoritariamente com
cozinha europeia que teve nesse
período potencializaram ainda
mais a vontade de romper com
essa fronteira.

A criação da Chermoula Cul-


tura Culinária aconteceu em
2006. Antes desse período,

52
Resgate e ancestralidade

SERVIÇO
Rua Monsenhor de Andrade, 25,
Brás

(11) 95144-4845

R$ 35,00

Cartões de débito, crédito, boleto


e transferência bancária

Segunda a sábado,
das 9h às 18h

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@alinechermoulaoficial
@rangotv_oficial

/chermoulaculinaria

chermoula.com.br

Pedidos por WhatsApp, e-mail,


site e redes sociais. Encomendas
feitas até terça-feira são
entregues na mesma semana.
Após esse dia, serão entregues
na próxima semana.

Fotos: Camila da Silva/Piter Valverde/


Revista Claudia/Acervo pessoal de
Aline Amorim

53
Prato Firmeza Preto

RESSIGNIFICANDO
A ANCESTRALIDADE
AFRO COM SABORES
BAOBÁ COMEDORIA
Por Wallace Morais, do Vozes das Periferias

GERÔNIMO APOSTA NOS PRATOS


ORIGINÁRIOS PARA VALORIZAR A ÁFRICA
COMO REFERÊNCIA GASTRONÔMICA

Trazer sabores, temperos e texturas que remetem à culinária orig-


inária do continente africano é o objetivo do Baobá Comedoria,
negócio especializado em pratos da gastronomia afro. Idealizado por
Gerônimo Vinicius, de 27 anos, morador do bairro de Sapopemba,

54
Resgate e ancestralidade

na zona Leste de São Paulo, o


empreendimento não possui es-
paço físico e se apresenta em
feiras gastronômicas, eventos
culinários e também por meio
de delivery para interessados
em conhecer os sabores que
o Baobá traz em seu cardápio.

sa mucapata, um acompanha-
Um exemplo é a cachupa, prato
mento comum em Moçambique,
originário da culinária de Cabo
que leva arroz e feijão sem pele
Verde, composto de carnes
cozidos no leite de coco.
como contrafilé e linguiça,
além de repolho e mandioca.
Com auxílio de amigos
Seu preparo se inicia mari-
e familiares, o Baobá começou
nando as carnes e os legumes
a ganhar espaço em feiras de
em um caldo de feijão sabo-
rua, eventos gastronômicos
roso. No dia seguinte, leva-se
e ocupações mensais ofertan-
todos ingredientes ao cozimento,
do sabores diferentes aos
unindo temperos e os sabores
consumidores. Gerônimo encon-
de seus componentes.
tra em sua iniciativa gastronômi-
ca a promoção de suas ideias,
Em combinação com a cachu-
como a inclusão da culinária
pa, o Baobá oferece a cremo-

55
Prato Firmeza Preto

africana no cenário popular. amente do eixo europeu,


“A gastronomia ainda é vis- asiático e árabe. Essa é mais
ta como algo majoritari- uma das várias formas de

56
Resgate e ancestralidade

ressignificar e valorizar nos-


sa ancestralidade, mostrando
os sabores típicos de nossa
terra mãe.”

No cardápio temos também


o egusi com frango assado e
fufu - massa feita de farinha
de arroz. Prato tradicional da
Nigéria e comum em diversos de luta social. Oriundo de um
países do oeste africano, o egu- trabalho acadêmico de seu
si é uma pasta produzida com idealizador, o Baobá conceitua
sementes de melão, camarão e todos os pratos por meio de sua
repolho, que ganha certa picân- origem histórica, identidade
cia com a presença do azeite territorial e composição de in-
de dendê e pimenta. O frango, gredientes, contribuindo para
crocante por fora e macio por a participação da gastronômia
dentro, soma com a textura de na conscientização coletiva
purê do fufu. dos movimentos negros por
meio da culinária, cultura,
Em atividade desde 2018, moda, literatura e música.
o negócio utiliza a degustação
como ferramenta educacional Mesmo com diversos desafios,
e de imersão no contexto Gerônimo e o Baobá continuam

57
Prato Firmeza Preto

levando seus pratos aos clientes. É ele mesmo que recebe as en-
comendas, prepara e entrega as refeições, percorrendo diversos
locais e difundindo seus ideais por meio da culinária.

58
Resgate e ancestralidade

SERVIÇO
Sapopemba

(11) 96565-1086

R$ 30,00

Cartões de débito e crédito

Pedidos sob encomenda

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@baobacomedoria

/baobacomedoria

Os pedidos devem ser


realizados até quinta-feira.
O próprio Gerônimo faz
as entregas aos domingos.

Fotos: Wallace Morais de Souza/


Acervo pessoal de Gerônimo Vinícius

59
Prato Firmeza Preto

DA PORTA PRA DENTRO, É ÁFRICA!


MAMA ÁFRICA LABONNE BOUFFE
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

COM ESPAÇO ACOLHEDOR E MULTICULTURAL,


O MAMA ÁFRICA LABONNE BOUFFE É UM PEDAÇO
DO CONTINENTE AFRICANO EM SÃO PAULO

Fotos, máscaras, cordas de sisal, paredes cheias de estampas


e a recepção calorosa do chef Sam, persona de Felix Rafferty, 49
anos, destacam a ancestralidade representada no Mama África
Labonne Bouffe, localizado no Tatuapé, zona Leste. Camaronês,
ele acredita que comer bem e conhecer a cultura de seu lugar de

60
Resgate e ancestralidade

origem andam de mãos da- Sempre ia a restaurantes, mas


das. Primeiro, tentei pedir por sentia falta do sabor de casa,
delivery, como em todo o res- então resolveu que o jeito se-
to do guia, mas o chef poli- ria abrir seu próprio negócio.
glota me explicou que ir até Engenheiro eletrônico de for-
o restaurante era necessário e mação, ele iria apenas admi-
que a experiência ali é única. nistrar, mas descobriu que o seu
Fui convencida. lugar era dentro da cozinha.
Ele e Andreia Jacynto, sua es-
“A comida para mim é uma posa de 42 anos, cuidam juntos
maneira de falar de minha
cultura, de apresentar a gas- do empreendimento.
tronomia africana. Da porta
pra dentro quero que você
se sinta em África, da porta Lá, comi o ndolé, um dos pra-
pra fora, Brasil e, ao mesmo tos tradicionais de Camarões,
tempo, quero que se sinta
feito com fufu, acompanha-
em casa.”
do de boldo-do-chile cozido,
Chef Sam saiu de Camarões, amendoim, banana-da-terra e
passou por muitos países da camarão. O fufu é uma mas-
África, por Buenos Aires e tam- sa de milho que lembra uma
bém por algumas cidades bra- polenta e tem aquele sabor
sileiras, até decidir que faria de de fubá de fundo. O proces-
São Paulo um lar. A cozinha foi so de preparo do boldo retira
um sonho que o chef começou o amargor, deixando ape-
a cultivar na América do Sul. nas uma sensação agridoce,

61
Prato Firmeza Preto

acentuada pela presença do doce e traz um toque refres-


amendoim e da banana. O cante e relaxante. Percebi que
chef recomenda primeiro ex- a maioria dos pratos é leve,
perimentar cada elemento do com ingredientes selecionados
prato separadamente, para cuidadosamente e diversidade
apreciá-los em sua unicidade, e de sabores. Um prato de ori-
só depois comê-los juntos para gem africana não precisa
sentir as diferentes texturas. necessariamente ser pesado
ou apimentado.
Para acompanhar, um suco
de hibisco, que não é muito Há um cardápio grande e vari-
ado, mas outra dica é pedir um
prato inédito. Dá para chegar
no restaurante e falar que o
chef pode escolher o menu, e
ele irá criar um prato todinho
pensando em você.

“Às vezes passo a noite


pensando em combinações.
Chega o dia seguinte
e eu faço o prato. Muitos
eu nem sei o nome, mas faço
para as pessoas que
pedem algo novo.”

62
Resgate e ancestralidade

63
Prato Firmeza Preto

Desde o começo me senti acolhida pelo papo, pela comida


personalizada e pelo espaço.

Ao me fazer o convite, o chef Sam estava certo: colar ali é uma experiên-
cia gastronômica e cultural que precisa ser feita pelo menos uma vez na
vida. Até rola pedir por delivery, mas garanto que não é a mesma coi-
sa. Vale a pena demais trocar uma ideia sobre a formação dos pratos
e escutar suas histórias. Do francês, o nome traduzido como “Mãe Áfri-
ca do rango bom”, não poderia ser melhor para batizar o restaurante:
o que acontece lá dentro é a mais pura celebração da nossa casa.

64
Resgate e ancestralidade

SERVIÇO
Rua Cantagalo, 230, Tatuapé

(11) 97047-4949

(11) 3582-7438

R$ 50,00 a R$ 90,00

Cartões de débito e crédito

Terça a sábado, das 11h30


às 22h; domingos e feriados,
das 12h às 16h

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@mamaafrica_labonnebouffe

/mamaafricalabonnebouffoficial

mamaafricalabonnebouffe.com.br

ccontatomamaafrica@
mamaafricalabonnebouffe.com.br

Disponível no iFood

Sim

Fotos: Gabrielly Oliveira/Acervo


pessoal de Felix Rafferty

65
Prato Firmeza Preto

ACARAJÉS
ACARAJÉS
Acarajé, um agrado culinário

Quando ouço falar em acarajé, logo me vem à cabeça uma ima-


gem do centro histórico de Salvador, as baianas e suas saias bran-
cas rodadas, preparando o quitute, com um sorriso no rosto. Mas
neste capítulo vimos que a força desse prato vai muito além do seu
poder comercial.

As baianas que preparam o acarajé são, inclusive, as primeiras


referências de profissão feminina que temos no Brasil. Com raízes
nos terreiros de candomblé, o prato deve ser feito com entrega, como
mostra a dona Iracy Santos, do Cozinha das Pretas. Ela cozinhava a
iguaria para presentear familiares e amigos, mas o prato acabou se
tornando empreendimento.

Respeitar cada passo a ser seguido na receita do acarajé também


norteou o trabalho do Akará Delivery. Preparado pelas mãos de uma
candomblecista - exatamente como deve ser - é feito para fortalecer
a história e a cultura afro-brasileira.

66
Essa mesma cultura inspirou a
Kitanda das Minas. Imagine só
que a forma como as quitan-
deiras angolanas se organiza-
vam no comércio serviu de base
para um modelo de negócio na
periferia de São Paulo. Sorte a
nossa, que temos várias opções
para trazer a Bahia, a cultu-
ra afro e o poder do acarajé
para dentro de casa, como
propõe o Akara Refeições e
todos os demais negócios desta
editoria apimentada!

Jamile Santana

67
Prato Firmeza Preto

O TABULEIRO
DA ZONA LESTE
AKARA REFEIÇÕES
Por Peterson Prates, do Vozes das Periferias

A DUPLA JANA E GERLAIDE RECORREU


AOS ANTEPASSADOS PARA EMPREENDER
DURANTE A PANDEMIA E ESPALHAR
A CULTURA DO AXÉ PELO JARDIM SÃO JOSÉ

Os baianos e os fãs da cozinha afro-brasileira que vivem na zona


Leste já sabem como se deliciar com uma das mais populares
especialidades da cultura nacional. Sem sair de casa, é possível
receber uma megabarca de acarajé fresca e quentinha para uma ex-

68
Acarajés

periência para lá de arretada.


Com raiz nos terreiros de can-
domblé, o acarajé se tornou
um meio de sobrevivência para
muitas famílias de santo. Além
do seu significado e importân-
cia dentro das obrigações reli-
giosas para as filhas de Oyá,
o potencial comercial do pra-
to, que antes possibilitava às todo o seu FGTS na Akara Re-
mulheres escravizadas a com- feições, um negócio que une
pra de alforria, hoje entre- desde julho de 2020 identidade
ga independência financeira religiosa e preservação cultural.
a tantas outras.
Gerlaide fala com alegria que
A professora de geografia Jana as duas aprenderam tudo no
Souza, 33 anos, sabe bem de terreiro de candomblé e que a
tudo isso. Com o desemprego culinária é um dos elementos
e o avanço da crise econômica da cultura do axé.
potencializada pela pandemia
“A gente pegou o sabor do
do coronavírus, ela uniu forças terreiro, da ancestralidade e
com a cunhada Gerlaide Silva aproveitou a oportunidade
de crescer financeiramente.”
de Azevedo, 28 anos, e recorreu
aos antepassados para investir

69
Prato Firmeza Preto

É possível escolher a opção


no prato ou na barca, que,
além dos tradicionais bolinhos
de acarajé, incluem porções
caprichadas de abará, vata-
pá, caruru, vinagrete e muito
camarão. Os tons alaranjados
do prato são graças ao azeite
de dendê, óleo essencial na cu- caruru é a quiabada mais fa-
linária baiana, fruto de uma mosa das festas de Cosme e
palmeira de origem africana. Damião. A verdadeira experiên-
cia do acarajé baiano acon-
O abará, bolinho amare- tece com a junção do bolinho
lo similar a uma pamonha, recheado com esses acom-
é feito com a mesma massa panhamentos sagrados da cu-
de feijão-fradinho do acarajé, linária candomblecista.
embrulhada na folha da bana-
neira e cozida no vapor, em vez A disposição dos alimentos na
de frita no dendê. barca possibilita que cada um
da família monte o seu próprio
O vatapá é uma massa que acarajé. A pimenta, que vem
leva amendoim, castanha de à parte, dá o toque especial,
caju, gengibre e pimenta, e o fazendo da refeição um pra-

70
Acarajés

to ainda mais “quente”, como tam com carinho a cliente-


dizem na Bahia. la, enviando em cada pedido
uma mensagem de boas-vin-
Como se a boa comida não das à experiência ofereci-
bastasse, as criadoras da Aka- da. Jana e Gerlaide afirmam
ra valorizam o afeto e tra- que o novo empreendimen-

71
Prato Firmeza Preto

to não veio para teste, mas sim para ficar e mostrar a potência
da gastronomia e cultura pela região.

Mais do que um prato típico das regiões com maior população negra no
país, o acarajé continua sendo símbolo de resistência e protagonismo
das mulheres pretas pelo Brasil. Para quem só conhece o “tabuleiro da
baiana” pelas canções de Dorival Caymmi, a Akara Refeições
é a oportunidade de experimentar a energia, o sabor e a cultura
de um prato que é um misto de memória, afeto, religiosidade e
identidade ancestral.

72
Acarajés

SERVIÇO
Rua Ana Santesso, 117,
Jardim São José

(11) 97130-1740

R$ 15,00 a R$ 30,00

Cartões de débito e crédito

Quarta a domingo, das 15h às 22h

@akararefeicoes

/Akararefeicoes

Pedidos pelo WhatsApp, redes


sociais ou aplicativos. Retirada
no local e entregas em um raio
de até 7km | Disponível no iFood
e Uber Eats

Fotos: Peterson Prates/Acervo


pessoal de Jana Souza

73
Prato Firmeza Preto

UM POUCO DA
BAHIA DENTRO
DE CASA
COZINHA DAS PRETAS
Por Camila Lima, da Periferia em Movimento

O AGRADO CULINÁRIO QUE SÓ PARENTES


E AMIGOS TINHAM ACESSO VIROU NEGÓCIO.
AGORA, QUALQUER PESSOA NO GRAJAÚ PODE
SABOREAR O TEMPERO DA COZINHEIRA IRACY

Era para ser um presente. Virou um empreendimento. Em meio ao


desejo dos amigos e a necessidade de ganhar dinheiro durante a
pandemia do coronavírus, dona Iracy Crispina Santos, 49 anos, trouxe
da Bahia a receita certa para apimentar as mesas paulistanas a par-

74
Acarajés

tir do Grajaú, na zona Sul da


cidade: o acarajé.

A ideia do negócio começou


a germinar em 2018, quando
dona Iracy visitou os pais na ter-
ra natal. De volta a São Paulo,
não pôde trazer lembrancinhas
típicas do estado para todos os
familiares e amigos. Então, fez
a “noite do acarajé”, um evento
para que todos e todas de al-
guma forma pudessem se sentir
acolhidos e queridos — e para pre tinha um amigo ou outro
que as novidades sobre a Bahia comentando que estava com
fossem atualizadas. vontade de comer o acarajé e
pedindo para refazer a “noite
“Antes de morar em São do acarajé”, comenta Ariadne
Paulo, eu era vendedora de
acarajé na Bahia e já tinha Carolina Santos, filha.
muita experiência em fazer
e vender o alimento.”
Foi a jovem de 25 anos quem
teve a ideia de transformar a
O evento ganhou prestígio
cozinha afetiva em fonte de
entre os mais chegados. “Sem-
renda para a família. Iracy re-

75
Prato Firmeza Preto

sistiu de início, já que tinha mui- nho também é planejada du-


to trabalho como cozinheira em rante o finalzinho da semana e
uma creche municipal de São reservada para o sábado.”
Paulo. Mas, com a pandemia
que impactou a vida de to- Checklist completo, agora é
dos, a decisão dela também se só aguardar os pedidos para
transformou: com a paralisação fritar e acrescentar o recheio.
das aulas e bunscando dar um Dona Iracy salienta:
gás na renda da casa, mãe e
filha iniciaram o Cozinha das “A intenção é que
o cliente receba em
Pretas em julho de 2020. sua casa o alimento mais
fresco e quentinho.”
As entregas são realizadas
aos sábados e domingos, mas E não é que é verdade? A mas-
a feitura do quitute leva boa sa é extremamente crocante e
parte da semana. Na quin- sequinha, feita na hora e mer-
ta-feira, elas começam a hi- gulhada em dendê fresquinho,
gienizar a cozinha e a organi- o que adiciona um cheiro ma-
zar o espaço para preparar o ravilhoso e instiga ainda mais a
prato em grandes quantidades. nossa fome.
Em paralelo, vão às compras.
Ariadne explica que “na sex- Para atender o público ve-
ta, a quiabada é preparada. getariano, a massa do acarajé
A base da massa do boli- é preparada sem a adição de

76
Acarajés

frutos do mar, alterando dessa com cebola, alho, sal e dendê.


forma a receita original. Porém, A montagem do recheio tam-
a mudança não perde em nada bém se atenta aos vegetaria-
em se tratando de sabor e tex- nos, pois pode ser com ou sem
tura. O bolinho é temperado o camarão, adicionando-se a

77
Prato Firmeza Preto

quiabada, pimenta, vatapá equipe de entrega, feita apenas


e salada. O prato é entregue por mulheres. A ideia é amad-
com molho de pimenta à par- urecer a empreitada antes de
te, o chamado “molho quente” ampliar, até porque é impor-
da Bahia. tante preservar o diferencial:
entregas feitas com extremo
A Cozinha das Pretas tam- cuidado, em embalagens indi-
bém vende bolos caseiros como viduais, sacolinhas com a logo
opção de sobremesa — e de da Cozinha das Pretas e um
renda. O bolo de maçã, por recadinho feito à mão desejan-
exemplo, tem a assadeira unta- do uma ótima refeição. A es-
da com canela, açúcar e óleo, sência da ideia está garantida:
formando uma deliciosa cros- o acarajé de dona Iracy é mes-
ta crocante e adocicada. O de mo um presente.
milho é extremamente saboro-
so e acolhedor. Cada mordida
remete aos tempos de casinha
de interior. A massa é cremo-
sinha e derrete na boca.

Como o negócio até então é


recente, ele ainda não está
nos aplicativos de comida, mas
mãe e filha articulam a própria

78
Acarajés

SERVIÇO
Grajaú

(11) 94904-8152

R$ 20,00

Transferência bancária
(Nubank, Caixa Econômica
e Banco do Brasil)

Sábados e domingos,
das 15h às 20h

@cozinha_daspretas

Pedidos feitos pelo


WhatsApp. Os acarajés
podem ser pedidos na hora.
Bolos devem ser solicitados
com pelo menos um dia de
antecedência. As entregas
são realizadas na região do
Grajaú por entregadores
próprios. Taxa mínima
de R$ 3,00.

