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UAB – UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL

FUESPI – FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ


NEAD – NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA

CONTEÚDOS E MÉTODOS DAS CIÊNCIAS


DA NATUREZA
Elinalva Ribeiro Barbosa Almeida
Roselis Ribeiro Barbosa Machado

FUESPI
2014
A444c Almeida, Elinalva R. Barbosa.

Conteúdos e métodos das ciências da natureza / Elinalva R.


Barbosa Almeida, Roselis Ribeiro B. Machado. - 2014.
110p.

ISBN 978-85-8320-061-1

Material de apoio pedagógico ao curso de Licenciatura Plena


em Pedagogia do Núcleo de Educação à Distância da Universidade Es-
tadual do Piauí – NEAD/UESPI, 2014.

1. Ciência. 2. Ciências naturais. 3. Métodos.


I. Título.
.

CDD 370

Ficha elaborada pelo Serviço de Catalogação da Biblioteca Central da UESPI


Grasielly Munizz (Bibliotecária) CRB 3/1067
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Coordenador do curso de Licenciatura Plena em Pedagogia – EAD


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Diretora Adjunta
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Licenciatura Plena em Pedagogia
Antoni Francisco Soares
UAB/FUESPI/NEAD
Coordenador de Tutoria
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2231, bairro Pirajá, Teresina (PI).
Coordenadora de Produção de CEP: 64002-150, Telefones: (86)
Material Didático 3213-5471 /
Silvana Maria Pantoja dos Santos
3213-1182
Autoras do Livro
Elinalva Ribeiro Barbosa Almeida Web: ead.uespi.br
Roselis Ribeiro Barbosa Machado E-mail:eaduespi@hotmail.com

CONSELHO EDITORIAL
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Elio Ferreira de Souza (UESPI)
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José Augusto de Carvalho Mendes Sobrinho (UFPI)
José da Cruz Bispo de Miranda (UESPI)
Lucirene da Silva Carvalho (UESPI)
Margareth Torres de Alencar Costa (UESPI)
Nize da Rocha Santos Paraguassu Martins (UESPI)
Roselis Ribeiro Barbosa Machado (UESPI)
Silvana Maria Pantoja dos Santos (UESPI/UEMA)

MATERIAL PARA FINS EDUCACIONAIS


DISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS CURSISTAS UAB/FUESPI
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO
UMA VISÃO GLOBAL: VAMOS CONHECER A DISCIPLINA CIÊNCIAS
DA NATUREZA: CONTEÚDO E METODOLOGIA....................................07

UNIDADE 1
1.0 INFLUÊNCIAS DA CIÊNCIA CLÁSSICA SOBRE AS TEORIAS E
SISTEMAS EDUCACIONAIS....................................................................11
1.1 Os meandros do conservadorismo......................................................11
1.2 Educação moderna: a do tempo e do espaço absolutos.....................13
1.3 O ritmo da razão substitui o ritmo da natureza....................................19
1.4 Um mundo monádico...........................................................................24
1.5 Retorno à natureza...............................................................................27
1.6 Quando fazer é educar e vice-versa....................................................37
2.0 Ciência: Evolução, Aspectos Conceituais e Classificação
das Ciências...............................................................................................41

UNIDADE 2
2.0 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE CIÊNCIAS NATURAIS...............51
2.1 Breve histórico do ensino de ciências naturais: fases e tendências dom-
inantes........................................................................................................51
2.2 Por que ensinar ciências naturais no ensino fundamental: ciências
naturais e cidadania...................................................................................55
2.2.1 Ciências Naturais e Tecnologia.........................................................57
3.0 Aprender e ensinar ciências naturais no ensino fundamental..............62
3.1 Objetivos gerais de ciências naturais para o ensino fundamental.......67
3.2 Os conteúdos de ciências naturais no ensino fundamental.................68
3.2.1 Blocos temáticos...............................................................................70
3.2.2 Ambiente...........................................................................................71
3.2.3 Ser humano e saúde.........................................................................76
3.2.4 Recursos Tecnológicos......................................................................80

UNIDADE 3
3. INTRODUÇÃO.......................................................................................87
3.1 Didática: aspectos conceituais.............................................................87
3.1.1 Relação Professor-Aluno no Processo Ensino-Aprendizagem.........88
3.1.2 Metodologia e Método.......................................................................89
3.1.3 Recursos didáticos ...........................................................................91
3.1.4 Avaliação (Instrumentos/Dispositivos Avaliativos).............................95
3.2 Formação Continuada do Professor e a Contribuição das Estratégias
Metodológicas para o Ensino de Ciências...............................................101

REFERÊNCIAS........................................................................................104
APRESENTAÇÃO

VISÃO GLOBAL DA DISCIPLINA E DOS SEUS OBJETOS DE ENSINO


Bem-vindo (a) à disciplina Ciências da Natureza: Conteúdo e
Metodologia em que exploraremos, em forma de síntese, um conjunto de
conhecimentos teórico-metodológicos, relativo ao processo de ensino,
aprendizagem e pesquisa. Neste sentido, a referida disciplina do Curso de
Licenciatura em Pedagogia da Universidade Estadual do Piauí – UESPI,
modalidade a distância, operacionalizada pelo Sistema Universidade Aberta
do Brasil – UAB /CAPES será uma etapa do curso de formação, organizada
com os seguintes desafios:

►► A socialização do saber cientifico para todos;


►► Apropriação e entendimento do processo de
produção acessível à maioria das pessoas escolariza-
das;
►► Incorporação à prática docente e aos programas
de ensino dos conhecimentos de ciência, métodos, téc-
nicas, recursos didáticos, e avaliação da aprendizagem
relevantes para a formação cultural dos discentes;

A notícia, a seguir, traz reflexões importantes sobre a produção do


conhecimento:

REVISTA ISTO É

GENIALIDADE FEITA EM CASA

Segundo André Julião, na última década, cada vez mais pes-


quisadores brasileiros ganharam destaque na comunidade científica in-
ternacional. Em todas as áreas do conhecimento, homens e mulheres
nascidos aqui – e, mais importante, que atuarem no país estão con-
tribuindo para a cura de doenças, a criação de novos combustíveis, a
busca de fontes alternativas de energia e a exploração de petróleo em
áreas nunca antes exploradas. Destaca que embora o atraso ainda seja
enorme, os números dão uma boa ideia da evolução da nossa produção
cientifica. Entre 1997 a 2007, o número de artigos brasileiros em revistas
especializadas mais do que dobrou. Soma o 13º país em publicações,
ultrapassando nações ricas como Holanda e Suíça. As Universidades
daqui formaram em 2010 o dobro de doutores de 2001.
De volta ao lar ao estudar o cérebro de ratos o neurocientista
Fábio Papes, 35 anos, ajuda a desvendar problemas humanos como
síndrome do pânico, estresse pós-traumático e esquizofrenia. Filho de
uma família de classe média de Jundiaí (SP), graduou-se em Biologia e
fez doutorado na Unicamp. Depois cursou seu primeiro pós-doutorado
na Universidade de Harvard (EUA) e voltou ao Brasil em 2006. Trabalha
em um laboratório tão bem equipado quanto aos americanos” diz o pro-
fessor da Unicamp.

A partir dessa notícia, algumas perguntas são oportunas:


O que significa conhecimento, ciência e pesquisa?

Qual a importância dessas questões na vida da socie-


dade? Como lidar com elas no campo acadêmico e em
outros campos de intervenção profissional?

Esses e outros questionamentos revelam o quanto essa disciplina


é importante e necessária para o desenvolvimento de pesquisas, de
aprendizagem, de descoberta de novos saberes, ocultos nas diferenças,
estabelecendo inter-relações nas diversidades cultural, social, ambiental e
história dos fatos estudados.
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

UNIDADE 1
INTRODUÇÃO À EPISTEMOLOGIA DAS CIÊNCIAS
NATURAIS: CARACTERÍSTICAS, PRINCÍPIOS
FILOSÓFICOS E METODOLÓGICOS

OBJETIVOS

• Conhecer o histórico dos sistemas educacionais;


• Relacionar a ciência clássica com os sistemas educacionais;
• Reconhecer a importância da ciência.

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1. INFLUÊNCIAS DA CIÊNCIA CLÁSSICA SOBRE AS TEORIAS E


SISTEMAS EDUCACIONAIS

1.1. OS MEANDROS DO CONSERVADORISMO

A educação formal quase sempre permanece na retaguarda em


relação ao avanço das ciências. Este fato se vincula a vários fatores, dentre
os quais destacarei alguns mais significativos.
Em primeiro lugar, o conservadorismo educacional se deve a
que os sistemas educacionais, historicamente, se ligaram a entida¬des
confessionais cujos princípios e objetivos se vinculam, por sua vez, a
dogmas e, com isto, os avanços científicos nem sempre estão em acordo
com tais formulações doutrinárias. Destacou-se, na parte anterior, que o
dogmatismo tanto se manifestou na religião quanto na ciência.
Outro fator determinante, nesta questão, vincula-se ao fato de que
os sistemas educacionais se subordinam aos poderes públi¬cos. Neste
caso, os interesses políticos conduzem os sistemas de conformidade
com as conveniências políticas. As conveniências políticas mudam de
acordo com os interesses e princípios políticos dos governantes que estão
momentaneamente no poder. Os sistemas educacionais públicos nem
sempre têm, pois, a continuidade desejável. Tampouco são os sistemas
pensados por si mesmos, mas o são em função do pensamento político
reinante, de acordo com os que governam, que nem sempre são detentores
de ideias úteis e eficientes ou significativas para a educação, nem para os
interesses coletivos. Permanecem ainda muito válidas as palavras de Kant,
quando, em sua obra Sobre a pedagogia (1996, p. 24-25), afirma:
Com os príncipes acontece o mesmo. Mais vale que
sejam sem¬pre educados por algum dos seus súditos do que
pelos seus pa¬res. Não se pode esperar que o bem venha do
alto, a não ser no , caso em que lá a educação seja primorosa.

Aqui é necessário, portanto, contar mais com os esforços


particulares do que com a ajuda dos príncipes, como julgaram Basedow
e outros; uma vez que a experiência ensina que os príncipes, para atingir

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

seus objetivos, se preocupam não com o bem do mundo, mas com o bem
do seu Estado. Se prestam auxílio à educação com dinheiro, reservam-se
o direito de estabelecer o plano que lhes convém.
Se por “príncipes” se entende, hoje, as autoridades, o poder
personificado, não há muito que retocar na afirmação do grande mestre de
Konigsberg.
Fator comum aos sistemas confessionais e aos sistemas go-
vernamentais, sendo poderes amplos, é um certo senso de conveni¬ência
determinado pelas circunstâncias de lidar com a coisa pública, a fim de não
provocar rupturas, quer entre os membros de igrejas, quer entre os civis de
tendências políticas múltiplas e, por vezes, divergentes dos que governam.
De qualquer forma, todos os sistemas, das várias subordinações, são
pressionados por fatores que não são sempre os que mais lhes convêm.
Esta é uma questão complexa que nunca terá solução desejável.
Os subsistemas educacionais particulares, de caráter empresarial
e, portanto, de ação mais livre, menos comprometida com os sistemas
oficiais, sofrem, por sua vez, pressões múltiplas: dos governos, das igrejas
a que seus membros pertencem, dos pais, dos alunos pagantes e assim
por diante, dos objetivos empresariais e do capital.
Outro fator moderador das concepções, filosofias, métodos, teorias
e comportamentos, de modo geral, decorre da moda. Há teorias, filosofias,
metodologias, programas de ensino etc., que por algum motivo, quase
sempre de prestígio, se tornam moda. A criticidade é deixada de lado, para
seguir a moda em voga. “Porém, as modas” — diz Popper — ,”sobretudo em
filosofia, não deveriam ser aceitas. Deveriam ser examinadas criticamente,
porque elas mesmas não passam de ‘ismos’ acriticamente aceitos”
(POPPER, 1983, p. 55).
A partir destas considerações, constatam-se elementos suficientes
para afirmar que tudo quanto chega à educação através dos sistemas
educacionais chega após uma espécie de filtragem ou sele¬ção prévia.
Aliás, a crítica em si é positiva. Faz parte da natureza do processo científico,
como faz parte da natureza da educação.
Finalmente, no processo educacional através do qual a ciência,

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“patrimônio da humanidade” (principalmente da mais poderosa), flui, há


o problema da “liberdade de cátedra”. Esta fica, quase sempre, limitada
por instâncias diversas: governo, igreja, direção da instituição educacional,
enfim, por tudo aquilo que Althusser denomina “aparelhos”.
Por esses caminhos, por vezes tortuosos, passam as influências
externas da educação formal (e também da informal). Ficam aqui
entendidas as leis, as normas, os regimentos, os regulamentos, pois estes
são determinados pelas instâncias que foram nominadas. Com isso se
explica também certa lentidão com que as ciências chegam a influenciar
a educação. O conceito de sociedade administrada dos frankfurtianos se
aplica perfeitamente ao campo educacional.
Há que se notar, também, que os sistemas que gerem a educação
formal apresentam extrema complexidade. A educação envolve, além de
formação e informação científica, inúmeros outros aspectos essenciais
e acidentais de extrema complexidade, por dizerem respeito ao sistema
complexo que é o próprio ser humano.
Neste estudo, o conceito de educação é o mais amplo possível.
Entende-se todo o processo por que passam os indivíduos e a sociedade
humana, no sentido da compreensão que formam de si próprios, tanto
indivíduos quanto sociedades, e a compreensão de mundo que adquirem,
com vistas à busca de seu próprio desenvolvimento pleno, num contexto de
finitude e descontinuidade, mas sempre comunicativo, auto-organizacional
e hermenêutico (interpretativo). O desenvolvimento pleno não se coloca
como um ponto a que de fato se chega, mas como meta a ser buscada, no
sentido do permanente devir, utopia.

1.2. EDUCAÇÃO MODERNA: A DO TEMPO E DO ESPAÇO ABSOLUTOS


Com este ponto de partida, pode-se, agora, analisar as influências
que o modelo de ciência clássica exerceu sobre a educação. O alvorecer
do mundo moderno surge, ao final da Idade Média, com a construção
do modelo clássico de ciência. Anteriormente, dissertei sobre várias
características desse modelo, herança que a atua¬lidade ainda carrega
consigo. Se a ciência clássica representa o auge da especialização, da

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

disciplinarização e da objetivação adquirida no curso de sua história com


tudo o que disto decorre, na verdade fortes rupturas ocorreram para que
isso se consolidasse. O mundo ocidental, no início da modernidade, deixava
a tutela de um poder unificador poderoso: a cristandade. Durante mil anos
o cristianismo exerceu tutela sobre toda a vida intelectual através da Igreja
hierárquica. A cultura era um privilégio dos clérigos. O poder temporal era-lhe
relativamente submisso. O ensino era praticado sobretudo pelos clérigos.
A ciência das ciências era a Teologia. Esta começou a sistematizar-se no
século XI. Até o século XII consolidou-se e atingiu o apogeu no século XIII.
A decadência ocorreu no período entre os séculos XIV e XVII.
O Renascimento Carolíngio é marcado pela fundação, por todo
o império de Carlos Magno, de escolas oficiais cujas influências se
estenderam aos séculos XII e XIII. Estas escolas resultaram, como lembra
Corbisier (1988), das “capitulares” de 787. As escolas se dividiam em
interiores ou monacais, pois funcionavam em mosteiros, e as exteriores,
destinadas aos padres seculares. Junto às catedrais funcionavam as
escolas catedrais episcopais ou capitulares. Estas se dividiam em escolas
internas, destinadas aos padres e externas, para os leigos.
O programa de ensino era assim dividido:
a) Trivium — composto pela gramática, retórica e dialética;
b) Quadrivium — composto pela aritmética, geometria,
as¬tronomia e música.
Otrivium e oquadrivium representam as artes liberais. Além destas,
o programa abrangia as ciências naturais, a filosofia e a teologia.
Quanto ao método, transcrevemos o que diz Roland Corbisier (1988,
p. 116): “O método adotado, mesmo em relação às ciências naturais, não
consistia na observação dos fatos e na experiência, mas no comentário de
textos cujos autores eram considerados ‘autoridades’”.
Entre as principais obras que serviam às escolas carolíngias da
Idade Média, destacavam-se o Timeu de Platão, tratados de Aristóteles,
oIsagogé de Porfírio, obras dos estóicos romanos, os livros dos Padres,
Santo Agostinho, bem como as obras de Boécio, o grande lógico e mestre
da lógica da Idade Média. Faziam-se leituras e comentários dos textos.

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Estas leituras constituíam as lectiones. As discussões se constituíam das


famosasdisputationes, ou questiones disputatae. Aqui se arrolavam os
argumentos que vinham respaldados pelas citações de autoridades. As
obras que tratavam de problemas isolados denominavam-se Gpuscula, e
os grandes tratados eram as Summa. Especialmente famosa é a de Santo
Tomás de Aquino, entre outras. Outros também escreveram Summa, como
Alexandre de Hales.
Hoje já não se aceita mais tão pacificamente a idéia de que a Idade
Média tenha sido a idade das trevas, ou um período de obscurantismo.
As contribuições da Idade Média foram indispensáveis. As grandes
sistematizações do pensamento tiveram aí sua origem e nascedouro.
Whitehead diz que “descontados todos os defeitos da escolástica, seu
sucesso foi inegável. Ela formou as bases intelectuais para um dos períodos
de maior progresso conhecidos na história”. Diz, a seguir, que a herança da
Idade Média não se perdeu, mas, pelo contrário, serviu de base para que,
na modernidade, se fundassem as ciências naturais e morais, expressas
com fundamento nos primeiros princípios que a escolástica legou (1975).
Jocosamente, diz este filósofo que os homens da Renascença (a propósito
da influência da Idade Média e dos clássicos) nunca sabiam se sacrificavam
um galo a Esculápio (como recomendara Sócrates aos amigos, antes de
morrer pela cicuta) ou se mandariam rezar uma missa. Conclui dizendo
que se acomodaram, fazendo ambas as coisas. Isto retrata exatamente
o espírito do Renascimento: renovador, cristianizado e ainda sob uma
avassaladora influência da Idade Média e encantado com a maravilha
do pensamento e do modus vivendi dos clássicos, sobretudo gregos. A
Weltanschauung da Renascença era este compósito de Idade Média e de
classicismo. Este foi o caldo onde se preparou a ciência da natureza para
emergir vigorosamente. Aliás, isto mesmo se constitui em prova de que não
há simplicidade na história dos humanos. É complexa. As características de
um tempo se mesclam profundamente em outro. Assim, a divisão do tempo
histórico serve para fins didáticos e não para simplificar o que é complexo.
Mesmo sob o impacto das formulações científicas rigorosas
realizadas por Copérnico, Keppler, Galileu e Newton, os fundamentos

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

educacionais em todos os tempos mantiveram sempre estreito vínculo


epistemológico com a revelação bíblica. As universidades tiveram sua
origem profundamente marcada pela teologia. O Renascimento tem duas
faces bem distintas: um Renascimento das minorias exíguas, cultas,
que usufruíram a produção tanto intelectual como técnica. A outra, a das
grandes maiorias, submersa na ignorância, à margem da modernidade
nascente, subserviente dos poderosos. A própria modernidade trazida pelo
novo modelo científico de análise matemática foi vivida sob duas faces
bem distintas: por um lado, dominou a força do pensamento expresso
sob a forma da técnica, da ideologia, do poder pelo saber. Por outro, e
concomitante, prevaleceu a força bruta dos condottieri,entre eles nobres
e eclesiásticos, até papas, fascinados pela guerra, em correrias belicosas
intermináveis. Neste contexto viveu uma figura das mais notáveis que o
mundo de então conheceu: Leonardo da Vinci (1452-1519). Uma carta que
escreveu a Lodovico Sforza, o Mouro, representa bem estes dois lados
da competência típica que procuraremos mostrar e que perdura até hoje.
Depois de enumerar, na sobredita carta, em nove itens, toda sorte de
artefatos de guerra que se dispunha a construir para Lodovico, destacando-
lhe as qualidades mortíferas e assustadoras com forte realismo, no décimo
item diz que, em tempo de paz, poderia “dar perfeita satisfação e igual a
qualquer outro em arquitetura e construção de edifícios públicos e privados”,
além de “encarregar-me do cavalo de bronze, que seria para imortal glória
e honra eterna do príncipe vosso pai de feliz memória e da ilustre casa
dos Sforza” (Bronowski; Mazlisch, 1988, p. 29-30). Para os padrões de
Florença, Leonardo era, de fato, um homem inculto. Para Milão, as coisas
eram diferentes, pois aqui dominavam os Sforza, condottieri do tipo self-
made man. Os ricos banqueiros florentinos orgulhavam-se de suas escolas
e eram sobejamente cultos. Esta era uma realidade inteiramente nova,
gerada no seio do novo modelo científico. Por um lado, temos o saber
intelectual, herança medieval. Por outro, o saber científico que se traduz na
técnica, ou seja, na tecnologia dos artefatos. O conhecimento não busca
mais as essências ou a resposta à pergunta “o que é?”. Agora, a nova
ciência se interessará muito mais pelo “como”, principalmente pelo “como

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se faz”. “Agir e fazer” se tornam distintos.


