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IUPERJ-UCAM
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RESUMO
1. INTRODUÇÃO
Trago para essa discussão, o autor italiano Giovanni Papini, que dialogou tanto com
o futurismo quanto com o fascismo. Autor esse que escreve o texto Il Diavolo Tentato, o
qual transformei em ópera no ano de 2004. Papini aqui, por meio de seu “diabo tentado”, se
torna o personagem central de meu trabalho enquanto compositor. Poder escrever sobre Il
Diavolo Tentato após dezessete anos de sua composição e dos quase dezesseis anos de sua
estréia mundial, além de contextualizar tanto a minha criação musical quanto a obra original,
em seu tempo, me fez revisitar estudos e leituras que se iniciaram há mais de vinte anos.
Isso sem levar em consideração, a relevância de se abordar temas como “fascismo”, “arte”,
“política”, “ideologia”, “direita”, “esquerda”, “modernidade”, “religião”,
“conservadorismo”, “revolução” e “vanguardas”.
2. FUTURISMO ITALIANO
O futurismo permeia uma das inúmeras vertentes vanguardistas da primeira metade
do século XX. Tendo a Itália como o seu berço, no ano de 1909, por meio do lançamento
do Manifesto Futurista, escrito pelo poeta Filippo Marinetti, e publicado na revista
francesa Le Figaro. Esse movimento não ficou restrito apenas à Itália, mas influenciou
artistas franceses, portugueses, russos e brasileiros.
3. FASCISMO
Para falarmos sobre o fascismo se fáz necessário trazer à luz os autores Ernest Mandel e
Leandro Konder que identificam elementos-chave para entendermos em que condições esse
movimento pode ocorrer. Em seu livro Sobre o Fascismo, Ernest Mandel, ao apresentar a teoria
do fascismo de Trotsky, nos diz que
...uma unidade de seis elementos; no interior desta unidade cada elemento possui uma
certa autonomia e uma evolução determinada em virtude das suas contradições internas:
mas a unidade só pode ser compreendida como uma totalidade fechada e dinâmica na
qual esses elementos, não isoladamente mas na sua intrínseca conexão recíproca, podem
explicar o ascenso, a vitória e a queda da ditadura fascista. (MANDEL, 1976, 28-29)
a) A função histórica da tomada do poder pelo fascismo é a alteração pela força da violência,
a favor dos grupos decisivos do capital monopolista, das condições de reprodução do capital.
(Ibidem, p. 29)
c) Com o uso de métodos adequados, adaptados às exigências da psicologia das massas, um tal
movimento de massas pode não obter um controle permanente sobre os assalariados
politicamente conscientes, (...) como pode mesmo influenciar ideologicamente os
trabalhadores menos conscientes, particularmente os empregados, e reintegrá-los
parcialmente numa colaboração de classes efectiva. (Ibidem, p. 32-33)
Destaco o fato de que esses elementos apresentados pelo autor se comportam de forma
interdependente e interrelacionada, ou seja, para que o fascismo se configure e se apresente como
tal, se torna necessário que todos esses elementos estejam diretamente conectados entre si e que
um dependa do outro para que ele, o fascismo, seja posto. Para Konder (2009),
...o fascismo é uma tendência que surge na fase imperialista do capitalismo, que procure
se fortalecer nas condições de implantação do capitalismo monopolista de Estado,
exprimindo-se através de uma política favorável à crescente concentração do capital; é
um movimento político de conteúdo social conservador, que se disfarça sob uma
máscara “modernizadora”, guiado pela ideologia de um pragmatismo radical, servindo-
se de mitos irracionalistas e conciliando-os com procedimentos racionalistas-formais de
tipo manipulatório. O fascismo é um movimento chauvinista, antiliberal,
antidemocrático, antissocialista, antioperário. Seu crescimento num país pressupõe
condições históricas especiais, pressupõe uma preparação reacionária que tenha sido
capaz de minar as bases as forças potencialmente antifascistas (enfraquecendo-lhes a
influência junto às massas); e pressupõe também as condições da chamada sociedade de
massas de consumo dirigido, bem como a existência nele de um certo nível de fusão do
capital bancário com o capital industrial, isto é, a existência do capital financeiro.
