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Publicado em 2021 pela Organização das Nações Unidas para a Coordenação técnica da Representação da UNESCO no Brasil:
Educação, a Ciência e a Cultura, 7, place de Fontenoy, 75352 Paris Marlova Jovchelovitch Noleto, diretora e representante
07 SP, França, e pela Representação da UNESCO no Brasil, em Maria Rebeca Otero Gomes, coordenadora do Setor de Educação
cooperação com o Ministério da Educação (MEC) e a Fundação
Carlos Chagas (FCC). Revisão técnica: Wagner Santana e Setor de Educação
da Representação da UNESCO no Brasil
© UNESCO 2021
Revisão gramatical e ortográfica: Marina Mendes
Revisão editorial: Unidade de Publicações da
Representação da UNESCO no Brasil
Diagramação: Raruti Comunicação e Design Ltda.
ISBN: 978-65-86603-20-0 Imagem de capa: © Shutterstock
Esta publicação está disponível em acesso livre ao abrigo da
licença Attribution-ShareAlike 3.0 IGO (CC-BY-SA 3.0 IGO) (http://
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conteúdo da presente publicação, os usuários aceitam os termos
de uso do Repositório UNESCO de acesso livre (www.unesco.org/
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BR/2021/PI/H/9
Esclarecimento: a UNESCO mantém, no cerne de suas prioridades, a promoção da igualdade de gênero, em todas as suas atividades
e ações. Devido à especificidade da língua portuguesa, adotam-se, nesta publicação, os termos no gênero masculino, para facilitar a
leitura, considerando as inúmeras menções ao longo do texto. Assim, embora alguns termos sejam escritos no masculino, eles referem-
se igualmente ao gênero feminino.
A Marli André (in memoriam), que participou
da idealização desta pesquisa e contribuiu
com as discussões iniciais. Ela fez uma falta
enorme no processo de análise e discussão
dos dados. Agradecimentos e saudades.
Agradecimentos
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Foto: © UNESCO/Edson Fogaça
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Resumo
O objetivo deste estudo é investigar como as pesquisas científicas produzidas e publicadas no
Brasil, no período 2008-2018, abordam e descrevem práticas pedagógicas relativas à educação
básica. A intenção é evidenciar práticas que mostraram alternativas pedagógicas diferenciadas e
que têm potencial para se tornarem referência na formação inicial e continuada de professores(as)
que atuam ou atuarão nesse nível de ensino. Para tanto, a metodologia da pesquisa incorpora
pressupostos de elaboração de um estado do conhecimento sobre práticas pedagógicas, ainda que
não o seja estritamente, sendo complementado por procedimentos de construção de metanálise.
O levantamento bibliográfico foi feito com os descritores “práticas pedagógicas” e “boas práticas”,
na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e no Scientific Eletronic Library Online
(SciELO). O corpus de análise constituiu-se de 28 teses e 24 artigos, evidenciando que há poucos
estudos no país que abordam a temática com detalhamento concreto, o que justifica sua relevância.
Os resultados apontam que são poucas as pesquisas, no Brasil, que apresentam alguma conceituação
de prática pedagógica, bem como relatos detalhados e comentados de práticas docentes encontradas
nas escolas. Tanto a conceituação quanto o relato de práticas, em vários estudos, aparecem de forma
implícita ou subjacente. No conjunto das pesquisas foram identificadas duas modalidades de práticas:
(i) aquelas relativas à atuação do professor com os seus alunos; e (ii) aquelas que dizem respeito ao
trabalho com os seus pares e ao seu próprio desenvolvimento profissional. As práticas relativas à
atuação do professor com os seus alunos foram as mais estudadas, especialmente aquelas que dizem
respeito à gestão dos aprendizados e da classe, porém com maior ênfase na primeira. Há achados
derivados das análises realizadas nesta pesquisa que podem ser considerados por parte das políticas,
dos gestores, instituições formadoras e seus docentes, no que se refere ao seu papel em relação à
formação inicial e continuada em geral, e às práticas pedagógicas em particular.
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Foto: © UNESCO/Edson Fogaça
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Lista de quadros
Lista de figura
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Sumário
Apresentação ..........................................................................................................................12
I. Introdução.............................................................................................................................15
1. Procedimentos da investigação....................................................................................25
6. Sistematização das práticas que ressaltam dos artigos e das teses de doutorado...65
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6.1.2. A gestão dos aprendizados ..........................................................................................................................71
Referências bibliográficas....................................................................................................151
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Apresentação
Enquanto, em 2015, o Brasil e um conjunto expres- toda espécie e a um elevado custo emocional, em
sivo de países assumiram o compromisso de ga- um ambiente cercado de incertezas.
rantir uma educação inclusiva, equitativa e de qua-
lidade para todos até 2030, tal como expresso no Assim, esse grupo profissional, que é alvo frequente
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4 (ODS de tantas críticas, muitas vezes sem que lhe sejam
4), em 2020, o mundo foi profundamente abalado garantidas as condições adequadas para a sua
pela pandemia da COVID-19. A promessa e a espe- formação inicial e continuada, carreira, valorização
rança que, juntos, abraçamos em 2015, se viram, e exercício da profissão, demonstrou mais uma vez
assim, seriamente ameaçadas. Bilhões de estudan- que não é substituível por máquinas eficientes,
tes e milhões de professoras e professores foram aparatos tecnológicos de última geração ou
subitamente afastados de seus ambientes de en- familiares muito bem-intencionados e amorosos,
sino e aprendizagem, ao mesmo tempo em que mas sem a formação pedagógica adequada.
desigualdades se aprofundaram e oportunidades
e sonhos foram ceifados. Os impasses e as deman- A UNESCO, desde a sua criação, em 1945, nunca
das colocados à garantia do direito à educação teve dúvidas em relação à importância da ga-
cederam lugar a um novo e inesperado capítulo, rantia do direito à educação para a construção
que talvez poderia ser chamado de “os desafios da de um mundo mais justo e solidário, da mesma
educação escolar sem escolas”. forma como nunca teve dúvidas quanto ao pa-
pel central e basilar dos docentes para a efetiva-
Em meio ao colapso sanitário, econômico e social ção desse direito. Assim, a agenda das políticas
que se seguiu à pandemia, ainda que as escolas docentes sempre ocupou um lugar proeminen-
permanecessem fechadas, estudantes e famílias te nas ações da UNESCO no campo educacional
não estavam sem professoras e professores. Ao em todo o mundo, por meio da produção de
menos naqueles lugares em que a pobreza e a estudos e pesquisas, da elaboração e discussão
vulnerabilidade extrema não inviabilizaram por em âmbito global de documentos referenciais
completo a construção de alternativas de ensino e normativos, apoio à formulação e à imple-
remoto, os docentes reinventaram suas práticas mentação de políticas voltadas aos docentes e
pedagógicas, improvisaram de forma criativa, inúmeras outras iniciativas de valorização e re-
estenderam suas jornadas laborais e reforçaram os conhecimento desses profissionais.
laços com as famílias e as comunidades. Tudo isso
foi possível somente porque esses profissionais É nesse contexto que se insere esta publicação, que
assumiram novas responsabilidades e reafirmaram é a quarta que desenvolvemos junto à Fundação
o compromisso de fazer o possível para não deixar Carlos Chagas (FCC), parceiro fundamental e que
ninguém para trás, mesmo em meio a perdas de também é responsável pela gestão e pelas ativida-
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des da Cátedra UNESCO sobre Profissionalização Ou seja, o conhecimento sobre as práticas
Docente. Essa parceria é fruto do reconhecimento, pedagógicas é um elemento basilar da formação
pela Representação da UNESCO no Brasil, da contri- inicial e continuada dos docentes na sua tarefa
buição relevante e destacada da FCC para os estu- cotidiana e, ao mesmo tempo, civilizatória, de
dos educacionais no Brasil e, em particular, sobre a contribuir para a formação de cidadãos em uma
condição docente no nosso país. perspectiva humanista e democrática.
Enquanto a primeira publicação desta parce- Com esta publicação, mais uma vez, a UNES-
ria se dedicou à formação inicial e continuada CO reforça o seu compromisso com a educação
dos docentes brasileiros, e a segunda buscou brasileira. Neste momento em que atravessamos
construir um estado da arte para as políticas mais uma crise global e vamos desenhando e im-
docentes no Brasil 1, a terceira publicação re- plementando os caminhos para não abandonar a
tomou os desafios da formação inicial e con- projeto de uma educação inclusiva, equitativa e
tinuada dos docentes.2 Nesse esforço comum de qualidade para todos, novamente escolhemos
de adensar o campo das políticas docentes e estar ao lado das professoras e dos professores,
contribuir para processos de formação inicial contribuindo para a sua formação e para o seu fa-
e continuada de professores, esta nova publi- zer profissional, em reconhecimento à sua impor-
cação que agora estudantes, pesquisadores tância, à sua dedicação e ao seu compromisso.
do campo da educação, gestores e leitores
em geral tem nas mãos, se dedica a contribuir
para o fortalecimento das práticas pedagógi-
cas na educação básica. Como esclarecem as
autoras da publicação, com base em ampla
literatura a respeito, a formação de docentes
qualificados supõe
1 GATTI, Bernardete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de Sá. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. Disponível em: <https://
unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000184682?posInSet=4&queryId=1e6e4e4d-bbd7-4c19-92db-d9637997ca73>.
GATTI, Bernardete Angelina; BARRETTO, Elba Siqueira de Sá; ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de;. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte.
Brasília: UNESCO, 2011. Disponível em: <https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000212183?posInSet=1&queryId=e9ed1501-06a7-46c5-a204-
0ce19aa0b374>.
2 GATTI, Bernadete Angelina; BARRETTO, Elba Siqueira de Sá; ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de; ALMEIDA, Patrícia Cristina Albieri de. Professores
do Brasil: novos cenários de formação. Brasília: UNESCO, 2019. Disponível em: < https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000367919?posInSet=1&
queryId=615cb52d-0744-419a-af5b-6132dcafde3f>.
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Foto: © Stephen Luke_Creative commons
O que evidenciam as pesquisas em educação
I. Introdução
Este texto trata de aspectos que as pesquisas na conhecimento às novas gerações, considerando a
área de educação no Brasil evidenciam como ca- formação da cidadania, com valores e princípios
racterísticas relevantes para a prática da docência éticos (ALTENFELDER, 2015; SILVA; ALMEIDA, 2015;
na educação básica.3 Retrata a busca realizada CUNHA, 2006; SCHEIBE; BAZZO, 2001; MELLO,
para detectar de que maneira são ressaltados ele- 2000; BRASIL, 2015, 2020).
mentos formativos que se destacam para a ação
pedagógica na educação escolar, em pesquisas Tais propósitos e dinâmicas da educação básica
socializadas em teses de doutorado e periódicos geram demandas tanto para as instituições forma-
científicos nacionais. doras nos cursos, pesquisas e ações que desenvol-
vem, quanto para as próprias escolas e as redes
1. Por que pensar nas escolares. Assim, especialmente a partir da déca-
práticas pedagógicas da de 1980, muitos estudos foram desenvolvidos
com a intenção de compreender e melhorar a for-
A docência na educação básica é um trabalho mação de professores e iniciar um processo que
que exige formação não só filosófica, sociológica favorecesse a legitimidade da profissão e, dessa
e histórica, que constitui sua cultura de contexto maneira, ultrapassasse a concepção da docência
e perspectivas educacionais, mas demanda tam- ligada a um fazer apenas vocacionado. Dessa for-
bém formação em áreas do conhecimento e em ma, emergiu a interdependência entre dois aspec-
práticas escolares, que visam ao desenvolvimento tos: a necessidade de melhorar a formação dos fu-
das aprendizagens dos alunos, em seus variados turos professores e de profissionalizar o magistério
momentos de desenvolvimento cognitivo, afeti- (GAUTHIER et al., 1998; POPKEWITZ, 1992). Isso está
vo, relacional e de vida social. Assim, em estudos bem configurado no Plano Nacional de Educação
que tratam do papel de professores da educa- 2014-2024, em sua Meta 13 (BRASIL, 2014).
ção básica, aponta-se a necessidade do domínio
de uma compreensão integrada no que se refe- Levando-se em consideração que essas situações
re aos: conhecimentos acumulados e considera- se transformam no tempo, criando desafios
dos socialmente relevantes; conhecimentos das formativos que devem ser ponderados, pode-se
áreas disciplinares a serem trabalhados na escola; dizer que o exercício da docência na educação
conhecimentos sobre o contexto sociocultural da básica nos contextos de sua realização e dentro
escola em que se vai atuar; conhecimentos sobre dos propósitos que o fundamentam requer
as crianças e adolescentes; e meios para levar esse capacidades relativas às escolhas de caminhos e
3 Para verificar a definição de educação básica e a equivalência dos níveis educacionais no Brasil e nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa
(Palops), consulte o “Glossário de terminologia curricular” do UNESCO-IBE, que apresenta a Classificação Internacional Normalizada da Educação
(International Standard Classification of Education – ISCED), disponível em: <https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000223059_por>.