Não podemos pensar que a ciência newtoniana encontrou grandes
massas nas escolas e universidades. Pelo contrário, até o fim do século
XIX o acesso à educação formal permaneceu restrito às minorias. Contudo,
o surgimento da ciência moderna coincide com a laicização. Os leigos
assumem o domínio dos rumos das ciências daí por diante.
Em tempo algum a filosofia da educação foi unitária. Para os fins
deste estudo interessa saber em que medida a ciência moderna influenciou
a educação. Fica bem claro que com o surgimento da ciência moderna
a educação recebeu novas influências, e novas preocupações surgiram:
a filosofia, como sistema de interpretação universal, alicerçou-se em
novas bases epistemológicas na medida em que a experiência ganhou
importância. Deve-se, porém, estar atento a uma espécie de direcionamento
aparentemente contraditório. Se, por um lado, a matemática é a nova ótica
através da qual se “lêo mundo”, por outro, a razão, como fundamento
epistêmico, também ganha espaço mais amplo. A rejeição da autoridade
da Igreja, com o consequente movimento de laicização, corresponde a
exacerbação do racionalismo que, por sua vez, se sustenta na força das
ideias, naratioque ilumina o saber fazer. Processo semelhante e com
as mesmas contradições se verifica no interior da Reforma: pietismo
acentuado, por um lado e, por outro, uma ética protestante (de idênticas
raízes), com características pragmáticas, origem do capitalismo, segundo
Max Weber, em sua obra Ética protestante e o espírito do capitalismo (1984).
Os conceitos de capitalismo, acumulação, ética econômica racionalista se
originaram no seio do desenvolvimento protestante, eivado por movimentos
pietistas que, no decurso da história, tiveram características comuns e
divergências teológicas. Em comum, todas tiveram a característica de uma
ética da acumulação justificada como graça divina. Elementos de ascese
religiosa se mesclam à ética capitalista da acumulação pelo trabalho e pelo
lucro.
Michael Lowy escreveu um artigo intitulado Ética católica e o
espírito do capitalismo: o capítulo da sociologia da religião de Max Weber
que não foi escrito (1992). Nele o autor afirma que “Paradoxalmente, A ética

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

protestante éum dos escritos de Max Weber que menos tem a dizer sobre
esta questão. Embora o primeiro capítulo trate extensamente das diferenças
no desenvolvimento econômico entre as áreas com predominância católica
ou protestante na Alemanha, há pouco empenho em examinar as barreiras
para o crescimento capitalista impostas pela cultura católica” (Lowy, 1992,
p. 87). Referindo-se, adiante, à obra weberiana Economia e sociedade, diz,
ainda: “Esta análise é extremamente perspicaz e nos ajuda a entender tanto
a oposição dos católicos latino-americanos à natureza fria e impessoal das
relações capitalistas como sua luta, em nome da justiça profética”.
A Reforma representa uma ruptura histórica dentre muitas outras,
no cristianismo manifesto através da cristandade, onde autoridade religiosa
e autoridade política se diluem. O cristianismo unitário estava rompido. A
unidade doutrinária se torna pluralidade que se polariza em várias formas.
A ética rompe os vínculos estritamente religiosos e cria novos parâmetros e
novos fundamentos morais. A fundamentação teórica do capitalismo exigia
bases novas para a ética e novas justificações. A nova ética encontrou
no calvinismo a mais aguda formulação prática pela glorificação da nova
economia do século XVII (Bronowski; Mazlisch, 1988).
A ruptura com a visão de totalidade não é propiciada pela pluralidade
emergente, que sempre é benéfica, mas o que se tornou ruptura maléfica
foi o dogmatismo das posições que foram se polarizando. A modernidade
impôs, mesmo a contragosto, uma adaptação às necessidades mundanas
do universo econômico nascente. Esta adaptação os puritanos a fizeram
com relativa facilidade. O mesmo não ocorreu com os jesuítas, quando
tentaram uma adaptação similar. A Igreja Católica com sua tradição
milenar unitária sempre ofereceu mais resistência às adaptações. O
protestantismo com suas várias formas surgiu de uma ruptura realizada por
Lutero, mas que tinha sido fermentada dentro da própria universidade. As
rupturas doutrinárias se sucederam e prosseguem sempre. Nas rupturas
protestantes permaneceu a Bíblia como núcleo comum de tendências muito
diversificadas. Católicas ou protestantes, as igrejas,a dominação patriarcal
tradicional sobre as comunidades camponesas”(Löwy, 1992, p. 89). Alhures,
diz: “A igreja dos pobres latino-americana é a herdeira da rejeição ética

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do capitalismo pelo catolicismo - a ‘afinidade negativa’ - e especialmente


desse socialismo cristão da tradição francesa e europeia” (Löwy, 1992, p.
99). São responsáveis por rupturas significativas e dicotomizantes, tal como
o entendimento sobre o ser humano como corpo e alma, o terrestre e o
celeste, o bem e o mal, herança da filosofia greco-romana principalmente. A
moral se tornou um fardo pesado e complicado, produto de uma exacerbada
racionalidade. Ninguém melhor que Nietzsche a descreveu como algo que
avilta os seres humanos, anulando-os, amesquinhando-os, diminuindo-os
ante si próprios.

1.3. O RITMO DA RAZÃO SUBSTITUI O RITMO DA NATUREZA


Todas estas dicotomias contribuíram para determinar o
pensa¬mento e a prática educacionais do mundo moderno. O ritmo da
natureza foi substituído pelo ritmo da razão que, afinal, é uma manifestação
extraordinária da natureza. O movimento moderno em direção da
individualidade - tendência do Renascimento em geral e da Reforma
em particular — impeliu a educação na direção do atendimento das
ne¬cessidades individuais, ainda que timidamente.
Feltre (1378-1446) dirigia uma escola em Mântua, denominada
Casa Giocosa. E uma das primeiras manifestações organizadas da
educação voltada para o indivíduo e suas necessidades. A educação faz
sua adequação ao educando e não ao educador. Esta nova postura se
coa¬duna com o modelo experimental da ciência.
Se citamos Feltre, não o fizemos porque tenha conseguido impor
largamente um modelo de educação, mas pela significação que tem
seu procedimento pedagógico singularmente inovador. Igual tendência
manifestou Jean-Louis Vives (1492-1540), que “considerava que pode ser
concebida uma didática justa e eficaz, baseada nas experiências com êxito
do mestre” (Suchodolski, 1984, p. 26). A propósito, Suchodolski fez um
estudo das tendências educacionais, intitulado A pedagogia e as grandes
correntes filosóficas, no qualbusca, de certa forma, classificar as tendências
pedagógicas em essencialistas e existencialistas, as vertentes filosóficas
básicas de toda a pedagogia, segundo sua ótica. Segundo o autor, esta

19
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

discussão foiformulada na Renascença e se estendeu até o fim do século


XVII.
E de se notar que o período desta discussão coincide com o
período em que se configurou o modelo newtoniano de ciência. O elemento
novo introduzido nesse período, na educação, é o da existência. Assim se
expressa o autor:
A orientação moderna manifestou-se através de uma filosofia
que utilizava a noção de Natureza. Esta filosofia perfilhava a
orientação principal das investigações no domínio das ciências
sociais. No século XVII e, ainda, no século XVIII - retomando as
tradições antigas, particularmente as estóicas, e utilizando os
resultados das modernas ciências da Natureza - fez-se grande
progresso no sentido de uma concepção laica e científica das
leis da Natureza; o intuito destes trabalhos era alcançar uma
compreensão da Natureza que permitisse definir as bases quer
da vida dos homens nas relações entre si, quer da atividade
humana em todos os seus domínios. De fato, todos os esforços
feitos neste sentido formaram uma concepção geral designada
mais tarde ‘Sistema natural da cultura’. (Suchodolski, 1984, p.
30).

O sistema natural da cultura fundamentou as teses essencialistas18.


Eram as variantes tradicionais da filosofia platônica e aristotélico-tomistas.
Além de conter os princípios da religião natural, da Essa dicotomia já não
pode mais ser aceita como um sistema binário perfeito, nítido em suas
fronteiras. Ela é fruto de discussões filosóficas históricas já superadas.
Fundamenta-se num modernismo marxista que esteve presente com muita
força também no Brasil desde o final da década de 60 e se estende até
nossos dias. No contexto do pensamento pós-moderno dos mais diferentes
matizes já não se mantém. A crítica ao projeto moderno iluminista se
encarregou de a desconstruir. Política e do Estado e de legislação baseada
no direito natural, continha, ainda, os princípios de moral resultantes da
ordem natural. Desta concepção de mundo, a partir da natureza, resultou
o sistema de Comenius (1593-1670). Comenius era herdeiro do pensar
renascentista, em que se recomendava o tratamento ao educando segundo
o modelo da necessidade natural, como o jardineiro procede em relação às
plantas.

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O modelo proposto por Comenius segue o conceito de história da


salvação, pois adota como objetivo final da educação o retorno à essência
comprometida do homem pecador. Sua visão é bíblica: “Por natureza não
entendemos a corrupção que, a partir da Queda, atingiu todos os homens
[...] mas o nosso sistema espiritual original e essencial, ao qual devemos
ser conduzidos como a um estado preliminar.” — diz o grande educador na
Didactica magna.
Em Comenius, através de sua Didactica magna (1985), a idéia
de natureza vem perpassada pelo dado revelado da “queda”, ou pecado
original. Portanto, ainda que o ideal seja o da natureza, a doutrina pedagógica
de Comenius remete a um estado “anterior”, isto é, anterior ao pecado
original. Esse estado é, para ele, o estado da verdadeira natureza (antes
de ser corrompida pelo pecado). A educação se põe como processo de
redenção ou, melhor, faz parte do plano salvífico de Deus, sentido buscado
no sacrifício de Cristo pela redenção do mundo que se realiza pela volta
do ser humano à sua natureza anterior à corrupção do pecado original. O
projeto educacional é parte do projeto divino de salvação estendido a todos.
Fica, aqui, mais uma vez evidenciada a dicotomia entre homem e
natureza. Natureza concreta e homem concreto estão muito longe desse
ideal de natureza e de homem. Separa-os o abismo do pecado — homem
corrompido, portanto, natureza corrompida. Não se pode ignorar, porém,
que o esforço de Comenius é de recompor ou reconstituir a unidade interna
do homem, ou seja, devolvê-lo a seu estado de totalidade essencial: homem/
mundo, homem/natureza, um intento, inovador para seu tempo, pois em seu
plano pedagógico havia lugar para todos, uma vez que todos são, segundo
o conceito religioso bíblico, filhos de Deus e, portanto, incluídos no plano
educacional. O afastamento do ser humano em relação à natureza é, em
Comenius, um afastamento interno pela corrupção advinda do pecado e
externo, porque o pecado expulsou o ser humano das delícias do paraíso
que agora, pela educação, busca reconquistar, por graça de um salvador,
Jesus Cristo. Cristo propiciou essa economia salvífica capaz de redimir o
ser humano da antiga culpa, fazendo dele um ser novo.
Locke, que tão significativa contribuição deu à ciência, também

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

emitiu seu pensamento sobre a educação. A formação moral dos jovens a


que se refere conduz à formação do gentleman, que caracteriza a formação
oferecida pelas universidades inglesas. Bronowski e Mazlisch (1988,
p. 472) externaram preocupação idêntica à nossa, quando afirmaram:
“Quando tratamos de Hobbes e Locke, dissemos que a física galileana
e newtoniana ‘tinha fornecido o modelo da sociedade como sendo uma
construção artificial, constituída por átomos individuais de humanidade”.
Mas tinha deixado sem resposta a questão básica: a natureza do bloco de
construção fundamental - o homem? (grifo nosso).
Formar o gentleman é trabalhar alguns aspectos exteriores do
homem ou, melhor, de alguns raros homens, pois esta qualificação só
dizia respeito às classes dominantes e elitizadas. Portanto, a educação
do gentleman não é acessível às maiorias. É, por natureza, um conceito
excludente. Voltaire, tendo permanecido por três anos na Inglaterra (1726-
1729), ao retornar, difundiu a postura do gentleman na França.
Fez uma espécie de composição entre o racionalismo cartesiano
e o empirismo inglês. Deste encontro de idéiasempiristas inglesas e
o desejo de reforma francês surgiu a Encyclopedia, escrita segundo os
parâmetros do Dicionário de Bayle. Diderot, D’Alembert, Voltaire e os
demais enciclopedistas, ao se proporem a produzir a mudança de pensar
pour changer la fa çoncommune de penser, estavam impondo um modo
de pensar segundo suas próprias imagens e semelhanças. As “Luzes”
se inclinaram à promoção da arrogância dos déspotas esclarecidos que
menosprezavam o povo, a exemplo de Frederico, o Grande, que, ao
referir-se ao povo usava a expressão “raça maldita”. Em cartas a este,
Voltaire, por sua vez, ao referir-se ao povo, denomina-o de “ralé”, como
fazia costumeiramente. “Não é uma contradição” - afirmam Bronowski e
Mazlisch - “afirmar que há leis naturais a respeito das quais todos os seres
humanos, em qualquer parte do mundo, devem estar de acordo e depois
chamar ‘ralé’ ao povo?”
Fica claro que no período das luzes, em particular Voltaire e os
enciclopedistas não supuseram serem extensivos à maioria os valores
que defenderam. Prestaram-se bem ao papel dos nob (que significa

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sinenobilitate), numa atitude facciosa e de visão estreita, egocêntrica, capaz


de ver apenas uma parcela diminuta da humanidade, a mais favorecida,
nem sempre pelo nascimento, mas, muitas vezes, pelos favores das
posições cômodas que ocupava. A unidade na pluralidade que o modelo
clássico de ciência lhes oferecia serviu, na prática, apenas a teorizações
sobre as ciências sociais, sem vínculo real com o ser humano a quem a
ciência se destina.
O século XVII foi marcado por concepções filosóficas diferentes, que
tiveram grande repercussão sobre os séculos seguintes. Os enciclopedistas
veicularam as contribuições que influenciaram fortemente o século XVIII. A
propósito, Hobbes (1979, 1993) defendera a tese do homo homini lupus, ou
seja, a maldade fundamental do homem, cuja organização social e política
visaria prover a salvaguarda contra a violência natural de uns contra os
outros. A maldade fundamental era um princípio de que deveria partir a
educação de qualquer ser humano, pois esta era sua natureza. Fundado
na concepção hobbesiana, Mandevillle, em Ancssayoncharity and charity
schools, tira conclusões pedagógico-educacionais de que o homem deve
ser entendido exatamente segundo esta sua natureza agressiva, e como
tal educado.
Hobbes coloca a própria organização política na defensiva contra
uma natureza (humana) sempre pronta a desencadear a rapacidade. Veja-
se o seguinte trecho de O Leviathan: “A natureza, arte pela qual Deus fez e
governa o mundo, é imitada também pela arte do homem, como em muitas
outras, no fato de ele poder fazer um animal artificial. Pois é pela arte que
se cria esse grande LEVIATHAN, chamado comunidade, ou ESTADO,
em latim CIVITAS, que não é senão um homem artificial; ainda que de
maior estatura e grandeza do que o natural, para cuja proteção e defesa foi
pensado” (Hobbes de Malmensbury, 1979).
E bem interessante notar um detalhe da interpretação hobbesiana
da natureza humana: a natureza do todo não é igual à natureza das partes.
O homem, essencialmente agressivo e mau, constitui uma organização
composta de homens que, nesse novo conjunto (o Leviathan- o Estado, a
comunidade, acivitas), tem uma natureza que se opõe à agressividade do

23
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

lúpus devorador. A essa nova natureza Hobbes chama de “homem artificial”


em oposição ao homem natural. Esse homem artificial seria o controlador
do homem natural.
Outro detalhe importante desse texto de Hobbes diz respeito à arte
como expressão criativa. Neste caso, a criatividade se expressa na criação
de um ser artificial cuja natureza difere de seu artífice, ainda que a matéria-
prima da obra seja sua própria natureza. Fica evidenciado um problema de
interesse: a construção da ciência da natureza não contou com nenhum
gênio da estatura de Newton que estudasse a natureza humana, até o
século XIX. Dessa maneira, a educação ficou à mercê de teorias que
serviram muito mais a outros interesses (o comércio, a navegação com fins
comerciais e bélicos, o controle social das cidades-estados, a arquitetura
etc.).

1.4 UM MUNDO MONÁDICO


O gênio de Leibniz trouxe contribuições decisivas para a
matemática e para a filosofia. As idéias de continuidade e de plenitude do
mundo levaram Leibniz a concluir que este é o melhor mundo possível, pois
contém mais realidade, é pleno e o mais perfeito. Não havendo, no universo,
nada que seja real e não seja, ao mesmo tempo, infinito, o universo se
constitui de substâncias simples ou manadas. São inextensas, contêm em
si todo o passado e todas as determinações do futuro e só são conhecidas
plenamente pela mônada suprema, que é Deus. Adotando o princípio de
que “nada está no intelecto que antes não tenha estado nos sentidos”,
acrescenta “nisi intellectus ipse” (a não ser o próprio intelecto). Não há,
segundo Leibniz, dois universos iguais. Como cada mônada representa
todo o universo por si, asmônadas não interagem externamente, “E as leis
que regulam sua interdependência e sucessão estão garantidas por uma
harmonia preestabelecida por Deus, que as criou como se fossem muitos
relógios perfeitos, eternamente concordantes entre si, cada um regido
por sua própria lei.” (Enciclopédia Mirador Internacional, 1980, p. 6720).
Portanto, o sentido do desenvolvimento das mônadas está nelas próprias,
pelo que não há interação pedagógica possível, dada a completude de

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cada mônada. A filosofia de Leibniz pressupõe uma pedagogia exclusiva


da individualidade solitária, monadológica. Não havendo, no universo,
dois seres iguais, a comunicação dialógico-educativa não se faz ad extra.
Contribuição notável, porém, para o conhecimento do homem em si são
os indicativos de um “subconsciente” presente na filosofia racionalista de
Leibniz. Suas grandes formulações, porém, dizem respeito à matemática
e à lógica, onde se revela a plenitude de seu gênio criador. Se, por um
lado, a conceito de mônada expressa a unidade, o fechamento de cada
mônada em si acaba por se tornar, por outro, uma filosofia dos fragmentos
monadológicos. Mas deve- se notar com clareza que cada mônada possui
em si os elementos do universo. Isto é, no mínimo, uma visão de totalidade e
que diz, de certa forma, da universalidade de cada mônada, pela existência,
em cada uma, de todo o presente e o futuro, bem como o passado. Há,
nisto tudo, um certo paradoxo que faz com que a reflexão não cesse. Nisto
está o valor universal da filosofia de Leibniz.
Em pleno iluminismo, gozando da amizade dos enciclope¬distas
e participando da elaboração da Enciclopédia, Jean-Jacques Rousseau
(1711-1778) inaugura uma nova pedagogia, com as obras Emílio e A nova
Heloísa. De certa forma é continuador de Comenius, ainda que apoiado
em outras bases, pois, como este, utiliza a noção de natureza da criança.
Externa suas idéias em outras duas obras importantes: Discurso sobre a
origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens e Contrato
social. Seguindo a tradição deixada por Hobbes, Rousseau desenvolve
seu pensamento a partir da hipótese do homem em estado de natureza.
Segundo sua concepção, os males do homem provêm da sociedade:
Enquanto os homens se contentarem com suas cabanas rústicas,
enquanto se limitarem a costurar com espinhos ou com cerdas suas
roupas de peles, a enfeitar-se com plumas e conchas, a pintar o corpo com
várias cores, a aperfeiçoar ou embelezar seus arcos e flechas, a cortar
com pedras agudas algumas canoas de pescador ou alguns instrumentos
grosseiros de música - em uma palavra: enquanto só se dedicavam a obras
que um único homem podia criar e a arte que não solicitava o concurso de
várias mãos, viveram tão livres, sadios, bons e felizes quanto o poderiam

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

ser por sua natureza, e continuaram a gozar entre si das doçuras de um


comércio independente; mas desde o instante em que um homem sentiu
necessidade do socorro de outro, desde que se percebeu ser útil a um
só contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, introduziu-
se a propriedade, o trabalho tornou-se necessário e as vastas florestas
transformaram-se em campos aprazíveis que se impôs regar com o suor
dos homens e nos quais logo se viu a escravidão e a miséria germinarem
e crescerem com as colheitas(Rousseau apud Bronowski; Mazlisch, 1988,
p. 270).
Aqui está uma verdadeira síntese do pensamento de seu autor. Para
ele, o contrato social corresponde ao mal necessário em que o ser humano
incidiu. A vida em sociedade é a perda das liberdades, da criatividade e do
bem viver. Todos os males derivam do viver em sociedade. O homem, bom
por natureza, encontra na sociedade sua corrupção e sua desgraça. Estas
idéias inauguram os ideais do romantismo. O romântico é, sem dúvida,
um ser que anseia pelo retorno ao estado natural feliz. Aliás, este é um
sentimento que a humanidade carrega consigo. Ovídio ( Públio Ovídio
Nasão - 43 a.C. a 17 d.C.) em Metamorphoseon, quando canta as quatro
ida¬des do tempo, assim se expressa:

Aurca prima sata est aetas, quxvindicenullo, Sponte sua sine


lege fidemrectumque colebat. Poenametusqueaberaiit, nec
verba ininacia fixo Aere legebantur, necsuplex turba timebat
Judieis ora sui, sederant sine judice tuti19 (1.1 89-93).

Não se pode esquecer a importância que tiveram os clássicos ao


tempo em que se estruturava o modelo da ciência moderna. Rousseau
propõe uma filosofia educacional bem ao molde dos ideais da Metamorfose
de Ovídio. Se compararmos o texto de Rousseau com este, de Ovídio,
há invariantes claras. Em ambos os autores encontramos a relutância
contra a ruptura do homem com a natureza. Agirsponte sua é o vigor
moral da vontade individual inabalável ante as influências e opiniões
alheias (da sociedade).Sine lege: o agir acima e apesar da lei, ou melhor,
sem a lei, porque na idade de ouro da humanidade ainda não havia lei,

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e assim mesmo o povo agia retamente (rectumquecolebat). Não havia o


discurso ideológico, que sempre traz ocultamento de intenções. O homo
homini lúpus hobbesiano é conseqüência, ao ver de Rousseau, da vida em
sociedade. Percebemos que, de tempos em tempos, o ser humano reage
às implicações dos problemas que ele mesmo vai criando. A saudade de
viver como homem universal, firmemente plantado na capacidade real, nos
valores intrinsecamente justificados que possibilitem agir sponte sua e em
paz é expressa na filosofia de Rousseau.
Para Rousseau, a criança é a própria fonte da educação. Com isto,
aquele educador busca na própria natureza da criança as suas.
“Semeou-se a primeira idade, a de ouro, na qual inexistia vingador.
De livre vontade, sem lei, praticava-se a lealdade e a retidão. Inexistiam o
castigo e o medo, nem se liam palavras ameaçadoras em placas de bronze,
nem temia suplicante, o povo, as palavras de seu juiz, mas estavam em
segurança sem ele.”Mais que isto, esta é a possibilidade fundamental
de toda e qualquer pedagogia. Ainda que a notável obra de Suchodolski
se empenhe por classificar as pedagogias em pedagogia da essência e
pedagogia da existência, esta bipolarização não me parece ser tudo. A meu
ver, nenhuma pedagogia pode ser só essencialista ou só existencialista.
O homem não é só essência nem só existência. A totalidade do homem/
da mulher é complexidade. Essência e existência são o compósito de
uma totalidade. Esta é a crítica básica e o intento principal deste estudo:
buscar fundamentos filosóficos e epistemológicos para a superação das
fragmentações sem negar o valor de todo e qualquer ângulo pelo qual se
possa enfocar a educação, no âmbito da finitude.