(Konder, 2009, p. 53)
Com uma ideologia agressiva, o futurismo era favorável à guerra e ao fascismo na Itália.
Parte da ideologia fascista teve suas origens em certas particularidades do futurismo, tais como:
uma representação revolucionária como meio de reestruturar a sociedade; o culto à guerra; a
máquina como elemento de adoração e exaltação. Tendo esses pontos em comum, aspectos
futuristas poderiam ser utilizados dentro de uma retórica fascista. Por outro lado, a Grande Guerra
se mostrou errática e catastrófica mesmo para os adeptos do futurismo. Uma cultura da máquina
passou a ser encarada com certo ceticismo e reações contra o futurismo foram sendo estabelecidas
por correntes filosóficas e estéticas. Em 1931, os fascistas deixam de lado a estética futurista em
detrimento de um estilo clássico simplificado, que era mais facilmetne reproduzível.
5. GIOVANNI PAPINI
Giovanni Papini, nasce em Florença, em 9 de janeiro de 1881 e falece, em 8 de julho de
1956, na mesma cidade. Foi um poeta, ensaísta, escritor e jornalista autodidata que se dedicou
aos estudos da literatura, da filosofia e da religião. Fundou inúmeras revistas e grupos de
vanguarda, dando destaque para Leornardo, L’Anima, La Voce e Lacerba. Papini foi responsável
por uma produção vigorosa, com destaques para: O Trágico Quotidiano e O Crepúsculo dos
Filósofos (1906), Um Homem Liquidado (1912), História de Cristo (1921), Pão e Vinho (1926),
Gog (1931), Dante Vivo (1935), História da Literatura Italiana (1937), O Passado Remoto
(1948), Vida de Michelangelo (1950) e O Diabo (1953).
Em sua juventude, se declarava ateu e muitas de suas produções daquele período refletiam
o seu posicionamento diante da fé e da religião. Anos mais tarde, se converte ao catolicismo, se
torna um combativo defensor dos valores cristãos e se vincula aos franciscanos. Em seu livro, O
Passado Remoto, que o próprio autor identifica como sendo uma coletânea de memórias, dedica
um de seus capítulos a relatar o encontro que teve pessoalmente com Marinetti, em 1913. Ressalto
esse elemento pois Papini foi um dos entusiastas tanto do futurismo como do fascismo em anos
posteriores. Aqui, não me coloco no papel de juiz no que concerne a ele ter sido apoiador do
fascismo italiano, apenas me coloco na posição de mencionar como as coisas se apresentaram e
foram apresentadas.
Nesse sentido, apresento parte da vida e da obra de Papini dentro de seuscontextos histórico,
político, social, cultural, econômico, religioso e artístico. Menciono ainda que não somente ele,
mas uma plêiade de artistas e intelectuais de sua época aderiram e foram entusiastas do fascismo,
como Gabriele D’Annunzio, Giuseppe Ungaretti e Luigi Pirandello. Isso sem contar os mais de
duzentos intelectuais italianos que juntos com os três citados anteriormente, assinaram o
Manifesto dos Intelectuais Fascistas, em 1925, que contara com a participação e articulação de
Filippo Marinetti.
A história se passa no dia 29 de setembro, Dia de São Miguel Arcanjo, em que Satã se vê
diante de uma catedral, onde fiéis participam de uma celebração em homenagem ao Arcanjo
Miguel. Do lado de fora, enquanto ele ouve atentamente os cânticos de louvor a seu inimigo, um
diabrete, de nome Uriel, se aproxima e começa a encorajá-lo para que ambos retornem para o
local onde habitam, o qual Satã é o governante. Após um longo diálogo entre eles, surge a figura
do Arcanjo Rafael. Nesse momento, Uriel se afugenta e Rafael tenta convencer Satã de que ele
deve voltar a ser quem era no início dos tempos, um Anjo de Luz.
