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Tiago Silva, 11º F, nº 26

Escola Secundária Professor José Augusto Lucas


Prof. Fátima Teles - Filosofia

Filosofia da Religião
Índice
➔ Introdução ao Tema
◆ Teísmo, Ateísmo, e Agnosticismo
◆ Conceito Teísta de Deus
➔ Argumentos Acerca da Existência de Deus
◆ Argumento Ontológico de Anselmo de Cantuária
● Breve Biografia de Anselmo de Cantuária
● Argumento Ontológico
● Objeções ao Argumento
◆ Argumentos de Tomás de Aquino
● Breve Biografia de Tomás de Aquino
● Argumento Cosmológico
● Objeções ao Argumento
● Argumento Teleológico
● Objeções ao Argumento
◆ O Fideísmo de Blaise Pascal
● Breve Biografia de Blaise Pascal
● Esclarecimento do Fideísmo
● Objeções ao Fideísmo
◆ O Argumento do Mal
● Introdução ao Argumento
● Argumento Lógico do Mal
● Argumento Indiciário do Mal
● A Resposta de Leibniz ao Argumento Lógico do Mal
○ Breve Biografia de Leibniz
○ A Teodiceia de Leibniz
○ Objeções à Teodiceia de Leibniz
➔ Conclusão

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Introdução ao Tema
A filosofia da religião é a área da filosofia que se dedica ao estudo de problemas

relacionados com a religião, com destaque para a existência de Deus, a relação entre a

religião e a moral, a relação entre a razão e a fé, entre outras. A procura por respostas

acerca do Deus das principais religiões, com destaque às ocidentais, é objeto de estudo

nesta área. Alguns dos filósofos que serão referidos ao longo do trabalho são Anselmo de

Cantuária, Tomás de Aquino, Blaise Pascal, e Gottfried Wilhelm Leibniz.

Teísmo, Ateísmo, e Agnosticismo


É possível adotar três posições quanto ao problema da existência de Deus, no qual

nos iremos focar: o teísmo, o ateísmo, e o agnosticismo. O teísmo é caracterizado pela

crença em um ou mais deuses, mas neste trabalho daremos destaque ao Deus teísta das

principais religiões do ocidente, que será explicado em maior detalhe a seguir. O ateísmo é

a descrença e negação da existência de qualquer Deus, e o agnosticismo (do grego, sem

conhecimento) duvida da existência de Deus, afirmando que não existe forma de a

comprovar.

Conceito Teísta de Deus


Por não se poder utilizar como objeto de estudo todos os Deuses das diferentes

religiões, tem-se como o Deus teísta a divindade das três principais religiões do ocidente: o

Cristianismo, o Judaísmo, e o Islamismo. Com isto em mente, tem-se como a definição

central de teísmo a existência de um único Deus. Este Deus é eterno e autoexistente,

criador e quem sustenta o universo, mas independente deste e do mundo físico em que nos

encontramos. Além disso, Ele é omnipresente, omnipotente, e omnisciente, assim como

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sumamente bom. O problema que irá ser o ponto central deste trabalho é o da existência

deste Deus teísta, e um dos atributos que será abordado é a omnipotência. Apesar de isto

significar que Deus tem o poder de fazer tudo, o seu alcance tem limites. Este não poderá

criar situações que contradizem a lógica, como, por exemplo, criar um círculo triangular.

Tal como não pode criar situações ilógicas, também não pode cometer atos que vão contra

os seus atributos divinos. Praticar o mal é impossível para Deus, pois isso invalida a suma

bondade que lhe está inerente.

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Argumentos Acerca da

Existência de Deus
Com o conceito teísta de Deus em mente, iremos abordar diversos argumentos que

procuram defender uma certa posição do problema da existência de Deus. A favor do

teísmo estão os argumentos ontológico, de Anselmo de Cantuária, e cosmológico e

teleológico, ambos de Tomás de Aquino. A defender o ateísmo está o argumento do mal,

que se irá dividir em dois argumentos distintos, e a defender o agnosticismo, afirmando

que não existe forma de comprovar a existência de Deus de forma racional, está o fideísmo

de Pascal.