1.5. RETORNO À NATUREZA


As influências de Rousseau se projetaram para dentro do século
XVIII por meio de Pestalozzi (1746-1827) e Fróbel (1782- 1852). Ao
procurar desenvolver as “forças espontâneas da criança”, buscavam as
forças inerentes da criatura humana, procurando desenvolver nelas os seus
próprios dons (natureza intrínseca). Buscaram, sobretudo Frõbel, fazer
com que a criança se transformasse naquilo que ela é, pela transformação

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

dos elementos exteriores em interiores e, estes, em exteriores, dialética


buscada ad intrae ad extra, na própria natureza como um todo: homem-
mundo. Esta quer-me parecer uma formulação teórico-educacional
extraordinária, que busca o contingente onde ele de fato está, isto é, na
finitude do próprio educando. Esta teoria educacional está em acordo
com o que afirmou Emerson: “A educação deve ser tão vasta como o
próprio homem: deve fazer emergir e reforçar tudo o que se encontra no
homem.” (apud Suchodolski, 1989, p. 40). A extensão e a compreensão da
pedagogia é a extensão e a compreensão do ser humano ecológico, isto é,
do ser humano inserido num contexto, entre outros seres, o mundo da vida
(Lebenswelt), complexo, plural, comunicante. Este é o verdadeiro saber
pedagógico que dá ao educador saber até onde e em que profundidade
vai a educação, ou seja, quais suas dimensões horizontais e verticais.
Faz-se sentir, aqui, a influência de Hegel, que, acompanhando Kant no
pensamento, acreditava existir uma unidade profunda entre o que conhece
e o que é conhecido e que o conhecimento é impossível sem essa unidade.
E esta relação é possível porque o ser humano é natureza. O avanço deste
processo dialético corresponde ao desenvolvimento humano: a educação.
Esta não é, a nosso ver, uma compreensão simplesmente “idealista” do
mundo, em que o ideal predomina sore o real. Esta relação, vemo-la
como sendo do tipo pensamento- cérebro. Se, a um tempo, o cérebro é
matéria, por outro, o pensamento, produto do cérebro, dificilmente pode
ser reduzido à quantidade material, como se fora algo corpuscular. O locus
dessa integração se viabiliza, em nosso entender, na linguagem, em que
significante e significado se tornam signo, que é o encontro dialético do
compreender e do compreendido que, novamente, se torna passível de ser
compreendido e, assim, se realiza a inesgotabilidade de sentido: o círculo
hermenêutico em funcionamento.
Quem tentou “juntar aquilo que Rousseau separou” foi Pestalozzi.
Acentuou os princípios propostos pelo Emílio e pelo Contrato social. Tentou
juntar os conceitos de homem natural e de realidade histórica. Mas, todo o
fio condutor da prática pedagógica de Pestalozzi é a religiosidade, ou seja,
o cristianismo e seus princípios da caridade fraterna e o cuidado pelos

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mais desvalidos. Aqui fica patente o interesse pela essência do educando e


por seu problema social. Essencialidade e historicidade do homem: ambas
foram preocupações na educação praticada por Pestalozzi.
Se é um tanto difícil ver uma contribuição direta de Hegel para a
educação, sobretudo pela rejeição de que é alvo, por causa de seu idealismo,
não seria justo ignorar sua contribuição para o despertar da importância do
sentido da história, a que chamou de “tribunal do mundo”. Marx e Engels
tiraram proveito máximo do pensamento hegeliano para a elaboração de
seu materialismo histórico, feita a devida adaptação da dialética hegeliana.
O desenvolvimento das ciências resultou numa consciência
sempre mais ampla da liberdade e da capacidade do homem em reger
seus destinos. As monarquias continuaram ocupando seus espaços, mas
estes espaços foram se tornando sempre mais restritos. A ciência foi
derivando sempre mais para a tecnologia que dá ao cidadão poderes que
não provêm da nobreza de nascimento. Assim, a Revolução Francesa é
fruto do espírito dos novos tempos que começaram na Renascença e foram
se impondo. Grandes nações coloniais se tornaram países independentes
graças às economias fortes que souberam criar. A consciência dos direitos
universais foi se tornando sempre mais ampla, não significando, isto, que os
detentores do poder renunciassem a seus privilégios. Ideais de igualdade
se espalharam por toda parte. A prática, porém, não lhe correspondeu,
historicamente. Mas, enfim, idéias novas foram surgindo, inclusive a de
universalizar o ensino. A Revolução Francesa como tal não chegou a
defender a universalização do ensino, nem a obrigatoriedade escolar.
Coube, este papel, a Talleyrand que introduziu na constituição francesa
a obrigatoriedade do ensino público, gratuito e para todos e a Condorcet
coube introduzir o ensino único e gratuito. Ele incluiu nos programas a
aprendizagem manual e agrícola. Joseph Lakanal criou as escolas normais.
Na Alemanha, Fichte desenvolveu a pedagogia social no sentido nacional.
Schleiermacher aprofundou-lhe o pensamento. Rompeu com a educação
abstrata e introduziu a educação concreta, isto é, introduzindo um conceito
de educação que atendesse às particularidades regionais e locais.
Na base destas ações práticas ou normativas ainda está a influência

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

do pensamento de Rousseau, com a assimilação das críticas pela falta


de historicidade do pensamento pedagógico rousseauniano. Rejeitou-se
também a ilustração e a afetação racionalista. As conquistas das ciências
determinaram sempre os rumos educacionais. Estas reações contra
posturas antigas derivam das inovações científicas do tempo. Podemos
ler na Enciclopédia Mirador Internacional (1974): “Assim, na medida que a
ciência foi superando os antigos conhecimentos, surgiram inovações que
se tornariam conhecidas sob a denominação de ‘realismo pedagógico’.
Passando a dar maior valor à língua materna, ao ensino das ciências e à
educação física. Ao mesmo tempo, o desenvolvimento do comércio e da
indústria provocou o aparecimento de escolas comerciais e industriais. O
ensino foi-se tornando mais diversificado.”
Francis Bacon e René Descartes estão no topo da lista dos cientistas
que contribuíram para as formulações científicas que influenciaram os
rumos e conceitos da educação. Bacon preconizara a observação e a
experimentação. Descartes, no Discours de la mé- thode(1633), estabeleceu
alguns princípios que se tornaram clássicos na didática: (1) Nada se admite
como verdadeiro se não se apresentar como evidente; (2) Dividir cada
dificuldade em tantas partes quantas sejam necessárias para resolvê-las
melhor; (3) Partir do mais simples e singelo indo para o mais complexo; (4)
Fazer enumerações completas e gerais para se estar seguro de não ter
cometi-do omissão alguma.
A reforma de ensino proposta por Wolfang Ratke, em Frankfurt,
Alemanha, foi diretamente inspirada em Bacon. Propunha o ensino da
língua materna, ofícios manuais em escolas populares. Verifica-se, pois, no
decurso da história, que sempre mais importância é dada ao “saber fazer”. A
partir da Reforma, a língua vernácula adquire importância sempre maior. O
individualismo se expressa através do uso da língua materna. A cristandade
como elemento de unificação perde a força. A interpretação pessoal das
Escrituras foi a prática que direcionou a educação para os interesses
pessoais como forma de expressão do indivíduo e da individualidade. O
caráter indutivo das ciências experimentais se expandiu para a educação
como consequência lógica. O senso do individualismo se arraigou

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profundamente na cultura. Mais ainda na cultura ocidental. Sobretudo a


partir do século XVIII, universalização do ensino e ensino profissionalizante
se difundiram. Contribuíram para tanto, entre outros, Locke, na Inglaterra,
Goethe, Kant e Fichte na Alemanha. E, através destes focos de influência,
todo o Ocidente seguiu os rumos que daí decorreram. Junto com a ciência
aplicada, desenvolve-se o senso de utilidade. A razão é o parâmetro
máximo e hegemônico de validação do conhecimento aceito no Ocidente.
Manacorda caracteriza as tendências educacionais a partir do século XIX (o
oitocentos) como sendo: universalidade, gratuidade, estatalidade, laicidade,
renovação cultural e trabalho. Destaca, ainda, o mesmo autor, que a nova
tendência é “fazer” da guerra more Francorum, um modelo em educação,
sobretudo quanto à importância que se passou a dar à educação física.
A moral, por sua vez, assume um caráter prático de conformidade com o
catecismo republicano. E a industrialização oferece a oportunidade para
que se ponha em plena marcha ohomo faber. Se no setecentos a educação
se tornou política, no oitocentosse tornou social. O desenvolvimento da
ciência segue a tendência da praticidade. Os investimentos em ciência
visam retorno financeiro. Ao despontar da era industrial, cada vez mais
a ciência reverte em invenções que transformam a vida humana. Assim
mesmo, as idéias de Rousseau ainda persistem, na prática, no que dizem
respeito ao artesanato. Um século mais tarde Prudhon verá na grande
indústria nada mais que a concentração e a soma dos trabalhadores da
tradicional divisão de trabalho das oficinas artesanais, ainda que Prudhon
não tenha entendido com a devida profundidade as relações entre trabalho
e propriedade (Manacorda, 1989). Comenius, Lasalle e Champagnat
também se haviam apercebido destas novas circunstâncias. Comenius já
preconizava o homem moderno em sua visão educacional ao se referir,
entre outras coisas, às armamentaria e aos merci- moniorum /oca, ou seja,
os canteiros navais e as bolsas da Holanda e Inglaterra, símbolos do novo
capitalismo emergente.
Com o surgimento do mundo industrial, aparece um novo tipo de
relação do homem com o homem e deste com a natureza. A oportunidade
de criatividade, para as maiorias, diminui. A máquina não é parte de sua

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

produção criativa. A máquina, produto da ciência e da tecnologia, se interpõe


entre o homem/a mulher e a natureza a ser transformada. A palavra proletário
expressa o homem que contribui com a prole, ou seja, com a mão-de-obra.
O proletário não participa da propriedade do meio de produção. É, antes,
uma extensão das engrenagens das máquinas que manipula quase que
mecanicamente. “Ao entrar na fábrica,” — diz Manacorda (1989, p. 281)
— “o homem, que tem na ciência moderna sua maior força produtiva, ele
foi expropriado também da sua pequena ciência, inerente ao seu trabalho.”
Os tempos e os movimentos newtonianos nunca contaram tanto. O homem
tem que se adequar ao ritmo dos dentes das engrenagens e das bielas. Sua
vida está aí, pendurada por um fio nas rodas das máquinas. Seu cérebro
está em permanente esforço de sincronia com os movimentos rotativos e
de vaivém das máquinas. Tempo e movimento são os dados funda¬mentais
na indústria. Galileu nem sonhara que suas descobertas poderiam ser tão
vitais para o mundo novo que viria depois dele. Mas, ao serem reproduzidos
pela fábrica o tempo e o movimento, o homem comum já não os entende. O
maestro desta orquestração é a máquina. O homem tem que lhe obedecer.
Executa suas tarefas monótonas e imbecilizantes ao som rítmico das
máquinas. E muito pessimista esta maneira de interpretar? Parece que não.
O padrão das indústrias que foram surgindo, até quase os nossos dias, não
foi muito favorável a homens e mulheres que se dispusessem a pensar. O
homem/a mulher que pensa muito é incômodo e atrapalha a cadência dos
tempos e movimentos fabris. Bem por isto se empregaram crianças desde
tenra idade. Não havia demanda de muita reflexão na fábrica. Quanto mais
dócil o homem, melhor funcionava a fábrica. O desenvolvimento rápido das
máquinas, porém, abriu uma demanda de adaptação igualmente rápida.
Filantropos e utopistas e até industriais se puseram o problema educacional
em função das novas habilidades ditadas pelo progresso das ciências e da
tecnologia. Acelerou-se a educação técnico- profissional.
Na verdade, o modelo clássico de ciência, ainda que tenha feito
contínuos avanços, sem interrupções, manifestou suas verdadeiras e
mais significativas conseqüências práticas a partir da industrialização.
Em substituição às escolassermocinales, fez-se sentir a necessidade das

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escolasreales, isto é, que em vez de ensinar palavras ensinem coisas


resultantes das ciências naturais. As escolasreales são as de caráter
científico, técnico e profissional. Mais adiante veremos como Hannah
Arendt (1993) interpreta esta realidade nova do “fazer”, que caracteriza
a educação até nossos dias. Entendemos que aquele modelo mecânico
das esferas celestes, tão bem definido pela gravitação universal, tão bem
ilustrado pelo grande relógio do mundo de Newton, se reproduziu no modelo
industrial. As esferas celestes correspondem a rodas gigantes da indústria,
a engrenagens bem azeitadas, com seus eixos possantes, movidos por
uma energia de atração e repulsão universal que aqui se traduziu em
energia hidráulica e térmica.
Está-se aqui a falar como se a ciência se tornou um patrimônio
de todos e como se todos tivessem consciência de tudo o que estava
ocorrendo. De fato, a ciência afetou a todos no Ocidente. O estado de
consciência, porém, do homem/da mulher comum, em grande parte
continuou o mesmo, na alienação e ignorância generalizadas. Mesmo as
grandes revoluções foram feitas por poucos; muito poucos sabiam o que
estava, então, acontecendo. A grande massa do povo serviu, na Revolução
Francesa, aos ideais da burguesia que estava interessada em se livrar dos
reis e imperadores. Na grande Revolução Russa, Stalin se encarregou
de encurralar o povo para impeli-lo a realizar os ideais revolucionários de
que não tinha a menor consciência como grande massa. Enquanto isto, o
grande relógio continuou a funcionar, impávido, ao tempo em que alguns
líderes diretamente interessados lhe davam apoio, com o empenho de toda
a força moral e física.
O marxismo, por sua vez, assume todas as posições burguesas
quanto às suas conquistas ideais e práticas no campo da instrução. O que
de novo apresenta é uma crítica áspera à burguesia pela sua incapacidade
de realizar os ideais que propôs. Sua posição clara e muito mais definida
do que a posição burguesa diz respeito ao binômio instrução e trabalho,
com plenas condições para todos os cidadãos. Esta tese vem expressa no
Manifesto comunista-, “Educação pública e gratuita de todas as crianças” -
afirma - “Abolição do trabalho das crianças nas fábricas na sua forma atual.

33
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

Unificação da instrução com a produção material [...]” Em suas Instruções


aos delegados ao I Congresso da Internacional dos Trabalhadores,Marx
define o que é instrução destacando três aspectos: (a) Instrução intelectual;
(b) Educação física; (c) Treinamento tecnológico (que transmita os
fundamentos científicos gerais de todos os processos de produção).
Marx teve a preocupação de minimizar os efeitos do embrutecimento
a que levava o processo produtivo praticado na indústria e a ignorância
generalizada do campesinato. Tinha também em mente a humanização
do trabalho produtivo, bem como a preocupação com a dignidade
humana do trabalhador. Imaginava que se devia estreitar a união entre
trabalho produtivo e remunerado, instrução intelectual, exercícios físicos
e treinamento politécnico, com vistas à elevação do operário acima das
classes média e superior (Manifestocomunista). Tinha clara em mente a
educação onilateralmente desenvolvida. “Do sistema da fábrica, como
podemos seguir particularmente nos escritos de Robert Owen, nasceu o
germe da instrução do futuro, que unirá para todas as crianças além de
certa idade o trabalho produtivo com a instrução e a ginástica, não somente
como método para aumentar a produção social, mas também como único
método para formar homens plenamente desenvolvidos.” (Marx apud
Manacorda, 1989, p. 297-298).
Em educação, Marx deixa definitivamente de lado o romantismo
de Rousseau. Volta-se inteiramente para a prática. O elemento que se
afigura como mais abrangente na proposta educacional de Marx é a
onilateralidade, ou seja, uma educação que contribua para a construção da
totalidade do homem. A dialética marxista, aliás, o materialismo histórico,
enfim, a filosofia de Marx exerceu forte influência na educação. No Brasil,
foram nas últimas décadas (sobretudo a partir de 70) que as teorias e
propostas educacionais mais se pautaram pelo materialismo histórico, com
interpretações marxistas de diferentes modalidades.
Durante aproximadamente trinta anos o materialismo histórico com
a respectiva dialética se constituiu o método hegemônico de produzir e
de pensar a educação brasileira. Só nos dias atuais, sobretudo a partir
da década de 90, sob a influência dos educadores ligados aos Estudos

34
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Culturais, ao pensamento foucaultiano e respectivos aportes educacionais,


ao pensamento pós-moderno em geral, se iniciou uma renovação marcada
também por um criticismo multiculturalista, onde aparecem nomes como
os de Peter McLaren, Henry A. Giroux, Michael W. Appel, só para citar
alguns entre dezenas de nomes estrangeiros influentes. No Brasil, pode-
se citar Tomaz Làdcu da Silva, entre outros, sobretudo nomes ligados à
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (mas não com exclusividade),
onde os Estudos Culturais ganharam espaço significativo, com a produção
de dissertações de mestrado e tese de doutorado em educação, artigos
de revistas e livros em significativa profusão, e onde a marca da pós-
modernidade inaugurou uma discussão em outras bases para a educação.
A influência de pensadores e educadores como Michel Foucault, Derrida,
Lyotard, os pós-estruturalistas em geral, Hans-Georg Gadamer na
hermenêutica, Jürgen Haber- mas com sua teoria da ação comunicativa,
marca irreversivelmente um novo tempo de reflexão.
Para Marx, a Comuna de Paris se afigurou como o modelo da
realização de uma escola totalmente liberta da tutela eclesiástica e
do Estado. Configurou-se como a “emancipação espiritual do povo”,
como afirmou em Guerra civil na França. Esta experiência ideal, porém,
não logrou se concretizar. O sonho de uma sociedade sem classes não
aconteceu conforme esperava Marx e tantos marxistas. Para permanecer
“histórico”, Marx não se deixou conduzir simplesmente por idéias por ele
concebidas, mas pelas circunstâncias vividas. A proposta educacional
marxista, como toda proposta econômico-social-política, é muito rica e
humanizante. Teve em vista o homo sapiens, o homofaber, ohomo ludicus
e, certamente, quando se reporta à “onilateralidade” se refere aohomo
universalis. Sente-se nitidamente em Marx a herança grega da educação,
que é a herança da cultura ocidental, racional, iluminista. Desejava para
os operários a superação de um proletariado grosseiro e sem instrução,
o lumpen Proletariat que tanto o aborrecia. Não pretendia apenas livrar
o proletariado da ignorância, mas elevá-lo acima das classes burguesas
pela qualidade, por uma formação abrangente, com visão da totalidade
(onilateralidade). A dialética concretizada na luta de classes se assemelha

35
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

ao uso da vela para navegar contra o vento. Seria profundamente desejável


que o amadurecimento da humanidade, no sentido profundo de sua
educação, deveria superar a solução dos seus problemas pelo conflito.
Todo otimismo precipitado pode resultar na não-verdade. As agências
de educação (escolas e universidades) ainda não conseguiram realizar
sínteses de significânciaeducacional 110 Brasil também. Outra temática
educacional também foi despertada por discussão em torno dos efeitos da
globalização tia economia para a educação. Aí se situam nomes como os
de Pablo Gentili, Germano Krigotto, entre outros. Coerentes e condizentes
com os problemas máximos da educação. O projeto do Iluminismo não
logrou êxito. A educação, que para Kant deveria conduzir para a superação
da menoridade, não atingiu seus objetivos de forma a atingir a maioria. “É
fácil constatar” - diz Veiga-Neto (2000, p. 43) - “que vivemos, neste fim de
milênio, num mundo que é bastante diferente daquele idealizado — em
parte até mesmo realizado — pelos arquitetos do Iluminismo. Os ideais
de uma Bildung- pela qual se conduziram os bons selvagens a um estado
de maioridade, donos de sua razão, por obra de uma peda¬gogia e de
uma escolarização racionais — mostraram-se, depois de mais de dois
séculos, inatingíveis, tanto em termos globais quanto em termos locais.”
E o resultado não poderia ser mais bizarro e lamentável, pois, segundo
o mesmo educador, Veiga-Neto, “Vivemos num mundo estranho, em que
muitos morrem por comerem demais ou desequilibradamente, enquanto
muitos mais morrem simplesmente por não terem o que comer.” Este é o
saldo de alguns séculos de modernidade, sem falar da crise de desemprego,
da crescente miséria endêmica, da ascensão da corrupção, da intolerância,
o estresse, a violência sem limites e, como diz ainda Veiga-Neto: “a feiura
das grandes cidades” e um sem número de outros males. Estas são
algumas das características da vida para a imensa maioria dos seres
humanos, sem falar dos males que assolam o reino animal em geral, o
reino vegetal e mineral, em larga escala, à mercê daquilo que se denominou
indistintamente de “progresso” da modernidade. Apenas uns poucos estão
acordando, nestas últimas décadas, para a realidade de que este planeta
Terra é a nossa oikoç (casa, morada) e que ela está ficando sufocante, com

36
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o ar envenenado, com o solo envenenado, com os frutos que servem de


alimento também envenenados, com a água, esse maravilhoso cristal vital,
completamente poluída.
A educação precisa se tornar uma pedagogia da totalidade a que
pertencemos desde nossa origem. Não há nenhum elemento químico
privilegiado em nosso corpo que o universo também não o tenha. Se nosso
cérebro é privilegiado por sua complexidade, isto se constitui numa forte
razão a mais para entendermos nossa pertença ao universo e para nos
mantermos firmes na luta pela solidariedade, no seio desse holograma em
que estamos inseridos. “A diáspora da humanidade não produziu nenhuma
cisão genética: pigmeus, negros, amarelos, brancos vêm da mesma espécie,
possuem os mesmos caracteres fundamentais de humanidade. Mas ela
levou à extraordinária diversidade de línguas, culturas, destinos, fontes de
inovação e de criação em todos os domínios. A riqueza da humanidade
reside na sua diversidade criadora, mas a fonte de sua criatividade está em
sua unidade geradora.” (Morin, 2000, p. 65). Mas, segundo Morin, sofremos
de uma espécie de atrofia na capacidade de conhecer o nosso mundo.
Somos tardos em contextualizar, em globalizar, “uma vez que a exigência
da era planetária é pensar sua globalidade, sua complexidade - o que nos
remete à reforma do pensamento, necessária para conceber o contexto, o
global, o multidimensional, o complexo” (Morin, 2000, p. 64).

