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Perícia Psicológica em Vara de

Família: Estudo de Casos


Introdução

Definições Iniciais
O Perito
Definições Legais Iniciais
De acordo com o CPC o Perito é um Auxiliar da Justiça:

“Art. 156. O juiz será assistido por perito quando a prova do fato
depender de conhecimento técnico ou científico.”
Principais Características e Funções do Perito
➢Conhecimento técnico e Científico
➢Imparcialidade
➢É o profissional da confiança do Juiz
➢Realiza um estudo que resulta num Laudo que servirá de prova nos
autos, chamada de prova pericial.
O Lugar do Psicólogo Perito e os Limites da Perícia
Psicológica.
➢No caso do estudo psicológico, o psicólogo irá através de
técnicas e instrumentos reconhecidos pela psicologia levar ao
conhecimento do juízo as particularidades da dinâmica familiar
que levaram ao litígio, bem como explicitar aspectos psicológicos
das partes envolvidas que se mostram importantes e pertinentes
para o entendimento e tentativa de resolução do litígio.
A imparcialidade do Perito:
Importância, Cuidados e Limites
➢A obrigatoriedade da imparcialidade do Perito deriva do fato dele
figurar como um auxiliar da justiça.
➢Assim sob o ponto de vista legal, a imparcialidade é importante para que
o trabalho pericial não seja influenciado por interesses pessoais,
financeiros, morais ou ideológicos do perito, o que certamente poderia
induzir o juízo a erro.
A imparcialidade do Perito:
Importância, Cuidados e Limites
➢Do ponto de vista psicológico, a manutenção da imparcialidade é
essencial para que a perícia não ocupe o lugar de legitimização dos
argumentos dos litigantes aprofundando o conflito familiar.
➢A imparcialidade é importante como instrumento para compensar a
ausência de importantes requisitos do atendimento psicológico tradicional
(demanda, procura espontânea e sigilo).
Perícia Psicológica: Um Estudo de Vínculo
➢Não se restringe à existência ou não de vínculo
➢Intensidade
➢Qualidade
➢A análise da Intensidade e Qualidade do vínculo dos pais com a criança e vice-versa
permite uma percepção mais segura acerca da medida legal que melhor se adequa às
necessidades da criança.
➢Dessa forma, ainda que outros aspectos do caso possam se mostrar desfavoráveis,
inclusive no âmbito legal, sob o ponto de vista psicológico, a vinculação da criança com
uma das partes pode se configurar como determinante para a conclusão do laudo
pericial e do parecer técnico sobre a guarda.
Outros Aspectos a Serem Abordados
➢Motivação
➢Visa entender o que motiva o pedido de quem entrou com o processo
(requerente) e o que motiva a negação desse pedido por parte de quem é
alvo do processo (requerido)
➢Histórico da Relação
➢Através do histórico da relação dos envolvidos no litígio judicial podemos
encontrar elementos que foram determinantes para o presente litígio
possibilitando um melhor entendimento do que realmente motiva as
pessoas envolvidas no processo.
➢Além disso, podemos encontrar padrões de comportamento conscientes e
inconscientes que são determinantes para a análise do caso.
Modulo I

Do casal conjugal ao casal parental: a transição


necessária e a difícil discriminação entre o desejo dos
adultos e as necessidades dos filhos.
➢Em grande parte dos estudos periciais psicológicos em Varas de Família
é comum perceber a existência de sentimentos negativos , mágoas e
dificuldades em lidar com o fim da relação em função do término do
relacionamento amoroso e/ou durante os rearranjos familiares após esse
término.
➢Assim é importante entender que tais dificuldade e a existência desses
sentimentos devem ser encarados com naturalidade e não com pré-
julgamentos e juízos de valor.
➢É necessário estar atento ao fato de que, durante um processo de disputa
judicial pela guarda ou visitação de crianças, a defesa que os genitores
procuram fazer em relação aos direitos e bem-estar dos filhos,
invariavelmente traz resquícios daquelas dificuldades, ressentimentos e
mágoas
➢É essencial portanto estar atento e observar se os sentimentos e
dificuldades pessoais dos genitores não se sobrepõem às reais
necessidades do filhos.
➢Muitas vezes a real motivação do litígio entre os genitores não
está ligada a uma forma dos pais protegerem os interesses do
filhos, e sim de se utilizarem da condição de mãe ou pai para,
apoiando-se na ideia de obrigação parental em “fazer de tudo pelo
filho”, justificar uma busca, às vezes patológica, por satisfazer
desejos diversos, tais como vingança, autoafirmação, ou mesmo
sexuais etc.
➢Nesse sentido é importante observar se a justiça, mediante a
interposição de processos judiciais diversos nas Varas de Família, não
está sendo utilizada como uma forma de estender o vínculo entre o
casal parental que efetivamente não consegue deixar de se ver como
casal conjugal.
➢Em tais casos cabe à perícia avaliar a capacidade ou não dos
envolvidos em preservarem seus papéis e deveres na relação conjugal
diferenciando-os dos papéis que desempenharam e das falhas que
eventualmente cometeram na relação conjugal.
Caso 1
Divórcio com Disputa de Guarda

Requerente: Genitora, Fabiana, 41 anos.


Requerido: Genitor, Pedro, 46 anos.
Crianças: Daniel, 13 anos e Diego, 10 anos.
BREVE RESUMO PROCESSUAL
➢A requerente entrou com o pedido de divórcio requerendo, entre outras coisas,
a guarda unilateral dos filhos. Alegou que após 17 anos de casamento já não
existia mais amor entre o casal daí a necessidade do divórcio.
➢O requerido contestou o pedido de guarda dos filhos alegando que a
requerente era violenta física e verbalmente com os filhos. Acusa a requerente de
traí-lo durante o final do matrimônio e de não se importar com ele ou com os
filhos.
➢Não houve desacordos com relação à divisão de bens.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Refere longo relacionamento de 28 anos, sendo 10 de
namoro/noivado e 28 de casamento.
➢Início da relação ambos muito novos, ela com 14 e ele com 19
anos.
➢Relação na maior parte do tempo harmoniosa, mas acredita que
a harmonia da relação se dava em função dela sempre concordar
com Pedro, que nunca gostou de ser contrariado.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Apesar do caráter machista da relação, refere que sempre foram muito
apaixonados e que durante todo o tempo em que estiveram juntos praticamente
não houve brigas.
➢Em relação aos filhos também destaca que ela e Pedro sempre se entenderam
bem nos papéis de pai e mãe e que não havia atritos ou diferenças significativas
na forma como criavam os filhos.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Sobre a separação, refere que nos últimos dois anos de casamento passou a se
sentir ao mesmo tempo descontente com sua vida conjugal e em dúvida sobre se
gostaria de manter o casamento. Explica que passou a se dar conta que tinha
passado toda a sua adolescência e juventude em função de uma única pessoa e
naquele momento já não sabia se estava casada por amor ou comodidade.
➢Dessa forma relata que ao longo dos dois últimos anos de casamento foi
amadurecendo a ideia do divórcio.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢O pedido de divórcio aconteceu, segundo conta, de forma muito amadurecida e
quando comunicou sua decisão estava muito segura dela. A reação de Pedro contudo
foi a pior possível.
➢Comenta que Pedro fez um grande e escândalo, não aceitou sua decisão, e passou a
procurar motivos para a separação, desde desconfiança de traição até problemas
espirituais tentando fazê-la acreditar que ela estava com algum “encosto”.
➢Lembra que ao contar para os filhos, o pai novamente reagiu da pior forma possível e
passou a gritar na frente dos filhos e dizer para eles que a mãe estava acabando com a
família.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Após quatro meses de Pedro sair de casa, encontrou em alguns pontos de sua
casa e carro escutas plantadas pelo requerido.
➢Sentiu-se invadida com a situação e denunciou Pedro conseguindo uma
medida protetiva pela vara da violência doméstica e familiar contra a mulher,
➢A partir daí conta que os meninos passaram a se mostrar rebeldes e agressivos
com ela, acusando-a de destruir a família e largar o pai sozinho sofrendo.
➢Diante da pressão dos filhos para que reatasse a relação, decidiu permanecer
firme em sua decisão e admite que pode ter passado aos meninos uma
impressão de frieza com relação ao sofrimento deles.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Os atritos dentro de casa aumentaram e, de sua parte, considerava que o
genitor usava os filhos, principalmente o mais velho, para pressionar seu
retorno.
➢Ao mesmo tempo o filho mais velho passou a exigir morar com o pai. Ao final,
diante da insustentabilidade da situação dentro de casa acabou por permitir a
ida dos filhos.
➢Após a ida dos filhos para a casa do pai, as visitas passaram a acontecer de
forma tranquila e a relação com os meninos melhorou.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Contudo afirma que os filhos vêm da casa do pai instruídos a saber de sua
vida pessoal para passar informações para Pedro, principalmente se ela tem
algum relacionamento.
➢Também percebe que Daniel muitas vezes se mostra provocativo dizendo
frases como: “você acabou com a família”, “você não liga para a gente”, “eu sei
mais sobre você do que você imagina”.
➢Quanto a Diego, percebe que o filho não pode demonstrar seus reais
sentimentos para com ela devido à pressão psicológica do genitor.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Traz o mesmo relato da requerente sobre o histórico da relação.
➢Destaca ainda apenas o descontentamento de sua mãe que tinha reservas
em relação à mãe de Fabiana que, dizia, traía o marido.
➢Lembra a pressão da mãe para deixar a relação, que frequentemente
perguntava a ele se ele gostaria de ser o próximo traído da família.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Conta que a separação foi decisão de Fabiana e o pegou de surpresa, afirma
que passou mal e foi levado ao hospital.
➢Com o pedido de separação refere uma transformação da esposa que se tornou
fria e insensível.
“aquela mulher se tornou um animal, fazia de tudo para me deixar mal”.
➢Afirma que a Fabiana fazia tudo para lhe deixar mal , referindo-se ao fato
dela não atender aos seus pedidos de retorno.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Fala sobre inicialmente desconfiar de traição, depois pensou em
problemas como possessão espiritual e refere que a esposa lhe
traiu até na religião ao abandonar o culto evangélico e procurar
cultos de matriz africana.
➢Após sair de casa passou a ouvir queixas dos filhos sobre maus-
tratos da mãe o que o obrigou a pedir a guarda dos filhos.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Embora nos autos houvesse a argumentação que o requerido
contratou um detetive para plantar escutas na casa da requerente
para produzir provas dos maus tratos aos filhos, ao longo da
entrevista o genitor é explícito ao dizer que plantou escutas e
contratou detetive para provar que ela o traía.
➢Conta que conseguiu gravar sons de Fabiana com outro homem,
negro e nordestino, e faz comentário racistas e preconceituosos para
explicar como sabia que se tratava que o suposto amante era negro e
nordestino mesmo com a escuta não incluindo imagens.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Revolta-se com a medida protetiva conseguida pela genitora
argumentando que o imóvel também era dele o que, na sua
opinião descaracterizaria a invasão de privacidade.
➢Faz vários comentários depreciativos sobre a Lei Maria da
Penha e o movimento feminista, visivelmente procurando algum
tipo de aliança ou camaradagem entre homens com o perito.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Refere que os filhos percebem que a mãe trocou a família por uma
aventura e conta que o filho mais velho já desconfiou que a mãe tinha
um namorado tendo ouvido dele que se a mãe arranjasse alguém não
olharia mais para ela. Termina essa parte do relato, com indisfarçado
orgulho, dizendo que “sabe como é homem né, mesmo criança já é
assim”.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Durante a entrevista repete inúmeras vezes:
➢ Que perdeu 11 quilos com a separação,
➢Que em 27 anos de casamento nunca traiu Fabiana,
➢“Como uma pessoa que dizia me amar me abandona de uma hora para outra sem
nenhum aviso”
➢“Eu fui tratado como um papel amassado que se joga fora”,
➢Que a ex-mulher jogou a família no lixo,
➢Que nos dois anos desde a separação não tinha tido relações sexuais com ninguém.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DOS IRMÃOS
➢Antes do início das entrevistas com os meninos o genitor, na
presença de Daniel e Diego, pressiona o perito a abordar
determinados assuntos com os meninos, principalmente sobre
existência ou não de agressão dele para com a requerente.
➢Ao aumentar a insistência argumenta que tal procedimento o
ajudaria no processo da violência doméstica.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DOS IRMÃOS
➢Daniel e Diego referem que a relação entre os pais estava boa porque
eles sequer se falavam, então não brigavam mais.
➢Sobre a separação, confirmam:
➢Reação descontrolada do genitor
➢Acusação do pai, e concordância com ela, de que a culpa pela
separação da família era da mãe
➢Que o genitor foi largado e sofre enquanto a mãe “fica de boa”
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DOS IRMÃOS
➢Confirmam também que sempre que a mãe impunha algum
limite financeiro aos seus desejos de consumo eles culpavam a
decisão da mãe em se separar pela queda no poder aquisitivo da
família.
➢Expressam que não permitem que nem o pai nem a mãe
tenham outro relacionamento.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DOS IRMÃOS
➢Afirmam que o pai não tem ninguém, mas que a mãe esconde que namora.
➢Daniel revela que sabe que a mãe traiu o pai porque o genitor o chamou
para ouvir uma gravação em que a genitora se declara para outro homem e
fala mal do pai.
➢Confirma que a escuta não se deu ocasional e fortuitamente, mas como uma
atitude intencional do genitor.
➢Afirmam que a mãe não mostra interesse sobre se o pai tem ou não
namorada, mas que o pai pede para que eles descubram se a mãe tem outro
relacionamento.
Principais Aspectos do Caso
➢Relacionamento afetivo do casal bastante longo (27 anos).
➢Casamento tradicional, com forte estruturação machista.
➢Harmonia baseada na divisão rígida de papéis com o marido
mantendo a casa e a esposa submissa.
➢Término súbito da relação seguido da revolta e indignação do marido.
Principais Aspectos do Caso
➢A revolta se dá pelo término inesperado da relação, pela mudança repentina de
postura da esposa que passa a contrariar sua vontade e claramente pela
sensação de impotência frente à postura firme da mulher em levar a cabo o
divórcio. A forma como se refere à esposa como um “animal” demonstra a
percepção da postura da esposa em manter sua vontade como algo não
civilizado, que foge às regras.
➢A indignação se dá pela descoberta súbita de não ser mais amado, a ferida
narcísica e o sentimento de abandono se refletem na postura de vitimização (o
papel amassado, os 11 quilos perdidos).
Principais Aspectos do Caso
➢Logo, revolta e indignação encontram uma via catártica pronta na suposta defesa dos
interesses dos filhos. Pedro procura assumir a figura do pai de família injustiçado e
humilhado pela insensibilidade da mulher num claro movimento de:
➢ disfarçar a dor pelo término do divórcio,
➢a mágoa pela certeza da traição e,
➢o inconformismo com a insubordinação da mulher que não cede mais às suas vontades.
➢O resultado do movimento de Pedro é uma total indiscriminação entre suas questões
pessoais de homem e marido com seu papel de pai.
➢Os filhos são vistos como companheiros de bar com quem o marido traído chora suas
mágoas, e com quem pode tecer comentários depreciativos sobre o mundo feminino.
Principais Aspectos do Caso
➢Na relação com o pai pós separação, Daniel e Diego têm suas condições de
filhos negadas, não apenas porque são tratados pelo pai como companheiros de
masculinidade, mas também porque têm a imagem da mãe descontruída e
substituída pela da mulher ingrata e insensível que trai o marido e destrói a
família.
➢Daniel e Diego também têm suas condições e criança negadas no conflito
familiar, já que são levados a se considerarem responsáveis tanto por exercer o
papel de confortar o pai, quanto pelo papel de punir o comportamento da mãe.
Principais Aspectos do Caso
➢O comportamento do pai leva os filhos a um duplo engodo:
➢O de passarem a considerar que o divórcio representa o término da família,
quando na realidade representa apenas uma rearranjo nas relações
familiares.
➢E o de serem impedidos de perceber que imposição da manutenção do
casamento a qualquer custo é o real fator da ruína familiar que
experimentam, porquanto sobrepõe as frustrações e mágoas pessoais de
Pedro como homem divorciado, sobre seus deveres de pai como parte
integrante do “indivorciável” casal parental.
O PAPEL DA PERÍCIA
➢Desconstruir o discurso do genitor de estar agindo na intenção de proteger os
filhos e revelar sua real motivação :
➢Angariar comiseração dos filhos e demais familiares para com sua situação de marido
traído e pai dedicado e,
➢Vingar-se da ex-mulher através de ataques a sua imagem como alguém que destruiu
a família e traiu a confiança do marido.
➢Evidenciar que a suposta postura protetiva do genitor, resulta, no que tange as
crianças, em intenso sofrimento e prejuízo psicoafetivo, porquanto baseada na
danificação da imagem materna o que gera dor, revolta e insegurança.
O PAPEL DA PERÍCIA
➢Apontar que aos danos causados na imagem materna,
correspondem sérios danos á própria experiência de Daniel e
Diego como filhos, já que deixam de enxergar a mãe sob ótica de
filhos, e são levados a vê-la e julga-la sob a ótica do pai, ou seja,
simplesmente com uma adúltera.
Módulo 2