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
4 Este trabalho considerou “práticas pedagógicas” como sinônimo de “práticas docentes” e “práticas de ensino”.
5 A construção de tipos ideais, aqui colocada, dialoga com o constructo teórico proposto por Max Weber (1979).
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O que evidenciam as pesquisas em educação
Nessa esteira, vem sendo destacada a importância A intenção aqui não é analisar as possíveis
das práticas pedagógicas concretamente desenvol- causas que possam explicar a resistência de
vidas nas salas de aula, ou seja, nas relações educa- pesquisadores e formadores de professores ao
cionais construídas na atividade cotidiana das esco- uso desses dados, mas ressaltar que convidar
las, como prática que tem lastro em pesquisas e co- os futuros professores a desenvolver sua própria
nhecimentos estruturados (SILVA JÚNIOR et al., 2015; “filosofia pessoal” de gestão de sala de aula e dos
MARTINS; ZAPPONE, 2018; BASTOS; NARDI, 2018). aprendizados não é uma atitude prudente, como
bem ressaltam os autores citados. Quando se lida
Desse modo, com gerações de crianças e jovens vulneráveis,
“é necessário ter um maior cuidado antes de
propor aos alunos em formação de professores
o caminho da investigação neste trabalho intervenções pedagógicas que não são fundadas
tem base no conhecimento produzido e em evidências” (BISSONNETTE; GAUTHIER;
publicado sobre práticas pedagógicas que se BOCQUILLON, 2020, p. 7).
mostrem efetivas para a criação de relações
pedagógicas que favoreçam aprendizagens Há um problema de fundo, segundo os autores:
relevantes na educação básica. “o desconforto crônico dos formadores de
professores na universidade face às exigências
Um aspecto silenciado quando se discute técnicas requeridas para assegurar que seus
prática pedagógica diz respeito ao uso de estudantes exerçam com competência a
“evidências” na formação de professores, o tarefa ao qual eles se destinam” (BISSONNETTE;
que pressupõe que melhorias são possíveis na GAUTHIER; BOCQUILLON, 2020, p. 6). O trabalho
educação quando as intervenções propostas docente não se reduz à técnica, no entanto, inclui
são fundadas em estudos. componentes técnicos essenciais que precisam
ser aprendidos. Segundos esses três autores,
Aqui “evidências” são concebidas em seu sentido Uma atitude de prudência na formação de professores
amplo: são a comprovação empírica de uma dada é, portanto, essencial, pois permite:
hipótese, mas não apenas e necessariamente 1. evitar a promoção de estratégias educativas que
aquela proveniente de estudos quantitativos, não tenham sido testadas;
ou experimentais e quase-experimentais. 2. combater o efeito de pêndulo tão frequente na
educação e realizar assim importantes economias,
Bissonnette, Gauthier e Bocquillon (2020, p. 3) não somente no plano financeiro, mas, também, no
questionam “qual lugar é dado às práticas de ensino plano de energia que os atores terão que empregar
cuja eficiência tem sido mostrada rigorosamente para implantar essas ideias pedagógicas, porque,
no final das contas, são sempre os professores que
na formação dos professores?”. Segundo os autores,
carregam o ônus do risco;
“a resposta é simples: pouco ou nada!”. Também
indagam “como podemos ser professores em 3. construir pacientemente uma base de conheci-
uma instituição que produz a ciência e, ao mesmo mento profissional baseada na pesquisa (research-
-supported professional knowledge base);
tempo, contraria o uso de intervenções baseadas
em evidências?” (2020, p. 5).
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
4. assegurar, no plano ético, que abordagens cujos aprendizagem, na pesquisa sobre o ensino e na
efeitos não tenham sido seriamente verificados formação de professores.
não sejam implementadas, levando-nos a perceber
tardiamente, ou seja, somente depois de sacrificar Esse movimento requer, dentre outros aspectos, o
gerações de cobaias, que seu impacto era fraco,
uso de evidências de pesquisas para dar suporte
ou mesmo negativo (BISSONNETTE; GAUTHIER;
aos programas de formação de professores
BOCQUILLON, 2020, p. 7).
como, por exemplo: as pesquisas básicas sobre
aprendizagem, tanto de modo geral como em
Logo, áreas específicas, como matemática, linguagem
etc.; os estudos que exploram como práticas
pedagógicas específicas promovem certos tipos
o uso de evidências na formação de profes- de aprendizagem; as pesquisas sobre a relação
sores é importante para que se evite que o entre a formação de professores, as práticas de
aprendizado da docência ocorra por tenta- ensino e o desempenho dos alunos; as pesquisas
tivas e erros. sobre como os professores aprendem.
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O que evidenciam as pesquisas em educação
2015, 2020; SILVA JÚNIOR et al., 2015: GATTI et al., propiciar a aprendizagem escolar de crianças,
2019; VASCONCELOS; ANDRADE, 2019). adolescentes e jovens, o que pressupõe
lidar com conceitos preexistentes relativos
É importante reiterar que os currículos de às práticas docentes. É o momento em que
formação inicial para a docência na educação conceitos e práticas podem ser refletidos,
básica e as formações continuadas recebem questionados, aprimorados, remodelados,
influxos de políticas gestadas por diferentes apreendidos e/ou refutados, seja por meio
governos, com perspectivas traduzidas por dos conhecimentos que são veiculados nos
documentos e programas. No Brasil, políticas cursos de formação, seja pelas experiências,
de gestão educacional vêm se constituindo interações e vivências variadas às quais, em
e imprimindo referências para as instituições situações de aprendizagem, os estudantes
formativas que vivenciam, desde o advento da nas licenciaturas são expostos. A formação
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional inicial nas graduações tem, assim, um peso
– Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996) –, processos considerável na construção da profissionalidade
de reformulação curricular decorrentes das e da profissionalização docente, ou seja, na
normatizações sobrevenientes e, também, de reconversão de saberes do senso comum em
demandas institucionais e do próprio corpo conhecimentos fundamentados, na criação
docente. Nesse processo, as instituições de ensino de possibilidades de desenvolvimento de
superior (IES) vêm sendo desafiadas a reestruturar saberes, habilidades, atitudes e valores que
suas práticas de formação inicial e continuada constituem a especificidade do ser professor.
tendo em vista, dentre outros aspectos, promover É preciso lembrar que a postura e a didática dos
a articulação entre a prática profissional e a formadores de professores também têm papel
formação teórica, entre a experiência concreta nas marcante nessa formação.
salas de aula e a pesquisa, entre os professores e os
formadores universitários. Imbernón (2001, p. 63) argumenta que “os
modelos com os quais o futuro professor ou
Os cursos de licenciatura, responsáveis pela professora aprende perpetuam-se com o exercício
formação de professores para as diferentes áreas de sua profissão docente já que esses modelos se
curriculares da educação básica, têm um papel convertem, até de maneira involuntária, em pauta
fundamental não só na construção da identidade de sua atuação”. Por essa razão é que Altet e Guibert
dos professores e na sua socialização profissional (2014) insistem na ideia de que desenvolver a
mas, também, na aproximação das relações formação de professores é propiciar a construção
entre o conhecimento universitário e a atividade de mudanças conceituais e de práticas.
profissional, considerada como um espaço
prático de produção, de transformação e de Já a formação continuada ajuda o docente
mobilização de saberes e, consequentemente, a avançar nesses aspectos e contribui com
de teorias, de conhecimentos e de saber-fazer aprofundamentos, reavaliações de práticas e
específicos do ofício de professor (TARDIF, 2002). perspectivas, reconfiguração de representações
e ideias que vão se configurando no tempo por
Durante a formação inicial, o futuro professor meio da atualização constante de conhecimentos,
forma-se para constituir modos de atuar para da reflexão individual e coletiva sobre a própria
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
prática e sobre sua cultura, suas experiências em geral. A formação de docentes integrando
pessoais e profissionais. teorias e práticas se mostra como caminho in-
contornável, e, neste diapasão, entra em foco
Na perspectiva das formações e considerando outro aspecto: o profissionalismo docente que
a dialeticidade do binômio teoria-prática, e a envolve valores e compromissos que se conju-
imbricação conceitual de ambos os termos, gam às formas de ação nas escolas e salas de
coloca-se como fundamental tanto mudar a aula. Como reflete Dourado:
concepção mais vigente sobre “prática” e “teoria”
como opostos, quanto mudar a concepção de
é fundamental romper com propostas político-peda-
prática como mera aplicação direta de teorias
gógicas para a formação de profissionais do magisté-
aprendidas ou mediadas por técnicas, ou como
rio que tenham por foco apenas o saber fazer, o mu-
mero uso mecânico de receituário de técnicas. As niciamento prático, bem como com concepções que
práticas pedagógicas são atos culturais, como já advogam a teoria como elemento fundante para a
colocado, portanto fundamentados em teoria, mais formação, ignorando, em muitos casos, a importância
ou menos elaboradas, e embebidos de sentido. As da produção de práticas pedagógicas, o estágio su-
práticas são ações educacionais com fundamentos pervisionado, dentre outros (DOURADO, 2016, p. 29).
e escolhas. Trata-se de trabalhar conceitualmente
em um plano de superação de uma concepção
meramente técnica sobre o ensino, avançando Uma perspectiva educacional associada às práti-
para uma compreensão da unidade teoria e prática, cas de formação com ênfase no desenvolvimento
bem como para o entendimento de que o trabalho do conhecimento profissional constitui elemento
docente possui, em sua natureza, uma dimensão essencial para formar um pensamento educativo,
teórico-prática integrada (GATTI, 2020). uma imagem do trabalho no magistério, tendo
em vista preparar profissionais que lidarão com a
Nessas condições, as questões da autonomia, socialização e a humanização de semelhantes por
das responsabilidades e da profissionalização meio da mediação com a cultura, com processos
dos professores são aspectos que há anos ocu- deontológicos e com o conhecimento. Trata-se,
pam as discussões acadêmicas e as preocupa- portanto, de preparar profissionais para um tra-
ções de gestores educacionais, bem como dos balho complexo que envolve conhecimentos
próprios docentes. Como explicita Perrenoud específicos, advindos de várias áreas, que se en-
(1997), são questões de primeira importância, trecruzam. Reportando-nos às análises de Altet
uma vez que não se pode esperar dos profes- e Guibert (2014), sinaliza-se a complexidade in-
sores resultados idênticos, dada a variedade trínseca dos processos formativos de professores
de contextos e condições em que atuam, suas que envolvem uma lógica socioprofissional, uma
diferenças formativas e a diversidade do aluna- lógica didática e uma lógica psicológica, ao que
do. Além disso, resultados idênticos não podem se acrescenta o desenvolvimento da necessária
ser esperados quando se propõe um trabalho sensibilidade ao contexto de vida dos alunos e
educacional ativo e participativo, diferenciado e aos movimentos societários em geral.
problematizante, em que estudantes construirão
tanto seus caminhos cognitivos como os signi- Desde os anos de 1990, as questões relativas
ficados para os conhecimentos e para a vida ao conhecimento profissional docente estão
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O que evidenciam as pesquisas em educação
6 O uso da sigla em inglês PCK tem sido recorrente na literatura para se referir ao conceito.
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
7 Em cada um dos países em que o estudo foi realizado, a metodologia contemplou: a) políticas referentes à formação inicial docente dos sete
países nas últimas duas décadas; b) currículos de 22 instituições formadoras (três por país, mas houve casos em que se estudaram quatro);
c) entrevistas com acadêmicos e autoridades das respectivas instituições para se conhecer suas percepções sobre as oportunidades formativas
oferecidas, aqui, em relação às pedagogias de inclusão; d) entrevistas grupais com estudantes que se encontravam em fase final de sua formação.
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Foto: © UNESCO/Edson Fogaça
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
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O que evidenciam as pesquisas em educação
8 “O BDTD integra e dissemina, em um só portal de busca, os textos completos das teses e dissertações defendidas nas instituições brasileiras de
ensino e pesquisa. O acesso a essa produção científica é livre de quaisquer custos. A BDTD contribui para o aumento de conteúdos de teses e
dissertações brasileiras na internet, o que significa a maior visibilidade da produção científica nacional e a difusão de informações de interesse
científico e tecnológico para a sociedade em geral”. Disponível em: <http://bdtd.ibict.br/vufind/Content/whatIs>. Acesso em: out. 2019.
9 Disponível em: <https://scielo.org/>. Acesso em: out. 2019.
10 As instituições que integram o banco podem ser consultadas em: <http://bdtd.ibict.br/vufind/Institutions>. Acesso em: out. 2019.
11 “O Qualis-Periódicos é uma ferramenta usada para classificar a produção científica dos programas de pós-graduação no que se refere aos artigos
publicados em periódicos científicos. Tal processo foi concebido para atender as necessidades específicas do sistema de avaliação da produção
científica e é baseado nas informações fornecidas por meio do módulo Coleta de Dados da Plataforma Sucupira. Como resultado, disponibiliza uma
lista com a classificação dos veículos utilizados pelos programas de pós-graduação para a divulgação da sua produção”. Disponível em: <http://www.
capes.gov.br/avaliacao/instrumentos-de-apoio/qualis-periodicos-e-classificacao-de-producao-intelectual>. Acesso em: out. 2019.