1.6. QUANDO FAZER É EDUCAR E VICE-VERSA


O ativismo tomou conta do mundo moderno e a esquizofrenia
caracteriza a pós-modernidade. “Fazer” é o que mais importa.
Gilles Deleuze e Félix Guattari intitularam uma de suas significativas
obras Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia (1995). A leitura desta obra é
muito útil para entender esta característica de nosso tempo. Vários outros
autores utilizam este conceito para explicar a fragmentariedade, a desconti-
nuidade e o deslocamento típicos de nosso modo de ser e, sobretudo, de
sentir: uma nova estética, às vezes absolutizada.
O advento da psicologia fundada em bases científicas tardou a surgir.
Entre os maiores esforços despendidos para as descobertas científicas em

37
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

psicologia, constam aqueles realizados em função de guerras, controle


social e propaganda (que não deixa de ser controle social). A psicologia
adotou muitos conceitos da ciência clássica. Conceitos cartesianos como
o da res cogitans e da res extensa. Dividiram-se, os psicólogos, pelos
caminhos do estruturalismo e do behaviorismo. Ambos adotam o modelo
newtoniano da ciência clássica, ou seja, a física clássica. A mecânica serviu
como grande paradigma de análise.
Os avanços verificados no século XIX em fisiologia e anatomia
traçaram os rumos da moderna psicologia. Os estudos do cérebro e do
sistema nervoso conduziram à determinação das funções cerebrais que,
pelo entusiasmo inicial da pesquisa neste sentido, pareciam definitivos
e simples. Pesquisas mostraram onde se situavam as funções motoras
primárias. A localização das funções superiores, porém, apresentou
dificuldades bem maiores. Este modelo reducionista, ainda que com
mais cuidado, continua sendo seguido pelos pesquisadores, agora com
muito mais recursos técnicos disponíveis e com menos ingenuidade.
Lúria levantou fortes objeções aos métodos até então utilizados. Hoje
os trabalhos em neurociência vêm apresentando resultados muito mais
promissores e muito mais críticos. Como se expressa Pereira (1994, p. 102):
“Um progresso importante ocorreu nos últimos quinze anos. Em particular a
Teoria da Seleção dos Grupos Neuronais (TSGN), de G. Edel- man, baseia-
se na concepção de estruturas e funções neuronais tendo como uma de
suas metas elaborar bases assentadas em disciplinas biológicas para a
‘psicologia científica’.”
A reflexologia desenvolvida no século XIX exerceu influências
profundas não só em psicologia, mas em educação. Estabeleceu-se relação
causal entre estímulo e resposta. Esta relação foi aplicada ao comportamento
humano de maneira claramente mecanicista. A aprendizagem foi
interpretada como um processo estímulo-resposta mecânico. Através
de suas descobertas, pesquisadores como Ivan Sechenov levaram às
verificações e formulações de Pavlov (reflexos condicionados) ou às
teorias de Weber-Fechner, que estabeleceram relações matemáticas entre
intensidade das sensações e os estímulos. Todas essas foram abordagens

38
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experimentais em psicologia. O primeiro laboratório de psicologia foi


fundado por Wundt. Estabeleceu a teoria elementarista, segundo a qual
todas as funções psíquicas poderiam ser explicadas a partir de elementos
específicos, associados entre si. Da combinação de tais elementos
resultavam as idéias, as percepções, das mais simples às mais complexas.
Prevaleceu, no século XIX, o dualismo. Mente e matéria seriam
duas realidades distintas. Daí surgiram fortes polêmicas entre psicólogos
que defendiam a união entre consciência e percepção e os que tentavam
uma interpretação holística, isto é, os gestaltistas e funcionalistas.
William James criticou fortemente as teorias atomísticas e
mecanicistas. Defendeu a interação corpo-mente. James lançou um desafio
inteiramente novo para a psicologia que viria após ele. James adota o
esquema estímulo-resposta. Um horizonte novo é aberto pelo filósofo e
psicólogo. Faz uma distinção fundamental entre “consciência vígil” e as
“formas potenciais de consciência inteiramente diferentes”. A compreensão
do universo como um todo não pode ser efetivada sem dar-se conta dessa
outra forma de consciência. Esta é que nos parece ser a “janela” que
James recorta num mundo psicológico fechado, para dar acesso à visão
de complexidade do universo em oposição às formulações mecanicistas
reducionistas, não só de psicólogos mas de cientistas de modo geral.
O pensador apela para uma prestação de contas para com a realidade
universal, até o fim, sob pena de um entendimento incompleto (prematuro)
da realidade global que nos cerca e especialmente aquela realidade interior
de nosso próprio eu global.
Enfim, no século XX, as duas correntes predominantes em psicologia
foram o behaviorismo e a psicanálise. Fundado nos conhecimentos da
fisiologia, o behaviorismo desconhece a alma humana. Os fenômenos da
mente são entendidos como comportamentos e o comportamento é reduzido
a processos fisiológicos, conformes com a física e a química. Fundador do
behaviorismo, Watson pesquisou sob fortes influências de pesquisadores
das ciências humanas do início do século.
Nas décadas de 30 e 40 de nosso século, Clark Hull criou a teoria
do reforço, segundo a qual para haver resposta decisiva a um estímulo é

39
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

necessário fornecer um reforço que satisfaça a um impulso básico. Esta


teoria exerceu influência generalizada sobre as teorias da aprendizagem.
Sua influência se estendeu até a década de 50, quando a influência maior
passou a ser a de Skinner. Sua rara competência para produzir experimentos
exatos e distintos, que corroboram o behaviorismo, tornou-o amplamente
aceito, especialmente nos Estados Unidos, e, através dos Estados Unidos,
pela influência avassaladora de sua psicologia, no resto do mundo. Skinner
desenvolveu o método denominado “condicionamento operante” e baseou-
se claramente em conceitos da física. “Dada a afirmação” — diz — “de que
faltam aos eventos mentais ou psíquicos as dimensões da ciência física,
temos aí uma razão adicional para rejeitá-los.” Escreveu isto em Ciência e
comportamento humano (1985). Uma das críticas que se faz a Skinner é a
de ignorar a interação entre o organismo vivo e seu meio ambiente, do qual
faz parte. Esta é uma deficiência de todos os behavioristas. Subjacente
está o conceito do homem-máquina. Ao esclarecer que precisamos
desenvolver uma tecnologia do comportamento comparável em poder e
precisão à tecnologia física e biológica, Skinner deixa claros os princípios
de onde partem suas teorias sobre a psicologia humana, entendimento
este expresso em Beyond freedom and dignity.
Não se faz necessário dizer que, como ciência de compreensão
da psique animal, por conseqüência do homem, a psicologia tem uma
importância decisiva na educação. O modelo da ciência clássica serviu
quase sempre à criação de modelos interpretativos em psicologia. As teorias
psicológicas são muito mais complexas e muito mais numerosas que a
amostragem deste trabalho. O que importa, para o momento, é que fiquem
claras as bases científicas em que se assentam. Estamos ainda longe
de chegar a uma visão de totalidade em psicologia. A fragmentariedade
predomina neste campo do saber. A tarefa recém iniciada tem um longo
caminho pela frente. A Neurociência em desenvolvimento na atualidade
vem fornecendo informações de significância para o estudo da psicologia.
Por ora, temos pela frente grandes tarefas neste campo, em educação,
para evitar as contradições ainda existentes e desafiadoras.
Ao longo desta parte destacou-se a fragmentariedade resultante

40
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da ciência clássica e suas contribuições para a formulação de teorias


educacionais. Não era objetivo meu analisar as teorias educacionais, uma
a uma, de forma extensa. O fiz tanto quanto necessário para poder verificar
que andamos em meio à precariedade teórica em educação, pois o interesse
das ciências pouco se voltou para o problema da felicidade do homem, de
sua educação para o bem viver e o viver melhor. Minha tentativa é de unir
o que Sócrates começou a separar, segundo a análise feita por Nietzsche.
Verifica- se de imediato que esta é uma tarefa que requer muito e muito
mais do que aquilo que se fez neste livro.

2.CIÊNCIA: EVOLUÇÃO, ASPECTOS CONCEITUAIS E CLASSIFICA-


ÇÃO DAS CIÊNCIAS
A revolução científica ocorrida na Europa dos séculos XVI e XVII foi
movida por um ideal de ruptura da Idade Média, emergindo assim a Idade
Moderna (século XV ao XVIII) com novas referências para a organização
do pensamento, com um novo modelo de ciência:
• [...] a observação e a experimentação, procedimentos
metodológicos que passam a ser considerados, a partir de Galileu (século
XV), como teste para o conhecimento científico, não eram procedimentos
utilizados para esse fim na Grécia e na Idade Média (ANDERY et. al. 1996);
• O método científico foi criado no século XVII, surgiu como
uma tentativa de organizar o pensamento para se chegar ao meio mais
adequado de conhecer e controlar a natureza;
• Para Cervo e Bervian (2006, p. 9) [...], a ciência, nos moldes
que conhecemos hoje, é relativamente recente. Foi somente na Idade
Moderna que adquiriu o caráter científicoque tem atualmente. [...] A
revolução científica propriamente dita ocorreu nos séculos XVI e XVII, com
Copérnico, Bacon e seu método experimental, Galileu, Descartes e outros;
• O Iluminismo no século XVIII apareceu como um
desdobramento de concepções desenvolvidas desde o Renascimento e
propunha “a luz da razão sobre as trevas dos dogmas religiosos”;
• O racionalismo moderno seu idealizador foi René Descartes,
que ao constatar que duvidar significa pensar, criou a frase “penso, logo

41
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

existo”, pela qual mostrou ser a razão a essência dos seres humanos.
Ele criou o cartesianismo, um modelo de conhecimento inspirado na
Matemática, que leva o homem à verdade. Segundo ele, a verdade poderia
ser alcançada através da dúvida e da reflexão;
• Na passagem da Idade Moderna para a Idade Contemporânea,
final do século XVIII até meados do século XIX, surgem importantes estudos
no campo das ciências naturais que também influenciaram o pensamento
moderno. Isaac Newton, por exemplo, conseguiu elaborar leis naturais
que, segundo ele, regiam o mundo material. Dessa maneira, a dúvida,
o experimento e a observação seriam instrumentos capazes de explicar
as “normas” que organizam o mundo. O método utilizado por Newton
acabou influenciando outros pensadores que também acreditavam que
por intermédio da razão., poderiam elaborar leis relacionadas à história, a
politica e a economia;
• O século XIX é considerado o século das ciências.Aciência
continuou a registrar importantes progressos e os enciclopedistas deram
uma forte ajuda para que houvesse mudanças na sociedadecientífica,
criando museus e escolas com ensino regular de ciência. Com isso surgem
as sociedades científicas especializadas. Na sociologia Augusto Comte
criou o positivismo, na economia, Karl Marx e Friederich Engels lançaram
o materialismo-dialético; Charles Darwin formula a teoria da evolução das
espécies. A ciência passou a explicar os fenômenos sociais biológicos,
antropológicos, físicos e naturais;
• A ciência moderna nasceu a partir da revolução científica
dos séculos XI e XVII. Basicamente no domínio das ciências naturais, no
entanto, a sua afirmação verifica-se, sobretudo, nos séculos XVIII e XIX. No
século XIX, as ciências sociais também foram incorporadas no pensamento
moderno;
• O método científico é a combinação de três operações que
visam descobrir as regras que regem os fenômenos naturais: observação,
experimentação e raciocínio. A observação é o primeiro passo parao
entendimento de um fenômeno. A partir da análise das observações, tenta-
se levantar uma hipótese que explique o fenômeno: é a fase do raciocínio.

42
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Ahipótese leva a uma nova série de experiências que irão confirmar, ou não,
a hipótese feita. Se ela se mostrar acertadae puder prever os resultados de
uma nova experiência, ela se torna uma lei natural (PENTEADO, 1988, p.
4)
• Ciência
Na literatura especializada, encontram-se vários conceitos para
ciência. Em sentido restrito, considera-se bastante plausível a definição
de Trujillo Ferrari (1974, p. 8 apud MARCONI e LAKATOS, 2009, p. 80) “a
ciência é todo um conjunto de atitudes e atividades racionais, dirigidas ao
sistemático conhecimento com objeto limitado, capaz de ser submetido à
verificação”.
A ciência pode ser definida por meio da identificação de suas
características principais. Dessa forma, a ciência segundo Gil (1999: 20,21)
“pode ser caracterizada como uma forma de conhecimento”:

♦♦ Objetivo – descreve a realidade independentemente dos


caprichos do pesquisador;
♦♦ Racional – vale-se, sobretudo, da razão e não de sensação
ou impressões para chegar a seus resultados;
♦♦ Sistemático –preocupa-se em construir sistemas de ideias
organizadas racionalmentee em incluir os conhecimentos parciais em
totalidades cada vez mais amplas;
♦♦ Geral – seu interesse se dirige fundamentalmente à elaboração
de leis ou normas gerais, que explicam todos os fenômenos de certo tipo;
♦♦ Verificável – sempre possibilita demonstrar a veracidade das
informações;
♦♦ Falível – reconhece sua própria capacidade de errar.

Para Ruiz (2002, p. 129-131 apud GONÇALVES, 2005, p. 20), a


ciência possui as seguintes características:
• Conhecimento pelas causas – demonstração dos porquês
de determinado enunciado;
• Profundidade e generalidades de suas conclusões –

43
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

exprimir suas conclusões em enunciados gerais que traduzem a relação


constante do binômio causa – efeito;
• Finalidade teórica e prática – tornar o universo compreensível
• Objeto formal – maneira peculiar, aspecto ou ângulo sob o
qual atinge seu objeto material – controle experimental das causas reais
próximas;
• Método e controle – via real de acesso da mente humana
aos processos de pesquisa científica;
• Aspecto social – procura da verdade para melhorar as
condições de vida da humanidade;
• Exatidão – possibilidade de demonstração.

É importante ressaltar que a partir destas características é


possível, em determinadas situações, diferenciar entre o que é ciência e
o que não é. Há casos, entretanto, em que não é possível, precisar com
toda clareza se um tipo de conhecimento faz parte da ciência humana, o
que é de certa forma compreensível, considerando que têm autores que
contemplam a filosofia no elenco dessas ciências.
Para Alves (2007, p. 13-14), a ciência:
- Exige:
• Capacidade de discernir as diferenças e semelhanças, refle-
tindo sobre a singularidade ou não dos fenômenos (fatos) observados;
• Domínio de técnicas de coleta de dados;
• Manuseio e uso de dados;
• Capacidade de manusear fontes bibliográficas;
• Versatilidade na discussão teórica;
• Conhecimento de teorias e autores.
- Tem critérios:
• Coerência – significa argumentação estruturada; ausência
de contradições; corpo sistemático de enunciados bem deduzidos, permi-
tindo um encadeamento lógico das ideias;
• Consistência – significa capacidade de resistir a argumenta-
ção contrárias; diz respeito à atualidade da argumentação;

44
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• Originalidade – significa produção não repetitiva; refere-se à


pesquisa criativa, incentiva;
• Objetivação – significa a tentativa de descobrira realidade
como ela é, sem pretender esgotá-la em uma única pesquisa.

Apolinário (2007, p. 42) elencou dentre outros, os seguintes


significados de ciência, destacando que há muita controvérsia acerca do
seu significado:
• “a ciência é o conjunto de conhecimentos racionais, certos ou
prováveis, obtidos metodicamente sistematizados e verificáveis que fazem
referência a objetos da mesma natureza” (ANDER-EGG, 1978, p. 15).
• É a atividade pela qual os homens adquirem um conhecimento
ordenado dos fenômenos naturais trabalhando com uma metodologia
particular (observação controlada e análise) e com um conjunto de
atividades (cetismo, objetividade, etc.) (MARX e HILLIX, 1978);
• “trata-se de estudo, com critérios metodológicos, das
relações existentes entre causa e efeitos de um fenômeno qualquer, no
qual o estudioso se propõe a demonstrar a verdade dos fatos e suas
aplicaçõespráticas” (OLIVEIRA, 1997, p. 47)
• “um cientista, seja teórico ou experimental, formula enunciados
ou sistemas de enunciados e verifica-se um a um. No campo das ciências
empíricas, ele formula hipóteses e submete-os a testes, confrontando-os
com a experiência, através de recursos de observação e experimentação.”
(POPPER, 1974 [1934], p. 27);
• “a ciência constitui-se negando os saberes pré-científicos ou
ideológicos, mas permanece aberta como sistema, porque é falível e, por
conseguinte, capaz de progredir. Ela é um discurso aproximativo, provisório
e incessante susceptível de retificação e questionamentos, porque seu
próprio método se apresenta sempre como perfectível.” (JAPIASSÙ, 1975,
p. 177)

Apolinário (2007, p. 42) destaca que há muita controvérsia acerca


do significado de ciência e elenca a contribuição de alguns teóricos sobre

45
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

o referido significado:

Ciência
• Transformada pelo notável desenvolvimento da tecnologia,
facilitando a pesquisa em muitos novos campos;
• As descobertas e realizações científicas se aceleram

Cabe considerar, também, as dimensões da ciência elencadas por


Demo (2009, p. 40):
• Ciência como método, constituindo-se a raiz do conhecimen-
to metódico, sistemático, lógico, do conhecimento discutível, formal e poli-
ticamente;
• Ciência como instrumento de intervenção levando ao ques-
tionamento cotidiano, à teoria para intervir, e à intervenção para teorizar, à
inovação.

A ciência é importante porque é transformada pelo notável


desenvolvimento da tecnologia nas diversas áreas do conhecimento,
facilitando e acelerando as pesquisas, as descobertas e as realizações
científicas em muitos novos campos.

A notícia, a seguir, objetiva refletir sobre aprendizagem:


2ª NOTÍCIA -LIVRO FORMAÇÃO DE PRO FESSORES: Situações Práticas de
Ensino e Aprendizagem Significativa - Jorge Santos Martins (2009, p. 11-12)

O QUE É APRENDIZAGEM? COMO SE APRENDE?

Certa vez seu Júlio Rocha acabara de fincar no quintal seis estacas de dois
metros de altura para formar uma latada com uma videira de um lado e
um pé de chuchu do outro. Esticou nas pontas arames, cruzou sobre eles
algumas varas e deixou tudo pronto.
No dia seguinte, plantou as preciosas mudas e amarrou-as às estacas junto
com um galho seco de árvore ao lado.
Seu filhinho de quatro anos, que tudo acompanhava de perto, perguntou-

46
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lhe:
- Pai, porque você plantou o chuchu junto com o galho seco?
- Para que, ao começar a crescer, possa aprender a subir na latada, pois no
chão os frutos vão apodrecer, ou bichos vão comê-los.
Na sabedoria do agricultor, o que será “aprender”?
Dias depois, “seu” Júlio levou o garoto ao sítio para ver a ninhada de patinhos
que haviam nascido na véspera. Ao vê-los tão pequeninos já nadando num
tanque d’água, o menino queria saber como aprenderam, pois ele mesmo
ainda não sabia nadar.
- Não precisam aprender, explicou o pai, eles nascem sabendo.

A partir desta notícia, algumas perguntas não “querem calar”.


E questiona-se: o que é “aprender”? Mas, afinal o que é aprender?
Será que os vegetais também aprendem, como disse “Seu” Júlio? O
aprendizado é igual no homem e nos seres irracionais?

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE CIÊNCIAS NATURAIS

2.1. BREVE HISTÓRICO DO ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS: FASES


E TENDÊNCIAS DOMINANTES
O ensino de Ciências Naturais, ao longo de sua curta história na

47
UNIDADE 2
EVOLUÇÃO DAS CIÊNCIAS NATURAIS

OBJETIVOS

• Conhecer as áreas que abrangem as ciências naturais;


• Compreender a relação entre ciências naturais e cidadania;
• Desenvolver competências que lhe permitam compreender o mundo uti-
lizando conhecimentos de natureza científica e tecnológica;
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escola fundamental, tem se orientado por diferentes tendências, que ainda


hoje se expressam nas salas de aula. Ainda que resumidamente, vale a
pena reunir fatos e diagnósticos que não perdem sua importância como
parte de um processo.
Até a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases n.4.024/61, minis-
travam-se aulas de Ciências Naturais apenas nas duas últimas séries do
antigo curso ginasial. Essa lei estendeu a obrigatoriedade do ensino da
disciplina a todas as séries ginasiais. Apenas a partir de 1971, com a Lei n.
5.692, Ciências Naturais passou a ter caráter obrigatório nas oito séries do
primeiro grau.
Quando foi promulgada a Lei n. 4.024/61, o cenário escolar era do-
minado pelo ensino tradicional, ainda que esforços de renovação estivessem
em processo. Aos professores cabia a transmissão de conhecimentos
acumulados pela humanidade, por meio de aulas expositivas, e aos alunos,
a absorção das informações. O conhecimento científico era tomado como
neutro e não se punha em questão a verdade científica. A qualidade do
curso era definida pela quantidade de conteúdos trabalhados. O principal
recurso de estudo e avaliação era o questionário, ao qual os alunos
deveriam responder detendo-se nas ideias apresentadas em aula ou no
livro-texto escolhido pelo professor.
As propostas para o ensino de Ciências debatidas para a confecção
da lei orientavam-se pela necessidade de o currículo responder ao avanço
do conhecimento científico e às demandas geradas por influência da Escola
Nova. Essa tendência deslocou o eixo da questão pedagógica, dos aspectos
puramente lógicos para aspectos psicológicos, valorizando a participação
ativa do aluno no processo de aprendizagem. Objetivos preponderantemente
informativos deram lugar a objetivos também formativos. As atividades
práticas passaram a representar importante elemento para a compreensão
ativa de conceitos.
A preocupação cm desenvolver atividade experimental começou a
ter presença marcante nos projetos de ensino e nos cursos de formação
de professores. As atividades práticas chegaram a ser proclamadas como
a grande solução para o ensino de Ciências, as grandes facilitadoras do
processo dc transmissão do saber científico.
51
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

O objetivo fundamental do ensino de Ciências passou a ser o de


dar condições para o aluno identificar problemas a partir de observações
sobre um fato, levantar hipóteses, testá-las, refutá-las e abandoná-las
quando fosse o caso, trabalhando de forma a tirar conclusões sozinho.
O aluno deveria ser capaz de “redescobrir” o já conhecido pela ciência,
apropriando-se da sua forma de trabalho, compreendida então como “o
método científico”: uma sequência rígida dc etapas preestabelecidas. E
com essa perspectiva que se buscava, naquela ocasião, a democratização
do conhecimento científico, reconhecendo-se a importância da vivência
científica não apenas para eventuais futuros cientistas, mas também para
o cidadão comum.
E inquestionável a importância das discussões ocorridas nesse
período para a mudança de mentalidade do professor, que começa a
assimilar, mesmo que num plano teórico, novos objetivos para o ensino
dc Ciências Naturais. Porém, a aplicação efetiva dos projetos em sala de
aula acabará se dando apenas em alguns grandes centros. Mesmo nesses
casos, não eram aplicados na sua totalidade, e muitas vezes ocorriam
distorções. É o caso da aplicação de material instrucional composto por
textos e atividades experimentais, em que se “pulavam” as atividades e
estudavam-se apenas os textos, também porque era já acentuada a
carência de espaço e equipamento adequado às atividades experimentais.
A ênfase no “método científico” acompanhou durante muito tempo
os objetivos do ensino de Ciências Naturais, levando alguns professores a,
inadvertidamente, identificarem metodologia científica com metodologia do
ensino de Ciências.
As concepções de produção do conhecimento científico e de
aprendizagem das Ciências subjacentes a essa tendência eram de cunho
empirista/indutivista: a partir da experiência direta com os fenômenos
naturais, seria possível descobrir as leis da natureza. Durante a década
de 80 pesquisadores do ensino de Ciências Naturais puderam demonstrar
o que professores já reconheciam em sua prática, o simples experimentar
não garantia a aquisição do conhecimento científico.
Ainda em meados da década de 70, instalou-se uma crise energética,

52
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

sintoma da grave crise econômica mundial, decorrente de uma ruptura com


o modelo desenvolvimentista deflagrado após a Segunda Guerra Mundial.
Esse modelo caracterizou-se pelo incentivo à industrialização acelerada
em todo o mundo, custeada por empréstimos norte americanos, ignorando-
se os custos sociais e ambientais desse desenvolvimento. Problemas
ambientais que antes pareciam ser apenas do Primeiro Mundo passaram
a ser realidade reconhecida de todos os países, inclusive do Brasil. Os
problemas relativos ao meio ambiente e à saúde começaram a ter presença
quase obrigatória em todos currículos de Ciências Naturais, mesmo que
abordados em diferentes níveis de profundidade e pertinência.
Em meio à crise político-econômica, são fortemente abaladas a
crença na neutralidade da Ciência c a visão ingênua do desenvolvimento
tecnológico. Faz-se necessária a discussão das implicações políticas
e sociais da produção e aplicação dos conhecimentos científicos e
tecnológicos, tanto em âmbito social como nas salas de aula. No campo
do ensino de Ciências Naturais as discussões travadas cm torno dessas
questões iniciaram a configuração de uma tendência do ensino, conhecida
como “Ciência, Tecnologia e Sociedade” (CTS), que tomou vulto nos anos
80 e é importante até os dias de hoje.
No âmbito da pedagogia geral, as discussões sobre as relações
entre educação e sociedade são determinantes para o surgimento das
tendências progressistas, que no Brasil se organizaram em correntes
importantes, como a Educação Libertadora e a Pedagogia Crítico-Social
dos Conteúdos. Foram correntes que influenciaram o ensino de Ciências
em paralelo à tendência CTS. Era traço comum a essas tendências
a importância conferida aos conteúdos socialmente relevantes c aos
processos de discussão em grupo. Se por um lado houve renovação dos
critérios para escolha de conteúdos, o mesmo não se verificou com relação
aos métodos de ensino/aprendizagem, pois ainda persistia a crença no
método da redescoberta que caracterizou a área desde os anos 60.
A partir dos anos 70 questionou-se tanto a abordagem quanto a
organização dos conteúdos. A produção dc programas pela justaposição
de conteúdos dc Biologia, Física, Química e Geociências começou a dar

53
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

lugar a um ensino que integrasse os diferentes conteúdos, buscando-se


um caráter interdisciplinar, o que tem representado importante desafio para
a didática da área.
Ao longo das várias mudanças, as críticas ao ensino de ciências
vol- tavam-se basicamente à atualização dos conteúdos, aos problemas de
inadequação das formas utilizadas para a transmissão do conhecimento e
à formulação da estrutura da área.
Nos anos 80 a análise do processo educacional passou a ter
como tônica o processo de construção do conhecimento científico pelo
aluno. Correntes da psicologia demonstraram a existência de conceitos
intuitivos, espontâneos, alternativos ou pré-concepções acerca dos
fenômenos naturais. Noções que não eram consideradas no processo
de ensino e aprendizagem e são centrais nas tendências construtivistas.
O reconhecimento de conceitos básicos e reiteradamente ensinados
não chegavam a ser corretamente compreendidos, sendo incapazes de
deslocar os conceitos intuitivos com os quais os alunos chegavam à escola,
mobilizou pesquisas para o conhecimento das representações espontâneas
dos alunos.
Desde os anos 80 até hoje, é grande a produção acadêmica de pes-
quisas voltadas à investigação das pré-concepções de crianças e adoles-
centes sobre os fenômenos naturais e suas relações com os conceitos ci-
entíficos. Uma importante linha de pesquisa acerca dos conceitos intuitivos
é aquela que, norteada por idéias piagetianas, se desenvolve acompanhada
por estudos sobre História das Ciências, dentro e fora do Brasil. Tem-se
verificado que as concepções espontâneas das crianças e adolescentes
se assemelham a concepções científicas de outros tempos. É o caso das
explicações de tipo lamarckista sobre o surgimento e diversidade da vida e
das concepções semelhantes às aristotélicas para o movimento dos corpos.
A contrapartida didática à pesquisa das concepções alternativas
é o modelo de aprendizagem por mudança conceitual, núcleo de
diferentes correntes construtivistas. São dois seus pressupostos básicos:
a aprendizagem provém do envolvimento ativo do aluno com a construção
do conhecimento e as ideias prévias dos alunos têm papel fundamental no

54
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

processo de aprendizagem, que só é possível embasada naquilo que ele já


sabe. Tais pressupostos não foram desconsiderados em currículos oficiais
recentes.
Esse modelo tem merecido críticas que apontam a necessidade de
reorientar as investigações para além das pré-concepções dos alunos. Não
leva em conta que a construção de conhecimento científico tem exigên¬cias
relativas a valores humanos, à construção de uma visão de Ciência e suas
relações com a Tecnologia e a Sociedade e ao papel dos métodos das
diferentes ciências.
Tais críticas não invalidam o processo de construção conceituai e
seus pressupostos. São úteis, sobretudo, para redimensionaras pesquisas
e as práticas construtivistas da área.