Fotos: Camila Lima/Acervo


pessoal de Ariadne Santos

79
Prato Firmeza Preto

AMOR E ANCESTRALIDADE
NA BRASILÂNDIA
AKARÁ DELIVERY
Por Priscila Reis, da Preto Império

O ACARAJÉ QUE TRAZ COR, ALEGRIA


E MOVIMENTO PARA A VIDA DE QUEM COME

O acarajé é um alimento com alma, dedicado ao orixá Oyá, feito


com todo amor e respeito. É dessa forma que Cinthia Oliveira do
Nascimento, 38 anos, fala sobre um dos produtos mais vendidos do
Akará Delivery, localizado na Vila Brasilândia, periferia da zona
Norte de São Paulo.

80
Acarajés

O acarajé de aparência e sa- cultura afro-brasileira”, expli-


bor impecável é feito com ca, enfatizando que o acarajé
o bolinho de feijão-fradinho, é, na verdade, um alimento
branquinho por dentro e doura- sagrado, capaz de transmitir
do por fora, resultado da fritu- toda boa intenção com que
ra no dendê. Quem come sente é preparado.
também a maciez e o sabor de
“Precede o preparo também,
cada ingrediente na medida um cuidado espiritual de
certa. Tudo isso acompanhado mente e coração. Queremos
transmitir às pessoas que
dos tradicionais vatapá, caruru, o acarajé, além de ser uma
vinagrete e camarão, mas com comida ancestral, é também
uma comida que transmite
o toque especial da idealizado-
muito axé e qualquer pessoa
ra e proprietária do negócio. pode comer e amar.”

Mulher preta e candomblecis- Amaro Santana da Silva Neto,


ta, formada em educação físi- 42 anos, é companheiro e sócio
ca, ela conta, de forma muito de Cinthia. Ele explica que para
respeitosa, sobre seu caso de o preparo do acarajé, antes
amor com o acarajé. “Eu não mesmo de iniciar as vendas e
quero só vender, mas promo- servir o público, é feito sem-
ver e fortalecer a história liga- pre um ritual, reverenciando
da a ele, que retrata a ances- e pedindo a benção dos ori-
tralidade de um povo, o amor xás. “Colocamos o primeiro aca-
e a alegria transmitidos pela rajé na rua para Exu, pois é o

81
Prato Firmeza Preto

primeiro que deve comer, sen-


tir-se agradado e abrir os camin-
hos. Depois, pedimos bençãos
à mãe Oyá, dona da bola de
fogo, para que as vendas sejam
boas”, explica.

Cinthia e Amaro não escondem


que temem que o racismo re-
ligioso diante das religiões de
matriz africana interfira, de al-
guma forma, nos negócios.

As primeiras vendas de aca- O Akará Delivery também


rajé começaram em 2018, mas oferece caldos, bolinhos de ba-
só eram feitas para alguns calhau e de camarão, além de
amigos e familiares. Por conta doces como cocadas e pingo
da pandemia do coronavírus, de rapadura.
que provocou o fechamento da
academia em que Cinthia dava O casal acredita que a popu-
aulas, ela viu uma oportuni- lação negra precisa se apoiar
dade para iniciar oficialmente e potencializar seus negócios.
o empreendimento e, com isso, Por isso, sempre procuram
complementar a renda. contratar, comprar produtos

82
Acarajés

e adquirir serviços de profis-


sionais negros.
SERVIÇO
Além disso, eles fazem questão
de ressaltar que o Akará Vila Brasilândia

Delivery tem o intuito de (11) 98634-9341


mostrar para os clientes que
R$ 15,00 a R$ 30,00
a cultura afro-brasileira é mui-
Cartões de débito, crédito
to rica e a comida, além de (a partir de R$ 60,00)
cores, traz alegria e dá movi- e transferência bancária

mento para a vida de quem a Quarta a domingo, das 17h


come. “Fazemos tudo isso por às 22h30

amor ao nosso povo e à nossa Opções ovolactovegetarianas


ancestralidade. Vale a pena nos caldos

sonhar, basta fazer com o @akara_delivery


coração, que as coisas aconte-
/akaradelivery
cem”, diz Cinthia.
Entregas em toda a Vila
Brasilândia, Freguesia
do Ó e região com
motoboy próprio.

Fotos: Priscila Reis/Acervo


pessoal de Cinthia Oliveira

83
Prato Firmeza Preto

UMA COMIDA
FEITA DE MEMÓRIAS
KITANDA DAS MINAS
Por Eduardo Silva, da Agência Mural

COM ACARAJÉ COMO CARRO-CHEFE DO


CARDÁPIO, O AFROBUFFET LIDERADO
POR PRISCILA NOVAES TRAZ CULINÁRIA
AFRO-BRASILEIRA COM TOQUE DE
EMPREENDEDORISMO FEMININO

“Seu pedido chegou! Com ele temos a intenção de levar sabor e


afeto aos seus momentos.” É assim que o delivery da Kitanda das
Minas chega até a casa dos clientes. Com um cardápio voltado

84
Acarajés

para a gastronomia afro-bra-


sileira, cada pedido vem com
uma mensagem personalizada.

“A gente sempre envia uma


mensagem e tenta transmitir
uma relação mais humanizada.
Seja um pedaço da história da
Kitanda ou a história das mu-
estética e a gastronomia afri-
lheres quitandeiras”, diz Priscila
cana e afro-brasileira.
Novaes, 36 anos, moradora de
Cidade Tiradentes, no extremo
As quitandeiras angolanas ser-
Leste de São Paulo, proprietária
viram de inspiração para que
e chef de cozinha do local.
Priscila entrasse na gastrono-
mia. Formada na área desde
O serviço de delivery é recen-
2011, ela sempre teve grande
te. Até os primeiros meses de
identificação com a forma
2020, antes da pandemia cau-
como essas mulheres se orga-
sada pelo coronavírus, a Kitan-
nizam no comércio e também
da atuava exclusivamente no
com o sabor das comidas típi-
estilo “afrobuffet” em eventos
cas africanas — sensação que
corporativos. O termo se re-
busca passar para os pratos
fere ao conceito de um buffet
que faz.
afrocentrado, que privilegia a

85
Prato Firmeza Preto

No cardápio, o carro-chefe é o “Em Salvador, ele é


tradicional acarajé, servido em comercializado em tabu-
leiros pelas ruas. Ganhou
porções na mão e no prato, in- esse nome por ser barato
dividuais ou com dez unidades. a ponto de ficar conhecido
entre os estudantes que não
Todas as opções, são entre- tinham muitos recursos para
gues separadamente, vatapá, gastar com a alimentação.”
caruru, salada de tomate verde
e camarão. Segundo a chef, ser uma mu-
lher negra e periférica é um de-
Outros pratos típicos, que safio em qualquer posição. Mas,
servem duas pessoas, são o para ela, ser uma mulher negra
bobó de camarão, a moqueca cozinheira também é ser her-
baiana e o baião de dois – este deira de um legado.
último com origem no sertão do
“É um saber ancestral que
Nordeste brasileiro.
ultrapassa os campos da
cozinha, pois eu enxergo que
De sobremesa, o cardápio ser- esse legado também está na
coletividade, no empreende-
ve, em porções de três unida- dorismo, na luta e na es-
des, cocadas nos sabores tradi- tratégia política.”
cional e cacau, mas a grande
revelação é o bolinho de estu- Priscila cita casos de mulheres
dante — em formato de kibe, que não encontram emprego
é feito com tapioca, coco e com os quais se identificam ou
canela, e frito no óleo. onde não sofram racismo. Por

86
Acarajés

isso, o lema “sabor e afeto” do Atualmente, o espaço é for-


afrobuffet é levado para ou- mado por seis pessoas — cinco
tras áreas, inclusive, para den- mulheres e um homem fixos,
tro da equipe que forma o em- além de outras vinte mulheres
preendimento. Ela busca fazer freelancers que trabalham nos
dele um espaço acolhedor des- eventos que a equipe realiza.
de o início, como quando uma Todos os membros buscam re-
pessoa a procura em busca de passar esses valores aos pratos
uma vaga de trabalho. que são produzidos e entregues.

87
Prato Firmeza Preto

Com relatos de clientes que receberam os acarajés e “sentiram a


Bahia dentro de casa”, a chef Priscila diz que tem sido muito gratifi-
cante entrar nos lares das pessoas.

Assim, a Kitanda das Minas segue levando um pedaço da cu-


linária afro-brasileira para cada cliente em pratos que são feitos de
memórias, como Priscila costuma dizer. Seja pela memória da comida
afro no Brasil ou pela ancestralidade que ela carrega consigo. Tudo
isso embalado em comidas com ótimo aroma e sabor (e, claro, afeto).

88
Acarajés

SERVIÇO
Rua Barão de Iguape,
158, Liberdade

(11) 98726-5098

R$ 10,00 a R$ 55,00

Cartões de débito e crédito

Terça a sábado,
das 12h às 17h

Opções veganas

@kitandadasminas

/kitandadasminas

Entregas com entregador


próprio em qualquer região,
com taxa combinada
previamente. Apesar do
atendimento das 11h às 16h,
aceita encomendas para
outros horários ou dias
da semana.

Fotos: Eduardo Silva/Acervo


pessoal de Priscila Novaes

89
Prato Firmeza Preto

DOCES AFETOS
DOCES AFETOS
Amor, afeto e negócio

Doce é sinônimo de tudo o que é agradável. E não é por acaso.


Além de ser um dos sabores preferidos de toda a humanidade,
também simboliza afeto. Aquele bolo quentinho saído do for-
no que a vovó faz para os netos, a trufa que levamos para casa
quando nos lembramos de alguém, o bolo de pote que a gente se permite
comer com calma no meio de um dia corrido. Tudo isso é sabor, mas
é também cuidado.

Nesta editoria somos convidados a conhecer histórias que relacionam


a memória afetiva como modelo de negócio e, em alguns casos, su-
peração pessoal. Por meio de bolos, mousses e brigadeiros, pessoas
reencontraram sua independência financeira e autoconfiança. Forte
como canela em pó.

Para além do cuidado, do amor depositado a cada sobremesa prepa-


rada, está uma boa camada de conhecimento técnico. Os doces
artesanais são “esculpidos”. Tornam-se verdadeiras obras de arte
que enchem os olhos de quem vê. Um trabalho que agrada a visão,

90
o olfato, o paladar e aquece
o coração. Uma doce leitura
para você!

Jamile Santana

91
Prato Firmeza Preto

RAP E CONFEITARIA:
A MISTURA DA
DOCE GHETTO
DOCE GHETTO BRIGADERIA
Por Danielle Lobato, da Agência Mural

BATALHAS DE RAP FORAM UM DOS


PRIMEIROS LUGARES ONDE A JOVEM
COMEÇOU VENDER BOLOS FEITOS EM CASA

À frente da Doce Ghetto Brigaderia está Gabriela de Paula,


dezenove anos. Ela é responsável por produzir mais de trinta tipos de
sabores de bolos e doces gourmets na cozinha de sua casa, no distrito
da Casa Verde, na zona Norte de São Paulo.

92
Doces afetos

A paixão pela confeitaria vem


desde os sete anos, quando ela
fez seu primeiro bolo e ficou
maravilhada com a alquimia
que existe em misturar os in-
gredientes da receita. “Assistia
muito o programa Cake Boss
[reality show norte-americano]
e queria fazer igual. Estava
instituição. Para custear essas
aprendendo a trabalhar com
despesas, a confeiteira decidiu
ganache, que é uma mistura
vender bolos no pote a R$ 5 no
cremosa de chocolate e creme
grupo da sala.
de leite, mas não deu certo. Foi
uma verdadeira sujeira na coz- “Os ingredientes das receitas
inha”, conta a empreendedora. são fornecidos pelos alunos,
mas eu estava sem dinheiro
para arcar. Decidi divulgar
Aos dezesseis, passou no vesti- nas redes sociais, porque no
bular da Etec (Escola Técni- interior da Etec as vendas
são proibidas”,
ca Estadual) para cursar nu-
trição e dietética. Embora o A divulgação deu tão certo
ensino seja público, os materi- que, em 2018, nasceu a Doce
ais didáticos e os gastos com Ghetto Brigaderia. O nome re-
trabalhos individuais e de gru- flete uma jovem da periferia
po não eram cobertos pela que ama a culinária e também

93
Prato Firmeza Preto

o rap. A confeiteira conta que, massa de chocolate, leve e bem


para fazer a divulgação do seu molhada, que se desmancha na
trabalho, ela ia a batalhas de boca ao mastigar, e recheio de
rap a convite de amigos. brigadeiro sem muita adição de
açúcar. Na finalização do bolo,
“Quando pensei no nome há pedaços de chocolate e o
para o meu negócio, não
poderia ser outro. Tinha que granulado split (diferentemente
homenagear o gênero musi- do tradicional, o split é quadra-
cal que cresci escutando.”
do, macio e não tem gosto de
gordura hidrogenada).
Gabriela atende os clientes nas
saídas do metrô de São Paulo
O cardápio também conta com
ou com delivery particular. As
o kit festa que inclui um bolo
receitas são cobradas pelo peso
de 1kg, trinta doces gourmets
do bolo, com preços que variam
e cinquenta salgados artesa-
de R$ 48 a R$ 110, dependendo
nais de sabores variados, feitos
do sabor e da decoração, que
pela mãe da confeiteira. O kit
pode ser mais simples ou com
custa a partir de R$ 115 e vai
desenhos, por exemplo. Ingredi-
acompanhado de um topper –
entes de marcas famosas, como
plaquinhas redondas, ovais ou
Nutella, Kinder Ovo e Ferrero
quadradas que servem para
Rocher, podem ser adicionados.
enfeitar o bolo ou os doces de
O destaque vai para o bolo de
acordo com o tema da festa.
brigadeiro gourmet, feito com

94
Doces afetos

No faturamento, a empreende-
dora diz que chega a fechar 55
pedidos de encomendas em um
SERVIÇO
único mês. “Não imaginava que
geraria emprego e renda com Casa Verde

a venda dos meus bolos”, diz (11) 95938-3136


Gabriela, que hoje vive exclu-
R$ 48,00 a R$ 115,00
sivamente com a renda obtida
Cartões de débito e crédito.
da venda dos doces. Pedidos acima de R$ 100
podem ser parcelados em 2x
Ao falar sobre a representati- Todos os dias, das 8h às 21h
vidade preta na confeitaria, ela
Opções ovolactovegetarianas
afirma que quer ser um modelo
para jovens da periferia não @doceghetto

desistirem de ocupar espaços Pedidos por WhatsApp.


de chefia e, principalmente, Entregas em todas as regiões
de São Paulo por delivery
incentivar a criação do seu privado, com taxa.
próprio negócio.

Fotos: Danielle Lobato/Acervo


pessoal de Gabriela de Paula

95
Prato Firmeza Preto

OBRAS DE ARTE
FEITAS DE AÇÚCAR
AMÔ • COZINHA AFETIVA
Por Camila da Silva, da Énois

AMÔ • COZINHA AFETIVA ENTREGA CARINHO,


QUALIDADE E BELEZA EM FORMA DE DOCES

A relação de Luana Pereira, 34 anos, com os doces começou na


infância. Sobrinha de confeiteira, ela cresceu ajudando a enrolar
docinhos de festa. “Eram sempre dois brigadeiros para mim e um
para os clientes da minha tia”, comenta. A brincadeira de criança
se tornou profissão anos depois, junto com o nascimento de seu filho
Daniel, em 2012. Num puerpério solitário e diante de uma demissão

96
Doces afetos

após a licença maternidade,


não havia muita opção a não
ser empreender.

“Nas entrevistas de
emprego, a primeira coisa
que perguntavam era
‘Você tem com quem deixar
seu filho?’. Então começar
um trabalho autônomo
naquele primeiro momento
não foi uma escolha O empreendimento tornou-se
consciente, mas um caminho
que tinha disponível.” mais profissional durante a
faculdade, quando Luana
Primeira vez mãe e primeira vez começou a estudar a história
confeiteira, Luana começou dos doces: “O Amô era tema do
todos os cursos possíveis e com meu TCC e hoje é o nome do
a ajuda das amigas conse- ateliê no Ipiranga, zona Sul de
guiu as primeiras encomendas São Paulo. Estudei uma linha
de bolos, brigadeiros, além artesanal de compotas, gele-
de ovos de Páscoa – tudo ias e antepastos. Produtos que
personalizado ao gosto do cli- representam resgate à história
ente. Dois anos depois, estava dos livros de receita amare-
se formando em gastronomia lados e toda ancestralidade
e com o seu negócio Amô • que carregam. São doces que
Cozinha Afetiva consolidado. passam horas, às vezes dias,

97
Prato Firmeza Preto

apurando em tachos de cobre.


Cozinha simples, com sabores e
aromas de infância e memórias
de afeto”, conta. A geleia hoje é
componente dos doces, como
os deliciosos macarons com
frutas vermelhas.

É muito difícil não se encontrar profissional: “Entre as pessoas


pela beleza das criações de que trabalham com confeitaria
Luana. Delicadeza e criativi- eu identifico a questão de que
dade são o ponto alto das en- quem recebe o reconhecimento
tregas. Bolos com flores, com nem sempre são as que estão
personagens, cores e formatos produzindo na cozinha. Quando
variados. No Instagram, mais você é um pequeno empreen-
de 7 mil seguidores contemplam dedor, é difícil te reconhecerem
as obras de arte açucaradas. como confeiteira. Mesmo você
fazendo esse trabalho, você é
Desde que trabalha no ramo sempre a moça do bolinho, a
ela conseguiu realizar o so- tia do doce, mas nunca é vista
nho de ter uma estrutura como confeiteira.”
melhor para o negócio, constru-
indo seu ateliê. Ainda assim, Entre os bolos decorados, ovos
por vezes, ela não é vista como de Páscoa e outros doces, do

98
Doces afetos

cardápio em todos os eventos é


o seu bem-casado que faz mais
sucesso. Essa foi uma das pri-
SERVIÇO
meiras receitas que ela apren-
deu a fazer e foi aprimorando Ipiranga

com os anos de trabalho. “Essa (11) 98575-7977


foi uma receita que tive que
• Doces tradicionais e finos:
aprender logo no ínicio e fazer R$1,50 a R$5/unidade
• Bem-casados: R$ 2,50
às pressas, a cliente me conven- a R$ 3,75/unidade
ceu a fazer mesmo sem saber. • Bolos decorados:
R$ 65 a R$ 85/kg
Procurei algumas receitas na
internet e fiz. Até hoje ele é um Cartões de débito e crédito e
transferência bancária
dos mais elogiados”, diz. O bolo
fofinho e macio com um recheio Segunda a sexta, das 10h às
16h; sábado, das 10h às 14h
cremoso com doce de leite e co-
bertura de calda de açúcar é Opções ovolactovegetarianas

tão lindo, e ao mesmo tempo @amo.cozinhaafetiva


gostoso, que você não sabe se
/amo.cozinhaafetivaa
contempla ou se come.
Pedidos por WhatsApp
e redes sociais com
antecedência mínima de três
dias. Entregas feitas pela
proprietária em São Paulo e
região do ABC.
Fotos: Camila da Silva/Acervo
pessoal de Luana Pereira

99
Prato Firmeza Preto

O PONTO MAIS
DOCE DA PRAÇA
QUERO CHURROS
Por Camila da Silva, da Énois

O CHURROS DA MICHELE TRAZ COBERTURA


EXTRA DE AFETO E CHOCOLATE

“Eu estou aqui há muito tempo. Quando cheguei, a rua que eu


moro era de terra, nem asfalto tinha ainda”, conta Michele Sou-
sa, 38 anos, nascida e criada em Guarulhos. Ela chegou no Jar-
dim Fortaleza, periferia da zona Norte da cidade, no fim da dé-
cada de 1990 e, desde 2016, tem ali seu carrinho de churros, o
Quero Churros. Fácil de encontrar, ela fica na praça central. Para

100
Doces afetos

quem é cria do bairro, é difí-


cil nunca ter passado por ali.
“Desceu no ponto-final do ôni-
bus, você vai em direção ao
mercado Quatro Irmãos que é
sem erro”, dizem os moradores.
E é na chegada do trabalho,
na ida e volta da aula, entre
uma saída para o mercado
ou lotérica que os clientes se
achegam, afinal, os doces entre
os corres do dia a dia podem
ser anestésicos.
Essa fala e o papo com o pú-
“Às vezes as pessoas param,
conversam, geralmente são blico também permeou todos
as mesmas que compram e os seus outros trabalhos. Antes
ficam para descansar um de ter o carro de churros, ela
pouco e papear.”
trabalhou com vendas de rou-
pa em Diadema. “Chegou um
O afeto e o jeitão conversador,
dia que eu não estava mais
segundo Michele, é de família,
aguentando aquela rotina. Eu
mais precisamente do lado da
saia muito cedo e voltava sem-
mãe, dona Laurentina, nascida
pre muito tarde. Com a gravi-
na Bahia.
dez, também senti mais neces-

101
Prato Firmeza Preto

sidade de cuidar de mim”. Seu “Eu fiquei desesperada


filho, que agora tem sete anos, quando fui à Prefeitura e
eles falaram que o chur-
a ajudou nessa mudança. ros não estava na lista dos
comércios que podiam ser
regularizados. Eu já tinha
Começar a trabalhar em seu investido em ingrediente e
próprio negócio exigiu estudo juntado dinheiro para
o carrinho que hoje custa
sobre a produção dos churros,
mais de mil.”
como gerar renda e lidar com
as burocracias.