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Quadro 1: Grupo 1 – Descritor mestre práticas Quadro 2: Grupo 2 – Descritor mestre boas
pedagógicas e descritores secundários práticas e descritores secundários boas práticas
Exitosas Educação
eficazes exitosas
inovadoras eficazes
evidências inovadoras
bem-sucedidas evidências
saberes bem-sucedidas
saberes docentes saberes
saberes curriculares saberes docentes
saberes curriculares
conteúdo
conteúdo
ensino
conhecimentos
didática
conhecimentos docentes
metodologias
conhecimentos curriculares
formação de professores
conhecimentos educação
escola
ensino
sala de aula
didática
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
educação básica
metodologias
BOAS PRÁTICAS
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Ou seja, selecionaram-se apenas teses e artigos Ficou-se, assim, com 97 teses para a leitura do
que tratavam explicitamente de práticas resumo. Após essa triagem, restaram 74 teses
pedagógicas no ensino fundamental e ensino que foram objeto de análise mais detalhada,
médio, em sua modalidade regular. Esse recorte incluindo leitura transversal da introdução,
tem também uma justificativa pragmática: o metodologia dos trabalhos e resultados. Desse
tempo da pesquisa não permitiria aprofundar último conjunto, foram selecionadas 28 teses
as especificidades que outros níveis e/ou que apresentavam dados suficientemente
modalidades de ensino demandariam. detalhados para as análises pretendidas, e que
compuseram, portanto, o corpus de análise. Esse
processo está explicitado no Quadro 3, a seguir:
Nº de
Nº de Nº de Nº de
Base Número teses
teses teses teses
selecionadas
de dados de remanescentes selecionadas selecionadas
após leitura
BDTD ocorrências excluídas as após leitura após triagem
do título e
repetições dos resumos final
palavras-chave
A relação com as 28 teses selecionadas por data com identificação da revista, autores, instituição de
vínculo do(s) autor(es), região, título e temática estão no Quadro 4, a seguir:
Quadro 4: Relação das teses selecionadas por data com identificação da revista, autores, instituição
de vínculo do(s) autor(es), região, título e temática
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O que evidenciam as pesquisas em educação
Do produto ao processo:
MORAIS,
contribuições da Provinha Brasil
2014 Georgyanna UFCE NE Linguagens; alfabetização
na reorganização da prática
Andréa Silva
pedagógica alfabetizadora
Linguagens, matemática e
ALMEIDA,
Programa Um Computador por ciências da natureza; TIC;
Alisandra
2014 PUC-SP SE Aluno: as práticas pedagógicas web currículo; práticas
Cavalcante
desenvolvidas com o uso do laptop pedagógicas; formação de
Fernandes de
professores
Cartografia e contexto: a
BRIGUENTI, linguagem simbólica e as múltiplas Ciências humanas; geografia;
2014 Unicamp SE
Éderson Costa relações cotidianas mediando o mediação docente; currículo
ensino de geografia
Os desafios de definir um
bom professor e a herança das
HORTA, Patrícia escolas alternativas paulistanas: Formação de professores;
2014 USP SE
Rossi Torralba perspectivas de coordenadoras escolas alternativas
pedagógicas e professoras do
ensino fundamental I
31
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Inovações pedagógicas em
MELGAÇO, Iria Ciências; inovações
2015 UFMG SE contextos de ensino de ciências
Luiza de Castro pedagógicas; PCNs
naturais no ensino fundamental
Desenvolvimento do conhecimento
pedagógico do conteúdo para
MOREIRA, Wagner Ciências da natureza;
2015 USP SE argumentação (PCKarg) de um
Alves química; CPC; argumentação
professor de química recém-
formado
Unesp- Professoras iniciantes e o aprender Matemática; prática
CIRÍACO, Klinger
2016 Presidente SE a ensinar matemática em um grupo pedagógica; formação de
Teodoro
Prudente colaborativo professores
Arquiteturas pedagógicas
Linguagens;
SANTOS, Karen como dispositivos de formação
língua portuguesa;
2016 Christina Pinheiro UFRN NE de professores em práticas
multiletramentos; formação
dos multiletradas por meio das
de professores
tecnologias digitais
Práticas pedagógicas de
professores no ensino de Matemática; práticas
LIMA, Simone
2017 Unesp-Marília SE matemática nos anos iniciais pedagógicas; resolução de
Marques
do ensino fundamental e a problemas
resolução de problemas
Interdisciplinar; tecnologia
SILVA, Ana Elisa
Redes móveis de produções: os educacional; conteúdos
2017 Drummond UFBA NE
tablets na prática pedagógica digitais; práticas
Celestino
pedagógicas
32
O que evidenciam as pesquisas em educação
O levantamento realizado mostra que, embora seis, que foram facilmente identificados como
a referência a práticas pedagógicas apareça em repetidos. Todos os artigos foram reunidos em
muitos trabalhos, sejam teses de doutorado ou uma única tabela com eliminação dos artigos
artigos, os procedimentos e processos envolvidos repetidos, que apareciam na busca de diferentes
na sua concretização e estudo nem sempre são descritores. Assim, restaram 363 artigos que
tratados nas análises encontradas. poderiam apresentar informações relevantes
sobre práticas pedagógicas. Na sequência, por
b) Artigos científicos
meio dos títulos, palavras-chave e dos critérios
O desenho do levantamento bibliográfico de de corte já referidos, restaram 99 artigos para
artigos científicos foi bastante semelhante ao leitura. A análise dos resumos levou à exclusão de
empregado para a busca das teses na BDTD. Com mais 56 trabalhos, restando 43, e, na triagem final,
base nessa experiência, foi realizada a busca de 24 artigos apresentavam dados, procedimentos
artigos com todos os descritores apresentados e processos que permitiriam a realização das
nos Quadros 1 e 2, com os filtros 2002-2018, análises aqui pretendidas.
produção brasileira.
Observa-se que, no conjunto de revistas
No grupo 1, registraram-se inicialmente 1.419 consideradas para este estudo, muitos artigos
ocorrências de artigos e, no grupo 2, apenas apresentam nas suas palavras-chave aquelas
33
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Nº de Nº de artigos
Base de artigos selecionados Nº de artigos Nº de artigos
dados Número de remanescentes após leitura selecionados selecionados
ocorrências do título e após leitura após triagem
BDTD excluídas palavras- dos resumos final
as repetições chave
tomadas como referência de nossa busca. No entanto, exame mais detalhado dos textos mostrou que
só uma pequena parte apresenta a descrição de práticas pedagógicas encontradas nas escolas, ou
exemplos dessas práticas, as quais foram objeto das interpretações dos autores das pesquisas. Por essa
razão, apenas 24 dos artigos foram tomados como objeto para análise.
A relação dos artigos selecionados por data com identificação da revista, autores, instituição de
vínculo do(s) autor(es), região, título e temática estão no Quadro 6, a seguir:
Quadro 6: Relação dos artigos selecionados por ano, com identificação da revista, autores,
instituição de vínculo do(s) autor(es), região, título e temática
INSTITUIÇÃO
ANO AUTOR(ES) REVISTA REGIÃO TÍTULO TEMÁTICA
DE VÍNCULO
ALBUQUERQUE, Eliana
Revista As práticas cotidianas
Borges Correia de; MORAIS, Linguagens;
2008 Brasileira de UFPE; UFRPE NE de alfabetização: o que
Artur Gomes de; FERREIRA, alfabetização
Educação fazem as professoras?
Andréa Tereza Brito
Prática docente:
THOMAZI, Áurea Regina considerações sobre Linguagens;
Educar em
2009 Guimarães; ASINELLI, Thania UFMG SE o planejamento leitura;
Revista
Mara Teixeira das atividades planejamento
pedagógicas
Instituto de
Ensino Superior
ALMEIDA, Janaina Maria Criatividade no ensino
Cenecist;
2010 Oliveira; ALENCAR, Eunice Paidéia SE/CO médio segundo seus Criatividade
Universidade
Maria Lima Soriano de estudantes
Católica de
Brasília
A dimensão criadora
Linguagens;
ZIBETTI, Marli Lúcia Tonatto; no trabalho docente:
Educação e alfabetização;
2010 SOUZA, Marilene Proença UNIR; USP SE/N subsídios para a
Pesquisa saberes
Rebello de formação de professores
docentes
alfabetizadores
34
O que evidenciam as pesquisas em educação
Avaliação por
Ensaio:
diferentes olhares:
Avaliação
CARDELLI, Douglas Teixeira; Fundação fatores que explicam
2012 e Políticas SE Avaliação
ELLIOT, Ligia Gomes Cesgranrio o sucesso de escola
Públicas em
carioca em área de
Educação
risco
O papel do professor
Ensaio: na escolarização dos
Ciências da
Pesquisa em saberes: produção
2013 FREITAS, Cláudia Avellar UFMG SE natureza;
Educação e reprodução de
biologia
em Ciências discursos sobre a
genética mendeliana
Grupos colaborativos
Ciências da
SANTOS JÚNIOR, João como ferramenta na
Ciência & natureza;
2013 Batista dos; MARCONDES, UFSCar; USP SE reestruturação do
Educação química; grupo
Maria Eunice Ribeiro modelo didático do
colaborativo
professor de química
Perfil, concepções e
práticas pedagógicas
Revista
de professores que Educação
PARENTE, Cláudia da Mota Brasileira
2014 Unesp-Marília SE atuam em turmas do campo;
Darós de Estudos
multisseriadas de multisseriação
Pedagógicos
escolas públicas de
Sergipe
Interações discursivas
Ensaio: Universidade
SANTOS, Bruno Ferreira dos; em aulas de química Ciências da
Pesquisa em Estadual do
2014 SANTOS, Karina Novaes dos; NE ao redor de atividades natureza;
Educação Sudoeste da
SILVA, Eliana Sardinha da experimentais: uma química
em Ciências Bahia
análise sociológica
Um enfoque
etnobiológico na
Ciências da
BAPTISTA, Geilsa Costa Ciência & formação do professor
2015 UFBA NE natureza;
Santos Educação de ciências sensível à
biologia
diversidade cultural:
estudo de caso
35
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
As práticas
Revista pedagógicas e o Linguagens;
SANTOS, Tatiana Cristina;
Brasileira material didático leitura-escrita;
2015 TASSONI, Elvira Cristina PUC-Campinas SE
de Estudos do Programa Ler e material
Martins
Pedagógicos Escrever no 1º ano do didático
ensino fundamental
Práticas escolares
SALGADO JUNIOR, e desempenho
Alexandre Pereira; NOVI, Educação & USP-Ribeirão dos alunos: uso
2016 SE Avaliação
Juliana Chiaretti; FERREIRA, Sociedade Preto das abordagens
Jonas quantitativa e
qualitativa
Obstáculos e
dificuldades
apresentados por
professores de
Bolema:
Universidade matemática Matemática;
CEOLIM, Amauri Jersi; Boletim de
2017 Estadual do S/SE recém-formados educação
CALDEIRA, Ademir Donizeti Educação
Paraná; UFSCar ao utilizarem matemática
Matemática
modelagem
matemática em
suas aulas na
educação básica
Formação continuada
de professores:
GEMENTE, Flórence Rosana
Educar em UFG; Unesp- construindo Linguagens;
2017 Faganello; MATTHIESEN, CO/SE
Revista Rio Claro possibilidades para o educação física
Sara Quenzer
ensino do atletismo na
educação física escolar
Concepções de
LIMA, Maria Consuelo Alves; UFMA; professores de São
Ciência & Ciências da
2018 LIMA, Raysa Myrelle Soares; Universidade NE/Portugal Luís e de Coimbra em
Educação natureza; física
DAMIÃO, Maria Helena de Coimbra planejamento de aulas
de física
A exigência conceitual
Universidade
na prática pedagógica Ciências da
SOUZA, Rosilene Ventura de; Ciência & Estadual do
2018 NE de dois professores de natureza;
SANTOS, Bruno Ferreira dos Educação Sudoeste da
química que ensinam química
Bahia
química e física
36
O que evidenciam as pesquisas em educação
4. Processo de análise do
corpus constituído
Os textos foram lidos e discutidos pela equipe e, Com base nisso, realizou-se uma leitura “vertical”
posteriormente, foram criados critérios comuns do observado nas pesquisas e, depois, uma
que orientaram a leitura e registros em relação leitura “horizontal” de cada um dos tópicos
a cada artigo ou tese. Elaborou-se, então, um acima descritos, de modo a se ter uma análise
quadro para anotação de dados que permitiu preliminar sobre as práticas pedagógicas
a descrição do conjunto dos trabalhos quanto evidenciadas. Em seguida às leituras referidas,
a algumas características referenciais, por meio novas categorias analíticas foram elaboradas a
dos seguintes tópicos abaixo citados: posteriori, a saber:
37
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
38
O que evidenciam as pesquisas em educação
39
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
40
O que evidenciam as pesquisas em educação
41
42
Quadro 7: Dados dos artigos em relação à metodologia de pesquisa
Quali-quanti Professoras;
ROCHA, Maria Silvia Pinto de (categorização Observação participante; Interior do coordenação
2009 Pública municipal 5 8 turmas 1º ano EF
Moura Librandi da da atividade entrevistas; questionários estado de SP pedagógica; 6
lúdica pelo ESAR) pais e mães
Pública (não
ZIBETTI, Marli Lúcia Tonatto;
Rondônia especifica se
2010 SOUZA, Marilene Proença Qualitativo Etnografia 1 _ 1 professora EF
(RO) municipal ou
Rebello de
estadual)
Escala – inventário de
OTAVIANO, Alessandra práticas docentes para
Barbosa Nunes; ALENCAR, criatividade; escala de Distrito
2012 Quantitativo Pública e privada 2 396 alunos _ 2º ano EF
Eunice Maria Lima Soriano motivação em matemática; Federal (DF)
de; FUKUDA, Cláudia Cristina notas alcançadas em
matemática
Interior de Não
2013 FREITAS, Cláudia Avellar Qualitativo Etnografia; sociolinguística Pública estadual 1 _ 1 professor
MG especifica
Inventário do Modelo
SANTOS JÚNIOR, João Batista Qualitativo: Didático (IMD);
São Paulo
2013 dos; MARCONDES, Maria Pesquisa registros sobre a forma Pública estadual Não especifica _ 4 professores EM
(SP)
Eunice Ribeiro intervenção de participação dos
professores no grupo
43
O que evidenciam as pesquisas em educação
44
36 alunos
SANTOS, Bruno Ferreira dos; Observação e registro das
pública –
2014 SANTOS, Karina Novaes dos; Qualitativo aulas – escrito e gravação Jequié (BA) Pública e privada 2 2 professores EM
38 alunos
SILVA, Eliana Sardinha da em áudio
particular
Pública (não
Entrevistas
BAPTISTA, Geilsa Costa Cidade na especifica se
2015 Qualitativo semiestruturadas; curso de Não especifica _ 9 professoras EF e EM
Santos Bahia (BA) municipal ou
formação de professores
estadual)
Rio de
Janeiro
(RJ), Belo
Quantitativo: Estudo Longitudinal da Rede pública (federal,
OLIVEIRA, Lúcia Helena Horizonte 600 2º e 3º anos
2015 modelo lineares Geração Escolar 2005 estadual, municipal) e Não especifica 17 mil alunos
Gazólis de; BONAMINO, Alicia (MG), professores EF
hierárquicos (Geres) privada
Campinas
(SP) e Campo
Grande (MT)
Observações em sala de
aula; entrevista com a
professora e entrevistas
com os alunos. Alguns
SANTOS, Tatiana Cristina;
recursos auxiliares, como Campinas
2015 TASSONI, Elvira Cristina Qualitativo Pública estadual 1 1 turma 1 professora 1º ano EF
microfone, câmera (SP)
Martins
fotográfica e uma boneca-
personagem foram
utilizados durante as
entrevistas com as crianças
Atividade
2015 RIBEIRO, Jair Lúcio Prados Brasília (DF) Privada 1 2 turmas _ 2º ano EM
experimental
Observação de
BARBOSA, Jonei Cerqueira; aulas; registros dos 2 salas (não
1 professora e
2018 OLIVEIRA, Andréia Maria Qualitativo procedimentos e processos Salvador (BA) Pública estadual 2 especifica 9º ano EF
1 professor
Pereira de na relação professor-alunos; quantidade)
entrevista
Observação participante;
SOUZA, Rosilene Ventura de; entrevista semiestruturada;
2018 Qualitativo Jequié (BA) Pública estadual 2 _ 2 professores EM
SANTOS, Bruno Ferreira dos diário de campo; gravação
de áudio
45
O que evidenciam as pesquisas em educação
As 28 teses selecionadas foram produzidas em di- Observando a composição de gênero dos autores
ferentes regiões do Brasil, a maioria delas (15) na das teses selecionadas, verifica-se pelos nomes que
46
O que evidenciam as pesquisas em educação
47
48
Quadro 8: Dados das teses em relação à metodologia de pesquisa
DEPENDÊNCIA QUANTIDADE
INSTRUMENTOS CIDADE DE QUANTIDADE QUANTIDADE
ADMINISTRATIVA DE
ANO AUTOR MÉTODO DE COLETA COLETA DE DE ESCOLAS DE ESTUDANTES SEGMENTO
DA ESCOLA PROFESSORES
DE DADOS DADOS ENVOLVIDAS ENVOLVIDOS
PESQUISADA ENVOLVIDOS
Observação
PICCOLLI, participante; Porto Pública
2009 Qualitativo 1 _ 1 EFI
Luciana diário de campo; Alegre (RS) municipal
gravação
Pesquisa
2 familiares,
documental; Santa Maria da Boa
SILVA, Qualitativo 1 funcionária
observação Vista (PE); Juazeiro Pública
2009 Maria do (abordagem 5 3 da escola, 2 EFI e II, EJA
participante; diário (BA); Orizona (GO); municipal
Socorro etnográfica) professores e
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
8 professoras
(4 professoras EF1 – classe
2 escolas
ARAÚJO, Grupo focal; Várzea 88 (multisseriada) – 111 de classes multisseriada
Pública (3º. ano); 4
2010 Nilza Cristina Qualitativo entrevistas; Grande (3º ano). Total de 199 multisseriadas (Escola do
municipal escolas (classe
Gomes de observação (MT) alunos e 4 professoras Campo) e 3º
multisseriada)
com classes ano EFI
cicladas)
Análise
GOULART, documental
Santo Antônio Pública Não
2011 Ligia Qualitativo (análise de 1 19 (6ª série) EFII
da Patrulha (RS) municipal especifica
Beatriz portfólio);
observação; portfólio
Análise documental;
BRAGA, Qualitativo
entrevistas; observação
Maria (fenomenologia Duas salas de aula: 3º e
como participante; Pública
2012 Margarete dialética – Ipueiras (CE) 1 5º anos: 21 alunos/25 5 EFI
relatórios descritivos das estadual
Sampaio de estudo de caso alunos
observações em sala de
Carvalho etnográfico)
aula
Qualitativo Não especificou,
CARLAN, Pública
2012 (estudo de caso Entrevistas Ijuí (RS) 1 observou aulas em 1 EFII
Paulo estadual
etnográfico) turmas de 5ª a 8ª série
Escola A: 5ª série – 51
Observação; alunos/6ª série – 61
caderno de alunos/7ª série – 71
LOPES,
Qualitativo campo; entrevista. alunos (T = 183).
