MICHEL
OS FASCISMOS
Edição: 5 Q 536
As rejeições do fascismo
O que o fascismo rejeita a priori totalmente é a sociedade liberal do século
XIX, inspirada pela «filosofia das luzes», transposta politicamente na Revolução
Francesa. O fascismo não crê que os homens sejam iguais, nem que o homem
seja naturalmente bom. Põe de, lado Descartes, Kant, Rousseau, e, com estes, o
positivismo, gerador do cientismo e da esperança num progresso contínuo. Esta
condenação global dá origem a algumas rejeições:
As afirmações do fascismo
Estas críticas não constituem novidade; o fascismo não fez mais do que
popularizá-las; completa-as, em antítese, com afirmações e proposições, que só
assumem alguma originalidade pela sua conjunção; foi assim que se elaborou a
pouco e pouco, ao correr da ação, uma doutrina quase coerente.
O fascismo é em primeiro lugar um nacionalismo exacerbado. A nação,
sagrada é o bem supremo. O seu interesse exige uma tripla coesão interna,
política, social e étnica, e exige também a supressão dos antagonismos que a
dividem e enfraquecem. O fascismo repudia a época que o precedeu - proclama-
se revolucionário - e procura os seus modelos num passado da nação mais ou
menos mítico - a germanidade, a latinidade, a hispanidade, o helenismo, a
francidade, etc. Nesta idade de ouro, a nação era pura de qualquer elemento
alheio; para a purificar de novo, o fascismo é xenófobo, racista, e, ao fim e ao
cabo, anti-semita. Povo, Nação, Raça exprimem então a mesma realidade
histórica.
O nacionalismo fascista é altivo e ambicioso; não há fronteira que não
pretenda violar; há sempre um tratado qualquer que quer rever e algum território
que pretende recuperar; no passado, encontra com facilidade um período de
grandeza que pretende igualar. Apoiado pelo exército, escorado nos antigos
combatentes, procurando a cooperação dos compatriotas exilados, o fascismo vai
acabar naturalmente no imperialismo. Ridiculariza o «pacifismo dos balidos», a
começar pela Sociedade das Nações; exalta a aventura, o soldado, a luta; às
soluções negociadas, prefere o «diktat» da vitória. Contém em si a guerra, como
a nuvem negra contém o raio.
Para que a nação tenha a certeza de poder viver e prosperar, o Estado deve
ser forte e autoritário. A centralização suprimirá os particularismos locais; o
Estado fará prevalecer o interesse colectivo sobre os dos indivíduos, dos grupos
profissionais ou das classes, sociais. A ditadura que vai ser instituída confundirá
os aparelhos do Estado e da ideologia partidária, à custa duma legalidade que
suplantará, a noção de Salvação Pública.
O Estado será policial e a Justiça estará às suas ordens; as funções de
advogados, acusadores, juízes, serão amalgamadas, porque o acusado será
julgado pelas suas intenções e «moralidade, política», mais do que pelos seus
atos; como outrora a Inquisição para os heréticos, o tribunal fascista esconjurará
as impurezas nacionais. Este Estado forte incarna-se num chefe, providencial,
guia e salvador da nação, erguido da massa pelo impulso da sua personalidade; a
sua palavra é lei e é também a verdade. As paredes de Roma proclamavam que
«Mussolini tinha sempre razão», e as multidões nazis gritavam o seu êxtase
perante o «gênio do Führer». Não há grupo fascista que não faça sacrifício ao
culto do chefe; aliás, o führerprinzip deve afirmar-se em todos os escalões da
sociedade, tanto na economia como na administração.
Entre o chefe e o povo, o intermediário, a correia de transmissão é o partido
único; este deve reunir um escol e, por meio de um movimento juvenil único,
deve também promover a sua renovação. A sociedade urdida pelo fascismo é
hierarquizada; uns comandam, os outros creem e obedecem mas o poder vem
sempre de cima; os fascistas travam a sua primeira batalha na rua, contra os seus
adversários; passado isto, «reina a ordem» e a população é enquadrada,
territorial e profissionalmente, em organismos destinados a modificar o Estado.
Assim irá surgindo, a pouco e pouco, uma nova classe dirigente.
Esta sujeição da população é justificada pelo fascismo como a defesa
nacional e com a vontade de instituir uma sociedade mais justa; é isto o
socialismo nacional, considerado a melhor arma contra o comunismo. É
necessário ultrapassar a luta de classes e substituí-la pela sua cooperação. Não se
trata de coletivização, nem de supressão do proletariado, e ainda menos de
autogestão. Mas o Estado, por um lado, submeterá os interesses dos poderosos à
lei comum, e, por outro, promulgará leis sociais destinadas a melhorar a
condição operária. Regra geral, estas disposições serão um tanto esquecidas
pelos partidos fascistas uma vez alcançado o poder; mas contribuirão para os
tornar ditaduras populares.
Para promover o «socialismo nacional», as forças de produção são
associadas numa economia corporativa. O fascismo pretende ultrapassar as
tensões da sociedade industrial; daqui resultam organismos de cooperação em
todas as profissões, as corporações, onde os patrões, operários e representantes
do Estado têm assento, teoricamente, em pé de igualdade. Por um lado, a
organização permite que o Estado tome até certo ponto à sua conta a economia
nacional; facilita a direção planificada da produção e permite a realização da
autarcia; por outro lado, o Estado desempenha o papel de medianeiro nos
conflitos de trabalho; de facto, com a supressão dos sindicatos e a proibição das
greves, o sistema consolida o desequilíbrio social em proveito dos possidentes.
Para o fascismo, este conjunto de medidas deve permitir a formação e
desenvolvimento de um tipo de homem novo. Este homem novo deve ser viril -
o fascismo menospreza a mulher -, apto para o comando, duro para si próprio e
para os outros. As suas qualidades dominantes serão a coragem, o espírito de
disciplina, o sentido da solidariedade. Mais do que as qualidades intelectuais, os
fascistas pretendem desenvolver as «qualidades animais» do homem;
desconfiam do espírito crítico, que consideram dissolvente; o fascista contenta-
se com «crer, obedecer, combater». O ideal seria que o homem se tornasse um
autômato perfeito, totalmente destituído de sensibilidade, despojado de qualquer
sentido humanitário, capaz apenas de executar, sem discussão, todas as ordens
que recebe. Este tipo de homem novo foi quase realizado na SS hitleriana.
Os educadores e os artistas devem dedicar-se a formar este novo tipo de
homem. A cultura fascista recusa o universalismo do humanismo; substitui-o
pela pertença à nação,a solidariedade gregária, a ligação ao solo, à língua e ao
torrão natal (ao sangue, dirão os nazis), numa palavra, uma maneira de sentir e
de pensamento comandada pela ação, na qual o irracional domina, com um
dogmatismo exaltado, uma esquematização dos problemas, uma falta completa
do sentido do humor e da compreensão dos matizes, um abuso dos estribilhos
repisados pela propaganda.
Estas características do fascismo são comuns a todos os grupos que se dizem
fascistas, com variantes na intensidade ou no tempo. Para as exprimir, todos os
fascistas utilizam o mesmo ritual - que impressionou muito os seus
contemporâneos. O culto do chefe traduz-se pela difusão ilimitada da sua
imagem nas paredes ou no cinema, nas montras, nos lugares públicos e nas
casas, umas vezes sorridente, amistoso e protetor, outras com ar duro e tenso, o
mais das vezes fardado. É saudado levantando o braço, aclamado freneticamente
antes de ser escutado religiosamente. O partido é uma «ordem », com as suas
vestes, a sua hierarquia, os seus regulamentos, os seus pendões, as suas insígnias
e paradas. A população é reunida em manifestações enormes, em que o espírito
colectivo se exprime pelo canto, em desfiles infindáveis em que cada um está
envolvido e protegido pela massa. A propaganda repete infatigavelmente os
mesmos temas por meio do cartaz, o jornal, a rádio, o filme. Sobre todos os
opositores, e até sobre os “tíbios”, paira a ameaça das agressões, da prisão, da
destituição, do internamento ou da expropriação; o fascismo domina por meio de
generalização do terror - neste ponto faz inovação.
Assim, rejeitando o capitalismo e o bolchevismo, recusando a democracia
liberal, o fascismo propõe uma terceira solução de cooperação, uma nação
dirigida pelo chefe, uniformizada pela arregimentação e propaganda, preparada
para guerras em que se farão valer os seus direitos e se afirmará a sua força.
Durante cerca vinte anos, teve um êxito incontestavelmente enorme, é um
fenômeno mundial.
Fascismo e reação
Não há nenhum elemento da «doutrina» fascista que o fascismo, não tenha
ido buscar a um pensador da direita dos séculos XIX e XX; a análise dos
diversos fascismos nacionais mostrará isto melhor, no seguimento deste
trabalho. Por isso houve fundamento, para dizer que o fascismo, de facto, era
uma «reação disfarçada».
De facto, verifica-se que o fascismo, e havemos de voltar a este ponto,
chegou ao poder, na Itália e na Alemanha, com a ajuda dos meios dirigentes e do
Estado que os representava. Verifica-se também que em Espanha, em Portugal e
na Grécia, a direita tradicional se entendeu bem, com o fascismo, no equilíbrio
de forças instituído pela ditadura. Finalmente, é claro que as duas tendências
combateram os mesmos inimigos - comunistas, democratas, estrangeiro inimigo;
comungavam num nacionalismo idêntico. Durante a guerra, quando teria podido
impor regimes inspirados no nacional-socialismo, em toda a Europa conquistada,
Hitler preferiu frequentemente apoiar-se em elementos conservadores - durante
muito tempo preferiu Antonesco em vez de Horia Sima, Horthy em vez de
Szalassy, Pétain em vez de Doriot {4}.
E no entanto, apesar desta cumplicidade evidente e desta comunidade de
interesses, há grandes diferenças entre a «reação» e o fascismo. Em primeiro
lugar a reação, como o próprio nome indica, coloca o seu ideal num passado
mais ou menos mítico, uma «idade de ouro» á qual aspira regressar - a
monarquia absoluta para Maurras. O fascismo, pelo contrário, embora louve este
ou aquele período da história da nação, volta-se para o futuro; proclama-se
revolucionário. Aos dirigentes tradicionais, aliás, o fascismo afigura-se
revolucionário na medida em que se diz socialista, ou, pelo menos verbalmente,
pretende modificar as estruturas sociais. Aliás, não será fascismo uma
metamorfose da execrável democracia, quando se afirma detentor da soberania
nacional e pretende exercer o poder em nome de uma massa plebeia por ele
fanatizada {5}?
O contraste é sobretudo grande na composição dos círculos dirigentes. A
extrema-direita coloca à sua frente aristocratas e grandes burgueses; as élite do
fascismo (com excepção de José António Primo de Rivera) não são as do
nascimento, da fortuna, da promoção por concurso; formaram-se na guerra
mundial, na luta de ruas, na atividade do partido, na dedicação ao chefe - alguns
vêm da «esquerda». Por isso mesmo é raro surgirem simpatias pessoais entre
homens com características, tão diferentes; a aristocracia italiana - escarnecia de
Mussolini, e os generais da Wehrmacht troçavam dos seus inferiores que
preenchiam as fileiras das secções de assalto. No limite, este contraste vai até ao
conflito; os nazis austríacos assassinaram Dollfuss, e uma conspiração de
elementos das classes superiores quiserem assassinar Hitler.
No entanto, temos de verificar que só uma pequena arte das forças
conservadoras se opôs ao fascismo, e sempre tarde demais, quando outras forças
já o tinham enfraquecido muito ou até abatido - como o rei de Itália, que mandou
prender Mussolini quando este já tinha sido destituído pelo Grande Conselho
fascista; aliás, um aristocrata como o príncipe Borghese foi fiel a Mussolini até
ao fim {6}. Os dirigentes tradicionais, conforme veremos melhor mais adiante,
elevaram o fascismo até ao poder para que este aplicasse os planos que eles não
podiam pôr em execução, com a esperança de o domar e dominar - como Thiers
quando disse que seria capaz de levar Napoleão III pelo beiço. Na realidade, os
dirigentes tradicionais foram arrastados para uma aventura que nem sempre
tinham desejado - generais e diplomatas fizeram algumas tímidas observações a
Hitler - mas que aceitaram e das quais aproveitaram abundantemente. Pode
dizer-se que, ao fim e ao cabo, o fascismo assimilou a maior parte dos dirigentes
tradicionais. Hoje em dia, em França, grupos como Aspects de la France e
Nouvelle Action Française rejeitam, não há dúvida, qualquer rótulo fascista; mas
se é verdade que a Action Française de antes de 1939 morreu de vez, ninguém
afirmaria que o fascismo não renascerá. Identificar completamente extrema-
direita e fascismo é fazer propaganda eleitoral; mas a História mostra que as
duas se foram associando progressivamente, e até se integram, entre 1920 e
1945.
Fascismo e bolchevismo
O bolchevismo e o fascismo nasceram ambos da crise da Europa, que
provocou a primeira guerra mundial mas não se resolveu com esta - sendo o
fascismo uma reação contra o bolchevismo. Por isso, alguns sociólogos
consideram-nos irmãos gémeos. Por exemplo Hannah Arendt {7}, que os
considera as duas faces dum fenômeno único, o totalitarismo. Este é o resultado
da formação das “massas”, consequência da atomização da sociedade - na
Alemanha em virtude da derrota e da crise econômica, na Rússia em virtude do
desastre czarista e da revolução. As “massas” são constituídas por indivíduos
sem laços que os unam; sentem-se inorgânicas, frustradas, humilhadas. Os
totalitários propõem-lhes uma ideologia, um grande apelo à imaginação que as
desvia das realidades; descontentes com o presente sem terem verdadeiramente
um passado, receosas do futuro, as “massas”, uma vez dentro do mundo da
ficção totalitário, aderem a este e estão dispostas a todos os sacrifícios exigidos
pelos chefes omniscientes perante os quais ajoelham em adoração.