Violência Contra a Mulher e a Lei Maria da Penha nas


Disputas pela Guarda e Visitação de Crianças
Lei Maria da Penha
➢Criada exclusivamente para os casos de violência contra a mulher que
ocorrem o contexto doméstico e familiar.
➢Cria instrumentos jurídicos de proteção à vítima e punição ao agressor que
visam compensar a fragilização da mulher no contexto doméstico e familiar.
➢Tipifica como crimes atos de violência que anteriormente sequer eram
considerados como violência.
➢Cria mecanismos de proteção (medidas protetivas)
➢Cria procedimentos que visam a agilização do andamento processual
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢A principal dificuldade de lidar com a violência doméstica em perícias
de vara de família na disputa pela guarda ou visitação de crianças e
adolescentes está na necessidade de lidar com a dupla condição da
mulher que é agredida no âmbito da lei Maria da Penha, a saber:
➢ como mulher vítima de violência doméstica e de gênero e,
➢como mãe com deveres e responsabilidades em relação aos filhos.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢A rigor muitas vezes a dificuldade em lidar com essa duplicidade já
está presente nos próprios processos nas Varas de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher. Por exemplo temos os casos em que a mulher
vítima da violência em função da dependência que criou do agressor ou
da relação, resiste em deixar o relacionamento abusivo deixando de
cumprir com seu dever de mãe em proteger os filhos que são igualmente
vítimas, tanto do agressor, quanto do caráter abusivo da relação que a
mãe não consegue superar.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Nas Varas de Família, contudo, essa dificuldade também se dá de outra
forma, quando há a instrumentalização da condição de vítima como
forma de impedimento do contato entre pai e filhos, ou à extensão da
condição de vítima da mãe aos filhos.
➢Em ambas as situações retomamos o tema da necessidade de
discernimento entre os papéis e acontecimentos relativos à relação
conjugal e os deveres inerentes à relação parental.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Além disso é necessário perceber como tais figuras são vistas pelos
principais interessados: os filhos.
➢Um dos principais desafios é lidar com as limitações de contato entre o
agressor e a vítima e procurar viabilizar o contato entre pai e filhos.
➢É comum que a medida protetiva conseguida pela vítima, dificulte a
efetivação de visitas, ou mesmo que num primeiro momento as próprias
visitas do pai aos filhos restem impedidas no processo de violência
doméstica até serem avaliadas pelo juízo da vara de família.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢O trabalho pericial em primeiro lugar deve se abster de entrar no
mérito do processo ocorrido ou ainda em andamento na vara de
violência doméstica, muito menos questionar as decisões e juízos sobre a
ocorrência ou não de violência doméstica entre os casal.
➢Isso significa dizer que caso a genitora tenha tido sua condição de
vítima de violência doméstica reconhecida, essa condição deve ser
respeitada e não deve ser relativizada, muito menos ignorada
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Contudo é dever da perícia avaliar a relação dentre pai e filhos a fim de
observar se as crianças efetivamente também foram vítimas da violência
do pai para com a mãe, seja direta, seja indiretamente
➢Também é necessário avaliar se os prejuízos causados aos filhos não
estão ligados exclusivamente ao agressor mas à exposição das crianças à
RELAÇÃO CONJUGAL ABUSIVA como um todo.
➢É essencial entender que a RELAÇÃO ABUSIVA não se resume às
agressões que nela ocorrem.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Nas agressões, sejam elas psicológicas, físicas, morais etc, só há
um responsável que é o agressor.
➢Já uma relação que suporta agressões e violências reiteradas,
torna-se abusiva não apenas pela soma dos episódios violentos,
mas principalmente pela manutenção dessa violência como
aspecto estruturante da relação afetiva.
➢Assim, na manutenção da relação abusiva, inevitavelmente há
sempre no mínimo dois responsáveis, agressor e vítima.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Nos casos em que a genitora foi beneficiada por uma medida protetiva
que impede o contato com o genitor, cabe à perícia psicológica em
primeiro lugar observar, inclusive com ajuda do estudo pericial social, se
o contextos socioeconômico e familiar da vítima torna a medida um
meio protetivo eficiente.
➢Se não, a perícia deve considerar que um regime de visitação pode ser
utilizados pelo genitor-agressor para perpetuar sua condição de
agressor, e medidas devem ser sugeridas para preservar mãe e filhos.
Entre a Condição de Vítima e os Deveres de Mãe
➢Se sim, é importante observar a postura da genitora frente a sua
condição de vítima e diante disso:
➢Avaliar sua capacidade de utilizar o respaldo que teve do Estado para
efetivamente se proteger, cortar relações com o agressor e finalmente superar
a relação abusiva preservando os vínculos existentes entre pai e filhos,
➢Observar qualquer tendência da genitora em se utilizar do respaldo do
estado para impedir sem justificativa o contato entre pai e filhos, como forma
de se vingar ou se autoafirmar diante do agressor,
➢Levar em consideração a existência de um quadro pós-traumático que
impeça a genitora de diferenciar a natureza abusiva da relação entre ela e o
agressor da real qualidade do vínculo formado entre pai e filhos.
Caso 2
Divórcio com Disputa de Guarda