Os argumentos teístas antes referidos podem ser divididos em duas categorias:

argumentos a priori e argumentos a posteriori. Argumentos a priori procuram comprovar a

existência de Deus baseando-se na razão e pensamento, ao passo que argumentos a

posteriori utilizam premissas empíricas e baseiam-se na experiência para as fundamentar.

Dos três argumentos teístas referidos no parágrafo anterior, apenas o ontológico de

Anselmo de Cantuária é a priori, e os argumentos de Tomás de Aquino são a posteriori.

Argumento Ontológico de Anselmo de Cantuária

Breve Biografia de Anselmo de Cantuária


Anselmo de Cantuária (1033-1109) foi um filósofo e teólogo cristão, nascido em

Aosta, Itália. Ele é mais conhecido por sua contribuição para a filosofia da religião através

de sua defesa do argumento ontológico para a existência de Deus. Anselmo ingressou na

abadia beneditina de Bec, na Normandia, onde estudou sob orientação de Lanfranco de

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Cantuária. Em 1078, tornou-se o arcebispo de Cantuária, Inglaterra, e exerceu grande

influência na política e na religião do país. O filósofo é mais conhecido por sua obra

Proslógio, na qual formulou o argumento que será referido à frente. Além disso, ele

defendeu a teoria da satisfação vicária, onde afirma que Cristo morreu na cruz para

satisfazer a justiça divina e redimir a humanidade do pecado. Anselmo de Cantuária é

considerado um dos grandes pensadores da Idade Média e teve grande influência na

filosofia e na teologia ocidental. Ele foi canonizado como santo pela Igreja Católica em

1720.

Argumento Ontológico
Anselmo de Cantuária formulou este argumento na sua obra Proslógio, baseando-se

no conceito ou definição de Deus, e portanto é chamado de ontológico, denominação que

se deve a Immanuel Kant.

O filósofo procura estabelecer a priori a existência de Deus recorrendo à ideia de

perfeição que este carrega. Deus é por ele definido como o ser mais perfeito que pode ser

concebido, acima de tudo e de todos, sendo que nada acima d’Ele pode ser pensado ou

idealizado. Tendo esta grandiosidade atribuída, Deus tem de existir no pensamento. Mas,

existindo no pensamento, e sendo o ser mais grandioso concebível, deverá existir na

realidade também, caso contrário seria possível idealizar um ser ainda maior, existente no

pensamento individual e na realidade em que vivemos. Sendo isto impossível, esse ser é o

Deus teísta.

Objeções ao Argumento
O monge Gaunilo cria uma objeção ao argumento de Anselmo de Cantuária,

afirmando que este é insatisfatório e que conduz a conclusões absurdas. Algo que viva no

pensamento não necessariamente existe na realidade, premissa que Gaunilo fundamentou

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com o exemplo de uma ilha perfeita, existente no pensamento mas inexistente na

realidade, a que chamou Ilha Perdida. Embora a comparação feita seja sobre um objeto

material ( a ilha) e um ser imaterial (Deus), esta crítica mostra fragilidades no argumento

de Anselmo.

Kant baseou-se em Gaunilo para reformular e complementar este argumento. O

erro de Anselmo de Cantuária passa por afirmar que a existência é um atributo adquirido.

Características como omnipotência, omnipresença, e omnisciência estão intrínsecas no

conceito do Deus teísta, mas a existência não. Um exemplo dado é o do unicórnio, que tem

nele incluído características como um corno, mas não existe necessariamente. Estes

exemplos comprovam falhas no argumento, pois de acordo com Anselmo, caso Deus exista,

Ele tem todas as características a si atribuídas, incluindo a existência, e caso não exista,

Ele tem as mesmas características, o que inclui a existência, criando uma contradição.