Elaine Porto Pública
2013 (abordagem Escala de valores 2 Escola B: 6ª série – 62 4 EFII
Ferreira Alegre (RS) estadual
etnográfica) nominais para alunos/8ª série – 81
da Silva
as práticas alunos (T = 143) (uma
(C+; C-, E++ etc.) professora para as duas
séries) T = 326
Observação;
diário de campo;
Qualitativo Campo Limpo Pública
entrevistas Brasil –
(pesquisa-ação; Paulista (SP); municipal 1 Brasil
WECKELMANN, com 21 alunos; Não
2012 método da Mosteiro e Cávado (Brasil); EFI (4º ano)
Valéria Faria professores 1 Portugal Portugal – especificado
interpretação (Conselho de Pública
e alunos; 17 alunos
de sentidos) Braga, Portugal) (Portugal)
questionário
para o professor
Não apresenta o
Observação participante;
BRIGUENTI, número, comenta
2014 Qualitativo elaboração de sequência Campinas (SP) Pública 1 2 turmas EM
Éderson Costa apenas que trabalhou
didática; cartografia
com 2 salas de aulas
49
O que evidenciam as pesquisas em educação
50
6 professoras
HORTA, Patrícia Entrevistas e7
2014 Qualitativo São Paulo (SP) Particular 4 _ EFI
Rossi Torralba semiestruturadas coordenadoras
pedagógicas
ANDRADE,
Observação; entrevistas; Recife (PE); Aveiro Turma 1 – 14 alunos;
2015 Renata Maria Qualitativo Pública municipal 2 2 professores EFI
gravação das aulas (Portugal) turma 2 – 20 alunos
Barros Lessa de
Questionário do esporte
de orientação para
tarefa ou Ego traduzido;
entrevista com os 1 turma (30 alunos) 1 professor de Não especifica;
CHAVES, Aline
2015 Quali-quanti professores do Proeti Uberaba (MG) Pública municipal 1 para cada uma das 5 cada uma das 5 Programa de
Dessupoio
(Programa de Tempo modalidades de esporte modalidades tempo integral
Integral); observação
das aulas, utilizando o
instrumento Target
Observação não
Alunos observados na
MELGAÇO, Iria participante; Belo Horizonte
2015 Qualitativo Pública 1 sala de aula, mas o foco 1 EFII (9º ano)
Luiza de Castro questionários; entrevistas (MG)
é a professora
semiestruturadas
Entrevistas; registros
audiovisuais das aulas;
registros em vídeo
das intervenções e
MOREIRA, São Caetano do
2015 Qualitativo discussões em grupo; Particular 1 6 _ EFI (3º ano)
Wagner Alves Sul (SP)
material didático escrito;
produção de texto e
representações pictóricas;
elaboração de mapas
Questionários;
Francisco Morato
2015 SILVA, Gilson Qualitativo oficinas; entrevistas Pública municipal 1 _ 9 EFI
(grande São Paulo)
semiestruturadas
Qualitativo
Observação participante;
SANTOS, Karen (pesquisa-
caderno de campo;
2016 Christina formação. Natal (RN) Pública municipal 1 _ 16 EFI
análise de documentos;
Pinheiro dos abordagem
questionários; entrevistas
etnográfica)
Constituição de um
grupo de trabalho
colaborativo com Pública municipal,
CIRÍACO, Klinger Qualitativo
2016 encontros quinzenais e Naviraí (MS) pública estadual e _ _ 5 EI e EF
Teodoro (pesquisa-ação)
depois mensais (2 anos); privada
entrevistas por meio de
narrativas recorrentes
10 professores;
1 CP do NTM; 1
prof. de língua
Entrevista dialógica; portuguesa
BELLOTTI, Alunos do 2º ao 5º ano
2017 Qualitativo observação; análise Juiz de Fora (MG) Pública municipal 1 em cargo EFI
Andreia Alvim (não especifica)
documental técnico na SME.
Observação
de aula de 2
professores
51
O que evidenciam as pesquisas em educação
52
Observação; análise
2017 HANNEL, Kelly Qualitativo Porto Alegre (RS) Pública federal 13 256 estudantes _ EFII
documental
8 salas de aula
Observação; entrevistas;
– 4 professores
documentos (PPP;
de 4º ano; 4
caderno de campo;
LIMA, Simone de 5º ano. Em
2017 Qualitativo fotografias do que foi Marília (SP) Pública municipal 2 _ EFI (4º e 5º anos)
Marques cada escola
desenvolvido na lousa;
4 professores
cadernos dos alunos e as
foram
avaliações)
observados
8 professores
RESENDE, entrevistados;
2017 Adriana Qualitativo Observação; entrevistas Osasco (SP) Pública municipal 1 27 3 professores EFI
Torquato acompanhado;
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
27 estudantes
Não se aplica
50 professores
(os professores
responderam
Região são de
ao questionário;
ROSA, Claudia Questionário; entrevistas; Metropolitana de Pública municipal e diferentes
2017 Qualitativo _ 9 professores EFII, EM e EJA
do Carmo observação de aulas Goiânia (RMG) e estadual escolas, o que
entrevistados;
Anápolis (GO) os caracteriza é
2 professores
estar em início
observados
de carreira)
33 estudantes
SANTOS, Qualitativo observados na 1ª turma Docentes;
Observação; entrevistas
2017 Graziella Souza (abordagem Porto Alegre (RS) Pública municipal 2 9º ano; 33 estudantes diretores; EFII
semiestruturadas
dos etnográfica) observados na 2ª turma supervisores
9º ano
Observação participante;
SILVA, Ana Elisa questionários; análise 60 alunos. 4º ano = 27
2017 Drummond Qualitativo de documentos e de Salvador (BA) Pública municipal 1 alunos; 5º ano = 33 3 EFI (4º e 5º anos)
Celestino conteúdos digitais; alunos
entrevistas; grupo focal
Análise documental;
STEFANELLI, Brasília (DF) e BH Pública estadual e
2018 Qualitativo entrevistas em 4 26 4 EFII e EM
Ricardo (MG) federal
profundidade
O que evidenciam as pesquisas em educação
Postas essas características das pesquisas selecio- ensino fundamental, foi classificado na área de
nadas, serão apresentados os objetivos a que se dedi- linguagens, uma vez que trata de movimentos,
cam e os referenciais teóricos que utilizam. gestos, expressões.
3. Objetivos de pesquisa dos artigos Dentre os oito artigos que compõem a área de
analisados e referencial teórico linguagens, três objetivam explicitar e analisar as
práticas adotadas pelos professores no processo
Serão sumarizados os objetivos das pesquisas de aquisição e desenvolvimento da leitura e/ou
relatadas nos artigos selecionados para este estudo, escrita. Os artigos de Thomazi e Asinelli (2009),
a fim de situar o foco dessas investigações, o que Oliveira e Bonamino (2015) e de Albuquerque,
auxiliará posteriormente a construir reflexões Morais e Ferreira (2008) focaram sua atenção
sobre a arquitetura de sustentação de práticas sobre as práticas adotadas pelos professores para
que contribuem para a criação de ambiências ensinar, no primeiro e segundo caso, leitura e, no
educacionais favoráveis ao desenvolvimento das terceiro, leitura e escrita. O artigo de Thomazi e
aprendizagens dos alunos. O amplo espectro de Asinelli (2009) buscou conhecer os mecanismos
abordagem dessas pesquisas, quanto a áreas de de elaboração do currículo de leitura, partindo
conhecimento, enfoques, objetivos, objetos e meios da etapa do planejamento, para verificar se os
de investigação – como se verá adiante – permite professores planejam e de que forma o fazem
considerá-las como uma amostra adequada para as – coletiva ou individualmente, se discutem, se
análises a serem desenvolvidas neste trabalho. estudam, se preparam e em que se apoiam, se
elaboram um documento, um programa etc. – e,
Os interesses de pesquisa dos 24 artigos depois, sua aplicação efetiva junto aos alunos. O
selecionados não só são diversos mas, sobretudo, artigo de Albuquerque, Morais e Ferreira (2008)
permitem múltiplas classificações. Assim, optou- analisou os conteúdos e atividades que os
se por apresentar esse dado agrupando os artigos professores costumavam priorizar para ensinar
pelas temáticas linguagens (oito), matemática a notação alfabética, o que incluiu identificar
(quatro) e ciências da natureza (oito), tendo em que práticas de leitura e produção de textos
vista explicitar as similaridades e especificidades escritos os docentes costumavam desenvolver
dessas produções em relação à área. Dos cinco e como vinculavam esses diferentes domínios
artigos que não se inserem em uma área de de conhecimento. Já o trabalho de Oliveira e
conhecimento específica, dois foram agrupados Bonamino (2015), de natureza quantitativa, que
por terem como interesse comum o campo da envolveu 17 mil alunos e 600 professores do
avaliação educacional, abordando também a 2º e do 3º ano do ensino fundamental, com o
avaliação de sistema. Nesse caso, os artigos foram uso de escalas de habilidades dos alunos e de
retidos para este estudo porque relacionam as práticas pedagógicas dos professores, discute a
questões de avaliação a práticas pedagógicas. Os associação entre práticas pedagógicas declaradas
dois artigos restantes tratam, respectivamente, pelos professores e o aprendizado de diferentes
da criatividade e da multisseriação na educação habilidades de leitura pelos alunos.
do campo, como já se explicitou anteriormente.
Como o artigo sobre ludicidade trata da transição A prática pedagógica de professores alfabeti-
da educação infantil para os anos iniciais do zadores foi pesquisada no estudo apresentado
53
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
no artigo de Zibetti e Souza (2010). As autoras mental com base nas práticas e interações entre
analisaram duas cenas recortadas do cotidiano crianças e adultos observadas em instituições
escolar, protagonizadas por uma professora al- públicas – creches, escolas de educação infantil
fabetizadora, para exemplificar como os saberes e escolas de ensino fundamental. Já o artigo de
docentes são alterados e recriados no enfrenta- Rocha (2009) teve como objeto de análise as prá-
mento dos desafios decorrentes do desenrolar ticas pedagógicas mais típicas realizadas nesses
das aulas no cotidiano da sala de aula. Um estu- espaços educacionais, com especial destaque às
do sobre as práticas desenvolvidas com o apoio condições oferecidas pela atividade lúdica.
do material didático do Programa Ler e Escrever,
sobre como a proposta foi vivenciada pelos alu- Os quatro artigos da área de matemática abordam
nos e pela professora de uma sala de 1º ano do questões relativas ao uso de estratégias didáticas
ensino fundamental, é apresentado no artigo de utilizadas por professores de matemática, porém
Santos e Tassoni (2015). As autoras observaram com enfoques diferentes. Starepravo e outros
como os alunos desenvolvem as atividades con- (2017) analisam as contribuições do Jogo do
tidas nas propostas do material e analisaram as Resto para a compreensão do conceito de
impressões da professora e dos alunos sobre esse multiplicação em crianças do 4º ano do ensino
material, pondo em evidência questões da práti- fundamental, e Barbosa e Oliveira (2018) estudam
ca pedagógica no contexto do seu uso. o uso de materiais curriculares por professores
que ensinam matemática. Há, no artigo de Ceolim
Ainda nesse grupo das linguagens, uma pesquisa e Caldeira (2017), um estudo sobre a aplicação da
com professores de educação física (GEMENTE; modelagem matemática em turmas da educação
MATTHIESEN, 2017) teve como objetivo verificar as básica, tendo em vista identificar obstáculos e
possíveis contribuições para práticas pedagógicas dificuldades apontados por professores recém-
favorecidas pela oferta de um curso de formação egressos de cursos de licenciatura em matemática
continuada, fundamentado nas necessidades e di- e que cursaram, na graduação, a disciplina de
ficuldades dos próprios professores em trabalhar modelagem matemática. Estratégias utilizadas
com o atletismo na educação física escolar. por professores de matemática em sala de aula
para desenvolver a criatividade discente e a
Dois artigos, o de Kramer, Nunes e Corsino (2011) motivação na disciplina são analisadas no artigo
e o de Rocha (2009), tratam da transição da edu- de Otaviano, Alencar e Fukuda (2012).
cação infantil para os anos iniciais do ensino fun-
damental. Como bem ressaltam Kramer, Nunes Os artigos da área de ciências da natureza
e Corsino (2011), a inserção das crianças de seis também apresentam diversidade em relação aos
anos no ensino fundamental levanta questões objetivos de investigação. Seis se debruçam sobre
tanto para os profissionais da educação infantil a prática do professor com enfoque no processo
quanto para os do ensino fundamental, especial- de ensino e aprendizagem nas disciplinas de
mente no que diz respeito aos espaços e práti- física, química e biologia. Lima, Lima e Damião
cas pedagógicas e sua adequação à faixa etária (2018), por exemplo, investigam as concepções
das crianças. Tendo em vista as implicações des- de ensino utilizadas por professores para tomadas
sa transição, esse artigo problematiza o trabalho de decisões no planejamento de aulas de física.
com as crianças de seis anos no ensino funda- Os artigos de Ribeiro (2015) e o de Santos,
54
O que evidenciam as pesquisas em educação
Santos e Silva (2014) colocam em evidência ensinar. Alguns têm interesse pelo processo
o papel das atividades experimentais nas que antecede a aula, o planejamento, o que
aulas de física e de química, respectivamente, inclui as concepções de ensino utilizadas por
sendo que o primeiro busca descontextualizá- professores para tomadas de decisões, a escolha
las em oposição à apresentação estática dos das estratégias para o ensino de um determinado
conteúdos, e o segundo coloca em destaque as conteúdo ou para desenvolver a criatividade
contribuições das atividades experimentais para e a motivação. Há aqueles que estudam a ação
o êxito dos aprendizes na realização de seus didática com análise das interações promovidas
trabalhos, especialmente aquelas que envolvem em sala de aula, e, ainda, outros estudos que
interações discursivas. investigam o uso de materiais didáticos e
curriculares em seu emprego na aula.