Processo: Guarda de Menor


Requerente: Genitor, Fábio, 35 anos.
Requerida: Genitora, Glaucia, 30 anos.
Crianças: Fabiano, 9 anos e Luciano, 7 anos.
BREVE RESUMO PROCESSUAL
➢O requerente entrou com pedido de divórcio requerendo entre outras coisas a
guarda unilateral dos filhos. Argumenta que a genitora nunca teve condições de
cuidar dos filhos e que após a separação do casal os filhos permaneceram
morando com ele.
➢A genitora contestou dizendo que sempre foi a principal responsável pelos
cuidados diretos com os filhos e que os mesmos sempre moraram com ela,
inclusive naquele momento processual. Argumenta ainda que os meninos
visitam o genitor em finais de semana alternados.
➢Por fim refere que a relação acabou devido às agressões, ofensas e ameaças
recorrentes do requerente.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Conta que se conheceram ocasionalmente há 13 anos, na época ele já era
policial e ela estava no ensino médio.
➢Refere um namoro muito rápido, sendo que em seis meses já estavam morando
juntos. A concepção de Fabiano aconteceu logo depois.
➢Refere que a relação com Glaucia sempre foi muito tumultuada por conta do
ciúme dela que considera patológico. O ciúme, segundo conta, era intensificado
em função de seu trabalho exigir plantões o que o fazia passar algumas noites
fora de casa.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Nega qualquer agressão à requerida e admite que no máximo a segurou algumas
vezes para não ser agredido por ela nas crises de ciúmes.
➢Durante a relação conta que houve duas outras separações de cerca de 3 a 4 meses
de duração. Conta que tais separações ocorreram por pedido dele após discussões
mais a agudas. As voltas se deram por que ela insistia muito e ele acabava cedendo.
➢Refere que sempre foi um bom marido e um bom pai porque nunca deixou faltar
nada dentro de casa para a esposa ou para os filhos. Por outro lado reclama que
Glaucia não cuidava bem nem da casa nem dele como esposo.
➢Ao falar sobre o período pós-separação acaba sem perceber admitindo que os filhos
sempre ficaram com a mãe e nunca moraram com ele.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Sobre os filhos também diz que a esposa nunca cuidou adequadamente do filhos e
diz se preocupar com os meninos após a separação.
➢Acusa a genitora e os pais dela de submeterem as crianças a condições de moradia
insalubres e negligência por parte dos avós maternos.
➢Logo depois se contradiz e fala que a mãe e as crianças estão morando em um casa
na zona leste paga por ele, que também sustenta os filhos.
➢Conta que tem condições de exercer a guarda dos filhos pois trabalha em um
esquema de 12x36 mas apenas de segunda a sexta. Justifica o esquema incomum de
trabalho dizendo que é motorista de oficiais de alta patente e por isso tem privilégios.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢A requerida confirma o relato do requerente quanto ao início da relação. Contudo
traz que desde o início o relacionamento foi marcado por uma postura muito rude,
verbalmente agressiva e emocionalmente fria de Fábio. Logo após passarem a morar
juntos essa atitude evoluiu para constantes agressões físicas.
➢Ao mesmo tempo diz que era completamente apaixonada por Fábio que foi seu
primeiro namorado e seu primeiro homem.
➢Descreve uma série de agressões físicas que perduraram por toda a relação,
incluindo períodos de gravidez e pós-separação. Também refere que quase sempre as
agressões aconteciam na frente dos filhos. Por fim refere ameaças recorrentes que
Fábio fazia apontando-lhe arma de fogo.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Confirma que antes da separação “definitiva” houve duas outras separações em que
saiu de casa por causa de agressões mais graves. Sobre os retornos, refere que se
deixava levar pelos pedidos de desculpas, arrependimentos e promessas de melhoras
por parte de Fábio.
➢Sobre os momentos de mais descontrole de Fábio, comenta que as agressões se
davam quando ela demonstrava ciúmes dele e em situações variadas e
desimportantes como a falta de talher na mesa na hora em que ele ia comer.
➢Admite que tinha muito ciúmes pois após as duas gravidez seu corpo mudou muito
ele deixou de procura-la sexualmente. Com o tempo percebeu que ele tinha amantes
e quando o cobrava, era agredida.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢A separação definitiva aconteceu após uma discussão em que Fábio ficou muito
descontrolado sacou a arma e atirou no chão perto do pé dela. Os filhos estavam
presentes e ficaram em pânico. Os pais de Fábio então ligaram para o pai dela e
pediram que ele viesse busca-la senão ela morreria.
➢Após a separação, refere uma série de mudanças. Primeiro foi morar como os
pais, onde permaneceu por quase um ano. Saiu de lá porque sempre que Fábio
ia buscar o filho fazia muita confusão e como sua mãe estava lutando contra um
câncer achou que aquele estresse não fazia bem para ela.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Saiu de lá aceitando proposta de Fábio de alugar uma casa perto da casa dos
pais dele. Glaucia conta que como Fábio pagava todas as contas da casa sentia
que tinha direitos de controla-la.
➢Voltaram a ter relações sexuais mas Fábio não queria reassumir a relação, por
isso acabou voltando para casa dos pais.
➢Meses depois os pais entenderam sua necessidade de privacidade e passaram a
ajuda-la a alugar uma casa perto da casa de sua irmã. Dessa forma consegue
trabalhar e voltar a estudar sem deixar os filhos desassistidos.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DAS CRIANÇAS
➢Fabiano e Luciano confirmaram em grande parte o relato da mãe e
desmentiram uma série de fatos trazidos pelo pai. Destaque também para o fato
dos filhos em muitas ocasiões trazerem fatos que a mãe procurou omitir.
➢Trazem um relato vivo e detalhado sobre as diversas vezes em que o pai agrediu
a mãe, inclusive após a separação.
➢Constrangidos também referem que o pai quando os busca para visitas chama
a genitora de “vadia”, “vagabunda”, “piranha”.
➢Contam que ficam com dó da mãe, que gostariam de protege-la, mas que
“como a gente ainda é pequeno, a gente fica mais é no canto chorando mesmo”.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DAS CRIANÇAS
➢Referem que o pai bate na mãe “por qualquer bobagem” e refere que o pai
acha que a mãe tem que ser “tipo uma empregada dele e da casa”.
➢Confirmam que certa vez o pai sacou sua arma e atirou no chão “para não
atirar na minha mãe”, e que depois disso saíram de casa e não voltaram
mais.
➢Contam que sempre que vão visitar o pai ficam a maior parte do tempo
com os avós paternos pois o pai trabalha a maior parte do final de semana.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DAS CRIANÇAS
➢Quando visitam o pai preferem ficar com os avós porque quando o pai chega
“começa com aquelas conversas” e descrevem forte pressão psicológica do pai
para com eles para que escolham morar com ele.
➢Contam que nem sempre querem ir com o pai para as visitas, mas que o pai os
obriga e que a própria mãe pede para eles concordarem com tudo o que pai
falar para que não seja pior.
➢Falam muito bem da casa dos avós maternos, dos cuidados que recebiam lá e
demonstram vontade de voltarem a morar com eles.
PRINCIPAIS ASPECTOS DO CASO
➢O casal viveu durante toda a relação, mesmo após a separação, em situação de
violência doméstica havendo na fala das crianças e da genitora a presença de
todas as fases da violência cíclica.
➢Há em Glaucia uma clara dependência de Fábio e resta claro um desejo ainda
forte em retomar a relação.
➢Fábio por sua vez se mostra extremamente infantilizado tanto cognitiva
quanto emocionalmente. Cognitivamente mostra-se muito limitado inventando
mentiras pueris para ludibriar a perícia, porém facilmente descobertas.
Emocionalmente não demonstra qualquer controle e quando contrariado ou
frustrado reage de forma violenta tal como uma criança de 2 anos de idade.
PRINCIPAIS ASPECTOS DO CASO
➢Não há dúvidas da condição de vítima de violência doméstica de Gláucia. Como
mulher ela claramente precisa de ajuda para romper o ciclo de violência e superar a
dependência que tem de Fábio. Nesse sentido não ser julgada e encontrar apoio
familiar e profissional são momentos essenciais para esse processo de superação da
violência doméstica.
➢Entretanto no estudo da família, do ponto de vista do interesse dos filhos, Gláucia,
em seu papel de mãe, inevitavelmente aparece como parte responsável na
manutenção de uma dinâmica familiar altamente tóxica para Fabiano e Luciano.
➢Crianças carregam consigo inevitavelmente a condição de dependência dos pais e
quanto mais jovens mais vulneráveis estão às escolhas dos genitores.
PRINCIPAIS ASPECTOS DO CASO
➢No caso em questão, portanto, Fabiano e Luciano se tornaram reféns da relação
patológica dos pais. Pela tenra idade não têm como escaparem dessa situação
sem que pelo menos um dos genitores tome a decisão de por um fim na relação.
➢Nesse sentido, considerando que Fábio faz da violência física e psicológica sua
forma de se relacionar e submeter aqueles que dele dependem, cabe à mãe a
decisão de por um fim na relação e proteger os filhos.
➢Infelizmente a dependência que Glaucia desenvolveu de Fábio como mulher
claramente se sobrepõe ao dever de proteção de Glaucia para com os filhos como
mãe.
O PAPEL DA PERÍCIA
➢Explicitar ao juízo a dinâmica familiar violenta, explicando o caráter de
dependência de Glaucia em relação à Fábio e o alto grau de periculosidade do
requerente mediante a explicação de que o genitor tem a idade emocional de
uma criança de três anos, mas num corpo adulto e com direito a porte de arma.
➢Explicar a dependência de Glaucia no contexto da violência doméstica e
familiar contra a mulher sob uma situação de violência cíclica. Essa tarefa deve
ser feita de modo a, ao mesmo tempo em que explicitamos a necessidade de não
julgá-la como vítima, destacar sua responsabilidade como mãe de proteger os
filhos da dinâmica tóxica do casal parental.
O PAPEL DA PERÍCIA

➢Sugerir uma sensível limitação ao contato entre pai e filhos tanto na


frequência quanto na duração das visitas, como forma alternativa de
proteger as crianças, caso a condição de dependência da genitora
inviabilize a proteção da família através da intervenção do Estado
mediante a aplicação da Lei Maria da Penha.
Caso 3
Divórcio com Disputa de Guarda

Processo: Guarda de Menor


Requerente: Genitor, Maurício, 33 anos.
Requerida: Genitora, Bianca, 33 anos.
Crianças: Ana 2 anos e 3 meses.
BREVE RESUMO PROCESSUAL
➢O requerente entrou com o pedido de guarda compartilhada e
regulamentação de visitas alegando que após a separação do casal a
genitora subitamente passou a impedir o contato dele com a filha.
Argumenta ainda que a mudança de atitude da genitora se deu a partir
do momento em que a requerida soube que ele iniciou um novo
relacionamento.
➢Liminarmente foi determinado regime de visitação provisório do pai à
filha.
BREVE RESUMO PROCESSUAL
➢A requerida contestou o decisão entrando com agravo de instrumento em
segunda instância alegando que o genitor era instável emocionalmente,
tinha ideações suicidas e já havia ameaçado se matar com os filhos
causando um acidente de carro.
➢As visitas foram suspensas.
➢Em audiência de tentativa de conciliação foi determinado regime
provisório de visitas no Centro de Visitação Assistida do Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo (CEVAT).
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Conheceram-se em um movimento político e refere uma forte identificação em
relação a visões de mundo e ideologias.
➢Relação muito rápida e intensa, sendo que em um mês já estavam grávidos.
➢A convivência enquanto casal contudo sempre foi muito atribulada.
➢Os problemas segundo conta começaram se dar em função da dificuldade de
convivência de Bianca com seus filhos mais velhos, Matheus e Denis, gêmeos de
9 anos de idade.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Explica que os meninos são fruto de seu primeiro relacionamento quando ainda
morava no interior e que após o término da relação sempre manteve o contato com
os filhos através de visitas. Assim, quando iniciou o relacionamento com Bianca disse
ter deixado claro a ela que o contato com os filhos era prioridade para ele.
➢Contudo refere que logo Bianca começou a se mostrar muito ciumenta em relação
ao contato entre ele e os filhos. Conta que ela reclamava da presença deles na casa do
casal nos finais de semana de visitas e mais tarde quando deixou de trazer os filhos
para visita-los na cidade deles, passou a reclamar da ausência dele nos finais de
semana.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Após o nascimento de Ana, refere que a situação piorou, Bianca teve início de
depressão pós-parto e a situação com os meninos ficou mais complicada.
Comenta que Bianca passou a reclamar dos gastos que ele tinha para se
deslocar entre São Paulo e a cidade em que eles moravam e que tais gastos
faziam falta na manutenção da casa.
➢As brigas e discussões aumentaram e breves separações ocorreram. Em uma
delas Bianca chamou a polícia. Maurício nega que alguma vez tenha agredido
fisicamente Bianca, mas admite que gritava muito e muitas vezes quebrava
coisas dentro de casa.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Acusa a genitora de assediar e manipular pessoas do convívio do casal para
formar provas contra ele.
➢Refere, como exemplo que a mãe de seus filhos mais velhos e sua atual chefe ao
saberem que suas falas foram deturpadas juntaram declarações dizendo terem
sido manipuladas por Bianca.
➢Sua ex-chefe também juntou em sua declaração, afirmação de que foi
chantageada por Bianca.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Após ter saído de casa, ambos continuaram se relacionamento normalmente, e
dividiam os cuidados com Ana chegando a, de acordo com Maurício, dormir
com a menina várias vezes na casa de Bianca enquanto ela dava aulas a noite.
➢O contato com a filha passou ser impedido logo após Bianca ficar sabendo do
seu novo relacionamento.
➢A requerida passou a argumentar que ele tinha problemas psicológicos, que
apresentava ideações suicidas e misturava álcool e remédios controlados.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Refere que o contato é impedido no plano físico, mas também no plano da
comunicação remota, por telefone, email ou aplicativo de celular todos eles
proibidos pela medida protetiva.
➢Afirma que tenta manter contato com Bianca através de sua atual
companheira, mas que Bianca constantemente o acusa de estar escrevendo no
lugar da companheira e o ameaça denunciar por descumprimento da medida.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Confirma o relato de Maurício sobre o início rápido e apaixonado da relação.
➢ Esforça-se contudo para destacar a inteligência do requerente e sua eloquência
e questiona a capacidade da perícia em conseguir avalia-lo de forma eficiente
sem a utilização de um teste de Rorschach, cujo pedido fora negado pelo juízo.
➢Refere que após as primeiras semanas de paixão, Maurício foi se mostrando
abusivo psicologicamente, referindo que sempre que discutiam ele acabava a
convencendo a fazer o que ele queria.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Refere que Maurício foi se mostrando também cada vez mais agressivo e
sempre que contrariado batia na mesa ou em outros móveis e quebrava objetos
da casa.
➢Ao mesmo tempo refere que ele não a ajudava com Ana. Mais tarde contradisse
sua fala deixando claro que dava aulas a noite e que o genitor ficava com a filha
nesses períodos.
➢Refere que Maurício não cuidava dos filhos mais velhos e não ficava com eles
nos finais de semana em que os trazia para São Paulo deixando-os apenas sob
responsabilidade dela.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Confirma que essa situação gerava muitas discussões entre ambos e que houve
algumas breves separações.
➢Conta que entrou com o pedido de separação de corpos por conta do
comportamento abusivo de Maurício, mas num primeiro momento não
procurou fazer queixa.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Sobre a relação com Maurício após a separação, Bianca se mostra muito
ambígua e vaga. Ora dizia que não havia mais nenhuma relação, ora o acusava
de ser falso ao fazer juras de amor a ela enquanto iniciava um novo
relacionamento com outra pessoa. Também se mostra indignada com o fato de
Maurício ter engravidado sua nova companheira dois meses após o início do
relacionamento, repetindo a história que teve com ela.
➢Conta que resolveu entrar com a queixa de violência doméstica após se
conscientizar que estava reproduzindo o papel de vítima submissa que
pesquisara em sua dissertação de doutorado.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Refere que após ter conseguido a medida protetiva, Maurício tenta de todas as
formas descumpri-la. Faz referências a tentativas de contato por email, à
insistência dele em querer saber sobre as consultas médicas de Ana e de querer
visitar a filha na escola.
➢Por fim argumenta que não pode permitir que a filha tenha contato com um
pai que é um agressor de mulheres. Refere que toda a família dele sempre
priorizou as crianças homens em detrimento das mulheres e que a experiência
dele com os gêmeos não pode ser levada em consideração porque além do pai
não cuidar direito dos meninos nas visitas, eles eram homens e sua filha mulher.
Outras Informações Obtidas
➢A mãe dos filhos mais velhos de Maurício, confirmou que o pai sempre
conviveu com os filhos, antes e durante a separação. Referiu que no
momento atual as crianças estavam passando mais tempo com o pai, na
casa da companheira dele, do que com ela em função dela ter voltado a
estudar. Finaliza dizendo que, como pai, não tem queixas do requerido.
➢Refere que Maurício de fato sempre reagiu mal quando ficava
descontrolado, que sempre foi de gritar e bater em móveis e paredes, mas
que na relação com ela nunca a agrediu embora ela já o tenha agredido
algumas vezes durante a relação.
Outras Informações Obtidas
➢Por fim refere que quando Maurício se separou de Bianca seus filhos lhe
disseram que eram muito maltratados pela madrasta e descreveram uma série
de situações constrangedoras e de séria violência psicológica dela para com eles.
Também confirmou que Bianca tentou manipula-la.
➢Disse que ela e Bianca sempre tiveram uma relação muito ruim, mas após
separar-se de Maurício, Bianca lhe ligou sendo amável, fazendo-lhe elogios
estendendo uma conversa telefônica por mais de duas horas tentando fazê-la
falar mal de Maurício para juntar no processo.
Outras Informações Obtidas
➢Os gêmeos contam que o período que o pai morou com Bianca foi “um
pesadelo” e fazem referências a Bianca ter transformado o pai em outra pessoa
“tipo como se meu pai fosse um computador e a Bianca fosse um vírus que
entrou no meu pai e fez ele funcionar de um jeito muito ruim”.
➢ Mostrando espontaneidade, fazem críticas duras ao pai por não terem
percebido o quanto Bianca fazia mal a todos. Comparam a situação do pai com
a antiga madrasta com a situação com a atual madrasta a quem fazem ótimas
referências dizendo serem tratados com carinho e atenção.
➢Comentam ao final que a madrasta foi “o antivírus que limpou meu pai”.
PRINCIPAIS ASPECTO DO CASO
➢O casal ao longo de 18 meses desenvolveu uma relação bastante intensa e com
claros aspectos abusivos.
➢As trocas de emails e mensagens entre ambos mostram claramente uma
relação impulsiva e extremamente volátil, com longas declarações viscerais de
amor seguidas, às vezes após minutos, de ofensas graves e palavras de baixo
calão de ambas as partes.
➢A relação homem mulher claramente foi marcada por situações de violência
doméstica. Embora haja momentos em que Bianca se mostre também bastante
agressiva, é claro que Maurício comete violência física e verbal nos termos do que
diz a Lei Maria da Penha.
PRINCIPAIS ASPECTO DO CASO
• Dessa forma Bianca foi devidamente respaldada quando recorreu à justiça e
conseguiu a medida protetiva. Importante deixar claro que aqui o Estado apoiou
Bianca a por fim a um relação afetiva abusiva e patológica auxiliando-a a seguir em
frente sem a presença do agressor.
• Contudo, a partir do momento em que a Bianca obtém a medida protetiva, ela não é
usada como um meio de superar a relação que teve com Maurício, e sim como um
meio de continuar a relação, mas dessa vez invertendo a balança de poder a seu
favor.
• A utilização da medida como meio de submeter o ex-companheiro já estava claro
quando Bianca decide entrar com a queixa somente após saber que Maurício e sua
companheira haviam engravidado.
PRINCIPAIS ASPECTO DO CASO
➢A todo momento Bianca usa a medida protetiva como um meio para impedir o contato
entre pai e filha. Tanto a visão da requerida como seu discurso são impregnados por
sua experiência conjugal
➢A filha de 2 anos e 3 meses é vista como uma possível vítima do pai simplesmente por
ser mulher.
➢O uso da medida protetiva como forma de dar continuidade à relação, obriga Bianca
também a dar continuidade à sua condição de vítima.
➢A mera reflexão sobre a necessidade de discriminação entre sua situação de vítima de
violência doméstica e suas responsabilidades e escolhas como mãe de Ana, faz com que
Bianca se indigne e acuse o perito, por ser homem, de confraternizar com o agressor e
revitimizá-la.
PAPEL DA PERÍCIA
➢Explanar ao juízo a relação patológica desenvolvida pelo casal e a importância
da atuação do Estado, através do juízo da vara da violência doméstica e familiar
contra a mulher, no sentido de intervir no caso e ajudar a vítima a por um fim
numa relação abusiva entre ambos.
➢Destacar contudo que o fim da relação conjugal, apesar de desejável não
significa o fim do casal parental e que enquanto tal, ambos são responsáveis
pelas escolhas que fizeram e que Ana é a mais importante das consequências
dessas escolhas, o que não pode ser ignorado por nenhuma das partes.
PAPEL DA PERÍCIA
➢Apontar o uso por parte genitora da sua condição de vítima de violência
doméstica para impedir o contato entre pai e filho.
➢Lembrar ao juiz que a requerida tem recursos internos para se proteger, tanto é
que recorreu com êxito ao Estado e também demonstrou ter recursos internos
para manipular pessoas de modo a convencê-las a ajuda-las no processo,
conforme provas inequívocas nos autos.
➢Ressaltar que a postura de agressor doméstico de Maurício nesse caso não o
impede de ser pai de Ana, assim como ninguém julga a capacidade de Bianca
em ser mãe de Ana apesar dela cometer seríssima violência doméstica com os
filhos de Maurício.
PAPEL DA PERÍCIA
➢Por fim apontar que a quebra de confiança entre as partes demanda a procura
por psicoterapia por ambos os genitores e contratação de Acompanhante
Terapêutico para a reaproximação entre pai e filha.
➢A participação do AT não visa a proteção da filha em relação ao pai, mas a
proteção da própria relação entre pai e filha de modo a ajudar a mãe a entender
a importância desse contato e evitar novas acusações por parte da genitora.
Módulo 3
Alienação Parental
➢ A Síndrome da Alienação Parental: Críticas e Limites
➢ Conceito de Alienação Parental
➢ Aspectos Empíricos da Investigação de Casos de Alienação
Parental
A Síndrome da Alienação Parental

