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Revista Brasileira de Obesidade, Nutrição e Emagrecimento.


ISSN 1981-9919 versão eletrônica
Periódico do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino em Fisiologia do Exercício
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CONDUTA NUTRICIONAL PROMOVE ALTERAÇÃO DO QUADRO


DE SÍNDROME METABÓLICA NA OBESIDADE

Andresa Costa Pimentel de Souza1,2, Grezielle Mapeli Couzzi1,3

RESUMO ABSTRACT

O aumento da prevalência da obesidade em Conduct nutritional promotes changes


quase todos os países durante os últimos anos metabolic syndrome in obesity
é um indicador de predisposição ou
suscetibilidade genética para a obesidade, Conduct nutritional promotes change the
sobre a qual atuam os fatores ambientais framework of metabolic syndrome in obesity
relacionados com o estilo de vida, em que se The prevalence of obesity increased in almost
incluem principalmente os hábitos alimentares all countries over recent years is an indicator of
e a atividade física. O presente trabalho tem genetic predisposition or susceptibility to
como objetivo, revisar na literatura científica a obesity, which act on the environmental factors
conduta nutricional como um fator related to lifestyle, which include mainly the
indispensável não somente no tratamento, dietary habits and physical activity. This paper
como também na prevenção da síndrome aims to, in reviewing scientific literature to
metabólica, referindo-se quanto ao consumo conduct nutrition as an essential factor not only
dos lipídeos, carboidratos, proteínas, fibras; in treatment, but also in the prevention of
dentre outras recomendações adicionais no metabolic syndrome, referring to regarding the
que se refere ao tratamento dessa síndrome. consumption of fats, carbohydrates, protein,
O tecido adiposo é um órgão dinâmico que fiber, among other recommendations additional
secreta vários fatores, denominados regarding the treatment of this syndrome. The
adipocinas; que estão relacionados direta ou body fat is a dynamic secret that several
indiretamente, em processos que contribuem factors, called adipokines, which are related
na aterosclerose, hipertensão arterial directly or indirectly, in processes that
sistêmica, resistência insulínica, diabetes tipo contribute to atherosclerosis, hypertension,
2 e dislipidemias, ou seja, representam o elo insulin resistance, type 2 diabetes and
entre adiposidade e síndrome metabólica, que dyslipidemia, which is representing the link
constitui um fator de risco cardiovascular já between adiposity and metabolic syndrome,
citados além dos estados pró-trombótico e pró- which is a cardiovascular risk factor than the
inflamatório. Portanto a conduta nutricional aforementioned states pro-thrombotic and pro-
constitui um fator indispensável no tratamento inflammatory. So the conduct nutrition is an
e prevenção da síndrome metabólica. essential factor in the treatment and prevention
of metabolic syndrome.
Palavras-chave: Obesidade, síndrome
metabólica, conduta nutricional e atividade
física. Key word: Obesity, metabolic syndrome,
conducts nutritional and physical activity.
1- Programa de Pós-Graduação Lato-Sensu
em Obesidade e Emagrecimento da Endereço para correspondência:
Universidade Gama Filho - UGF ac-andresanutri@ig.com.br
2- Bacharel em Nutrição pela Universidade de greziellecouzzi@ig.com.br
Mogi das Cruzes – UMC
3- Bacharel em Nutrição pela Universidade
Gama Filho - UGF

Revista Brasileira de Obesidade, Nutrição e Emagrecimento, São Paulo v.3, n.13, p.18-29, Jan/Fev. 2009. ISSN 1981-9919.
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INTRODUÇÃO a conceituação atualmente mais utilizada


(Pinheiro, Freitas e Corso, 2004).
O crescente aumento da incidência de A obesidade não é uma doença
obesidade na população brasileira vem singular, e sim um grupo heterogêneo de
desencadeando um quadro preocupante de condições com múltiplas causas que, em
doenças crônicas não transmissíveis como o última análise, refletem no fenótipo obeso
diabetes, hipertensão arterial e (Pereira, Francischi e Lancha Júnior, 2003).
hipercolesterolemia. Estas doenças Segundo a Organização Mundial de
juntamente com excesso de peso são Saúde, a ocorrência da obesidade nos
denominadas de síndrome metabólica, uma indivíduos reflete a interação entre fatores
condição clínica correspondente a um distúrbio dietéticos e ambientais com uma
metabólico complexo. Neste sentido sabe-se predisposição genética (Francischi e
da importância da alimentação na prevenção e colaboradores, 2000).
tratamento destas doenças. A importância genética na etiologia da
Por muitos anos, dietas hipolipídicas obesidade também tem sido foco de pesquisa
foram recomendadas, a fim de prevenir e tratar em todo o mundo, no entanto, existem poucas
as doenças cardiovasculares, hoje tais evidências sugerindo que algumas populações
recomendações são discutíveis, em função do são mais susceptíveis à obesidade por
atual conhecimento de que dietas motivos puramente genéticos; além disto, o
hiperglicídicas podem promover a síndrome substancial aumento na prevalência da
metabólica. obesidade observado nos últimos 20 anos não
Neste contexto, o objetivo é revisar na pode ser justificado por alterações genéticas
literatura científica a conduta nutricional como que teoricamente teriam ocorrido neste
um fator indispensável não somente no pequeno espaço de tempo (Pereira, Francischi
tratamento, como também na prevenção da e Lancha Júnior, 2003).
síndrome metabólica, referindo-se quanto ao Deste modo, alguns autores enfatizam
consumo dos lipídeos, carboidratos, proteínas, o fato de que a diferença na prevalência da
fibras; dentre outras recomendações obesidade em diferentes grupos populacionais
adicionais no que se refere ao tratamento está muito mais atribuída aos chamados
dessa síndrome. fatores ambientais, em especial à dieta e a
Para levantamento bibliográfico, foram atividade física (Pereira, Francischi e Lancha
utilizados como base de dados Medline, Lilacs, Júnior, 2003).
Periódicos Capes e Scielo. A obesidade, particularmente a de
distribuição abdominal, associa-se a um maior
OBESIDADE risco cardiovascular decorrente da maior
incidência de diabetes melitus, hipertensão
A obesidade definida como a arterial, dislipidemia e da própria síndrome
acumulação excessiva de gordura corporal metabólica, além de um maior risco de
deriva de um desequilíbrio crônico entre a mortalidade em geral (Steemburgo e
energia ingerida e a energia gasta. Neste colaboradores, 2007).
desequilíbrio podem estar implicados diversos Conforme a Organização Mundial de
fatores relacionados com o estilo de vida (dieta Saúde, o crescente aumento da prevalência
e exercício físico), alterações da obesidade se caracteriza como uma
neuroendócrinas, juntamente com um pandemia global, constituindo-se em grave
componente hereditário (Marques-Lopes e problema para o âmbito da Saúde Pública.
colaboradores, 2004). Dados relacionados com sobrepeso e
A obesidade é considerada uma obesidade demonstram que um terço da
doença integrante do grupo de doenças população adulta em vários países apresenta
crônicas não-transmissíveis (DCNT), as quais este problema (Acuña e Cruz, 2004).
são de difícil conceituação, gerando aspectos Em 1956, Vague já chamava a
polêmicos quanto à sua própria denominação, atenção para a existência de padrões distintos
seja como doença não-infecciosa, doenças de distribuição da adiposidade corporal;
crônico-degenerativas ou como doenças associava ao padrão andróide, ou seja, a
crônicas não-transmissíveis, sendo esta última deposição da gordura na porção superior do
corpo a distúrbios metabólicos tais como