Como a prática do professor pode contribuir
para que os alunos compreendam os códigos, Observa-se que os dois trabalhos sobre avaliação
conceitos e métodos particulares das ciências educacional foram selecionados neste estudo
biológicas é o objetivo do artigo de Freitas porque relacionam as práticas administrativas
(2013), partindo da linguagem cotidiana. O artigo e/ou pedagógicas com os resultados em
de Souza e Santos (2018) aborda a exigência avaliações de sistema, levantando aspectos
conceitual na prática pedagógica de professores relativos às ações educacionais. O objetivo
de química que ensinam química e física. Já o do artigo de Salgado Junior, Novi e Ferreira
estudo apresentado por Quadros e outros (2011) (2016) consistiu em inter-relacionar práticas
versa sobre as percepções dos professores sobre administrativas e pedagógicas identificadas em
as práticas pedagógicas em sala de aula e na escolas municipais do ensino fundamental que
escola, incluindo as dificuldades enfrentadas e podem contribuir para o desempenho dos alunos
as possíveis maneiras de solucioná-las. na Prova Brasil. Já Cardelli e Elliot (2012) realizam
estudo avaliativo das relações estabelecidas
Outras perspectivas se mostram em dois trabalhos entre alunos, gestores, comunidade do entorno,
que abordam a questão da prática pedagógica familiares, professores e técnicos pedagógicos
do professor da área de Ciências da Natureza. de uma escola pública inserida em uma área de
Santos e Marcondes (2013) investigam um projeto risco, que vem apresentando, ao longo dos anos,
colaborativo envolvendo professores de química, resultados positivos em suas avaliações. Buscou-
projeto que é colocado como instrumento para a -se, assim, avaliar que fatores levam essa escola a
reflexão dos docentes sobre as suas concepções apresentar tais resultados.
e práticas pedagógicas. Baptista (2015) toma a
etnobiologia – ciência que estuda as inúmeras Dos dois artigos restantes, o de Almeida e Alencar
relações entre os seres humanos e a natureza ao seu
(2010) versa sobre criatividade e teve por objetivo
redor – para problematizar como esse campo podeinvestigar a percepção de estudantes do ensino
contribuir com a formação do professor de ciências
médio em relação ao nível de sua criatividade,
para que seja sensível à diversidade cultural. de seus professores e dos colegas, bem como
identificar a extensão em que seus professores
A maioria desses artigos tem como eixo comum implementam práticas que promovem a
a prática pedagógica adotada por docentes para expressão e o desenvolvimento da criatividade.
55
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
O estudo de Parente (2014) tem como foco a a regras ideologicamente configuradas, mas
educação do campo com foco na multisseriação, que variam com o contexto. Santos, Santos e
tendo em vista analisar, dentre outros aspectos, Silva (2014) recorrem à aplicação da teoria do
as concepções e as práticas pedagógicas de discurso pedagógico de Bernstein e ao estudo
professores que atuam em turmas multisseriadas dos processos de escolarização na área de
de escolas públicas. ciências para analisar as interações discursivas de
professores de química durante a definição de
O embasamento teórico utilizado nos artigos atividades experimentais. Já Souza e Santos (2018)
para criar um plano de sustentação argumen- também se apoiam nessa teoria para analisar e
tativo sobre o estudo realizado é muito disper- contrastar o nível de exigência conceitual da
so. Dos 24 artigos selecionados, sete recorrem prática pedagógica de professores que atuam na
a autores diversos sem especificar o uso de um docência nas disciplinas de química e física no
referencial teórico que tenha embasado as aná- ensino médio.
lises, e os demais nomeiam e justificam o uso do
seu referencial. Porém, há dispersão em cinco Barbosa e Oliveira (2018) utilizam as noções de
deles, e os demais (12) têm alguma convergên- voz e mensagem elaboradas por Bernstein (2000)
cia teórica, a saber: cinco utilizam a perspecti- para analisar as diferenças entre a mensagem
va sociológica de Basil Bernstein; três recorrem dos materiais curriculares para professores que
à perspectiva sócio-histórica-cultural e utilizam ensinam matemática e a mensagem (voz) da
Vygotsky, Bakhtin e Leontiev; um apoia-se nos prática pedagógica escolar de quem os utilizou.
estudos baseados no construtivismo piagetia- Já o artigo Thomazi e Asinelli (2009), sobre
no; um toma como referência estudos sobre leitura, que teve a intenção de compreender o
efeito-escola e efeito-professor com forte influ- que se passa durante as ações de planejamento
ência das pesquisas realizadas no contexto es- das atividades de leitura que antecedem sua
tadunidense; e dois utilizam os constructos de aplicação efetiva junto aos alunos, apoia-se na
motivação e criatividade. É sobre esses 12 que construção conceitual sobre código seriado e
será feita análise a seguir. código integrado de Bernstein, que estabelece
as diferenças entre esses dois modelos na
Dentre os cinco artigos que recorreram à transmissão do “saber escolar”.
perspectiva sociológica de Basil Bernstein,
cuja obra está centrada nas relações entre Entre os três artigos que recorrem à perspectiva
linguagem e educação, três são da área de sócio-histórica-cultural e utilizam Vygotsky,
ciências da natureza, um de matemática e um Bakhtin e Leontiev, dois são da área de linguagens,
de linguagens. e um relativo às atividades lúdicas nos anos
iniciais. Um dos textos sobre alfabetização,
Freitas (2013) utiliza-se da ideia de estruturação de Zibetti e Souza (2010), estuda a dimensão
dos discursos, de Bernstein, para investigar criadora dos saberes docentes mobilizados por
o processo de escolarização de conteúdos uma professora alfabetizadora, com base nas
imagéticos em aulas de biologia. Ele considera a contribuições de Lev Vygotsky sobre o conceito
aula como mediada por um discurso pedagógico de atividade criadora.
oficial, analisado como multimodal, sujeito
56
O que evidenciam as pesquisas em educação
O outro, que investigou práticas e interações a estratégias utilizadas por seus professores de
entre crianças e adultos em creches, escolas matemática em sala de aula para desenvolver
de educação infantil e escolas de ensino a criatividade discente e sua motivação na
fundamental do setor público, apoia-se em disciplina. Já o artigo de Almeida e Alencar (2010)
Bakhtin e Vygotsky para falar das crianças como diz respeito à criatividade no ensino médio com
produtoras de cultura, constituídas por meio de foco nas práticas docentes que promovem a
sua classe social, etnia, gênero e com diferenças expressão e o desenvolvimento da criatividade.
físicas, psicológicas e culturais (KRAMER; NUNES; Ambos os artigos utilizam estudos desenvolvidos
CORSINO, 2011). Já o artigo de Rocha (2009), por Eunice Alencar e Denise de Souza Fleith,
que teve como objeto de análise as atividades que destacam os fatores que influenciam o
lúdicas mais utilizadas para crianças do primeiro desenvolvimento e expressão da criatividade no
ano do ensino fundamental, concentra-se nas contexto educacional.
formulações feitas na abordagem histórico-
cultural, apropriando-se, especialmente, das 4. Objetivos de pesquisa das
colaborações de Vygotsky, Leontiev e Elkonin. teses de doutorado analisadas
e referencial teórico
O artigo que se apoia nos estudos baseados
no construtivismo piagetiano é da área de Analisando-se os objetivos das 28 teses selecio-
matemática: Starepravo e outros (2017) utilizam nadas, verifica-se que elas buscam compreender
o conceito de autorregulação compreendida os processos pelos quais é construída a prática
com base em Jean Piaget e Barbel Inhelder para pedagógica e como ela é vivenciada por um ou
analisar as contribuições do Jogo do Resto para a mais docentes, em várias áreas temáticas.
compreensão do conceito de multiplicação.
Oito teses investigam as práticas de um conjun-
O artigo, que toma como referência estudos to de professores. Resende (2017) e Araújo (2010)
sobre efeito-escola e efeito-professor com forte investigam, respectivamente, as práticas pedagó-
influência das pesquisas realizadas no contexto gicas de professores do 5º ano e de classes mul-
estadunidense, é fruto de uma pesquisa tisseriadas, esta última tese indicando como tais
quantitativa. Focado na leitura, o artigo de práticas podem contribuir com a dinâmica de
Oliveira e Bonamino (2015) teve como objetivo trabalho das professoras de classes cicladas. A lín-
compreender processos de aprendizagem e de gua portuguesa e a matemática são representa-
ensino de forma a identificar feitos diferenciados das pelas teses de Andrade (2015) e Lima (2017),
de práticas pedagógicas no aprendizado das ambas pesquisando os anos iniciais do ensino
habilidades de leitura. fundamental: enquanto a primeira busca analisar
práticas docentes em situações de produção de
Há dois artigos que utilizam os constructos de textos, a última o faz no contexto didático da re-
motivação e criatividade. O trabalho de Otaviano, solução de problemas.
Alencar e Fukuda (2012) investiga, dentre
outros aspectos, as diferenças entre estudantes Três teses da geografia (GOULART, 2011; BRIGUENTI,
de escola pública e particular e do gênero 2014; ROSA, 2017) trazem, nessa ordem, a peda-
masculino e feminino em sua percepção quanto gogia de projetos, a mediação cartográfica e os
57
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
58
O que evidenciam as pesquisas em educação
a personalização do ensino e conduzir o aluno Por fim, há cinco teses que trazem objetivos
em sua própria trajetória individual rumo ao variados: Braga (2012) busca analisar as ações
aprendizado significativo, sanando dificuldades e as relações que expressam os elementos
de conteúdo” (HANNEL, 2017, p. 6). constituidores da dimensão humanizadora da
pedagogia de Paulo Freire na prática pedagógica
Saindo da perspectiva da vivência e construção docente-discente; a tese de Chaves (2015), única
da prática pedagógica, três teses a tomam na quali-quanti, trata do clima motivacional no
sua relação com a aprendizagem dos alunos, esporte educacional; Moreira (2015) investiga o
ou seja, buscam vincular a prática do professor desenvolvimento do conhecimento pedagógico
ao desempenho dos estudantes. Duas delas do conteúdo para o ensino de argumentação
são da área de linguagens: a de Lopes (2013), científica (PCKarg) de um professor de química;
focada na língua portuguesa, busca identificar Horta (2014) trabalha com as percepções do que
“práticas pedagógicas do ensino fundamental seja um “bom professor”; e Santos (2017) procura
que tenham possibilitado aos alunos, durante compreender os processos de recontextualização
o percurso escolar, aprenderem o que lhes é curricular no âmbito do planejamento docente e
proposto” (LOPES, 2013, p. 16). A tese de Morais de suas práticas pedagógicas de ensino.
(2014) relaciona a avaliação externa (no caso,
a Provinha Brasil) às práticas pedagógicas de Em relação ao referencial teórico, embora haja
professoras alfabetizadoras “com vistas a garantir alguns autores comuns, não se pode dizer que a
a aprendizagem dos alunos” (MORAIS, 2014, p. 16). referência a um dado conjunto esteja associada a
A terceira tese, de Rodrigues (2014), situada no determinada área do conhecimento. Até porque
campo dos estudos sobre eficácia docente, tem muitos desses autores comuns são relacionados
por objetivo associar os perfis e características ao processo de aprendizagem. Assim é que se
de práticas pedagógicas de professores de tem Lev Vygotsky e John Dewey em teses de
matemática considerados eficazes com o língua portuguesa, geografia e matemática,
desempenho dos alunos. e Basil Bernstein nas duas primeiras; Lee
Shulmann em matemática, ciências, química e
Há dois trabalhos que analisam as práticas geografia; Maurice Tardif em língua portuguesa,
pedagógicas no contexto da formação de matemática e ciências; e Antonio Nóvoa na
professores: Silva (2015) objetiva investigar como primeira e na última; e Paulo Freire também
programas de formação continuada em serviço, em língua portuguesa, matemática, ciências e
baseados em metodologias de oficinas de em uma tese sobre audiovisual. Enfim, cada um
experimentação em Ciências, podem contribuir desses autores aparece em aproximadamente
com as práticas pedagógicas dos professores três das 28 teses. A maioria delas, por sua
dos anos iniciais do ensino fundamental. Ciríaco vez, compila várias referências tanto na área
(2016) busca “retratar o movimento do aprender do ensino quanto na área específica do
a ensinar matemática com base na ação conhecimento em questão. São poucos aqueles
colaborativa de um grupo de professoras em trabalhos que partem basicamente de um só
início de carreira, tendo em vista compreender as autor e teoria e, quando isso acontece, é Paulo
dimensões envolvidas neste processo” (CIRÍACO, Freire a referência única (BRAGA, 2012; ALMEIDA,
2016, p. 61). 2014; STEFANELLI, 2018).