Argumentos de Tomás de Aquino

Breve Biografia de Tomás de Aquino


Tomás de Aquino (1225-1274) foi um teólogo, filósofo e frade dominicano italiano,

considerado um dos maiores pensadores da Idade Média e um dos principais expoentes da

filosofia escolástica. Ele nasceu em Roccasecca, na Itália, no seio de uma família nobre e

estudou na Universidade de Nápoles. Tomás de Aquino ingressou na Ordem dos

Dominicanos em 1244, apesar da oposição de sua família, que queria que este aderisse à

Ordem Beneditina, e estudou em Paris, onde recebeu a alcunha de “boi mudo”, por ser

bastante forte e calado. Tornou-se um dos principais defensores da filosofia aristotélica na

Europa medieval e suas obras abrangem áreas que vão desde a teologia e filosofia até a

política e ética. As suas obras principais incluem a Suma Teológica, uma obra monumental

que tenta sistematizar toda a teologia cristã, e a Suma Contra os Gentios, onde argumenta a

favor da razão e da filosofia como ferramentas para a compreensão da fé cristã. Tomás de

Aquino morreu em 1274, como consequência de um AVC, com apenas 49 anos, enquanto

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se dirigia ao Segundo Concílio de Lyon, onde deveria defender suas ideias teológicas. Ele

foi canonizado em 1323 e é venerado como santo pela Igreja Católica. Suas obras

continuam a influenciar a filosofia, teologia e ética até os dias de hoje.

Argumento Cosmológico
Sendo o argumento de Anselmo de Cantuária o mais discutido e analisado na sua

área, não faltaram argumentos diferentes para explicar a existência de Deus. Um

argumento particularmente famoso é o cosmológico de Tomás de Aquino, que procurou

comprovar a existência de Deus com premissas a posteriori, contrariamente à natureza a

posteriori que o argumento de Anselmo tinha. Na sua obra Suma Teológica, Tomás

apresenta cinco vias baseadas em factos acerca do mundo para chegar à existência de Deus.

As três primeiras fazem parte do argumento cosmológico. A primeira via baseia-se na ideia

de movimento, a segunda na noção de causa, e a terceira na contingência. A segunda terá

especial atenção, e porque se baseia na causalidade, este argumento também é conhecido

como argumento da causa primeira.

O começo é a existência do universo, e a premissa de que tudo o que existe necessita

de uma causa para começar a existir. Nada pode existir do nada. O mundo é encarado como

um sistema de relações causa-efeito, onde nada é espontâneo ou criado do vazio. Mas, para

Tomás de Aquino deverá haver uma primeira causa que iniciou este processo, caso

contrário seria uma regressão infinita. Visto que a ideia de uma regressão infinita é

rejeitada, só nos resta a hipótese de uma causa primeira, que para Tomás de Aquino é

Deus. Deus é e existe e é a causa de todas as coisas.

Objeções ao Argumento
O argumento apresentado afirma que tudo no universo tem uma causa. Mas, no

entanto, nada nos comprova necessariamente esta premissa. O ceticismo de David Hume

leva-nos a crer que uma crença não justificada não poderá ser válida. Não podendo

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demonstrar a existência de universos sem causa, não se pode admitir o argumento

cosmológico como válido.

Outra objeção diz que a premissa de que existe uma causa primeira para tudo é uma

falácia. A possibilidade de que não foi só uma, mas várias causas para o começo do

universo é válida e está presente.

Por último, a terceira objeção afirma que nada no argumento justifica que a causa

primeira da criação do universo seja o Deus teísta, ou qualquer divindade. Nada no

argumento cosmológico prova as conclusões de Tomás de Aquino.

Argumento Teleológico
Na última via, Tomás de Aquino apresenta o argumento do desígnio, ou teleológico.