É certo que comunistas e fascistas, uma vez ou outra, chegaram a um acordo
e até às vezes se tornaram “aliados objetivos” contra um inimigo comum - a
democracia liberal; os irmãos Strasser preconizavam um entendimento
duradouro entre a Alemanha hitleriana e a U.R.S.S. bolchevique, entendimento
que Hitler e Estaline, por táctica, fizeram vigorar durante algum tempo com o
pacto de não agressão de Agosto de 1939 {8}. Hitler, que algumas vezes elogiou
Estaline, foi até mais longe quando propôs à U.R.S.S. tomar parte numa partilha
do mundo com as potências do Eixo {9}. É também incontestável que as
semelhanças entre fascismo e estalinismo são impressionantes, quando vistas do
exterior: incompreensão desdenhosa e altaneira para com os outros;
omnipotência do Estado, com idêntica confusão dos poderes em proveito do
partido único; liquidação dos opositores pelo terror - os campos de concentração
da Alemanha têm equivalente no “Gulag soviético”; polícia toda-poderosa;
idêntico nacionalismo, sustentado por um exército muito forte; o mesmo culto do
chefe, etc {10}. Até se escreveu que Estaline era mais totalitário que Hitler - no
nazismo não há nada que se possa equiparar à “liquidação” dos kulaks e seus
milhões de mortos, e deixou continuar a viver a aristocracia, a Igreja e as
estruturas industriais.
Na realidade, as diferenças entre o nazismo e o paroxismo do bolchevismo
que foi o estalinismo são fundamentais. A União Soviética procedeu a uma
transformação total da sociedade e da economia, transformação que o nazismo
apenas preconizou. O fascismo rejeita a “ditadura” do proletariado; pretende
eliminar a luta de classes, fazendo com que estas colaborem; sendo certo que
provém das massas, procura dominá-las, e não quer que se desencadeiem; as
condições em que o bolchevismo triunfou na Rússia, com uma situação de
desordem e anarquia em que teoricamente se exprimia a “vontade das massas”,
são condenadas pelo fascismo; para os fascistas, o bolchevismo, que atribui à
base uma infalibilidade eu esta não tem, embora, uma vez triunfante, não lhe
permite que continue a exprimir-se, é a conclusão lógica da democracia. Por isso
mesmo, uma das ideias fixas de Hitler - com o racismo - era que o comunismo
provinha de uma Ásia bárbara e era preciso repeli-lo para a Ásia. Nazismo e
bolchevismo, ambos com tendência para a universalidade, excluíam-se de facto
um ao outro, e estes irmãos desavindos lutaram selvaticamente um contra o
outro para se exterminarem.
A evolução do fascismo
Portanto, o fascismo, visto em conjunto, é um fenômeno original. Enquanto
não está no poder, limita-se à luta contra os seus inimigos internos, e como que
se mantém imobilizado nessa luta. Quando chega ao poder, é apanhado pela
engrenagem dos negócios públicos; representa a partir daí o Estado e a Nação, e
opera num contexto internacional; tem então de ter em conta a conjuntura, e, por
vezes, tem de inflectir o seu programa inicial. No seu excelente livro La liberté
en question, le fascisme au XX siècle {11}, P. Milza e M. Benteli, procurando
«recolocar o fascismo no seu tempo», distinguiram três fases na sua evolução:
Os fascismos
Na verdade, embora o fascismo tenha sido um fenômeno internacional, que
lutou para alcançar o domínio do mundo, embora houvesse um «fundo comum»
para todos os grupos ou regimes que se dizem fascistas, a ponto de ser lícito
perguntar, e havemos de voltar a este ponto, se o fascismo não constituiu uma
nova «internacional», quando pretendia combater todas as internacionais, o facto
é que a doutrina se desenvolveu e a prática se integrou em meios diferentes -
nacionais, sociais, étnicos.
Portanto, há ao mesmo tempo um fascismo e vários fascismos. O
nacionalismo que os inspira a todos também os pode opor uns aos outros - sem a
autoridade de Hitler, os nazis húngaros e romenos teriam lutado por causa da
Transilvânia; a Itália fascista e a Alemanha nazi foram hostis durante anos, rivais
na Áustria, e na bacia do Danúbio; no fascismo francês, as diversas tendências
nunca se uniram; Mussolini atacou na Grécia um regime fascista, etc. .
O fascismo não chegou ao poder da mesma maneira, embora quase sempre
tenha tido os mesmos apoios; os traços comuns que o caracterizam não têm a
mesma importância em todos - o anti-semitismo italiano foi tardio, e como que
importado da Alemanha, para ficarmos agora por um só exemplo. É esta
variedade de fascismos que vamos procurar examinar {12}.
II. O FASCISMO ITALIANO
Antecedentes e advento
Cinquenta anos depois da sua unidade, a nação italiana ainda não era um
facto consumado. De facto, havia divergências graves nos planos geográfico,
social, cultural e econômico. Ao Norte urbano e industrializado, opunha-se o
Sul, atrasado, camponês, com um cristianismo pagão, destinado à emigração
para o Norte, para a França, para a América {14}. Uma classe dirigente cultivada
e poderosa, constituída por grandes proprietários latifundiários e industriais,
governava uma massa de operários e camponeses pobres e analfabetos. Destes
desequilíbrios resultava uma democratização insuficiente; só em Junho de 1912
foi concedido o direito de voto a todos os italianos maiores de 21 anos, para os
que sabiam ler, e aos analfabetos maiores de 30 anos; o método de governação,
herdado de Cavour, era moldado num autoritarismo maleável, no qual o
Parlamento tinha audiência e responsabilidade restritas.
Para remediar esta crise permanente, Crispi sugeriu uma política de expansão
colonial, seguindo-se, em 1915, um nacionalismo antiaustríaco que conduziu à
inversão das alianças e à entrada na guerra ao lado dos Aliados. A guerra
provocou um grande entusiasmo nacional e deu ensejo a um grande
desenvolvimento industrial, principalmente na indústria siderúrgica. Mas,
quando a luta terminou, as desilusões acumularam-se.
A pequena burguesia tinha sido muito atingida pela depreciação monetária;
os camponeses, de onde tinham saído a maior parte dos combatentes, e a quem
tinham prometido a distribuição das terras, depois do desastre de Caporetto,
voltaram de facto a uma situação ainda mais miserável. Muitíssimos antigos
combatentes dificilmente encontravam trabalho, sentiam-se indignados com o
dinheiro ganho pelos que se aproveitaram do conflito, consideravam-se muitas
vezes despromovidos em relação ao lugar que tinham tido no exército. Uma
inflação desordenada produzia maléficos efeitos nos preços e salários. Além
disso, no plano nacional, havia uma grande irritação contra os Aliados, que
recusaram entregar à Itália todas as terras «irredentas» que lhes tinham
prometido em segredo, quando os italianos se lhes tinham juntado na guerra.
Daqui resultou uma explosão de violência. Ao mesmo tempo que os
socialistas julgavam ter chegado o momento para proceder a transformações «de
fundo», as massas operárias e camponesas, entusiasmadas com a revolução
bolchevique, passaram à ação direta e deixaram de acatar a autoridade dos
dirigentes políticos e sindicais. Grupos de camponeses apoderaram-se dos
latifúndios, cujos proprietários viviam nas cidades, e organizaram cooperativas
de exploração e consumo; grupos de operários ocuparam as fábricas e tentaram
dirigi-las. O que impressionou os contemporâneos foi o carácter desordenado e
selvático deste movimento; além de que as desordens eram frequentemente
sangrentas, a Itália ia caindo a pouco e pouco num estado de desordem
generalizada, em virtude de greves infindáveis, absentismo e desorganização do
sistema de produção. Como se haveria de resolver a crise?
Giolitti tentou contemporizar. Na esperança de que os operários, desiludidos
com as suas experiências de ação direta, aceitassem um compromisso, propôs
desenvolver as cooperativas, instituir um controle operário na administração das
fábricas, tornar os títulos nominativos para poder tributar de melhor maneira os
rendimentos e tributar a herança. Mas deparou-se-lhe a oposição dos círculos
dirigentes, que tinham criado grupos de autodefesa, e que, uma vez passada a
parte mais perigosa do temporal, pretendiam primeiro que tudo impedir que o
vendaval regressasse com a mesma violência.
D'Annunzio apontou outro caminho, a ultrapassagem do conflito pelo
nacionalismo. Este poeta tinha sempre preconizado o gesto perigoso, tinha
sempre sentido desprezo pela vida fácil. Colocando-se à frente de um corpo de
voluntários, ocupou Fiume, que os Aliados não queriam ceder à Itália; renovou
desta maneira a odisseia garibaldina e fez nascer um movimento de unânime
entusiasmo, obtendo o apoio dos conservadores e dos sindicalistas
revolucionários; e durante algum tempo, quis instaurar em Trieste uma república
comunista.
Foi neste contexto que nasceu o fascismo de Mussolini {15}. A princípio, os
seus objetivos não eram claros. É certo que pretendia que a Itália obtivesse
Fiume e a Dalmácia, como todos os italianos; mas o fascismo dizia também ser
«aristocrata e democrata, conservador e progressista, reacionário e
revolucionário, conforme as circunstâncias de tempo, meio e lugar». Em seguida
apresentou-se como defensor da ordem e dos mais altos valores da Pátria.
Despertou então o interesse dos industriais e agrários, que começaram a
subsidiá-lo. Os fascistas organizaram expedições punitivas contra bolsas de
trabalho,e fizeram cercos a sindicatos e câmaras municipais
esquerdistas;atacavam os adversários à mocada ou obrigavam-nos a beber óleo
de rícino. Mas os começos do fascismo foram difíceis; foram esmagados nas
eleições de 1920 e só conseguiram ter 31 deputados em 1921, entre eles
Mussolini. O movimento transformou-se então em partido político; organizou os
seus próprios sindicatos e juntou 300 000 membros no fim de 1922; nesse
mesmo ano, anulou uma greve por meios violentos e expulsou os conselhos
municipais socialistas em Ancona, Génova, Livorno e Milão. Esta vivacidade,
esta combatividade contrastam com a apatia do Parlamento, onde um demorado
interregno privou o país de Governo durante muito tempo, e só terminou com
um compromisso que não satisfez ninguém.
Em 27 de Outubro de 1922, Mussolini decidiu fazer a «marcha para Roma»,
com 40 000 «camisas negras» decididos,esfaimados, que o exército teria podido
dispersar sem dificuldade - o próprio Mussolini chegou de comboio. A
expedição nada teve de gloriosa, tão fraca foi a oposição e tantas foram as
cooperações para colocar Mussolini no poder. O presidente do Conselho, Facta,
e o velho Giolitti tinham a esperança de poderem servir-se de Mussolini. O rei
Vítor Manuel III, reservado e sem envergadura, convocou Mussolini para o
encarregar de formar Governo; os liberais aliaram-se com Salandra, que aceitou
representar o fascismo na Sociedade das Nações; o exército tinha fornecido à
milícia os seus primeiros oficiais, e alguns generais, como o ilustre Cadona,
eram mais ou menos declaradamente simpatizantes do fascismo; o partido
democrata-cristão aceitou colaborar e tomou quatro pastas no novo Governo;
muitos franco-mações aderiram ao partido {16}; intelectuais célebres, como
Benedetto Croce, aderiram também; só os socialistas se mostraram contrários,
mas cometeram muitos erros de táctica, primeiro quando recusaram assumir o
poder, depois quando impediram Giolitti de voltar atrás, contribuindo assim para
criar uma situação sem saída. A vitória do fascismo não resultou
necessariamente da crise italiana, mas sim dum conjunto favorável de
cooperações valiosas - as classes dirigentes e o Estado - e dos erros e divisões
dos seus adversários.
Benito Mussolini
O fascismo ficou a dever muito, sem dúvida, ao seu chefe. Nascido na
Romanha, robusto, com 39 anos em 1922, Mussolini foi desertor, agitador,
socialista revolucionário, um passado turbulento que o levou à prisão e ao exílio,
e lhe valeu também, segundo parece, a simpatia de Lenine. Professor primário,
jornalista, foi um socialista intransigente, contrário a qualquer colaboração com
a burguesia. Depois, em 1915, deu a primeira reviravolta política, ao preconizar
a intervenção na guerra contra as potências centrais; tornou-se nacionalista,
talvez apenas para que falassem dele.
Mussolini teve uma personalidade complexa, foi um extrovertido com gosto
pelo exibicionismo, e um cabotino com habilidade para causar ilusão sobre a sua
realidade profunda. Ambicioso, desmedido, alguns admiraram-no pelo seu gosto
pela ação e a sua predileção pela violência, a outros afigurou-se indeciso e até
pusilânime. De facto, com pouca cultura, polêmico, era bom orador mas não um
pensador; com pouca instrução, autodidata, admira-se a si próprio ao subir no
poder, aprecia o convívio com os grandes do mundo e coloca sobre a face
plebeia a máscara do chefe forjado na firmeza inabalável das suas convicções,
seguro de si próprio e do seu futuro.
Despreza o homem, esse «esterco da história», e mostra desprezo pelo povo
italiano, «povo, de carneiros, raça medíocre». Procura no passado de Roma a
grandeza que a época em que vive não tem. E diz: «Gosto de César», e, em
1920, exclama: «Roma, verbo mágico que preencheu toda a história durante
vinte séculos»; endureceu o perfil, imitando o de um busto antigo e regalou-se
com o retrato em que o pintor polaco J. Stycka o representou vestido de
imperador romano, coroado de louros {17}. Pensou em mandar construir um
colosso no gênero do de Rodes, com as suas feições.
Em que medida a sua formação de homem da esquerda perdurou em
Mussolini? E. Nolte {18} pensa que no seu declínio, em Saló, Mussolini voltou
a sentir uma inspiração socialista que nunca o tinha abandonado. Na verdade,
afigura-se que Mussolini, por oportunismo ou convicção, deu a sua reviravolta
política em 1922. Passou para a direita porque, segundo disse, «o mundo deseja
ordem, disciplina, trabalho». Pensou então que «a guerra liquidou o século da
democracia; o igualitarismo democrático está a ponto de morrer, nascem
aristocracias novas e a revolução está nesta reação ... O socialismo acumula
ruínas sobre ruínas; o capitalismo vai mostrar-se mais dinâmico e mais
histórico» {19}.
Tal como era, pretensioso e ridículo, megalômano e cheio de arrogância, este
individualista descomedido captou a simpatia e admiração do povo italiano. Foi
tal o seu ascendente que, na sua ausência, os seus ministros não se atreviam a
tomar qualquer decisão, os casos mais simples ficavam em suspenso. Quando
chegou aos cinquenta anos, estava barrigudo, com a saúde abalada, a inteligência
diminuída, a energia enfraquecida. Sem dúvida que a sua personalidade marcou
o fascismo; a decadência do regime coincidiu com a sua.