59
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
60
O que evidenciam as pesquisas em educação
intencional de ações que visam à consolidação mas dão destaque à relação professor-aluno. Tal
do ensino e da aprendizagem: perspectiva, trazida por um artigo da área de
matemática (BARBOSA; OLIVEIRA, 2018), assume
As práticas pedagógicas incluem desde planejar e que prática pedagógica é a relação entre quem
sistematizar a dinâmica dos processos de aprendizagem ensina e quem aprende, aquela que toma
até caminhar no meio de processos que ocorrem para lugar na instituição escola. Baseada em Paulo
além dela, de forma a garantir o ensino de conteúdos e Freire, a tese de Braga (2012, p. 43), da área das
de atividades que são considerados fundamentais para linguagens, destaca a relação dialógica da prática
aquele estágio de formação do aluno, e, através desse pedagógica como forma de superar a prática
processo, criar nos alunos mecanismos de mobilização da “transferência de quem sabe para quem não
de seus saberes anteriores construídos em outros espaços
sabe”, já que ambos – docente e estudante – são
educativos (FRANCO, 2015, apud LIMA, 2017, p. 19).
sujeitos do ato de conhecer. Assim concebida,
61
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
e inserida no contexto dessa prática social. [...] A construção de posturas, atitudes, valores, significado
prática pedagógica é uma dimensão da prática social, social dos conhecimentos, responsabilidade social
portanto imbuída de contradições e de características e para consigo mesmo, entre outras condições.
socioculturais. [...] Expressa atividades rotineiras que são É assim que duas teses (uma de geografia e outra
desenvolvidas no cenário escolar, podendo vir a serem
que trata das escolas do campo) destacam, além do
atividades planejadas com o intuito de possibilitar
aspecto sociocultural e relacional das práticas, seu
a transformação colaborando para a redução das
desigualdades sociais, ou, pelo contrário, reforçar esta
caráter coletivo, institucional e intencional, tal como
por meio do que Freire (1987) denominou a educação se vê nos excertos abaixo:
bancária (ALMEIDA, 2014, p. 26, p. 111-112, p. 163).
62
O que evidenciam as pesquisas em educação
O currículo praticado não será mais exatamente o professores têm sobre as atividades que eles
mesmo do nível do planejamento dos professores, nem propõem aos alunos” (FAVRE; PERREDOUD, 1985,
o mesmo do nível curricular institucional, tampouco o apud THOMAZI; ASINELLI, 2009, p. 184). Implícita
mesmo do currículo previsto pelas instâncias oficiais. e de forma bastante simples está aqui a ideia de
Por esta razão, as práticas pedagógicas de ensino
que a prática pedagógica diz respeito justamente
também são entendidas como um processo de
às “atividades que os professores propõem aos
recontextualização curricular, uma vez que o currículo
é novamente remodelado e ajustado pelos professores
alunos”. Ao mesmo tempo, os autores invocados
nesta etapa (SANTOS, 2017, p. 206). salientam que, nesse discurso, “o ponto de vista
é parcial porque trata-se de uma reconstrução
da realidade”. Todavia, ele é válido e se justifica
O tema das mudanças na prática pedagógica – poder-se-ia acrescentar: como uma evidência
está presente na discussão do conceito de – porque “compreender as práticas passa por
inovação, trazido por apenas um trabalho dentre uma parte não negligente de apreensão das
o conjunto de teses e artigos. A tese de Melgaço significações dos atores” (FAVRE; PERREDOUD,
(2015), na área de ciências naturais, adota a 1985, apud THOMAZI; ASINELLI, 2009, p. 184).
concepção de Fernando Hernandez (2000) para
inovações pedagógicas: são “estratégias que Em direção análoga, há, ainda, a perspectiva
expressam dinâmicas explícitas com intenção de daqueles trabalhos que incorporam em suas
alterar ideias, concepções, conteúdos e práticas análises o processo pelo qual os conhecimentos
em alguma direção renovadora em relação e saberes que compõem as práticas pedagógicas
à existente” (HERNÁNDEZ, 2000, p. 58, apud foram sendo constituídos ao logo da vida e da
MELGAÇO, 2015, p. 27). Trata-se de novos modos formação do professor. Um dos artigos sobre
de ensinar que são introduzidos e consolidados química afirma que “práticas educacionais
na prática educativa do professor por meio da seriam os fazeres pedagógicos de um professor,
articulação entre as orientações curriculares e o impregnadas por suas crenças e saberes tácitos”
nível micro da escola e da sala de aula. (SANTOS JÚNIOR; MARCONDES, 2013, p. 697).
É preciso destacar o conceito adotado no outro
Os aspectos transformadores da prática artigo de química, referido a Lelis (2001), porque
pedagógica – mais propriamente as dificuldades a concepção utilizada expande a concepção de
de mudanças – aparecem no artigo de Thomazi prática pedagógica para variados ambientes, além
e Asinelli: o texto traz uma citação interessante dos espaços estritamente escolares; ressalta-se
com base na qual se pode refletir não apenas que “prática pedagógica envolve uma expressão
sobre o conceito de prática pedagógica, como de múltiplos saberes incorporados em âmbitos,
também sobre as evidências de práticas efetivas, tempos e espaços de socialização diversos” (LELIS,
item que será discutido a seguir. Inspirando-se apud QUADROS et al., 2011, p. 162). Infere-se
em Bernard Favre e Philippe Perrenoud para falar que práticas pedagógicas podem ser realizadas
de currículo, as autoras mencionam que ambos também, por exemplo, em ambientes de lazer
refletem sobre as “dificuldades de introduzir ou do trabalho, em socializações comunitárias
novas práticas pedagógicas”, com base em e outras situações e locais. Isso denota um
pesquisas realizadas por meio dos discursos dos diferencial conceitual em relação aos demais
professores, ou seja, “através do discurso que os conceitos propostos.
63
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Nessa linha dos saberes e espaços construídos vistas ou outros instrumentos. Há estudos que
em diferentes tempos e lugares, o artigo de Tho- inferem aspectos ligados às práticas docentes
mazi e Azinelli cita Eric Plaisance para “definir as pelas respostas dos professores a questionários,
práticas não como práticas ditadas por esta ou sem observação de campo, o que ainda assim é
aquela instituição, mas como práticas sobre as válido como evidência, tal como proposto por
quais se exerce ao mesmo tempo as imposições Bernard Favre e Philippe Perrenoud (1985, apud
das instituições e as iniciativas dos indivíduos ou THOMAZI; ASINELLI, 2009).
dos grupos” (PLAISANCE, 1988, apud THOMAZI;
ASINELLI, 2009, p. 190). Essas iniciativas são mui-
Evidência aqui é tomada em seu sentido am-
tas vezes feitas “sobre esquemas de ação, de per-
plo: é comprovação empírica de uma dada
cepção e de decisão parcialmente inconscientes”
hipótese, mas não apenas e necessariamente
(PERRENOUD, 1994, apud THOMAZI; ASINELLI,
aquela proveniente de estudos quantitativos
2009, p. 193) ou, em outras ocasiões, por meio de
ou experimentais e quase-experimentais.
estratégias reflexivas, importantes para a prática
pedagógica e para eventuais mudanças, nem
sempre fáceis de serem implementadas. Esse É interessante notar que um dos quatro artigos
aspecto também é destacado pela tese de Silva, de natureza quantitativa – que buscam mostrar
a qual, apoiando-se em Kenneth Zeichner, põe efeitos diferenciados de práticas docentes sobre a
foco no coletivo e nos ambientes colaborativos proficiência dos alunos em determinada disciplina
de formação e atuação, as chamadas comunida- – releva, ao mesmo tempo, os limites de pesquisas
des de aprendizagem, para que os professores desse tipo para se apreender um conjunto de
reflitam e se apoiem mutuamente (SILVA, 2015). características não observáveis ou de traço latente,
devido à própria limitação dos instrumentos de
coleta de dados, como os questionários. E isso
E como as teses e artigos analisados se apre-
não porque os questionários captem apenas
sentam em relação às evidências? Aqui, tem-se
informações sobre a percepção dos atores sobre
uma situação contrária àquela exposta ante-
suas práticas, mas porque essas práticas são
riormente sobre a definição de prática peda-
complexas. Assim, “na medida em que raramente
gógica: a maioria dos trabalhos (17 dentre os
é possível se chegar a uma variável complexa
24 artigos e 22 das 28 teses) traz algum tipo de
por meio apenas de uma pergunta efetuada aos
evidência que mostra a relevância ou eficácia
respondentes” (OLIVEIRA; BONAMINO, 2015, p. 420),
de uma dada ação desenvolvida em sala de
tais estudos buscam compor um indicador com
aula. A maioria das evidências trazidas por es-
base em vários itens de um questionário ou de
ses trabalhos é proveniente de estudos quali-
uma escala, de modo a tornar possível captar e
tativos, que buscam características de práticas
sintetizar os conceitos, os construtos ou os traços
desenvolvidas concretamente no ambiente
latentes. E chega-se à conclusão de que “há efeitos
escolar que favorecem a formação docente
diferenciados das práticas docentes, conforme
e/ou o desenvolvimento dos estudantes.
o ano escolar e a habilidade avaliada” (OLIVEIRA;
BONAMINO, 2015, p. 432). Ou seja, as relações de
Utilizam a observação como meio de coleta de ensino-aprendizagem são complexas e dependem
dados, agregada ou não a questionários, entre- também de contextos e situações específicos
64
O que evidenciam as pesquisas em educação
cuja dinâmica é local, evidenciando a importância criação de relações pedagógicas que favoreçam
do papel do professor, de suas práticas e da aprendizagens relevantes na educação básica.
interação professor-aluno no processo de ensino e
aprendizagem que se dá no interior da sala de aula. Do processo de análise das pesquisas científicas
produzidas e publicadas no Brasil, no período
2008-2018, foi possível identificar fatores, condi-
Todos os aspectos destacados no que se refere
ções e características que se associam e tornam
à definição de prática pedagógica e à constru-
possível a execução de práticas pedagógicas rele-
ção de evidências são importantes, pois, como
vantes e que podem lograr consideração no âmbi-
se disse na Introdução desta pesquisa, poucos
to dos processos de formação de professores.
pesquisadores brasileiros se colocaram o desa-
fio de estabelecer uma definição tipo-ideal da
referida noção. Conceber a prática pedagógica Com base na análise dos artigos e teses, per-
na educação básica como sendo aquilo que é cebe-se que há duas modalidades de práticas
desenvolvido no interior da sala de aula, onde pedagógicas: (i) aquelas relativas à atuação do
se dá a interação professor-aluno e onde fica o professor com os seus alunos; e (ii) aquelas que
locus do aprendizado, não significa desprezar dizem respeito ao trabalho com os seus pares
os múltiplos fatores que nela interferem e que e ao seu próprio desenvolvimento profissional.
poderiam participar de um conceito mais am-
pliado. Entretanto, o que os autores das teses e
Com isso, optou-se por apresentar o texto que se
artigos aqui selecionados enfatizam é a impor-
segue considerando essas duas modalidades.
tância de se olhar justamente para o miúdo
desse cotidiano concreto do ambiente escolar,
6.1. Atuação do professor com os seus alunos
o qual por muito tempo foi renegado, e asso-
ciado a uma perspectiva meramente técnica,
É consenso nas pesquisas analisadas a ideia
não sendo, portanto, valorizado na formação
de que o professor deve buscar, de modo
docente no país.
intencional, apoiar o aprendizado dos alunos
por meio de uma série de ações. No processo
Na sequência, serão analisadas as características de análise do conjunto dos artigos e teses, o que
de práticas pedagógicas destacadas pelo conjun- sobressaiu foram as práticas relativas à gestão
to dos artigos e teses como propiciadoras para a dos aprendizados e à gestão da classe.
criação de relações pedagógicas que favoreçam
aprendizagens relevantes na educação básica.
No processo de análise do conjunto dos arti-
gos e teses, no que se refere à atuação do pro-
6. Sistematização das práticas
fessor com os seus alunos, o que sobressaiu
que ressaltam dos artigos
foram as práticas relativas à gestão dos apren-
e das teses de doutorado
dizados e à gestão da classe.
Agora, serão analisadas as características de
práticas pedagógicas destacadas pelo conjunto
dos artigos e teses como propiciadoras para a
65
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
A gestão dos aprendizados diz respeito, segundo têm início com a elaboração do planejamento que,
Gauthier, Bissonnette e Richard (2014), ao ensino durante o processo, se constitui em documento vivo
dos conteúdos, o que alude o professor a certifi- que orienta, adequa e se modifica, quando necessá-
car-se de que os diversos elementos da matéria rio, visando a promover os aprendizados dos alunos.
sejam aprendidos e dominados pelos alunos. Já a Permite, inclusive, a avaliação das práticas docentes
gestão da classe envolve a organização da convi- e o replanejamento da intervenção em situações
vência em sala de aula, uma vez que não é possível futuras. O planejamento tem, ainda, o objetivo de
colocar os alunos em situação de aprendizagem articular as duas funções que estão no cerne do tra-
de conteúdos se não houver um ambiente favo- balho educativo e que correspondem às dimensões
rável. Qualquer professor em situação de trabalho de análise: gestão dos aprendizados e gestão da classe.
com os alunos na sala de aula desempenha essas Essas, por sua vez, foram subdivididas em categorias,
duas grandes ações, que são complementares e descritas na Figura 1.
necessárias para o trabalho na sala de aula.