Também se trata de um argumento a posteriori, à semelhança do anterior. Tomás afirma

que existe regularidade e ordem no mundo, e que as coisas operam em harmonia para um

certo fim. Este é um argumento por analogia, por estar a aproximar objetos naturais e

artificiais. Existem artefactos humanos e objetos naturais, ambos carecem de inteligência,

têm todas as suas partes ajustadas, e atingem um fim ou propósito. Ambos têm um

ajustamento dos meios aos fins, cuja causa poderá ser o desígnio de alguém humano (no

caso dos artefactos humanos), ou o desígnio inteligente que governa o universo em direção

ao seu fim ou propósito: Deus.

David Hume apresentou a sua versão do argumento, comparando o universo a uma

máquina, e Deus seu projetor. Ao observar uma máquina, é de notar que os seus meios são

adaptados aos fins por um desígnio humano. O universo trabalha como uma complexa e

gigante máquina, com um grau de organização e precisão muito maior. Com isto em

mente, supõe-se que o governo desta máquina está nas mãos de um desígnio maior que

supera o ser humano, e seria Deus.

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Objeções ao Argumento
Apesar de criar a sua própria versão deste argumento, David Hume foi um crítico

do mesmo, afirmando, juntamente com outros críticos, que este cometia uma falsa

analogia. Quando a diferença entre os dois objetos a ser comparados é grande, e existem

disparidades importantes e que devem ser notadas entre os mesmos, esta analogia torna-se

fraca. Ao ignorar tudo o que difere artefactos humanos e o universo como um todo, e criar

uma analogia entre os dois para um argumento, este não deve ser válido.

Além da fraqueza da analogia criada, também se tem em atenção a natureza deste

desígnio inteligente. Tal como no argumento anterior, nada garante que este é o Deus

teísta. David Hume afirma que o mundo é demasiado imperfeito para tirar conclusões

acerca de Deus através do mesmo. Nenhuma hipótese acerca da criação do universo deve

ser excluída, Hume afirma até que pode ser produto de um desígnio imperfeito e limitado,

uma tentativa fracassada e abandonada.

O Fideísmo de Blaise Pascal

Breve Biografia de Blaise Pascal


Blaise Pascal (1623-1662) foi um filósofo, matemático, físico e escritor francês. Foi

educado pelo pai, pois perdeu a mãe ainda muito novo. Contribuiu para as bases da teoria

de probabilidades, fez importantes trabalhos acerca de vácuo e pressão, e inventou a

primeira calculadora mecânica, a Pascalina, assim como a seringa. Abandonou a ciência

após uma experiência mística aos 31 anos e decidiu dedicar-se exclusivamente à filosofia e

teologia. Morre aos 39 anos na sequência de um cancro do estômago que acabou por

alastrar ao cérebro. Os seus últimos anos de vida foram dominados pelo sofrimento devido

ao seu estado de saúde, que desde sempre fora precário.

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Esclarecimento do Fideísmo
Ao contrário dos filósofos anteriores, alguns teólogos acreditam que não existe

forma de comprovar a existência de Deus, e portanto defendem que a crença se baseia na fé

e não na razão ou por indícios. Esta tese é conhecida como fideísmo. Nesta teoria, por fé

entende-se a absoluta adesão à crença religiosa.

Dentro do fideísmo, várias posições foram tomadas. As mais extremas consideram

os fundamentos da religião, como a existência de Deus, contrários à razão e absurdos. O

fideísmo mais moderado, que Pascal defende, diz que a fé vem antes da razão quando se

estabelece verdades religiosas, mas que o papel a posteriori da razão não deve ser

invalidado. Como fideísta, Pascal era um cético quanto à capacidade da filosofia de

comprovar a existência de Deus, acreditando que isto é impossível.