O advento do nazismo
Os acontecimentos favoráveis foram a derrota de 1918 e a «grande crise dos
anos Trinta»; o agitador hábil foi Adolfo Hitler. A bem dizer, já existiam causas
anteriores. A unidade do povo alemão tardia, mas rápida e violenta, a sua
industrialização recente, mas a ritmo rápido, desenvolveram no povo alemão,
com o culto da eficiência e do rendimento, a saudade do passado, a necessidade
duma comunidade nacional muito fortemente estruturada; um espírito de
conquista e poder desenvolveu-se assim num fundo de misticismo. A derrota de
1918, atribuída à traição dos socialistas e dos judeus, a humilhação nacional
provocada pela perda de territórios, suscitaram uma vaga de nacionalismo -
«corpos francos» de voluntários procuraram atrasar a aplicação dos tratados,
especialmente na Alta Silésia - e deram origem a um desejo de desforra contra os
traidores e os vencedores. A crise econômica originada pela derrota, com a
inflação galopante que a acompanhou, voltou a corroer a economia nacional com
a crise mundial dos anos Trinta; a Alemanha tinha 1500 000 desempregados em
1929, cerca de 6 000 000 em 1932; a produção desceu para 50 %, e depois para
30% da de 1929; a ruína das classes médias, a miséria do proletariado,
«atomizavam» a sociedade alemã.
O Partido Operário Nacional-Socialista nasceu em 1921, surgindo como um
entre muitos grupos nacionalistas que não aceitavam a democracia nem a
derrota. Em 1922 organizou o seu primeiro congresso e começou a publicar o
seu jornal, o , Hitler assumiu a direção do partido, depois de ter eliminado o seu
fundador, Drexler; em 1923, o partido tentou um golpe em Munique, mas a
tentativa falhou e o partido teve 16 Mortos; Hitler foi então preso; em 1924, o
partido apenas teve 6,6% dos votos nas eleições; em 1928, esta percentagem de
votantes desceu para 3,5 %. O partido continuou a ser fraco, mas bem
estruturado, com secções de assalto (as SA), os chefes regionais (os gauleiters),
as secções de segurança (as SS), as filiais de juventude, estudantes. A crise
econômica proporcionou-lhe os seus eleitores - a partir de 1929 o número de
desempregados aumentou proporcionalmente ao número de votos que o partido
teve: em Setembro de 1930, 18 % dos votantes e com isto 107 deputados.
Os conservadores, os industriais, o exército começaram a sentir então um
forte interesse por este grupo. O presidente Hindenburgo recebeu Hitler; o
chanceler Bruning propôs-lhe a entrada para o Governo; houve subsídios de
magnatas da indústria. Embora Hitler tivesse sido batido por Hindenburgo na
eleição presidencial de 13 de Março de 1932, poucos meses depois 37 % dos
eleitores votaram nos candidatos do partido. Quando Bruning, vou Papen, von
Schleicher governaram por decretos-leis contra o Parlamento, convidar Hitler
para formar o Governo pode afigurar-se democrático; concedendo apenas quatro
pastas ao partido, os conservadores esperavam confiná-lo numa posição
subalterna. Mas Hitler dissolveu o Reichstag, e, em eleições em que as
irregularidades foram muitas e as pressões foram muito fortes, o partido passou
para 44 % dos votos; em 5 de Março de 1933, Hitler assinou uma Concordata
com a Igreja Católica e saiu da Sociedade das Nações - os seus dois primeiros
êxitos no exterior. Dissolveu o partido comunista depois do incêndio do
Reichstag, organizado por Goering, proclamou o partido nacional-socialista
como partido único, e, em 23 de Março de 1933, com a maioria constitucional de
dois terços, obteve para si plenos poderes - o executivo e o legislativo ficaram
daí em diante nas suas mãos.
Em poucas semanas, o hitlerismo colocou a Alemanha sob o seu domínio,
mantendo aparências de legalidade. Na verdade, tinha começado por fazer reinar
o terror nas ruas - por meio de desordens e expedições punitivas. Os plenos
poderes só foram concedidos com a exclusão de 80 deputados comunistas e com
as SA e as SS a ocupar a sala das sessões. Em 1933 o partido manifestou fadiga,
causada por lutas internas e dificuldades financeiras; perdeu dois milhões de
votos em relação às eleições de 1932, foi então reanimado pela grande indústria,
Thyssen, Krupp, I. G. Farben, magnates da Imprensa (Hugenberg), financeiros
(Schroeder e Schacht), e foi apoiado pela generalidade dos conservadores,
receosos da revolução social depois de uma greve dos transportes em Berlim e
quando se afigurava que ia começar a recuperação econômica. Por outro lado, os
socialistas e os comunistas não se uniram para combater o hitlerismo; em nada
ajudaram Bruning e o Centro Democrático. Desta maneira, Hitler não chegou ao
poder desacompanhado; os conservadores facilitaram-lhe a subida, e a divisão
dos seus adversários também facilitou esta ascensão. Conforme disse Brecht, a
elevação de Hitler ao Poder era perfeitamente «resistível» {36}.
Adolfo Hitler
A personalidade de Hitler fascinou o povo alemão, antes de intrigar muitos
historiadores {37}. Os crimes horríveis que ordenou ou permitiu que se
cometessem fizeram com que fosse apodado de louco sanguinário. A autópsia do
seu cadáver revelou que tinha uma deformação sexual congênita, geradora de
apatia e aspiração à grandeza; era um psiconevrótico, na fronteira da
esquizofrenia; mas, embora a nevrose se tivesse agravado com as derrotas, era
perfeitamente capaz de lógica e eficiência. Mantém-se na sombra todo o período
da sua formação, embora tivesse escrito muitos pormenores a seu respeito no
Mein Kampf; nunca escreveu cartas nem elaborou qualquer diário; tem de
recorrer-se aos seus discursos, diretrizes, «conversas à mesa», relações humanas
para se ter uma ideia desta personalidade. É provável que tivesse tido uma
infância ao mesmo tempo fácil e difícil, entre um pai autoritário e uma mãe
excessivamente protetora. Artista falhado, boêmio, adquiriu no exército alemão -
tomou parte na guerra de 1914-18, embora fosse austríaco - o sentido da
hierarquia e da disciplina.
Gabou-se sempre da enorme quantidade das suas leituras - Nietzsche,
Schopenhauer, Mommsen..., «às centenas de quilos» - mas a sua biblioteca
apenas tinha 1500 volumes, e nem um só destes era realmente clássico ou
científico. No entanto, com memória excelente, surpreendia às vezes os
convidados com uma erudição súbita no meio da salsada monótona dos seus
intermináveis monólogos. Mostrou ter uma inteligência doutrinária e
simplificadora. Manhoso, hábil, muito forte na arte da mentira e da
dissimulação, era às vezes lento na tomada de decisões, depois de intermináveis
consultas com os seus íntimos; mas também era capaz de decisões súbitas,
devidas a uma espécie de alucinação - mostrou ser um completo oportunista ao
aproveitar as ocasiões, que se lhe deparavam. Manifestou a mais completa
indiferença para com os sofrimentos que infligia aos seus semelhantes, mas
preocupava-se muito com a sua segurança pessoal e as suas próprias ninharias, e
mostrava-se muito bondoso para o cão. Este cinismo misantrópico destruiu nele
todo o calor humano; Speer observou que Hitler, fascinado pela eternidade de
monumentos colossais, não manifestava o mínimo interesse pelas zonas de
urbanização. Mas o facto é que um magnetismo surpreendente e uma aparente
confiança completa na sua missão, tornavam histéricas as multidões às quais
pregava. «No começo do III Reich não era o Verbo», escreveu Herbert Luthy,
«mas sim um grito saído do mundo zoológico». Todavia, Hitler tinha qualidades
de chefia incontestáveis; sabia impor a sua autoridade aos recalcitrantes,
desorganizar e oposição, intimidar e neutralizar os adversários. Por isso mesmo
cada vez mais se foi convencendo, da própria infalibilidade.
Hitler, primeiro que tudo, foi um patriota alemão; a sua ambição, significava
a inteira dedicação à pátria; quem atacasse a Alemanha injuriava-o
pessoalmente. Considerava-se um ideólogo, que ao mesmo tempo era profeta.
Na verdade, a sua «doutrina» constituía uma manta de trapos feita de bocados
apanhados aqui e acolá, sem originalidade nem coerência. Manta que servia para
cobrir um oportunismo natural levado até ao niilismo, até ao jogo do «tudo ou
nada». Mas depressa formulou objetivos políticos precisos, que não sofreram
nenhuma variação e cujos três temas principais eram os seguintes: anti-
semitismo, antibolchevismo, expansionismo. Jaeckel fala «de um espírito
consequente orientado para a autodestruição. O que tornou Hitler uma
personagem histórica com dimensão excepcional foi o facto de a sua «doutrina»
e o seu comportamento se terem entranhado num terreno bem preparado,
psicológica e socialmente. Hitler orquestrou para as massas certos temas dos
quais não era o autor, mas formavam o fundo do nacionalismo alemão, e aos
quais as circunstâncias davam uma força persuasiva singular, que na excitação
oratória entrava em transes de epiléptico, foi também um estadista, um «gênio
sombrio» corno lhe chamou De Gaulle. Colocado no poder por uma minoria
forte, os seu êxitos identificaram-no com a nação alemã {38}; sem Hitler, o
nacional-socialismo não teria sido aquilo que foi.
O partido nacional-socialista
De 1929 até 1933, o número de filiados no partido nacional-socialista passou
de 400 000 para 1300 000; o partido não parou de crescer depois de 1933, em
virtude das pressões exercidas sobre os funcionários e da obrigação de ser
membro do partido para ter acesso a lugares de chefia nas organizações
profissionais. A maior parte dos membros do partido pertenciam às classes
médias; mas os operários constituíam um terço do total; a implantação era mais
forte nas cidades que nos campos, e os camponeses, principalmente nas regiões
católicas, eram os menos representados {39}. Sigmann distinguiu três espécies
de filiados: os alte Kampfer (os pioneiros de antes de 1933), as grandes
formações dos anos 35, 37 e 40, onde eram numerosos os oportunistas que
entraram para o partido em vagas sucessivas, e as inscrições feitas nos intervalos
entre estas datas, para as quais se exigiram garantias de ortodoxia política
{40}. Geograficamente, as zonas favoráveis ao nazismo foram as de
predominância luterana, se bem que também tenha sido nestas zonas que os
marxistas tiveram mais votos nas eleições {41}. O número de quadros
dirigentes de todas as espécies era notável, cerca de 500 000. Os postos
inferiores não eram retribuídos, mas os «kreisleiters» e os «gauleiters» tinham
retribuição e eram todos nazis fanáticos. Pôs-se frequentemente em destaque o
baixo nível intelectual destes dirigentes; no entanto, uma grande parte das elites
aderiu, visto que, das 4000 personalidades do regime, 670 pertenciam à
aristocracia, 1050 tinham títulos de doutor e 330 eram professores universitários.
Por conseguinte, o partido representava quase toda a sociedade alemã.
O partido estava hierarquizado numa divisão territorial, cabendo-lhe o papel
de enquadrar toda a população; o bairro, a cidade e o distrito tinham chefes
responsáveis, as organizações profissionais também. As mulheres voluntárias
entravam para a NS Frauenschaft. Foram dissolvidos todos os movimentos
juvenis, sendo os jovens agrupados em organizações do partido, conforme a
idade; a adesão, de começo deixada em princípio à decisão dos país, passou a ser
obrigatória em 1936; em 1939, os contraventores foram considerados traidores:
«Toda a juventude - decretou Hitler - receberá, fora do lar e da escola, uma
educação moral para servir a comunidade segundo o espírito nacional-
socialista.» No entanto, o partido não tinha a dirigi-lo uma organização com
poderes efetivos, e o Parteileitung não passava de uma constelação de chefes.
Isso resultou de Hitler não ter sido capaz de escolher entre duas concepções;
Robert Ley, com a sua Frente do Trabalho, que reunia todos os trabalhadores,
pretendia um partido de massas e dava relevo à grandes manifestações de
propaganda e à ação social, numa palavra, identificava o partido com a nação;
outros, como Rudolf Hess e Martin Bormann, pelo contrário, pretendiam um
corpo de dirigentes escolhidos, encarregado de missões de fiscalização e direção
{42}.
Desta maneira, não se suprimiu a dualidade, partido-administração, corrente;
no conselho, no distrito, esta dualidade manifestava-se em conflitos entre dois
homens, embora os funcionários, de modo geral, tenham sido fiéis. No escalão
regional, os 31 gauleiters do partido dirigiam circunscrições diferentes dos 17
Estados do Reich, e as suas atribuições estavam mal definidas: tinham uma
burocracia, uma imprensa, dinheiro, e no momento do perigo, foram
encarregados dos problemas da defesa; mas consideravam-se dependentes
diretamente de Hitler e tiveram conflitos com o ministro do Interior, Frick, e em
seguida com, Himmler, este último inimigo pessoal de Rudolf Hess, que
representava Hitler no partido. Embora, em princípio, tudo fosse hierarquizado
pela generalização do Führer-prinzip, a organização manteve-se de facto caótica,
incompleta, com multas baronias autônoma; a incompetência, a avidez, as
ambições, o número de dignitários do partido davam mais uma nota suplementar
de anarquia {43}. É possível que Hitler, ao fim e ao cabo, tenha sido enleado
pelo partido quando se tornou senhor do Estado. Mas todos se lhe declaram fiéis,
e, entre os dirigentes nazis, os que tiveram os papéis mais importantes foram os
que com Hitler privaram mais de perto e com maior regularidade.
O próprio Hitler tomava em geral as decisões; entre os seus colaboradores
diretos, apenas cinco exerceram influência pessoal. Goering, oficial aviador,
combatente brilhante em 1914-18, acumulava títulos, honras e proveitos:
fundador da Gestapo e dos campos de concentração, criador da Luftwaffe,
ditador da economia, era também colecionador, mecenas e larápio; era um
vaidoso, uma mistura de bonomia e crueldade, encanto e ferocidade, chefe e
salteador, e também um toxicômano {44}. O Dr. Goebbels, fraco, orador
disposto a defender todas as causas, comediante consumado, organizou a
propaganda do regime, utilizando da melhor maneira, pela primeira vez na
História, a rádio e o cinema. Foi ele quem lançou a «marca Hitler», dando de um
agitadorzito de cervejaria a imagem de um profeta, salvador do povo; endeusou
o Führer, lançou o «Heil Hitler», convencendo a pouco e pouco os Alemães da
essência sobrenatural de Hitler, mas renovando também periodicamente o
ciclotímico entusiasmo do próprio Hitler {45}. Rosenberg, oriundo do Báltico,
era o ideólogo do regime, com um livro muito vendido mas confuso, O Mito do
Século XX. Foi ele quem lançou o mito da superioridade da raça nórdica - no
qual Hitler não tinha fé nenhuma - e, proclamou o direito dos senhores ao espaço
vital e ao domínio sobre as raças inferiores; demonstrou que o cristianismo é
alheio à germanidade; diretor da Hohe Schule, centro de estudos ideológicos e
pedagógicos nacional-socialistas, foi nomeado por Hitler para o cargo de
«comissário para a conservação da concepção do mundo nacional-socialista». O
mais influente dos colaboradores íntimos, no entanto, foi Martin Bormann,
porque, privando muito com o Führer - era ele quem geria, os bens de Hitler -
tinha com o chefe os contatos mais numerosos, visto ser chanceler do partido;
nazi fanático, anti-semita feroz, tinha na mão os gauleiters e afirmava
constantemente a sua fé no Reich eterno, encarnado pelo Führer, «o maior
homem da humanidade» {46}. Mas o mais temível era o aparentemente
insignificante H. Himmler, engenheiro agrônomo; este não pretendia as
satisfações do poder, nem os êxitos pessoais, fossem de que espécie
fossem. Levava uma vida muito simples, tinha desprezo pelo dinheiro, era
desumano por fanatismo e dedicou a vida à formação do escol nazi, a SS {47}.