2.2 POR QUE ENSINAR CIÊNCIAS NATURAIS NO ENSINO


FUNDAMENTAL: CIÊNCIAS NATURAIS E CIDADANIA
Numa sociedade em que se convive com a supervalorização do
conhecimento científico e com a crescente intervenção da tecnologia no
dia-a-dia, não é possível pensar na formação de um cidadão crítico à
margem do saber científico.
Mostrar a Ciência como um conhecimento que colabora para a com-
preensão do mundo e suas transformações, para reconhecer o homem
como parte do universo e como indivíduo, é a meta que se propõe para o
ensino da área na escola fundamental. A apropriação de seus conceitos e
procedimentos pode contribuir para o questionamento do que se vê e ouve,
para a ampliação das explicações acerca dos fenômenos da natureza,
para a compreensão e valoração dos modos de intervir na natureza e de
utilizar seus recursos, para a compreensão dos recursos tecnológicos que
realizam essas mediações, para a reflexão sobre questões éticas implícitas
nas relações entre Ciência, Sociedade e Tecnologia.
É importante que se supere a postura “cientificista” que levou
durante muito tempo a considerar-se ensino de Ciências como sinônimo
da descrição de seu instrumental teórico ou experimental, divorciado da
reflexão sobre o significado ético dos conteúdos desenvolvidos no interior

55
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

da Ciência e suas relações com o mundo do trabalho.


Durante os últimos séculos, o ser humano foi considerado o centro
do Universo. O homem acreditou que a natureza estava à sua disposição.
Apropriou-se de seus processos, alterou seus ciclos, redefiniu seus
espaços. Hoje, quando se depara com uma crise ambiental que coloca em
risco a vida do planeta, inclusive a humana, o ensino de Ciências Naturais
pode contribuir para uma reconstrução da relação homem-natureza em
outros termos.
O conhecimento sobre como a natureza se comporta e a vida se
processa contribui para o aluno se posicionar com fundamentos acerca
de questões bastantepolêmicas e orientar suas ações de forma mais
consciente. São exemplos dessas questões: a manipulação gênica, os
desmatamentos, o acúmulo na atmosfera de produtos resultantes da
combustão, o destino dado ao lixo industrial, hospitalar e doméstico, entre
muitas outras.
Também é importante o estudo do ser humano considerando-se
seu corpo como um todo dinâmico, que interage com o meio em sentido
amplo. Tanto os aspectos da herança biológica quanto aqueles de ordem
cultural, social e afetiva refletem-se na arquitetura do corpo. O corpo
humano, portanto, não é uma máquina e cada ser humano é único como
único é seu corpo. Nessa perspectiva, a área de Ciências pode contribuir
para a formação da integridade pessoal e da auto-estima, da postura de
respeito ao próprio corpo e ao dos outros, para o entendimento da saúde
como um valor pessoal e social, e para a compreensão da sexualidade
humana sem preconceitos.
A sociedade atual tem exigido um volume de informações muito
maior do que em qualquer época do passado, seja para realizar tarefas
corriqueiras e opções de consumo, seja para incorporar-se ao mundo do
trabalho, seja para interpretar e avaliar informações científicas veiculadas
pela mídia, seja para interferir em decisões políticas sobre investimentos à
pesquisa e ao desenvolvimento de tecnologias e suas aplicações.
Apesar de a maioria da população fazer uso e conviver com
incontáveis produtos científicos e tecnológicos, os indivíduos pouco refletem

56
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

sobre os processos envolvidos na sua criação, produção e distribuição,


tornando-se assim indivíduos que, pela falta de informação, não exercem
opções autônomas, subordinando-se às regras do mercado e dos meios de
comunicação, o que impede o exercício da cidadania crítica e consciente.
O ensino de Ciências Naturais também é espaço privilegiado em
que as diferentes explicações sobre o mundo, os fenômenos da natureza
e as transformações produzidas pelo homem podem ser expostos e
comparados. E espaço de expressão das explicações espontâneas dos
alunos e daquelas oriundas de vários sistemas explicativos. Contrapor
e avaliar diferentes explicações favorece o desenvolvimento de postura
reflexiva, crítica, questionadora e investigativa, de não-aceitação a priori
de ideias e informações. Possibilita a percepção dos limites de cada
modelo explicativo, inclusive dos modelos científicos, colaborando para a
construção da autonomia de pensamento e ação.
Ao se considerar ser o ensino fundamental o nível de escolarização
obrigatório no Brasil, não se pode pensar no ensino de Ciências como
um ensino propedêutico, voltado para uma aprendizagem efetiva em
momento futuro. A criança não é cidadã do futuro, mas já é cidadã hoje, e,
nesse sentido, conhecer ciência é ampliara sua possibilidade presente de
participação social e viabilizar sua capacidade plena de participação social
no futuro.

2.2.1. Ciências Naturais e Tecnologia


Não se pretende traçar considerações aprofundadas acerca
de cada uma dessas atividades humanas, das interações entre elas e
de seu desenvolvimento histórico. Mas é intenção deste texto oferecer
aos educadores alguns elementos que lhes permitam compreender as
dimensões do fazer científico, sua relação de mão dupla com o tecnológico
e o caráter não-neutro desses fazeres humanos.
O conhecimento da natureza não se faz por mera acumulação
de informações e interpretações, embora o processo de acumulação, de
herança, teve e sempre terá grande significado — a própria designação
e concepção de muitos ramos das ciências e da Matemática, como a

57
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

Geometria, são as mesmas da Grécia antiga.


Mas o percurso das Ciências tem rupturas e depende delas. Quando
novas teorias são aceitas, convicções antigas são abandonadas em favor
de novas, os mesmos fatos são descritos em novos termos criando-se
novos conceitos, um mesmo aspecto da natureza passa a ser explicado
segundo uma nova compreensão geral, ou seja, um novo paradigma.
São traços gerais das Ciências buscar compreender a natureza,
ge¬rar representações do mundo — como se entende o universo, o espaço,
o tempo, a matéria, o ser humano, a vida —, descobrir e explicar novos
fenômenos naturais, organizar e sintetizar o conhecimento em teorias,
trabalhadas e debatidas pela comunidade científica, que também se ocupa
da difusão social do conhecimento produzido.
Na história das Ciências são notáveis as transformações na compre-
ensão dos diferentes fenômenos da natureza especialmente a partir do
século XVI, quando começam a surgir os paradigmas da Ciência moderna.
Esse processo tem início na Astronomia, por meio dos trabalhos de
Copérnico, Kepler e Galileu (séculos XVI e XVII), que, de posse de dados
mais precisos obtidos pelo aperfeiçoamento das técnicas, reinterpretam
as observações celestes e propõem o modelo heliocêntrico, que desloca
definitivamente a Terra do centro do Universo.
A Mecânica foi formulada por Newton (século XVII) a partir
das informações acumuladas pelos trabalhos de outros pensadores,
notadamente de Galileu e Kepler. Interpreta-as com o auxílio de um modelo
matemático que esquematizou, estabelecendo um paradigma rigoroso e
hegemônico até o século passado.
Na Química, a teoria da combustão pelo oxigênio, formulada por
Lavoisier (século XVIII), teve importante papel na solução dos debates da
época e é considerada, segundo muitos filósofos e historiadores, a pedra
angular da Revolução Química.
Lyell (século XIX) teoriza acerca da crosta terrestre ser constituída
por camadas de diferentes idades, contribuindo para a concepção de que a
Terra se formou ao longo do tempo, mediante mudanças graduais e lentas,
e não como produto de catástrofes, como afirmavam a Bíblia e alguns

58
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cientistas, entre eles Buffon e Cuvier.


Poucas décadas depois da publicação da geologia de Lyell as
ciências da vida alcançam uma teoria unificadora por meio da obra de Darwin,
que foi leitor e amigo do geólogo. Tomando os conhecimentos produzidos
pela Botânica, Zoologia, Paleontologia e Embriologia, avaliando-os à luz
dos dados que obteve cm suas viagens de exploração e das relações que
estabeleceu entre tais achados, Darwin elabora uma teoria da evolução que
possibilita uma interpretação geral para o fenômeno da diversidade da vida,
assentada sobre os conceitos de adaptação e seleção natural. Mesmo que
tal teoria tenha encontrado muitos opositores e revelado pontos frágeis,
estes foram, mais tarde, explicados com o desenvolvimento da Genética
e a com cooperação de outros campos do conhecimento, confirmando e
dando mais consistência à formulação de Darwin.
Não foi sem debates e controvérsias que se instalaram os
paradigmas fundadores das ciências modernas. Esta apresentação,
muito sucinta e linear, não poderia mostrar esse aspecto que possibilita
compreender como as mudanças dos paradigmas são revoluções não
apenas no âmbito interno das Ciências, mas que alcançam, mais cedo ou
mais tarde, toda a sociedade. Também não traz à luz a intrincada rede de
relações entre a produção científica e o contexto socioeconómico e político
em que ela se dá. Ao longo da história é possível verificar que a formulação
e o sucesso das diferentes teorias científicas estão associados a aspectos
de seu momento histórico.
Este século presencia um intenso processo de criação científica,
inigualável a tempos anteriores. A associação entre Ciência e Tecnologia
se estreita, assegurando a parceria em resultados: os semicondutores que
propiciaram a informática e a chamada “terceira revolução industrial”, a
engenharia genética, capaz de produzir novas espécies vegetais e animais
com características previamente estipuladas, são exemplos de tecnologias
científicas que alcançam a todos, ainda que nem sempre o leigo consiga
entender sua amplitude.
O desenvolvimento da tecnologia de produção industrial deu
margem a desenvolvimentos científicos, a exemplo da termodinâmica, que

59
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

surgiu com a primeira revolução industrial. Da mesma forma, as tecnologias


de produção também se apropriaram de descobertas científicas, a exemplo
da eletrodinâmica na segunda revolução industrial e da quântica na terceira.
Há assim um movimento retroalimentado, de dupla mão de direção, em
que, a despeito do distinto “estatuto” da investigação científica, é pretensa
qualquer separação radical entre esta e inúmeros desenvolvimentos
tecnológicos. Isso valeu para a roda d’água medieval, para o motor elétrico
do século passado e para o desenvolvimento do laser e dos semicondutores
neste século.
Atualmente, em meio à industrialização intensa e à urbanização
absurdamente concentrada, também potenciadas pelos conhecimentos
científicos e tecnológicos, conta-se com a sofisticação da medicina
científica das tomografias computadorizadas e com a enorme difusão da
teleinformática. Ao mesmo tempo, convive-se com ameaças como o buraco
na camada de ozônio, a bomba atômica, a fome, as doenças endêmicas
não-controladas e as decorrentes da poluição. A associação entre
Ciência e Tecnologia se amplia, tornando-se mais presente no cotidiano e
modificando, cada vez mais, o próprio mundo.
As idéias herdadas da cultura clássica revelam-se insuficientes para
explicar fenômenos, quando abordados do ponto de vista do infinitamente
pequeno e do infinitamente grande.
Elétrons, por exemplo, consagrados como partículas, comportam-
se como ondas ao atravessarem um cristal. A luz, consagrada como onda,
pode se comportar como partícula. E essa dualidade onda-partícula é um
traço universal do mundo quântico de toda matéria, no âmago cristalino das
grandes rochas, na delicada estrutura da informação genética das células
vivas.
No mundo quântico a lógica causal e a relação de identificação es-
paço/tempo são outras, não alcançadas pela lógica do senso comum. O
desenvolvimento da física quântica mostrou uma realidade que demanda
outras representações.
Essa nova lógica permitirá compreender, pela primeira vez, a
enorme regularidade das propriedades químicas, ópticas, magnéticas e

60
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elétricas dos materiais e desvendar a estrutura microscópica da vida.


A Biologia reflete e abriga os dilemas dessa nova lógica. Explica-
se quanticamente a estrutura infinitesimal, as microscópicas estruturas de
construção dos seres, sua reprodução c seu desenvolvimento. E se debate,
com questões existenciais de grande repercussão filosófica, se a origem
da vida é um acidente, uma casualidade que poderia não ter acontecido
ou se, pelo contrário, é a realização de uma ordem já inscrita na própria
constituição da matéria primeva3.
A lógica quântica mostra que a intervenção do observador modifica o
objeto observado. O observador interfere no fenômeno, pois a observação é
uma interação. Assim, seria vã a esperança de um conhecimento objetivo do
mundo desprendida de qualquer influência subjetiva. “O que nós chamamos
de realidade não é nada mais que uma síntese humana aproximativa,
construída a partir de observações diversas e de olhares descontínuos”4.
Essa continua sendo, no entanto, uma polêmica deste século, pois há ainda
quem advogue uma total objetividade do conhecimento científico.
Finalmente, é importante reiterar que, sendo atividades humanas,
a Ciência e a Tecnologia são fortemente associadas às questões sociais
e políticas. Motivações aparentemente singelas, como a curiosidade ou
o prazer de conhecer são importantes na busca de conhecimento para
o indivíduo que investiga a natureza. Mas freqüentemente interesses
econômicos e políticos conduzem a produção científica ou tecnológica.
Não há, portanto, neutralidade nos interesses científicos das nações, das
instituições, nem dos grupos de pesquisa que promovem e interferem na
produção do conhecimento.

3. APRENDER E ENSINAR CIÊNCIAS NATURAIS NO ENSINO


FUNDAMENTAL
Os avanços das pesquisas na didática das Ciências, resumidos na
introdução, apontam a importância da análise psicológica e epistemológica
do processo de ensino e aprendizagem de Ciências Naturais para

61
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

compreendê-lo e reestruturá-lo.
Para o ensino de Ciências Naturais é necessária a construção de
uma estrutura geral da área que favoreça a aprendizagem significativa do
conhecimento historicamente acumulado e a formação de uma concepção
de Ciência, suas relações com a Tecnologia e com a Sociedade. Portanto,
é necessário considerar as estruturas de conhecimento envolvidas no
processo de ensino e aprendizagem — do aluno, do professor, da Ciência.
De um lado, os estudantes possuem um repertório de representações,
conhecimentos intuitivos, adquiridos pela vivência, pela cultura e senso
comum, acerca dos conceitos que serão ensinados na escola. O grau de
amadurecimento intelectual e emocional do aluno e sua formação escolar
são relevantes na elaboração desses conhecimentos prévios. Além disso,
é necessário considerar, o professor também carrega consigo muitas ideias
de senso comum, ainda que tenha elaborado parcelas do conhecimento
científico. De outro lado, tem-se a estrutura do conhecimento científico
e seu processo histórico de produção, que envolve relações com várias
atividades humanas, especialmente a Tecnologia, com valores hu¬manos
e concepções de Ciência.
Os campos do conhecimento científico — Astronomia, Biologia,
Física, Geociências e Química — têm por referência as teorias vigentes,
que se apresentam como conjuntos de proposições e metodologias
altamente estruturados e formalizados, muito distantes, portanto, do
aluno em formação. Não se pode pretender que a estrutura das teorias
científicas, em sua complexidade, seja a mesma que organiza o ensino e a
aprendizagem de Ciências Naturais no ensino fundamental.
As teorias científicas oferecem modelos lógicos e categorias dc ra-
ciocínio, um painel de objetos de estudo — fenômenos naturais e modos
de realizar transformações no meio —, que são um horizonte para onde
orientar as investigações em aulas e projetos de Ciências.
A história das Ciências também é fonte importante de conhecimentos
na área. A história das ideias científicas e a história das relações do ser
humano com seu corpo, com os ambientes e com os recursos naturais
devem ter lugar no ensino, para que se possa construir com os alunos uma

62
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

concepção interativa de Ciência e Tecnologia não-neutras, contextualizada


nas relações entre as sociedades humanas e a natureza. A dimensão
histórica pode ser introduzida nas séries iniciais na forma de história dos
ambientes e das invenções. Também é possível o professor versar sobre
a história das idéias científicas, conteúdo que passa a ser abordado com
mais profundidade nas séries finais do ensino fundamental.
Pela abrangência e pela natureza dos objetos deestudo das
Ciências, é possível desenvolver a área de forma muito dinâmica, orientando
o trabalho escolar para o conhecimento sobre fenômenos da natureza,
incluindo o ser humano e as tecnologias mais próximas e mais distantes,
no espaço e no tempo. Estabelecer relações entre o que é conhecido e as
novas idéias, entre o comum e o diferente, entre o particular e o geral, definir
contrapontos entre os muitos elementos no universo de conhecimentos são
processos essenciais à estruturação do pensamento, particularmente do
pensamento científico.
Aspectos do desenvolvimento afetivo, dos valores e das atitudes
também merecem atenção ao se estruturar a área de Ciências Naturais,
que deve ser concebida como oportunidade de encontro entre o aluno,
o professor e o mundo, reunindo os repertórios de vivências dos alunos
e oferecendo-lhes imagens, palavras e proposições com significados que
evoluam, na perspectiva de ultrapassar o conhecimento intuitivo e o senso
comum.
Se a intenção é que os alunos se apropriem do conhecimento
científico e desenvolvam uma autonomia no pensar c no agir, é importante
conceber a relação de ensino e aprendizagem como uma relação entre
sujeitos, em que cada um, a seu modo e com determinado papel, está
envolvido na construção de uma compreensão dos fenômenos naturais e
suas transformações, na formação de atitudes e valores humanos.
Dizer que o aluno é sujeito de sua aprendizagem significa afirmar
que é dele o movimento de ressignificar o mundo, isto é, de construir
explicações norteadas pelo conhecimento científico.
Os alunos têm idéias acerca do seu corpo, dos fenômenos naturais
e dos modos de realizar transformações no meio; são modelos com uma

63
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

lógica interna, carregados de símbolos da sua cultura. Convidados a expor


suas idéias para explicar determinado fenômeno e a confrontá-las com outras
explicações, eles podem perceber limites de seus modelos e a necessidade
de novas informações; estarão com movimento de ressignifícação.
Mas esse processo não é espontâneo; é construído com a
intervenção do professor. O professor quem tem condições de orientar
o caminhar do aluno, criando situações interessantes e significativas,
fornecendo informações que permitam a reelaboração e a ampliação
dos conhecimentos prévios, propondo articulações entre os conceitos
construídos, para organizá-los em um corpo de conhecimentos
sistematizados.
Ao longo do ensino fundamental a aproximação ao conhecimento
científico se faz gradualmente. Nos primeiros ciclos o aluno constrói re-
pertórios de imagens, fatos e noções, sendo que o estabelecimento dos
conceitos científicos se configura nos ciclos finais.
Ao professor cabe selecionar, organizar e problematizar conteúdos
de modo a promover um avanço no desenvolvimento intelectual do aluno,
na sua construção como ser social.
Pesquisas têm mostrado que, muitas vezes, conceitos intuitivos
co-existem com conceitos científicos aprendidos na escola. Nesse caso
o ensino não provocou uma mudança conceitual, mas, desde que a
aprendizagem tenha sido significativa, o aluno adquiriu um novo conceito.
Além disso, desde que o professor interfira adequadamente, o aluno pode
ganhar consciência da coexistência de diferentes sistemas explicativos
para o mesmo conjunto de fatos e fenômenos, estando apto a reconhecer
e aplicar diferentes domínios de idéias em diferentes situações. Ganhar
consciência da existência de diferentes fontes de explicação para as coisas
da natureza e do mundo é tão importante quanto aprender conceitos
científicos.
Sabe-se também que nem sempre todos os alunos de uma classe
têm idéiasprévias acerca de um objeto de estudo. Isso não significa que
tal objeto não deva ser estudado. Significa, sim, que a intervenção do
professor será a de apresentar idéiasgerais a partir das quais o processo
de investigação sobre o objeto possa se estabelecer. A apresentação de um
64
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assunto novo para o aluno também é instigante, c durante as investigações


surgem dúvidas, constroem-se representações, buscam-se informações e
confrontam-se idéias.
É importante, no entanto, que o professor tenha claro que o ensino
de Ciências não se resume à apresentação dc definições científicas,
em geral fora do alcance da compreensão dos alunos. Definições são o
ponto de chegada do processo de ensino, aquilo que se pretende que o
aluno compreenda ao longo de suas investigações, da mesma forma que
conceitos, procedimentos e atitudes também são aprendidos.
Ciências Naturais são procedimentos fundamentais aqueles que
permitem a investigação, a comunicação e o debate de fatos e ideias. A
observação, a experimentação, a comparação, o estabelecimento de
relações entre fatos ou fenômenos e idéias, a leitura e a escrita dc textos
informativos, a organização de informações por meio de desenhos, tabelas,
gráficos, esquemas e textos, a proposição de suposições, o confronto entre
suposições e entre elas e os dados obtidos por investigação, a proposição
e a solução de problemas, são diferentes procedimentos que possibilitam
a aprendizagem.
Da mesma forma que os conteúdos conceituais, os procedimentos
devem ser construídos pelos alunos por meio de comparações e discussões
estimuladas por elementos e modelos oferecidos pelo professor.
No contexto da aprendizagem ativa, os alunos são convidados
à prática de tais procedimentos, início imitando o professor, e, aos
poucos, tornando-se autônomos. Por exemplo, ao trabalhar o desenho de
observação, o professor inicia a atividade desenhando na lousa, conversando
com as crianças sobre os detalhes de cores e formas que permitem que
o desenho seja uma representação do objeto original. Em seguida, os
alunos podem fazer seu próprio desenho de observação, sendo esperado
dele esse primeiro desenho se assemelhe ao do professor. Em outras
oportunidades as crianças poderão começar o desenho de observação
sem o modelo do professor, que ainda assim conversa com os alunos
sobre detalhes necessários ao desenho. O ensino desses procedimentos
só é possível pelo trabalho com diferentes temas de interesse científico,

65
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

que serão investigados de formas distintas. Certos temas podem ser objeto
de observações diretas e/ou experimentação, outros não.
Quanto ao ensino de atitudes e valores, embora muitas vezes o
professor não se dê conta estará sempre legitimando determinadas atitudes
com seus alunos. Afinal é ele uma referência importante para sua classe. É
muito importante que esta dimensão dos conteúdos seja objeto de reflexão
e de ensino do professor, para que valores e posturas sejam desenvolvidos
tendo cm vista o aluno que se tem a intenção de formar.
Em Ciências Naturais é relevante o desenvolvimento de posturas e
valores pertinentes às relações entre os seres humanos, o conhecimento e
o ambiente. O desenvolvimento desses valores envolve muitos aspectos da
vida social, como a cultura e o sistema produtivo, as relações entre o homem
e a natureza. Nessas discussões, o respeito à diversidade de opiniões
ou às provas obtidas por intermédio de investigação e a colaboração na
execução das tarefas são elementos que contribuem para o aprendizado
de atitudes, como a responsabilidade em relação à saúde e ao ambiente.
O Incentivo às atitudes de curiosidade, de respeito à diversidade
de opiniões, à persistência na busca e compreensão das informações,
às provas obtidas por meio de investigações, de valorização da vida em
sua diversidade, de preservação do ambiente, de apreço e respeito à
individualidade e à coletividade, têm lugar ímpar no processo de ensino e
aprendizagem.
No planejamento e desenvolvimento dos temas de Ciências em sala
de aula, cada uma das dimensões dos conteúdos deve ser explicitamente
tratada. É também essencial que sejam levadas em conta por ocasião das
avaliações, de forma compatível com o sentido amplo que se adotou para
os conteúdos do aprendizado.