Momentos depois, a porta da catedral de abre e a multidão de fiéis toma as ruas. Satã
avista uma transeunte e logo se aproxima dela, enquanto Rafael desaparece. Essa mulher se
chama Virgia e Satã tenta seduzi-la. Durante a conversa que se estabelece entre eles, Satã revela
ser uma criatura ancestral e ao mesmo tempo detentora de poderes sobrenaturais. Virgia, por sua
vez, não se deixa impressionar. Possuindo uma fé avassaladora, tenta mostrar a Satã que ele possui
uma essência boa e que pode se arrepender.
Para a composição da partitura, defini que Satã seria interpretado por umcantor no registro
de baixo, Uriel como tenor, Rafael barítono e Virgia soprano. O coro composto por sopranos,
contraltos, tenores e baixos, interpreta o louvor em latim do início do texto, contendo os seguintes
ditames:
Além disso, uma orquestra de câmara executa toda a parte instrumental da peça. O processo de
criação levou um total de seis meses, trabalhando diariamente na escrita da ópera. Após o término,
fiz a redução da orquestra para piano. Isso foi necessário pois precisaria da partitura para os
ensaios com o pianista e cantores.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Espero que esse texto tenha servido para aguçar a curiosidade dos leitores em relação aos
temas principais aqui apresentados, que são: FUTURISMO, FASCISMO e ÓPERA. Coloco esses
três em caixa alta para potencializar o aprofundamento em cada um deles e para brincar com tais
palavras, que em nosso tempo e como divulgado por meio das redes sociais, caixa alta dá a ideia
ou indicação de que quem escreve dessa forma quer se expressar através do grito. Além disso,
esse recurso estilístico, o da caixa alta, era também utilizado na poesia futurista e pode ser
encontrada entre as obras dos modernistas brasileiros.
Sobre o FUTURISMO, ressalto a importância que esse movimento teve nas artes da
primeira metade do século XX, por meio de suas representações na pintura, na arquitetura, na
música, na literatura, na poesia, na escultura, na fotografia e no cinema. Já sobre o FASCISMO,
se torna necessário aprofundarmos a discussão acerca desse tema principalmente para não cairmos
em uma armadilha conceitual. Digo, esvaziarmos o conceito de “fascismo” e tentarmos aplicá-lo
a toda e qualquer pessoa ou governo que diverge de nossos entendimentos político e de sociedade.
Sabemos que o fascismo tratado aqui, é aquele que foi gestado e desenvolvido na Itália de
Mussolini. Ao reinterpretarmos e relermos esse conceito, não podemos fazer isso de forma
gratuita e pueril. O fascismo é algo sério e merece um olhar atento por parte de quem se pretende
fazer um estudo minimamente detalhado e o mais distanciado possível de nosso objeto de análise.
Isso posto, chamo a atenção para uma “neutralidade política” em relação a uma “neutralidade
axiológica”. Esclareço. Independentemente de nosso posicionamento político, ao fazermos e
produzirmos ciência, devemos nosdistanciar ao máximo daquilo que nós pesquisamos.
Pode parecer aqui que estou reafirmando o óbvio e que estou redescobrindo a roda e por
conseguinte, a escrita e a imprensa, mas enfatizo que por mais apaixonados que sejamos, ao
pesquisarmos e analisarmos algo academicamente, precisamos nos ater aos conceitos, às lentes e
às categorias analíticas realmente concernentes ao tema de nossa investigação. Se estivermos
fazendo militância, tudo isso que eu disse não precisa de fato ser considerado. Porém, acredito
que esse texto possa servir tanto ao acadêmico, como o militante quanto o militante-acadêmico
ou ao acadêmico-militante.
Finalmente, sobre o tema ÓPERA, essa que já existe e sobrevive há mais de quatro séculos e
que cumpriu no passado o papel que hoje pertence ao cinema, aos musicais e aos programas de
televisão e que assim como o FUTURISMO e o FASCISMO, nasceu na Itália. Esse gênero que
reúne os mais diferentes matizes e aspectos estéticos da arte, tais como: música, literatura,
pintura, arquitetura, dança, iluminação, cenografia, escultura, poesia e teatro. Que nasce como a
tentativa de se resgatar elementos primordiais do teatro grego antigo e que hoje é reproduzido por
telas de computador.
8. REFERÊNCIAS
ARANTES, Ana Amélia Almada. A história da produção de ópera em Belo Horizonte.