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hiperuricemia, dislipidemias e alterações do nacional mais recente (Pesquisa Nacional


metabolismo glicêmico (Ribeiro Filho e sobre Saúde e Nutrição, 1989), cerca de 32%
colaboradores, 2006). dos adultos brasileiros têm algum grau de
Atualmente, a associação da excesso de peso (Pinheiro, Freitas e Corso,
adiposidade abdominal com os componentes 2004).
da síndrome metabólica está bem O aumento da prevalência da
estabelecida. Pacientes com maior grau de obesidade no Brasil torna-se ainda mais
resistência à insulina apresentam maior relevante, ao verificar-se que este aumento,
deposição intra-abdominal de gordura (Ribeiro apesar de estar distribuído em todas as
Filho e colaboradores, 2006). regiões do país e nos diferentes estratos
O tecido adiposo é um órgão dinâmico socioeconômicos da população, é
que secreta vários fatores denominados proporcionalmente mais elevado entre as
adipocinas. Estas adipocinas, em sua grande famílias de baixa renda (Pinheiro, Freitas e
maioria, estão relacionadas, direta ou Corso, 2004).
indiretamente, a processos que contribuem na No Brasil, as mudanças demográficas,
aterosclerose, hipertensão arterial, resistência socioeconômicas e epidemiológicas ao longo
insulínica, diabetes melitus tipo 2 e do tempo permitiram que ocorresse a
dislipidemias, ou seja, representam o elo entre denominada transição nos padrões
adiposidade, síndrome metabólica e doenças nutricionais, com a diminuição progressiva da
cardiovasculares (Hermsdorff e Monteiro, desnutrição e o aumento da obesidade. Isso
2004). se torna um problema de Saúde Pública, uma
vez que as conseqüências da obesidade para
Perfil epidemiológico da obesidade mundial a saúde são muitas, e variam do risco
aumentado de morte prematura a graves
Na Europa, verificou-se em 10 anos doenças não letais, mas debilitantes e que
um aumento entre 10% e 40% de obesidade; afetam diretamente a qualidade de vida destes
na maioria dos países, destacando-se a indivíduos (Pereira, Francischi e Lancha
Inglaterra, com um aumento superior ao dobro, Júnior, 2003).
entre os anos 80 e 90. A região oeste do
pacífico, compreendendo a Austrália, Japão, Determinação do aumento da obesidade
Samoa e China, também apresentou aumento
da prevalência de obesidade; porém importa As causas do aumento da obesidade
destacar que China e Japão, apesar do no mundo ainda não estão suficientemente
aumento da obesidade em comparação com esclarecidas. Três hipóteses são objeto de
outros países desenvolvidos, apresentam as estudo, na tentativa de elucidar essas causas
mais baixas prevalências (Pinheiro, Freitas e (Pinheiro, Freitas e Corso, 2004).
Corso, 2004). Dentre elas, destaca-se a
Os dados mais expressivos de possibilidade de populações apresentarem-se
prevalência de obesidade em nível mundial geneticamente mais suscetíveis à obesidade;
são provenientes do estudo WHO MONICA o que, associado a determinados fatores
(Monitoring of Trends and Determinants in ambientais, potencializariam o evento. A
Cardiovascular Diseases), que segundo este, elevação da obesidade em populações de
os valores de índice de massa corporal (IMC) baixa renda seria, a um suposto “genótipo
entre 25 e 30 são responsáveis pela maior econômico”, ou seja, os genes relacionados à
parte do impacto do sobrepeso sobre certas obesidade seriam uma garantia de
co-morbidades associadas à obesidade sobrevivência em casos de escassez de
(Pinheiro, Freitas e Corso, 2004). alimentos; porém, quando o aporte de
alimentos fosse excessivo, tais genes tornar-
Perfil epidemiológico da obesidade no se-iam prejudiciais (Romero e Zanesco, 2006).
Brasil A identificação do gene ob, que
codifica o peptídeo leptina, (uma proteína
Dados do ministério da saúde - Brasil circulante produzida, proporcionalmente, pela
informa que a população adulta vem massa do tecido adiposo que age no sistema
apresentando prevalência de excesso de nervoso aumentando a saciedade) e a
peso. De acordo com os dados do inquérito descoberta que o defeito neste gene parece