102
Doces afetos

Para seu alívio, a carta de re- “Como toda mãe, ela estava
gularização, que é motivo de preocupada. Aí tentei falar
com a Rayane, eu lembro
orgulho, chegou depois três muito bem desse dia.
meses. No auge dos seus quatro Ela estava com desenhos,
ela foi me mostrando
anos de negócio, ela se mantém e confiando em mim.”
fiel à clientela conquistada no
bairro. “As pessoas me pergun- Aos poucos a garotinha revelou
tam se com todo esse tempo eu que haviam zombado de seu
não penso em expandir. Eu en- cabelo na escola. “Eu disse: ‘A
tendo que crescer é importante, tia tem um cabelo igual o seu,
mas não tenho essa ambição. A olha aqui os cachos’”, conta.
relação que eu tenho com al-
gumas pessoas aqui eu não te- O conforto que a conversa e
ria se tivesse expandido tanto”, a comida proporcionam fazem
afirma, referindo-se a uma das Michele lembrar de seu avô
clientes mais jovens: a pequena Antônio. A canela, um dos prin-
Rayane, de seis anos. cipais ingredientes dos churros,
é o que o avô mais colocava
A menina, que sempre aparecia em seus mingaus de fubá para
por ali muito brincalhona, pas- animá-la quando criança.
sou um dia mais quieta e triste.
A mãe, preocupada, comentou “Eita, menina, ainda tenho
esse paladar de criança,
que não conseguiu descobrir o
por isso escolhi os churros”,
que havia acontecido na escola. relembra emocionada.

103
Prato Firmeza Preto

Essas conexões proporcionaram a potência para ela melhorar o seu


trabalho e buscar novidades. No carrinho tem churros para todos
os gostos: com recheio tradicional, de chocolate, mini-churros, bolo e
o novo produto, que é o churros no copo com mais recheio. De um
lado, chocolate e do outro doce de leite para o cliente mergulhar o
churros de acordo com a própria vontade. O cheirinho da canela vem
junto da crocância da massa sequinha e, quando você dá a primeira
mordida, tem recheio até não querer mais. Ou melhor, até você
pegar mais um.

104
Doces afetos

SERVIÇO
Avenida dos Evangélicos s/n°,
Jardim Fortaleza – Guarulhos

(11) 99000-1322

R$ 3,00 a R$ 10,00

Cartões de crédito e débito

Segunda a sexta, das 16h às


21h; sábado, das 16h às 18h

Opções ovolactovegetarianas

/michelyy.vieira.3

Pedidos por WhatsApp


com entrega própria.

Fotos: Camila da Silva

105
Prato Firmeza Preto

BOLEIRA
JUSTICEIRA OU
DOCE ADVOGADA?
BATUQUE NA COZINHA
Por Camila da Silva, da Énois

OS BOLOS QUE ELAINE SOUZA VENDIA


PARA COMPLEMENTAR A RENDA DURANTE
A FACULDADE DE DIREITO ACABARAM SE
TORNANDO SEU NEGÓCIO

“Quando estava cursando direito, comecei a brincar que não sabia se


eu seria uma boleira justiceira ou uma doce advogada. Acabou que a
boleira justiceira venceu”, brinca Elaine Aparecida de Souza, 46 anos,
que hoje é dona do Batuque na Cozinha. O sonho de se tornar

106
Doces afetos

delegada perdeu espaço para


a gastronomia, já que os bolos
e doces – usados para comple-
mentar a renda – faziam muito
sucesso nos corredores da fa-
culdade e do estágio.

A culinária sempre esteve pre-


sente na vida da empreen-
dedora. A mãe trabalhava
em comércios e bares da Vila em que passou oito anos, não a
Ema, zona Leste de São Pau- deixava feliz.
lo, onde moram, e ela sempre
“Eu ficava indignada de
demonstrou muito interesse em não poder fazer nada, não
aprender mais sobre chocolates me sentia satisfeita. Então
pedi demissão e nesses oito
e doces. Aos doze, Elaine fez
meses em que fiquei desem-
seu primeiro curso de chocola- pregada, aproveitei para me
teria, mas naquela época ain- qualificar em algo onde eu
pudesse crescer e ser feliz.”
da não considerava o talento
na cozinha como uma fonte Entre a faculdade e o estágio
de renda. foi preciso vender alguns bolos
e doce para complementar a
Na vida adulta, o trabalho em renda. O sucesso foi tão grande
um escritório de contabilidade, que as encomendas de bolos

107
Prato Firmeza Preto

e dos salgados da sua mãe A economia solidária, com a


cresceram tanto, que Elaine Associação de Mulheres na
já não queria esperar para se Economia Solidária e Feminista
dedicar apenas a confeitaria. (AMESOL), foi a porta de en-
trada para a gastronomia, af-
“Em 2015, foi uma transição inal, não bastava só aprender
bem complicada porque
fui a primeira da família a como fazer os melhores choc-
entrar na faculdade e todo olates e salgados, era preciso
mundo achou que eu estava
jogando meus estudos no também entender como admin-
lixo, mas acredito que saí istrar um negócio. Até hoje ela
no momento certo.”
faz parte da AMESOL, onde
participou das primeiras feiras
Nesse processo não foi difícil
e grandes eventos. Começou
escolher o nome do negócio.
experienciando o ramo sem es-
Batuque na Cozinha é inspira-
tar sozinha, e sim, com outras
do na infância de Elaine, que
mulheres negras da área, deu o
cresceu numa casa movimenta-
norte que ela precisava.
da e cheia, em que a criançada
brincava com as panelas.
Entre as receitas de chocolate,
pão de mel e empadão que
“Batuque fala do povo preto.
Eu tenho uma família negra aprendeu a fazer nos cursos,
e batuque lembra festa, co- floresceu a satisfação em pro-
mida bem-feita, farta, então
pensei que teria tudo a ver duzir coffee breaks, os eventos
com o meu negócio.” para empresas, que podem in-

108
Doces afetos

Na economia solidária também


entendeu que queria trabalhar
com produtos orgânicos, arte-
sanais e reconheceu a neces-
sidade de trabalhar com out-
ras mulheres. Nesses anos de
profissão ela atua com black
money junto com outras profis-
sionais negras.

cluir almoços, jantares e cafés. Os doces e os amargos das


O processo começa uma sem- experiências de trabalho de-
ana ou até quinze dias antes ram a ela o impulso que pre-
do evento contratado. “Não é cisava para se dedicar à con-
só saber cozinhar, vai desde feitaria. O copo da felicidade,
você saber montar uma mesa que leva brownie, morango,
de forma harmoniosa e boni- chocolate em barra e cremes
ta, cuidar da temperatura do de chocolate branco e preto,
doce, do café, do suco. Como ou o fondue são algumas das
você precisa estar vestida e vai suas principais vendas. É im-
se apresentar, como vai elabo- possível comer um e não se
rar um cardápio e como vai ex- sentir bem, e isso não apenas
plicar para o cliente o que está para os amantes de doce. A
oferecendo”, detalha. caixa de fondue vem com dois

109
Prato Firmeza Preto

cremes de chocolate preto com rum e chocolate branco e cham-


panhe, além de brigadeiros, brownies e frutas –que vão desde as
tradicionais, como morango e uva, até outras menos comuns, como o
damasco. Cada detalhe é pensado para ter aquele “hmmm” quando
provamos. O brigadeiro por exemplo, precisa ficar oito horas des-
cansando para ter firmeza. O equilíbrio no sabor de cada produ-
to da cesta, dá vontade de continuar parada no tempo comendo
e aproveitando cada sabor.

110
Doces afetos

SERVIÇO
Vila Ema

(11) 95479-1649

R$ 50,00 a R$ 100,00

Cartões de débito, crédito e


transferência bancária

Todos os dias, das 9h às 21h

Opções ovolactovegetarianas

@batuque_na_cozinha

/BatuqueNaCozinhaOficial

Pedidos devem ser feitos


com pelo menos um dia de
antecedência, até às 18h.
Eventos e coffee break pelo
menos uma semana antes.
Entregas na cidade de São
Paulo e Região Metropolitana

Fotos: Camila da Silva/Acervo


pessoal de Elaine Souza

111
Prato Firmeza Preto

A PAUSA DOCE
E LEVE NA ROTINA
DO TRABALHO
LETÍCIA VALIAS DOCERIA ARTESANAL
Por Camila da Silva, da Énois

A CONFEITEIRA LETÍCIA VALIAS


ENCONTROU NAS EMPRESAS UM NICHO
DE MERCADO PARA EMPREENDER

Letícia Valias, quarenta anos, passou dois anos estudando confei-


taria antes de mergulhar de cabeça no mundo dos doces e abrir a
Letícia Valias Doceria Artesanal. Foi nos condomínios do Parque
Cecap, em Guarulhos, que ela teve a certeza de que tinha a mão
certa para conquistar os clientes pelo estômago.

112
Doces afetos

Mas nem tudo foi doce.


A empreendedora trabalhava
em um banco e, desanimada
com a falta de oportunidades,
resolveu pedir demissão e
começar em uma área nova.
Entre os vários cursos de em-
preendedorismo, Letícia desco-
briu a confeitaria, de onde veio
a certeza de que essa seria a
próxima parada profissional. dade e comprou o seu primeiro
carrinho de bolos para expor
Preparando os bolos para even- seus quitutes.
tos de condomínios vizinhos e
indo vendê-los também em fei- Depois de muitas ligações sem
ras livres do Cecap, ela desco- respostas das empresas, surgi-
briu com outros vendedores o ram mãos amigas e uma rede
mundo dos bazares e grêmios de outros empreendedores e
de empresas. Os grêmios são empreendedoras que lhe deram
áreas de lazer e descanso para apoio. Um dos seus primeiros
funcionários, com espaços para grêmios foi conquistado com a
empreendedores de diferentes ajuda dessa rede em uma mul-
ramos venderem seus produtos. tinacional. Após uma reunião
Letícia viu ali uma oportuni- com os representantes do local

113
Prato Firmeza Preto

e da degustação dos bolos, ela


foi chamada mais vezes para
expor na empresa. Com o tem-
po, sua rede de clientes foi cre-
scendo para além de Guarulhos
e passou a ser convidada para
participar de eventos maiores
em São Paulo. Letícia oferece
equipe para fortalecer a marca
aquela pausa deliciosa e doce
em São Paulo, enquanto desen-
na rotina do trabalho.
volve ainda mais seu público
“O legal de trabalhar com em Guarulhos.
empresas é ver o retorno
das pessoas. Quando a pes-
soa come com prazer, Durante a pandemia do coro-
dá uma satisfação ver que navírus - e suspensão das feiras
você está levando um – a confeiteira se dedicou a tes-
momento de alegria que
o doce proporciona.” tes de novas receitas. Surgiram
no cardápio brownies, mousses,
O retorno também veio no fi- tortas de limão e sobremesa
nanceiro. Esse ano Letícia con- com brigadeiro e capuccino.
seguiu um apartamento com Mas mesmo com tantas delí-
espaço para produzir seus bo- cias, tem uma receita que não
los e, agora, suas metas são sai do topo: a banoffee, uma
altas: ela pretende ter uma sobremesa que leva farofa de

114
Doces afetos

bolacha com manteiga, doce


de leite, banana, chantilly fres-
co e canela. E o tamanho vai do
SERVIÇO
pequeno ao grande. O aroma
da canela se destaca de cara Parque Cecap – Guarulhos

e complementa o sabor dos (11) 97408-0906


outros ingredientes. Dá para
R$ 35,00
senti-los a cada colherada.
Cartões de débito, crédito,
boleto bancário e PicPay
Também não podemos deixar
Segunda a sábado,
de fora o bolo de pote, que das 9h às 19h
foi o ínicio de tudo e está dis-
Opções ovolactovegetarianas
ponível nos sabores chocolate,
paçoca, prestígio, brigadeiro @leticiavaliasbolos

e leite Ninho com morango, /leticiavaliasbolos


o mais amado pela clientela.
Encomendas devem ser feitas
Com massa molhada, fofinha com antecedência mínima de
três dias. As entregas podem
e com recheio cremoso, é difícil
ser combinadas. Aos fins de
querer apenas um. semana a doces para pronta-
entrega, como bolos no pote,
pães de mel e trufas.

Fotos: Camila da Silva/Acervo


pessoal de Letícia Valias

115
Prato Firmeza Preto

TRANSFORMAR
SONHOS EM DOCES
É MARAVILHOSO
CAKES DA NEGA
Priscila Reis, da Preto Império

A MORADORA DA BRASILÂNDIA
QUE NASCEU PARA FAZER DOCES

Na Vila Terezinha, bairro da Brasilândia, zona Norte de São Pau-


lo, Amanda Cristina de Oliveira nasceu e cresceu. A jovem de 28
anos, formada em marketing, não imaginava que se tornaria uma
empreendedora do ramo alimentício. Ela conta que o dom de fazer
doces herdou da mãe, mas não tinha consciência disso, até se propor
a fazer trezentos cupcakes para ajudar em uma festa de sua igreja.

116
Doces afetos

A partir de R$ 2,50 é possível


experimentar as maravilhas
do Cakes da Nega. Feitos
com chocolate de primeiríssi-
ma qualidade, os pães de mel
trazem um sabor único, com re-
cheio na medida certa e leveza
na massa, impossível não com-
partilhar a experiência e quer-
er presentear todo mundo com
essa delícia. O pão de mel tem meus aniversários e para en-
opções de recheio nos sabores comendas também. Eu nunca
brigadeiro e doce de leite. Bo- me interessei muito por isso,
los também são os favoritos da gostava mesmo era de comer.”
clientela: os mais pedidos são
os sabores bicho de pé, paçoca Foi aí que tudo começou, os
e mousse de morango. cupcakes se tornaram um
sucesso, todos gostaram! Logo
“Na verdade, não houve um surgiu o interesse por bolos
planejamento, as coisas foram personalizados dos mais diver-
acontecendo. Minha mãe sem- sos sabores, os famosos bolos
pre trabalhou com doces e artísticos. Amanda conta que
salgados, praticamente a vida os primeiros foram um desas-
inteira, era ela quem fazia em tre, ela aceitava pedidos de

117
Prato Firmeza Preto

amigos e não cobrava nada, cada dia vem conquistando


eles forneciam o material. Ali a confiança e o paladar de
ela viu uma oportunidade de seus clientes.
aprender e prosperar ainda
mais. Claro que, como sua mãe Quando iniciou seu negócio
sempre foi muito hábil em fa- não pensou necessariamente
zer deliciosos doces, teve essa em um público específico, quis
vantagem. Além de sempre in- se aperfeiçoar para atender a
centivá-la, sua mãe lhe passou todos com excelência, produz-
tudo que sabe! Amanda vende indo desde doces mais sim-
bolos inteiros, no pote, a pron- ples até os mais específicos
ta-entrega e por encomenda. e personalizados.

“Hoje agradeço a ela por Hoje administra seu negócio


toda paciência e amor que
teve e tem comigo, ainda sozinha e o dinheiro investido
tenho muito o que aprender, para iniciar o empreendimen-
mas acredito que estou no
caminho certo.” to veio de seu antigo emprego.
Amanda saiu da empresa em
Amanda busca manter-se sem- que trabalhava e confessa que
pre atualizada, faz pesquisas, no início da pandemia ficou
segue páginas de confeitei- muito preocupada sobre o rumo
ras pelas redes sociais e faz que as coisas tomariam. Porém,
cursos para oferecer produ- ela sentiu que algumas pessoas
tos cada vez melhores. E a passaram a priorizar pequenos

118
Doces afetos

empreendedores. O período em
que as lojas estavam fechadas,
foi muito bom para as vendas,
SERVIÇO
pode-se dizer até que surpreen-
dente, uma vez que vendeu Vila Terezinha – Brasilândia

doces para lembrancinhas e (11) 96476-1861


pequenas confraternizações em
• Doces individuais:
família. Amanda conta que em R$ 2,50 a R$ 12,00
• Bolos personalizados
cinco anos de negócio, 2020 a partir de R$ 60,00)
foi o melhor ano de vendas no
Transferência bancária,
período da Páscoa. boleto, cartões de débito e
crédito
“Por mais que a
pandemia tenha nos deixa- Segunda a sexta, das 9h às
17h; sábado das 10h às 17h
do de mãos atadas inicial-
mente, também trouxe @cakesdanega
coisas positivas para aque-
les que aproveitaram o /cakesdanega
isolamento para se reinven-
tar. Transformar sonhos Entregas até o centro da
em doces é maravilhoso, cidade. Se o endereço de
e hoje sei que eu realmente entraga for muito distante,
nasci pra fazer isso!” é possível combinar o
melhor local. Para doces
personalizados ou bolos é
necessário encomendar com
antecedência de, no mínimo,
três dias.
Fotos: Priscila Reis/Acervo pessoal
de Amanda Cristina de Oliveira

119
Prato Firmeza Preto

BOLOS QUE
MUDAM VIDAS
BOLOS DA VIDA
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

DOS ESCRITÓRIOS FRIOS PARA O QUENTINHO


DOS SORRISOS SATISFEITOS COM A ENTREGA
DE BOLOS DELICIOSOS

A correria de ir atrás do sonho de entregar felicidade por meio dos


bolos levou Sabrina Modesto, 42 anos, a abandonar o direito e trans-
formar a própria vida ao abrir a loja Bolos da Vida, em Osasco. “A
gastronomia me traz muito mais prazer, e a maturidade me mostrou
que hoje eu estou fazendo o que mais amo”, relata a ex-advogada,

120
Doces afetos

que trabalhou por mais de dez


anos com direito tributário.

