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Conversão de áreas florestais 69

O case Paraná

No Sul, principalmente no Paraná, a Associação Paranaense de Empresas de Base


Florestal (Apre) relata que esse movimento não é novo, é algo que já vem acontecendo
há alguns anos.

“O principal fator que motiva isso é a alta do preço dos grãos, tanto da soja, quanto do
milho. Esse preço elevado dos grãos acabou motivando a conversão de área florestal
para área agrícola. Além disso, houve também um aumento do preço da terra da área já
preparada para agricultura em relação à área com floresta. A área agricultável teve uma
valorização. Outro fator que merece destaque é a estagnação do preço da madeira. Ou
seja, de um lado, um produto que não teve alteração de preço e vem se mantendo
estável; de outro, um produto com aumento significativo de preço há alguns anos. Isso
também incentivou essa conversão de área. Também vale destacar a própria força da
certificação; um pequeno produtor não tinha capacidade de ter uma área certificada,
pois esse processo custa caro. Todos esses pontos acabaram desmotivando os
produtores, principalmente os pequenos”, explica Álvaro Luiz Scheffer Jr., presidente
da Apre.

Apesar disso, a Associação argumenta que, em nenhum momento, o setor florestal deve
competir com a produção de grãos, até porque toda a produção de grãos é voltada para
alimentação.

“A conversão de área de floresta para a área agrícola é uma realidade e não assusta o
setor, porque encaramos como algo normal de acontecer. O setor florestal vai precisar
migrar das áreas planas, áreas agricultáveis, para áreas não agricultáveis, aquelas em
que o relevo é mais difícil, como uma área dobrada, ondulada, de morro, em que o
próprio aproveitamento da área é menor, porque a quantidade de Áreas de Preservação
Permanente (APP) e de reserva legal em um local de relevo acentuado é maior do que
em uma área agrícola”, diz o presidente da Apre. Para a entidade, o principal desafio é
conseguir ter os mesmos níveis de produção e custos de uma área plana para uma área
dobrada. O nível de mecanização também tende a ser mais difícil: “Hoje, na parte de
silvicultura, conseguimos mecanizar quase tudo numa área plana. Porém, numa área
dobrada, não conseguiremos o mesmo grau de mecanização. Por isso, o desafio
realmente vai ser atingir os mesmos níveis de produção e de custos de produção em
áreas que não permitem o cultivo agrícola”, acrescenta.

Um desafio complexo

Para Nelson Barboza Leite, o desafio é primeiramente uma questão de eventual


valorização da madeira. Caso o preço de venda se torne mais atraente para esses
produtores que hoje estão deixando a silvicultura, a conversão em áreas agrícolas
continuará nos casos específicos em que a terra em questão tem um valor especialmente
alto, com potencial particularmente promissor para alta produtividade agrícola.
Contudo, uma reversão efetiva do cenário é difícil de vislumbrar.

“Considero difícil reverter esse cenário. A área que tem aptidão agrícola deve ser área
agrícola. O setor florestal precisa se adaptar para conseguir trabalhar nessas áreas mais
dobra – das, que não têm aptidão agrícola, áreas mais difíceis, com relevo ou com solo
que não seja tão fértil. Nosso segmento precisará aprender a trabalhar nisso, porque essa
vai ser a realidade. Dificilmente teremos uma inversão no futuro, porque a demanda de
alimento não vai diminuir, sempre vai crescer. Por isso, o setor precisa se adaptar, se
reinventar, buscar tecnologia e novos sistemas para mecanizar tanto a atividade de
silvicultura, como a de colheita, algo que já está mais avançado nas áreas de colheita do
que na silvicultura”, argumenta Álvaro Scheffer Jr., da Apre.

Nesse cenário, as associações representativas e o setor como um todo vão precisar se


unir para desenvolver novos caminhos, novas tecnologias para aprimorar a eficiência e a
produtividade nesses terrenos. A Apre destaca que essa realidade não vem acontecendo
somente no Paraná, mas em outros Estados também. “A demanda por alimento não vai
diminuir e a demanda por madeira também não, já que a procura por sustentáveis só
tende a aumentar. Mas não adianta querer competir com o setor de produção de grãos. É
preciso entender como produzir nessa nova realidade”, acrescenta o presidente da
Associação.

Para Nelson Barboza, a tendência de conversão de pequenas propriedades florestais em


áreas agrícolas não tem ou terá um grande efeito econômico sobre o setor florestal
brasileiro como um todo, visto que o suprimento de madeira nas grandes indústrias já
está garantido e bem planejado na maior parte dos grandes polos produtivos do país.
Porém, trata-se de um efeito demonstrativo bastante negativo, que acaba por inibir o
crescimento e a adesão de novos produtores à silvicultura.

Com isso, o profissional argumenta que há dois caminhos para os pequenos produtores
que tencionam permanecer no setor florestal: para aqueles que estão próximos às
indústrias, é preciso ter tecnologia para extrair e transportar essa madeira a custo
competitivo e vendê-la mais facilmente; para aqueles que estão mais distantes, a saída
seria transformar pequenas propriedades em grandes produtores, e a forma de fazer isso
seria investir no cultivo de espécies de madeira mais rica, de maior valor agregado. Isso
inclui tanto espécies exóticas (como o mogno africano e a teca) quanto nativas (como o
paricá), ou mesmo espécies de eucalipto e pinus cuja madeira tem uma densidade muito
alta para aproveitamento na indústria de celulose, mas pode ter alto valor por metro
cúbico para outras aplicações (como o Eucalyptus pellita ou Eucalyptus microcorys).

Avanços em novos arranjos como plantios em Integração Lavoura-Pecuária-Floresta


(ILPF) também podem tornar a atividade florestal viável em peque – nas e médias
propriedades. Além disso, o compromisso assumido pelo Brasil na Conferência do
Clima, em Paris, de plantar 12 milhões de hectares adicionais de florestas até 2030 pode
ser um grande driver da silvicultura em pequenas e médias propriedades, especialmente
para os produtores com áreas em bacias hidrográficas importantes e de crucial
recuperação.

Apesar de não se tratar de um cenário completamente reversível, esses possíveis rumos


apontados mostram que, caso haja políticas de incentivo e fomento organizadas e uma
estrutura comunicacional capaz de levar ao pequeno produtor a informação e a técnica
necessárias para recuperação dessas áreas e/ou plantio de espécies de madeira de maior
valor agregado, ainda é possível manter a silvicultura como uma atividade de todos e
para todos – e não apenas dos grandes players de relevância nacional e mundial.

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