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ser a simples causa de obesidade em ratos tecido adiposo (Santos e colaboradores,


ob/ob tem gerado considerável interesse na 2006).
genética da obesidade (Pereira, Francischi e Com o desenvolvimento da resistên-
Lancha Júnior, 2003). cia, ocorre uma hiperinsulinemia compensató-
A segunda atribui à tendência de ria, mas, com a evolução da doença, o
ascensão da obesidade em países indivíduo passa a apresentar deficiência na
desenvolvidos e em desenvolvimento, a secreção de insulina, em função da exaustão
rápidos e intensos declínios de dispêndio da capacidade secretora das células beta, o
energético dos indivíduos. Tais declínios que culmina na sua incapacidade de
teriam origem no predomínio crescente das manutenção das concentrações glicêmicas
ocupações que demandam um menor esforço normais, no período pós-prandial. A essa fase
físico e na redução da atividade física da intolerância à glicose segue-se a
associada ao lazer. Ainda estaria aliado a hiperglicemia de jejum e a conseqüente
fatores alimentares, como a diminuição do instalação do quadro clínico de diabetes
consumo de fibras e o aumento do consumo mellitus (McLellan e colaboradores, 2007).
de gorduras e açúcares (Pinheiro, Freitas e
Corso, 2004). Hipertensão arterial
Na terceira hipótese, a obesidade
resultaria de uma desnutrição energético- A hipertensão arterial é uma doença
protéica precoce, ou seja, a obesidade altamente prevalente em nosso meio,
ocorreria como uma seqüela da desnutrição, atingindo cerca de 15 a 20% da população
onde a restrição energética e protéica adulta com mais de 18 anos. Para cada
ocasionaria “uma modificação na regulação do aumento de 10% na gordura corporal, há
sistema nervoso central no sentido de facilitar elevação na pressão arterial sistólica de
prioritariamente o acúmulo de gordura aproximadamente 6,0 mmHg e na diastólica
corporal”, promovendo uma tendência ao de 4,0mmHg (Mion Júnior e colaboradores,
balanço energético positivo, quando ocorresse 2001).
o acesso facilitado aos alimentos (Pinheiro,
Freitas e Corso, 2004). Doenças cardiovasculares e dislipidemia
Sumariamente, há duas vertentes
teóricas: uma que responsabiliza a Para cada 10% de aumento no peso
composição da dieta com alta concentração de corporal, há aumento na incidência de
gorduras e carboidratos simples como fator doenças coronarianas em aproximadamente
determinante da obesidade; outra, que afirma 20%, além da elevação do colesterol
ser o consumo total de calorias o principal plasmático em torno de 12mg/dl (Francischi e
determinante (Halpern e colaboradores, 2004). colaboradores, 2000).
Segundo análise de Stunkard, a obesidade é A forma mais comum de dislipidemia
determinada por vários fatores, sendo que os associada à síndrome metabólica é chamada
mesmos atuam em conjunto na determinação dislipidemia aterogênica, caracterizada por
clínica da doença. Portanto, o resultado seria três anormalidades lipídicas:
produto da combinação entre fatores genéticos hipertrigliceridemia, baixas concentrações
e ambientais, preconizando-se que as plasmáticas de lipoproteína de alta intensidade
influências genéticas são especificamente (HDL-c) e elevação da lipoproteína de baixa
mais importantes para determinar a intensidade (LDL-c) (Hermsdorff e Monteiro,
distribuição da gordura corpórea (Pinheiro, 2004).
Freitas e Corso, 2004). A sua etiologia está associada à
resistência insulínica, na qual em virtude do
CONSEQÜÊNCIAS DA OBESIDADE menor metabolismo de lipoproteína de muita
baixa intensidade (VLDL-c), decorrente da
Resistência insulínica hiperinsulinemia, a concentração plasmática
de triglicerídeos encontra-se aumentada,
A resistência à insulina ocorre quando enquanto a de HDL-c está diminuída (Barbosa
uma concentração normal deste hormônio e colaboradores, 2006).
produz uma menor resposta biológica nos Posteriormente, há aumento na
tecidos periféricos, como músculo, fígado e síntese de colágeno nas células da parede

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vascular e na formação de placas de lipídeos síndrome metabólica são muito preocupantes,