Filha de mãe boleira, só foi


dar espaço para o talento de
família em 2015, quando per-
cebeu que gostava de pre-
sentear pessoas próximas com
bolos. Ela queria fazer um tra-
balho mais independente e, da pelas suas delícias, ficou difí-
pouco tempo depois, já estava cil conciliar as encomendas com
anunciando suas criações nas a jornada no escritório. Então,
redes sociais. Conseguiu se apri- em novembro de 2019, ela in-
morar no mercado participando augurou a loja e passou a se
da formação de empreendedo- dedicar exclusivamente aos bo-
rismo no Afrolab – um projeto los. Divide a administração do
do Instituto Feira Preta, que negócio com Vinícius Wander-
visa promover inovação para ley, 44 anos, sócio que cuida da
pequenos e médios negócios de gestão do espaço e da logística
pessoas negras. Durante o cur- de entregas.
so, ela viu que estava no cami-
nho certo para empreender no Todo esse conhecimento e ele-
ramo da gastronomia. Com o mentos tão pessoais de Sabrina
tempo e o aumento da deman- são misturados com muita sabe-

121
Prato Firmeza Preto

doria e carinho para produzir


receitas próprias. E que receitas
maravilhosas! Tem bolo caseiro,
de festa, no pote e brownie. Os
brigadeiros também aparecem
em várias versões: tradicionais
(brigadeiro, beijinho, bicho de
pé e brigadeiro branco), re- e é criação de Sabrina, feito de
cheados (com uva, Nutella e chocolate, morango e chantilly.
prestígio) e gourmets (choco-
late blend, belga, nozes, crème Cada bolo é resultado de uma
brullé e quindim), além do clás- alquimia diária de transfor-
sico bombom de morango. mar ingredientes e usar ma-
cetes que fazem a diferença.
Já os bolos são molhadin- Suas dicas vão desde montar
hos, muito recheados e doces o bolo na própria forma en-
na medida certa, sem aquele volvida com plástico para sol-
gosto “industrializado” de bo- tar mais fácil, forrar a forma
los prontos de supermercado com papel-manteiga para as-
ou de grandes redes de lojas. sar a massa sem grudar, até
Entre sabores como bem-casa- deixar o bolo “dormir” até o
do, prestígio e brigadeiro, o dia seguinte, fazendo com que
destaque vai para o Bolo da algumas reações químicas que
Vida, que leva o nome da loja acontecem no forno continuem

122
Doces afetos

ocorrendo, deixando o sabor


ainda melhor.
SERVIÇO
“Isso foi o divisor de águas
para entender como que se
Avenida Iara, 262,
sai de um bolo amador para Vila Iara - Osasco
um bolo profissional.”
(11) 95688-2687

O nome Bolos da Vida vem de R$ 25,00 a R$ 40,00


um apelido de casal. “Rogério e
Cartões de débito, crédito
eu nos chamamos de Vida. Como e vale-refeição
sou eu quem faz os bolos, ficou Bo-
Na pandemia horário
los da Vida”, conta a confeiteira, reduzido; Segunda a sexta,
das 9h às 18h; sábado, das
que conseguiu passar por todas
9h às 15h. Geralmente fora
as dificuldades que uma transição da pandemia, de segunda
a sexta, das 10h às 18h30;
profissional tão grande pudesse sábado, das 10h às 14h.
lhe trazer. Ao entender que a
Opções ovolactovegetarianas
sua verdadeira vocação estava
nos sabores e não nos papéis, ela @bolosdavidaoficial

prova todos os dias que os bolos /bolosdavida


marcam também as vidas de
Pedidos por telefone,
quem come. WhatsApp e redes sociais. As
encomendas devem ser feitas
com pelo menos três dias de
antecedência.
Fotos: Gabrielly Oliveira/Acervo
pessoal de Sabrina Modesto

123
Prato Firmeza Preto

BLACK BUSINESS
BLACK
Aqui tem empreendedor preto prosperando

Já dizia os versos do rapper Emicida em Avua Besouro: “Guetos


precisam de heróis. Pretos, digam, desde quando o medo existe en-
tre nós?”. E é assim, com a cara, coragem, criatividade e personali-
dade que empreendedores pretos conquistam cada vez mais espaço
no mercado.

Mesmo quando uma boa ideia é intimidada por uma situação sem
precedentes – como a pandemia do coronavírus – não falta garra.
Foi o caso dos empreendedores do 50/25 Cocktail & Co. que estavam
prestes a inaugurar o espaço quando o isolamento social começou.
A saída? Enviar coquetéis por delivery.

No caso do Levinho Fit, a rotina de atleta da empreendedora Gisele


de Oliveira fez toda a diferença. Ela, que já participou de dez
meias-maratonas, com o perdão do trocadilho, sabe o que é fazer
um corre. E deu certo! Agora tem marmitas fit nas quebradas.

Já no Mesa Cheia, a proposta é levar receitas sofisticadas para

124
bairros de vulnerabilidade so-
cial. Todo mundo merece co-
mer bem, e esse cuidado com o
visual da comida tem mantido
o negócio próspero.

E é assim, superando dificul-


dades, dando a volta por cima
e reinventando processos, que
outros negócios tocados por
mulheres pretas tem ganha-
do mercado também. Afinal,
pretos, digam, desde quando
o medo existe entre nós?

Jamile Santana

125
Prato Firmeza Preto

BONS DRINKS
DE UM CASAL
INFLUENCER
50/25 COCKTAIL & CO.
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

PAULO E XAN UNEM


CONHECIMENTOS PARA ENGARRAFAR
COQUETÉIS E BOAS RELAÇÕES

O ano de 2020 era para ser o de inauguração do 50/25 Cocktail &


Co., em São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo,
mas a chegada da pandemia do coronavírus fez com que os planos
de Paulo Ravelli, 38 anos, e Xan Ravelli, 39, tivessem que ser adiados.
No entanto, o casal percebeu que, mesmo em quarentena, as pessoas

126
Black Business

continuaram confraternizando
em casa e apreciando bebidas
de qualidade. Assim, viram que
uma boa saída seria produz-
ir drinques engarrafados para
entrega por delivery, e que as
redes sociais poderiam ser por-
ta de entrada para a marca.
Já com uma base bem-construí-
Paulo é mixologista, ou seja, da, voltou ao Brasil por motivos
aquele que investiga a fundo o familiares e, quando conheceu
preparo de receitas e ingredi- Xan, decidiu ficar no país e
entes da coquetelaria. Também passou por grandes bares de
conhecemos esses especialistas São Paulo. Em 2019, conquistou
como bartenders. Ele está no o prêmio de Melhor Negroni
ramo desde 2004 e começou da cidade pelo Guia da Folha
sua carreira no Japão, quando de S.Paulo.
foi ao país para trabalhar na
indústria automotiva. Depois Alexandra, mais conhecida
de uma crise econômica, pas- como Xan Ravelli, é musico-
sou a trabalhar como assistente terapeuta e trabalhava em um
de bar. Logo se especializou, abrigo para crianças que sof-
buscou aperfeiçoamento em reram abuso sexual, mas depois
cursos e acumulou experiência. dos filhos teve que mudar a tra-

127
Prato Firmeza Preto

jetória. Em 2013 iniciou o Soul gou participou do programa


Vaidosa, um canal no YouTube O Aprendiz, na Rede Bandei-
que fala sobre “beleza com rantes, como a única partici-
propósito, apoio emocional, pante preta da edição. Hoje,
identidade e vidas pretas com Xan também é embaixadora de
leveza”. O canal ultrapassa 66 marcas de produtos capilares.
mil inscritos e tem conteúdos de
estilo de vida, feminismo negro, Enquanto Xan é responsável
questões raciais, maternidade, pelas redes sociais e divulgação
beleza e estética. Ela se tornou da marca, Paulo comanda o
influenciadora digital e che- bar e prepara lotes quinzenais

128
Black Business

de garrafas para entregas em Um dos rótulos experimentados


domicílio. O conceito de en- foi a Pin-up Colada, um drinque
garrafar coquetéis nasceu em refrescante e com sabor delica-
Nova York e se espalhou pelo do. Frutado e leve, o coquetel
mundo. No 50/25, as garrafas é preparado a partir da com-
são seladas com uma tampa binação de rum, suco de aba-
de cera derretida, têm 375ml caxi, água de coco, limão tahiti,
e servem quatro drinques de xarope de banana e noz-mos-
cerca de 90ml cada. O nome cada. Diferente da piña cola-
é uma referência às duas da tradicional, nesta versão é
medidas de um dosador de utilizada uma técnica chamada
coquetéis, com volumes de milk punch, feita a partir da ex-
50ml e 25ml. tração de notas sensoriais (sa-
bor, aroma e acidez) de frutas
Por enquanto há oito rótulos em um processo de clarificação
disponíveis: Pin-up Colada, Ne- que deixa a bebida translúcida.
groni Cacau, Rabo de Galo,
Negrocho, Negroni Jerez, Bitter Já o Negroni Cacau é um drin-
Mule, Smoked Old Fashioned que com muita personalidade,
e Caju Tônica. Cada garrafa feito da junção de gin com
traz na embalagem as orien- infusão de nibs de cacau, ver-
tações para melhor degustação mute, amaro e bitters*. O ca-
da bebida, como em qual copo cau, ingrediente brasileiro, dá
tomar e com o que misturar. muita originalidade e um toque

129
Prato Firmeza Preto

de amargor suave nessa releitu- continuar na luta por um em-


ra do clássico italiano. Preferi- preendimento comandado por
do de Paulo, é também o mais pessoas negras.
pedido. A bebida esquenta
por dentro e o recomendado é Seguindo o próprio slogan da
que se tome em um copo baixo marca, “Dose a vida do seu
com gelo e pedaços de laran- jeito”, Xan e Paulo inspiram ou-
ja-bahia, segundo as instruções tras pessoas pretas como exem-
no rótulo. plo de uma história de vida que
aponta para possibilidades fe-
Aberto para pedidos desde lizes e positivas. Ao unir potên-
maio de 2020, o 50/25 conti- cias e se fortalecer de maneira
nua crescendo. Os planos de recíproca para administrar a
um espaço físico no futuro tam- vida, a empresa, os dois filhos e
bém continuam, com a linha de o cachorro, o casal mostra que
engarrafados garantida. suas doses têm dado muito cer-
to. Quem experimenta garante.
Paulo inclusive afirma que as
manifestações do movimen- * Extrato de essências herbais que
fixam o gosto amargo ou agridoce e
to Black Lives Matter (Vidas traz complexidade aromática para o
Negras Importam), que acon- coquetel, como se fossem “temperos”.
teceram em junho em diversas
partes do mundo reforçaram
para ele a importância de

130
Black Business

SERVIÇO
São Caetano do Sul

(11) 94602-6313

R$ 90,00 a R$ 115,00

Cartões de débito, crédito


(em até 3x) e transferência
bancária (Itaú e Santander)

@50vintecinco

/50vintecinco

Pedidos por WhatsApp.


As vendas são realizadas
por lotes, com entregas
para todo o Brasil.

Fotos: Gabrielly Oliveira/Divulgação/


Acervo pessoal de Paulo e Xan Ravelli

131
Prato Firmeza Preto

TEMPERADO
COM SAÚDE
LEVINHO FIT
Por Carolina Messias, da Periferia em Movimento

DA COZINHA DE CASA PARA AS MESAS


E REDES SOCIAIS DO PÚBLICO, GISA
INFLUENCIA SEGUIDORES E CLIENTES
A TER UMA VIDA MAIS LEVE E FITNESS

Na rotina de Gisele de Oliveira, 41 anos, a saúde sempre foi posta à


mesa. Filha de uma bailarina e de um personal trainer, Gisa, como é
conhecida, tem rotina de atleta. Nadadora desde criança, ela tam-
bém pratica corrida desde 2010 e participa de competições de rua.

132
Black Business

Já esteve em dez meias-mara-


tonas e fez centenas de pro-
vas de 5km, 10km e outras
distâncias. Por isso, os hábitos
saudáveis invadem a cozinha,
e acabaram se tornando um
negócio: o Levinho Fit.

Tudo começou em 2017, quando


Gisa trabalhava como motoris-
ta de aplicativo. Ela não estava
recebendo tão bem quanto já
havia recebido e foi assim que,
Paulo, e muito conhecida por
com R$ 200, foi ao sacolão
todos e todas na região, ela
mais próximo de casa, comprou
preparou vinte marmitas e saiu
ingredientes e fez seu famo-
pelos comércios da movimenta-
so escondidinho de carne-seca
da avenida Nossa Senhora do
no pote. A escolha foi óbvia:
Sabará. Em duas horas, vendeu
o prato era conhecido e mui-
todas as unidades e triplicou o
to elogiado por seus amigos
valor investido.
e familiares.

Nascida e criada no Cam- “Teria vendido mais rápido


se não ficasse batendo papo
po Grande, zona Sul de São com todo mundo.”

133
Prato Firmeza Preto

No fim do dia, Gisa separou inusitada, mas estava muito


o dinheiro em três partes: boa. A lentilha não é pesada e
guardar, pagar as contas de estava sem caldo, o que com-
casa e comprar novos ingre- binou com a textura da torta,
dientes para o dia seguinte. mais sequinha também. Por
Ela administra o dinheiro da último, comi arroz com frango
mesma forma até hoje. Com no estilo tailandês, que leva
isso, comprou novos ingredien- pimentão em fartos pedaços.
tes, diversificou o cardápio e O tempero caiu muito bem.
começou a vender marmitas de O objetivo é esse mesmo: cozi-
outros sabores. nhar para todos os gostos, pro-
vando que se alimentar bem
O preparo dos alimentos segue não significa deixar de comer
o protocolo saudável “padrão o que gosta.
casa da Gisa”: sem excessos de
óleo ou sal, bem-temperados e Nosso entregador
Vandson e sua esposa
com bastante alho. Ao provar Edirlane também experi-
a saborosa marmita de arroz, mentaram uma marmita de
cuscuz com carne-seca
feijão, carne de panela e couve, e brócolis e gostaram
senti logo o sabor de comida bastante: “Nós adoramos.
Muito boa mesmo.”
caseira, feita na hora. Outro
prato que experimentei era de
Com uma clientela fixa, toda
lentilha com torta de frango. A
semana a chef envia o cadápio
combinação me pareceu bem

134
Black Business

com quatro pratos difer-


entes aos clientes por meio de
uma lista de transmissão no
WhatsApp. Cada kit vem com
dez ou doze marmitas. Com or-
gulho, ela diz que nunca repe-
tiu o cardápio desde o início do
negócio e busca sempre inovar
as opções.
Então, com apenas um celular,
A rotina na cozinha também um tripé e a ajuda da filha,
invadiu as redes sociais, que ela começou a gravar vídeos
Giza utilizava para falar da e a publicá-los nos canais. O
vida fitness. Com quase 40 mil sucesso atraiu a atenção de
seguidores, somando as pági- empresas de diversas regiões
nas no Facebook, Instagram do país e de diferentes seg-
e YouTube, ela é uma influen- mentos, desde supermercados
ciadora digital e embaixadora a fabricantes de iogurtes, que
de marcas esportivas. Quando começaram a enviar produtos
começou a fazer as marmitas para que ela produzisse recei-
e divulgar na internet, muitas tas saudáveis com eles.
seguidoras passaram a pedir
receitas dos pratos. A visibilidade gerou uma ou-
tra demanda: a de consultoria.

135
Prato Firmeza Preto

Além de ser personal chef e criar pratos exclusivos, principalmente


para o público vegano, Gisa também oferece dicas e cursos voltados
sobretudo para mulheres em busca de liberdade financeira.

“Ensino passo a passo de como montar seu negócio em casa e


tudo que aprendi como cozinheira e empreendedora.”

Comida na mesa, receita na tela e o passo a passo para quem quiser


fazer igual: com a Levinho Fit, Gisa oferece o pacote completo para
ter uma vida mais saudável.

Fotos: Carolina Messias/Acervo


pessoal de Gisa Oliveira

136
Black Business

SERVIÇO
Campo Grande

(11) 98435-5435

Kits entre R$ 130,00


a R$ 170,00

Segunda a quinta,
das 9h às 18h

Transferência bancária
(Santander) ou pagamento
on-line via Mercado Pago nos
cartões de débito e crédito,
PicPay, PayPal e AME Digital

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@levinho.fit
@runnergisa

/levinhofit

/gisasportube

Pedidos devem ser feitos pelo


WhatsApp e são agendados
conforme a ordem de chamada.
A produção é feita em um dia
e entregue no dia seguinte.
Entregas em toda a cidade de
São Paulo. Taxa fixa de R$ 20,00.

137
Prato Firmeza Preto

MESA CHEIA DE COMIDA


FARTA E SOFISTICADA
PARA O POVO NEGRO
MESA CHEIA
Por Priscila Reis, da Preto Império

THAYNÁ TRAZ FRESCOR E REQUINTE ÀS SUAS


RECEITAS E SONHA EM UM AMBIENTE EM
QUE PESSOAS PRETAS SE SINTAM À VONTADE

O Mesa Cheia, idealizado pela empreendedora Thayná Ferreira


Paulino, 23 anos, tem o objetivo de mostrar como usar, de diversas
formas, ingredientes que estão muito presentes na vida de pessoas
em vulnerabilidade social e periféricas. A proposta é fazer render
receitas incríveis e sofisticadas, gastando pouco e comendo bem.

138
Black Business

Entre os principais pratos do


estabelecimento está a delicio-
sa torta de abacaxi com panna
cotta de coco. A panna cotta é
uma sobremesa típica italiana,
elaborada a partir da nata do
leite, açúcar e gelatina. Nessa
versão, vem com massa de fubá
e aveia, que dá uma sensação
de crocância e que ao mesmo
tempo se desmancha na boca,
diferente dos doces tradiciona-
is que geralmente encontramos
em qualquer padaria. Thayná sempre gostou de
cozinhar. Filha do seu Edson,
O Mesa Cheia também que trabalhou como dedetiza-
oferece bolo de milho cremoso dor a vida inteira e de dona
com coco e calda de goiaba- Ednalva, que trabalhava como
da, além de opções de pra- doméstica, expressa o quan-
tos salgados, como a torta de to percebeia o desejo dos
frango e o maravilhoso arroz pais para que ela e as duas
com carne de porco. Ótimos irmãs fizessem uma boa
pedidos para quem aprecia faculdade e tivessem uma
novos sabores. vida próspera.

139
Prato Firmeza Preto

A empreendedora conta que


sentia certa apreensão por par-
te de seu pai por ela gostar e
desejar trabalhar “na cozinha”.
Para ela, esse incômodo estava
de alguma forma relacionado a
função de “servir” e, consideran-
do como os negros são vistos e
julgados na sociedade em que
vivemos, ele não gostaria de
vê-la naquela posição.

Por isso, Thayná cursou serviço relacionados à alimentação


social durante dois anos e, de- na Idade da Pedra e passou a
pois, um semestre de publici- entender a gastronomia como
dade e propaganda. Conta que algo que vai além de simples-
não se julgava boa aluna, pois mente cozinhar, aprendeu so-
nunca estava satisfeita, não era bre a cultura de se alimentar
o que desejava para sua vida, e como chegamos nos dias de
mas foi nas aulas de eventos hoje. Então, se viu pensando em
da faculdade que encontrou cursar a faculdade de gastrono-
sentido em uma das disciplinas mia. Chegou a tentar bolsa em
que falava sobre gastronomia. algumas instituições, mas não
Começou a ler alguns textos obteve tanto sucesso quanto

140
Black Business

gostaria, pois é um curso caro A empreendedora, que rela-


e pouco acessível. ciona o acesso à alimentação
de qualidade e diversificada
Ela trabalhava em eventos à saúde física e mental, tes-
como garçonete e, com as di- tou diversas receitas e foi aos
ficuldades impostas pela pan- poucos encontrando o que mais
demia do coronavírus, a si- tem a ver com seus ideais. Uti-
tuação ficou muito complicada. liza ingredientes frescos, como
Seu companheiro, que tem um abacaxi e coco, com a propos-
trabalho fixo, resolveu ajudá-la ta de criar receitas acessíveis
fazendo um pequeno investi- e saudáveis.
mento para que ela comprasse
alguns ingredientes e pudesse Com esse pensamento, Thayná
tirar esse empreedimento do busca compartilhar suas refle-
papel, em junho de 2020. xões por meio de sua empresa,

141
Prato Firmeza Preto

principalmente com pessoas ne- dem ter certo estranhamento


gras, desmistificando padrões ou não se identificarem. Thayná
preestabelecidos e quebrando acredita que o caminho é sem-
os limites alimentares dentro pre apoiar e fortalecer em-
do pensamento de que pode- preendedores negros, para
mos ou não consumir por mui- que haja a desconstrução de
tas vezes não ter acesso. padrões e estereótipos racistas
que ainda presenciamos nos
“Sonho em abrir um restau- dias de hoje.
rante bem bacana e cuidar
de tudo para que pessoas
como eu se sintam bem- Lembrando do pai, que adora-
vindas e à vontade em um
lugar sofisticado.” va fazer uma boa feijoada e
convidar os amigos e fami-
Ela gosta de ir a restaurantes liares para comerem juntos, a
mais caros para conhecer o que empreendedora conta que são
é servido, mas confessa que não propostas de refeições difer-
são lugares em que se sente entes da sua, mas adora ter
à vontade. sido criada em um ambiente
assim, cercada de amigos e fa-
Buscou uma artista negra para miliares, com uma Mesa Cheia.
desenvolver sua identidade
visual, que a fez usando a
imagem de uma pessoa negra,
mesmo sabendo que alguns po-

142
Black Business

SERVIÇO
Bairro dos Metalúrgicos -
Osasco

(11) 95057-1943

R$ 30,00 a R$ 50,00

Todos os dias, das 7h às 20h

Cartões de débito,
crédito, transferência
bancária e boleto

Opções ovolactovegetarianas

@o_mesacheia

Entregas às segundas
no período da manhã.
Os pedidos devem ser
feitos durante a semana.
Frete de R$ 5,00.