Proposto Inicialmente pelo psiquiatra Norte Americano


Richard A. Gardner o termo surgiu da experiência clínica do
autor com crianças e adultos que teriam sido vítimas de um
tipo específico de impedimento ao contato com um dos
genitores, frequentemente o genitor não guardião.
A Síndrome da Alienação Parental
Com o termo Síndrome da Alienação Parental Gardner propõe a existência
de um conjunto de características que poderiam ser observados em crianças
que estariam sendo vítimas de alienação parental.
A ideia de uma síndrome, portanto, prevê a existência de que a criança
vítima seria portadora de sintomas específicos que indicariam a ocorrência
de Alienação Parental.
A partir de então temos o uso desses “sintomas” para avaliar e identificar a
ocorrência de Alienação Parental.
Síndrome de Alienação Parental
Críticas e Limites
➢Não reconhecimento em termos médicos/científicos da existência da
Síndrome
➢Falta de estudos que comprovem ou ao menos padronizem os “sintomas”
que caracterizariam a Síndrome
➢Mudanças constantes de Gardner sobre quais características deveriam
ser consideradas elementos indicativos da SAP
➢Utilização acrítica e generalizada da SAP para desacreditar denúncias de
abuso sexual contra crianças e adolescentes.
Definição de Alienação Parental
Trata-se de uma campanha que visa eliminar um dos genitores
(genitor alienado) da vida da criança. Essa campanha visa
denegrir a imagem do genitor alienado para a criança de modo
que a própria criança passe a sentir medo, rejeição e ódio do
genitor alienado, mediante implantação de falsas memórias,
distorção de fatos ocorridos, falsas ameaças atribuídas ao
genitor alienado etc.
Alienação Parental
Principais Características
➢Inicia-se com a decisão de um dos genitores de eliminar o
outro da vida criança
➢Implica necessariamente em um atitude consciente e
planejada do genitor alienante
➢A criança vítima realmente desenvolve sentimentos
negativos para com o genitor alienado.
➢ Não há encenação mas um medo e uma rejeição visceral
ao genitor alienado
Alienação Parental
Principais Características
➢Há uma coisificação da criança, que é manipulada como
instrumento (coisa) para o genitor alienante satisfazer sua
necessidade psíquica de atingir o genitor alienado
➢ O perfil do genitor alienante é o de um sujeito perverso
➢O vínculo com a criança é o de coisificação
➢O corte no contato com o genitor alienado se dá muitas
vezes no início do processo de alienação parental como
forma de criar condições propícias para a sua instalação.
O Fenômeno da Alienação Parental
➢O Conceito de Alienação Parental representa um
fenômeno bastante antigo.
➢Há uma correlação muito consistente entre as
características da Alienação Parental e casos periciados em
Vara de Família.
➢As característica da alienação estão fundamentadas em
aspectos presentes em diferentes tipos de violação de
direitos da criança e do adolescente independentemente de
se constituírem um litígio em Vara de Família.
Aspectos Empíricos da Investigação Pericial de Suspeitas
de Alienação Parental
Identificação
➢Não se restringir ao comportamentos da criança pois eles variam conforme as
estratégias utilizadas para o afastamento e a capacidade cognitiva do genitor
alienante.
➢Não se restringir às acusações feitas pelo genitor supostamente alienador, pois
tais, ainda que fantasiosas podem envolver problemas diversos, inclusive
psiquiátricos, que não se enquadram no perfil de genitor alienador.
➢Realizar um estudo que procure observar a existência de uma interação entre
três aspectos típicos da alienação:
Aspectos Empíricos da Investigação Pericial de Suspeitas
de Alienação Parental
➢Existência de impedimento ou criação de obstáculos ao contato entre a criança e
o genitor supostamente alienado sem justificativa consistente.
➢Existência de sentimentos de rejeição ou pavor da criança ao genitor
supostamente alienado sem que haja um correspondente no comportamento ou
na relação com esse genitor que justifique ou ao menos explique a postura da
criança.
➢Existência de um comportamento de manipulação psicológica consciente e
planejado do suposto genitor alienante junto à criança que vise ao impedimento
injustificado do contato entre essa criança e o genitor supostamente alienado.
O Estudo do Vínculo no Diagnóstico da Alienação
➢A ocorrência da alienação parental implica na maior parte das vezes na
existência de um genitor alienador perverso.
➢A perversidade se dá na coisificação da criança mediante sua manipulação
psicológica e utilização dela para satisfazer necessidades psíquicas do
alienador.
➢ Vingança, demonstração de poder e controle, manutenção de vínculo
simbiótico são algumas das motivações frequentemente observadas em tais
casos.
Diferença entre Alienação Instalada e Intenção Alienadora
➢ A alienação para acontecer não depende apenas da intenção alienadora, mas
também de um contexto propício para a sua instalação.
➢ Variáveis como o grau de afinidade entre criança e o genitor alvo da alienação
ou convivência intensa entre ambos podem impedir que seja instalada a
alienação.
➢ Mas em havendo uma intenção alienadora, a instalação da alienação pode se dar
no primeiro momento em que o contexto propício venha a surgir.
➢ Daí a importância de que a perícia não se esgote na procura de indícios de
alienação mas procure também observar situações que indiquem a existência de
um vínculo perverso com a criança.
Principais Fatores Influenciadores na instalação da
Alienação Parental
➢Resiliência da Criança a situação de manipulação psicológica
➢Capacidade do genitor alienado em permanecer e insistir no
contato com a criança
➢RAPIDEZ DA JUSTIÇA NO DIAGNÓSTICO DA ALIENAÇÃO E
CAPACIDADE DE PROTEÇÃO DO VÍNCULO ENTRE A CRIANÇA E
O GENITOR ALIENADO
Caso 4
Processo: Regulamentação de Visitas

Requerente: Genitor, Otávio, 42 anos.