Monografia de Pós-Graduação em Produção e Crítica Cultural da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais. Belo Horizonte, p. 68. 2008.
ARMANI, W. R. Il Diavolo Tentato – first part. Disponível em:
<https://soundcloud.com/wallace-armani-608767412/il-diavolo-tentato-first-part>. Acesso em:
25 jul. 2021.
ARMANI, W. R. Il Diavolo Tentato – second part. Disponível em:
<https://soundcloud.com/wallace-armani-608767412/il-diavolo-tentato-second-part>. Acesso
em: 25 jul. 2021.
BOBBIO, Norberto; MATTEUCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política.
Brasília – Distrito Federal: Editora UNB, 2016.
BRANDINO, Luiza. “Futurismo”. Brasil Escola. Disponível em: <
https://brasilescola.uol.com.br/artes/futurismo.htm>. Acesso em: 25 jul. 2021.
Equipe Editorial. Como os futuristas usaram a arte para alimentar o fascismo. Disponível em:
<https://arteref.com/movimentos/como-os-futuristas- usaram-a-arte-para-alimentar-o-
fascismo/>. Acesso em: 25 jul. 2021.
Equipe Editorial. Top 10 artistas futuristas que você precisa conhecer! Disponível em:
<https://arteref.com/arte/top-10-artistas-futuristas-que-voce- precisa-conhecer/>. Acesso em: 25
jul. 2021.
GABRIELE D’ANNUNZIO. In: Wikipedia. L’enciclopedia libera. Wikimedia. 2021. Disponível
em: <https://it.wikipedia.org/wiki/Gabriele_D%27Annunzio>. Acesso em: 25 jul. 2021.
GIOVANNI Papini. In: Wikipedia. l’enciclopedia libera. Wikimedia, 2021. Disponível em:
<https://it.wikipedia.org/wiki/Giovanni_Papini>. Acesso em: 25 jul. 2021.
GIUSEPPE Ungaretti. In: Wikipedia. l’enciclopedia libera. Wikimedia. 2021. Disponível em:
<https://it.wikipedia.org/wiki/Giuseppe_Ungaretti>. Acesso em: 25 jul. 2021.
KONDER, Leandro. Introdução ao fascismo. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 53.
LIQUORI, Guido; VOZA, Pasquale. Dicionário Gramsciano. São Paulo: Boitempo, 2017.
LUIGI Pirandello. In: Wikipedia. l’enciclopedia libera. Wikimedia. 2021. Disponível em:
<https://it.wikipedia.org/wiki/Luigi_Pirandello>. Acesso em: 25 jul.2021.
MANDEL, Ernest. Sobre o Fascismo. Lisboa: Editora Antidoto, 1976. p. 28-38.
ABSTRACT
This essay's premise is to present the close relations between the futurist and fascist movements,
in the first half of the 20th century, in Italy. Showing how a myriad of Italian intellectuals
contributed to the gestation of fascism and how art can be represented in totalitarian regimes,
especially regarding the imbrications between art and politics. The trajectory of the futurist
movement is followed, from the creation of the Manifesto of the Futurism, by Filippo Marinetti,
through the Futurist Political Party, the March on Rome, and the Manifesto of Fascist
Intellectuals. On this path, Giovanni Papini and his work Il Diavolo Tentato, which I turned into
an opera, in the year 2004, is highlighted. A brief report on the creation process of this show and
its performance in 2005, at Sala Juvenal Dias, at Palácio das Artes, in Belo Horizonte, is
presented. Giovanni Papini's relationship with futurism, fascism, and religion is observed. About
futurism, the text shows how this avant-garde aesthetic trend and political movement spread
throughout Italy, and how it influenced intellectuals and artists from other countries, such as the
Soviet Union, Portugal, and Brazil. Finally, it is highlighted the fact that the concept of fascism
has become increasingly widespread through the traditional press, social networks, and informal
debates about the current political scenario in which we live, not only in Brazil but also in the
international level. Observing the emergence of political parties and representatives of the far
right, as well as anti-fascist movements.
Keywords: Fascism; Futurism; Opera.