Fotos: Divulgação/Acervo
pessoal de Thayna Paulino

143
Prato Firmeza Preto

ACALENTO
QUE ENCANTA
SABORES DE FAMÍLIA
Por Camila da Silva, da Énois

O BUFFET SABORES DE FAMÍLIA APOSTA


NO CARDÁPIO PERSONALIZADO E RECHEADO
DE AFETO PARA A PRODUÇÃO DE EVENTOS

Entre as idas e vindas dos hospitais e cirurgias para tratar sua defi-
ciência, sempre tinha algo que confortava o coração de Teresinha
Maria durante a infância. A moradora da zona Leste de São Paulo,
hoje com 48 anos, conta que era o bolo de fubá cremoso de sua
avó – também Teresinha – que fazia os dias da criançada e do res-

144
Black Business

to da família cheios de amor


e cuidado. “Até hoje gosto de
fazer o bolo dela para os meus
filhos. É como se eu pudesse
reviver o amor da minha avó
e toda atenção que ela nos
dava”, relembra. E se as mel-
hores memórias afetivas estão
ligadas à culinária, o reconhe-
cimento profissional, também,
como mostra a história do
Sabores de Família. “Hoje eu entro em algu-
mas reuniões com grandes
empresas para oferecer os
Tendo como ponto-chave a sim- serviços e representar minha
plicidade na cozinha para en- própria marca, quem eu sou
cantar os mais variados gostos, e o meu trabalho. Isso fez
toda diferença e é motivo de
ela se formou em nutrição e foi satisfação e orgulho.”
de estagiária júnior à gerente
da cozinha na multinacional em Teresinha montou seu buffet com
que trabalhava. a ajuda do esposo e de pessoas
próximas. Depois da produção
Foi depois de ganhar seu segun- da primeira festa para uma
do filho, Fábio, que ela decidiu amiga, ela já fechou a agenda
ser dona do próprio buffet. inteira do mês seguinte. Foram

145
Prato Firmeza Preto

cerca de trinta encomendas


para eventos.

A mudança, como ela mesma diz,


foi de corpo, alma e coração, e lhe
ajudou a curar alguns traumas do
passado com a área. O Sabores
de Família nasceu em 2012 e Ter-
esinha contou com a ajuda da
mãe. Foram anos de curso e de
redes de contato que ela já tinha
para fazer o negócio crescer. O para pensar em tudo que vai na
Consulado da Mulher, um dos lu- festa, das coisas mais simples até
gares em que estudou, foi a porta as mais inusitadas. O que mais
de entrada para desenvolver tra- chamou a atenção nesse sen-
balhos em eventos de empresas, tido foi o repolho agridoce de
como Consul, Brastemp, além de um casamento. “O casal estava
realizar a festa junina da AACD com dificuldade de encontrar
e do Sesc Itaquera. um buffet que aceitasse montar
o casamento por ser uma união
Durante o desenvolvimento do homoafetiva. Até me pergun-
buffet ela explica que não quis taram com jeito se eu faria, mes-
ter um cardápio fixo. As conver- mo sendo evangélica. E assim, eu
sas com os clientes são essenciais fiz e o prato do casamento deles

146
Black Business

foi uma grande sensação”, conta


rindo. “Eu fiquei meio receosa de
misturar risoto com repolho agri-
SERVIÇO
doce, mas era uma memória afe-
tiva dos dois, então tinha que ter. Jardim Célia

E não é que deu certo?” (11) 9724-89417

R$ 50,00
Feito com vinho branco, o repolho
Cartões de débito e crédito
roxo agridoce tem um sabor tem-
perado e suave que não lembra Segunda a sábado,
das 9h às 22h
nem um pouco as salada de re-
polho que você pode estar acos- Opções ovolactovegetarianas

tumado. Usado como acompa- @saboresdefamiliabuffet


nhamento, ela dá a dica de que
Doces e salgados a pronta-
o sabor pode ficar ainda melhor entrega. Encomendas com
com carne de porco ou frango. Já pelo menos um dia de
antecedência.
o bolo da avó Teresinha, é feito
primeiro com o cozimento do
fubá, formando uma massa fo-
finha e crocante com gostinho de
erva-doce no fundo. A união de
carinho e sabor para os cafezi-
nhos e festas em família.
Fotos: Camila da Silva/Acervo
pessoal de Teresinha Maria

147
Prato Firmeza Preto

COMIDA SAUDÁVEL
COM FARTURA E SABOR
LILI COMIDA SAUDÁVEL
Por Priscila Reis, da Preto Império

SÓCIAS, LÍGIA E CHAYANNE


PROCURAM OBSERVAR COMO
AS PESSOAS SENTEM O CARINHO
DEPOSITADO POR ELAS A CADA RECEITA

Idealizado pelas sócias Ligia Silvestre da Silva, 33, e Chayanne


Barbanti Floriano da Silva, 28, o Lili Comida Saudável segue o
princípio de que um prato saudável também significa fartura e sabor.
Com uma variedade de pratos, o estabelecimento tem como um de

148
Black Business

seus destaques o nutritivo ham-


búrguer de grão-de-bico, feito
com farinha de aveia e grão-de
-bico e recheado com queijo e
um delicioso molho de tomate,
acompanhado por um mix de
legumes (cenoura, repolho
e abobrinha).

Além de pratos vegetarianos,


há receitas para os que apre-
ciam carne, como o hambúr-
guer feito com patinho, re- textura leve, deixa qualquer
cheado com queijo muçarela e cliente com um gostinho de
com um tempero inconfundível quero mais.
que deixa a receita extrema-
mente saborosa. Tem também O empreendimento existe des-
escondidinho de carne moí- de 2017. A ideia surgiu, ini-
da com purê de abóbora. Os cialmente, porque as sócias
pratos acompanham arroz in- adoram comer bem e viram a
tegral e legumes da estação, possibilidade de desconstruir
além de deliciosas sobremesas, no imaginário popular a ideia
como o muffin de cacau, com de que comer comida saudável
um sabor meio amargo e sua é sem graça ou só para quem

149
Prato Firmeza Preto

faz dieta. Para elas, comer bem


é viver bem, por isso, é preci-
so repensar os hábitos e fazer
uma reeducação alimentar.

“Queremos provocar as
pessoas a cozinharem e ver
que podem criar receitas na
cozinha e comer de forma
saudável”, diz Chayanne.

No início, as sócias cozinhavam


na casa da Lígia e, aos poucos,
conseguiram construir um es-
paço e comprar os equipamen- Então, elas criaram pratos
tos necessários para ampliar as novos como o baião de dois
vendas e estruturar o negócio. fit, feito com arroz integral e
O planejamento era fazer de carne-seca sem gordura. Com a
2020 o melhor ano para a em- divulgação do trabalho feita no
presa, mas com a pandemia boca a boca, a saída foi usar
do coronavírus, tiveram que se a criatividade e pensar em for-
readaptar. Com os clientes em mas de continuar funcionando.
isolamento social ou evitando E elas seguem assim, dividindo
ir aos restaurantes, houve uma uma história de amizade que já
grande redução de pedidos. dura dez anos.

150
Black Business

SERVIÇO
Lauzane Paulista

(11) 95907-4571

R$ 2,50 a R$ 12,00

Todas as bandeiras de vale-


refeição, débito e crédito

Segunda a sexta, das 10h


às 17h; fins de semana
das 8h às 19h.

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@lilisilvestrecomsaud

/ligia.silvestre.58

Entregas com entregador


próprio na capital e Grande
São Paulo, geralmente aos
fins de semana. Atendimento
apenas por delivery. Os pedidos
são por encomenda, semanal
ou quinzenal, e a entrega é
combinada com
o cliente.

Fotos: Priscila Reis/Acervo pessoal


de Chay Barbanti e Ligia Silvestre

151
Prato Firmeza Preto

NO CENTRO
NO CENTRO
As regiões centrais da cidade de São Paulo são conhecidas pelas
inúmeras opções culinárias, de diversas regiões do país, do mundo
e para todos os gostos. Ao entrar em algum restaurante em regiões
como o Bixiga ou Pinheiros, é comum notar que está em um espaço
majoritariamente branco e comandado por empreendedores e chefs
de cozinha brancos.

Não por acaso esses estabelecimentos refletem seus públicos-alvos,


que é a população mais rica e, inevitavelmente, a branca. Mas arris-
co dizer que isso está mudando e é o que este capítulo realizado pela
Alma Preta, agência de jornalismo especializada na temática racial
e parceira desta nova edição do Prato Firmeza, se propõe a mostrar.
Da ponte pra cá, nós já sabemos da potência da negritude em diver-
sos setores como o da gastronomia. Mas será que o centro da maior
metrópole do país também não abriga restaurantes que oferecem,
além de boa comida, é claro, uma legítima imersão na cultura
afrodiaspórica?

A resistência da cultura negra não se limita às barreiras geográficas


das quebradas. O que nem todo paulistano sabe é que as regiões

152
centrais também abrigam uma
série de opções gastronômi-
cas que possibilitam uma rica
imersão nas culturas afro-bra-
sileira e africana, para além
dos territórios elitizados.

Aqui, trazemos restaurantes, de


segmentos diferentes, liderados
por chefs negros e negras, que
encontraram na gastronomia a
oportunidade que precisavam
para gerar renda e trabalhar
com o que amam: proporcionar
experiências em forma de co-
mida. Bom gosto e aconchego
não faltam nesses empreendi-
mentos culinários e nos serviços
de entrega feitos por eles du-
rante a pandemia. Aproveite.

Nataly Simões,
da Alma Preta

153
Prato Firmeza Preto

SABORES DA ÁFRICA NO
CORAÇÃO DE SÃO PAULO
BIYOU’Z RESTAURANTE AFRO
Por Juca Guimarães, da Alma Preta

A CHEF CAMARONESA MELANITO BIYOUHA


UNE EM SEUS PRATOS DIFERENTES CULTURAS
E REGIONALIDADES DO CONTINENTE AFRICANO

A gastronomia africana oferecida pelo Biyou’z Restaurante Afro


é uma verdadeira aula de história e prazer culinário sobre as di-
ferentes culturas e regionalidades do imenso continente que fica do
outro lado do Atlântico, mas que tem uma ligação visceral com o
Brasil. O espaço charmoso, que existe desde 2007 na região cen-

154
No centro

tral de São Paulo, tem uma


decoração caprichada, colori-
da e um cardápio rico em de-
talhes sobre os pratos criados
pela chef camaronesa Melanito
Biyouha, de cinquenta anos.

A empresária chegou ao Bra-


sil em 2003 para fazer turismo
e percebeu que não haviam
restaurantes africanos na ci-
dade. Ela veio de Yaondé, a
capital da República de Ca- Melanito recebe alguns tempe-
marões, onde aprendeu a cozi- ros de lá para usar no restauran-
nhar com a avó, a mãe e a irmã te, como o ngansang, o mbongo
mais velha. Os ensinamentos e o messep. “O modo de mistu-
ancestrais foram complementa- ras desses temperos faz toda a
dos na escola de gastronomia. diferença entre um prato e ou-
Os ingredientes de seus pra- tro. São essas especiarias típicas
tos são os mesmos de várias da África que dão o colorido
regiões de Camarões e de ou- dos pratos”, diz.
tros países, a exemplo do kigaky
e do beguere, duas especiarias Para quem gosta da comida
muito utilizadas no continente. típica brasileira, os pratos do

155
Prato Firmeza Preto

Biyou’z trazem muitas simila- ser feito de arroz, é uma pasta


ridades, principalmente com consistente, ao estilo de purê.
a comida baiana. Sobre a A textura permite que seja cor-
criação de cada um, coloridos tado em fatias, mas tem quem
e bem-apresentados, prefira amassar e misturá-la
com o ensopado, que também
“Tento preservar as carac- é uma ótima escolha, pois a
terísticas regionais também,
que são significativamente pasta de milho harmoniza mui-
diferentes por conta da to bem com os temperos da
etnia e da região do povo
que criou a receita.” carne e da berinjela.

Entre as opções do cardápio, Entre as opções sem carne, o


está o ndjap, um ensopado sanga tem agradável sensação
de carne bovina com berinje- de comida baiana. É um re-
la, acompanhado de espinafre fogado de milho-verde com
refogado, fufu de milho e ca- couve no azeite de dendê. Uma
marão moído. É bem leve o refeição levemente apimenta-
sabor do camarão junto com da que vem acompanhada por
o espinafre, que dá cor e tex- arroz e cenoura cozida. Para a
tura para o prato. A berinje- sobremesa, uma boa opção é o
la e a carne são bem tempe- doce de mandioca, um creme
radas e têm um aroma muito denso com pouco açúcar e que
agradável. O fufu, acompanha- combina com todos os pratos.
mento base que também pode

156
No centro

“A cultura africana não tem baobá é uma árvore sagrada.


tradição de doces, então Tem muitos nutrientes e sub-
criei um inspirado no Brasil.”
stâncias medicinais. A polpa da
fruta pode ser feita com diver-
O restaurante também serve
sas combinações”, conta.
coquetéis e sucos típicos para
acompanhar as refeições. O
Melanito tem forte participação
suco de baobá com melancia
no cotidiano da comunidade
é refrescante e o sabor lembra
africana do centro de São Pau-
um pouco o gosto do tama-
lo. Ela busca a integração com
rindo, porém, mais encorpado.
a cidade e a aproximação das
“No continente africano todo, o

157
Prato Firmeza Preto

culturas. O perfil dos clientes do


Biyou’z reflete essa pluralidade
e riqueza de pensamento con-
tra a exploração e a favor da
união. Aos fins de semana, as
mesas estão sempre cheias de
turistas estrangeiros, pessoas
que estão a passeio pelo cen-
tro e africanos com saudades
de casa. Nos dias da semana, como Gana, Nigéria e Costa
é frequentado por moradores do Marfim.
da região e trabalhadores
do entorno interessados na Ponto de encontro e de con-
variedade gastronômica que vergências culturais para quem
São Paulo oferece. quer entender mais sobre o
continente africano, o Biyou’z
É contagiante a simpatia e o mistura tradição com inovação
entusiasmo do garçom Victor, e seu sucesso é um exem-
de Camarões, ao explicar que plo para os empreendedores
os funcionários do Biyou’z são que buscam vencer com a sua
de Senegal e de Camarões, própria identidade.
mas que também conhecem
as histórias e a gastronomia
tradicional de outros países,

158
No centro

SERVIÇO
Alameda Barão de Limeira, 19

(11) 3221-6806

R$ 50,00 a R $ 60,00

Segunda a sábado,
das 12h às 17h

Cartões de débito,
crédito e vale-refeição

Opções veganas

@biyouz_restaurante_
africano

/biyouzresto

biyouzrestauranteafricano.
com.br

Pedidos por telefone, iFood


e Rappi. As entregas são
realizadas na região central
de São Paulo.

Sim

Fotos: Juca Guimarães/Divulgação/


Acervo pessoal de Melanito Biyouha

159
Prato Firmeza Preto

ROBIN HOOD
DA GASTRONOMIA
PRETO COZINHA
Por Guilherme Soares Dias, da Alma Preta

FRED SERRA FAZ SUCESSO AO VENDER


QUENTINHAS FEITAS EM APENAS QUATRO
PANELAS DA COZINHA DO APARTAMENTO

O negócio do cozinheiro Fred Serra, 28 anos, surgiu em março de


2020, em seu apartamento no Bixiga. A intenção inicial era oferecer
cursos e cozinhar na casa das pessoas, já que não estava satisfeito
trabalhando em restaurantes e pretendia realizar algo voltado à
população negra, invisibilizada pelo elitismo da “alta” gastronomia.

160
No centro

“A intenção era oferecer


algo mais palpável para
essas pessoas.”,

Carioca, Fred queria voltar


para o Rio de Janeiro e lançar
o negócio por lá, mas com o
isolamento social decretado
na capital paulista por conta
da pandemia do coronavírus,
o chef ficou “preso” e começou
a fazer quentinhas. Assim nas-
ceu o Preto Cozinha, que utili-
za a estrutura caseira da sua
cozinha, com ingredientes de
O cozinheiro diz que faz com-
fornecedores do próprio bairro,
fort food e serve comida bra-
para alimentar outros lares.
sileira com técnicas que apren-
“Só tenho quatro deu pelos lugares que viajou e
panelas”, diz, ressaltando
que prepara pratos conheci- trabalhou. A maior inspiração
dos. “As pessoas consomem é a comida de infância. Tem
aquilo que conhecem. prato que o irmão gostava,
Comida é família, é fazer
algo com paixão para mas também dos lugares que
quem você gosta.” visitou. Hoje, o carro-chefe é a
feijoada servida aos sábados,

161
Prato Firmeza Preto

162
No centro

feita com carnes frescas e lin- Para a sobremesa, o bolo de


guiça, de textura leve e cremo- cenoura com cobertura cre-
sa. Os temperos trazem o gos- mosa de chocolate é doce na
to do louro acrescido de alho, medida certa. Outra criação
sal e pimenta dedo-de-moça. do chef é a tapioca com doce
De acompanhamentos, arroz de leite e farofinha de coco tor-
branco, couve, laranja e torres- rado. A tapioca, mais grossa
mo de barriga. e granulada (servida também
como dadinho de tapioca) é
Durante a semana, o prato cozida com a mesma medida
que mais sai é a marmita de de leite, leite de coco e açúcar.
frango com quiabo. A refeição A farofa é feita de coco em flo-
traz sobrecoxa sem pele corta- cos desidratado com castanha,
da em cubos e refogada com torrado na manteiga e açúcar.
cebola, tomate, cenoura, alho, Fred atua na gastronomia des-
louro e coentro em pó, acom- de 2010 e já trabalhou na Casa
panhado por quiabos tostados. de Francisca, teatro com músi-
Já a carne de panela é corta- ca ao vivo que oferece petiscos
da miúda e acompanha molho e pratos italianos, e no Balaio,
de cerveja preta, o que a torna no Instituto Moreira Salles, que
bem temperada e saborosa. O serve uma mescla das culinárias
feijão fresco parece feito por do país, com destaque para a
avó, enquanto a farofa dá um cozinha sertaneja. Atualmente
toque especial. trabalha sozinho e afirma que

163
Prato Firmeza Preto

está aprendendo a lidar com diz. Fred considera que sua


os números. comida e seu trabalho é para
todos e se classifica como “Ro-
“Tenho umas planilhas. bin Hood da gastronomia”.
Eu sou muito avó, tenho
tudo anotado e uma conta
separada para o negócio.”

O cozinheiro diz que ter um


negócio é difícil, já que antes
era preciso se provar cozinheiro
e, agora, precisa também da
validação de que é capaz de
empreender.

“As pessoas acham que


tenho uma equipe.
É um perrengue, que
poderia ser desanimador,
mas dá um gás.”

O público que consome o Preto


Cozinha é quem está em busca
de comida com afeto. “É a pes-
soa que sente falta de comer
algo que faça lembrar algum
momento importante da vida”,

164
No centro

SERVIÇO
Bixiga

(11) 98437-3492

R$ 30,00 (prato indivídual de


massa) a R$ 160,00 (kit com
sete refeições de 400g)

Segunda a sábado,
das 9h às 19h

Transferência bancária
(Nubank), boleto e PayPal

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@pretocozinha

Pedidos por WhatsApp


e Instagram. Entregas
às segundas e sextas,
em um raio de até 15km.

Fotos: Guilherme Soares Dias/


Divulgação

165
Prato Firmeza Preto

COMIDA CRIATIVA
PARA VEGETARIANOS
EM TRANSIÇÃO

TOYA VEGAN
Por Juca Guimarães, da Alma Preta

RESTAURANTE TOYA VEGAN SERVE PRATOS


VEGETARIANOS, COM BAIXO CUSTO E PREÇO
JUSTO PARA QUEM É VEGETARIANO OU ESTÁ
EM PROCESSO DE DEIXAR A CARNE

Cria do Jaçanã, famoso bairro da zona Norte de São Paulo, a chef


Selma Lopes, 55 anos, é vegetariana e proprietária do restauran-
te Toya Vegan, localizado na região central de São Paulo. O em-
preendimento se dedica a servir comida criativa, acessível, feita com

166
No centro

amor e sem nenhum produto de


origem animal.

“Eu quero mostrar para as


pessoas que é possível fazer
uma comida saborosa, com
custo baixo e preço justo”,
explica a chef, que admi-
nistra o negócio com a ajuda
dos filhos.