As SS
Para sua proteção pessoal, Hitler constituiu uma guarda que foi denominada,
em 1925, Schutz-Staffel - secção de proteção. Mas a milícia do partido,
comparável com a milícia fascista italiana, era constituída pelas Secções de
Assalto (SA), comandadas por R. Röhm, antigo oficial. Quando Himmler
assumiu o comando das SS, em 1930, aumentou as atividades destas: proteção
das personalidades principais do partido, serviço de espionagem e contra-
espionagem, que se transformou no SD (Sicherheitdienst), entregue a Reinhard
Heydrich; ao mesmo tempo, criaram-se «comandos de intervenção» em muitas
cidades - em 1933, as SS já tinham 50000 homens. Passaram então a ser rivais
das SA, que frequentemente manifestaram insubordinação e pretendiam formar
um novo exército «popular», ideia que causava preocupação à Wehrmacht.
Convencido, por meio de documentos falsos preparados por Heydrich, de que
Röhm conspirava contra ele, Hitler livra-se deste e de numerosos adversários,
reais ou imaginários, na noite de 30 de Junho de 1934, «a noite dos facões».
Himmler passou a ter daí por diante funções novas, cada vez mais importantes.
Em 1936, por Heydrich, passou a ser o chefe de todas as polícias do Reich,
apesar da oposição de Goering; mais tarde deitou a mão aos serviços especiais
do exército, a Abwehr.
Segundo Himmler, e Hitler - que lhes entregou a «Blutfahne», a bandeira
impregnada do sangue dos «mártires» do golpe de 1923 - as SS deviam
constituir uma ordem ao serviço do partido e do Estado. Himmler disse a este
respeito: «Só sangue nórdico deve ser tido em consideração. . . o nosso sangue
confere-nos um gênio inventivo muito superior ao das outras nações... As
décadas futuras verão o extermínio dos seres inferiores que lutam contra a
Alemanha, berço da raça nórdica, porta-voz da civilização.» Para manter a
pureza racial do escol, todos os meios eram bons: bigamia, procriação fora do
casamento, roubos de crianças. O recruta SS era ensinado a obedecer, sem fazer
perguntas, fosse a que ordem fosse, por mais dura que pudesse ser; o extermínio
dos inimigos do Reich era a sua razão de ser; a decisão fanática e a falta de
piedade eram as condições do êxito; a camaradagem, os laços pessoais dos
homens com os seu chefes instituíam uma espécie de devoção religiosa {48}.
Em 1936, criaram-se unidades SS «caveira», encarregadas da vigilância e
depois da direção dos campos de concentração, até essa altura entregues às SA;
nestes campos, os nazis metiam os adversários - primeiro alemães contrários ao
regime, misturados com criminosos e associais, depois os «resistentes» dos
países ocupados, por fim, e sobretudo, judeus, condenados ao extermínio. Uma
massa humana, destituída de qualquer proteção jurídica, enfraquecida pelas suas,
divisões internas - estiveram ali representadas mais de vinte nações -
indefinidamente renovável, ficou assim entregue ao arbítrio de um exército de
carrascos, cujo comportamento ia do sadismo puro e simples até experiências
médicas em cobaias humanas. Mas esta massa humana também proporcionava à
SS uma multidão de trabalhadores que podiam ser explorados até ao último
limite das suas forças. A SS tornou-se assim um grande industrial que explorava
fábricas de tijolos, pedreiras, indústrias de madeira, têxteis, couro, borracha
sintética e armas secretas. As suas empresas tinham uma estrutura paradoxal;
eram sociedades privadas - de responsabilidade limitada, mas dirigidas
inteiramente pela administração central da SS. Durante a guerra, o principal
proveito era o aprovisionamento da própria SS em objetos de equipamento.
Himmler encontrou a oposição de Speer quando pretendeu, sem êxito, deslocar
as fábricas de armamento para os campos de concentração. Mas a conquista da
Europa abriu à SS perspectivas grandiosas: foi encarregada de colonizar o
espaço conquistado e criar raízes nestes territórios. A sua primeira missão de
defender o regime juntou-se assim a tarefa de preparar a economia da Europa
nazificada {49}.
A SS juntou a isto a constituição de um exército livre de qualquer sequela da
época imperial. A partir de 1940, unidades de Waffen SS tomaram parte na
campanha da França. Essas unidades multiplicaram-se e fizeram recrutamentos
em toda a Europa, com a guerra contra a U. R. S. S.; a sua importância foi
aumentando sempre, porque Hitler tinha pouca confiança nos seus generais e
para explorar o capital de entusiasmo e fanatismo da juventude. Himmler,
quando não o fazia o próprio, Hitler, ocupava-se pessoalmente dos
fornecimentos de material, escolha de chefes, lugares de recrutamento {50}. Os
homens eram treinados numa disciplina draconiana, havia exercícios de combate
constantemente e as sessões de doutrinação política eram intermináveis; os
chefes eram muitas vezes cadastrados, falhados ou semiloucos (Eicke,
comandante da divisão Totenkopf, foi recrutado por Himmler num asilo
psiquiátrico). As Waffen SS comportaram-se de maneira criminosa nos
territórios conquistados, incendiando aldeias (uma delas Oradour, em França),
assassinando prisioneiros ou resistentes detidos, exterminando colectividades
judaicas, matando os feridos - e cometeram também pilhagens individuais,
violações, que eram proibidas em princípio mas raramente davam lugar a
penalidades. As Waffen SS foram a princípio desprezadas, pelo exército, que
procurava distinguir-se delas; em seguida, o exército sentiu ciúmes das Waffen
SS, em virtude da retumbância que a propaganda dava aos feitos destas; por fim,
o exército utilizou as Waffen SS, com prioridade, nos combates difíceis e
admirados (a divisão SS Hitlerjugend teve 20 % de mortos e 40 % de feridos e
desaparecidos na Normandia, de 16 de Junho a 11 de Julho de 1944).
Para o fim, a SS tornou-se um Estado dentro do Estado; em 1944, Himmler
acumulou a direção das SS com a da Polícia, o Ministério do Interior, a politica
racial, o comando de 34 divisões SS e dos exércitos do centro. Nesta posição,
julgou que poderia adotar uma política pessoal, estabelecendo contatos com a
Suécia para desempenhar um papel diplomático, entabulando negociações na
Itália com os Aliados para circunscrever o conflito à guerra contra a U.R.S.S.,
tentando trocar o destino dos concentracionários por uma proteção anglo-
americana para ele e os seus homens, tendo até alguns contatos indiretos com o
grupo dos conspiradores contra Hitler, e aspirando a tomar o lugar deste em
1945 - mas acabou por se envenenar quando os Americanos o capturaram e
identificaram.
O Estado nacional-socialista
Hitler nunca aboliu a constituição de Weimar; não elaborou uma
Constituição nova, e não parece que se tenha preocupado com o assunto. O
regime nacional-socialista foi sempre, portanto, um regime de excepção, de
facto, desejoso de não ter embaraços com qualquer restrição de ordem jurídica,
um regime no qual a administração e a polícia estavam acima do Direito. Era um
Führerstaat, isto é, um Estado a mercê do seu chefe, cuja palavra cria a lei, cuja
vontade não está sujeita a nenhuma restrição e cujo comportamento não admite
nenhuma crítica. Mas, de facto, é difícil determinar o papel de Hitler fora dos
seus dois domínios reservados, a diplomacia e a guerra, suas principais
preocupações, mas a sua autoridade era completa. Quanto ao mais, há poucas
decisões claras escritas pelo seu punho, ao passo que se vê constantemente a
assinatura de Lammers, que lia e separava a correspondência, anotava os
documentos submetidos ao Führer. Houve quem dissesse que Hitler, no
exercício rotineiro do poder, era «o homem que não decidia»{51}; mas é
provável que os seus colaboradores diretos nunca tivessem tentado iludi-lo ou
atuar contra a maneira de pensar do chefe, pelo menos enquanto este teve êxitos.
Hitler criou instituições especializadas, que se desenvolveram paralelamente
à administração normal - os gauleiters, a Frente do Trabalho, a Organização Todt
das obras públicas, o plano de quatro anos, o gabinete de estudos de Ribbentrop
(que durante algum tempo duplicou a Wilhelmstrasse), a missão de Rosenberg,
sem esquecer, claro, as SS. Pôde assim tomar as decisões fundamentais - a
eutanásia, o genocídio dos Judeus - sem ter em conta a autoridade competente.
M. Broszat chama a este regime «policracia», um regime com instituições rivais
que se interpenetram, instituições com competências estatais, semi-estatais e
partidárias - sendo difusas as fronteiras entre o Estado, a Sociedade e o
Partido{52}. Daqui resultou, com o condicionalismo uniformizador, uma
permanência de comportamentos diversos nas grandes cidades, nas cidades
pequenas e nos campos.
Psicologicamente, o regime apoiou-se na propaganda e na angústia colectiva,
que Hitler denominava o «terror do espírito»; a miséria e o medo privam o
indivíduo de qualquer pensamento pessoal; exercem-se pressões nas famílias; as
torturas, a execução ou a morte lenta nos campos de concentração eram o destino
dos opositores. Havia uma completa indiferença para com o ser humano e as
suas possibilidades intelectuais; a educação dos homens passou a ser uma
espécie de criação de gado, e o fanatismo tornou-se a principal inspiração do
nazi na ação {53}. É certo que o código das leis não foi transformado nos seus
princípios essenciais, mas o Estado de facto instituído dá a justiça um papel
meramente secundário; os julgamentos eram raros; o que predominava era a
prática da detenção e internamento, sem julgamento; em 1942, o ministro da
Justiça, Thierack, «legalizou» este comportamento, proclamando que o juiz não
é guardião da lei, mas sim auxiliar do governo.
Conforme mostrou J. Billig {54}, o que Hitler admirava acima de tudo era o
engenheiro-empresário, cujo saber e vontade edificam a força e o poderio. Quis
fundar um império «milenário», racialmente puro, que ampliasse o seu «espaço
vital» com conquistas em prejuízo das raças inferiores, destinadas à escravatura
ou ao extermínio. Esta obra exigia a perenidade da dura exploração do homem
pelo homem; pressupunha a submissão de todos, voluntariamente ou à força, aos
objetivos da comunidade. Instituía de modo permanente um tipo de sociedade
militar; imitando Clausewitz, E. Nolte escreveu que o nacional-socialismo
seguiu «uma política que continuava a guerra com os mesmos meios». É
evidente que um regime como este foi muito mais totalitário que o fascismo
italiano. Mas foi, no entanto, este regime o «totalitarismo»? Um autor como
Heinz Höhne {55} põe isso em dúvida, porque, segundo escreveu, Hitler
permitiu que se mantivessem certas instituições tradicionais muito veneráveis e
poderosas como o exército, a Igreja, a administração, o corpo diplomático, as
estruturas industriais. Temos de tentar avaliar o domínio do hitlerismo na
sociedade alemã.
A «cultura» nacional-socialista
A cultura individual, a procura do belo pelo belo, a predileção pelo
conhecimento desinteressado, foram noções alheias ao nazismo.
«A massa», disse Hitler a Rauschning, «é como um animal que obedece aos
seus instintos ... Fanatizei as massas para fazer delas o instrumento da política ...
Desperto nelas sentimentos que lhes convêm, obedecem imediatamente às
diretrizes que lhes dou. Numa assembleia de massa, deixa de haver lugar para o
pensamento.» Passando à aplicação, Goebbels acrescentava: «Precisamos de
satisfazer os instintos primários das massas.» O nacional-socialismo deveu uma
boa parte dos seus êxitos à propaganda; foi o primeiro regime que criou um
Ministério da Propaganda. Goebbels, em princípio, era senhor da Imprensa,
cinema, rádio, música e literatura. Mas, também neste campo, proliferavam a
anarquia e as rivalidades; a Wilhelmstrasse tinha a seu cargo a propaganda no
estrangeiro, o Dr. Dietrich dirigia a Imprensa, sendo Max Amman o responsável
pelos jornais do partido! Mas Goebbels acabou por ser o verdadeiro responsável
pela manutenção do moral do povo alemão. Nos seus discursos, usou linguagem
popular; conhecia a virtude dos estribilhos e o efeito da sua repetição nas
multidões {62}.
Goebbels, não sem cinismo, afirmava que «a Imprensa não deve apenas
informar, mas também instruir ... É um teclado em que o Governo pode tocar ...
Os jornalistas têm uma função, não têm opinião». Goebbels dava instruções
precisas em conferências diárias que duravam meia hora. Para se ser jornalista
era preciso ser-se licenciado; não havia qualquer censura prévia, mas tinha de
haver autocensura, e as extravagâncias eram julgadas num tribunal corporativo e
estavam sujeitas a sanções policiais. De 4073 diários e semanários existentes em
1932 passou-se para 2208 em 1937 e para 500 em 1944. Os nazis foram
eliminando a pouco e pouco os jornais dos seus adversários e aliados destes,
pagando-lhes indenizações (Hugenberg foi pago com instalações de siderurgia e
laminagem!). Depois disto, os nazis formaram um autêntico truste, o Eher
Verlag, que agrupava 150 empresas e empregava 35 000 pessoas {63}. Goebbels
conseguiu ter a direção da rádio, em compita com Goering; imediatamente
tomou a significativa decisão de substituir nas emissões literárias a palavra
Kritik por Betrachtung (consideração). As emissões radiofônicas, as
retransmissões de discursos em comícios multiplicaram-se, quando se observou
que a propaganda nazi se difundia melhor pela via oral que pela escrita. Em
particular, criaram-se muitas emissões para o estrangeiro - onze horas por dia
para os Estados Unidos, oito horas para a Africa. O cinema, dirigido por uma
câmara corporativa, subvencionado por um banco especial, difundiu filmes anti-
semitas (O Judeu Suss), enalteceu a beleza do esforço físico (Jogos Olímpicos),
recordou as glórias do passado (Kolberg) {64}.