Requerida: Genitora, Thaís, 26 anos.
Crianças: Otávio Jr. 6 anos
BREVE RESUMO PROCESSUAL
➢Genitor entrou com a ação solicitando a regulamentação das visitas ao filho
Otávio Jr. Alega que desde a separação vem encontrando dificuldades em visitar
o filho. Acusa a genitora de colocar a criança contra ele e denegrir sua imagem.
Pretende que as visitas sejam regulamentadas aos finais de semana alternados e
às quartas-feiras com retirada e devolução na escola.
➢A genitora contestou negando qualquer empecilho. Argumenta que o filho não
quer visitar o pai pois o genitor sempre foi violento com ele e com ela. Alega que
o filho tem pavor do genitor. Por outro lado acusa o genitor de utilizar o
processo como forma de assédio para que ela aceite diminuir o valor da pensão
que recebe.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢O requerente iniciou contanto que conheceu Thaís quando ela foi trabalhar em sua
empresa como estagiária. Refere que na época ela contava com 18 anos e ele com 34
anos. Lembra que inicialmente o relacionamento era estritamente profissional, mas
após pouco menos e um ano lembra que ficaram trabalhando até mais tarde e ela
então se declarou para ele.
➢Comenta que Thaís sempre foi muito bonita e além disso parecia meiga e ingênua.
Iniciaram então um namoro e seis meses depois engravidaram. Conta que a gravidez
não foi planejada e encara como um descuido de ambos. Além disso refere que na
época já tinha muita vontade de ter filhos. Assim quando soube da notícia ficou
muito contente.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Em relação à sua família, mãe e irmã, conta que houve certo temor em razão da
rapidez da relação e da diferença de idade.
➢Com a gravidez refere que foram morar juntos em um apartamento dele. A
partir de então, conta que o relacionamento passou a ser muito afetado por uma
intensa influência da mãe de Thaís. Tal influência se dava principalmente em
relação a gastos financeiros. Conta que Thaís passou a ter uma postura de
consumo compulsivo e que frequentemente dispendia altas quantias de
dinheiro com a mãe. Refere que perdeu a conta do número de dívidas que
pagou da sogra e de quantias que emprestou a ela.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Após dois anos de relacionamento, tentou colocar um limite na sogra, mas
então percebeu que Thaís passou a ser pressionada por ela e a relação acabou
ficando insuportável.
➢Quanto à Otávio Jr., conta que a criança tinha babá dia e noite e também aos
finais de semana. Lembra que algumas vezes propôs à Thaís que ambos
dispensassem a profissional aos finais de semana para que pudessem curtir o
filho, mas ela se mostrou terminantemente contra o acusando de querer
economizar dinheiro.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Após a separação, refere que passou a pagar uma pensão para o filho e outra
para a ex-esposa. Ao todo pagava as despesas com escola, uniforme e transporte
escolar do filho, plano de saúde de mãe e filho, financiamento do apartamento
da genitora, condomínio e tv a cabo acrescido de uma quantia mensal em
espécie a mãe e filho que totalizava R$12.000,00. Ainda assim conta que estava
sendo novamente processado pela genitora que cobra que ele pague despesas
com solas ortopédicas e tratamento para alergia de Otávio Jr.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Em relação ao filho, refere que já durante o processo de pensão começou a
notar que o menino passou apresentar resistência para visita-lo, contudo
quando estava consigo e com sua família acabava ficando bem.
➢A situação piorou quando a genitora passou a exigir uma babá. Como a
genitora não trabalhava e não estudava e o menino estava matriculado na escola
em período integral, considerou o pedido absurdo. Desde então o contato com o
filho piorou, sendo que Otávio Jr. passou a assumir uma postura muito mais
arredia para com o pai e a família paterna.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERENTE
➢Refere que o menino diz para ele que não quer ir porque apanha dele, da avó e
da tia, o que segundo conta não é verdade.
➢Também relata que o filho diz a ele que a mãe fala que o pai não gosta dele
porque não quer dar mais dinheiro.
➢Sabe que a genitora tem um namorado e que o menino já lhe disse que preferia
o namorado da mãe como pai.
➢Por fim soube pela escola que o filho, que tem o nome completo do pai, está
assinando o nome com o sobrenome materno.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Thaís iniciou contanto sobre o início da relação trazendo as mesmas
informações que Otávio, apenas ressaltando que a gravidez foi planejada por
ambos pois o requerente dizia com frequência que queria um filho. Questionada
sobre se ele dizia querer um filho naquele momento ou se dizia de um desejo
geral com vistas a um futuro próximo, a requerente teve bastante dificuldade
para entender a diferença.
➢Relata que ele aceitou muito bem a notícia da gravidez mas que a mãe e irmã
dele não gostaram. Consideram que elas acharam que ela queria “dar o golpe
nele”. Dessa forma, refere que nunca teve um bom relacionamento com ambas.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Sobre a vida em conjunto, conta que Otávio era muito controlador com
dinheiro. Refere que tentou algumas vezes ajudar sua mãe mas que Otávio
implicava com ela e a tratava muito mal. Lembra que essa situação foi causando
cada vez mais atritos entre o casal até que resolveu pedir a separação.
➢Sobre Otávio Jr., conta que o pai sempre foi muito ausente e que pouco ligava
para o filho. Refere que era ela quem ficava responsável pelos cuidados com o
filho. Contudo ao longo a entrevista, ao falar do cotidiano da família e de Jonas,
acabou deixando claro que desde o nascimento da criança contou com babá dia
e noite e aos finais de semana.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Ao apontarmos isso e a questão dos cuidados com o filho, Thaís aparentando
confusão disse que cuidava do filho pois era ela quem dava as ordens para as
babás.
➢Thaís relata que após a separação o genitor continuou muito “muquirana” e
frequentemente deixa de pagar despesas importantes do filho afirmando que o
pai se negou a pagar a palmilha ortopédica de Otávio Jr. e cremes antialérgicos
➢Informa ainda que com a recusa do pai a criança estava sem fazer o tratamento
➢Confirmou que o genitor arcava com 100% dos gastos com escola, saúde e
moradia dela e do filho.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Confirmou o pagamento em dia do valor em espécie de R$ 7000,00 para o
filho e R$5000,00 para ela.
➢Não mencionou atrasos ou não pagamento de pensão.
➢Quando questionada sobre com que eram gastos os valores de pensão da
criança, se genitor arcava com todos os gastos, corou e, após algum tempo
pensando, acabou respondendo que poupava o dinheiro do filho para o futuro
(mais tarde no estudo social e depois nos autos sob determinação do juízo a
genitora não conseguiu apresentar existência de uma conta poupança ou
investimento no nome do filho, ou mesmo em seu próprio).
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERIDA
➢Refere que Otávio Jr. Não deseja ver o pai porque Otávio sempre foi frio,
distante e grosseiro. Refere que o filho já reclamou de ser beliscado pelo pai e
pela avó paterna e que a tia paterna grita com ele. Refere ainda que tem um
namorado que é muito próximo à Otávio Jr.
➢Afirma que o namorado assumiu a figura paterna que o pai não conseguiu.
➢Argumenta que o próprio menino percebeu isso e insiste em chamar o
namorado de pai.
➢Questionada a genitora disse que permite que o filho chame seu namorado de
pai
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA CRIANÇA
➢Otávio Jr. chegou para entrevista demonstrando muito pouca espontaneidade.
Assim que nos avistou disse que não queria ver o pai porque ele é frio e distante
e já o machucou. Percebendo a fala pronta procuramos falar de outros aspectos
do cotidiano do menino. Ao final dessa parte o menino já se encontrava mais à
vontade.
➢Ao falar de seu cotidiano Otávio fala muito sobre a escola, professores e colegas,
mas ao falar da parte do dia em que fica em casa não menciona a mãe, a não ser
para dizer que ela não gosta que ele a atrapalhe quando está no quarto com o
Fernando (namorado).
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA CRIANÇA
➢Ao perguntarmos de Fernando, novamente Otávio Jr. perde a espontaneidade e
começa dizendo que ele é atencioso, muito legal e uma figura de pai que ele não
tem.
➢O menino mostra desconforto em falar sobre o cotidiano familiar e volta a falar
da escola. Perguntamos se ele já aprendera a escrever e a criança confirma que
aprendeu a escrever o próprio nome.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA CRIANÇA
➢Pedimos que ele escreva seu nome e a criança escreve seu nome de outra forma,
sem o sobre nome do pai e sem o “Jr”. e com o sobrenome da família materna.
Perguntamos se ele tinha certeza que aquele era seu nome, a criança confirma
com tranquilidade. Comentamos então que então provavelmente “o juiz” havia
errado seu nome pois no processo ele estava escrito de forma diferente e
mostramos o nome dele no processo. Otávio Jr. conta que aquele era seu nome
antigo e que agora seu nome era aquele.
➢ Acrescentou que a avó materna e a mãe lhe ensinaram seu novo nome dizendo
que ele não deveria ter o nome do pai.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
CONTATO DA CRIANÇA COM PAI
➢O menino se mostra resistente em entrar na sala em que o pai se encontrava,
aceitando apenas com muita insistência.
➢Com o pai a entrevista inicia-se com o menino muito tímido e o pai tentando
animá-lo. Após 15 minutos pai e filho já estão ambientados, conversam
animadamente e riem. Falam sobre vários programas e passeios que já fizeram e
combinam outros. Ao final de 40 minutos terminamos o contato e agendamos
outra entrevista apenas com a criança.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
SEGUNDA ENTREVISTA COM A CRIANÇA
➢Na última entrevista notamos Otávio Jr. ansioso e angustiado. A todo momento
o garoto desviava sua atenção para a rua (atrás do perito a parede da sala era de
vidro e dava ampla visão da rua em frente ao Fórum).
➢Ao comentarmos sobre a boa interação entre ele e o pai, o menino ainda mais
angustiado diz que não havia se divertido nada e que só rira porque o pai o
obrigara. Lembrei Otávio Jr. que eu estava presente e não havia nenhum
comportamento do pai que o “obrigasse a se divertir”, o menino então disse que
não havíamos visto porque o pai o beliscava por debaixo da mesa como forma e
constrange-lo a parecer alegre.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
SEGUNDA ENTREVISTA COM A CRIANÇA
➢Notando o nível fora do comum de ansiedade e angústia do garoto, e a
insistência com que ele olhava para a rua através da parede envidraçada, nos
voltamos para trás e ao fazermos isso verificamos que na rua, postado bem em
frente à vidraça, observando o garoto, estava o namorado da genitora que ao
nos ver tentou se esconder atrás de uma árvore.
➢Ao nos voltarmos para o garoto pudemos notar que ele se encontrava em
pânico. Fingimos ignorar o fato no momento para não piorar o desespero da
criança, e acalmamos Otávio Jr. conversando sobre temas de sua preferência.
Principais Aspectos do Caso
➢Há fartos indícios de alienação parental, tais como, palavras da genitora que
visam denegrir a imagem do pai, tentativa de substituir a figura paterna, claro
interesse financeiro da genitora na manutenção da guarda.
➢Mediante tais indícios busca-se elementos comprovadores da alienação
parental.
➢O interesse financeiro da genitora na manutenção da guarda não diz respeito
apenas à uma questão pessoal de Thaís em obter mais conforto para si, mas
envolve diretamente a criança como uma apólice de seguro.
Principais Aspectos do Caso
➢Isso porque não há utilização do dinheiro pago pelo pai em prol da criança.
Não há esforço da genitora em participar também dos gastos com o filho. A
exemplo, como o pai se recusou a pagar também a palmilha ortopédica do filho,
e os cremes dermatológicos, a genitora, mesmo dispondo de condições
financeiras, deixou o filho sem o tratamento adequado.
➢A relação entre mãe e filho também se mostra fria e distante. A mãe não
trabalha, entretanto mantém o filho de seis anos em período integral na escola e
requer uma babá para permanecer com ele fora desse período. Desde bebê a
genitora claramente terceiriza os cuidados com o filho a babás em tempo
integral.
Principais Aspectos do Caso

➢Na fala da criança não surgem quaisquer referências à mãe, quer seja
cotidianas (comida, almoço, lições escolares, banho, café da manhã), quer seja
de programações e diversão como passeios, idas ao cinema, restaurantes,
parques etc.
➢Além da ausência materna notada no âmbito dos cuidados, afeto e carinho,
não se observa qualquer presença da genitora na imposição de limites, a não ser
quando a criança se torna inconveniente interferindo ou atrapalhando os
momentos íntimos com o namorado.
Principais Aspectos do Caso
➢Dois episódios são definitivos.
➢Primeiramente a criança sendo ensinada a trocar o nome excluindo,
literalmente, o pai de sua vida. Tal situação é claramente descrita como uma
ação consciente e planejada da genitora e da avó materna. Acrescente-se ainda a
esse primeiro aspecto a tentativa da genitora em substituir a figura paterna
colocando o namorado Fernando no lugar.
➢O segundo diz respeito à forma como a criança é colocada num contexto
extremamente ameaçador durante a última entrevista.
➢Claramente a relação entre mãe e filho indica um vínculo perverso onde a
criança para a genitora não é nada além de uma fonte de renda.
PAPEL DA PERÍCIA
➢Elencar os vários indícios de alienação parental observados nas entrevistas e
observações.
➢Explicitar que as condutas da genitora e de sua mãe para com o filho implicam
numa ausência de vínculo afetivo e materno, ao mesmo tempo que indicam o
estabelecimento de uma relação exclusivamente utilitária com criança que se
mostra como um artigo útil para a obtenção de vantagem financeira.
➢Demonstrar que esse tipo de relação implica numa postura perversa da mãe,
no sentido em que Thaís perverte a condição de filho e de criança de Otávio Jr
em um instrumento eficaz para atingir o genitor e conseguir vantagem
financeira.
PAPEL DA PERÍCIA
➢Explicar que a permanência de qualquer criança numa relação perversa como
a que a família materna estabeleceu, leva a seríssimos prejuízos no
desenvolvimento psicológico, emocional e cognitivo da criança por se tratar de
uma experiência de coisificação.
➢Apontar a necessidade de inversão da guarda da criança para o pai e visitação
da genitora ao filho mediante supervisionamento, haja vista a tendência de
Thaís em manipular, pressionar e ameaçar o filho para que cumpra com o que
considera ser o dever do filho em se constituir como seu meio de sustento e
conforto financeiro.
Módulo 4