O restaurante existe na região


da Consolação desde julho de
2018. O nome “Toya” é uma
homenagem ao cachorrinho da
proprietária que morreu. “Eu sanduíche de jaca louca, a co-
não encontrava nenhum nome, xinha de alcachofra, o bauruzi-
era para ser Tia Selma, mas eu nho, a “salsicha” de amendo-
não queria. Então o meu filho im e o “bife” de berinjela. O
teve a ideia de homenagear o cardápio do Toya Vegan capri-
nosso cachorrinho. Depois de- cha na variedae dos pratos e
scobri que Toya também sig- na atenção ao cliente.
nifica flor de pessegueira”, com-
plementa. A propaganda boca Quem está na transição para
a boca ajudou a popularizar al- mudar a alimentação, um pro-
guns pratos, como a feijoada, o cesso que para muitos não é

167
Prato Firmeza Preto

fácil, fica com a memória dos De família adventista, Selma é


pratos e lembranças afetivas vegetariana desde criança por
de momentos felizes em relação um hábito passado de geração.
aos hábitos deixados para trás. “A minha avó era adventista
Para isso, a chef tem a solução: e trabalhou por muitos anos
como cozinheira. Ela me criou
“Na opção vegana, esse e também me ensinou a cozi-
cliente quer sentir uma
semelhança na textura, nhar”, lembra.
no sabor e na aparência.
Por isso, eu sempre
procuro fazer o mais Ao conferir o cardápio, fiquei
parecido possível”, curioso para provar a feijoada,

168
No centro

que mesmo na versão vegetari- Os doces e bolos do Toya Ve-


ana tem a aparência clássica das gan são uma história à parte.
melhores feijoadas de São Pau- As conversas com os clientes e
lo. O caldo do feijão com pe- as lembranças das receitas de
dacinhos de proteína e linguiça família são fontes para criações
de soja são bem temperados e como sonho, torta de banana
combinam perfeitamente com bolo de abacaxi com coco, que
o arroz integral e a farofinha. é o preferido da dona Selma.
A couve refogada é cortada A cobertura não é muito doce,
fininha e tem um aroma ímpar. o que ressalta o sabor dos pe-
Outro ponto forte é a man- dacinhos de abacaxi. O segre-
dioca frita sem excesso de óleo. do da massa bem fofinha ela
Saladinha de alface crocante e não revela a ninguém.
tomate fresquinho ou salada de
maionese acompanham. No Toya são servidos pratos
feitos na quantidade ideal para
Outro prato que mantém toda matar a fome. Um PF que pode
a semelhança, sabor e textura ser chamado de Prato Firmeza
é o espeto de legumes, proteí- tanto pelo preço quanto pela
na de soja, cenoura, cebola e quantidade de comida sabo-
pimentão acompanhado de um rosa. No marmitex para levar
arroz soltinho, salada de maio- ou no delivery, as porções tam-
nese e farofa. bém são generosas e a apre-
sentação é caprichada. O Toya

169
Prato Firmeza Preto

fica dentro de uma galeria, e o salão, localizado na parte de cima


do restaurante, é bastante tranquilo e silencioso. Ideal para quem
quer curtir um refeição de maneira mais calma e dar um tempo na
agitação e barulho do centro da metrópole.

Dona Selma se preocupa com cada detalhe do restaurante para que os


clientes aproveitem ao máximo a experiência de um cantinho simples e
aconchegante, em que a principal estrela é a comida saudável
a preço justo.

170
No centro

SERVIÇO
Rua da Consolação, 331

(11) 98214-7130

R$ 25,00 a R$ 35,00

Segunda a sexta, das 11h às


18h; domingo, das 11h às 19h

Cartões de débito,
crédito, vale-refeição e
transferência bancária (Itaú)

Cardápio totalmente vegano

@toyavegan

/toyavegan

Pedidos por WhatsApp.


Entregas em um raio de
4km. Encomendas de bolos
e salgados devem ser feitas
com pelo menos três dias
de antecedência.

Sim

Fotos: Juca Guimarães/Acervo


pessoal de Selma Lopes

171
Prato Firmeza Preto

SUSTENTABILIDADE,
DIVERSIDADE E AFETO
DENTRO E FORA DO PRATO

FREE SOUL FOOD


Por Beatriz Mazzei, da Alma Preta

COMANDADO POR MÃE E FILHA, RESTAURANTE


CONTA COM COZINHA TOTALMENTE FEMININA
E EMPREGA MULHERES NEGRAS E IMIGRANTES

Como entusiasta da comida saudável e livre de proteína animal,


a Free Soul Food ganhou toda a minha atenção quando vi que
ofereciam – por um precinho justo – uma variedade de opções
veganas, vegetarianas e low carbs feitas da forma mais
artesanal possível e utilizando ingredientes frescos. Esse é justamente

172
No centro

o propósito compartilhado en- a dupla também comparti-


tre as donas do restaurante: lha a realidade das restrições
mostrar que uma alimentação alimentares. Janete é diabéti-
saudável pode ser deliciosa ca e Maíra tem intolerante à
sem quebrar o bolso. lactose, logo, a alimentação
saudável sempre foi presente
Comandado por mãe e filha, na mesa da família. Juntas, elas
a Free Soul Food nasceu em levaram suas receitas para
2016 como um desejo de Janete outras pessoas por meio do
da Costa, 63 anos, que estava empreendimento.
aposentada na época. “Quan-
do a minha mãe disse que que- Em formato de delivery e
ria abrir um restaurante, eu buffet para eventos, a Free Soul
achei maluquice”, conta Maíra Food contempla veganos, vege-
da Costa, 38 anos, que hoje é tarianos, intolerantes a glúten
tão apaixonada pelo negócio ou lactose, diabéticos ou sim-
quanto a mãe. “Trabalhar entre plesmente pessoas que buscam
mãe e filha tem vários desafios, uma comidinha bem tempera-
mas o convívio entre gerações é da e com alto valor nutricional.
algo muito bonito, que faz com “A ideia não é necessariamente
que a gente vá superando as ser vegetariano ou vegano, mas
tensões”, considera Janete. pregar por uma alimentação
que abra menos pacotes e tire
Além do amor por cozinhar, mais alimentos da terra”, conta.

173
Prato Firmeza Preto

Contudo, não foi apenas o tem- uma situação muito precária


pero e a criatividade das duas na rua das empreendedoras
que fez o negócio ganhar o es- trabalhando com costura. Na
tômago da clientela: a comida Free Soul Food, ela teve uma
oferecida é tão diversa e verda- oportunidade de obter renda e
deira quanto as mãos de quem ganhou mais autonomia para
a produz. Na cozinha, o time é viver na cidade. Outras vieram
composto apenas por mulheres depois, a partir de uma par-
majoritariamente negras e imi- ceria com a Casa na Luz, ini-
grantes, que vieram do Haiti, ciativa que acolhe e capacita
Angola e Venezuela. imigrantes em São Paulo. Na
cozinha, essas mulheres levam
“Eu e minha mãe somos consigo os sabores e a cultu-
mulheres negras e desde o
começo pensamos em criar ra de onde vieram, como é o
um empreendimento que exemplo da sobremesa desen-
gera integração econômica
para as nossas. Quando volvida pela Katheryn, do Hai-
você compra um produto ti. Bem refrescante, a geleia de
nosso, está ajudando um
casca de maracujá tem aquele
ecossistema feminino e,
em sua maioria, negro”, sabor que dança entre o aze-
salienta Maíra. dinho e o doce.

Essa jornada veio por aca- Entre as opções do cardápio, a


so. Começou com Domingas, “carne” de jaca é um dos des-
uma angolana que vivia em taques. Para quem quiser pro-

174
No centro

var, a dica é o hambúrguer de nese vegana casam perfeita-


jaca, feito apenas com ingre- mente com o pão supermacio,
dientes artesanais e sem pro- também artesanal. Para com-
dutos de origem animal. De pletar, batata-doce rústica
primeira, me impressionou o ta- temperada com ervas acom-
manho, que desmonta qualquer panha. De sobremesa, me senti
hipótese de que veganos pas- na mesa da cozinha da Maíra
sam fome. O hambúrguer vem quando passei um café e expe-
grelhadinho com gosto de feito rimentei a cocada, que é uma
na chama. A textura suculenta receita da dona Benedita, avó
somada ao catchup e à maio- materna da empreendedora.

175
Prato Firmeza Preto

Em resumo, minha experiên-


cia com a Free Soul Food foi
construída em etapas. Pri-
meiro, ganharam a minha
atenção, depois o estômago e,
ao conhecer toda a história do
negócio, levaram meu coração,
afinal, é uma uma empresa que
diz muito sobre ancestralidade
e cooperação entre mulheres.
Com as funcionárias, Janete
acrescenta que sente uma cul-
tura em que o papel da mãe
Os doces – todos veganos e é muito importante. “Todo esse
sem glúten – vieram com uma clima deixa a empresa mais
colherzinha e um garfinho de humana”, detalha. A matriarca
madeira, e o hambúrguer che- do negócio mostra que não é à
gou aqui em casa em uma em- toa que o empreendimento car-
balagem biodegradável. Elas rega “soul” no próprio nome: é
também incentivam o retorno realmente comida que alimenta
das embalagens de vidro com a alma.
descontos, cuidando não só
das pessoas, mas também do
meio ambiente.

176
No centro

SERVIÇO
Avenida Santos Dumont, 33,
Luz (apenas retirada)

(11) 98372-9986

Segunda a sexta,
das 11h30 às 15h

Cartões de débito,
crédito e vale-refeição

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@freesoulfood

/freesoulfood

freesoulfood.com.br

Pedidos personalizados.
O contato pode ser feito por
telefone, site, redes sociais,
iFood e Uber Eats

Fotos: Beatriz Mazzei/Acervo


pessoal de Janete e Maíra da Costa

177
Prato Firmeza Preto

O CHEIRO, GOSTO
E ACONCHEGO DA
CHAPADA DIAMANTINA

CASA DE IEDA
Por Guilherme Soares Dias, da Alma Preta

IEDA MATOS ENTREGA


EM SEUS PRATOS A “COMIDA
DE RESISTÊNCIA” INSPIRADA
NA CULINÁRIA BAIANA

Um restaurante para vinte pessoas com a cozinha sem divisórias


onde a chef Ieda Matos, 48 anos, fica a poucos metros dos clientes.
Assim é a Casa de Ieda, em Pinheiros, na zona Oeste de São Paulo.
Ela classifica a própria comida como “resistência e história”.

178
No centro

“É uma comida que lembra e o Ensino Médio e, em segui-


família, não é só para matar da, fez um curso técnico de
a fome, mas para chegar
no estômago e passar uma gastronomia, mas por ser uma
mensagem de amor. As pes- “mulher negra, nordestina, vin-
soas precisam desse abraço
por meio da comida.” da da roça”, a cobrança era
grande. Por isso resolveu mon-
Aos 17 anos, o olhar de Ieda tar o próprio negócio.
despertou para a cozinha e ela
começou a cozinhar informal- Começou com uma kombi, na
mente. Filha de agricultores, ela onda de food trucks na cidade
cresceu na roça e depois migrou de São Paulo, onde duran-
para Utinga (BA), na Chapada te três anos serviu comida de
Diamantina. A família planta- diferentes estados do Nordeste.
va o próprio alimento em uma
“O negócio deu certo,
cultura de subsistência e tinha mas saturou e eu não estava
uma casa de farinha. O proces- satisfeita. Isso me fez muito
mal. Perguntava: ‘Até quan-
so faz parte da bagagem e da do vou me esconder?’”
memória afetiva da cozinheira,
que viu desde cedo a produção Nesse momento, ao passar pelo
de doces, bolos e pães. ponto que fica em Pinheiros, ela
viu a placa de “aluga-se” e de-
Quando Ieda fez 33 anos, ter- cidiu abrir o restaurante, como
minou o Ensino Fundamental forma de contar a sua história

179
Prato Firmeza Preto

por meio da gastronomia com dona Nena, 85 anos, que


da Chapada. A inspiração veio cozinha há mais de cinquenta.
de uma viagem que fez para Ela disse para eu fazer a comi-
Mucugê, na Bahia: “Conversei da que comia na roça.”

180
No centro

Desde 2017 o restaurante de entrada, tem massa ma-


serve pratos como arroz de cia e combina com o molho
garimpeiro, pirão de leite com de melaço com pimenta que
carne assada e o godó, um gui- o acompanha. A cocada de
sado de carne de sol com ba- forno tem sabor diferente da
nana-verde que nasce de uma tradicional vendida nas ruas,
região “onde a fome não espe- sendo menos doce e com
ra amadurecer”, o que faz com textura mais cremosa.
que as frutas e verduras sejam
servidas mesmo verdes. O restaurante tem estrutura
familiar e quem faz a adminis-
“Vocês chamam de picadinho
e nós de cortado. Eu dei uma tração é o marido de Ieda, José
nova roupagem. Faço com
carne de sol, linguiça defu-
mada, banana-verde picada
e sirvo com maxixe.”

O prato traz arroz vermelho


misturado a carne de sol pic-
ada bem miúda, junto com
o gosto peculiar trazido pela
banana-verde. A cada garfa-
da o prato vai se revelando
uma mistura saborosa. Já o
bolinho de estudante, servidor

181
Prato Firmeza Preto

Carmo de Oliveira, 43 anos, atravessar momentos mais difí-


responsável por cuidar da do- ceis de forma mais tranquila.
cumentação, notas e planilhas.
O filho Everton Matos, 30 Aconchegante, o restaurante
anos, também fez técnico de foi o meio que a chef encontrou
gastronomia para atuar junto para resgatar suas raízes no in-
com a mãe na cozinha. terior da Bahia. Ela faz questão
de chamar o espaço de casa,
O fato de ser uma cozinheira assim como prefere denominar
negra traz desafios como o quem come de visitante e não
de ter que se provar boa di- de cliente, elaborando um con-
ariamente e também de ser vite para que a todos e todas
questionada se realmente é a se sintam realmente em casa
dona do restaurante. “É uma a partir da vivência – e do
provação todo dia”, reitera. paladar – dela.

Ieda morou em Salvador por


cinco anos, é abiã do can-
domblé e durante a pandemia
do coronavírus tem investido na
venda de acarajé, uma comida
ritual da orixá Iansã, duas vez-
es por mês. A ancestralidade
africana também lhe ajuda a

182
No centro

SERVIÇO
Rua Ferreira de Araújo,
841, Pinheiros

(11) 97712-0924

Quinta a sábado,
das 12h30 às 15h

R$ 35,00

Transferência bancária
(Bradesco e Santander),
boleto, cartão de débito
e crédito (retirada)

Opções ovolactovegetarianas
e veganas

@casadeieda

Pedidos pelo aplicativo


GoomerGO

Sim

Fotos: Guilherme Soares


Dias/Acervo pessoal de Ieda Matos

183
Prato Firmeza Preto

DE QUEBRADINHA
DE QUEBRADINHA
Negócios locais e pertencimento

Todo mundo tem alguma memória afetiva ligada ao lugar por onde
passou ou morou. Eu me lembro muito da quitanda do Adalto, que
ficava no pé do morro do bairro em que eu morava, em Mogi das
Cruzes (SP). Ainda criança, buscava para a minha mãe o pão do
café da tarde, meia dúzia de ovos ou gastava lá todas as minhas
moedas em chicletes coloridos e azedos. Bons tempos. Até hoje, quan-
do passo por perto, olho a quitanda com carinho. Agora ela já não é
mais do seu Adalto, e nem tão pequena como antes. Mas sempre vou
sentir saudade daqueles tempos toda vez que visitar o lugar.

Empreendedores pretos tem colaborado efetivamente com a for-


mação dessas memórias afetivas nas quebradas. Neste capítulo, você
vai se encantar com as histórias de chefs e pratos criados e pensados
para o público das quebradas. São pessoas que carregam no nome
do negócio as características de um bairro.

Comida rápida como lanches e espetinhos, para saborear com amigos


durante uma partida de futebol, em casa com a família aos fins de

184
semana ou só para vivenciar
o bairro mesmo. Bem-vin-
de a quebrada! Aqui tem
comida boa, gente talentosa
e muito afeto.

Jamile Santana

185
Prato Firmeza Preto

CHURRASCO
A SEMANA INTEIRA
O CHAPA CHURRASCO
Por Laís Diogo, da Periferia em Movimento

COM 17 OPÇÕES DE ESPETINHOS NO CARDÁPIO,


EMPREENDEDOR DO GRAJAÚ GARANTE SABORES
QUE LEMBRAM MOMENTOS DE DESCONTRAÇÃO

Pagode lá no alto, fogo na brasa, fumaça subindo, cerveja trincan-


do de gelada. Chega com a farofa que a carne tá quase no ponto.
Ahh, churrasco tem sabor de celebração, é a desculpa perfeita para
reunir a família ou os amigos. O complicado é o preparo: corrida
no supermercado para agilizar as compras, o quintal todo sujo de

186
De quebradinha

carvão... Por isso, esse tipo de “Tivemos a ideia de mon-


evento muitas vezes se restringe tar um espaço onde o
carro-chefe pudesse ser
ao almoço de domingo ou à so- espetinhos gourmet que
cial do sabadão. atendessem os nossos pa-
ladares, em um bom ambi-
ente, com preços acessíveis
Para descomplicar o rolê, em e em nossa região.”
2017, Júlio César Cardoso
Silva, 39 anos, abriu O Chapa A matemática é complexa: são
Churrasco, um negócio de dezessete opções, desde os
espetinhos para churrasco no tradicionais de carne e linguiça
Parque Residencial Cocaia, na até versões mais sofisticadas,
zona Sul de São Paulo. Em- como costela bovina, carne
preendedor do ramo da alimen- com bacon, tilápia, salmão e
tação, ele fez nome na região yakitori – um espetinho japonês
com a rotisseria Firmezão, inau- com pedaços de frango grelha-
gurada em 2015. A casa ficou do no molho tarê.
conhecida pelo frango assado
que ocupa a mesa das famílias A maioria da clientela é forma-
aos fins de semana, mas os da por pessoas que saem do
clientes pediam algo que fun- trampo e querem fazer aquele
cionasse a semana inteira. Foi happy hour, mas também têm
prestando atenção a isso que aqueles que trabalham no
Júlio César viu a possibilidade próprio bairro e pedem algo
de um segundo estabelecimento. para almoçar. Por isso, O Cha-

187
Prato Firmeza Preto

pa oferece porções como pão de uma refeição com arroz, fei-


de alho, salada de maionese e jão e farofa. Estava tudo no
até refeições completas, com ponto, bem temperadinho com
arroz, feijão, farofa e um espe- sal e um sabor que evidenciava
tinho de sua escolha. que tinham acabado de sair da
churrasqueira.
Aqui em casa, a refeição che-
gou no tempo combinado e eu Diversificando o menu, para
experimentei cinco espetinhos além do churrasco, tem também
(carne, linguiça, coração de caldo verde e até ratatouille,
galinha, salmão e costela) além um prato francês parecido com

188
De
De Quebradinha
quebradinha

um refogado de legumes, que


acompanha o frango assado do
Chapa. Para sobremesa, açaí e
SERVIÇO
bolos de pote nos sabores bri-
Rua Demas Zitto, 554,
gadeiro e prestígio. Parque Residencial Cocaia

(11) 96409-7236
Antes da pandemia do coro-
R$ 13,00 a R$ 20,00
navírus, Júlio César já tra-
balhava com delivery, mas Cartões de débito,
crédito e vale-refeição
isso se intensificou com a
quarentena. Por isso, é fácil Segunda a sábado, das 11h30
às 15h30 e das 18h30 às 23h45
encontrá-lo nas redes sociais
e em aplicativos de comida. Opções ovolactovegetarianas

Nesses tempos de distan- @ochapachurrasco


ciamento social, os espetinhos
/Ochapachurrasco
têm um gosto especial: fazem
Pedidos podem ser feitos
a gente relembrar os abraços
peloWhatsApp com até 1h de
e risadas com quem a gente antecedência ou pelo iFood
e Uber Eats. As entregas são
ama. Churrasco completo. realizdas em um raio de 10km
com entregadores próprios.