nas artérias associada à diminuição de sua já que esta síndrome é preditora de diabetes e
remoção. Assim, haverá predisposição à doenças cardiovasculares, considerando que
formação do ateroma, elevando a probabilida- existam cerca de 200 milhões de pacientes
de de ocorrência de problemas cardiovascula- diabéticos em todo o mundo e que 80% vão
res (Bevilacqua e colaboradores, 2007). falecer devido a doenças cardiovasculares
(Ribeiro Filho e colaboradores, 2006). A
Sedentarismo maioria dos casos de síndrome metabólica
ocorre em indivíduos com excesso de peso, o
A prática regular de atividade física que por si só, prejudica a sensibilidade à
tem sido recomendada para a prevenção e insulina, que diminui em até 40% quando o
reabilitação de doenças cardiovasculares e indivíduo apresenta massa corporal maior que
outras doenças crônicas por diferentes 35% a 40% da ideal (Santos e colaboradores,
associações de saúde no mundo. Estudos 2006).
epidemiológicos têm demonstrado relação
direta entre inatividade física e a presença de Fisiologia da Síndrome Metabólica
múltiplos fatores de risco como os encontrados
na síndrome metabólica (Ciolac e Guimarães, A ocorrência de complicações da
2004). obesidade depende não apenas do excesso
de peso, mas também da distribuição da
SÍNDROME METABÓLICA gordura corporal, a qual pode estar localizada
na região central ou abdominal (conhecida
Reconhecida como uma entidade como obesidade em forma de maçã, andróide
complexa que associa fatores de risco ou visceral) ou na região inferior do quadril
cardiovasculares bem estabelecidos, como (conhecida como de pêra ou ginóide) (Porto,
hipertensão arterial, hipercolesterolemia, León, Valdés, 2002).
diabetes, entre outros, com a deposição A obesidade visceral está relacionada
central de gordura e a resistência à insulina, a a diversos problemas metabólicos
síndrome metabólica já ganha dimensão como plasmáticos, característicos da síndrome
um dos principais desafios da prática clínica metabólica:
nesse início de século (Sociedade Brasileira 1 • Hipersensibilidade aos glicocorticóides;
de Cardiologia, 2005). 2 • Elevadas concentrações plasmáticas de
Esta síndrome foi descrita pela glicose que induzem o pâncreas a liberar o
primeira vez, por Raven em 1988 e consistia excesso de insulina (hiperinsulinemia) que, em
na presença simultânea de vários fatores de longo prazo, culmina com resistência à
risco cardiovasculares, como hipertensão insulina e diabetes mellitus tipo 2;
arterial, intolerância à glicose, 3 • Aumento da secreção de angiotensina que
hipertrigliceridemia e baixas concentrações de pode aumentar o risco de hipertensão;
lipoproteínas de alta intensidade (HDL-c) 4 • Aumento da secreção de interleucina-6 (IL-
sendo identificada como síndrome X (McLellan 6), citocina inflamatória;
e colaboradores, 2007). 5 • Aumento de triglicerídeos que pode
A patogenia da síndrome metabólica comprometer a viscosidade sangüínea,
não é bem conhecida, a insulinoresistência é aumentando o risco cardiovascular;
considerada a responsável pela maior parte 6 • Redução do colesterol HDL, fundamental
das anomalias presentes, fundamentalmente para realizar o transporte reverso do colesterol
na hiperglicemia, no aumento da produção e que também apresenta efeitos
hepática de lipoproteína de densidade muito antiinflamatórios, antioxidantes e
baixa (VLDL) e triglicerídeos e na estimulação vasodilatadores (Ribeiro e colaboradores,
da proliferação endotelial dos receptores 2001).
endoteliais causadores do início do processo
de aterosclerose (Porto, León, Valdés, 2002). Efeitos da obesidade Visceral ou Central na
Síndrome Metabólica
Prevalência da Síndrome Metabólica
Existem diversos indicadores de
Os dados de prevalência mundial da obesidade total e central: a obesidade central

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pode ser medida pela espessura de dobras concentrações de triglicerídeos, com aumento
cutâneas no tronco e nas extremidades; por do HDL-c (Sociedade Brasileira de
medidas de circunferências de cintura e Cardiologia, 2005).
quadril; por tomografia computadorizada, A necessidade de uma abordagem
ultrassonografia abdominal e ressonância multidisciplinar e de inúmeros medicamentos
magnética nuclear. Mais recentemente, no impõe ao paciente e ao sistema de saúde
início da década de 90 foi proposto o índice de elevado custo, tanto com prevenção primária
conicidade (índice C) como indicador para como com prevenção secundária e terciária.
avaliação da obesidade e a distribuição da Apenas com este tipo de abordagem estes
gordura corporal. Este índice utiliza como pacientes são adequadamente tratados e uma
variáveis o peso, a estatura e a circunferência diminuição significativa da mortalidade pode
da cintura (Pitanga e Lessa, 2007). ser alcançada (Matos, Moreira e Guedes,
Quando há acúmulo de gordura 2003).
visceral aumenta o risco de degeneração Por muitos anos, dietas hipolipídicas e
gordurosa não – alcoólica do fígado uma vez hiperglicídicas foram recomendadas, a fim de
que há aumento da lipólise e da síntese de prevenir e tratar as doenças cardiovasculares.
triglicerídeos a partir da glicose. Neste caso Hoje tais recomendações são discutíveis, em
também há aumento da secreção hepática função do atual conhecimento de que dietas
para o sangue, aumentando suas hiperglicídicas podem promover a síndrome
concentrações séricas. O excesso de metabólica. Há um enorme apelo médico e
triglicerídeos no sangue, outro componente da socioeconômico para identificar marcadores
síndrome metabólica, diminui a secreção da síndrome metabólica que possam auxiliar
hepática de HDL-c e promove alteração da no combate à progressão da atual epidemia
viscosidade sangüínea, favorecendo o (Ribeiro Filho e colaboradores, 2006).
processo de agregação de plaquetas e o risco
de trombose (Ferrari, 2007). Diferentes condutas para o tratamento
Depósitos viscerais de gorduras nutricional da síndrome metabólica
possuem turnover mais acelerado que em
outras regiões, elevando as concentrações do O estudo da síndrome metabólica tem
inibidor do plasminogênio-1 (PAI-1, promove a sido dificultado pela ausência de consenso na
formação de trombos e ruptura de placas sua definição e nos pontos de corte dos seus
aterogênicas instáveis e contribui para o componentes. A Organização Mundial de
processo aterosclerótico), citocinas Saúde preconiza como ponto de partida a
inflamatórias e ácidos graxos não-esterificados avaliação da resistência à insulina ou do
(NEFA) no sistema porta (Santos e distúrbio do metabolismo da glicose, o que
colaboradores, 2006). dificulta sua utilização. Segundo o National
A maior liberação de ácidos graxos Chocolsterol Education Programs Adult
não-esterificados no tecido adiposo estimula a Treatment Panel III (NCEP –ATP III) a
gliconeogênese, inibe a depuração hepática síndrome metabólica representa a combinação
de insulina e provoca acúmulo de triglicerídeos de pelo menos três destes fatores: obesidade
no fígado e no músculo, resultando em abdominal (homens acima de 102 e mulheres
hiperglicemia e conseqüente hiperinsulinemia. acima de 88cm), triglicerídeo acima de
Assim, o acúmulo de gordura no músculo leva 150mg/dl, HDL colesterol menor que 40mg/dl
à resistência insulínica, enquanto no fígado, para homens e menor que 50mg/dl para
promove a dislipidemia aterogênica (Santos e mulheres, pressão arterial acima de 130mmHg
colaboradores, 2006). ou maior ou igual a 85mmHg e glicemia de
Está comprovado que a redução jejum maior ou igual a 110mg/dl. Pela sua
expressiva da circunferência abdominal e a simplicidade e praticidade é a definição
gordura visceral melhoram significativamente a recomendada pela I Diretriz Brasileira de
sensibilidade à insulina, diminui as Diagnóstico e Tratamento da Síndrome
concentrações plasmáticas de glicose, metabólica (Sociedade Brasileira de
podendo prevenir e retardar o aparecimento Cardiologia, 2005).
de diabetes mellitus tipo 2. Há ainda, com A maioria das entidades nacionais e
essas duas intervenções, uma redução internacionais não possui diretrizes específicas
expressiva da pressão arterial e nas para a síndrome metabólica como uma