As suspeitas de abuso sexual: a perícia psicológica


entre a perversidade do abusador e a perversidade do
alienador.
Violência Sexual - Definição
Segundo o Ministério da Saúde Violência Sexual contra a Criança e o
Adolescente consiste em:
todo ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual cujo agressor
está em estágio de desenvolvimento psicossexual mais adiantado que a
criança ou adolescente. Tem por intenção estimulá-la sexualmente ou utilizá-
la para obter satisfação sexual. Apresenta-se sob a forma de práticas eróticas
e sexuais impostas à criança e ao adolescente pela violência física, ameaças
ou indução de sua vontade. Esse fenômeno violento pode variar desde atos
em que não se produz o contato sexual (voyerismo, exibicionismo, produção
de fotos), até diferentes tipos de ações que incluem contato sexual sem ou
com penetração. Engloba ainda a situação de exploração sexual visando
lucros como é o caso da prostituição e da pornografia (MS, 2002)
Abuso Sexual - Diagnóstico
➢Substituição do termo Violência por Abuso
➢Abuso permite ampliar o leque de situações potencialmente abusivas do
ponto de vista sexual
➢Considera a existência de uma sexualidade infantil que, todavia, deve ser
entendida como essencialmente diferente da sexualidade adulta
➢Abusos por Inadequação
➢Há uma invasão da sexualidade infantil mas sem uma finalidade consciente e
voluntária de consecução do prazer sexual
➢Abusos por Perversidade
➢Utilização da criança como meio para a consecução do prazer sexual do
agressor
➢Coisificação da criança
A Denúncia de Abuso Sexual no Contexto de Litígio
Familiar em Vara de Família
➢Um dos aspectos mais fundamentais a serem levados em consideração nas
perícias de psicológicas que visam apurar denúncias de abuso sexual é o
contexto familiar no momento em que a denúncia surgiu.
➢Há dois aspectos as serem levados em consideração:
➢A revelação da criança se deu num contexto familiar unido, com convivência
entre ela e o suposto abusador
➢A revelação da criança se deu num contexto familiar onde os genitores
encontram-se separados em situação de litígio.
A Denúncia de Abuso Sexual no Contexto de Litígio
Familiar em Vara de Família
➢Tal diferenciação é importante pois no primeiro caso, temos de levar
em consideração que a revelação de uma criança sobre abuso sexual
dentro do seio familiar em plena convivência com agressor é
resultado de um esforço muito grande da criança para romper o
silêncio familiar e o assim chamado “pacto de silêncio com o
agressor”. Isso equivale a dizer que qualquer sinal, ainda que
inicialmente não muito revelador, pode ser apenas o início de uma
situação muito maior e mais grave.
A Denúncia de Abuso Sexual no Contexto de Litígio
Familiar em Vara de Família
➢Já no segundo caso, temos de levar em consideração que o clima de
litígio entre o casal parental, principalmente quando envolve questões
mal elaboradas do processo de término da relação, muitas vezes
propicia fantasias altamente negativas de um sobre o outro. Assim,
muitas vezes falas e comportamentos das crianças podem,
eventualmente, serem interpretados de maneira equivocada e terem
sua importância aumentadas, justamente em função do clima de
litígio e ressentimento generalizado existente na relação.
A Denúncia de Abuso Sexual no Contexto de Litígio
Familiar em Vara de Família
➢O diagnóstico depende, portanto, de uma avaliação bastante detalhada
da dinâmica familiar, e do nível de litígio entre os genitores por ocasião
da suposta revelação da criança ou suspeita do denunciante.
➢Além disso, é importante uma avaliação dos indícios (falas e
comportamentos) que deram origem a suspeita incluindo aí a
correspondência desses indícios com uma situação de abuso sexual, e a
consistência do relato desses indícios em relação a idade e rotina a
criança
A Denúncia de Abuso Sexual no Contexto de Litígio
Familiar em Vara de Família
➢Por fim embora seja possível em algumas vezes dar um diagnóstico
positivo afirmando a ocorrência de abuso sexual, na maioria das
vezes é inviável dar um diagnóstico positivo afirmando a não
ocorrência de abuso.
➢Seja em função das várias possibilidade e situação sexualmente
abusiva que podem envolver crianças dentro e fora de suas famílias,
na maior parte das perícias podemos apenas apontar a ausência de
indícios e/ou a inconsistência dos indícios trazidos.
CASO 5
Processo: Regulamentação de visitas
Requerente: Genitora, Amanda, 36 anos.
Requerida: Genitora, Edson, 29 anos.
Crianças: Maria, 5 anos e Ana 3 anos.
Histórico Processual
➢A requerente entrou com a presente ação solicitando a suspensão das
visitas do pai às filhas Maria e Ana. De acordo com a genitora, após a
separação do casal as filhas passaram a visitar o pai, mas algumas
semanas depois passou a notar alteração de comportamento na filha
mais velha. Argumenta que a filha mais velha passou a se mostrar
irritadiça e agressiva para com ela. Também teria revelado à babá e
depois a ela própria que teria tido contatos sexuais com o pai.
Histórico Processual
➢Refere que levou a criança em serviço especializado para vítimas de
violência sexual e foi orientada a impedir o contato entre pai e filha, o
que acontece há cerca de 8 meses.
➢O requerente contestou, negando a acusação. Defende-se dizendo
que a família da genitora nunca gostou dele e acusa a genitora de
fazer a denúncia por estar sendo influenciada pelas irmãs mais
velhas.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Namoro muito rápido em função de motivos religiosos. Lembra que 2 meses após
se conhecerem já estavam casados.
➢Desaprovação da família em função da rapidez do relacionamento e diferenças
culturais e socioeconômicas entre ambos.
➢Casamento marcado justamente pelos fatos que levaram a família a desaprovar a
união.
➢Edson se mostrava machista e de pensamento rigidamente tradicional.
➢Não aceitava que vivessem acima do padrão financeiro que ele podia
proporcionar e não aceitava que ela sustentasse a casa.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Exigia que além do trabalho ela também fosse dona de casa e cuidasse do
marido, do lar e das filhas.
➢Descreve Edson como imaturo e necessitando de autoafirmação o que a
levava a passar por constrangimentos familiares em função dele
frequentemente mentir sobre um sucesso financeiro e profissional que ele
nunca teve.
➢A separação se deu em função de um negócio que ele tentou começar mas
que faliu causando grande prejuízo a ela.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Lembra que houve uma discussão durante o café da manhã e que terminou
com Edson se descontrolando, jogando uma xícara de café nela e saindo de
casa.
➢Refere que não queria inicialmente a separação, mas depois refletiu e
decidiu que se ele havia resolvido sair de casa não haveria mais volta.
➢Lembra que logo depois ele tentou retomar a relação mas ela não permitiu.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Após a separação conta que Maria passou a sentir muita falta do pai pois
era muito apegada ao genitor. Assim, logo permitiu que Edson retirasse a
filha para visitas nos finais de semana alternados com pernoite.
➢Após o início das visitas Maria se mostra irritada e rebelde com a genitora
acusando-a de não querer deixar o pai voltar para casa e de deixar o pai
sozinho sofrendo.
➢A primeira fala da criança indicando possibilidade de abuso veio de uma
conversa de Maria com a Babá.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢A babá informou que Maria havia lhe dito que ela e o pai tomavam banho
juntos e que ela brincava com o pipi do papai.
➢Dias depois conta que a filha estava muito agressiva com ela durante o café
da manhã e, rebelde não queria se arrumar a tempo de ir para a escolha. No
meio da discussão disse “Eu não quero morar com você, eu quero morar com
meu pai. Você sabe que a gente toma banho junto? Eu dou beijo no pipi dele
e ele dá beijo na minha popóca?”(SIC)
➢Em outro momento, também durante um momento de irritação a filha lhe
disse que pegava no pipi do pai e este crescia.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Após tais falas levou a situação à psicóloga de Maria que encaminhou o caso
para uma instituição especializada em atendimento de crianças vítimas de
violência.
➢Nesse serviço conta que através dos atendimentos no grupo de mães
passou a aceitar que de fato o pai havia abusado da filha e, por pressão do
serviço, entrou com os presentes autos solicitando a interrupção das visitas.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DA REQUERENTE
➢Refere que Edson sempre foi um excelente pai, brincalhão e muito dedicado
às filhas. Elogia o fato dele sempre ter participado dos banhos e trocas de
fraldas. Também refere que ele ajudava muito quando ela chegava do
trabalho e as crianças da escola. Lembra que muitas vezes iam todos para o
chuveiro e ela saía antes para arrumar o quarto e o pai permanecia tomando
banho com as filhas.
➢Questionada, disse que nunca viu problemas nessa prática, mas depois que
começou a frequentar o grupo de mãe percebeu que ela era inadequada.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Refere os mesmos fatos trazidos pela requerida mas com o “sinal invertido”.
➢Relata o casamento como a relação de um jovem, pobre, ingênuo e sem
estudos com uma mulher mais madura, rica e experiente.
➢Refere que Amanda constantemente o humilhava e o constrangia em
função dela ter maior poder aquisitivo.
➢Conta ainda que ela era muito influenciada pela família, especialmente as
duas irmãs mais velhas que sempre o odiaram e fizeram de tudo para que o
casamento acabasse.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Confirma a situação que levou ao divórcio, contudo, argumenta que se
descontrolou porque Amanda mais uma vez o humilhou quando o negócio
que tentou abrir faliu.
➢Refere que embora tenha saído de casa, não tinha a intenção de divorciar-se,
e sim de “esfriar a cabeça”. Mas que quando tentou voltar foi Amanda quem
comunicou o desejo de divórcio.
➢Após a separação confirma que Maria passou a sofrer muito pois eram
ambos muito apegados um ao outro. Também confirma que a filha passou a
se mostrar muito irritada e agressiva, principalmente com a mãe.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Por isso, passaram a levar a filha a uma psicóloga.
➢Confirma que foi chamado à atenção pela psicóloga por comentar com a
filha que não voltava para casa porque “a mamãe não quer”.
➢Sobre a denúncia de abuso, nega qualquer situação ou interação
inadequada com a filha.
➢Credita a denúncia a uma vingança materna pelo fato de certa vez ele ter
chamado a polícia para conseguir pegar seus pertences pessoais na casa onde
moravam. Lembra que ela gritou para ele em alto e bom som quando saía
que ele pagaria por tê-la feito passar por tal constrangimento.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
RELATO DO REQUERIDO
➢Edson afirmou que sempre foi ótimo pai e sempre participou dos cuidados
diretos com as filhas. Também confirmou a fala de Amanda que, quando
ainda casados frequentemente ele e muitas vezes ele e Amanda tomavam
banho com Maria e Ana.
➢Confirma que após a separação chegou a tomar banho com a filha, mas com
menos frequência pois como estava na casa dos seus pais, sua mãe fazia
questão de dar banho nas netas.
➢Negou, contudo que tenha, nessas ocasiões ocorrido qualquer toque ou
situação entre ele e a filha que se configurasse como inadequado.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
CONTATOS COM A CRIANÇA
➢Criança se mostrou nos contatos, espontânea, comunicativa, com ótima
verbalização e muito inteligente.
➢Durante as entrevistas desenvolveu ótimo vínculo com o perito, muito em
função de termos proporcionado um encontro com o pai que ela não via
havia muito tempo.
➢Após falar de diversos assuntos, a meu pedido, fez um desenho de uma
família em que a mãe era desenhada com o cabelo feio que morava com uma
das filhas, a outra filha morava com o pai em uma casa.
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
CONTATOS COM A CRIANÇA
➢Ao explicar o desenho falava sobre o histórico de separação da família, e
fazia questão de repetir que se tratava de uma história inventada.
➢Após algum tempo pedimos que falasse sobre sua família real. A menina
descreveu a separação como sendo por causa do pai ter jogado café na mãe e
da mãe ter dado um soco no olho do pai. Disse que o pai estava muito triste
pois estava sozinho e ao final, entristecida disse que não podia mais ver o pai.
➢Explicou então que não podia ver o pai porque “tinha inventado uma
mentira e todo mundo acreditou”(sic). Insiste durante várias vezes durante
as entrevistas que havia mentido e por isso não podia mais ver o pai
HISTÓRICO DA RELAÇÃO
OUTRA INFORMAÇÕES IMPORTANTES
➢A criança, após três entrevistas, não apresenta nenhum tipo de
conhecimento ou comportamento sexual inadequado para a idade.
➢Em visita à escola, a professora afirma categoricamente que Maria não
apresenta nenhum comportamento sexualizado com colegas, não apresenta
erotização exacerbada, nem falas sobre sexualidade inadequadas para sua
idade.
➢Por outro lado a diretora comenta que havia sido lhe passada a informação
pela tia materna da criança de que a existência do abuso já havia sido
comprovada, bem como a culpa do genitor .
OUTRAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES
➢A criança demonstra em seus desenhos imagens claramente fálicas em
profusão.
➢No contato com o genitor, pai filha se mostram muito apegados e
carinhosos e o genitor em determinado momento, na presença do perito,
produz uma cena de conteúdo edípico intenso.
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
Falando sobre os banhos com o pai
P – alguma vez o papai pediu para a filhinha lavar o pipi dele?
V – não
P – não? (em tom de dúvida) mas se não era para um lavar o outro então porque
tomar banho juntos?
V – não, o papai ficava falando onde faltava eu lavar.
P – tem certeza que você nunca pegou no pipi do papai?
V – nunca.
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
➢Durante os três contatos com a criança questionamentos sobre a possibilidade
da criança ter tido qualquer contato físico com o pênis do genitor que excedesse
a sua mera visualização durante os banhos foram feitos de diferentes formas em
diferentes contextos, sempre resultando em negativas seguras e espontâneas.
➢Diante das diversas negativas buscamos investigar a frase mais perturbadora
da criança, a de que quando pegava no pipi do papai ele CRESCIA.
➢A criança continuou afirmando que mentia
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
P – Porque antes você dormia na casa do papai e agora não dorme mais?
M – Sabe o que é (grande pausa) é que eu fiz uma coisa (pausa). Eu inventei uma
mentira e todo mundo acreditou.
P – Mentira?
M – É... eu falei que (pausa) que o meu pai fazia xixi em mim
P – Que mais ?
M – Que o pipi dele crescia.
P – E isso é mentira?
M–É
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
➢A criança demonstrando um misto de angústia e irritação mas com muita
segurança continuou afirmando que mentira.
➢Todavia, o problema residia no fato de que a fala de que o pipi do papai
crescia, indicava um conteúdo que dificilmente poderia ser inventado já que
apontava para um conhecimento inapropriado para uma criança da idade de
Maria sobre o processo anatômico de excitação sexual masculina.
➢Assim continuamos investigando até que no último encontro, em
determinado momento ocorreu o seguinte diálogo:
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
P- Mas da onde você tirou que o pipi do papai crescia?
M – Da minha cabeça
P – (brincando e em atitude de descrédito) ah, da tua cabeça, você está
querendo me enganar!
M – Não! Verdade, eu inventei!
P – (Com uma caneta na mão) faz de conta que essa caneta é o pipi do papai,
conta para mim como é que ele fica (dando três opções: pendurando-a para
baixo, segurando-a na horizontal e apontando-a para cima).
Detalhamento dos Diálogos com a Criança
M – Assim (escolhendo a posição pendurada).
P – (insistindo) Ta bom, agora mostra como é que o pipi do papai fica quando
cresce (passando a caneta para ela).
M – (rindo e demonstrando impaciência) Mas o pipi do papai não cresce! Eu
inventei!
P – Tudo bem. Então mostra como ele ficaria no jeito que você inventou.
M – (pega a caneta na mão e fica sem saber o que fazer com ela)
P – Como é que o pipi cresce? Cresce para baixo? Cresce para cima? Incha que
nem uma bexiga?
Detalhamento dos Diálogos com a Criança