Sim

Sim
Fotos: Douglas Fontes/Acervo
pessoal de Júlio César Cardoso Silva

189
Prato Firmeza Preto

A ESPANHA DENTRO
DE LANCHES GOURMETS
PIERRY DELIVERY
Por Kátia Flora, da Agência Mural

APAIXONADO PELOS TEMPEROS


E A PELA CULTURA ESPANHOLA,
O EMPREENDEDOR DE SÃO BERNARDO DO
CAMPO BUSCA INOVAR NA GASTRONOMIA

Admirador da culinária espanhola, o chef de cozinha José Augusto


de Oliveira Filho, 37 anos, mais conhecido como Augusto Pierry, se
considera um amante da gastronomia. Morador do Jardim Calux,
em São Bernardo do Campo, Pierry teve o primeiro contato prático

190
De quebradinha

com a cozinha na adolescência,


quando passava o dia na casa
da avó materna e a ajudava no
preparo das refeições. Naquela
época, aprendeu a fazer bolos
de laranja, fubá e chocolate.

Aos dezoito, conseguiu um


emprego como ajudante de
serviços gerais em uma cozinha
industrial e, sempre que era como futebol de várzea e ro-
possível, observava o preparo das de samba. Contudo, sem
das refeições. as comemorações e encontros
presenciais devido à pandemia
“Gostava de sentir
do coronavírus, precisou rein-
o aroma das comidas e
analisar as misturas dos ventar suas receitas.
temperos. Porém, o que me
fascinava era a agilidade
do cozinheiro na hora de Assim,teve a ideia de criar o
cortar os alimentos.” Pierry Delivery, com dois
lanches artesanais que ele
Autônomo desde 2015, ele or- prepara na cozinha de casa:
ganizava festas, casamentos o Porco Pizza, feito de pernil,
e feijoadas aos fins de sem- e o El Toro, com carne de coste-
ana em eventos da região, la desfiada.

191
Prato Firmeza Preto

A invenção veio depois que O segundo lanche, El Toro,


Pierry foi a um evento, em 2019, retrata o famoso evento de
e viu um porco na brasa. “O tourada na Espanha, que o
leitão estava assando, forrado empreendedor gosta de assistir
com recheio de queijo, bacon e nos filmes. Com pão francês
tomate. As pessoas comiam e e costela assada e fatiada, o
falavam ‘o porco pizza’. Fiquei prato recebe ainda maionese
com essa ideia na cabeça e defumada, alface-americana e
criei o lanche”, comenta. creme de dois queijos (requei-
jão e parmesão) reduzidos na
O prato é servido no pão cerveja. A mistura da carne
francês crocante e redondo, com a couve crispy fica crocan-
recheado com uma porção de te e apetitosa.
pernil desfiado e bem tempe-
rado, acompanhado da textura O chef conquistou a vizin-
cremosa da pasta de alho com hança por causa do cheiro
repolho fatiado, alface-ameri- bom que exalava, vindo da
cana, molho barbecue caseiro, carne temperada com ervas
queijo prato e farofinha. Um frescas. Na porta da casa, não
lanche grande e saboroso, tem placa de divulgação,
com a carne bem suculenta mas ele faz a propaganda
e que, combinada ao queijo nas redes sociais.
derretido, resultam em um um
sabor formidável.

192
De quebradinha

“Os vizinhos passavam que, nos fins de semana, optam


e elogiavam o aroma por comer pratos rápidos.
gostoso. Alguns,
um pouco mais curiosos,
perguntavam: ‘O que Além dos lanches, Pierry
você está preparando?’”
também faz sobremesas. O
destaque são as fatias hún-
Dessa forma, de boca a boca, o
garas, pãezinhos doces corta-
chef foi adquirindo clientes no
dos no formato de caracóis e
bairro, amigos e a indicação de
recheados com coco ralado. A
outras pessoas. O público dele
massa, leve e macia, fica úmi-
é formado por jovens e famílias
da por causa do recheio. Com

193
Prato Firmeza Preto

doze unidades, está disponível nos sabores tradicional com coco ou


com cobertura de chocolate.

Augusto quer investir mais no ramo de pratos rápidos e está desen-


volvendo mais duas opções de lanches, também inspirados na cu-
linária espanhola. O chef prioriza no atendimento aos clientes do
bairro e da região, o tratamento pessoal e diz que “a empatia é a
chave do empreendedorismo”. Costuma colocar na embalagem dos
lanches frases como “Obrigado pela preferência” e “Bom apetite”. Isso
tem gerado elogios quando os clientes retornam e novas indicações.

194
De quebradinha

SERVIÇO
Jardim Calux -
São Bernardo do Campo

(11) 96950-7619

Sábados e domingos,
das 18h às 22h30

R$ 12,00 a R$ 25,00

cartões de débito e crédito

@maisfacilcompierry

/maisfacilcompierry

Pedidos por WhatsApp.


Entregas em São Bernardo
do Campo e região, em um
raio de 15km, com motoboy
próprio.

Fotos: Kátia Flora/Acervo pessoal


de José Augusto de Oliveira Filho

195
Prato Firmeza Preto

EXPERIMENTANDO
SABORES COM
A MELHOR VISTA DA ZS
SÔNEGO BISTRÔ
Por Carolina Messias, da Periferia em Movimento

COMIDA GOSTOSA, MÚSICA


BOA E MUITA PERSONALIDADE
NO PONTO MAIS ALTO DO MORRO
DA CHÁCARA SANTANA

Uma ladeira liga o Largo de Piraporinha à Chácara Santana.


E de lá fica a melhor vista da periferia da zona Sul de São Paulo:
o mirante do Sônego Bistrô, que só concorre com o cardápio do
próprio espaço.

196
De quebradinha

Daniel Faria, 39 anos, que já sede da ONG, hoje recebe cur-


viajou para quinze países di- sos para jovens moradores.
ferentes, quis trazer um pedaço
de cada lugar para a quebra- Antes da pandemia do coro-
da e abriu o espaço no ponto navírus, o bistrô abrigava um
mais alto do morro, para que curso de gestão gastronômica
ninguém precise ir até Paris que formava profissionais para
para saber como é um bistrô – o trabalho na área. Alguns de-
um ambiente simples, familiar e les, inclusive, trabalharam no
aconchegante para experimen- próprio restaurante, atuando
tar sabores. em eventos e no atendimento
ao público.
A ideia nasceu em 2016, na OR-
PAS (Obras Recreativas, Profis- Também foi no território, mais
sionais, Artísticas e Sociais), or- especificamente dentro de
ganização liderada por Daniel casa, que Daniel buscou um
para promover a integração nome adequado para o esta-
comunitária por meio de cultu- belecimento. “Sônego” é o ape-
ra, desenvolvimento econômico, lido que seu pai, José Carlos,
intercâmbios e formação profis- recebera no bairro. Quando
sional. Ele notou que precisava vivo, era conhecido por ser um
de mais uma frente para gerar senhor simples que orientava os
renda e fomento para a comu- meninos da quebrada.
nidade. A cozinha, que já foi

197
Prato Firmeza Preto

Esse acolhimento hoje se faz de Cultura do Ministério da


presente no espaço, cheio de Cultura, além de reconheci-
alegria, cores e personalidade. mentos do Criança Esperança
Na entrada e no interior do e destaques no Guia da Folha
bar, encontramos grafites, de S.Paulo e Guia do Sesc.
quadros de artistas da quebra-
da e prêmios já conquistados, No térreo fica o bar, em que
como Voluntário do Ano pelo é possível conversar despreocu-
banco Santander e o Ponto padamente. No primeiro an-

198
De quebradinha

dar, há um espaço maior com “Criamos o Sônego Bistrô


som ambiente e, por fim, o fa- do conceito francês de fazer
pratos diferenciados com
moso terraço com vista para ingredientes simples que
todo o distrito do Campo agradam a clientela.”
Limpo. Dali, é possível avistar
a extensão da movimentada Optei por um lanche de
Estrada do M’Boi Mirim, a ci- pernil desfiado, feito em uma
clovia da Avenida Luiz Gushi- minibaguete, com salada de
ken e as pipas que cruzam os tomate e alface. A comida é di-
céus. O próprio Daniel diz que ferente de tudo que já comi:
as pessoas chamam o lugar de o cheiro é ímpar, o pernil dá
“Terraço Itália da Quebrada”, vontade de comer de primeira.
em comparação a um famo- O pão é bem amarelinho e ma-
so restaurante no alto de um cio, parece aqueles que você
prédio no centro de São Paulo. compra na padaria quenti-
nho. Já a salada, é vistosa e
O cardápio tem diversas feita com ingredientes frescos.
opções: desde pratos, feitos O colorido do prato dá água
de pernil, bisteca ou ome- na boca.
lete, porções de batata frita,
mandioca, calabresa, alcatra e Os lanches são feitos de
até lanches rápidos de pernil, forma artesanal – do pão, que
abobrinha e contra-filé. é preparado na cozinha do

199
Prato Firmeza Preto

restaurante, até a escolha final da salada. Deu para notar esse toque
de cuidado em cada detalhe desde o primeiro momento em entrei no
bistrô. Comida boa contemplando o horizonte? Vale a pena!

200
De quebradinha

SERVIÇO
Rua João de Santana,
358, Chácara Santana

(11) 97155-7616

Sexta a domingo,
das 12h à 0h

R$ 25,00 a R$ 40,00

Cartões de débito,
crédito e vale-refeição

Opções ovolactovegetarianas

@sonegobistro/

/Sonegobistro

Pedidos por telefone,


WhatsApp ou aplicativos
(iFood e UberEats).
Entregas em um raio
de até 15km.

Sim

Fotos: Carolina Messias/Daniel Alvarado/


Acervo pessoal de Daniel Faria

201
Prato Firmeza Preto

BATATA COMBINA COM


TUDO, ATÉ COM DELIVERY

BATATAS TOP DELIVERY


Por Thalita Monte Santo, da Agência Mural

A EMPREENDEDORA VIVIAN BONFIM


DOS SANTOS OLIVEIRA VIU NAS BATATAS UMA
NOVA MANEIRA DE SUSTENTAR A FAMÍLIA

Não é à toa que a batata é um dos alimentos mais consumidos do


mundo: ela é boa frita, cozida, assada e até mesmo em conserva,
mas recheada fica ainda mais saborosa. E é dessa maneira que o
Batatas Top Delivery se propõe a entregar o prato.

202
De quebradinha

Desde fevereiro de 2020, Vivi- para trinta. Desde então, é com


an Bonfim dos Santos Oliveira, o lucro das vendas que ela e o
36 anos, moradora de Gua- marido estão mantendo a casa.
rulhos, na Grande São Paulo,
“Como nós não temos
comanda o negócio. Casada
fornecedores e também
e mãe de duas crianças, ela não temos como deixar
começou a empreender no em estoque, compramos
tudo todos os dias.
início do ano produzindo bolos Escolho ingrediente por
na rua e pela internet, mas as ingrediente. Isso também
garante que os produtos
vendas começaram a cair. estejam sempre frescos.”

No mesmo período, o marido Vale a pena pedir e experi-


dela, Roberto Carlos Faustino mentar os sabores para esco-
Calif, 45, ficou desempregado. lher o favorito. Além disso,
Foi então que ela decidiu in- batatas, sejam recheadas ou
vestir nas batatas recheadas. não, combinam com qualquer
“Com o dinheiro que eu tinha, refeição do dia. Quem nunca
comprei batatas e recheios e experimentou algo parecido
preparei algumas para vender”, vai se encantar. Já quem é fã
conta Vivian. de batata, vai ficar ainda mais
apaixonado, pois além do tem-
No primeiro dia, ela vendeu pero na medida certa, é pos-
apenas três batatas. Já no se- sível sentir o cuidado com que
gundo, os pedidos saltaram tudo é preparado.

203
Prato Firmeza Preto

A escolha do nome, por exem- gonoff de camarão, que tam-


plo, faz jus a todo o sabor que bém leva manteiga de ervas e
cada batata recheada carre- cobertura de requeijão cremo-
ga. Hoje, as mais pedidas são so. Para quem gosta de sabores
as tradicionais de strogonoff variados, é uma boa opção.
de carne e frango. Elas levam
requeijão cremoso e manteiga Além disso, todos os pedi-
de ervas, o que deixa a textura dos são acompanhados por
macia e saborosa. um pacote de batata palha e
um refrigerante de 237ml.
Mas o cardápio é variado. Quem gosta de adicionar in-
É possível escolher também o gredientes extras pode escolher
sabor brócolis ao molho bran- entre porções de bacon, cogu-
co, que leva brócolis ninja re- melo, queijo muçarela, par-
fogado, com molho branco, mesão ou requeijão.
requeijão cremoso e manteiga
com ervas. A mistura de in-
gredientes deixa o sabor leve
mas ao mesmo tempo bastante
apetitoso. Provando que batata
combina com tudo.

A nova aposta do delivery é


a batata recheada com stro-

204
De quebradinha

SERVIÇO
Rua João Dias, 51, Parque
Santos Dumont – Guarulhos

(11) 96957-6223

Terça a domingo,
das 18h às 23h

R$ 16,00 a R$ 28,00

Cartões de débito
e crédito

Opções ovolactovegetarianas

@batatastopdeliver

/batatastopdelivery2020

Disponível no GoomerGO
e iFood.

Fotos: Acervo pessoal


de Vivian Bonfim

205
Prato Firmeza Preto

HAMBÚRGUER,
CERVEJA E ARTE
DU PUB
Por Laís Diogo, da Periferia em Movimento

NO DU PUB A COMIDA E A BEBIDA SÃO


ARTESANAIS E OS ARTISTAS QUE SE
APRESENTAM SÃO CRIAS DA QUEBRADA

No caldeirão do Grajaú, as almas se alimentam de arte.


A efervescente cena cultural local tem um cardápio para gostos va-
riados. E, para acompanhar, um morador aposta naquilo que ali-
menta o corpo: comidas e bebidas. Seja hambúrguer, cerveja ou arte,

206
De quebradinha

no Du Pub toda a produção lo. Começou com a Du Pipas


é caseira. que, como o nome diz, vendia
pipas e também doces e sal-
Conhecido como Du, Wardell gados para a molecada do
Kinsey Rocha Neves, 35 anos, bairro. Mas desde 2017 o
atua desde 2005 como comer- pequeno negócio deu uma gui-
ciante na região do Jardim Eli- nada, a partir da percepção
ana, na zona Sul de São Pau- que Du apurou como um

207
Prato Firmeza Preto

agente cultural ativo na região tações musicais, móveis feitos


ao longo de uma vida. de pallets, mesinhas e cadeiras
na calçada e em parte da rua
Assim, ele adaptou seu espaço, para reunir a galera.
o transformado no Du Pub. A
loja simples, com pipas pendu- “Percebi que faltava um
espaço na quebrada que
radas nas paredes, foi remo- poderia dialogar com a
delada: ganhou uma coz- comunidade a partir das
atividades de gastronomia,
inha, espaço para projeção de arte e cultura.”
vídeos, palco para apresen-

208
De quebradinha

Os hambúrgueres são feitos ar- Para acompanhar, nada me-


tesanalmente pelo próprio chef lhor que uma cerveja geladinha.
Du, acompanhados de molhos O Du criou seu próprio rótulo,
como cheddar picante ou maio- a Grajauense, uma pale lager
nese com orégano. Entre as em edição limitada pensada
porções, o pub oferece os tradi- especialmente para harmoni-
cionais anéis de cebola, frango zar com os lanches da casa.
à passarinho, batata frita e o Com sabor refrescante e pouco
dadinho de tapioca da casa. O amargo, diferente das tradicio-
cardápio também tem opções nais, a cerveja é mais clara e
vegetarianas como o lanche de segue um padrão que os cerve-
pão francês, maionese, alface, jeiros usam, que é a da cerveja
tomate, queijo prato e anéis de tcheca Pilsner Urquell.
cebola, além de sanduíches com
steak de frango ou calabresa. “O público ama ter uma cer-
veja com seu próprio nome,
por isso a aceitação foi bem
O mais gostoso desses lanches boa. Ela é produzida de
forma limitada para ir ven-
é que eles são feitos com aquele dendo aos poucos e ter um
pão francês, sabe? No meu gostinho de quero mais.”
pedido, o pão estava quenti-
nho e o queijo veio derretendo. A fabricação da cerveja é no
O steak de frango empanado próprio Du Pub, em grandes
estava bem sequinho e crocan- panelas de pressão. A bebida
te, sem gosto de fritura. também fica armazenada em

209
Prato Firmeza Preto

baldes para fermentação antes cozinha com dicas de cerveja


de ser servida bem fresca. e música. Na programação, já
rolou receita de costelinha na
As noites ficam ainda melhor cerveja artesanal - uma das
com música. O estabelecimento melhores coisas que o Grajaú
é ponto de encontro de faze- tem a oferecer.
dores e apreciadores da cultu-
ra periférica, recebendo sema-
nalmente várias atrações. Nas
caixas e microfones, os ritmos
se revezam: sound system, dubs,
shows de MPB e intervenções
artísticas diversas. Por ali, já
passaram artistas do território,
como Denise Alves, Xemalami,
DJ Afonia, entre outros.

Mesmo com o distanciamento


social trazido pela pandemia
do coronavírus, o show tem
que continuar. Lives transmiti-
das pelas redes sociais têm DJs
animando quem está em isola-
mento, enquanto Du chefia a

210
De quebradinha

SERVIÇO
Rua Pedro Escobar, 414,
Jardim Eliana

(11) 97736-9933

Terça a quinta e domingo,


das 18h às 23h50; sexta
e sábado, das 18h à 1h30

R$ 25,00

Cartões de débito e crédito

Opções ovolactovegetarianas

@du_pub

Pedidos pelo WhatsApp,


sem taxa no raio de 2km,
além de aplicativos (iFood)
e sistema próprio (http://cutt.
ly/RyFxocc). Entregas em
um raio de 8km com
entregadores próprio.

Sim

Fotos: Douglas Fontes/Acervo


pessoal de Wardell Kinsey

211
Prato Firmeza Preto

LAJE, COMIDA,
CERVEJA E FUTEBOL
DE DOMINGAS
DOMINGA’S BAR
Por Eduardo Bernardo, do Vozes das Periferias

ESPAÇO ABERTO NA GARAGEM DE CASA


REÚNE AMANTES DE FUTEBOL
E DE BOA COMIDA NO JARDIM SINHÁ

O Dominga’s Bar, inaugurado em 2014, está localizado dentro do


coração do Jardim Sinhá, em Sapopemba, na zona Leste. Situado em
frente ao campo de futebol do bairro, o bar é ponto de encontro para
os boleiros da área. Todos os fins de semana a galera se reúne depois
da partida para fazer aquela resenha e comer um petisco. Fui em

212
De quebradinha

um dia de jogo para acompan- com a avó que aprendeu a fa-


har essa energia e pude sentir zer as melhores receitas. Uma
de perto que subir na laje, delas é a galinha com polenta,
tomar uma cerveja gelada e o prato mais pedido da casa,
apreciar um bom torresmo é e que Domingas mantém em
realmente maravilhoso. segredo até hoje. A galinha,
cozida com tomate, pimentão,
Quem comanda e dá nome batata e bastante caldo, vem
ao estabelecimento é Domin- acompanhada por uma polen-
gas de Jesus Matias, 57 anos, ta de cor amarela bem viva,
mãe de quatro filhos, que teve com sabor único e textura
a ideia de usar a vaga livre em macia, feita na colher de pau.
sua garagem para ter uma ren- Tudo combina perfeitamente
da extra. Quem vive em que- e é muito bem-servido. Garan-
brada sabe que essa é uma to que duas pessoas comem
boa opção para “sobreviver”. tranquilamente.
Assim, ela trouxe o empreen-
dedorismo para dentro de casa A comida é preparada no
e montou seu bar com ajuda dos fogão da própria cozinha
familiares, que também cuidam de casa e é ali que a magia
da administração. acontece: o cachorro-quente
se destaca pelo molho único e
Ela começou a cozinhar cedo, saboroso que só a dona Do-
influenciada pela mãe, mas foi mingas faz. Além de uma

213
Prato Firmeza Preto

grande variedade de pratos e Domingas e quem experimen-


lanches, o cardápio tem diver- ta não consegue comer um só.
sas porções, como calabresa fri- Com uma cor bem dourada e
ta, linguiça acebolada, batata crocante por fora, o bolinho é
frita, bolinho de carne. temperado com cebolinha e um
pouco de pimenta. A criativi-
Outra estrela é o bolinho de dade está em utilizar leite na
arroz, que traz uma recordação mistura para deixar o interior
da infância para os filhos de macio, revela a cozinheira.