3.1. OBJETIVOS GERAIS DE CIÊNCIAS NATURAIS PARA O ENSINO


FUNDAMENTAL
Os objetivos de Ciências Naturais no ensino fundamental são con-
cebidos para que o aluno desenvolva competências que lhe permitam
compreender o mundo e atuar como indivíduo e como cidadão, utilizando

66
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

conhecimentos de natureza científica e tecnológica. Esses objetivos de


área são coerentes com os objetivos gerais estabelecidos na Introdução
aos Parâmetros Curriculares Nacionais e também com aqueles distribuídos
nos Temas Transversais.
O ensino de Ciências Naturais deverá então se organizar de
forma que, ao final do ensino fundamental, os alunos tenham as seguintes
capacidades:
- compreender a natureza como um todo dinâmico, sendo o ser
humano parte integrante e agente de transformações do mundo em que
vive;
- identificar relações entre conhecimento científico, produção
de tecnologia e condições da vida no mundo de hoje e em sua evolução
histórica;
- formular questões, diagnosticar e propor soluções para problemas
reais a partir de elementos das Ciências Naturais, colocando em prática
conceitos, procedimentos e atitudes desenvolvidos no aprendizado escolar;
- saber utilizar conceitos científicos básicos, associados a energia,
matéria, transformação, espaço, tempo, sistema, equilíbrio e vida; saber
combinar leituras, observações, experimentações, registros, etc., para
coleta, organização, comunicação c discussão de fatos e informações;
- valorizar o trabalho em grupo, sendo capaz de ação crítica c
cooperativa para a construção coletiva do conhecimento;
- compreender a saúde como bem individual e comum que deve
ser promovido pela ação coletiva;
- compreender a tecnologia como meio para suprir necessidades
humanas, distinguindo usos corretos e necessários daqueles prejudi¬ciais
ao equilíbrio da natureza e ao homem.

3.2. OS CONTEÚDOS DE CIÊNCIAS NATURAIS NO ENSINO


FUNDAMENTAL
Os conteúdos não serão apresentados em blocos de conteúdos,
mas em blocos temáticos, dada a natureza da área. Estão organizados em
blo¬cos temáticos para que não sejam tratados como assuntos isolados. Os

67
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

blocos temáticos indicam perspectivas de abordagem e dão organização


aos conteúdos sem se configurarem como padrão rígido, pois possibilitam
estabelecer diferentes sequências internas aos ciclos, tratar conteúdos de
importância local e fazer conexão entre conteúdos dos diferentes blocos,
das demais áreas e dos temas transversais.
Os conceitos da área de Ciências Naturais, que são conhecimentos
desenvolvidos pelas diferentes ciências e aqueles relacionados às
tecnologias, são um primeiro referencial para os conteúdos do aprendizado.
Estão organizados em teorias científicas, ou em conhecimentos tecnológicos,
que não são definidos, mas se transformam continuamente, conforme já
discutido neste documento.
A grande variedade de conteúdos teóricos das disciplinas científicas
como a Astronomia, a Biologia, a Física, as Geociências e a Química,
assim como dos conhecimentos tecnológicos, deve ser considerada pelo
professor em seu planejamento.
A compreensão integrada dos fenômenos naturais, uma perspectiva
interdisciplinar, depende do estabelecimento de vínculos conceituais
entre as diferentes ciências. Os conceitos de energia, matéria, espaço,
tempo, transformação, sistema, equilíbrio, variação, ciclo, fluxo, relação,
interação e vida estão presentes em diferentes campos das ciências,
com significados particulares ou comuns, mas sempre contribuindo para
conceituações gerais. Por isso, adotou-se como segundo referencial esse
conjunto de conceitos centrais, para compreender os fenômenos naturais e
os conhecimentos tecnológicos com mútua relação.
Um terceiro referencial para os conteúdos nas Ciências Naturais
são as explicações intuitivas, de senso comum, acerca da natureza e
da tecnologia. São conceitos que importam e interferem no aprendizado
científico.
São procedimentos os modos de indagar, selecionar e elaborar o
conhecimento. Implicam observar, comparar, registrar, analisar, sintetizar,
interpretar e comunicar conhecimento.
As atitudes em Ciências Naturais relacionam-se ao desenvolvimento
de posturas e valores humanos, na relação entre o homem, o conhecimento

68
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

c o ambiente.
Sendo a natureza uma ampla rede de relações entre fenômenos,
e o ser humano parte integrante e agente de transformação dessa rede,
são muitos e diversos os conteúdos objetos de estudo da área. Faz-se
necessário, portanto, o estabelecimento de critérios para a seleção dos
conteúdos, de acordo com os objetivos gerais da área e com os fundamentos
apresentados nestes Parâmetros Curriculares Nacionais. São eles:
- os conteúdos devem se constituir em fatos, conceitos,
procedimentos, atitudes e valores compatíveis com o nível de
desenvolvimento intelectual do aluno, de maneira que ele possa operar
com tais conteúdos e avançar efetivamente nos seus conhecimentos;
- os conteúdos devem favorecer a construção de uma visão
de mundo, que se apresenta como um todo formado por elementos
interrelacionados, entre os quais o homem, agente de transformação. O
ensino de Ciências Naturais deve relacionar fenômenos naturais e objetos
da tecnologia, possibilitando a per-cepção de um mundo permanentemente
reelaborado, estabelecendo-se relações entre o conhecido e o desconhecido,
entre as partes e o todo;
- os conteúdos devem ser relevantes do ponto de vista social e ter
revelados seus reflexos na cultura, para permitirem ao aluno compreender,
cm seu cotidiano, as relações entre o homem e a natureza mediadas
pela tecnologia, superando interpretações ingênuas sobre a realidade à
sua volta. Os Temas Transversais apontam conteúdos particularmente
apropriados para isso.

3.2.1. Blocos temáticos


São quatro os blocos temáticos propostos para o ensino
fundamental: Ambiente; Ser humano e saúde; Recursos tecnológicos; e
Terra e Universo.
Os três primeiros blocos se desenvolvem ao longo de todo o ensino
fundamental, apresentando alcances diferentes nos diferentes ciclos.
O bloco Terra e Universo só será destacado a partir do terceiro
ciclo e não será abordado neste documento, completo apenas para os dois

69
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

primeiros ciclos.
Antes de entrar na explicitação dos blocos temáticos e suas possíveis
conexões, vale apontar as inúmeras possibilidades que esta estrutura
traz para a organização dos currículos regionais e locais, permitindo ao
educador criar e organizar seu planejamento considerando a sua realidade.
Cada bloco sugere conteúdos, indicando também as perspectivas de
abordagem. Tais conteúdos podem ser organizados em temas, compostos
pelo professor ao desenhar seu planejamento. Na composição dos temas
podem articular-se conteúdos dos diferentes blocos.
Os temas em Ciências podem ser muito variados, pois há assuntos
sobre o ser humano e o mundo que podem e devem ser investigados
em aulas de Ciências Naturais ao longo do primeiro grau. Existem temas
já consagrados — como água, poluição, energia, máquinas, culinária.
Tratados como temas, esses assuntos podem ser vistos sob os enfoques
dc diferentes conhecimentos científicos nas relações com aspectos
socioculturais.
De certo ponto de vista, os temas são aleatórios. Por exemplo,
uma notícia de jornal, um filme, um programa de TV, um acontecimento na
comunidade podem sugerir assuntos a serem trabalhados e converterem-
se em temas de investigação. O mesmo tema pode ser tratado de muitas
maneiras, escolhendo-se abordagens compatíveis com o desenvolvimento
intelectual da classe, com a finalidade de realizar processos consistentes
de ensino e aprendizagem.
A opção por organizar o currículo segundo tenras facilita o
tratamento interdisciplinar das Ciências Naturais. É também mais flexível
para se adequar ao interesse e às características do aluno, pois a menos
rigorosa que a estrutura das disciplinas. Os temas podem ser escolhidos
considerando-se a realidade da comunidade escolar, ou seja, do contexto
social e da vivência cultural de alunos e professores.
O tratamento dos conteúdos por meio de temas não deve significar,
entretanto, que a estrutura do conhecimento científico não tenha papel
no currículo. É essa estrutura que embasará os conhecimentos a serem
transmitidos, e compreendê-la é uma das metas da evolução conceituai de

70
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

alunos e professores.
Das temáticas estabelecidas para o primeiro e segundo ciclos,
duas são reiteradamente escolhidas, segundo a análise dos currículos
estaduais atualizados realizada pela Fundação Carlos Chagas: Ambiente e
Ser humano e saúde.
A temática “Recursos tecnológicos”, introduzida ainda nos primeiros
ciclos, reúne conteúdos que poderiam ser estudados compondo os outros
dois blocos, mas, por sua atualidade e urgência social, merece especial
destaque.
No próximo tópico será aprofundado o contorno geral dos três blocos
temáticos que se desenvolvem ao longo de todo o ensino fundamental.
apresentando-se algumas conexões gerais entre eles e indicando-se as
correlações com os temas transversais.

3.2.2. Ambiente
Nas últimas décadas presenciou-se a divulgação de debates sobre
problemas ambientais nos meios de comunicação, o que sem dúvida tem
contribuído para que as populações estejam alertas, mas a simples divulgação
não assegura a aquisição de informações e conceitos referendados pelas
Ciências. Ao contrário, é bastante freqüente a banalização do conhecimento
científico — o emprego da ecologia como sinônimo de meio ambiente é um
exemplo — e a difusão de visões distorcidas sobre a questão ambiental.
A partir do senso comum, os indivíduos desenvolvem representações
sobre o meio ambiente c problemas ambientais, geralmente pouco
rigorosas do ponto de vista científico. É papel da escola provocar a revisão
dos conhecimentos, valorizando-os sempre e buscando enriquecê-los com
informações científicas.
Como conteúdo escolar, a temática ambiental permite apontar
para as relações recíprocas entre sociedade e ambiente, marcadas pelas
necessidades humanas, seus conhecimentos e valores. As questões
específicas dos recursos tecnológicos, intimamente relacionadas às
transformações ambientais, também são importantes conhecimentos a
serem desenvolvidos.

71
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

O tema transversal Meio Ambiente traz a discussão a respeito


da relação entre os problemas ambientais e fatores econômicos,
políticos, sociais e históricos. São problemas que acarretam discussões
sobre responsabilidades humanas voltadas ao bem-estar comum
e ao desenvolvimento sustentado, na perspectiva da reversão da
crise socioambiental planetária. Sua discussão completa demanda
fundamentação cm diferentes campos de conhecimento. Assim, tanto as
ciências humanas quanto as ciências naturais contribuem para a construção
de seus conteúdos.
Em coerência com os princípios da educação ambiental (tema
transversal Meio Ambiente), aponta-se a necessidade de reconstrução
da relação homem-natureza, a fim de derrubar definitivamente a crença
do homem como senhor da natureza e alheio a ela e ampliando-se o
conhecimento sobre como a natureza se comporta e a vida se processa.
É necessário conhecer o conjunto das relações na natureza para
compreender o papel fundamental das Ciências Naturais nas decisões
importantes sobre os problemas ambientais. Entretanto, um conhecimento
profundo dessas relações só é possível mediante sucessivas aproximações
dos conceitos, procedimentos e atitudes relativos à temática ambiental,
observando-se as possibilidades intelectuais dos alunos, de modo que,
ao longo da escolaridade, o tratamento dos conceitos de inte¬resse geral
ganhe profundidade.
A Ecologia é o principal referencial teórico para os estudos
ambientais. Em uma definição ampla, a Ecologia estuda as relações de
interdependência entre os organismos vivos e destes com os componentes
sem vida do espaço que habitam, resultando em um sistema aberto
denominado ecossistema. Tais relações são enfocadas nos estudos das
cadeias e teias alimentares, dos níveis tróficos (produção, consumo e
decomposição), do ciclo dos materiais e fluxo de energia, da dinâmica
das populações, do desenvolvimento e evolução dos ecossistemas. Em
cada um desses capítulos lança-se mão de conhecimentos da Química, da
Física, da Geologia, da Paleontologia, da Biologia e de outras ciências, o
que faz da Ecologia uma ciência interdisciplinar.

72
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A fim de se observar a abrangência dos estudos ambientais do


ponto de vista das Ciências, serão examinados por alto dois exemplos: a
questão do fluxo de energia nos ambientes e as relações dos seres vivos
com os componentes abióticos do meio.
O conceito de fluxo de energia no ambiente só pode ser
compreendido, em sua amplitude, ao reunir noções sobre:
- fontes e transformações de energia;
- radiação solar diferenciada conforme a latitude geográfica da
região;
- fotossíntese (transformação de energia luminosa em energia
química dos alimentos produzidos pelas plantas) e respiração celular
(processo que converte energia acumulada nos nutrientes em energia
disponível para a célula dos organismos vivos);
- teia alimentar (que sinaliza passagem e dissipação de energia em
cada nível da teia);
- dinâmica terrestre (a ocorrência de vulcões);
- transformações de energia provocadas pelo homem. Este assunto,
por si só, suscita inúmeras investigações, como, por exemplo, a origem
remota dos combustíveis fósseis, formados num tempo muito anterior
(aproximadamente 650 milhões de anos) ao surgimento do homem na Terra
(aproximadamente 1,5 milhão de anos); a natureza desses combustíveis
(hipóteses sobre o processo de fossiIização em condições primitivas); os
processos de extração e refino dos combustíveis (destacados no bloco
“Recursos tecnológicos”).
O conceito de relação dos seres vivos com os componentes
abióticos do meio, por sua vez, também considerado em linhas gerais,
deve levar em conta:
• a relação geral entre plantas e luz solar (fotossíntese), que
de fato é específica, considerando-se a variação da intensidade luminosa
em diferentes ambientes terrestres e aquáticos no decorrer do ano e as
adaptações evolutivas dos organismos autótrofos a essas condições;
• as relações entre animais e luz, considerando-se suas
adaptações morfofisiológicas aos hábitos de vida noturno ou diurno;

73
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

• as relações entre água e seres vivos, que por si só merecem


vários capítulos das Ciências Naturais, posto que repor a água é condição
para diferentes processos metabólicos (funcionamento bioquímico dos
organismos), para processos de reprodução (cm plantas, animais c outros
seres vivos que dependem da disponibilidade de água para a reprodução),
para a determinação do hábitat c do nicho ecológico, no caso de seres
vivos aquáticos;
• as relações entre solo e seres vivos, que são variadíssimas e
muito antigas, pois se considera a formação dos solos como conseqüência
dessa relação desde milhares de anos.
• as relações entre seres vivos entre si no espaço e no tempo,
determinando a biodiversidade de ambientes naturais específicos.
O enfoque das relações entre os seres vivos e não-vivos, matéria
e energia, com dimensões instantâneas ou de longa duração, locais ou
planetárias, aplicado aos múltiplos conteúdos da temática ambiental,
oferece subsídios para a formação de atitudes de respeito à integridade
ambiental, observando-se o longo período de formação dos ambientes
naturais — muito mais remoto que o surgimento do homem na Terra — e
que a natureza tem ritmo próprio de renovação c reconstituição de seus
componentes, por meio de processo complexo.
Os fundamentos científicos devem subsidiar a formação de atitudes
dos alunos. Não basta ensinar, por exemplo, que não se deve jogar lixo nas
ruas ou que é necessário não desperdiçar materiais, como água, papel ou
plástico. Para que essas atitudes e valores se justifiquem, para não serem
dogmas vazios de significados, é necessário informar sobre as implicações
ambientais dessas ações. Nas cidades, lixo nas ruas pode significar bueiros
entupidos e água de chuva sem escoamento, favorecendo as enchentes e a
propagação de moscas, ratos ou outros veículos de doenças. Por sua vez,
o desperdício de materiais, considerado no enfoque das relações entre os
componentes do ambiente, pode significar a intensificação de extração de
recursos naturais, como petróleo e vegetais que são matéria-prima para a
produção de plásticos e papel.
Ao realizarem procedimentos de observação e experimentação, os

74
FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

alunos buscam informações e estabelecem relações entre elementos dos


ambientes, subsidiados por informações complementares oferecidas por
outras fontes ou pelo professor.
É importante considerar que os conceitos de Ecologia são
construções teóricas e não fenômenos observáveis ou passíveis de
experimentação. Este é o caso das cadeias alimentares, do fluxo de
energia, da fotossíntese, da adaptação dos seres vivos ao ambiente, da
biodiversidade. Não são aspectos que possam ser vistos diretamente, só
podem ser interpretados, são idéias construídas com o auxílio de outras mais
simples, de menor grau de abstração, que podem, ao menos parcialmente,
ser objeto de investigação por meio da observação e da experimentação
diretas.
Por exemplo, a idéia abstrata de ciclo dos materiais nos ambientes,
que no referencial teórico comporta implicações biológicas, físicas, químicas
e geológicas, pode ganhar sucessivas aproximações, construindo- se
conceitos menos abstratos e mais simples. Neste conteúdo, é possível
a observação da degradação de diferentes materiais, examinando-
se a incidência de fungos na decomposição de restos de seres vivos, o
enferrujamento de metais, a resistência do vidro e a influência da umidade,
da luz e do calor nesses processos. São ideias que colaboram para a
formação do conceito de ciclo de materiais nos ambientes. Estes conteúdos
podem ser tratados em conexão com outros na dimensão das atitudes,
como a valorização da reciclagem e repúdio ao desperdício, essenciais
à educação ambiental. Com isso, busca-se explicar como as várias
di¬mensões dos conteúdos estão articulados entre si e com os conteúdos
de educação ambiental, apontados no tema transversal Meio Ambiente.
Em síntese, para se tratar conteúdos tendo cm vista o
desenvolvimento de capacidades inerentes à cidadania é preciso que o
conhecimento escolar não seja alheio ao debate ambiental travado pela
comunidade e ofereça meios de o aluno participar, refletir e manifestar-se,
ouvindo os membros da comunidade, no processo de convívio democrático
e participação social.