Para os nazis, a literatura era uma fonte de «energia nacional »; numerosas
comissões passavam a pente fino todos os escritores, distribuíam incitamentos,
ameaças e castigos. Para publicar, era preciso ser-se membro da «câmara dos
escritores», que apontava as obras suspeitas; as bibliotecas foram expurgadas, e
as obras «malfazejas» deram ocasião para cerimônias histéricas de autos-de-fé.
Os temas recomendados eram: «o sangue e o solo», o passado nacional, as
virtudes da raça nórdica; criaram-se inúmeras bibliotecas, compostas por livros
«sãos», para serem utilizadas por jovens, operários e soldados. O teatro foi
ligado à velha instituição germânica do Thing, assembleia de homens livres;
perante auditórios enormes, ao ar livre, representaram-se peças adaptadas para a
propaganda - por exemplo, «a paixão alemã de 1933» foi concebida para
substituir, mas não teve êxito, a célebre paixão de Oberammergau. Exilaram-se
cerca de 300 escritores, os mais conhecidos; alguns escritores ilustres, como G.
Hauptmann, M. Heidegger, H. Carossa, serviram o regime; a maior parte deles
submeteram-se, depois de às vezes terem protestado contra as imposições das
instituições culturais de Goebbels e Rosenberg, aliás rivais. Muitos refugiaram-
se na literatura de evasão, no lirismo, nas histórias de aventuras {65}.
Baldur von Schirach disse a certa altura que «o critério estético só
acessoriamente interessava os nazis». De facto, as preocupações artísticas dos
nazis resultavam das suas concepções racistas e ideológicas. Hitler entendia que
os Judeus e os Negros eram responsáveis pela degenerescência da arte.
Rosenberg criou a «união de combate a favor da cultura alemã», que atacava
pintores como Klee e Kadinsky, músicos como Hindemith e Stravinsky; retirou-
se dos museus muitos quadros - o que não impediu que Goebbels e Goering
viessem a arrebanhar quadros semelhantes na Europa Ocupada. Hitler, arquitecto
falhado - também o eram, convém notá-lo, vários dirigentes nazis - pretendia
deixar testemunhos arquitecturais da sua glória. Sonhava com um
neoclassicismo que «ultrapassasse o quotidiano e as suas exigências», capaz de
«estabelecer a ordem nova». Procedendo desta maneira, inspirava-se mais na
arte antiga do que na «arte nórdica», embora também admirasse as categorias
góticas e o barroco vienense; é certo que a mitologia nazi via Arianos nos
Gregos. Monumentos colossais deveriam assinalar as vitórias: Somme, Volga,
Termópilas, etc. {66}.
Num sistema como este, embora a propaganda celebre as virtudes familiares,
e existam obras como «a mãe e o filho», está tudo previsto para fazer passar a
juventude pelo molde do partido. Os livros escolares foram revistos, os
estudantes foram agrupados na Studenschaft, os professores foram colocados sob
a vigilância dos seus organismos corporativos. Enquanto as «Adolf Hitler
Schulen» forneciam ao partido os seus militantes de escol, os futuros quadros
dirigentes da nação eram formados nas napola {67}. Nestes institutos, em que
todos os alunos tinham de ser racialmente puros e ter qualidades físicas e
intelectuais superiores à média, e para onde entravam sobretudo os filhos de
membros do partido, manteve-se o ensino tradicional mas baniu-se por completo
o espírito crítico e ensinou-se a submissão à comunidade, com o estribilho «Tu
não és nada, o teu povo é tudo», e a aceitação do sacrifício. Quando se fazia a
entrega solene das baionetas, uma espécie de distribuição de prêmios, a fórmula
era: «A espada é o direito e a verdade. »
Hitler disse um dia a Rauschning: «Quero uma juventude brutal, imperiosa,
impávida e cruel.» O fascismo considera a juventude como uma entidade, com
as suas características, os seus direitos, as suas aspirações próprias. Instituí-se
uma demagogia: «O diabo leve os velhos, só o jovem eterno deve ter a sua pátria
na Alemanha.» Von Schirach avisou os pais de «que tinham entregue as suas
prerrogativas ao partido». Os jovens eram educados segundo o mito do chefe,
que era também, dizia von Schirach, «o professor e o sacerdote». Punha-se em
destaque a ideia darwiniana da «luta pela vida que nos é imposta pela Natureza»
{68}. A «alegria da luta» era considerada um enriquecimento; a libertação, dos
instintos, a importância da Natureza, eram exaltadas numa espécie de
romantismo irracional, no qual desempenhavam os seus papéis as forças
primitivas do fogo, da noite e da montanha; daqui resultaram as cerimônias do
solstício, os acampamentos em tendas, os cantos colectivos e brutais e a
preponderância dos cursos de educação política, onde constantemente se
celebravam a vida, a personalidade e a obra do Führer. Os cursos de história
baseavam-se nos exemplo, dos heróis germânicos, Arminius, Widukind,
Frederico o Grande, Frederico Barba-Roxa, Andreas Hofer. Ao mesmo tempo
ensinava-se o ódio aos destruidores do Reich, o judeu, o comunista, o inimigo
estrangeiro. Os nazis souberam explorar a fundo as qualidades da juventude, a
generosidade e a dedicação, com a ideia de «Quem tem a juventude tem o
futuro». A educação da juventude devia prepará-la para a guerra «pelo Reich
milenário». Os resultados são convincentes: na segunda guerra mundial, todos os
quadros dirigentes da Hitlerjugend se tornaram oficiais do exército ou da SS. Se
a derrota não lhe tivesse tirado o tempo necessário, é provável que tivesse sido
este o domínio em que Hitler viria a ter os maiores êxitos e dessa realidade ao
sonho de todos os condutores de povos que pretendem ser revolucionários:
moldar um homem novo.
O racismo hitleriano
O racismo era o fundamento do nazismo. Para proteger a «raça alemã»,
tomaram-se diversas medidas. W. Darré pretendia classificar as raparigas: umas
poderiam casar e ter filhos; as outras, indignas de tal honra, ficariam proibidas
de uma coisa e outra. Himmler decretou em 1931 que qualquer membro da SS
que quisesse casar teria de pedir uma licença, «que seria concedida ou recusada
de acordo com os princípios da saúde racial e hereditária». Em contrapartida, as
raparigas não teriam o direito de se recusar aos SS, que eram autênticos
garanhões para a criação de «uma ordem sagrada, herdeira dos Vikings e dos
cavaleiros teutônicos». Himmler, aprovado por Rosenberg, fundou a organização
Lebensborn (fonte da vida), na qual seriam educadas as crianças com vestígios
de «sangue nórdico», mesmo que tivessem nascido fora da Alemanha.
Não é absolutamente seguro que todos os dirigentes nazis tenham aprovado
toda esta salsada - Goebbels achava isto ridículo. Mas todos entendiam que era
necessário purificar a Alemanha de qualquer influência judaica. A mensagem de
Gobineau, que define uma hierarquia entre as raças e condena a mestiçagem, foi
vulgarizada pelo «mestre de coro da raça ariana», Chamberlain, genro de
Wagner. No fim do século XIX, já havia 16 deputados anti-semitas no
Reichstag. O estereótipo judeu corrupto e corruptor era frequente na literatura
popular. Quando rapaz, Hitler leu em Viena o falso Protocolo dos Sábios de
Sião, que atribuía aos Judeus a ambição de dominar o mundo; sem dúvida que
era profundamente anti-semita, embora tenha dito a Rauschning que «se o Judeu
não existisse, teria sido preciso inventá-lo». Dizia Hitler que «só um anti-semita
pode ser um verdadeiro anticomunista». Para ele, o judeu era inassimilável; a sua
presença impedia o regresso aos valores salvadores da germanidade; o seu
internacionalismo - pela sua dispersão, mas também porque era a base das
internacionais capitalista e comunista - era um suicídio para os povos entre os
quais vivia; era a «anti-raça» {69}.
Nestas condições, os Judeus foram postos de parte, eliminados da
administração pública, do foro, da banca, da edição; em 1935, as leis de
Nuremberga retiraram-lhes os direitos cívicos - passaram a ser estrangeiros no
seu país; os lugares públicos passaram a ser proibidos aos judeus, e proibida
ficou qualquer relação sexual com os «Arianos». A princípio foi-lhes permitido
emigrar, a troco de perderem parte das suas fortunas; em seguida, Hitler pensou
em exportá-los em massa para Madagáscar. A guerra deu ensejo para aplicar a
solução final do problema judaico», isto é, o extermínio dos Judeus, decidido em
Wansee em 1942, arrebanhados em toda a Europa, amontoados em bairros
fechados, às vezes chacinados ali mesmo ou reduzidos à indigência, acabaram
por serem mortos em câmaras de gás e incinerados em campos de concentração,
com Birkenau a ocupar o primeiro lugar. Crime abominável, que causou a morte
de seis milhões de pessoas infelizes, sem que o seu desaparecimento tivesse tido
qualquer relação com o conflito ou tivesse tido neste uma influência qualquer;
foi o mais monstruoso dos crimes gratuitos {70}.
No entanto, os nazis tiveram de acomodar este fanatismo racista com as
exigências da sua política externa, em particular na altura da sua aliança com os
Japoneses ou no seu apoio aos Árabes. Hitler deitou água na fervura e disse que
«o Japão também era ameaçado pelo Judeu, que não se lhe podia adaptar». Indo
mais longe, Rosenberg admitiu que os Japoneses, visto não estarem classificados
entre os não Arianos, poderiam, casar com alemãs sem «poluir o sangue nazi».
Finalmente, o professor de antropologia Hans Gunther explicou que «os
Nórdicos figuravam entre os antepassados dos Japoneses» {71}. O anti-
semitismo nazi, sem fundamento científico, sem nenhuma necessidade - apenas
0,75% dos Alemães eram judeus e todos queriam assimilar-se - transformou-se
assim numa farsa e veio a acabar numa tragédia.
O espaço vital
Hitler censurava a República de Weimar pela «sua fascinação por litígios
fronteiriços de pouca importância». O programa do partido, redigido por Feder,
previa a supressão dos tratados, o regresso às fronteiras anteriores, a constituição
de um grande Reich que agrupasse todos os Alemães. No Mein Kampf e no seu
«segundo livro», Hitler acrescentou a isto a noção de «espaço vital», tirada da
geopolítica de Haushofer, segundo a qual a extensão territorial de um país é
determinada por caracteres geográficos, históricos e econômicos idênticos, de
maneira a estabelecer «um equilíbrio entre a importância numérica do povo e a
qualidade e extensão do território que ocupa» {72}. Hitler nunca pensou numa
solução por meio da extensão da ciência e da técnica, e ainda menos por meio do
maltusianismo - pelo contrário, alegrava-se com o impulso demográfico do
Reich. Adotou a ideia de Mussolini a respeito das nações pobres, condenadas a
conquistar às nações ricas os seus meios de existência.
Os objetivos da política hitleriana foram definidos no Mein Kampf. Nesse
livro, Hitler previu um acordo a longo prazo com a Inglaterra, sem que o Reich
renunciasse completamente à sua vocação marítima e colonial, a exclusão da
França da sua posição de grande potência, e em seguida «a conquista da gleba»,
a Leste, contra a U. R. S. S. É verdade que nas suas variações tácticas, a política
de Hitler esteve cheia de contradições - designadamente com a assinatura do
pacto germano-soviético e a guerra contra a Inglaterra; isto resultou de que
Hitler era ao mesmo tempo um ideólogo fanático e um aventureiro oportunista,
para quem o que primeiro contava era a ocasião e o êxito imediato; mas embora
parecesse indeciso na prática, os seus objetivos foram sempre os mesmos e
chamavam-se U. R. S. S. Na U. R. S. S. e na Polônia, Hitler reencontrava a via
dos cavaleiros teutônicos, descobria o espaço enorme para colonizar, e tinha lá o
foco do comunismo que era preciso destruir, e ainda grandes massas de judeus
para exterminar. Pensava que a U. R. S. S. era o «flagelo da humanidade», por
causa dos Judeus, para quem a U. R. S. S. «era o paraíso». Em Julho de, 1941,
Hitler colocou na U. R. S. S. o centro da experiência político-racial que deveria
dar à Alemanha a supremacia na Europa; na mesma altura foi prevista a
expulsão da população russa, com o esboço de um «plano oriental de conjunto»
que Hitler considerava que viria a ser «a maior das suas realizações históricas».
No seu testamento de 1945, antes de se suicidar, Hitler ainda convidou a nação a
«opor-se impiedosamente, primeiro que tudo, aos envenenadores da
humanidade, a judiaria internacional». Judeu, comunista e russo eram sinônimos
{73}.
Uma vez alcançado esse grande desígnio, se fosse possível com o acordo da
Inglaterra, mas contra esta se fosse necessário, adquirir-se-ia territórios coloniais
em África e criar-se-ia o poderio naval suficiente para combater contra os
Estados Unidos, à frente da Europa, na luta final para o domínio do mundo.
Hitler deixava esta última fase aos seus sucessores. Assim, no Mein Kampf, já o
imperialismo alemão estava enleado nesta alternativa: tudo ou nada, vitória ou
desastre completo; ou o povo alemão realizaria o seu destino, impondo ao
mundo uma imutável uniformidade racial que afirmaria a sua superioridade, ou
desapareceria. Havia alguma coerência nesta loucura, de ambição desmedida,
cujo primeiro resultado seria o desencadear da segunda guerra mundial, a morte
de dezenas de milhões de homens, e, para o povo alemão, enormíssimas
destruições materiais e morais.
Os êxitos que teve, a hegemonia momentânea que exerceu, as dedicações
fanáticas que suscitou, fazem com que o nazismo ainda hoje tenha quem lhe teça
louvores {74}. Quem assim faz tem em pouca conta o poderio alemão e dá valor
excessivo aos regimes e dirigentes de um país. As vitórias militares da
Alemanha nazi foram ganhas pelo exército alemão tradicional - os generais SS
só tiveram derrotas; a eficiência econômica duradoura, foram obra dos
engenheiros e industriais alemães - Speer teve de usar os serviços destes em
1944, contra os nazis. A contribuição dada pelo nazismo foi o desprezo da
pessoa humana, o endeusamento do chefe, o terror generalizado, a vontade
ilimitada de conquista, os campos de concentração, o genocídio, dos Judeus, etc.