214
De
De Quebradinha
quebradinha

A periferia nos traz histórias


maravilhosas de pessoas guer-
reiras como Domingas. Com
SERVIÇO
sua simplicidade, elas não bus-
cam riquezas, mas apenas o Rua Henri Fuseli, 362,
Jardim Dona Sinhá
direito de viver tranquilamente
(11) 2721-5509
e passar a mesma sensação
para quem as cerca. Não tem R$ 30,00
pessoa no Jardim Dona Sinhá Cartões de débito e crédito
que não conheça o seu bar,
Todos os dias, das 10h às 21h
todos entram e ficam sempre
bem à vontade. Por meio do Opções ovolactovegetarianas

clima aconchegante e do sa- Pedidos por telefone.


bor caseiro e acolhedor, dona Entregas em um raio
de 2km com entregador
Domingas nos faz sentir em próprio, sem taxa.
casa e mostra como, além
do nosso lar, a favela tam-
bém é laço, é cultura, é arte e
é gastronomia.

Fotos: Wallace Morais


de Souza/Eduardo Bernardo

215
Prato Firmeza Preto

ALÉM DO
ALÉM DO PRATO
PRATO
O que um projeto de educação ambiental, um empreendimento mul-
tiplataformas de buffet que distribui marmitas e uma confraria de
vinhos têm em comum?

Neste capítulo, as histórias ultrapassam as barreiras concretas


da cozinha e do empreendedorismo e vão pra rua, pro mundo.

Com as mãos na terra e a mente no céu, todas essas iniciativas colo-


cam a comida no nosso caldeirão imaginário de futuros possíveis.
Aqui, a gastronomia ganha outra camada de complexidade ao ser
utilizada como elo e ponte entre pessoas e ideias e também como
instrumento de mudança social.

Combate à fome, educação alimentar e autoestima são alguns dos


temas tratados, com alimentos estabelecendo o diálogo e alimentan-
do muito mais que o corpo.

Mais que serviço de consumo, temos opções de contribuição.


Experiências sensoriais completas. Territórios inteiros – físicos
e abstratos – impactados.

216
Tem coisa mais Prato Firmeza
do que isso?

Lembra da reflexão sobre ex-


pandir o olhar sobre o con-
ceito de “prato firmeza” lá na
introdução do livro? Chega-
mos ao final ainda nos ques-
tionando, sem uma resposta
definitiva – se é que ela existe.
E quer saber? Que bom! Sinal
que, assim como as iniciativas
aqui retratadas, estamos em
constante movimento. E dan-
do passos importantes.

Onde isso vai nos levar?

O jeito vai ser aguardar os


próximos capítulos. O caminho
delicioso é garantido.

Guilherme Petro

217
Prato Firmeza Preto

MÃOS QUE CULTIVAM


E ALIMENTAM
PRATO VERDE SUSTENTÁVEL
Por Priscila Reis, do Preto Império

TESE DE MESTRADO SOBRE RACISMO


AMBIENTAL VIRA PROJETO SOCIAL NA PERIFERIA

Wagner Ramalho, quarenta anos, nasceu no Jardim Filhos da


Terra, em São Paulo. Aos seis anos de idade, mudou-se com o
pai para Presidente Prudente, no interior de São Paulo, onde
passou a conviver com famílias indígenas que tinham o hábito de
cultivar o próprio alimento. Maravilhado com aquela possibilidade,

218
Além do prato

ele ganhou seu pedaço simbóli- to Dottori de Ensino Superior,


co de terra e começou – desde além de formações complemen-
muito cedo – a cultivar também. tares em jardinagem e geogra-
Anos mais tarde, quando voltou fia política e meio ambiente.
a morar em sua comunidade
natal, percebeu que a relação “Pessoas negras e periféricas
sofrem do que chamamos
das famílias de periferia com de racismo ambiental, que
os alimentos era outra: as pes- consiste na dificuldade em
acessar uma alimentação de
soas precisam comprá-los, mes- qualidade para que possam
mo sem condições favoráveis se desenvolver plenamente.
Daí a importância de en-
para isso. Foi então que ele
sinar as pessoas das perife-
soube o que gostaria de fazer: rias a cultivar seu próprio
trabalhar em um projeto para alimento, como a classe
média vem fazendo há um
contribuir com a sua própria bom tempo em suas casas.”
comunidade. Assim nasceu
o Prato Verde Sustentável. Desde que voltou à São Pau-
lo, nunca mais saiu do Jardim
Mesmo tendo experiência com
Filhos da Terra. Nesses 28
a terra, ele sentiu a necessi-
anos morando no bairro onde
dade de buscar uma formação
nasceu, sente que cumpre uma
acadêmica na área. Escolheu
missão: levar a academia para
cursar tecnologia em gestão
dentro da comunidade e não
ambiental pela FMU, fez licen-
somente usar o fato de ser pe-
ciatura em geografia no Institu-
riférico e acadêmico para al-

219
Prato Firmeza Preto

imentar o próprio ego. Para “Jamais volte pra sua quebrada


ele, a grande sacada está de mão e mente vazia”.
em praticar o que se apren-
de e fazer a diferença com No espaço da Associação
isso. Wagner cita uma frase do Mutirão, onde ele já foi aluno
rapper Emicida, que acredita quando criança, nasceu o pro-
ter a ver com os seus ideais: jeto Prato Verde Sustentável.

220
Além do prato

No local também funcionam o Hoje, quinhentos jovens da co-


Centro para Crianças e Adoles- munidade são atendidos com
centes (CCA), um Centro para oficinas de educação ambiental
Juventude (CJ), além de uma e, através da horta, aprendem
creche. Com o tempo, o proje- sobre consciência ambiental.
to foi ampliado para os bair- Consequentemente, eles levam
ros de Edu Chaves (Núcleo de esses conhecimento às suas
Convivência do Idoso) e Jardim famílias.
São Luiz, na zona Sul de São
Paulo. Parte da mão de obra As oficinas têm duração de
também é voluntária. três meses e os jovens apren-
dem sobre direito ambiental e
Por meio do projeto, ele ajuda constitucional, agricultura fa-
os moradores a relembrar a miliar, dentre outras disciplinas,
relação com o cultivo artesanal contribuindo com o desempe-
e, assim, desenvolver autonomia. nho dos alunos na escola. E
os impactos do trabalho não
“Cultivar e comer são atos param por aí: por meio do
políticos. Então se as pes-
soas tiverem uma consciên- projeto em parceria com uma
cia alimentar, conseguirão Unidade Básica de Saúde
entender que alimento, meio
ambiente e sociedade são (UBS), pacientes com alguma
coisas intrinsecamente liga- doença relacionada a alimen-
das. Somos parte da nature-
tação ganham um kit de pro-
za, mas as pessoas acabam
separando isso.” dutos orgânicos a cada quinze

221
Prato Firmeza Preto

dias. A evolução do quadro não temos uma disciplina de


é acompanhada pelos agen- educação financeira, como em
tes de saúde periodicamente. algumas escolas particulares,
Wagner dá aulas em escolas onde quem tem mais condições
particulares e, com os salári- já nasce empreendedor. Por
os, mantém seu sustento e isso, aprendemos na hora da
o projeto funcionando. necessidade a nos virar com o
que temos.
“É muito difícil empreender
sendo negro porque
preciso pagar minhas Wagner vê o projeto como um
contas, precisava que sonho que alimenta a sua comu-
o dia tivesse 36 horas para
dar conta de trabalhar nidade, por isso é persistente e
e manter o projeto.” agora tem participado de ace-
leradoras e vem ganhando um
Ele teve de parar de dar aula pouco mais de visibilidade. Ele
em um período para manter o acha importante estar cercado
projeto. Comenta que se não de pessoas pretas na equipe,
tivesse uma fonte de renda se- principalmente de mulheres
ria ainda pior, pois ele mesmo pretas, mas encontra certa difi-
mantém o Prato Verde Suste- culdade por ser uma ação vol-
ntável funcionando com o din- untária, uma vez que essas pes-
heiro que recebe das aulas que soas precisam trabalhar para
leciona em escolas particulares. pagar as contas.
Na escola pública, infelizmente,

222
DeAlém
Quebradinha
do prato

Durante a pandemia do coro-


navírus fizeram um projeto em
que recebem doações financei-
SERVIÇO
ras de pessoas que já haviam
comprado as verduras da hor- Rua dos Filhos da Terra, 944,
Jardim Filhos da Terra
ta. O projeto se chama “Adote
(11) 98228-2504
uma família”, para que pessoas
que podem ajudar financeira- @pratoverdesustentavel
mente, paguem o valor de uma /pratoverdesustentavel
cesta básica de verduras para
A venda de cestas está
as famílias que têm menos suspensa durante a pandemia,
condições. As doações do pro- mas é possível se cadastrar
no grupo de WhatsApp do
jeto serão realizdas até dezem- projeto ou ir pessoalmente
bro de 2020. até a Associação Mutirão
para comprar outros produtos
agroecológicos. As entregas
são feitas na região pela
própria equipe do projeto.

Fotos: Priscila Reis/Acervo


pessoal de Wagner Ramalho

223
Prato Firmeza Preto

MATULAS PARA
TODO TIPO DE FOME
MATULAS DA NEGA
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

CRIANDO MUITO MAIS QUE MARMITAS, SUELLEN


SE CERCA DE REFERÊNCIAS FEMININAS E
ANCESTRAIS PARA FAZER DA COMIDA UM
INSTRUMENTO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

Direto do Capão Redondo, na zona Sul, a gastronomia de Suellen


Maristela Conceição, 31 anos, e sua marca Matulas da Nega, é
herança das suas mais velhas: a avó Ortência Conceição de Souza,
de 86 anos, e a mãe, Marilda Conceição de Souza, 58.

224
Além do prato

“Se não puder falar da verso e varia conforme a dis-


minha avó, eu nem venho”,
diz a chef, que hoje pode ponibilidade de ingredientes
escolher a cozinha como da época, mas sempre traz um
profissão e negócio porque toque de afrobrasilidade. Um
no passado suas ancestrais,
por necessidade, percor- dos maiores sucessos é o nho-
reram um longo caminho que, que aparece em diferentes
“esquentando a barriga no
fogão dos outros”. versões: tem de batata, batata-
doce roxa, abóbora, mandioca,
Outra grande referência de mandioquinha, cará, inhame
Suellen, que também é formada e beterraba.
em marketing, é Cidinha San-
tiago, chef culinarista pioneira A moqueca de banana, outro
na televisão, que ganhou noto- destaque, também tem um
riedade nos anos 1990 ao fazer segredo, revela Suellen: “Faço um
parte do antigo programa Coz- mix de bananas, pois existe uma
inha Maravilhosa da Ofélia, exi- resistência muito grande com a
bido na Rede Bandeirantes. Com banana-da-terra de quem não é
mais de trinta anos de carreira, habituado”. O prato, carregado
além das telas, ela também de dendê, é acompanhado de
dá consultorias, é educadora e arroz de coco (feito com leite de
personal chef. coco e coco ralado) e farofinha
crocante. De sobremesa, as cas-
Com tantas influências, o cas de laranjas caramelizadas
cardápio da Matulas é di- valem pelo contraste de sabor

225
Prato Firmeza Preto

entre o azedinho da fruta e o


doce do caramelo.

A Matulas da Nega também se


desdobra na Matulas Pela Vida,
uma iniciativa de responsabili-
dade social que visa arrecadar
doações de alimentos, roupas de de cestas de orgânicos produz-
frio e cobertores para pessoas idos por agricultores da região
em situação de vulnerabilidade, de Parelheiros e outros bairros
além de ração para animais que da zona Sul. A relação de troca
estão nas ruas. Mais de 10 mil é contínua: a cada cesta compra-
marmitas foram doadas entre da do coletivo, outra é doada.
março e maio de 2020, com a Além de uma comida feita com
chegada da pandemia do coro- ingredientes livre de agrotóxicos,
navírus. “Posso não ter muito, a ação apoia a agricultura fami-
mas se puder fazer a minha par- liar em São Paulo.
te, eu vou fazer, para estar lado
a lado de quem precisa”, afirma. Da cozinha de Suellen também
Ela trabalha em parceria com o saem hambúrgueres de carne e
Orgânicos para Todes, coletivo vegetais, saladas, caldinhos, piz-
criado e liderado por mulheres zas artesanais, polenta frita, tor-
com o objetivo de promover tas, bolos decorados, docinhos,
alimentação saudável por meio pães e outras criações diversas.

226
DeAlém
Quebradinha
do prato

Até “feijogazza”, uma fogazza re-


cheada com o típico prato bra-
sileiro, ela já fez. Desde refeições
SERVIÇO
individuais até o buffet comple-
Capão Redondo
to, tem de tudo. “Nosso slogan é:
você tem fome de quê?”, brinca. (11) 96577-2622

R$ 20,00 a R$ 40,00
Para a chef, todas as palavras
Cartões de débito, crédito
têm um significado muito pro- e transferência bancária
(Stone)
fundo. Ela conta que aprendeu
em uma passagem por Minas Horários personalizados e sob
demanda. É necessário pedir
Gerais que “matula” quer dizer com antecedência.
marmita. “Da nega” é para que
Opções ovolactovegetarianas
as pessoas saibam que se tra- e veganas
ta de um empreendimento de
@matulasdanega
uma mulher negra. Cercada por @cidinha_santiago
outras mulheres pretas que são @organicasparatodes

referência e fazem a diferença /matulasdanega


dentro e fora das cozinhas, a
As entregas são realizadas
Matulas da Nega é assim, no em toda a capital por Suellen
e a mãe, nas linhas de metrô.
feminino mesmo.
As encomendas devem ser
feitas com pelo menos dois
dias de antecedência.
Fotos: Gabrielly Oliveira/Acervo
pessoal de Suellen Conceição

227
CONEXÕES DE AFETO
Prato Firmeza Preto

EM ENCONTROS
REGADOS A VINHO
CONFRARIA DAS PRETAS
Por Gabrielly Oliveira, da Énois

UM ESPAÇO ACOLHEDOR PARA PESSOAS


NEGRAS QUE DESEJAM APRENDER SOBRE
VINHOS E CONHECER GENTE NOVA

“Vivências, vinhos e aquilombamentos” é o lema da iniciativa


inovadora de reunir pessoas negras de todas as classes sociais para
conversar sobre vinhos, degustar sabores e trocar experiências.
Assim é a Confraria das Pretas, criada por Silvana Aluá, 37 anos,
especialista em vinhos desde 2010.

228
Além do prato

O encontro é uma nizações apenas com comidas


confraternização com
europeias, por exemplo. Mesmo
protagonismo feminino:
“Os homens são bem-vindos, o sobrenome Aluá foi escolhido
mas precisam entender por Silvana, em abandono ao
que aqui o protagonismo
é das mulheres.” sobrenome “colonizador”. “Aluá
é uma bebida afro-indígena
A ideia surgiu em 2017 com bem conhecida. Essa bebida
o objetivo de promover a in- tem base de abacaxi, é típi-
teração entre pessoas negras ca em alguns lugares do Bra-
de diferentes trajetórias em sil e também é utilizada para
rolês pela cidade de São Pau- rituais de espiritualidade afri-
lo. A escolha pode ser desde cana”, revela.
um quilombo urbano, como
o Aparelha Luzia, uma laje No entanto, com a pandemia
ou um restaurante em um do coronavírus, Silvana teve
bairro elitizado. que transformar tudo. Os en-
contros, que aconteciam pre-
A Confraria foi também para sencialmente uma vez por mês,
Silvana um espaço de des- começaram a acontecer on-
colonização de mentalidade. line, com a mesma frequência.
No começo, ela carregava O lado bom é que pessoas
ideias comuns e preconcebi- de outros estados passaram a
das que o mundo do vinho a acompanhar e curtir os eventos.
havia ensinado, como harmo-

229
Prato Firmeza Preto

“No Rio de Janeiro tem que fui, o tema da noite era a


bastante gente que gosta cerveja. A convidada foi a cer-
e acompanha os encontros
on-line. Depois da pandemia vejeira Sara Araújo, bacharel
pretendo continuar com eles, em direito, acadêmica de ciên-
além dos presenciais”.
cias sociais, beer sommelière e
dona do perfil @negracervejas-
Todo encontro traz uma con-
sommelier no Instagram, com
vidada especial para falar de
mais de 12 mil seguidores.
assuntos diversos, que podem
envolver poesia, arte, comédia
A aula/degustação foi incrível:
ou música, por exemplo. Antes
aprendi que existem dife-
de cada confraternização, Sil-
rentes “escolas cervejeiras” e
vana divulga nas redes sociais
isso influencia na forma como
da Confraria a programação
se prepara cada uma delas.
e também envia mensagem às
São diversas as tradições e
participantes com orientações
características cervejeiras, de-
sobre qual vinho sugere para
degustação, além do link para
entrar na chamada em vídeo.

Pessoalmente, a experiência
me agregou muito. Apesar das
confraternizações serem sem-
pre sobre vinho, no encontro em

230
Além do prato

pendendo da região e da cul-


tura de quem faz. Foi bacana
ver que os ingredientes fazem
muita diferença no resultado
final e que a qualidade está
justamente na escolha desses
insumos. Assim como o vinho,
as cervejas também têm um
conceito por trás. Saber disso é Demoiselle Colorado, bem mar-
muito chique, ao mesmo tempo cante, forte e robusta, por sua
em que ali na confraternização vez, deu um contraste grande.
tudo foi passado de uma ma- De coloração escura e com
neira super acessível. aroma e gosto de café, essa é
para quem prefere uma cerveja
Na degustação, experimentei mais encorpada.
as três bebidas sugeridas: a
Hoegaarden Witbier, uma cer- A última que degustei, a “Ile-
veja belga feita de trigo, com gal”, chama a atenção pela
um fundo de laranja e coentro. forte presença do sabor de vi-
A sugestão de Sara foi servir nho, e dá para entender o moti-
com laranja dentro, e assim vo: é uma cerveja artesanal de
eu fiz. O sabor ficou mais cítri- vinho maltado. Ou seja, sua
co. Leve e frutada, é uma boa base vem da uva Sauvignon
opção para entradas. A Porter Blanc dos vales chilenos.

231
Prato Firmeza Preto

Haviam ali muitas mulheres negras mais velhas e bem-sucedidas,


o que foi muito representativo, já que não temos tantas referên-
cias nesse perfil no Brasil. Além disso, o evento aconteceu logo
após o falecimento do ator Chadwick Boseman (1976-2020), o
eterno Pantera Negra, primeiro super-herói negro protagonis-
ta das histórias em quadrinhos na história. Na despedida, cruza-
mos as mãos em punho sobre o peito, relembrando o símbolo de
“Wakanda Forever”. A Confraria das Pretas é isso: poder preto
regado de afetividade, memória e bons vinhos.

232
Além do prato

SERVIÇO
@confrariadaspretas

confrariadaspretas.com

confrariadaspretas@gmail.com

Cadastre-se no site para


acompanhar a programação
dos encontros.

Fotos: Gabrielly Oliveira/Acervo


pessoal de Silvana Aluá

233
ÍNDICE REMISSIVO
ÍNDICE REMISSIVO
Procure por região:

ZONA LESTE ZONA OESTE


Areté Comedoria 42 Casa de Ieda 178
Baobá Comedoria 54
Mama África La Bonne Bouffe 60 ZONA SUL
Akara Refeições 68
Batuque na Cozinha 106 Cozinha das Pretas 74
Sabores de Família 144 Amô • Cozinha Afetiva 96
Dominga’s Bar 212 Levinho Fit 132
O Chapa Churrasco 186
ZONA NORTE Sônego Bistrô 196
Du Pub 206
Akará Delivery 80 Matulas da Nega 224
Doce Ghetto Brigaderia 92
Cakes da Nega 116
Lili Comida Saudável 148
Prato Verde Sustentável 218
CENTRO OSASCO
Chermoula Cultura Culinária 48 Bolos da Vida 120
Kitanda das Minas 84 Mesa Cheia 138
Biyou’z 154
Preto Cozinha 160 SÃO BERNARDO DO CAMPO
Toya Vegan 166
Free Soul Food 172 Pierry Delivery 190

GUARULHOS SÃO CAETANO DO SUL


Quero Churros 100 50/25 Cocktail & Co. 126
Letícia Valias Doceria Artesanal 112
Batatas Top Delivery 202
ONLINE/ITINERANTE
Confraria das Pretas 228
CONTATOS
Prato Firmeza
pratofirmeza.com.br
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