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condição clínica independente, e as deve exceder 30% do valor energético total


recomendações são em geral focadas no (Steemburgo e colaboradores, 2007).
manejo dos fatores de risco cardiovasculares. Em relação aos carboidratos, a ADA
A seguir será resumido o posicionamento de recomenda diferenciá-los quanto à qualidade,
diferentes entidades em relação à conduta isto é, quanto ao índice glicêmico, e não
nutricional na síndrome metabólica apenas à quantidade total ingerida. Porém,
(Steemburgo e colaboradores, 2007). enfatiza que são necessários mais estudos
Segundo a American Heart antes de adotar o critério do índice glicêmico
Association (AHA) o enfoque principal para como uma diretriz. A ADA também recomenda
portadores de síndrome metabólica é o o consumo de alimentos ricos em fibras
controle dos fatores de risco cardiovascular alimentares e com baixo índice glicêmico (14g
individuais, que pode ser realizado através de de fibras totais para cada 1000 kcal/dia)
modificações no estilo de vida, incluindo a (Romero, 2006).
intervenção dietoterápica (Steemburgo e A Sociedade Brasileira de Diabetes
colaboradores, 2007). (SBD), em recente consenso, considera as
É recomendado um consumo calórico modificações no estilo de vida como redução
balanceado, que associado à atividade física, de peso, dieta saudável, exercício regular e
permita atingir e/ou manter o peso ideal. Além cessação do fumo como sendo as principais
disso, evitar uma dieta aterogênica, através da orientações terapêuticas no tratamento da
redução da ingestão de gordura saturada síndrome metabólica. Não existem
(menor que 7% do valor energético total), de recomendações dietoterápicas específicas,
ácidos graxos do tipo trans (menor que 1% do porém a dieta mediterrânea é citada como
valor energético total) e de colesterol (menor possivelmente associada a uma maior perda
que 300mg/dia), o que pode contribuir de de peso (Steemburgo e colaboradores, 2007).
forma efetiva na redução de risco para doença A adoção do modelo dietético dietary
cardiovascular, aumentando o consumo de approaches to stop hypertension (dietas
frutas, vegetais, grãos integrais e peixes apropriadas para parar a hipertensão) (DASH)
(Steemburgo e colaboradores, 2007). e da dieta mediterrânea que preconizam o uso
O National Cholesterol Education de hortaliças, leguminosas, grãos integrais,
Program – Adult Treatment Panel III (NCEP- frutas, laticínios com baixo teor de gordura
ATP III), fundamenta suas recomendações total, gordura saturada, gordura trans e
dietoterápicas em relação à síndrome colesterol, dando ênfase à alta quantidade de
metabólica no controle das concentrações de gordura monoinsaturada (azeite de oliva) e
LDL colesterol com o objetivo de redução do ácido graxo ômega-3 fornecendo altas
risco de doença cardiovascular. Em relação ao quantidades de potássio, magnésio e cálcio,
valor energético total, recomenda consumo de pode ser uma opção terapêutica na síndrome
50 – 60% de carboidratos, 15% de proteínas e metabólica quando associada a uma
25 – 30% de gorduras. A ingestão diária de intervenção no estilo de vida (Sociedade
gordura saturada e de colesterol total deve ser Brasileira de Cardiologia, 2005).
menor que 7% e do que 200mg, A Sociedade Brasileira de Cardiologia
respectivamente. No NCEP- ATP III é feita já apresenta uma diretriz definida para o
uma recomendação específica para o tratamento não medicamentoso da síndrome
consumo de fibras do tipo solúvel; 10-25g/dia metabólica. O plano alimentar recomendado
(Steemburgo e colaboradores, 2007). aos pacientes consiste em fornecer um valor
A American Diabetes Association energético total compatível com a obtenção
(ADA) ainda não apresenta uma diretriz e/ou manutenção do peso corporal desejável.
específica para a síndrome metabólica. No Além disso, o consumo diário de carboidratos,
entanto, uma vez que gorduras saturadas proteínas e gordura total deve ser de 50-60%,
elevam as concentrações de colesterol e 15% e 25-35% do valor energético total,
potencializam a hipercolesterolemia, é respectivamente. A ingestão de gordura
recomendado reduzir seu conteúdo dietético a saturada deve ser limitada a menos do que
menos do que 7% do valor energético total e o 10%, a de gordura monoinsaturada, até 20% e
consumo de colesterol a menos do que de gordura poliinsaturada, até 10%. O
200mg/dia. A ingestão de gorduras totais não consumo de colesterol deve ser menor do que
200mg/dia. É recomendado o consumo de 20-