A gestão dos aprendizados diz respeito ao
A descrição das práticas provenientes das ensino dos conteúdos, o que significa que o
produções foi organizada considerando essas professor deve se certificar de que os diver-
duas dimensões, que têm como elemento sos elementos da matéria sejam aprendidos
comum o planejamento. Observou-se que, no e dominados pelos alunos.
conjunto das pesquisas, não há uma distinção
clara dos momentos que dizem respeito
especificamente ao planejamento ou ao A gestão da classe envolve a organização da
ensino propriamente dito. convivência em sala de aula, uma vez que
não é possível colocar os alunos em situação
de aprendizagem de conteúdos se não hou-
O que há é o reconhecimento de que a gestão dos
ver um ambiente favorável.
aprendizados e da classe demandam etapas que
66
O que evidenciam as pesquisas em educação
No estudo desenvolvido por Melgaço (2015), o processo, é fundamental que os alunos estejam
relato de uma professora de ciências coloca em receptivos e que haja um clima e um ambiente
evidência elementos da gestão dos aprendizados constituído por relações interativas em que predo-
e da gestão da classe, funções do ensino que mine a aceitação, a confiança e o respeito mútuo.
estão inter-relacionadas:
Logo,
eu consegui um jeito diferente de organizar minhas
aulas, usando algumas estratégias. Eu coloco os meninos
a gestão da aprendizagem e a gestão da clas-
em grupos, para investigar situações do dia a dia
se são dimensões complementares, interliga-
relacionadas ao conteúdo. Para explicar eles conversam,
das e indispensáveis ao trabalho docente. No
escutam, reelaboram e socializam suas ideias sobre
as questões que eu trouxe e assim faço o diagnóstico entanto, apesar de guardarem uma relação
do que os meninos pensam. Depois vou ensinando a intrínseca e de interdependência, cada dimen-
selecionar ideias comuns e com elas vou dialogando, são apresenta características próprias e, desse
introduzindo, avaliando e sistematizando as ideias modo, serão apresentadas separadamente.
científicas relacionadas ao conteúdo. Uso esquemas,
quadros, resumos, exercícios, vários livros e vou colocando
a meninada para repensar e reorganizar as ideias que Antes, porém, de apresentar os aspectos que se
eles tinham, incorporando as científicas. Eles dialogam, destacaram nas pesquisas analisadas em relação
participam sem indisciplina e compreendem muito mais à gestão dos aprendizados e à gestão da classe,
conteúdo, porque o reconhecem na vida deles. Essa é necessário compartilhar a compreensão de al-
organização eu não inventei, eu adaptei juntando tudo guns trabalhos analisados sobre o planejamento,
e selecionando o que dava certo. Assim, eu consegui momento em que se delineia as intervenções pe-
um jeito novo de organizar as aulas que funciona e os dagógicas tendo em vista obter êxito no proces-
meninos gostam (MELGAÇO, 2015, p. 123-124).
so de ensino-aprendizagem.
Observa-se que a professora explicita tanto as 6.1.1. O que dizem as pesquisas sobre
ações que adota para promover a aprendizagem a prática do planejamento
dos alunos em relação a determinados conheci-
mentos científicos, considerando o processo de
Planejar dá trabalho, mas, depois, tudo fica mais
apropriação desses conceitos pelos estudantes,
fácil, a gente sabe por onde tem que ir. Todos os
como, também, organiza atividades articuladas conteúdos estão antecipadamente planejados e o
e situações que favorecem diferentes formas de mais significativo é que os alunos têm conhecimento
os alunos se relacionarem e interagirem. de cada etapa do processo educativo, como: o quê?
Como? Quando? E por quê? de cada unidade didática
Como bem ressaltam Gauthier, Bissonnette e Ri- a ser trabalhada (CARLAN, 2012, p. 309).
chard (2014), as possibilidades de o professor ter
sucesso na gestão da classe dependem, em boa Essa frase, extraída da tese desenvolvida por
medida, de como ele apresenta os conhecimen- Carlan (2012), que analisa a prática pedagógica
tos e das ações e estratégias que mobiliza para de um professor de educação física, evidencia o
acompanhar e favorecer a apropriação dos conte- valor da prática do planejamento para favorecer
údos pelos alunos. E, para se beneficiarem desse os aprendizados dos alunos.
67
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
68
O que evidenciam as pesquisas em educação
mas que, ao mesmo tempo, a exercitassem exigia e conteúdo precisam ser explicitados. [...], mas o
revisar leituras e práticas, refazer as trajetórias de jogo não pode ser, quando intencional, apenas um
aprendizagem dos alunos, dialogar com colegas procedimento inicial da aula sem relação com o
especialistas em leitura e escrita, disponibilidade para processo de ensino daquele conteúdo abordado
criar novas práticas e estar aberta para a possibilidade e por isso precisa ser bem planejado por parte do
de frustração. O tempo usado para o planejamento era docente (CIRÍACO, 2016, p. 233).
inversamente proporcional aos resultados (GOULART,
2011, p. 142).
Um outro aspecto a ser considerado é o fato de as
Esse relato mostra a complexa tarefa do ensino, que escolhas dos professores terem como referência
tem início no planejamento e exige do professor as características e necessidades dos alunos, o
um processo que envolve, segundo Shulman que inclui o contexto em que estão inseridos. Isso
(1987), compreensão e raciocínio, transformação indica que é importante o professor conhecer
e reflexão, o que sugere uma vigorosa interação os alunos individualmente e como grupo, a
de ideias e de premissas a serem analisadas por organização da escola, as particularidades sociais
meio de diferentes perspectivas. Esse processo e culturais da comunidade onde está a escola
de preparação, segundo o autor, envolve uma e as de seus alunos. Esse entendimento requer,
interpretação crítica e especializada de textos por sua vez, conhecimento da compreensão que
e materiais, tendo em vista criar as condições os estudantes têm dos conteúdos propostos,
necessárias para que os alunos aprendam. Faz parte abrangendo suas experiências e concepções,
desse processo a construção de pontes entre as seus modos de raciocínio, suas possibilidades
muitas compreensões do professor e aquelas que se e dificuldades, bem como outras variáveis que
deseja que os alunos elaborem. Para isso, o professor podem influenciar o conhecimento dos alunos
precisará criar modos alternativos de apresentar os sobre os conteúdos apresentados pelo docente
conteúdos aos estudantes, empregando analogias, nas situações de ensino. Logo, é essencial
metáforas, exemplos, explicações, dramatizações, que o professor estruture as experiências de
músicas, filmes, demonstrações, diferentes tipos de aprendizagem, o que pressupõe conceber formas
mídia, dentre outros. de representar e explicar o conteúdo.
Nos estudos do ensino de matemática, por Um exemplo que ilustra essa ideia foi localizado
exemplo, destaca-se o uso de jogos e a importância na tese de Melgaço (2015), que teve por objetivo
de serem utilizados de forma intencional e descrever e analisar de que maneira uma
planejada. Ciríaco (2016) explica que o professor é professora de ciências, em sua prática pedagógica,
um agente importante na mediação entre o jogo, interage com abordagens e estratégias de ensino
o aluno e o conhecimento matemático. Destaca a consideradas inovadoras. A professora relata:
importância de planejar
69
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
outro jeito de trabalhar, [...] percebi que o conteúdo necessidades de seus alunos à prática docente,
passou a interessar porque fazia parte da vida deles. influenciam significativamente o que os alunos
Eles falam com segurança do que conhecem. Aprendi
aprendem e a qualidade de suas oportunidades
a juntar tudo e virou um roteiro de trabalho, um
de aprendizagem” (BANKS et al., 2019, p. 207). Isso
plano geral de aula. Eu acho que é isso aí! À medida
que fui experimentando, usando as estratégias e
significa que um trabalho importante do professor
atividades, articulando tudo, errando e acertando, “é aprender sobre seus alunos: quem eles são, o
fui aprendendo como mudar. Minhas aulas ficaram que sabem e quais significados e pontos fortes
dialogadas (MELGAÇO, 2015, p. 124). trazem para a escola” (BANKS et al., 2019, p. 210).
Com esse conhecimento, é menos provável que
Melgaço (2015) explica que as estratégias se- o professor faça suposições rápidas sobre os
lecionadas por essa professora passam por alunos e o planejamento ganha em qualidade,
um criterioso processo de análise, estudo, se- uma vez que poderá adaptar o currículo e o
leção, aplicação, adequação, articulação, inte- ensino para que os alunos participem de um
gração e avaliação em sala de aula. Segundo trabalho significativo.
a pesquisadora, a professora em tela recorre
apenas àquelas estratégias de ensino que ela Por outro lado, é importante considerar que
avalia como funcionais, aplicáveis e que, so- o desenvolvimento de uma prática mais
bretudo, favorecem e contribuem para a me- equitativa não é de responsabilidade exclusiva
lhoria da aprendizagem dos estudantes. do professor, mas de toda a comunidade escolar.
A pesquisa de Thomazi e Asinelli (2009) coloca
Conhecer o aluno e seu contexto na elaboração em evidência a relação entre o individual e o
do planejamento é um aspecto abordado coletivo no processo de planejamento. Nesse
nas pesquisas; no entanto, a explicitação da estudo, as autoras analisaram como um grupo
elaboração de atividades variadas e diferenciadas de professoras do ensino fundamental, das redes
para um mesmo grupo de alunos tendo em vista pública e privada, planeja as atividades de leitura
um ensino equitativo não é um ponto de atenção que desenvolvem em sala de aula. Está implícito
das pesquisas analisadas. na discussão dos resultados que a ideia de que
o planejamento realizado de forma coletiva e
Nas escolas de hoje, os professores precisam com apoio da equipe da escola oferece melhores
estar preparados para ensinar alunos com condições para atuação do professor. Thomazi
características, experiências e necessidades e Asinelli (2009) explicam que faz parte de um
muito diversas. Banks e outros (2019, p. 197) planejamento coletivo:
baseiam-se em pesquisas para sugerir que,
quando os professores “utilizam o conhecimento • planejar conjuntamente com colegas, contando
sobre as origens sociais, culturais e linguísticas com apoio da supervisão/direção da escola;
de seus alunos ao planejarem e colocarem o • ter reuniões de planejamento periodicamente,
ensino em prática, o desempenho acadêmico durante o semestre, com o conjunto de profes-
dos alunos aumenta”. Isso significa dizer que não sores e a supervisão ou com colegas do mesmo
só as atitudes e as expectativas dos docentes, nível de ensino;
mas, sobretudo, o seu “conhecimento de como • elaborar o plano individual para o cotidiano,
incorporar as culturas, as experiências e as posteriormente ao planejamento coletivo; e
70
O que evidenciam as pesquisas em educação
71
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
A construção de sentidos e motivação é abordada No artigo de Zibetti e Souza (2010), que teve por
por 29 dos 52 trabalhados analisados. É consenso en-
objetivo evidenciar a dimensão criadora dos sa-
tre elas de que é preciso desafiar, estimular, provocar
beres docentes mobilizados por uma professora
e sensibilizar os alunos na construção da relação que
alfabetizadora, há um estudo detalhado sobre a
ele precisará estabelecer com o objeto de aprendiza-
prática dessa profissional, destacando uma série
gem; no entanto, promover esse engajamento não é de ações consideradas cruciais e relevantes para o
uma prática trivial, e é inevitável questionar: que prá-
desenvolvimento de um ensino capaz de levar a
ticas podem favorecer esse movimento? uma aprendizagem efetiva. Chama a atenção nos
resultados do estudo as práticas a que a professora
Construir com os alunos sentidos para o trabalho recorre para a construção de sentidos e de motiva-
de estudar é um princípio que direciona as ção pelos alunos. Segundo as autoras, a professora:
72
O que evidenciam as pesquisas em educação
• apresenta o roteiro de atividades previstas para o sua atenção constante aos interesses dos alunos permite
dia de aula (pauta). Às vezes, é apenas lido, mas na que ela modifique a atividade no momento em que
maior parte do tempo é escrito na lousa e ali per- esta não atendeu as expectativas ou não desencadeou
manece durante toda a aula. Várias vezes, a pau- o desempenho esperado nas crianças. Com esse tipo
de procedimentos, dificilmente a professora enfrenta
ta serve de orientadora da sequência das tarefas:
problemas com as crianças em relação à realização das
quando a professora alerta os alunos para que se
atividades (ZIBETTI; SOUZA, 2010, p. 471).
apressem, pois há muito por fazer; ou quando um
aluno interessado em alguma atividade específica
prevista na pauta apressa-se em cumprir as ante- As autoras destacam que a análise da prática
riores para poder acompanhar os colegas na refe- dessa professora articula-se com o resultado de
rida atividade (assistir a um vídeo, por exemplo); outras pesquisas na área do ensino analisadas por
• dá atenção especial à forma como as crianças Gauthier e outros (1998), as quais indicam que
se relacionam com a tarefa, sendo esse um os professores mais bem-sucedidos no que diz
elemento decisivo na maneira como conduz respeito à gestão da classe e dos aprendizados
a aula. Sua atuação está centrada nas crianças: são aqueles que dão instruções claras, explícitas,
nas suas necessidades de aprendizagem, no redundantes (repetidas mais de uma vez) e
interesse e desempenho desses durante a tarefa, compreendidas por todos os alunos.
nos resultados obtidos com o trabalho. Todo
o encaminhamento do trabalho pedagógico Dedicado a investigar como a proposta do ma-
obedece a uma análise constante, por parte terial didático do Programa Ler e Escrever (PLE)
dela, dos indícios dados pelos alunos de como foi vivenciada pelos alunos e pela professora de
estão se relacionando com as atividades; e uma sala de 1º ano do ensino fundamental, em
• certifica-se de que todos os alunos e alunas te- uma escola estadual de Campinas, no estado de
nham compreendido o que devem fazer. Para São Paulo, o artigo de Santos e Tassoni (2015)
isso, ao encaminhar as atividades, apresenta ressalta a importância de um estilo de prática
apenas uma de cada vez, explica-a com clare- que considere a vivência e o interesse dos alu-
za para a sala toda e, se necessário, explica no- nos, bem como o uso de textos significativos. As
vamente para as duplas nas carteiras ou para autoras ressaltam a importância de atividades
algum aluno individualmente. Em muitas situ- diversificadas e contextualizadas no 1º ano do
ações, dá exemplos para que possam entender ensino fundamental, com textos que possibili-
melhor o que está sendo solicitado. tem ao aluno articular o apreendido na sala de
aula com sua vivência na sociedade, de modo
Zibetti e Souza (2010) relatam que o cuidado a explorar em seu conteúdo elementos que
da professora em garantir não só a participação possam ser discutidos e compreendidos. Assim,
dos alunos, mas, sobretudo, o envolvimento e promove-se a aprendizagem da criança: as pro-
o prazer durante a realização das atividades foi postas devem ser “engajadas tanto ao contexto
uma constante. dos alunos quanto a uma concepção de leitu-
ra e escrita reais que se transporte para a com-
Sua atitude em relação às crianças sempre foi de preensão sobre o sentido e a função social da
convencimento com base em argumentos ou estímulos, linguagem escrita, contribuindo para a reflexão
nunca por meio de imposição ou punição. Além disso, sobre a língua” (SANTOS; TASSONI, 2015, p. 89).