M – Primeiro faz assim (pega a caneta e faz um movimento


serpenteante para baixo) e depois (serpenteando para frente) vai
subindo (serpenteando para cima) até chegar lá no céu!
Principais Aspectos do Caso
➢O caso se inicia com uma suspeita baseada em falas contundentes da
criança, que indicam contato físico de caráter sexualizado com o genitor e
conhecimento incompatíveis para a idade sobre detalhes da sexualidade
adulta.
➢Diante da fala da criança a conduta da mãe é acertada e qualquer outra
postura da genitora que não a investigação poderia ser encarada como
negligência ou cumplicidade.
➢Não há aqui comportamento de má fé da genitora, eliminando-se, portanto,
a possibilidade de alienação parental.
Principais Aspectos do Caso
➢Diante dos indícios consistentes de que a criança passou por abuso sexual,
a perícia foca em alguns objetivos:
➢O histórico do casal, especificamente a intimidade sexual do casal buscando
indícios no genitor de dificuldades tais como, desinteresse sexual, dificuldade de
iniciar ou manter uma relação sexual e incapacidade de satisfação sexual na
relação com a esposa.
➢Se as falas realmente aconteceram conforme a genitora relata,
➢Se a criança apresenta outros indícios de abuso sexual tais como erotização ou
comportamento sexual inadequado,
➢O vínculo entre a criança e o genitor.
Principais Aspectos do Caso
➢O histórico sexual do casal não demonstra qualquer fato que chamasse
atenção seja no relato genitor seja no relato da genitora.
➢Já em relação à fala da criança, logo surge uma aspecto importante quando
a criança diz que mentiu sobre o que falou.
➢À essa fala corresponde uma tentativa constante da criança em voltar atrás
no que falou mesmo no plano da fantasia, negando por exemplo a prática do
banho com o pai já confirmado pelos genitores.
➢ Até esse momento, entretanto, o recuo da criança não caracteriza
inexistência de abuso.
Principais Aspectos do Caso
➢Crianças que passaram efetivamente por abuso sexual, voltarem atrás dias
ou semanas após a revelação, afirmando que mentiram, confundiram-se ou
mesmo que se esqueceram é relativamente comum.
➢Isso acontece em algumas situações por influência de familiares que, tendo
dificuldades de encarar a realidade do incesto, pressionam a criança,
consciente ou inconscientemente a voltarem atrás em suas falas.
➢Outras vezes a própria criança, percebendo a comoção e desestruturação que
acometeu a família após a revelação (mãe, irmãos, avós etc.), acaba por voltar
a atrás em suas falas na tentativa de se livrar da culpa sentida pelo sofrimento
daqueles que ama, incluindo aí muitas vezes o próprio abusador.
Principais Aspectos do Caso
➢No entanto à medida em que o estudo avança, alguns aspectos passam a
diminuir a probabilidade da criança de ter sido vítima de abuso sexual no
sentido de ter sido utilizada pelo genitor como objeto de satisfação sexual.
➢O primeiro ponto diz respeito a ausência de qualquer comportamento sexual
inapropriado para a idade ou erotização precoce. Seja pelo relato da genitora
seja pelo relato detalhado da professora de Maria, a criança nunca
apresentou nada relevante nessa área.
➢Ao mesmo tempo, não se nota no caso os danos causados ao vínculo entre a
criança e abusador sexual.
Principais Aspectos do Caso
➢Ainda que o abusador seja alguém próximo e por quem a criança
desenvolveu afetividade, esse vínculo também é permeado por sentimentos
negativos de raiva, nojo e principalmente medo, promovendo forte
ambiguidade.
➢Além disso, no momento da perícia, Maria encontrava-se havia quase um
ano longe do suposto agressor, portanto, protegida e com pressão zero da
família para que voltasse atrás. Ao contrário, uma de suas tias claramente
incentivava e ecoava a história do abuso inclusive abrindo a situação de
maneira precipitada e altamente inadequada na escola da menina.
Principais Aspectos do Caso
➢Mesmo diante desse quadro a criança mantém com insistência incomum
sua fala de que mentiu e apresenta em suas brincadeiras, desenhos e
referências familiares um forte sentimento de culpa pela separação do pai e
um forte desejo de reparação.
➢O contato com o pai não apenas confirma a boa vinculação e o desejo da
menina em retomar a relação com o pai, como também acrescenta uma
informação importantíssima.
➢Durante o contato, o pai emocionado e diante do perito, ajoelha-se diante da
filha e dá a ela um pequeno anel sem pedras ou adornos, parecido com uma
aliança, e diz à filha que aquele é o símbolo do amor dele por ela.
Principais Aspectos do Caso
➢A postura claramente edípica e inadequada do pai soma-se à também
igualmente inadequada prática familiar dos banhos conjuntos.
➢A consequência parece ser clara no comportamento de Maria
➢O amor e defesa incondicional do pai,
➢A irritação e rebeldia com a mãe,
➢A profusão de imagens fálicas nos desenhos,
➢O profundo sentimento de culpa pela separação do genitor
➢A insistência de que mentiu e fez algo errado.
Principais Aspectos do Caso
➢Todos esses dados apontam para uma situação de abuso sexual por
inadequação, não apenas do genitor, mas da dinâmica familiar antes da
separação.
➢Há uma indiscriminação de papéis entre adultos e crianças, entre pais e
filhos que expõe Maria a situações para as quais ela não tem maturidade para
lidar, tais como
➢Estar intimamente exposta à nudez e ao contato nu com e entre os genitores,
➢Ser “pedida em casamento” pelo genitor
➢Competir com a mãe pela presença do marido.
Principais Aspectos do Caso
➢Assim nesse contexto, a maior parte das falas da criança podem passar a ser
encaradas como resultado da fantasia da criança excessivamente estimulada
pela dinâmica inadequada dos genitores
➢Eu tomo banho com o papai e brinco com o pipi dele.
➢Eu beijo o pipi dele e ele beija a minha popóca.
➢Eu prefiro morar com o meu pai.
➢Todas essas falas apesar de impactantes envolvem apenas elementos que não
são estranhos nem ao vocabulário, muito menos à capacidade de fantasia da
criança na faixa etária de Maria.
Principais Aspectos do Caso
➢A exposição recorrente ao pênis do pai aliada às fantasias edípicas
excessivamente estimuladas pela dinâmica familiar inadequada podem
funcionar como explicação para tais falas.
➢Além disso importante ressaltar que as falas da criança não surgiram como
um difícil e penoso desabafo feito sob os medos e angústia de quem está
quebrando o pacto de silêncio, mas durante momentos de intensa raiva e
revolta, justamente contra a figura materna que impedia a volta do genitor.
➢Além disso, é possível observar também, a partir desse contexto, um intenso
clima de rivalidade entre mãe filha, observável no tom de desafio com que
Maria provoca a mãe com uma suposta preferência do pai pela filha.
Principais Aspectos do Caso
➢Contudo nem a dinâmica familiar inadequada, nem a postura inadequada
do genitor, nem as fantasias edípicas exacerbadas da criança conseguiam
explicar a parte mais preocupante da fala da menina:

“Eu pego no pipi do papai e o pipi dele cresce”


➢O diálogo com a menina sobre essa fala contudo revela um aspecto
importantíssimo do trabalho pericial em casos de abuso sexual, qual seja:
A ESCUTA DA CRIANÇA DE ACORDO COM OS REFERENCIAIS DELA
Principais Aspectos do Caso
➢A fala foi objeto de preocupação intensa da perícia porque explicitava de
modo aparentemente cabal um conhecimento totalmente incompatível da
criança sobre detalhes anatômicos da excitação sexual masculina.
➢Isso aconteceu porque todos os adultos envolvidos no caso, identificaram a
informação “e o pipi cresce” com a imagem da ereção masculina quando
manipulado (“eu pego no pipi do papai e ele cresce”).
➢Entretanto, a descrição desse crescimento do “pipi do papai” pela meinina,
nada tem haver com uma ereção ou com um processo de excitação, mas reflete
novamente fantasias da criança onde o pênis tem um lugar de destaque
absoluto, tal como surgem também nos desenhos de Maria.
Papel da Perícia
➢Explicar os diversos tipos de situações sexualmente abusivas.
➢Apontar a existência de um abuso sexual mediante uma dinâmica familiar
inadequada que, apesar de não utilizar a criança como meio de satisfação
sexual, criava um clima de indiferenciação de papéis e gerações, expondo as
filhas a momentos íntimos do casal, exacerbando as fantasias edípicas de Maria.
➢Apontar para a possibilidade de retomada das visitas mediante procura da
família por psicoterapia familiar, ou na impossibilidade, que tanto o genitor
quanto a genitora procurem por psicoterapia.
CASO 6
Processo: Destituição do Poder Familiar
Requerente: Genitor, Carlos, 50 anos.
Requerida: Genitora, Gabriela, 43 anos.
Crianças: Bruno, 9 anos.
Histórico Processual
➢O requerente entrou com a presente ação solicitando a destituição do poder
familiar da requerida em relação ao filho Bruno, atualmente com 9 anos de
idade, alegando que a genitora tem um longo histórico de condutas abusivas
com o filho, razão pela qual conseguiu a guarda do menino em processo
anterior, e que atualmente teria sabido que a mãe abusaria sexualmente do
filho durante as visitas.
➢Em razão das provas juntadas aos autos, as visitas foram provisoriamente
suspensas.
Histórico Processual