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30g/dia de fibras totais sob a forma de grãos normalização dos níveis pressóricos, correção
integrais, frutas, vegetais e leguminosas das dislipidemias e da hiperglicemia e
(Steemburgo e colaboradores, 2007). conseqüentemente a redução do risco
cardiovascular. As evidências favorecem as
CONDUTA NUTRICIONAL dietas ricas em fibras, pobres em gorduras
saturadas e colesterol e com reduzida
A urbanização induziu uma mudança quantidade de açúcar simples (Sociedade
nos padrões de vida e comportamento Brasileira de Cardiologia, 2005).
alimentar das populações. Em países em Em pacientes com sobrepeso ou
desenvolvimento, o tipo de alimento obesidade, as dietas hipocalóricas que variam
consumido na zona rural apresenta-se entre 800 – 1500 Kcal/dia reduzem
diferente daquele consumido na zona urbana, aproximadamente 8% do peso corporal após
numa relação diretamente proporcional ao um período de seis meses de tratamento
poder aquisitivo ou ao nível socioeconômico. A dietético (Steemburgo e colaboradores, 2007).
população urbana consome maior quantidade O estabelecimento de guias de alimentação e
de alimentos processados, como carnes nutrição saudável tem por base o
gorduras, açúcares e derivados do leite, em reconhecimento de que um nível ótimo de
relação à área rural, onde a ingestão de saúde depende da nutrição. Com o aumento
cereais, raízes e tubérculos é mais elevada da obesidade e das doenças associadas à
(Pinheiro, Freitas e Corso, 2004). obesidade, no Brasil, há que se combinarem
O plano alimentar deve fornecer um orientações para a redução das deficiências
valor calórico total (VCT) compatível com nutricionais, ainda presentes, com orientações
obtenção e/ou manutenção de peso corporal visando à prevenção das doenças crônicas
desejável. Para obesos, a dieta deve ser não transmissíveis (Sichieri e colaboradores,
hipocalórica, com a redução de 500 kcal a 2000).
1000 kcal do gasto energético total (GET) Quanto à forma de preparo dos
diário previsto ou da anamnese alimentar, com alimentos, preferir os grelhados, assados,
o objetivo de promover perdas ponderais de cozidos no vapor ou até mesmo crus. Os
0,5kg a 1,0Kg/semana. Não utilizar dietas alimentos diet e light podem ser indicados no
inferiores a 800 kcal, pois não são efetivas contexto do plano alimentar e não utilizados de
para redução de peso (Sociedade Brasileira de forma exclusiva (Sociedade Brasileira de
Cardiologia, 2005). Cardiologia, 2005).
Segundo Wirth (1995) a dieta para
redução de peso deve limitar a ingestão total PLANO ALIMENTAR
energética. Duas estratégias comumente
utilizadas são o uso das Very Low Calorie Lipídeos
Diets (dietas de baixa caloria) com consumo
energético menor de 800 kcal/dia, e as A ingestão de gorduras é
restrições energéticas moderadas, com inversamente associada à sensibilidade
consumo de 1200 Kcal/dia ou mais (Francischi insulínica não somente pela relação positiva
e colaboradores, 2000). com o peso corporal, mas também pela
Dietas que restringem severamente o qualidade de oferta de ácidos graxos. Os
consumo energético, bem como jejuns ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 podem
prolongados, são cientificamente indesejáveis ser benéficos na síndrome metabólica em
e perigosos para a saúde, resultando em especial no tratamento da hipertrigliceridemia
perdas de grandes quantidades de água, grave em pessoas com diabetes tipo 2. Duas
eletrólitos, minerais, glicogênio e outros ou três porções de peixe/semana devem ser
tecidos isentos de gordura, com mínima recomendadas (Sociedade Brasileira de
redução de massa adiposa (Francischi e Cardiologia, 2005).
colaboradores, 2000). Os ácidos graxos trans aumentam as
A adoção de uma dieta balanceada é lipoproteínas de baixa intensidade (LDL-c) e
uma das principais medidas a ser preconizada triglicerídeos e reduzem a fração do HDL-c. A
em indivíduos com síndrome metabólica e maior contribuição desses ácidos graxos na
deve estar direcionada para perda de peso e dieta origina-se do consumo de óleos e
da gordura visceral, com o objetivo de gorduras hidrogenadas, margarinas duras e

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shorteings (gorduras industriais presentes em Dietas de alto índice glicêmico