75
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

3.2.3. Ser humano e saúde


A concepção de corpo humano como um sistema integrado, que
interage com o ambiente e reflete a história de vida do sujeito, orienta esta
temática.
Assim como a natureza, o corpo humano deve ser visto como
um todo dinamicamente articulado; os diferentes aparelhos e sistemas
que o compõem devem ser percebidos em suas funções específicas
para a manutenção do todo. Importa, portanto, compreender as relações
fisiológicas c anatômicas. Para que o aluno compreenda a maneira pela
qual o corpo transforma, transporta e elimina água, oxigênio, alimentos,
obtém energia, se defende da invasão de elementos danosos, coordena e
integra as diferentes funções, é importante conhecer os vários processos
e estruturas e compreender a relação de cada aparelho e sistema com os
demais. É essa relação que assegura a integridade do corpo e faz dele
uma totalidade.
Tanto quanto as relações entre aparelhos e sistemas, as interações
com o meio respondem pela manutenção da integridade do corpo. A maneira
como tais interações se estabelecem, permitindo ou não a realização das
necessidades biológicas, afetivas, sociais e culturais, fica registrada no
corpo. Por isso se diz que o corpo reflete a história de vida do sujeito.
A carência nutricional, afetiva e social, por exemplo, desenham o corpo
humano, interferem na sua arquitetura e no seu funcionamento.
Assim considerado — um sistema, fruto das interações entre suas
partes e com o meio—, pode-se compreender que o corpo humano apresenta
um equilíbrio dinâmico: passa de um estado a outro, volta ao estado inicial,
e assim por diante. A temperatura c a pressão variam ao longo do dia, todos
os dias. O mesmo ocorre com a atividade cerebral, a cardíaca, o estado de
consciência, etc. O nível de açúcar no sangue, por exemplo, varia ao longo
do dia, conforme os horários da alimentação. Transpira-se mais ou menos,
urina-se mais ou menos, conforme a temperatura ambiental e conforme
as atividades realizadas. Em outras palavras, o corpo apresenta funções
rítmicas, isto é, que se repetem com determinados intervalos de tempo.
Esses ritmos apresentam um padrão comum para a espécie humana,

76
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mas apresentam variações individuais. E esta é outra idéiaextremamente


importante a ser considerada no trabalho com os alunos: o corpo humano
apresenta um padrão estrutural e funcional comum, que o identifica como
espécie; mas cada corpo é único, o que o identifica como individualidade.
Se há necessidades básicas gerais, há também necessidades individuais.
Portanto, o conhecimento sobre o corpo humano para o aluno
deve estar associado a um melhor conhecimento do seu próprio corpo,
por ser seu e por ser único, e com o qual ele tem uma intimidade e uma
percepção subjetiva que ninguém mais pode ter. Essa visão favorece o
desenvolvimento de atitudes de respeito e de apreço pelo próprio corpo c
pelas diferenças individuais.
O equilíbrio dinâmico, característico do corpo humano é chamado
de estado de saúde. Pode-se então compreender que o estado de saúde
é condicionado por fatores de várias ordens: físicos, psíquicos e sociais. A
falta dc um ou mais desses condicionantes da saúde pode ferir o equilíbrio
e, como conseqüência, o corpo adoece. Trabalhando com a perspectiva do
corpo como um todo integrado, a doença passa a ser compreendida como
um estado de desequilíbrio do corpo e não de alguma de suas partes. Uma
disfunção de qualquer aparelho ou sistema representa um problema do
corpo todo e não apenas daquele aparelho ou sistema.
Cada pessoa, aluno ou professor, apreende em seu meio dc
convívio, especialmente cm família, um conjunto de idéias a respeito do
corpo. E importante que o professor tenha consciência disso para que possa
superar suas próprias pré-concepções e retrabalhar algumas das noções
que os alunos trazem de casa, algumas correspondentes a equívocos
graves. Além dessas noções adquiridas em sua vivência individual, há
outras gerais difundidas pela mídia, mas tão pouco elaboradas que também
constituem senso comum. Todas essas conceituações adquiridas fora da
escola devem ser consideradas no trabalho em sala de aula.
Também faz parte da herança cultural isolar o corpo humano das
interações com o meio ou. ainda, concebê-lo apenas como entidade física.
Essa ideia vem cedendo seu lugar a outra, a de que o corpo não é uma
máquina; tem emoções, sentimentos, que, junto com os aspectos físicos,
se constituem dimensões de um único corpo.
77
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

O estado de saúde ou de doença decorre da satisfação ou não das


necessidades biológicas, afetivas, sociais e culturais, que, embora sejam
comuns, apresentam particularidades em cada indivíduo, nas diferentes
culturas e fases da vida.
Como ser vivo que é, o ser humano tem seu ciclo vital: nasce,
cresce, se desenvolve, se reproduz e morre. Cada uma dessas fases é
fortemente marcada por aspectos socioculturais que se traduzem em
hábitos, comportamentos, rituais próprios de cada cultura. A alimentação,
por exemplo, é uma necessidade biológica comum a todos os seres
humanos. Todos têm necessidade de consumir diariamente uma série de
substâncias alimentares, fundamentais à construção c ao desenvolvimento
do corpo — proteínas, vitaminas, carboidratos, lipídios, sais minerais e
água. Os tipos de alimentos c a forma de prepará-los são determinados
pela cultura e pelo gosto pessoal. Atualmente, a mídia tem se incumbido
de ditar a alimentação mediante a veiculação de propaganda. E muito
importante estar atento às ciladas que a propaganda prega. O consumo é
o objetivo principal da propaganda — de alimentos ou de medicamentos —,
não importando o comprometimento da saúde. Pesquisas têm mostrado
que o índice elevado de colesterol no sangue deixou de ser um problema
apenas de adultos, para ser também de crianças. E não se trata de casos
esporádicos; vem crescendo o número de crianças com índice elevado de
colesterol. Motivo: consumo de sanduíches e doces no lugar de refeições
com verduras, cereais e legumes.
O desenvolvimento de uma consciência com relação à alimentação
é necessário, considerando-se as demandas individuais e as possibilidades
coletivas de obter alimentos. E essencial a máxima e equilibrada utilização
de recursos disponíveis, pelo aproveitamento de partes de vegetais e
animais comumente desperdiçadas, plantio coletivo de hortas e árvores
frutíferas. Esse assunto também é abordado no documento Saúde.
É importante que o trabalho sobre o crescimento e o desenvolvimento
humanos leve em conta as transformações do corpo e do comportamento
nas diferentes fases da vida — nascimento, infância, juventude, idade adulta
e velhice —, evidenciando-se e intercruzando-se os fatores biológicos,

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culturais e sociais que marcam tais fases. Importa, ainda, que se enfatize a
possibilidade de realizar escolhas na herança cultural recebida e de mudar
hábitos e comportamentos que favoreçam a saúde pessoal e coletiva e
o desenvolvimento individual. E papel da escola subsidiar os alunos
com conhecimentos e capacidades que os tornem aptos a discriminar
informações, identificar valores agregados a essas informações c realizar
escolhas. Por exemplo, o hábito da automedicação, que se constitui fator de
risco à vida, não um hábito a ser preservado, pois fere um valor importante
a ser desenvolvido: o respeito à vida com qualidade. Da mesma forma,
outros hábitos e comportamentos, como jogar lixo em terrenos baldios,
descuido com a higiene pessoal, discriminação de pessoas de padrões
culturalmente distintos, etc., podem e devem ser trabalhados.
A sexualidade humana deve ser considerada nas diferentes fases
da vida, compreendendo que é um comportamento condicionado por fatores
biológicos, culturais e sociais, que tem um significado muito mais amplo e
variado que a reprodução, para pessoas de todas as idades. E elemento
de realização humana em suas dimensões afetivas e sociais, que incluem
mas não se restringem à dimensão biológica.
Tão importante quanto o estudo da anatomia e fisiologia dos
aparelhos reprodutores, masculino e feminino, a gravidez, o parto,
a contracepção, as formas de prevenção às doenças sexualmente
transmissíveis, é a compreensão de que o corpo humano é sexuado, que
a manifestação da sexua-lidade assume formas diversas ao longo do
desenvolvimento humano e, como qualquer comportamento, é modelado
pela cultura e pela sociedade. Esse conhecimento abre possibilidades para
o aluno conhecer-se melhor, perceber e respeitar suas necessidades e as
dos outros, realizar escolhas dentro daquilo que lhe é oferecido.
Os conteúdos tratados neste bloco temático permitem inúmeras
conexões com aqueles propostos nos outros dois blocos, bem como com
os temas transversais Saúde e Orientação Sexual.
Por exemplo, ao tratar a reprodução humana, pode-se compará-
la à reprodução de outros seres vivos, em que se observam rituais de
acasalamento e comportamentos de cuidado com a prole. Podem-se esta-

79
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

belecer diferenças e semelhanças entre tais comportamentos — o que é


instintivo nos animais e no ser humano, o que é modelado pela cultura
e pelas convenções sociais nos humanos, as diferenças de padrões nas
dife¬rentes culturas c nos diferentes tempos. Pode-se tratar da alimentação
no estudo das cadeias e teias alimentares evidenciando-se a presença do
homem como consumidor integrante da natureza.
O aspecto rítmico das funções do corpo humano pode ser abordado
em conexão com o mesmo aspecto observado para os demais seres vivos,
evidenciando-se o aspecto da natureza biológica do ser humano. Algumas
funções rítmicas interessantes e facilmente observáveis são a floração e a
frutificação de plantas ao longo do ano, o estado de sono e vigília no ser
humano e nos demais animais, a menstruação nas mulheres, o cio entre os
animais, etc. Pode-se ainda estabelecer relações entre os ritmos fisiológicos
e os geofísicos, como o dia e a noite e as estações do ano. Os ritmos
fisiológicos estão ajustados aos geofísicos, embora sejam indepen¬dentes.
Por exemplo: o ciclo sono-vigília está ajustado ao ciclo dia-noite (movimento
da Terra em torno de seu eixo). Se isolarmos uma pessoa dentro de uma
caverna onde o ciclo dia-noite inexista, ela continuará tendo períodos de
sono e períodos de vigília, mas o tamanho de cada um desses períodos se
modificará.

3.2.4. Recursos tecnológicos


Este bloco temático enfoca as transformações dos recursos
materiais e energéticos em produtos necessários à vida humana, aparelhos,
máquinas, instrumentos e processos que possibilitam essas transformações
e as implicações sociais do desenvolvimento e do uso de tecnologias.
Para a elaboração deste bloco não há discussão acumulada
expressiva, ao contrário do que ocorre com a educação ambiental e
educação para a saúde. Sua presença neste documento decorre da
necessidade de formar alunos capacitados para compreender e utilizar
recursostecnológicos, cuja oferta e aplicação se ampliam significativamente
na sociedade brasileira e mundial.
É interessante lembrar que o conhecimento da história da

80
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humanidade, da pré-história aos dias atuais, nas diferentes culturas, tem


como referência importante a tecnologia. Assim, conhece-se o período
paleolítico caracterizado pelo domínio do fogo e pelo uso da pedra lascada
como instrumento de caça e pesca, substituído pela pedra polida no período
neolítico, (aliando os instrumentos sofriam polimento por meio de atrito.
Durante esse período desenvolveram-se também a agricultura, a criação de
animais e a utilização do ouro e do cobre, metais que dispensam fun¬dição
c refinação, cuja tecnologia foi elaborada no período seguinte.
Aceita-se amplamente que o desenvolvimento e especialização
das populações humanas, ao longo dos tempos, se deu com conexão com
o desenvolvimento tecnológico que foi sendo refinado e aumentado.
No presente, assiste-se à convivência da utilização de técnicas
an¬tigas e artesanais com aplicações tecnológicas que se desenvolveram
em íntima relação com as ciências modernas e contemporâneas. Assiste-se,
também, ao crescimento de problemas sociais graves, como a desnutrição e
a mortalidade infantil num momento em que o desenvolvimento tecnológico
se faz marcante na produção e estocagem de alimentos, na indústria
farmacêutica e na medicina.
Este bloco temático comporta discussões acerca das relações
entre Ciência, Tecnologia e Sociedade, no presente e no passado, no Brasil
e no mundo, em vários contextos culturais. As questões éticas, valores e
atitudes compreendidos nessas relações são aspectos fundamentais a
in¬vestigar nos temas que se desenvolvem em sala de aula. A origem e o
destino social dos recursos tecnológicos, as conseqüências para a saúde
pessoal e ambiental e as vantagens sociais do emprego de determinadas
tecnologias são exemplos de aspectos a serem investigados.
A dimensão dos procedimentos comporta todos os modos de reunir,
organizar, discutir e comunicar informações como nos demais blocos. São
exemplos de interesse da Física a construção de modelos e experimentos
em eletro-eletrônica, magnetismo, acústica, óptica e mecânica (circuitos
elétricos, campainhas, máquinas fotográficas, motores, chuveiro, torneira,
rádio a pilha, etc.), assim como são exemplos de interesse da Química e
da Biologia a experimentação e interpretação da ação de catalisadores, de

81
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

fermentos, de fertilizantes. Nem sempre é possível e sequer é desejável


que os estudos se restrinjam a interesses unidisciplinares, dado o caráter
interdisciplinar das elaborações tecnológicas.
Do ponto de vista dos conceitos, este bloco reúne estudos sobre
matéria, energia, espaço, tempo, transformação e sistema aplicados às
tecnologias que medeiam as relações do ser humano com o seu meio.
Por intermédio da apreciação de um exemplo é possível verificaras
dimensões dos conteúdos implicados a um determinado problema: de
onde vem a luz das casas? O entendimento da geração e transmissão da
energia elétrica envolve conceitos relacionados a princípios de conservação
da energia, transformação de energia mecânica em energia elétrica, calor,
luz, propriedades dos materiais, corrente, circuitos elétricos e geradores.
Vários procedimentos podem ser utilizados, como visitas a usinas ou
estações de transmissão, entrevistas, leituras, experimentos e montagens.
Investigações sobre o descobrimento e aplicação da eletricidade, sobre
os limites dos usos de recursos hídricos e suas implicações ambientais e
sobre o acesso das populações a esse bem ampliam e contextualizam o
tema.
Os conteúdos deste bloco temático estão estreitamente ligados aos
estudos sobre Ambiente, Ser humano e saúde c aos temas transversais
Meio Ambiente. Saúde, Ética e Pluralidade Cultural.
O conhecimento acerca dos processos de extração e cultivo de
plantas com hortas, pomares e lavouras, de criação de animais em granjas,
viveiros e pastagens, de extração e transformação industrial de metais, de
extração de areia e outros materiais utilizados na construção civil podem
ser abordados, considerando os conteúdos de Recursos tecnológicos e
Ambiente, possibilitando ainda conexão com o tema transversal Meio
Ambiente.
As relações entre os recursos tecnológicos e a saúde humana, en-
tendida como bem-estar físico, psíquico e social, estabelecem conexões
entre este bloco e o documento Saúde. Por exemplo, as aplicações
tecnológicas no saneamento dos espaços urbanos e rurais, na conservação
de alimentos, na medicina, no lazer e no trabalho.

82
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As funções de nutrição podem ser trabalhadas em conexão com


o bloco “Recursos tecnológicos”. Ao lado do conhecimento sobre as
substâncias alimentares e suas funções no organismo, necessidades
alimentares de acordo com idade, sexo, atividade que o sujeito desenvolve e
clima da região onde vive, pode-se estudar o problema da deterioração dos
alimentos e as técnicas desenvolvidas para conservação, considerando-
se o alcance social de tal desenvolvimento. A indústria alimentícia pode
ser discutida, investigando-se alguns processos de transformação dos
alimentos, adição de substâncias corantes, conservantes, etc. Também
cabem relações com aspectos político-econômicos envolvidos na
disponibilidade de tais alimentos.
Todas as questões relativas ao emprego e ao desenvolvimento
de técnicas e tecnologias comportam discussões de aspectos éticos.
Muito frequentemente esses aspectos éticos estão associados a grandes
interesses econômicos e políticos e é preciso trazer tais componentes da
questão para a discussão, evitando-se desenvolver exclusivamente uma
consciência ingênua. É comum, por exemplo, discutir-se a preservação de
energia e de água potável ou o risco da automedicação a partir de uma
perspectiva simplesmente individual, restringindo-se a recomendações do
tipo “apague a luz do corredor” e “não deixe a torneira pingando”, ou “evite a
automedicação”, deixando-se de lado variáveis gravemente mais rele¬vantes
como a política econômica de produção de equipamentos energeticamente
perdulários, como automóveis de alta potência e geladeiras mal isoladas
ou a propaganda de medicamentos e sua venda indiscriminada. O alcance
político de tais questões éticas poderia reverter em imediato benefício para
a população, pois uma efetiva proibição da venda de medicamentos sem
receita colocaria a poderosa indústria farmacêutica mobilizada a favor da
ampliação do atendimento médico.
A escolha de conteúdos, também neste bloco temático, deve ser
cuidadosa, para que seja estimulante e de real interesse dos alunos, para que
sirva à sua aprendizagem, respeitando o amadurecimento correspondente
a cada faixa etária e levando à aprendizagem de procedimentos, ao
desenvolvimento de valores, à construção da cidadania.

83
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

3. INTRODUÇÃO
Você irá estudar alguns elementos do processo ensino e
aprendizagem. Dessa forma, estruturamos a unidade 3, nos temas a seguir:
3.1 TEMA I – Aspectos Conceituais: da didática: relação professor
aluno no processo ensino-aprendizagem, método, metodologia, recursos

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UNIDADE 3
DIDÁTICA: ASPECTOS CONCEITUAIS

OBJETIVOS

• Reconhecer a didática como elemento importante no processo de ensi-


no-aprendizagem;
• Associar a didática como meio para buscar alternativas para os prob-
lemas da prática pedagógica;
• Conhecer os métodos de ensino.

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didáticos e avaliação (Instrumentos/Dispositivos Avaliativos)


3.2 TEMA II –Formação Continuada do Professor e a Contribuição
das Estratégias Metodológicas para o Ensino de Ciências e Biologia

3.1 DIDÁTICA: ASPECTOS CONCEITUAIS


Segundo Pimenta (2002, p. 41), enquanto adjetivo, o termo
“didática”, didático é conhecido desde a Grécia, significando:

Essa didática implícita na ação de ensinar de Sócrates, por


exemplo, começará a ganhar contornos de campo específico e autônomo
a partir do século XVII, com o monge luterano João Amós Comênio (1562
– 1670) que escreve entre 1627 e 1657, a obra Didática Magna – trata da
arte universal de ensinar tudo a todos.
Uma ação de ensinar presente nas relações entre os mais velhos e os
jovens, crianças e adultos, na família e nos demais espaços sociais e
públicos.

Para Masseto (1997, p. 13) a didática é:

Uma reflexão sistemática sobre o processo de ensino –


aprendizagem que acontece na escola e na aula, buscando
alternativas para os problemas da prática pedagógica.

Então, podemos pensar sobre a didática como reflexão sistemática


– é o estudo das teorias de ensino e de aprendizagem aplicado ao processo
educativo que se realiza na escola bem como dos resultados obtidos.

3.1.1 Relação Professor-Aluno no Processo Ensino-Aprendizagem


A relação professor-aluno no processo ensino e aprendizagem na
escola deve ser vista como um dos pilares para o pleno desenvolvimento
do estudante. Podemos considerar que essa relação é o foco do processo
pedagógico. Afinal, esse diálogo pode propiciar um movimento de ligação

87
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

entre o contexto escolar e o contexto do mundo que é vivenciado pelos


discentes, fazendo daquele contexto um espaço de troca de vivências.
A relação entre o ensino e aprendizagem é dinâmica, é uma relação
recíproca na qual se enfatizam as funções do dirigente, do docente e das
ações dos discentes. Assim, segundo Morales (1998, p. 49):

A relação professor-aluno na sala de aula é complexa e abarca


vários aspectos: não de pode reduzi-la a uma fria relação
didática nem a uma relação humana calorosa. Mas é preciso ver
a globalidade da relação professor-aluno mediante um modelo
simples relacionado diretamente com a motivação, mas que
necessariamente abarca tudo o que acontece na sala de aula e
há necessidade de desenvolver atividades motivadoras.

Na mesma direção Libâneo (199, p. 249) destaca que:

As relações entre professor e alunos, as formas de comunicação,


os aspectos afetivos e emocionais, a dinâmica das manifestações
na sala de aula fazem parte das condições organizativas do
trabalho docente, ao lado de outras que estudamos.

Dessa forma, as relações entre docentes e discentes englobam


comportamentos relacionados entre si, em que o professor deve
preocupar-se tanto com a transmissão e produção do conhecimento
quanto com o processo de construção da cidadania do discente, e este
deve ser considerado como sujeito interativo e ativo no processo ensino
e aprendizagem, ou seja, um ser capaz de pensar, refletir, discutir. Ter
opiniões, participar, decidir o que quer e o que não quer.
Portanto, o docente deve proporcionar condições e meios para os
discentes se tornarem sujeitos ativos no processo de apropriaçãoe produção
do saber sistematizado. Para tanto deve-se promover situações que
favoreçam o diálogo entre discente/discente/docente/discente, proporcionar
a renovação da prática pedagógica repensada sistematicamente como

88
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fator diferencial e envolver todos os responsáveis no processo de ensino-


aprendizagem, na busca do mesmo objetivo, formar cidadãos conscientes.

3.1.2 Metodologia e Método


Segundo Tosi (2003), de maneira geral, o termo metodologia,
ora significa um conjunto de métodos, ora um conjunto de técnicas.
Cientificamente, ele tem uma maior amplitude quando se refere à educação,
e representa: o conjunto de métodos, técnicas, recursos e procedimentos,
em um planejamento, tendo em vista, alcançar com êxito, objetivos
anteriormente determinados.
A palavra método vem do latim methodus que, por sua vez, tem
origem no grego, das palavras meta (meta=meta) e hodos (hodos=caminho).
Logo, método quer dizer caminho para se chegar a determinado lugar.
De acordo com Nérici (1981), didaticamente, método quer dizer,
Dessa forma, método e técnica representam:
• A maneira de conduzir o pensamento e as ações para se
atingir meta preestabelecida;
• Representam, mais, a disciplinação do pensamento e das
ações para se obter maior eficiência no que se deseje realizar.

Caminho para se alcançar os objetivos estipulados em um planeja-


mento de ensino, ou caminho para se chegar a um fim. Assim, método
indica caminho e técnica que mostra como percorrê-lo.

Sendo assim, a metodologia do ensino, pois, nada mais é do que,


Temos que compreender a metodologia de ensino como um meio e
não como um fim, pelo que deve haver, por parte do professor, disposição
para alterá-la sempre que sua crítica sobre a mesma sugerir.
Nesse sentido, Nérici (1981, p. 57), afirma que todo o método de
ensino tem de acompanhar o esquema de desenvolvimento de um ciclo
O conjunto de procedimentos didáticos, expressos pelos métodos e
técnicas de ensino, que visam levar a bom termo a ação didática, que
é alcançar os objetivos do ensino e, consequentemente, os da educa-
ção com o mínimo de espaço e o máximo de rendimento.

89
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

docente, que fundamentalmente consta de três partes:


• planejamento, execução e avaliação.

a) Fases do planejamento
• É a fase que se estabelece o conteúdo a ser estudado e
são precisados detalhes de desenvolvimento da ação didática esta fase,
de modo geral, fica a mais abstrata ao professor, mas pode também ser
efetuada por professor e educando, bem como, conforme o método, por
educando.

b) Fase da execução
• Esta fase compreende quatro subfases, quais sejam: subfase
da motivação, e apresentação subfase da realização, subfase da elaboração
e subfase das conclusões.

• Subfase da motivação e apresentação


Em que a classe, por um processo de motivação, é predisposta
para os trabalhos a serem desenvolvidos, bem como, em linhas gerais, é
apresentado o conteúdo ou o sujeito do estudo a ser efetuado;

• Subfase da realização
Em que se processo o estudo propriamente dito, com base no
método que tenha sido escolhido.

• Subfase da elaboração
Em que, após o estudo sistemático do assunto em foco, são
realizados trabalhos que visem à fixação e integração da aprendizagem,
através de discussão, exercícios, aplicações etc
• Subfase das conclusões
Em que determinada a fase anterior, a classe é conduzida a tirar
conclusões a respeito dos trabalhos realizados, ou melhor, do conteúdo
estudado.

90
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c) Fase da avaliação
• Esta é a última fase do método e consta de provas de avalição
ou de outros quaisquer recursos que permitam ao professor uma avaliação
a respeito do estudo efetuado, a fim de providenciar reajustes no conteúdo
ou na metodologia.
Assim, de nada serve se não sabemos para onde vamos – o método
– e como vamos – didática, se não dispomos de um bom planejamento que
corresponde ao estabelecimento de um conjunto de providencias a serem
tomadas pelo docente para a situação do futuro tende a ser diferente do
passado.