O argumento do apostador ou a aposta de Pascal é o último de uma sequência de

argumentos que este apresentou, onde se questiona se mesmo sem provas para comprovar

que Deus é real, valerá a pena acreditar que sim. Juntando elementos de outras áreas no

seu argumento, como probabilidades, ou o voluntarismo, tese que classifica a crença como

uma vontade ou iniciativa própria, Pascal conclui que mesmo sem qualquer prova,

acreditar em Deus é o mais correto a fazer, por ser mais vantajoso.

Existem apenas três posições que se podem adotar quanto à crença na existência do

Deus teísta: o teísmo, acreditando que Ele existe, o ateísmo, negando que Ele existe, e o

agnosticismo, que duvida da existência de Deus. Estes dois últimos são equivalentes pois

não existe crença em ambos os casos. Pascal teve em conta estas três posições e calculou a

melhor posição a ser tomada através de probabilidades. Os ganhos e perdas em cada uma

destas crenças pode ser finito ou infinito, ou seja, a recompensa ou castigo pela adoção de

uma destas ideias pode ser mais elevada ou menor. Pascal conclui que ao acreditar em

Deus o ganho é infinito e a perda é finita, pois caso Ele exista, o crente tem garantida a

vida eterna e a salvação, e caso Ele não exista, pouco ou nada se perde pela crença. No

entanto, ao não acreditar em Deus, a perda é infinita e o ganho finito. Caso Ele exista, o

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castigo eterno espera o não crente, e daí vem a perda infinita, e caso Ele não exista, nada se

ganhou com essa não crença, e portanto vale mais a pena acreditar em Deus do que não

acreditar.

A teoria de Pascal não tenta nem quer provar a existência do Deus teísta, mas sim

fundamentar a crença n’Ele e mostrar que é a posição racional a ser tomada. Não é a

raciocinar nem por indícios que se chega a Deus, mas sim puramente pela fé, ou, como

Pascal dizia, pelo coração. Na verdade, a fé não é necessária sequer, apenas basta

considerar racionalmente as hipóteses e os ganhos para decidir a melhor decisão a ser

tomada. A fé virá mais tarde como resultado da aposta nesta crença.

Objeções ao Fideísmo
O fideísmo que Pascal expôs foi alvo de desaprovação por parte de filósofos como

William James, que consideraram a ideia ridícula e até vil. James não considera cabível que

o cálculo por si só seja suficiente para tornar alguém crente. Não se pode só decidir

acreditar na esperança da salvação. É necessário acreditar em Deus desde sempre, ou que

exista uma tendência para acreditar, para que um ateu ou agnóstico se converta quando

deparado com o cálculo de hipóteses. Para isto Pascal responde que a fé acabará por

aparecer como resultado do hábito de agir exteriormente como se fosse crente. William

James tem uma resposta para esta explicação, afirmando que um Deus omnipotente,

omnisciente, e omnipresente não consideraria como um verdadeiro crente alguém que

decide acreditar por simplesmente calcular o que lhe dá mais benefício. O filósofo ainda

acrescenta que se ele próprio fosse Deus, certificar-se-ia de que esses falsos crentes não

atinjam a vida eterna.

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O Argumento do Mal

Introdução ao Argumento
No mundo em que vivemos, o mal e sofrimento está presente. Seja este natural ou

por processos humanos, o mal existe no mundo em que vivemos. Daí surge o problema do

mal, o mais complicado que se coloca na área da religião. Com este procura-se procura-se

determinar a real natureza dos atributos intrínsecos a Deus, que são postos em causa pela

existência deste mal. Parece contraditório que uma divindade omnipotente e sumamente

boa permita a existência do mal que ocorre no plano físico. Por isso, surgem três hipóteses

neste problema. Deus quer evitar o mal mas não consegue, e portanto não é omnipotente;

Deus consegue evitar o mal mas não quer, e portanto não é bom; ou Deus quer e consegue

evitar o mal, e a partir daí o problema coloca-se na origem deste mal. Existem duas versões

deste argumento: a versão lógica e a versão indiciária do argumento do mal.