sorvetes, chocolates, produtos de padaria, diminuem a sensibilidade à insulina, além de
salgadinhos tipo chips, molhos para saladas, estarem associadas à hipertrigliceridemia e
maionese, creme para sobremesas e óleos diminuição das concentrações plasmáticas de
para fritura industrial) (Santos e colaboradores, HDL-c. Por outro lado, dietas com baixos
2006). índice estão associadas a um menor risco de
Atualmente, sabe-se que não apenas desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2,
a quantidade total dos lipídeos da dieta é doenças cardiovasculares e certos tipos de
importante, mas é relevante estudar também a câncer (Santos e colaboradores, 2006).
qualidade dos lipídeos. Os resultados de Sabe-se que o consumo de
pesquisas epidemiológicas colaboraram com a carboidratos está associado com teores de
hipótese de que o tipo de gordura é um triglicerídeos séricos. O indivíduo
determinante mais importante do risco hipertrigliceridêmico deve reduzir o consumo
cardiovascular que a sua quantidade total de carboidratos simples e controlar o de
(Bevilacqua, 2007). carboidratos complexos. É recomendado o uso
Ensaios clínicos também mostraram de hortaliças, leguminosas, grãos integrais e
que a substituição de ácido graxo saturado e frutas. Embora dietas com baixo índice
gorduras trans da dieta por ácido graxo glicêmico possam reduzir o perfil lipídico, a
poliinsaturado é mais efetiva na redução das capacidade dos indivíduos para manter essas
concentrações séricas de colesterol e da dietas em longo prazo não está bem
morbi-mortalidade por doenças estabelecida (Bevilacqua, 2007).
cardiovasculares que a simples redução do
teor total de lipídeos da dieta. A Proteínas
recomendação atual é a de estimular o
consumo de óleos vegetais (especialmente os Recomenda-se uma ingestão diária de
de oliva e canola), de peixes e frutas proteínas de 0,8 a 1g/Kg de peso atual ou 15%
oleaginosas, e reduzir o de alimentos ricos em do VCT. O aporte protéico assemelha-se ao
gorduras saturadas e trans (Bevilacqua, 2007). da população geral, com ênfase no consumo
de proteínas de origem vegetal (como a soja:
Carboidratos 1,3g% de gordura saturada e 0 mg colesterol)
e peixe (teor médio de 2,9% de gordura
De acordo com Riccardi e Rivellese, saturada e 68mg de colesterol), visando à
dietas hiperglicídicas estão associadas ao menor ingestão de gorduras saturadas e
aumento das concentrações plasmáticas de colesterol, uma vez que as carnes vermelhas
triglicerídeos e PAI-1, bem como à redução de apresentam teores mais elevados (teor médio
HDL-c e menor fibrinólise. Tais malefícios são de 7,3g% de gordura saturada e 85 mg% de
minimizados se a digestão e absorção dos colesterol) (Santos e colaboradores, 2006).
carboidratos forem lentas, despertando assim, A substituição de proteína de origem
o interesse a respeito do índice glicêmico dos animal por proteína de soja diminui as
alimentos. Segundo os autores, tais efeitos concentrações sangüíneas de colesterol e
somente ocorrem quando alimentos de alto LDL-c em indivíduos hipercolesterolêmicos. As
índice glicêmico são consumidos (Romero e concentrações séricas de LDL-c podem ser
colaboradores, 2006). reduzidas em até 5% com dietas pobres em
O índice glicêmico mensura a resposta gorduras saturadas e colesterol, contendo 25g
glicêmica prandial causada por um diárias de proteína de soja (Santos e
determinado alimento. Vários fatores colaboradores, 2006).
influenciam essa resposta, incluindo a
quantidade de carboidratos, o tipo de açúcar Fibras
(glicose, frutose, sacarose, lactose), a
natureza do amido (amilose, amilopectina, É recomendado o consumo de fibras
amido resistente), o processo de cocção (grau em 20g a 30g/dia sob a forma de hortaliças,
de gelatinização do amido), a forma física do leguminosas, grãos integrais e frutas, pois
alimento e o tamanho da partícula do fornecem minerais, vitaminas e outros
carboidrato (Santos e colaboradores, 2006). nutrientes essenciais para uma dieta saudável
(Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2005).

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A quantidade adequada de fibras Cálcio, potássio e magnésio parecem


alimentares tem importante função na dieta diminuir o risco de hipertensão arterial
para redução de obesidade, tais como: sistêmica, doença arterial coronariana e
redução na ingestão energética; aumento no diabetes mellitus tipo 2 (Santos e
tempo de esvaziamento gástrico; diminuição colaboradores, 2006).
na secreção de insulina; aumento na sensação O magnésio participa de várias
de saciedade; redução na digestibilidade; reações críticas no metabolismo de
redução no gasto energético e aumento na carboidratos e, por isso, acredita-se que tenha
excreção fecal de energia (Francischi e um papel importante na homeostase de
colaboradores, 2000). glicose e ação insulínica (Carvalho e
Dietas ricas em fibras também colaboradores, 2006).
contribuem para a minimização dos problemas
de doenças cardiovasculares, devido à Atividade Física
redução do colesterol plasmático e da LDL-c
(Francischi e colaboradores, 2000). Estudos epidemiológicos têm
As fibras solúveis reduzem o tempo de demonstrado relação direta entre inatividade
trânsito intestinal e ajudam na diminuição das física e a presença de múltiplos fatores de
concentrações séricas de colesterol. Além risco como os encontrados na síndrome
disso, melhoram a tolerância à glicose, sendo metabólica, onde a prática regular de
responsáveis pela maioria dos benefícios exercícios tem sido recomendada para
cardiovasculares atribuídos às fibras prevenção e reabilitação de doenças
alimentares. Já as fibras insolúveis não têm cardiovasculares e outras doenças crônicas
ação na colesterolemia, mas aumentam a por diferentes associações de saúde no
saciedade, auxiliando na redução da ingestão mundo (Ciolac e Guimarães, 2004).
energética. Dessa maneira, o aumento da Tem sido recomendado que
ingestão de fibras alimentares pode promover programas de exercícios para obesos
a perda de peso (Santos e colaboradores, comecem com o mínimo de 150 minutos
2006). semanais e intensidade moderada e progridam
Entre os alimentos da dieta brasileira gradativamente para 200 a 300 minutos
com maior teor de fibra incluem-se farinha de semanais na mesma intensidade, onde não
mandioca, feijão, ervilha, milho, amendoim, evoluindo desta forma, deve-se incentivar a
jiló, pinhão, batata doce, batata baroa, cará e realizar pelo menos a recomendação mínima
taioba (Sichieri e colaboradores, 2000). pois mesmo não havendo redução de peso
haverá benefícios para a saúde (Ciolac e
RECOMENDAÇÕES ADICIONAIS Guimarães, 2004).