3.1.3 Recursos Didáticos


“A concepção de materiais didáticos que incorporem novas
tecnologias, capazes de oferecer uma reestruturação do processo de
aprendizagem, depende do esforço de relacionar novas abordagens
teóricas sobre a aprendizagem a seu desenho instrucional.” Dessa forma,

E mais, o planejamento de aula, significa estabelecer uma direção a


ser seguida pelo professor em sala, visando maior interação com o
aluno.

o construtivismo tem sido ultimamente a abordagem teórica mais utilizada


para orientar o desenvolvimento de materiais didáticos
informatizados, principalmente o de ambientes multimídia de
aprendizagem. (BOYLE, 1997 apud REZENDE, 2000).
Desse modo, podemos, corroborar que o princípio
fundamental do construtivismo é a do aluno/profissional como
sujeito ativo do seu próprio conhecimento.

Nessa direção é possível evidenciar e identificar alguns aspectos


bastante pertinentes que configuram a inter-relação entre a concepção
construtivista e a Educação a Distância no modelo implementado em nosso
país:
Os recursos didáticos para Duarte e Castilho (1983) são

91
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

Assim, podemos compreender melhor o papel


dos atores do processo educativo; e especial-
mente os professores,
• Que passam a ter postura de orientadores
ou facilitadores pedagógicos
• E preocupam-se em prover ambientes e fer-
ramentas que ajudem os alunos a interpretar
as múltiplas perspectivas de análise do mundo real, o que
possibilita a construção de suas próprias perspectivas.
instrumentos auxiliares dos quais o docente pode fazer uso para facilitar
o processo de aprendizagem dos seus discentes, destacando dentre
outros: livros, apostilas, cartazes, globo, Quadro Valor de Lugar (QVL),
retroprojetores, até mesmo plantas, animais ou pessoas (que participem
de entrevistas, palestras, seminários, etc)

Interatividade Cooperação Autonomia


• É um aspecto indispen- • Muito presente nas trocas • Representa a capacid-
sável viabilizada pelos de informações e parcerias ade que o aluno possui
diversos recursos: mútuas; na tomada de decisões,
• Possibilita virtualmente a • É uma relação compar- escolher, apropriar-se
procedência das comuni- tilhada presente entre os e reconstruir o conheci-
cações; participantes do programa mento produzido cultur-
• Envolve um relaciona- no desenvolvimento almente em função de
mento entre pessoas de da aprendizagem e na suas necessidades e
experiências diversas, realização de projetos de interesses;
entre ferramentas e ativi- interesse comum; • Caracterizar-se pela
dades múltiplas previa- • Esta relação se carac- responsabilização, auto-
mente orientadas e orga- teriza pela desigualdade determinação, decisão,
nizadas; do conhecimento entre auto-avaliação e com-
• Ela depende da relação os participantes, pelo promissos a partir da
entre grupos, desejos, sistema de combinações reflexão de suas próprias
motivações, culturas, in- e compromissos esta- experiências e vivencias;
teresses individuais e so- belecidos na solução de • O estudante da edu-
ciais; problemas significativos; cação à distância pre-
• Informações através da • É uma relação de troca cisa devolver de forma
participação com os out- compartilhada dada pe- dinâmica sua autonomia
ros nas atividades plane- los diferentes perfis para que possa acom-
jadas pelo programa; profissionais, formas de panhar e compreender
atuação e experiências sua aplicabilidade.
num contexto de trabalho
complexo e multifaetado.

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De acordo, com esses autores os recursos didáticos são


classificados quanto à natureza e complexidade. Quanto à natureza: em
humanos – o próprio docente, os discentes, as pessoas da comunidade;
materiais – os recursos naturais (minerais ou animais) e os ambientais
(visuais e auditivos, audiovisuais e tecnológicos). Quanto ao nível de
complexidade: em concreto (manipulativos - pedrinhas, pauzinhos de
picolé, tampinhas de garrafa, toquinhos, folhas, pequenos animais, etc.
semiconcretos (ou figurativos) – desenhos, figuras, gravuras, material de
flanelógrafo, cartazes ilustrativos, slides, filmes, etc e simbólicos – livros,
apostilas, textos mimeográficos, gráficos, mapas, globos, plantas etc.
Na utilização dos recursos didáticos é importante observar que o
nível de complexidade está estreitamente relacionado ao desenvolvimento
da criança, no que se refere a exploração dos conceitos. Nesta fase devem
ser utilizadas materiais do tipo concreto (manipulativos), que apelem para
todos os sentidos da criança. Só após a criança adquirir a percepção
concreta é que o docente propiciará a passagem gradual para o recurso
didático semiconcreto e, posteriormente, introduzir e utilizar o recurso
didático simbólico.
Neste sentido, cabe ao docente constatar o período exato que
cada discente está apto para trabalhar com novos tipos de recurso didático
isto é, quando cada discente já ultrapassou uma fase e está apto para
desenvolver o trabalho de outra fase. É imprescindível que se compreenda
o posicionamento de Duarte e Castilho (1983, p. 13-14) “a escolha do
material exato a ser utilizado estará condicionada diretamente, ao objetivo
a ser alcançado, ao conteúdo a ser trabalhado e aos procedimentos de
ensino selecionados pelo professor.”
Vale ressaltar que os Parâmetros Curriculares Nacionais
representam um material didático à disposição do professor como ressalta
o próprio documento: os PCNs oferecem material para que os professores
desenvolvam sua prática, estudo e reflexão. Toda atividade de sala de
aula é única, realiza-se em tempo e espaço socialmente determinados; há
envolvimento de docentes e discentes que têm especificidades quanto a
necessidade, interesses e histórias de vidas. Dessa forma, os recursos de

93
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

apoio ao currículo e ao docente cumprem seu papel quando considerados


como fontes de sugestões e ajudam os educadores a refletirem suas
práticas, possibilitando tornar o conhecimento cientifico significativo para
os discentes.
Mostrar a ciência como elaboração humana para uma compreensão
do mundo é uma meta para o ensino da área da escola fundamental.Seus
conceitos e procedimentos contribuem para o questionamento do que se vê
e se ouve, para interpretar os fenômenos da natureza, para compreender
como a sociedade nela intervém utilizando recursos e criando um novo meio
social e tecnológico.É necessário favorecer o desenvolvimento de postura
reflexiva e investigativa, de não-aceitação, a priori, de ideias e informações,
assim como a percepção dos limites das explicações, inclusive dos modelos
científicos, colaborando para a construção da autonomia de pensamento e
de ação. (PCN, 1997)
3.1.4 Avaliação (instrumentos/dispositivos avaliativos)
A prática avaliativa é uma etapa importante no processo de ensino-
aprendizagem, tendo em vista, que possibilita o professor refletir sobre a
eficácia de sua prática educativa, e dessa forma, orienta o ajuste de sua
intervenção pedagógica para que o estudante aprenda.
Podemos refletir sobre os seguintes questionamentos:

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998)


apresentam “ciências” como uma elaboração humana para
a compreensão do mundo, seus procedimentos devem
estimular uma postura reflexiva e investigativa sobre os
fenômenos da natureza e da sociedade, utilizando seus re-
cursos e criando uma nova realidade social e tecnológica.
No ensino de ciências, os livros didáticos constituem um
recurso de fundamental importância, já que representa na maioria
dos casos o único material de apoio didático disponível para alunos
e professores.

Os livros de ciências têm uma função que se difere dos demais – a


aplicação do método científico, estimulando a análise de fenôme-
nos, o teste de hipóteses e a formulação de conclusões.

94
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• Como você se sente quando está para realizar uma prova?


• Qual a sua ideia de avaliação?

Quando falamos em avaliação, na maioria das vezes, o pensamento


é direcionado para a escola, no entanto a avaliação está presente em
nosso dia-a-dia, nas interações cotidianas, em casa, no trabalho, no lazer,
pois inclui um julgamento de valores sobre nós mesmos, o que fazemos e
sobre o que produzimos. Então, sem percebermos, naturalmente estamos
sempre avaliando alguma coisa. No entanto, quando passamos a falar da
avaliação escolar, nos deparamos com os entraves, resultantes de um
processo fragmentado, e descontextualizado, em que é vista por alguns não
somente como fazer teste, dar nota, aprovar ou reprovar o aluno, detentor
de erros, lacunas e problemas, sendo um olhar limitante e desvirtuado da
concepção de aprendizagem.
Desse modo, avaliar segundo os PCNs, 1998 é:

Por outro lado, os erros dos estudantes também indicam as


necessidades de ajuste no planejamento de quem ensina ou no programa
da área.
• Longe de ser apenas um momento final do processo de
ensino, a avaliação se inicia quando os estudantes põem em jogo seus
conhecimentos prévios e continua a se evidenciar durante toda a situação
Buscar compreender essa lógica, sua razão constitutiva como parte do
processo, explicitá-la para quem está aprendendo, possibilitando seu
avanço. .

escolar.
• O resultado tanto de um acompanhamento contínuo e
sistemático pelo professor como o de momentos específicos de formalização,
ou seja, a demonstração de que as metas de formação de cada etapa
foram alcançadas.
• A avaliação deve considerar o desenvolvimento das

95
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

capacidades dos estudantes em relação à aprendizagem não só de


conceitos, mas também de procedimentos e de atitudes.

No nosso diaadia, estamos sempre refletindo sobre nossas ações


e tomando decisões de acordo com os nossos interesses. Entretanto, não
costumamos utilizar notas, avaliamos e tomamos nossas decisões.

E na
escola?

Avaliação da
aprendizagem

A
O que se Quem
avalia? avalia?
resposta a
esses Como se Quando se
avalia? avalia?

questionamentos tem variado pouco nos últimos anos. Embora exista uma
preocupação crescente com o assunto, a avaliação continua sendo um dos
aspectos mais polêmicos da prática pedagógica.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB nº 9.394/96,
atenta a essa questão, trata da avaliação na educação básica de maneira

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apropriada, moderna e inovadora no artigo 24, inciso V:

A verificação do rendimento escolar observará os


seguintes critérios:
1) Avaliação continua e cumulativa do desempenho
do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos
e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
2) Possibilidade de aceleração de estudos para alunos com
atraso escolar;
3) Possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante
verificação do aprendizado;
4) Aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
5) Obrigatoriedade de estudos de recuperação de preferencia
paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a
serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos.
• A LDB flexibiliza o processo educacional ao ampliar as
possibilidades de organização básica e trata de forma inovadora a avaliação
quando recomenda a revogação das práticas classificatórias excludentes.
• E de acordo com Hoffmann (2003), as práticas avaliativas
classificatórias fundam-se na competição e no individualismo, no poder, na
arbitrariedade presentes nas relações entre professores e alunos, entre os
alunos e entre os próprios professores. A medida que os estudos apontam
para o caráter interativo e intersubjetivo da avaliação que alertam também
para a essencialidade do diálogo entre todos os que fazem parte desse
processo, para a importância das relações interpessoais e dos projetos
coletivos.
• Em ciências há várias formas de avaliação possíveis:

• Individual e coletiva;
• Oral e escrita
E para tanto, há instrumentos ou dispositivos de avaliação, segundo
os PCns (1998), que comportam, por um lado, a observação sistemática
durante as aulas sobre as perguntas feitas pelos estudantes as respostas

97
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

dadas, os registros de debates, de entrevistas, de pesquisas, de filmes, de


experimentos, os desenhos de observação etc.
Logo, as provas, muitas vezes, são entendidas como a única
forma de avalição possível, perdendo-se a perspectiva da avalição como
elemento muito mais abrangente. Sendo que, nas provas que demandam
definição de conceitos as perguntas precisam estar contextualizadas para
que o estudante não interprete a aprendizagem em Ciências Naturais como
aprendizagem de trechos de textos decorados para a prova.
Na prática pedagógica a prova continua sendo usada como
instrumento punitivo e disciplinador. Entretanto, se convenientemente
empregada, a prova pode se tornar fonte de informação para intervenção e
replanejamento didático- metodológico.
Vários são os meios (instrumentos/dispositivos) que o professor
pode utilizar para acompanhar o desempenho do aluno:

• Prova objetiva
• Relatórios
• Pesquisas
• Debates
• Prova dissertativa
• Seminários
• Observação
• Fichas de acompanhamento
• Entrevistas

Então, o professor Cipriano Luckesi nos diz que o ato de avaliar


a aprendizagem, por si, é um ato amoroso, é acolhedor, integrativo,
inclusivo e consiste em acolher uma situação para daí poder julgar a sua
qualidade,tendo como objetivo caminhar para mudança.
Para ele, ao avaliar, o professor deverá:
Coletar, analisar e sintetizar, da forma mais objetiva possível,
as manifestações das condutas cognitivas, afetivas, psicomotoras – dos
educandos, produzindo uma configuração do efetivamente aprendido;
Atribuir uma qualidade a essa configuração da aprendizagem, a
partir de um padrão (nível de expectativa) pré-estabelecido e admitido como

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válido pela comunidade dos educadores e especialistas dos conteúdos que


estejam sendo trabalhados;
A partir dessa qualidade, tomar uma decisão sobre as condutas
docentes e discentes a serem seguidas, tendo em vista:
• A reorientação imediata da aprendizagem, caso sua qualidade
se mostre insatisfatória e caso o conteúdo, habilidade ou hábito, que esteja
sendo ensinado e aprendido, seja efetivamente essencial para a formação
do educando.
• O encaminhamento dos educandos para passos subsequentes
da aprendizagem, caso se considere que, qualitativamente, atingiram um
nível satisfatório no que estava sendo trabalhado.
Assim, “o objetivo primeiro da aferição do aproveitamento escolar
não será a aprovação ou reprovação do educando, mas o direcionamento
da aprendizagem e seu consequente desenvolvimento.”
É importante destacar que a avaliação é antes de mais nada uma
questão politica e não pode ser concebida de forma isolada, uma vez que
reflete uma concepção de homem, de educação e de sociedade.
Vamos agora relembrar os pressupostos que devem pautar a
avaliação qualitativa:
• Levando em conta todo o exposto, reafirmamos que
na concepção da Avaliação diagnóstica, processual, cumulativa e
emancipatória,é preciso ter clareza de que o processo ensino –aprendizagem
requer do professor:
Processual Participativa /
Diagnóstica Cumulativa
Contínua emancipatória
• L e v a n t a m e n t o • A avaliação pro- • Quando falamos • Acreditamos ser
de informações cessual contínua que a avalição impossível avaliar
necessárias para requer que o pro- também é cumu- sem a participa-
que o professor fessor desenvol- lativa, estamos ção de todos os
saiba o que pre- va uma observa- considerando que atores envolvidos
cisa ser ensinado ção cuidadosa de no processo de no processo de
e conhecer o que todos os alunos. aprendizagem os ensino e apren-
os alunos trazem • Deve orientar a conhecimentos dizagem.
de conhecimen- prática pedagógi- não se isolam no • Quando profes-
tos que precisam ca possibilitando tempo e no es- sores e alunos
ser sistematiza- a correção de paço. Os conheci- avaliam a prática
dos e aprofunda- desvios e pos- mentos construí- educativa tendo-

99
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

dos. síveis interven- dos se acumulam, se a clareza dos


• A ação diagnos- ções planejadas. se ampliam e fa- objetivos, a aval-
tica possibilita ao • Não deve ocor- cilitam o processo iação perde o
professor perce- rer em momentos de novas apren- caráter punitivo,
ber os avanços isolados e sim no dizagens. Nesta autoritário, uni-
dos alunos, iden- dia a dia, bus- perspectiva, a lateral tornando-
tificar os fatores cando identificar avaliação cumu- se, dessa forma,
que interferem passo a passo lativa permite um processo
na aprendizagem a construção de considerar cada democrático e
e fazer interven- conhecimentos aspecto progres- emancipatório.
ções imediatas. e dificuldades de sivo da produção
aprendizagens do do conhecimento
aluno. e o professor de-
• A avaliação pro- verá identificar o
cessual não sig- quanto e como o
nificafazer provas aluno aprendeu
todos os dias. e desafiá-lo para
novas aprendiza-
gens.

• Domínio da sua disciplina a fim de conduzir todo ato de


ensinar com segurança, tendo bem claro os objetivos a serem alcançados,
de forma a obter êxito na sua função educativa;
• Analise contínua do desenvolvimento do aluno;
• Reflexão constante sobre sua atuação;
• Registro e uso das informações levantadas e observadas.
Segundo os PCNs , podemos compreender que para o estudante
e para o professor, a análise conjunta da produção realizada por meio dos
trabalhos escolares é importante no processo educativo, e não deve ser
confundida com a correção de exercícios ou provas. Esses momentos,

PARA REFLETIR
A avaliação só tem sentido se tiver como ponto de partida e chegada o
processo pedagógico para que, identificadas as causas do sucesso ou
do fracasso, sejam estabelecidas estratégias de enfrentamento da situa-
ção; não deve servir como em geral, se faz, para penalizar a vítima. Deve
ser um processo permanente que à luz de uma teoria do conhecimento,
possibilite acompanhar e interferir no processo, à medida que penetre em
sua complexidade. Avaliação que, por se colocar a favor da aprendiza-
gem do aluno, adeque o currículo a cada momento da aprendizagem do
aluno, tornando-se um processo de investigação, de pesquisa, que vise
astransformações, perdendo a conotação de mensuração, de julgamen-
to, que leva ás classificações.”
GARCIA, R.L. In: Currículo a favor do aluno das classes populares – cadernos CEDES,
Nº13.

100
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dos quais a autoavaliação faz parte, são situações em que os estudantes


podem tomar consciência tanto de ser processo de aprendizagem como se
seu processo educativo mais geral; são situações de síntese, que podem
localizá-los em relação ao conhecimento, ao grupo de colegas de sala e à
própria escola.

3.2 FORMAÇÃO CONTINUADA DO PROFESSOR E A CONTRIBUIÇÃO


DAS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS
E BIOLOGIA

O mundo é um desafio, com novas descobertas


e estudos, novas tecnologias, crise econômica, crise
ambiental, globalização, consumismo exacerbado, fome
e guerra e novas doenças que surgem ameaçando a
população. Diante disso, surge, cada vez mais a necessidade de novos
saberes, conhecimentos, habilidades para sobreviver e a escola como
parte integrante da sociedade não poderia deixar de acompanhar essas
transformações, passando a rever métodos de ensinar e aprender diante
dos novos desafios propostos pela realidade cotidiana. Todos esperam
que a escola ofereça uma melhor qualidade de ensino para atender às
exigências de um mundo globalizado.
A formação continuada deve ser um processo de transformação
pessoal e profissional em que o ator busque constantemente aprimorar
e aperfeiçoar seus conhecimentos, logo, hoje, a realidade mostra que o
profissional deve estar consciente de que sua formação é permanente, e o
educador não é diferente, pois a sua formação deve estar atrelada ao seu
dia-a-dia na escola e assim contribuir para melhorar a qualidade de ensino,
pois as mudanças sociais se refletem nas transformações do ensino.
Então, no contexto atual, o professor não pode ser mais aquele
transmissor de informações, detentor soberano do saber, mas sim, o que dá
condições para que o aluno “aprenda aaprender”, desenvolvendo situações
de aprendizagens diferenciadas e estimulando a articulação entre saberes
e competências. E assim, os professores, segundo Massabni (2007)

101
Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

remetem a uma orientação construtivista do ensino e da aprendizagem.


Por isso, começando por você, reflita sobre o que Libâneo (2004,
p. 76) escreve:

Vamos refletir sobre algumas questões.


Depois que você leu sobre a formação continuada, qual a sua
A formação continuada é uma maneira diferente de ver a capacita-
ção profissional de professores. Ela visa ao desenvolvimento pes-
soal e profissional mediante praticas de envolvimento dos profes-
sores na organização da escola, na organização e articulação do
currículo, nas atividades de assistência pedagógico-didática junto
com a coordenação pedagógica nas reuniões pedagógicas, nos
conselhos de classe. O professor deixa de estar apenas
cumprindo a rotina e executando tarefas, sem tempo de
refletir e avaliar que faz.

impressão sobre o tema? Imagine-se um professor que terminou a sua


graduação há mais ou menos dez anos, não estudou mais, não procurou
se qualificar e continua com a mesma metodologia, às vezes nem planeja
mais suas aulas, já tem tudo na cabeça (memória), as estratégias de ensino
são as mesmas. Para esse professor, os alunos não querem nada com
estudo, não acomodados, desinteressados. A dificuldade do aluno não o
interessa, o importante é ele ministrar a sua aula, cumprir o seu horário,
fazer exercício, provas, e assim, cumpre o seu papel de transmissor do
conhecimento ... Enquanto isso, o mundo a sua volta está em constante
transformação, os seus alunos sentem interesse no que está acontecendo
no seu dia-a-dia, querem estar preparados para enfrentar os obstáculos
do desemprego, da não qualificação, querem superar-se para terem uma
vida melhor, querem conhecer esse mundo que entra na sua casa, através
dos meios de comunicação. Eles acessam a internet, procuram o que é do
seu interesse, muitos estão mais capacitados que seu próprio professor. O
mundo fora da escola é uma roda viva, é o lugar deles. E ai, por que será
que muitos perguntam e comentam: para que ir a escola? Estou aqui só

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FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

para ter o grau de instrução que pedem quando eu vou atrás de emprego,
mas o que eu vou fazer não tem nada a ver com o que eu vejo aqui na
escola. A escola é uma chateação, não tem nada de interessante. Por que
estudar isto? Estas e outras são as frases que mais escutamos dos alunos.
Se você leciona, deve ter escutado muitas outras, e também como aluno,
com certeza já levantou questões a respeito.
Nesse sentido, Freire (1996, p. 43) afirma que é pensando criticamente a
pratica de hoje ou a de ontem é que se pode melhorar a próxima prática.
Concluímos a Unidade 3. Realize agora as atividades a seguir:

ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
1. Quais as concepções de: didática, relação professor/aluno, método,
metodologia, recursos didáticos e avaliação da aprendizagem, nos dias
atuais?
2. Relacione alguns recursos didáticos segundo a classificação de Duarte
e Castilho.

3. Estabeleça as principais diferençasentre a avaliação quantitativa e


avaliação qualitativa.

4. Qual o conceito de aprendizagem na atualidade?

5. Para você como a aprendizagem na escola está acontecendo na


sociedade do conhecimento?

6. Construa texto dissertativo acerca dos pressupostos que pautam a


avaliação qualitativa

REFERÊNCIAS

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Conteúdos e Métodos das Ciências da Natureza

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DUARTE, A.L.A.; CASTILHO, S. F. da R. Metodologia da matemática: a


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cientifica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

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PENTEADO,Heloisa D. Metodologia do Ensino de História e Geografia.


Coleção Magistério – 2º Grau. SérieFormação do Professor. São Paulo:

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pesquisa cientifica. 2. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2000.

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VYGOTSKY, L.S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes,


1993.

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FUESPI/NEAD Licenciatura Plena em Pedagogia

AVALIAÇÃO DO LIVRO

Prezado(a) cursista:

Visando melhorar a qualidade do material didático, gostaríamos que


respondesse aos questionamentos abaixo, com presteza e discerni-
mento. Concluído o trabalho, entregue a seu tutor esta avaliação. Não
é necessário identificar-se.

Unidade:____________ Município: _________________


Disciplina:___________ Data: _____________________

1. No que se refere a este material, a qualidade gráfica está visual-


mente clara e atraente
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

2. Quanto ao conteúdo, está coerente, contextualizado à sua prática


de estudos
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

3. Quanto às atividades do material, estão relacionadas aos conteú-


dos estudados e compreensíveis para possíveis respostas.
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

4. Coloque abaixo suas sugestões para melhorar a qualidade deste


e de outros materiais.
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