Argumento Lógico do Mal


O argumento do mal procura salientar a incompatibilidade entre a presença do mal

e a existência do Deus teísta. Quando duas proposições mostram-se inconsistentes,

conclui-se que uma delas ou ambas terá de ser falsa. Sabendo que o mal existe, o Deus

teísta não pode existir. No entanto, estas proposições não são necessariamente

inconsistentes. Não existe forma de comprovar que a existência do mal anule um Deus

omnipotente, omnipresente, omnisciente e sumamente bom. É cabível afirmar que um

Deus assim possa ter criado um mundo que permita mal e sofrimento a acontecer. O

argumento lógico do mal é, portanto, insuficiente para refutar a existência de Deus, por ser

possível que exista uma razão para Deus permitir este mal, apenas não a conhecemos, e

podemos nunca vir a conhecer.

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Argumento Indiciário do Mal
Esta versão do argumento também admite que a incompatibilidade entre Deus e o

mal não existe, mas afirma que a existência do mal é indício de que a existência de Deus é

improvável. Este argumento aplica-se a todos os males que o mundo físico apresenta,

sejam os males naturais ou os males morais, e as diferentes escalas do mal. No centro desta

discussão encontra-se o mal que é considerado gratuito ou sem sentido, ou seja, o mal que

Deus consegue evitar sem consequências. Considerando que é possível que este tipo de mal

exista, também é possível que Deus não exista.

Este argumento ainda tem outra premissa associada, uma a posteriori, através de

uma inferência não dedutiva. Recolhendo exemplos de males e sofrimento humano ou não

humano que não mostram uma boa razão aparente, dá para concluir que provavelmente

estes males são gratuitos e sem sentido, mais uma vez colocando em causa a hipótese da

existência de Deus. Para isto os defensores do teísmo voltam a ripostar, dizendo que da

mera hipótese de existirem males sem sentido não se pode refutar a existência do Deus

teísta. No entanto, reconhece-se que esta versão do argumento do mal é mais

fundamentada e possível em relação ao argumento lógico.

A Resposta de Leibniz ao Argumento Lógico do Mal


A origem e existência do mal foi algo que desde sempre se tentou justificar, e as

explicações teístas que tentam responder a este problema chamam-se teodiceias (do grego,

theós díke - justiça de Deus). Estas podem ser separadas em dois grupos: as teodiceias

morais, e as teodiceias naturais, correspondendo a cada tipo de mal que é abordado. Este

termo foi desenvolvido pelo filósofo Gottfried Leibniz, que o utilizou na sua obra Teodiceia:

Ensaios sobre a bondade de Deus, a origem do ser humano e a origem do mal.

Teodiceias morais focam-se na discussão do livre arbítrio destes tais agentes morais

que praticam o mal. A existência deste tipo de mal tem sido justificada com a premissa de

que o mal é condição obrigatória do livre arbítrio, ou de que o mal é permitido para que o

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ser humano se desenvolva e amadureça moralmente ao longo da sua vida. As teodiceias

naturais classificam estes males como contrapartes do bem ou meios para atingir o bem.

Sendo a lista de teodiceias existentes vasta, aqui irá ser abordada a primeira, a de Leibniz.

Breve Biografia de Leibniz

Gottfried Leibniz (1646-1716) nasceu em Leipzig, Alemanha, e foi um filósofo,

matemático, físico, lógico, político e diplomata. Cresceu no seio de uma família instruída e

desde cedo foi considerado um génio, entrando na faculdade aos 15 anos. Doutorou-se em

direito mas recusou a posição de professor. Inventou o cálculo infinitesimal, que levou à

sua reputação ser manchada após Newton reclamar a ideia como sua. Entre os seus

diversos documentos, textos, e obras, destaca-se Teodiceia: Ensaios sobre a bondade de Deus,

a liberdade do ser humano e a origem do mal.