Vitamina C, Cálcio, Potássio e Magnésio Sal de Cozinha

O plano alimentar deve prover a Redução do consumo de sal requer


recomendação para o consumo diário de duas grande redução do consumo de alimentos
a quatro porções de frutas, sendo pelo menos processados com alta quantidade de sódio
uma rica em ácido ascórbico (vitamina C) como chips, defumados e enlatados, bem
(Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2005). como evitar adicionar sal aos alimentos já
O ácido ascórbico é o micronutriente preparados. Produtos enlatados têm até 20
mais associado a frutas e hortaliças, que vezes mais sal do que o produto natural. O
fornecem mais de 90% desta vitamina à dieta processamento dos enlatados pode, contudo,
humana. Possui diversas funções biológicas ser feito com menor teor de sódio, estratégia
na formação de colágeno, absorção de ferro que deveria ser estimulada pelo Ministério da
inorgânico, redução da concentração de Saúde, bem como a rotulagem dos produtos
colesterol, inibição da formação de em relação ao sal (Sichieri e colaboradores,
nitrosaminas e fortalecimento do sistema 2000).
imunológico. Como antioxidante, reduz o risco Ao contrário, temperos naturais como
de aterosclerose, doenças cardiovasculares e salsa, cebolinha e ervas aromáticas são
algumas formas de câncer (Carvalho e recomendados em vez de condimentos
colaboradores, 2006).

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industrializados (Sociedade Brasileira de conseguiremos prevenir e posteriormente


Cardiologia, 2005). tratar a obesidade e a síndrome metabólica.

Bebida Alcoólica REFERÊNCIAS

A ingestão excessiva de bebidas 1- Acuña, K.; Cruz, T. Avaliação do Estado


alcoólicas está relacionada ao aumento da Nutricional de Adultos e Idosos e Situação
pressão arterial, das concentrações de Nutricional da População Brasileira. São
triglicerídeos e da carga calórica total. Paulo. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia
Recomenda-se limitar a ingestão de bebidas & Metabologia. Vol .48. Num. 3. 2004. p. 22 –
alcoólicas a 30 ml/dia de etanol para homens e 39.
a metade para mulher. Evidências mostram
que acima desse limite há elevação nos níveis 2- Barbosa, B.J.P.; Lessa, I.; Almeida Filho, N.;
de pressão arterial e de triglicerídeos, além de Magalhães, C.N.B.L.; Araújo, J. Critério de
influenciar na carga calórica total. Aos Obesidade Central em população brasileira:
pacientes que não conseguem respeitar estes impacto sobre a síndrome metabólica. São
limites, sugere-se o abandono do consumo de Paulo. Arquivos Brasileiros de Cardiologia.
bebidas alcoólicas (Sociedade Brasileira de Vol. 87. Num. 4.2006. p. 10-21.
Cardiologia, 2005).
Embora não seja parte integrante da 3- Bevilacqua, R.M.; Gimeno, A.G.S.;
síndrome metabólica, a proibição do hábito de Matsumura, K.L.; Ferreira, G.R.S.; Group,
fumar deve ser fortemente estimulada face à S.D.B.J. Hiperlipidemias e Fatores Dietéticos:
sua enorme importância como fator de risco Estudo Transversal entre Nipo-Brasileiros. São
cardiovascular (Sociedade Brasileira de Paulo. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia
Cardiologia, 2005). & Metabologia. Vol. 51. Num. 4. 2007. p. 16 –
30.
CONCLUSÃO
4- Carvalho, B.G.P.; Machado, M.M.C.;
De acordo com a revisão proposta, a Moretti, L.C.; Fonseca, N.E.M. Hortaliças como
literatura afirma que a alimentação possui um alimentos funcionais. Brasília. Vol.24. Num.4.
papel de extrema importância para o 2006. p.24-38.
tratamento e também para prevenção de
doenças crônicas não transmissíveis que se 5- Ciolac, G.E.; Guimarães, V.G. Exercício
não tratadas resultam na síndrome metabólica. físico e síndrome metabólica. Niterói. Revista
Destacamos a conduta nutricional, priorizando Brasileira de Medicina do Esporte. Vol.10.
uma restrição quanto ao consumo de lipídeos Num. 4. 2004. p. 18 -37.
saturados e lipídeos trans (maionese, cremes
gordurosos, gordura animal, óleos de fritura 6- Ferrari, B.K.A. Fisiopatologia Clínica da
industrial, sorvetes...), para a adesão de Síndrome Metabólica. Arquivos Catarinenses
gorduras vegetais como óleo canola e azeite; de Medicina. Vol.36. Num. 4. 2007. p. 91-95.
quanto ao consumo de carboidratos, consumir
os complexos (grãos integrais, frutas, 7- Francischi, P.P.R.; Pereira, O.L.; Freitas,
hortaliças e leguminosas) utilizando S.C.; Klopfer, M.; Santos, C.R.; Vieira, P.;
eventualmente os simples; quanto às Lancha Júnior, H.A. Obesidade: Atualização
proteínas devem ser consumidas em sobre sua Etiologia, Morbidade e Tratamento.
proporções normais sem excedentes, incluindo Campinas. Revista de Nutrição. Vol. 13. Num.
os peixes e as de origem vegetal como a soja 1. 2000. p. 30 - 45.
e o consumo das fibras diariamente na forma
de legumes, verduras e frutas. 8- Halpern, C.S.Z.; Rodrigues, B.D.M.; Costa,
A importância de exercícios físicos, a F.R. Determinantes fisiológicos do controle de
cessação do hábito de fumar e o controle da peso. São Paulo. Vol.31. Num. 4. 2004. p.25-
ingestão de bebidas alcoólicas são 30.
fundamentais como complemento de um plano
de vida mais saudável, pois mantendo bons 9- Hermsdorff, M.H.H.; Monteiro, R.B.J.
hábitos e uma alimentação equilibrada, Gordura Visceral, Subcutânea ou

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