Numa palavra, o nazismo transformou o crime em instituição.
IV. OS FASCISMOS FRANCESES
Os antecedentes
Napoleão I e Napoleão III abriram caminho ao fascismo, com a ditadura, o
culto de grande homem, a busca do apoio popular pelo plebiscito, a restruturação
do corpo social - com uma nova nobreza ou a promoção duma classe de
negociantes. Na verdade, o bonapartismo exprimia tanto a revolução francesa
como o nacionalismo de inspiração jacobina. No século XX, tinha perdido toda a
implantação autêntica, salvo na Córsega, onde se mantinha de maneira mais
folclórica que política; a sua última encarnação foi o «boulangismo», que
nenhum fascista francês jamais invocou; se houve antepassado, estava esquecido
por completo.
O bonapartismo, aliás, era recusado pela Action Française, que o considerava
republicano. E. Nolte pôs em destaque os caráteres fascistas desta tendência
política {76}: favorável à autoridade, à hierarquia, à disciplina; contrário ao
individualismo, à democracia e à República parlamentar. Para a AF, como lhe
chamavam, o princípio supremo era a Pátria, encarnada no Estado, em nome do
«nacionalismo integral»; a AF exaltava a violência, a subversão; tinha os seus
grupos de choque - Os «bufarinheiros do rei » - que castigavam os mal pensantes
e eram numerosos entre os estudantes; insultava e emporcalhava os seus
adversários, de maneira nojenta {77}; era responsável pelo assassínio de Jaurès.
Afastava-se bastante do monarquismo tradicional de um Bonald ou de um
Maistre, e eram muitos os fascistas comprovados que tinham sido seus adeptos.
No entanto, a Action Française, embora admirasse Mussolini, não o imitava. No
seu entender, a ditadura devia ser muito provisória, para permitir o
restabelecimento da monarquia hereditária; pretendia que era necessário
regressar ao estado de coisas anterior a 1789, e desta maneira se afirmava
profundamente reacionária. Preconizava a ordem, a razão contra o instinto, o
classicismo contra o romantismo. O Estado não devia ser centralizador, mas sim
regionalista; devia apoiar-se nas elites tradicionais: a Igreja, o Exército, a antiga
aristocracia, os proprietários fundiários, numa palavra, os notáveis. Aliás, Léon
Daudet rejeitava qualquer analogia com o fascismo italiano. Assustada com «as
massas», que não podiam ser senão o povo de Paris de 1793 ou da Comuna,
desprezando-as, a Action Française era talvez um degrau para o fascismo, mas
não era o fascismo {78}.
Aconteceu ainda que a guerra, em França como na Itália, trouxe de novo ao
primeiro plano as ideias de eficiência, hierarquia e sentimento nacional; os
antigos combatentes lamentavam as querelas e inoperância dos partidos políticos
que tinham «desonrado» a vitória. Havia muitos grupos com fins eleitorais, que
pretendiam «agrupar os amigos da ordem» contra a subversão social; alguns
destes grupos, como as «Juventudes Patrióticas», tinham uniforme e
preconizavam um reforço da autoridade, com uma carta social. O feixe de G.
Valois inspirava-se diretamente em Mussolini. Operário da indústria do livro, de
inspiração proudhoniana e anarco-sindicalista, Valois foi seduzido pelo primeiro
fascismo italiano {79}. Quis reunir «socialismo e nacionalismo, o estado dos
combatentes e o dos produtores». Preconizou um socialismo hierarquizado à
maneira de Saint-Simon; pretendeu uma ditadura nacional, uma assembleia de
ofícios e outra de chefes de família, um sistema corporativo.
Embora Valois não tivesse êxito popular - os efetivos do seu movimento
político foram sempre esqueléticos - foi uma das expressões da intensa
fermentação que agitou os intelectuais franceses por alturas dos anos trinta.
Multiplicaram-se então os semanários e os inquéritos, em busca de uma terceira
via entre socialismo e capitalismo {80}, mais ou menos diretamente subsidiados
por negociantes - Lemaigre-Dubreuil, Coty - ou pelo consulado italiano em
Paris. O mais virulento destes grupos foi o do jornal Je suis partout (Gaxotte,
Brasillach, Bardèche), anti-bolchevique e anti-semita, que preconizava a
violência {81}. Os intelectuais, principalmente os novos, entram portanto no
combate político contra a República; mantêm-se frequentemente influenciados
pelo antigermanismo da Action Française e simpatizam mais com o fascismo
italiano - uma petição contra as sanções que a SDN aplicou à Itália teve centenas
de assinaturas de jornalistas, escritores, artistas ...{82}.
Esta fermentação atingiu aliás a esquerda socialista, sindicalista ou radical.
Em Front Commun e em La Flèche, Bergery e G. Izard diziam ser adversários
do sistema parlamentar, adeptos de uma ampla união dos trabalhadores
organizados em sindicatos e cooperativas; opunham-se simultaneamente aos
trustes e à ditadura de classe. A renovação italiana, o poderio recuperado na
Alemanha, atraíam estes intelectuais, perturbados pelo nacionalismo afirmado
pelos comunistas a partir de 1935 e assustados com a ideia de uma segunda
guerra mundial; a decadência da democracia afigurava-se-lhe irremediável. Esta
oposição de ideias contribuiu para desacreditar os partidos políticos tradicionais;
tendeu para esbater as fronteiras entre a direita e a esquerda; não foi ter por
completo ao fascismo, mas facilitou a sua eclosão, designadamente e em
primeiro lugar nas «Ligas».
Os fascismos clericais
Parece-nos que se podem classificar assim os regimes que se instituíram, na
Áustria de Dollfuss, antes de se inserir no Reich alemão, e, mais
duradouramente, em Portugal com Salazar, mais tarde na Croácia e na
Eslováquia depois de 1940. O que diferencia estes regimes do da Alemanha nazi
é o papel primordial que neles desempenhou a Igreja Católica e os valores que
esta defende.
Na Áustria, que, depois da guerra de 1914-18, ficou como que uma cabeça
sem corpo, arruinada pela inflação e até ameaçada pela fome, monsenhor Seipel
instituiu um regime, sem dúvida parlamentar, mas muito conservador e baseado
num corporativismo inspirada na encíclica Quadragesimo Anno e na
colaboração de classes. Em seguida, o chanceler Dollfuss avançou ainda mais no
mesmo caminho; destitui o Parlamento, amordaçou a imprensa, esmagou uma
revolta de operários em 1934, proibiu as greves e apoiou-se num só partido - o
partido cristão-social. Foi uma ditadura branda, na qual os opositores
conhecidos, internados mas depois postos em liberdade, circulavam à vontade,
sem que nada de mau lhes acontecesse, em que a imprensa socialista, em
princípio clandestina, era distribuída quase às claras. A esta ditadura deparou-se
dois adversários - a Heimwehr e os nazis.
A Heimwehr do príncipe Stahrenberg tinha como adeptos os pequenos
proprietários, os antigos oficiais e funcionários da Áustria-Hungria desaparecida.
Este movimento, apoiado por Mussolini, era de carácter rural, provincial e
católico, opunha-se à «Viena Vermelha» e tinha como ideal uma sociedade pré-
industrial; os industriais subsidiaram este Movimento, por ser anti-socialista, o
exército deu-lhes armas e o clero tomou parte em missas ao ar livre por ele
organizadas, nas quais se juntavam grandes multidões. Dollfuss e o seu sucessor,
Schuschnigg, umas vezes combatem a Heimwehr - que Schuschnigg dissolveu
em 1936 - outras vezes servem-se dela, como milícia, quer contra os socialistas
quer contra os nacionais-socialistas austríacos que, dirigidos e sustentados por
Berlim, obtiveram grande adesão à ideia da ligação da Áustria ao Reich alemão.
Os nacionais-socialistas austríacos assassinaram Dollfuss; contra eles,
Schuschnigg tentou em vão formar uma união nacional, integrando os operários
em sindicatos oficiais, proclamando uma anistia geral; a sua base social
manteve-se sempre muito restrita; foi vítima, sobretudo, do abandono da Áustria
por Mussolini, depois da guerra da Etiópia e das sanções contra a Itália. Desta
maneira, o fascismo clerical austríaco foi vítima da vontade de expansão
hitleriana, que pouca oposição teve na Áustria - o episcopado e até o socialista
Karl Renner, chanceler em 1919, aprovaram o Anschluss de 1938.
O fascismo português, que beneficiou de circunstâncias mais favoráveis,
manteve-se durante cerca de cinquenta anos {100}. Quando o Prof. Salazar
entrou para o Governo, em 1928, foi a isso chamado como financista de renome,
com a missão de tratar um país muito doente por causa do abuso das revoluções
e da crise econômica e financeira. Os êxitos que Salazar obteve, nestas funções,
transformaram-no a pouco e pouco num «homem providencial» e os seus
poderes foram aumentando constantemente, sem golpes de Estado embora não
sem violência. O regime instituído por Salazar foi fascista porque apresentava as
seguintes características: rejeição do parlamentarismo, adoção dum sistema
corporativo, proibição da greve, enquadramento dos indivíduos, internamentos
de carácter administrativo; glorificava o chefe, o Salvador, difundia os mitos
nacionalistas, proclamava a vocação colonizadora de Portugal - o Ato Colonial
de 1933 fundou a unidade de Portugal e suas possessões ultramarinas. O regime
rejeitava a luta de classes e procurava a união da nação num corpo social
hierarquizado; aliás, o regime sucedeu a uma ditadura militar.
Mas Salazar rejeitava o totalitarismo, «que subordinaria tudo à nação e à
raça»; os Portugueses fazem mestiçagem com facilidade. Salazar manteve o
Estado clássico; sonhava um Portugal voltado para o passado, imóvel, agrícola,
pouco instruído, dirigido pelos notáveis, guiado pelos padres na via dos valores
familiares e morais cristãos. Assustavam-no as perspectivas proporcionadas pela
sociedade industrial, para a qual se orientavam os fascistas italianos e os nazis
alemães; apoiava-se nos grandes proprietários, mais do que na burguesia
industrial, aliás mais liberal que os agrários. Nestas condições, o regime era
tanto tradicionalista como fascista, embora, a partir de 1936, tentasse reunir as
massas, e agrupar a juventude. Apesar do seu anticomunismo, Salazar, durante a
segunda guerra mundial manteve-se neutral entre os dois campos, até que a
vitória dos Aliados fez com que se inclinasse a favor destes.
O fascismo japonês
No Japão não se formou um partido fascista poderoso; as facções que se
diziam fascistas até se combatiam umas às outras {109}, e o fascismo era até um
tanto rejeitado como produto vindo da Europa. No entanto, havia na sociedade
japonesa um mal-estar autêntico; especulação e escândalos, grande riqueza de
uns e miséria de outros, capitalismo avassalador com laivos de feudalismo, um
imperador teoricamente todo-poderoso mas de facto sem qualquer poder, sistema
parlamentar perturbado pela fraqueza dos partidos políticos e pelas eleições
falseadas, etc. A classe dirigente, divergindo das suas homólogas europeias - os
grandes proprietários e industriais japoneses -, nunca teve apreço pelas ideias
liberais; os trustes mantinham as estruturas fechadas das antigas famílias
associadas. A inflação prejudicou a pequena burguesia das cidades e os
camponeses; é verdade que o imobilismo da sociedade japonesa, o sentimento da
hierarquia social e a disciplina do povo japonês impediram as revoltas. Mas o
serviço militar obrigatório criou um corpo de oficiais vindos do povo, que
conheciam por experiência a miséria deste e não morriam de amores pelos
novos-ricos; por outro lado, a classe dos guerreiros, a pequena nobreza (os
Samurai), tendo baixado de categoria, tornou-se anticapitalista reacionária. O
fascismo foi recrutar os seus adeptos nestas duas categorias.
Mas o fascismo nunca foi um movimento de massas violento, «a explosão
vulcânica das paixões humanas» de que falava Hitler. Em vez de procurarem
promover transformações sociais, os fascistas japoneses faziam o possível por
atrair os círculos dirigentes, a começar pelo imperador; queriam monopolizar o
poder, apoiando-se na organização social existente. Unia-os a convicção da
superioridade da civilização japonesa. «A missão divina do nosso grande Japão»,
escrevia Ishihara Kanji, «é trazer a paz ao mundo, realizando uma síntese de
todas as civilizações.» Estavam todos convencidos ;de que a crise interna só
poderia ser debelada com a expansão externa; o Japão não só tinha o direito de
se defender - por exemplo da hostilidade dos ocidentais que o privavam de
matérias-primas - mas, dizia Kita Ikki, fundador do fascismo japonês, tinha
também «o direito de defender as outras nações contra as potências que se
apoderaram de grandes territórios sem terem em conta os direitos naturais dos
povos» - neste ponto o fascismo japonês aderia aos seus homólogos italiano e
alemão e adotava a teoria nazi do espaço vital.
Posto isto, surgiram entre os fascistas japoneses duas tendências. Alguns,
como Kita Ikki, confiavam em «Sua Majestade, o deus vivo,», para realizar um
golpe de Estado que associasse o imperador e o povo contra as classes
privilegiadas. Mas a maior parte, dando prioridade à crise externa, punha as suas
esperanças nas forças armadas; estas foram desempenhando um papel cada vez
mais importante, a partir das primeiras operações de guerra com a China;
apoiada por sociedades secretas, nas quais havia muitos oficiais novos -
assassinavam os políticos que não lhes convinham - e pelos antigos combatentes
organizados militar e espiritualmente, a atuação dos militares foi eliminando os
partidos políticos, a influência, dos intelectuais corrompidos pelo Ocidente e os
venenos do liberalismo e do marxismo (com o desemprego e a subida dos
preços, foram-se formando sindicatos e nasceram agrupamentos socialistas e
comunistas).
Pode falar-se em ditadura na medida em que toda a oposição foi aniquilada,
mas foi a ditadura de um grupo social, não a de um homem. Embora se fosse
implantando a pouco e pouco, a partir de 1940, um totalitarismo que instituiu um
sindicato único e um partido único, a integração da economia no esforço de
guerra, a supressão completa das liberdades, o certo é que a «revolução fascista»
não foi efetuada por um partido político novo, mas sim por um escol tradicional.