A Teodiceia de Leibniz

Leibniz procura responder ao argumento lógico do mal para provar que este é

inválido, falsificando a premissa de que se mal existe, Deus não pode existir. A partir disto

o filósofo desenvolve o princípio do melhor, defendendo que a realidade em que nos

encontramos já é a mais perfeita possível.

Sendo Deus o ser mais perfeito que existe, omnipotente, omnipresente,

omnisciente e sumamente bom, Ele visionou todos os mundos possíveis que poderia criar,

de acordo com os seus atributos e os seus limites lógicos. Tendo todo este poder e todas as

possibilidades de mundos para criar, Deus escolheu o melhor mundo que poderia ser feito,

aquele em que vivemos. Tendo o poder de criar um mundo totalmente livre de maldade,

Deus decidiu criar uma realidade com mal em abundância, pois este permite o crescimento

moral do ser humano. Um mundo com mal significa que é um mundo com livre arbítrio, e

portanto o ser humano tem a hipótese de se melhorar moralmente. O pecado e a punição

como consequência do pecado estão presentes no mundo em que nos encontramos, mas é o

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melhor mundo que poderia ser criado, porque mesmo havendo mal existe livre arbítrio.

Este mal é necessário também, pois Deus cria tudo por algum motivo e pelo melhor

motivo. O mal é feito como contraparte do bem e meio para atingir o bem, e os motivos

que expliquem o porquê de todos os bens estarem ligados aos males e de que forma estes

males servem o plano de Deus como ele entende estão além da nossa compreensão, apenas

o Deus perfeito o sabe.

Objeções à Teodiceia de Leibniz

Se a teoria de Leibniz estiver correta, então seria logicamente impossível criar um

mundo sem o mal, visto que Deus não pode fazer nada que vá contra as suas características

ou que contradiga a lógica. No entanto, não existem evidências que comprovem que isto

não pode acontecer. Críticos da teodiceia afirmam que enquanto nada comprovar que Deus

não poderia ter criado um mundo sem mal, este argumento é fraco.

Outra objeção está ligada ao conceito de livre arbítrio como um bem necessário. A

teoria de Leibniz afirma que Deus não poderia criar um mundo sem mal, porque um

mundo sem mal implicaria que o livre arbítrio não existisse. Mas tal como na objeção

anterior, nada indica que o livre arbítrio é um bem necessário ou um bem sequer. A ideia

de que o livre arbítrio é um bem que funciona como contraparte do mal não está

justificada, e não é considerada suficiente para justificar a existência do mal.

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Conclusão
Ao longo da história, sentiu-se a necessidade de comprovar a existência de Deus, ou

se isto seria mesmo possível. Teístas, ateístas, e agnósticos divulgaram as suas teorias

acerca de diferentes pontos de vista adotados quanto a este problema, assim como foram

alvos de críticas por parte de tantos outros. A meu ver, é impossível comprovar a existência

de Deus, mas considero igualmente impossível decidir apenas acreditar com base em

cálculos de probabilidades. O argumento do mal é o que faz mais sentido no meu ponto de

vista, pois acho difícil que um Deus sumamente bom e omnipotente, omnipresente, e

omnisciente permita a existência da quantidade de mal que está presente no mundo em

que vivemos e que ocorre em situações até comuns do dia a dia. A ideia de livre arbítrio

não é necessariamente um bem tão importante que justifique todo o mal com que nos

encontramos na nossa realidade, e uma divindade tão poderosa com todos os atributos que

lhe estão atribuídos poderia facilmente evitar grande parte do mal que ocorre, seja ele

humano ou natural. Portanto, apesar de acreditar que a existência de Deus é uma incógnita

impossível de determinar, estou mais inclinado para não acreditar que esta seja real,

devido às contradições que encontro entre as características de Deus e situações do dia a

dia.

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