➢A requerida contestou, negando as acusações e alegou que o requerente


sempre foi um homem violento que tem por objetivo destruí-la e, com a
suspensão do poder familiar levar o menino para seu país natal (situado na
América do Sul).
Histórico da Relação
➢Refere que conheceu Gabriela em um shopping de alto padrão de São
Paulo.
➢Descreve Gabriela como incrivelmente bonita e atraente.
➢Na época era sócio de um restaurante referência da gastronomia de seu país
de origem.
➢Namoraram por dois meses até que ela engravidou.
➢Lembra que não queria se unir a ninguém, mas havia tempos queria ser pai.
Dessa forma propôs assumir o filho e se responsabilizar por todo o suporte
financeiro durante e após a gravidez.
Histórico da Relação
➢Conta que Gabriela não aceitou. Insistiu em que fossem morar juntos e que
caso contrário abortaria a gestação.
➢Seja por causa de questões religiosas seja por causa do desejo de ter filhos,
acabou aceitando morar com a requerida.
➢Conta que Gabriela tinha mais duas filhas de pais diferentes. Luciane que
na época tinha 10 anos e Letícia com 3 anos. Luciane morava com o pai e
tinha contato eventual com a mãe. Letícia veio morar com eles.
➢A convivência durou pouco mais de dois anos.
Histórico da Relação
➢Refere uma convivência permeada por brigas, agressões físicas e
descontroles emocionais por parte de Gabriela.
➢Refere que a companheira ingeria bebidas alcóolicas em grande quantidade
e misturava com remédios psiquiátricos e essa interação causava grande
descontrole.
➢Refere que a ingestão de álcool e medicamentos controlados ocorreu durante
toda a gravidez.
➢Após o parto refere episódio depressivo de Gabriela e isolamento em seu
quarto. A criança era cuidada por ele e pela babá.
Histórico da Relação
➢O episódios depressivo foi seguido por um comportamento errático onde a
companheira passava grandes partes do dia e da noite fora de casa,
invariavelmente chegando alcoolizada em casa.
➢A brigas com agressão física passaram a ser frequentes. Relata episódio em
que se descontrolou e revidou a agressões com violência. O fato ocorreu na
frente das duas filhas de Gabriela.
➢Após o aumento dos episódios de embate físico resolveu sair de casa
➢Refere preocupação com o filho ainda novo, mas lembra que logo Gabriela
arranjou emprego como corretora de imóveis e passou a deixar Bruno todos
os finais semana com ele além de três pernoites durante a semana.
Histórico da Relação
➢Após a separação Gabriela voltou a abusar da mistura de álcool e remédios o
que levou a alguns colapsos que resultaram em internações médicas. Alguns
desses colapsos descreve como tentativas de suicídio. A filha Letícia é quem
acabava se responsabilizando por zelar pela mãe e pedir ajuda nesses
momentos.
➢Quando Bruno estava com seis anos a genitora acabou agredindo o filho
quando acordou o menino de madrugada para cortar as unhas e o menino
reclamou.
➢Em função disso e com o depoimento de várias pessoas que falaram sobre o
comportamento de Gabriela, conseguiu a guarda do filho e foram
estabelecidas visitas sem pernoite para a mãe.
Histórico da Relação
➢Nos dois anos que se seguiram houve pouco contato entre mãe e filho e
Gabriela teve mais dois surtos com tentativa de suicídio.
➢Após o último surto, contudo, a genitora aparentou melhora e Carlos
acabou aceitando pedido da genitora para que o filho voltasse a dormir em
sua casa.
➢No início as visitas ocorreram normalmente, mas logo Bruno passou a
reclamar e constantemente ligava para ele pedindo para vir busca-lo,
principalmente à noite.
➢O genitor disse que insistia e às vezes obrigava o filho a cumprir o acordado
com a genitora.
Histórico da Relação
➢A situação permaneceu dessa forma por 4 meses até que durante o período
de férias percebeu que o filho estava de fato muito melancólico e às vezes
agressivo.
➢Conta então que certo dia Bruno começou a chorar descontroladamente.
Disse que tinha acontecido uma coisa “muito feia” mas que não queria
contar senão o pai iria brigar com a mãe.
➢Acalmou o menino e no dia seguinte retomou o assunto.
➢Bruno disse que queria falar mas não conseguia. Pediu então para escrever
e num pedaço de papel escreveu:
Histórico da Relação
“Minha transa comigo faz boquete em mim”
➢Carlos relata pânico e procurou saber a quem o filho se referia, ao que o
menino responde com dificuldade que era a mãe.
➢Depois Bruno passou a dar mais detalhes como a mãe, durante a noite
colocava a boca no “pipi” dele e depois “colocava a bunda no meu pipi e
espremia contra a parede”(sic).
➢O genitor refere que a partir de então não permitiu mais o contato entre
mãe e filho e entrou com a presente ação conseguindo a suspensão das
visitas.
Histórico da Relação
Relato da Requerida
➢A genitora se mostra bastante evasiva na entrevista. Comparece com
as duas filhas mais velhas que permanecem esperando no hall do
foro.
➢Na entrevista esforça por mostrar o genitor como uma pessoa
desonesta, violenta e com problemas de caráter.
➢Refere inúmeras agressões físicas e a todo o momento acusa Carlos
de dar golpes em sócios e ter problemas com a justiça em função de
dívidas.
Histórico da Relação
Relato da Requerida
➢Conta que sempre foi ótima mãe e que trouxe as filhas para
comprovar isso.
➢Refere que ambas as filhas sabem do que está acontecendo porque
mostrou os autos à elas.
➢Quanto à nossa preocupação sobre mostrar conteúdo tão forte para
as filhas, principalmente a mais nova (com apenas 12 anos naquele
momento), refere que Letícia é muito madura, considera-a como
amiga e que ela sempre a apoiou.
Histórico da Relação
Relato da Requerida
➢ Conta que Carlos já quebrou seu nariz e tentou atropela-la com o
carro.
➢Considera que ele é um psicopata que quer acabar com a vida dela.
➢Nega todas as acusações de descontrole, ingestão e mistura de
álcool e medicamentos controlados, internações por problemas
psiquiátricos e tentativas de suicídio.
➢Argumenta que é corretora de imóveis de empresa renomada e que
“uma louca” nunca teria o sucesso profissional que ela obteve.
Histórico da Relação
Relato da Requerida
➢Sobre algumas situações comprovadas nos autos através de laudos e
declarações de médicos e hospitais a respeito de internações e tentativas de
suicídio, a genitora se cala.
➢Sobre a acusação, conta que é uma estratégia de Carlos para lhe tirar o
poder familiar e conseguir voltar para seu país de origem levando o filho.
➢Sobre as falas do filho, refere que o menino vinha andando, no
condomínio do genitor, com adolescentes mais velhos e entrou em contato
com palavras de baixo calão como boquete.
Histórico da Relação
Relato da Criança
➢Bruno chega muito tímido e cabisbaixo. Demonstra saber o que está
fazendo na sala comigo mas adianta que é muito ruim ter de falar
do que lhe aconteceu.
➢Após uma longa introdução que envolveu conversas sobre vários dos
assuntos preferidos do menino, passamos a abordar o assunto.
➢Bruno apresentava intenso nível de angústia e ansiedade.
➢Entendia que a intenção da conversa visava proteger a si e,
eventualmente a própria mãe.
Histórico da Relação
Relato da Criança
➢Contudo nas palavras e gestos do menino: “eu quero falar, mas
quando chega aqui (espalma a mão e envolve a própria garganta)
não sai, eu não consigo!”
➢Passamos então a propor uma série de estratégias de modo a criar
alguma forma menos traumatizante para que Bruno conseguisse se
expressar.
➢Ao fim a criança através de bonecos sexualizados conseguiu
demonstrar a interação entre ele e a mãe
Histórico da Relação
Relato da Criança
➢Trouxe que os abusos aconteciam à noite na cama da mãe
➢Revela que durante a noite “quando eu percebia que ela ia começar a
fazer aquilo de novo eu virava de lado para a parede, mas ela era mais forte
e me puxava para ela”
➢ Com os bonecos simulou o boneco adulto feminino com a cabeça entre as
pernas do boneco infantil masculino. Depois colocou o boneco adulto
feminino de costas para o infantil masculino que era puxado por trás
contra as nádegas do primeiro.
➢Comenta que a mãe passava de um ato para outro quando percebia que o
pipi dele estava “durinho”(sic).
Histórico da Relação
Relato da Criança
➢Disse que por causa da convivência com amigos já sabia que aquilo
que a mãe fazia era errado e “muito feio”(sic)
➢Refere sentir-se muito envergonhado e ao mesmo tempo teme que a
mãe seja presa.
➢Ao final diz que não queria que a mãe fosse presa mas que ela fosse
tratada, pois sua psicóloga explicou que ela é doente.
➢Não deseja ver a mãe até que ela esteja bem.
Outras Informações Importantes
➢Em contato com os pais de Letícia e Luciane ambos confirmaram
sobre os descontroles de Gabriela.
➢Ambos também fizeram referência ao fato de que Gabriela sempre
foi uma mulher muito atraente e, assim como Carlos, a conheceram
no mesmo shopping de alto padrão.
➢O pai de Luciane conta que “deu um jeito” de Luciane vir morar com
ele quando ela ainda era bebê, pois não confiava na capacidade de
Gabriela em cuidar de uma criança. Por dar um jeito, conta que
aceitou tudo o que ela propôs em termos de valores de pensão.
Outras Informações Importantes
➢O pai de Letícia conta que a filha acabou se tornando uma espécie
de cuidadora a mãe. Confirmou que por diversas vezes foi ela quem
encontrou a mãe desacordada.
➢Refere que permite que a filha permanecer com a mãe após a
separação pois ele não queria confusão com a genitora em função dos
seus constantes descontroles.
➢Na entrevista com Luciane e Letícia, as meninas tentaram defender
a mãe relatando o episódio de agressão entre o requerente e a
genitora e argumentando que Bruno estava sendo mal influenciado
pelo genitor
Outras Informações Importantes
➢Quando abordamos os assuntos referentes às internações, tentativas
de suicídio e alcoolismo, Luciane evita o tema dizendo que morava
com o pai e nem sempre estava presente. Letícia tenta negar mas se
mostra contraditória e nervosa.
➢Quando perguntam do irmão e são informadas sobre o sofrimento
dele, Luciane se revolta e sai da sala, Letícia preocupada que o
comportamento da irmã prejudique a mãe, apesar de seus apenas 12
anos, assume o controle da situação e tenta contemporizar pedindo
desculpas ao perito.
Aspectos Importantes do Caso
➢ Farto material nos autos documentando o frágil estado de saúde
mental da genitora.
➢A postura paterna de permitir que o filho ficasse mais tempo com a
genitora apesar se seu histórico, e contrariando decisão judicial é um
forte indicativo de que o genitor nunca teve a intenção de afastar mãe
e filho.
➢O relato sobre o processo doloroso do filho para conseguir falar
sobre o abuso é muito consistente com casos de abuso sexual.
Aspectos Importantes do Caso
➢ Na entrevista a genitora aparenta certa cisão da realidade falando
de assuntos pouco relacionados com a questão e procurando negar o
abuso mediante sua postura ética do ponto de vista profissional e
financeiro.
➢O compartilhamento dos detalhes do processo com as filhas,
principalmente a mais nova, demonstra dificuldade da genitora em
discernir entre o papel de mãe e filha, bem como entre sua condição
de adulta e a condição de criança da filha.
Aspectos Importantes do Caso
➢ O silêncio de Gabriela sobre as diversas internações e relatos
documentados de pelo menos duas tentativas de suicídio mostra um
preocupante movimento de negação da realidade com forte matiz psicótico.
➢O relato da criança é contundente e absolutamente consistente em
conteúdo e forma.
➢A angústia em ter de falar do assunto corresponde à palavra entalada da
garganta que aparece na primeira conversa com o pai e depois com o
perito.
➢A palavra entalada na garganta deriva da vergonha pela consciência do
caráter sexual da violência que sofreu e dos sentimentos de medo e culpa
pela possibilidade de punição da mãe.
Aspectos Importantes do Caso
➢Em termos de conteúdo, Bruno traz um relato detalhado sobre a interação
com a genitora e uso de vocabulário apropriado para a idade.
➢Em relação aos detalhes dados pela criança, destacamos:
➢A espera na madrugada quando revela que percebia quando a mãe ia
começar a fazer “aquilo”.
➢O fato de tentar se proteger se colocando contra a parede mas a mãe ser mais
forte do que ele.
➢O fato de referir o preparo da genitora em primeiro praticar a felação e, só
depois do pênis ereto, pressioná-lo com suas nádegas.
➢O movimento que faz com os braços para mostrar como a mãe, mesmo de
costas conseguia puxá-lo contra suas nádegas .
Papel da Perícia
➢Confirmar a existência do abuso
➢Recomendar a continuidade do afastamento entre mãe e filho.
➢Apontar a necessidade e obrigatoriedade de manutenção do
atendimento psicológico da criança como um dever do genitor.
➢Indicar necessidade de tratamento da genitora.
➢Oficiar a Vara da Infância e Juventude solicitando avaliação e
acompanhamento da situação de Letícia, devidos aos amplos sinais de
que se encontra em situação de risco.
AGRADEÇO A ATENÇÃO DE TODOS
UM BOM FINAL DE TARDE
Alexandre Lara de Moraes

(alexandre.lara@yahoo.com)

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