As massas foram afastadas do liberalismo e da democracia, para serem
submetidas a uma burocracia uniformizante e agitadas pela mobilização. O
fascismo japonês entrou em acordo, desta maneira, com as forças sociais
existentes; e submeteu-as ao seu domínio - até ao movimento do Mikado em
agosto de 1945. Mas não conseguiu organizar uma direção política unificada
para travar e ganhar a guerra de conquista - e muitos insucessos foram devidos a
rivalidades e má coordenação entre exército e marinha.
O fascismo sul-americano
A existência de minorias italianas e alemãs deu origem ao aparecimento de
algum grupúsculos fascistas ligados à mãe-pátria. Em especial na América do
Sul e Central, existia uma tradição de «caudilhismo» e pronunciamentos - quer
dizer, ditaduras de chefes militares, mais ou menos efémeras, instituídas a partir
de golpes de Estado. Do ponto de vista econômico, as riquezas nacionais
consistem na produção e exportação de matérias-primas e produtos primários,
umas e outros sujeitos às variações dos preços do mercado mundial e às
correspondentes crises de sobreprodução; mas, em virtude do corte com a
Europa depois de 1939, nasceu uma tendência para a industrialização que foi
alimentada com capitais norte-americanos e ficou quase sempre na dependência
deste. Socialmente, a casta dirigente tinha todo o poder político, às vezes com
uma aparência de jogo democrático; mas, como no Japão, os oficiais subalternos
do exército, vindos da pequena burguesia, irritam-se frequentemente com a
miséria do povo, a exploração das riquezas por uma oligarquia, a presença
dominante dos norte-americanos; desta maneira, o exército desempenha o papel
de parlamento; é no exército que os grupos de famílias se encontram frente a
frente. Mas a grande maioria da população, em especial os índios e em menor
grau os negros, mantêm-se passivos e indiferentes às lutas que os brancos travam
entre si - salvo no México, a partir de Juarez, e, mais recententemente, na
Bolívia e no Peru.
No Brasil, em 1932, Salgado lançou a «ação integralista brasileira», que se
inspirava no fascismo italiano e buscava os seus aderentes entre os pequenos
comerciantes, os funcionários de média categoria, os oficiais subalternos; era um
partido de juventude, que combatia ao mesmo tempo o comunismo, o
capitalismo yankee, o «pretenso» liberalismo e os Judeus. Com a milícia, o culto
do chefe, a organização hierarquizada, o movimento fascista brasileiro
reproduzia o fascismo europeu; mas, ao mesmo tempo, talvez em virtude da
influência de Salazar, Salgado rejeitava o totalitarismo; é certo que pretendia
anular os regionalismos e as classes sociais, libertar o Brasil da ingerência dos
yankees e tornar o seu país um campeão de uma nova ordem sul-americana. Mas
era também profundamente religioso, e afirmava, não sem se contradizer, que
era necessário respeitar a pessoa humana. Salgado não chegou ao poder, mas foi
nele que se inspirou o presidente Vargas, eleito em 1930, embora o combatesse;
assim, o presidente Vargas suprimiu os partidos políticos, proibiu as eleições,
conferiu à polícia poderes excessivos e procurou industrializar o Brasil enquanto
afirmava a sua independência nacional. Ao mesmo tempo, para combater mais
eficientemente o comunismo, que começava a surgir, o presidente Vargas
instituiu o seguro social, o dia de trabalho de oito horas, o contrato de trabalho;
criou assim uma clientela fiel na população pobre dos arrabaldes das grandes
cidades, mas causou com isto uma grande inquietação nas classes dirigentes
tradicionais; nasceu assim o «getulismo», bastante parecido com o bonapartismo
do Segundo Império. Em política externa, Vargas começou por ser a favor das
potências do Eixo, antes de colocar o Brasil ao lado dos Aliados - como Salazar.
Os oficiais superiores derrubaram-no em 1945, exprimindo a hostilidade da
oligarquia brasileira.
Na Argentina, o «peronismo» ou «justicialismo» pareceu-se com o
«getulianismo» brasileiro. O coronel Perón pretendeu fazer o desenvolvimento
industrial sob a direção do Governo e quis dar uma grande amplitude ao
movimento sindical, mas também sob a direção do Estado. Colocado no poder
por eleições, nas quais teve 56 % dos votos, nacionalizou os caminhos-de-ferro e
a fabricação de armas; elaborou uma legislação operária. Ajudado pela mulher,
Eva, que se dedicou a obras de assistência aos humildes, Perón, transformou-se
no homem providencial, não da classe média, como Hitler na Alemanha, mas
sim dos operários e camponeses pobres (os descamisados), enquadrados numa
forte e dócil Confederação Geral do Trabalho. Fundiu os partidos políticos e
exerceu um poder pessoal, policial, caracterizado por demagogia verbal mas
populista. Teve contra ele os intelectuais, que consideravam insuficientes as
liberdades, a burguesia dos grandes proprietários e o corpo de oficiais superiores
do exército, que se opunham às reformas sociais; uma vez unidas, estas forças
hostis derrubaram Perón. O justicialismo pode ser considerado fascismo
demagógico de esquerda {110}.
África: nasserismo e «apartheid»
Pode usar-se a mesma expressão quando se fala do nasserismo no Egito. O
coronel Nasser, oriundo da pequena burguesia, reuniu à sua volta camaradas que,
como ele, se sentiam feridos no seu orgulho nacional e no seu sentimento de
justiça, para derrubar, em 1952, o regime corrupto do rei Faruk. No sistema
autoritário que instituiu, o chefe de Estado tem todos os poderes: os partidos e as
assembleias, legislativas foram suprimidas, as empresas jornalísticas foram
nacionalizadas e colocadas sob direção governamental, criou-se um partido
único, a «União Nacional». Ao mesmo tempo, promoveram-se reformas
econômicas e sociais importantes, como a divisão dos latifúndios, grandes obras
públicas (barragem do Nilo), a planificação da economia. Em muitos aspectos,
esta ditadura lembra a da Mustafá Kemal; também se inspira no nazismo por
anti-semitismo, que aqui se tornou anti-sionismo (Nasser fazia parte do grupo de
egípcios que tiveram contacto com Rommel quando este se aproximou de
Alexandria, e muitos nazis refugiaram-se no Egito depois da guerra) {111}. Mas
difere muito do paganismo nazi e do laicismo de Kemal, pela sua defesa
intransigente dos valores do islão; a mística que anima a ditadura de Nasser é
nacional e racial, não há dúvida, mas ainda é mais religiosa do que outra coisa
qualquer. Desta maneira, o juramento que Nasser pede à multidão que preste:
«Oh Deus, tu amas os fortes, tu detestas os fracos», está de harmonia com o
estilo guerreiro do Corão. É verdade que Nasser combate o movimento
extremista religioso dos Irmãos Muçulmanos, tal como combate os comunistas e
os agentes americanos. A sua doutrina não é exportável para fora do mundo
árabe, mas ultrapasse o Egito e dirige-se a todos os países árabes - o nasserismo
(como os regimes de predominância «baasista» do Iraque e da Síria, ou a
ditadura de Khadafi na Líbia), conduz naturalmente a um pan-arabismo
agressivo, multinacional.
No outro extremo, desenvolveu-se um racismo com fundamento religioso na
África do Sul, entre os Africânderes. Fundou-se a partir a partir de 1912 muitas
seitas político-religiosas, inspiradas na Bíblia, as quais proclamavam que o povo
africânder, resultante da emigração de protestantes holandeses e franceses, era
um povo eleito e predestinado para dominar as raças inferiores {112}. Estas
seitas infiltraram-se profundamente no poder político, e alguns dirigentes
políticos foram seus membros; o seu ponto comum principal é a vontade de
manter o poder dos brancos numa região onde estão em minoria junto de uma
grande massa de negros, vontade que se exprime na prática rigorosa duma
segregação denominada «apartheid»; os negros são confinados a trabalhos
servis, regressam aos seus bairros depois de trabalharem nas casas dos brancos,
são privados de direitos cívicos, não podem ter propriedade privada e só
aproveitam alguns restos da prosperidade econômica do país.
Este racismo declara-se nacional, pela vontade de acabar com o estatuto de
Domínio na Comunidade Britânica {113} e pela afirmação de uma língua «que
não é europeia nem africana», o africânder. Mas nestes movimentos não há chefe
miraculoso nem partido único; não há demagogia socializante que se exalte, nem
anticapitalismo preconizado por princípio. No entanto, a existência de uma forte
minoria alemã facilitou os laços com o nacional-socialismo hitleriano e o
aparecimento de anti-semitismo, que se tornou especialmente virulento quando
no país procuraram refúgio alguns judeus fugidos da Alemanha. A crise
econômica dos anos trinta não teve reflexos no país e as classes médias de modo
nenhum se sentiam em situação perigosa, as tensões produzidas pela
industrialização não surgiam entre classes, mas sim entre raças, pois quase todos
os operários eram negros. O fascismo africânder, como o nasserismo, associou-
se intimamente com uma situação dada num certo país; mas tinha vocação para
também ultrapassar este enquadramento restrito e se afirmar num pan-
europeismo inimigo dos nacionalismos negros; pelo menos podia ser um bastião
da raça branca, como colonizadora.
Fascismo e capitalismo
A assimilação das duas forças não foi sempre completa. Os socialistas, Blum
em primeiro lugar, raciocinando com base no fascismo italiano, entendiam que o
fascismo só podia prosperar em países atrasados, de economia rural, e estava
condenado de antemão nas nações industrializadas onde a classe operária se
encontrava bem organizada, política e sindicalmente. Daí resultaram os erros de
previsão quanto às probabilidades de êxito de Hitler, e a profecia da queda dos
efetivos nazis depois da semiderrota, eleitoral de 1933.
Os comunistas - Os comunistas alemães em primeiro lugar - viram no
fascismo uma forma radicalizada do domínio burguês; as suas raízes
mergulhavam na democracia liberal, condenada em bloco; os sociais-
democratas, que preconizavam uma transformação progressiva da sociedade
burguesa, eram pura e simplesmente sociais-fascistas traidores - outro erro de
visão, na prática mais grave que o precedente, porque tornou impossível a
formação de um bloco social-comunista, a única possibilidade, como vimos, de
impedir o acesso dos nazis ao poder; em França, o acordo concretizou-se na
Frente Popular, e a tentativa de golpe de 6 de Fevereiro de 1934 gorou-se à
nascença.
Hoje, há uma enorme literatura histórica, em geral de origem comunista ou
comunizante, que vê no fascismo uma forma de determinismo econômico, um
aspecto necessário do imperialismo econômico. Na origem desta ideia está uma
afirmação de Estaline, em 1935, ao dizer que «o fascismo era a ditadura
terrorista declarada do capital financeiro». Radek acrescentava que «a ditadura
fascista era o aro de ferro com o qual a burguesia procura consolidar o barril
desconjuntado do capitalismo». Uma definição mais completa foi dada por
Dimitrov no VII Congresso da Internacional Comunista, ainda em 1935: «O
fascismo é uma ditadura terrorista declarada (as mesmas palavras de Estaline)
dos elementos mais reacionários, mais calvinistas, mais imperialistas do capital
financeiro» - definição que põe em destaque não só a economia como também o
nacionalismo agressivo do fascismo; quando a U. R. S. S., nessa altura, se sentiu
diretamente ameaçada, o partido comunista Soviético começou a fazer
ressuscitar o patriotismo russo e a preparar alianças no exterior, com grupos
políticos ou Estados impressionados com o perigo nazi. Mais tarde,
concretizaram-se melhor as ligações entre capitalismo e fascismo. O primeiro
engendra o segundo quando atinge «a fase da concentração monopolista e do
imperialismo», isto é, quando o capital industrial e o capital financeiro se
fundem e se formaram os grandes trustes que se lançaram à conquista dos
mercados internacionais.
O escritor Daniel Guérin levou mais adiante a análise da pressão capitalista
sobre o fascismo {117}. Põe em causa a indústria pesada, que em grande parte
vive de encomendas de armamentos e se pronuncia, portanto, a favor de uma
política de prestígio, força militar e imperialismo. A vontade de poder explica-se
pela dimensão das empresas. Por outro lado, o volume enorme dos investimentos
obriga os grandes industriais a mostrarem-se muito rigorosos em matéria de
salários, e a serem autoritários e duros para com os seus operários. Pelo
contrário, a indústria ligeira, interessada na exportação, prefere a paz social e
uma política, de contratação, em vez da maneira, forte; mas nada faz para
impedir que o fascismo vença {118}.
Esta tendência aceita, portanto, a inevitabilidade do advento do fascismo na
perspectiva histórica da evolução do capitalismo {119}; também ignora todos os
acidentes de percurso nos quais o fascismo poderia ter tropeçado, e até se ter
desmembrado; dá uma importância mínima à ação dos homens - como Mussolini
e Hitler - cujo papel pessoal se afigura, no entanto, fundamental. Em certa
medida, esta tendência contribuiu para que se cometessem erros de táctica entre
os antifascistas, designadamente na Alemanha, porque os comunistas, ao
considerarem o fascismo como uma última reação de um nacionalismo com a
corda na garganta, podiam inferir daí que o fascismo, pela sua própria existência,
podia contribuir para a inevitável decrepitude do capitalismo {120}; ao fim e ao
cabo, o fascismo era menos perigoso que as democracias liberais, onde o
capitalismo existia e atuava à vontade; a tempestade era preferível às águas
mansas. Foi talvez este o cálculo feito por Estaline quando assinou o pacto de
não agressão com Hitler.
A assimilação entre o fascismo e o capitalismo tem o mérito de pôr em
destaque uma constante: os grupos fascistas não podem atingir o poder sem o
auxílio multiforme das classes dirigentes, e mais particularmente dos industriais;
depois disso, ficam na classe de devedores destes e acabam por colocar-se às
suas ordens - embora esta afirmação não seja válida quanto ao «nasserismo» e ao
«prónismo». Tem também a vantagem, para aqueles que a aceitam, de eliminar
qualquer assimilação e até qualquer comparação entre fascismo e bolchevismo;
finalmente, é tão boa para a luta que os comunistas travam, que não pode passar
sem um acrescento de propaganda. Mas, na realidade, as objecções que se lhe
podem fazer não são de somenos.
Em primeiro lugar, falar de «capitalismo monopolista» é talvez lançar um
bom estribilho de propaganda, mas com certeza que é ser inexato. Nenhuma
economia de nenhum pais «capitalista» está submetida a um monopólio
absoluto. A burguesia capitalista não é homogênea; afora circunstâncias
excepcionais, em que pode formar bloco, está dividida em grupos rivais cujos
interesses nem sempre se conciliam, e até por vezes se opõem {121}. Por outro
lado, se o fascismo é uma manifestação necessária do capitalismo, como se
explica que nunca se tenha desenvolvido - ainda que aí tenha lançado à terra
algumas sementes - nas cidadelas do capitalismo que são a Inglaterra, e, ainda
mais do que esta, os Estados Unidos? Como se explica que a crise mundial dos
anos trinta tenha dado origem ao fascismo na Europa, e não na América, onde a
crise começou e teve a amplitude máxima? {122}. A contrário, apareceram
variantes do fascismo, talvez semifascismos mas com origens no tronco comum
e alimentados com a mesma seiva, em países que ainda se encontravam
subdesenvolvidos, onde a classe dirigente era constituída por proprietários
fundiários, e não por capitalistas industriais e financeiros - Hungria, Romênia,
Argentina, Espanha, etc. Na Itália e mais ainda na Alemanha, onde a classe
dirigente era com certeza muito diferente, o fascismo surgiu quando esta classe,
longe de triunfar, estava na defensiva. Mantém-se, portanto, uma dúvida: quando
soa a hora do fascismo? Quando o capitalismo pede socorro, ou quando triunfa
num «monopólio imperialista»?
Algumas observações
Parece-nos, portanto, que o fascismo é um complexo histórico diversificado
e variável demais para poder ser reduzido a um fenômeno moral, um
nacionalismo total e pervertido ou a conclusão, preferimos limitar-nos a alguma
observações a respeito do advento do fascismo, seu conteúdo humano, objetivos
e métodos.
A primeira observação é que o fascismo nasceu no contexto duma crise
europeia de gravidade excepcional e sem precedente: uma guerra mundial que
alterou o equilíbrio de forças, com graves consequências demográficas e
econômicas, que provocou azedumes e rancores, mobilizou uma massa de
manobra - os antigos combatentes - à disposição dos agitadores; uma crise
política e moral, que prejudicou o funcionamento das instituições democráticas e
as desacreditou; finalmente, uma crise econômica e mundial que proletarizou
uns, roubou trabalho e esperança a outros e pôs em perigo o poder dos dirigentes
políticos e econômicos. Uma conjunção como esta, como é evidente, tem poucas
probabilidades de se reproduzir. Mas a evolução geral da sociedade capitalista dá
origem, com a sociedade de massas, a uma inquietação que podem provocar
tanto a desordem como o recurso a uma autoridade tranquilizadora.
Segunda observação: o fascismo é um fenômeno interclasses. É verdade que
exprime principalmente as apreensões das classes médias; mas, conforme vimos,
só chegou ao poder com o apoio das classes dirigentes e só se manteve no poder
com uma aprovação popular bastante ampla - quer esta tenha sido espontânea ou
forçada. Conviria acrescentar a isto mais uma dimensão: a adesão de alguns
intelectuais {123} (Heidegger, Yeats, T. S. Eliott, Ezra Pound, Pirandello,
Richard Strauss, Konrad Lorenz, Celine, Drieu La Rochelle, etc.). O fascismo
exprime, portanto, uma certa globalidade nacional, e a necessidade de a ele
recorrer poderia sentir-se de novo se as circunstâncias a isso fossem
propícias. Bardèche vai ao ponto de afirmar: «Todo o homem sinceramente
patriota tem dentro de si a semente do fascismo.» {124}
O fascismo é o irmão inimigo do bolchevismo; os elementos que o fascismo
toma do bolchevismo, utiliza-os para o combater; Hitler, no Judeu, quis rachar
de meio a meio o criador do bolchevismo. O objectivo primordial do fascismo,
ainda que não seja o primeiro no tempo, é destruir o comunismo. Lenine
predisse: o fascismo é a última forma que tomarão, para sobreviver, as
sociedades que não capitularem sem luta perante a ditadura comunista. O recurso
à ditadura fascista pode ser, portanto, a última defesa duma sociedade que não
acredita ter outra alternativa para a ditadura do proletariado.
Finalmente, os métodos do fascismo criaram escola; reabilitaram a violência,
e nunca o extermínio dos adversários - reais ou supostos - assumiu tão grandes
proporções como no último conflito mundial. É verdade que a violência é de
todos os tempos; é verdade que, teoricamente, não há razão para que a violência
seja apanágio privilegiado do fascismo. Mas é um facto que o nazismo, com os
internamentos arbitrários, as rusgas, as torturas, os campos de concentração, o
genocídio dos Judeus e dos Ciganos, deu à violência a sua maior dimensão e de
uma maneira muitas vezes gratuita. Ora, para melhor o combater, os seus
adversários tiveram de adotar os métodos do próprio fascismo - o
bombardeamento de Dresde em abril de 1945, a bomba atômica de Hiroshima
também são genocídios. O mundo entrou na era da violência, que se tomou o
modo de expressão até daqueles que se proclamam antifascistas - e é talvez por
isso que daqui por diante cada um será sempre o fascista de outro.
Convém acrescentar que o fascismo perverteu alguns valores morais
tradicionais - ordem, patriotismo, disciplina, solidariedade de grupo, autoridade.
Não é estranho à rejeição destes valores por grande parte da juventude do
mundo. Mas, por outro lado, uma frouxidão excessiva, uma sociedade
demasiado permissiva, multiplicando as desordens, desenvolvendo um
sentimento de insegurança, criando a convicção duma decadência, poderiam
fazer nascer uma certa saudade duma autoridade perdida - sobretudo se um mal-
estar econômico (inflação, desemprego) aumentasse as dificuldades de vida do
dia-a-dia, suscitando preocupação quanto ao futuro. O fascismo poderia
reaparecer então como remédio para uma doença crônica das democracias; o
recurso à autoridade seria a resposta ao excesso de liberdade, e os chefes
poderiam voltar a recrutar os seus soldados entre aqueles que perdem com a
civilização tecnológica - viu-se isso em França com o fogo passageiro do
pujadismo. {125}
Em resumo, parece-nos que o fascismo é uma força política em grande, parte
original e nova, que voltou a pôr em questão o conceito do homem e da
sociedade do século XIX, sem abalar as estruturas desta. Desenvolveu-se em
virtude de circunstâncias excepcionais entre as duas guerras; mas a sua derrota
não o fez desaparecer por completo, e, talvez mudando de pele, esta fênix falsa
pode muito bem renascer das cinzas {126}.
NOTAS DE RODAPÉ
I. QUE É O FASCISMO?
{1} Vem de «feixe»: reunião das espingardas no repouso, ou: atributo do
lictor na Roma antiga.
{2} Com excepção talvez de Nietzsche, cuja obra Hitler se gabava de ter
devorado, mas a propósito da qual o ditador alemão acumulava manifestações de
ignorância nas conversas que tinha com os seus íntimos; quando o Führer quis
oferecer um presente bonito ao seu amigo Mussolini, mandou-lhe as obras
completas de Nietzsche.
{3} Mas o fascismo também se desenvolveu em países que não tinham
tomado parte na guerra, que não tinham antigos combatentes (na América do
Sul, por exemplo).
{4} Cf. a nossa Seconde guerre mondiale, t. I, p. 275 e sgs.
{5} É isto que diferencia o fascismo das ditaduras militares, que exercem o
poder com o apoio dos quadros dirigentes e são impopulares.
{6} Para não falar dos aristocratas alemães que entraram para a SS, como o
príncipe de Hohenlohe, agente de Himmler na Suíça.
{7} Elemente und Ursprünge totalitarer Herrschft, Frankfurt, 1965.
{8} Segundo Ribbentrop, os nazis antigos sentiam grande surpresa quando
descobriam que tinham semelhanças com os antigos bolcheviques.
{9} Cf. a nossa Seconde guerre mondiale, t. I, p. 228-230.
{10} Alguns dos atributos de Estaline: guia imortal da Humanidade, pai dos
povos, a nossa luz, o gigante do pensamento e da ação, o maior titã de todos os
tempos, a águia da montanha e da revolução, etc.
{11} Edições Richelieu, 1973, pp. 87-109.
{12} Falta-nos espaço para apurar porquê o fascismo não triunfou em toda a
parte; falhou em especial nos países anglo-saxões; mais exatamente, nesses
países apenas se manifestou em grupúsculos insignificantes; sucedeu a mesma
coisa em França. As causas deste insucesso, são várias: antiguidade, solidez e
bom funcionamento das instituições democráticas (Estados Unidos, Inglaterra e
Domínios), ou oposição eficaz dos partidos políticos proletários (Frente Popular
em França, mas a explicação perde validade após a derrota de 1940). Também se
pode observar que as nações protestantes foram terreno mais estéril que as
católicas (pode até falar-se num fascismo clerical na Áustria, Croácia, Espanha,
Portugal).
III. O NACIONAL-SOCIALISMO
{32} Claude David, Hitler et le nazisme,PUF, 1969; René Alleau, Hitler et
les sociétés sécrètes, Grasset, 1969.
{33} Mosse, The crisis of German ideology, Intellectual origins of the third
Reich, New York, 1964.
{34} E. Vermeil, «As Ideias de Meinecke sobre as Origens da Catástrofe»,
Revue d’histoire de la deuxième guerre mondiale, Outubro de 1951.
{35} A. Kruck, Geschichte des Alldeutschen Verbandes, Wiesbaden, 1954.
{36} G. Castellan, «Forças de Oposição ao Advento do II Reich», Revue
d’histoire de la deuxième guerre mondiale, Outubro de 1959; Bracher ete., Die
nazionalsozialistische Machtergreifung, Colonia, 1960.
{37} W. Gorlitz, H. Quint, Adolf Hitler, eine biographie, Stuttgart, 1952;
Max Dornarus, Hitler, reden und proklamationen, Warzburgo, 1962; W. C.
Langer, The mind of Adolf Hitler, New York, 1972; E. Jaeckel, Hitler
idéologue, Calmann-Lévy, 1973.
{38} Baldur von Schirach, nas Suas Memórias, escreveu que «só pode haver
Hitler num povo que deseja e quer ter um Hitler».
{39} W. Schaefer, NSDAP, Frankfurt, 1958.
{40} J. Sigmann, Qu’est-ce-qu’un nazi?, Friburgo, 1948.
{41} G. Castellan, op. cit.
{42} D. Orlow, The history of the nazi party, Pittsburg, 1973.
{43} D. Orlow escreve: «A história do partido nazi constitui a lenda de
revolucionários destruídos pela lógica incoerente dos seus próprios valores.»
{44} R. ManwelI, EI. Fraenkel, Hermann Goering, Londres, Heinemann,
1962.
{45} Id., Goebbels, ibid, 1960.
{46} H. R. Trevor-Ropper, The Borman letters, Londres, 1954; J. Wulf,
Martin Bormann, Hifiers-Schatten, Güterhsloh, 1962.
{47} E. Vermeil, «Himmler», Revue d’histoire de la deuxième guerre
mondiale, Janeiro de 1955; é mais difícil de avaliar a influência, que de facto
existiu, de Otto Meissner, na Chancelaria presidencial, que Hitler manteve, e de
Lammers, na Chancelaria do Reich, que pretendeu ser um superministro.
{48} Dr. E. Neusüss-Hunkel, Die SS, Hannover e Frankfurt, 1956; G.
Reitlinger, The SS, alibi of a nation, Londres, 1956.
{49} J. Billig, L’hitlérisme et te système concentrationnaire, Paris, PUP,
1967.
{50} C. W. Sydnor, «A Divisão SS Totenkopf», in Revue d`histoire de la
deuxième guerre mondiale, Abril de 1975.
{51} E.N. Peterson, The limits of Hitler power, Princeton, 1969.
{52} M. Brozsat, Der Staat Hitlers, Munique, 1969
{53} De 31 gauleiters, 8 não quiseram sobreviver a Hitler.
{54} Op. cit.
{55} L’ordre noir, histoire de la SS, Castermann, 1968.
{56} David Schoenbaum, Hitler’s social class and status in nazi Germany,
New York, 1967.
{57} H. J. Winkler,. Legenden um Hitler, Berlim, 1961.
{58} H. E. Kannapin, Wirtschaft unter Zwang, Colonia, 1966; G. Badia,
Histoire de l'Allemagne contemporaine, Edições Sociais, t. II, 1962.
{59} Até então a fórmula do juramento era: «Servir o povo e a pátria»;
passou a ser: «Jurar obediência absoluta a Adolfo Hitler.»
{60} G. Buchheit, Soldatentum und rebellion, Rastatt-Baden, 1961; T.
Taylor, Sword and Swastika, Nova Iorque, 1952.
{61} G. Zahn, German catholics and Hitler’s war, Londres, 1963; Th.
Wurm, Erinnerungen aus meinen Leben, Estugarda, 1953.
{62} E. K. Bramstead, Goebbels and national-socialist propaganda,
Imprensa da Universidade do Estado de Michigan, 1965.
{63} Oron. J. Hale, The captive press in the third Reich, Princeton, 1964; Z.
A. B. Zennan, Nazi propaganda, Londres, 1965.
{64} R. E. Herzstein, «Hitler e o Mito Histórico pelo Filme», in Revue
d’histoire de la deuxième guerre mondiale, Janeiro de 1976.
{65} D. Strothman, Nationalsozialistisch Literatur, Bonn, 1968.
{66} H. Brenner, Die Kuntspolitik des National Sozialismus, Hamburgo,
1963.
{67} Nationalpolitische Erziehungsanstalten.
{68} W. Klose, Generation im Gleichschritt, Hamburgo, 1964. Na verdade,
a crença nazi no imobilismo das raças contraria a teoria darwiniana da evolução.
{69} D. Bracher, Die Deutsche díktatur-Entstechung Struktur, Folgen des
nationalsozialismus, Colonia, 1972.
{70} O. Wormser, Le système concentrationnaire nazi, PUF 1968.
{71} E. Presseisen, «O Racismo e os Japoneses», Revue d’histoire de la
deuxième guerre mondiale, Julho de 1963.
{72} K. Jonca, «Nas Origens Jurídicas da Grande Alemanha», Revue
d’histoire de la deuxième guerre mondiale, Outubro de 1974.
{73} K. Hildebrandt, O Programa de Hitler, ibid., Outubro de 1971; Norman
Rich, Hitler’s war aims: ideology, the nazi state and the cause of expansion,
Nova Iorque, Norton, 1973.
{74} Cf. Bardèche, op. cit., pp. 52-53. «O fanatismo tornado princípio de
salvação», dizia Thomas Mann, «com o entusiasmo a degenerar em êxtase
epiléptico, a política transformada em estupefaciente para as massas.»
I - ESTUDOS GERAIS
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S. Y. Woolf, The nature of fascism, Nova Iorque, 1969.
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