73
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Piccoli (2009), em sua tese, descreve e analisa a com a linguagem, a leitura e a escrita, e que lhes
prática pedagógica de uma professora alfabe- seja produzido o desejo de aprender a ler e a
tizadora da rede municipal de ensino de Porto escrever”. As autoras acrescentam, ainda, que é de
Alegre e destaca o uso contextualizado que a fundamental importância o professor estimular as
professora faz da escrita, para um fim específi- crianças a aprenderem a gostar de ouvir a leitura.
co e comunicativo. A pesquisadora observou “a
prevalência de uma proposta pedagógica que A tese de Lopes (2013) também ilustra posturas
contemple a língua, através de seus usos sociais, e práticas que ajudam os alunos a encontrarem
e o sistema de escrita, através de atividades que sentido no que fazem. A autora analisou práticas
estimulem a aprendizagem das correspondên- pedagógicas de cinco professores dos anos
cias entre fonemas e grafemas” (PICCOLI, 2009, finais do ensino fundamental, da disciplina de
p. 197). O que indica, segundo Piccoli (2009), a língua portuguesa, em duas escolas estaduais
simultaneidade dos processos de alfabetização da periferia urbana da cidade de Porto Alegre,
e de letramento. que haviam atingido as metas de 2009 propostas
pelo Índice de Desenvolvimento da Educação
A autora explica que, na prática pedagógica Básica (Ideb). Segundo a autora, predominou,
da professora, predomina a precedência do nas práticas de cinco professoras, o uso de
letramento à alfabetização, uma vez que “as diferentes estratégias para desenvolver os temas
palavras que compõem os diferentes universos previstos, acolhendo, em alguns momentos, os
vocabulares são selecionadas a partir de temáticas comentários e sugestões vindos dos alunos. Os
decorrentes de histórias lidas, filmes assistidos, professores sempre informavam a sequência das
músicas cantaroladas”, havendo um cuidado por atividades aos alunos para que tivessem clareza
parte dela na seleção das leituras que privilegiam da proposta de trabalho, o que possibilitava
a captação dos interesses e das motivações dos que acompanhassem, de forma participativa,
alunos. Relata que, durante as observações das o desenvolvimento das aulas. Observou-
aulas da docente, chama a atenção a “postura das -se que os docentes buscavam, também,
crianças durante a longa exploração proposta contextualizar os conteúdos relacionando-
pela professora, que permaneceram motivadas, os a situações conhecidas e do cotidiano dos
escutando com atenção as interações ocorridas alunos. A pesquisadora relata a prática de uma
na turma e manifestando-se quando acharam das professoras, destacando que sempre que
oportuno fazê-lo” (PICCOLI, 2009, p. 122). os estudantes eram questionados por ela,
participavam respondendo e trazendo fatos do
Outro exemplo foi extraído do artigo de Kramer, seu cotidiano. O conteúdo era introduzido por
Nunes e Corsino (2011), que pesquisaram meio de uma exposição oral, na qual a professora
práticas desenvolvidas na educação infantil para contextualizava-o, utilizando exemplos de
problematizar o trabalho com as crianças de seis situações ocorridas, o que despertava o interesse
anos no ensino fundamental, tendo em vista dos alunos. A fala de um dos professores ilustra o
analisar e discutir questões que atravessam essas cuidado em considerar, na proposta da disciplina,
etapas. Ao problematizarem as práticas de leitura os interesses dos alunos: “Muitas vezes, partilho
e escrita observadas, ressaltaram que é preciso com os alunos os seus interesses. Eles gostam
que “as crianças estabeleçam relações positivas de funk, me trazem letras de músicas onde eu
74
O que evidenciam as pesquisas em educação
aproveito para resgatar a questão da escrita da os estudantes retomam os objetivos das aulas, tanto
língua portuguesa, apontando e mostrando o exemplificando o que fizeram (objetivos), quanto
conteúdo a partir do material que eles trazem” justificando (metodologia) o porquê fizeram, bem
como explicitando conceitos trabalhados nas aulas[...]
(LOPES, 2013, p. 132). Essa é uma prática que
Esse processo produz introspecção da concepção nos
pode ajudar os alunos, segundo Zabala (1998),
alunos de que a aula tem um planejamento, tem uma
a tomar consciência dos próprios interesses e lógica, tem uma sequência, tem uma organização,
buscar o interesse geral, bem como valer-se da tem um sentido, portanto, que todo o fazer dos
participação e do envolvimento no planejamento alunos está articulado e foi pensado para uma melhor
das atividades que se desenvolvem em sala, como aprendizagem (CARLAN, 2012, p. 271).
meio de assegurar que o que fazem responda a
uma necessidade.
A tese de Chaves vai na mesma linha, ao postular
Outra tese que apresenta práticas que favorecem que o esporte trabalhado no contexto escolar
a construção de sentidos e a motivação é a de um deve ter por objetivo a formação e socialização
professor de educação física que atua nos anos fi- do educando, pelas quais são priorizados valores
nais do ensino fundamental. Trata-se de um estu- como a cooperação, a autonomia, a criatividade
do de caso que compõe a tese de Carlan (2012). O e a participação de todos, em contraponto à
autor analisa a atuação do professor, denominado competição exacerbada e à seleção de poucos
no estudo de Gilmar, destacando, dentre outros habilidosos (CHAVES, 2015).
aspectos, o seu cuidado em realizar um planeja-
mento detalhado e compartilhado com alunos Na tese de Lima (2017, p. 54) há uma interessante
que reconhecem o valor do trabalho desenvolvido análise sobre a atividade do aluno associada ao
pelo docente. Carlan (2012, p. 271) explica que o interesse e motivação com base nos estudos de
professor utiliza a “Apostila do estudante”, material Leontiev (1978, 2006) e de Davidov (1999). A autora
didático-metodológico por ele elaborado, que in- buscou investigar e analisar como se configuram
corpora os objetivos e conteúdos para cada uni- as práticas pedagógicas de professores no ensino
dade didática, definidos antecipadamente e apre- da matemática nos anos escolares iniciais no
sentados e discutidos com os estudantes. Sema- contexto didático da resolução de problemas.
nalmente os alunos têm a tarefa/responsabilidade Participaram da pesquisa oito professores que
de fazer um breve registro da aula, o que, segundo atuam no ensino de matemática no 4º e 5º ano
o professor Gilmar, além de favorecer o hábito da do ensino fundamental, em duas escolas da
escrita, potencializa no educando a capacidade de rede municipal de Marília (SP). A autora explica
síntese, em que relaciona a experiência corporal que, quando o aluno é posto em atividade, ele
com a escrita. Carlan (2012) relata que é perceptí- aprende e se desenvolve; no entanto, ressalta
vel nas observações e no depoimento dos alunos que essa atividade deve sempre estar associada
a sua evolução em relação à participação nos trei- com um motivo, um objetivo que normalmente
nos e nos jogos do campeonato. Percebe-se, tam- está relacionado com a necessidade do aluno. A
bém, o quanto os alunos “demonstram que apren- autora defende o ensino centrado na resolução
deram conteúdos novos, diferentes, portanto, de problemas, pois compreende que ele “põe o
motivadores, e que produziram muitos sentidos e aluno em atividade, porque o problema contém
significados diferentes”. Também observou que elementos motivadores para a aprendizagem
75
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
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O que evidenciam as pesquisas em educação
interesse e do esforço dos alunos foi abordada professores em sala de aula como, por exemplo,
nos resultados da tese de Rodrigues (2014), que aquelas típicas “do método tradicional de ensino,
buscou traçar o perfil de bons professores de como uso de formas de avaliação que exigem
matemática nas escolas estaduais de São Paulo. do aluno apenas a reprodução de conteúdo,
Nos resultados da pesquisa a motivação para poucas oportunidades de escolha com relação
o estudo aparece como fator de significativa aos trabalhos a serem desenvolvidos e mesma
importância para a melhora do desempenho metodologia de ensino utilizada em todas as
dos alunos. Rodrigues (2014) relata que a maioria aulas” (OTAVIANO; ALENCAR; FUKUDA, 2012,
dos 53 professores que participaram do estudo p. 65) são alguns dos fatores que cooperam para
entendem que o desinteresse e a falta de “reduzir a motivação do aluno para aprender e a
esforço dos estudantes trazem dificuldades para expressão do seu potencial para criar”. Tendo em
promover a aprendizagem. A autora problematiza vista as dificuldades para aprender matemática,
que o desinteresse pode estar relacionado ao que os autores consideram fundamental o professor
os próprios professores atribuíram como “falta de “não apenas auxiliar o aluno a dominar os
habilidade”, ou seja, os alunos teriam dificuldades conteúdos dessa disciplina, como também
de compreensão de um novo conteúdo pela falta motivá-los, levando-os a ter prazer em estudar
de conhecimento de uma matéria anterior. Ela e aprender matemática” (OTAVIANO; ALENCAR;
também observou que a ausência de um objetivo FUKUDA, 2012, p. 67).
claro nas atividades propostas, mesmo aquelas
que envolvem a utilização de jogos, softwares No estudo de Starepravo e outros (2017), também
educativos ou até mesmo de trabalhos em grupo, na disciplina de matemática, o jogo, tendo em
podem “levar à dispersão da atenção dos alunos vista o seu potencial cognitivo e afetivo, foi cenário
ou até mesmo ao completo desinteresse pela de engajamento dos alunos à ação. Os autores
atividade por não se atribuir nenhum sentido a tiveram por objetivo analisar as contribuições
ela” (RODRIGUES, 2014, p. 103). do Jogo do Resto para a compreensão do
conceito de multiplicação com alunos do 4º ano
Os procedimentos didáticos utilizados pelos do ensino fundamental. Baseados em Piaget,
professores de matemática em sala de aula Starepravo e outros (2017), defendem que o
também foram abordados no artigo de Otaviano, jogo promove o engajamento do aluno nas
Alencar e Fukuda (2012), que investigaram a ações propostas independentemente de ele
percepção de alunos do ensino médio quanto à saber ou não jogar. Os autores explicam que “o
utilização, por seu professor de matemática, de aspecto afetivo motivador como interesse pelo
práticas docentes favoráveis ao desenvolvimento jogo, seja pela competição, seja até mesmo pelo
da criatividade e motivação na matéria. Os estar junto com o colega, desloca os alunos de
resultados do estudo indicaram relação positiva um posicionamento passivo para atuar no jogo
entre a percepção dos alunos em relação ao uso com interesse e esforço” (STAREPRAVO et al., 2017,
de estratégias em sala de aula para desenvolver p. 22). Explicam que os conceitos matemáticos
a criatividade pelos professores e a motivação se tornam significativos para os alunos quando
dos alunos em matemática. Fundamentados em são utilizados como ferramentas para solucionar
Fleith e Alencar (2010), Otaviano, Alencar e Fukuda problemas, devendo ser esse o ponto de partida
(2012) explicam que as práticas mobilizadas pelos no ensino dos conteúdos escolares.
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
14 Foi utilizado na pesquisa um desenho de Gervasio Troche, representando um pai e uma filha caminhando, com a sombra da menina sendo maior
que a projetada pelo pai. O desenho foi utilizado em uma proposta de reconceitualização de atividades experimentais, conforme conceituado
por D. Hodson em “Enseñanza de las ciencias” (HODSON, 1994, p. 299). A imagem foi apresentada a estudantes de óptica no ensino médio, que
deveriam discutir sua possibilidade física, além de construir e testar um modelo experimental baseado na figura.
80
O que evidenciam as pesquisas em educação
geométrica “à manipulação dos modelos pelos para que interpretem e aprendam conceitos e
próprios estudantes” (RIBEIRO, 2015, p. 3507-3515), fenômenos do conhecimento científico” (p. 953).
além da possibilidade de comparar os modelos
construídos pelos diferentes grupos de alunos. Na tese de Melgaço (2015), algumas das práticas
da professora de ciências ilustram o cuidado e a
Vê-se assim que, longe de ser um barateamento preocupação em ter como ponto de partida os
do ensino, o objetivo é justamente levar a uma conhecimentos prévios dos estudantes. Ao propor
maior compreensão da ciência e de seus mé- para os alunos o tema “mudanças de estados
todos. Não se trata de negar a importância dos físicos”, por exemplo, explora, com base em uma
exercícios, que permitem aprofundar o aprendi- situação cotidiana, os conhecimentos prévios dos
do, mas a tônica está em modificar a forma de estudantes a respeito da evaporação da água. Faz
explicar conceitos abstratos e complexos. referência às roupas molhadas penduradas no
varal que secam ao sol e pergunta “cadê a água
Por outro lado, no estudo de Souza e Santos que estava aqui?”. O questionamento tem por
(2018), que teve por objetivo analisar e objetivo estimular a discussão entre alunos e, na
contrastar o nível de exigência conceitual da sequência, ela propõe outra pergunta, tendo em
prática pedagógica de professores que atuam vista propiciar o relato de experiências pessoais
na docência nas disciplinas de química e física e familiares sobre o modo de secar roupas: “Qual
no ensino médio, há relato das dificuldades é a diferença, no processo de evaporação, entre
dos docentes que participaram do estudo pendurar a roupa molhada, totalmente estendida
em considerar os conhecimentos prévios dos ou dobrada?”. Melgaço (2015, p. 93) explica que
alunos e da baixa complexidade e abstração do com “essa pergunta, a professora desafia os
conhecimento científico nas atividades e nas estudantes a refletirem e dialogarem, a partir de
avaliações da aprendizagem. suas vivências cotidianas, sobre a importância da
superfície de contato das roupas molhadas com
Os autores observaram que, nas aulas de o ar no processo de evaporação”.
química e física, os discursos acadêmicos
prevaleciam durante a explicação e a discussão A autora observou que a professora dedica um
de conceitos. Os professores pouco exploravam tempo significativo de aula para as atividades
o que os alunos já sabiam sobre os fenômenos de identificação e registro de conhecimentos
estudados. Souza e Santos (2018, p. 953) prévios dos estudantes e relata que, durante a
argumentam que “a aquisição da linguagem entrevista, ela contou
científica pelos alunos é facilitada quando
se permite que o conhecimento científico
haver aprendido pela experiência de trabalho, que ‘ou-
e teórico se desenvolva com a utilização de
vir os estudantes’ possibilita orientações e intervenções
uma linguagem próxima àquela dos alunos”. pedagógicas direcionadas para um ensino de ciências
Acrescentam, ainda, que é importante o mais dialogado e menos transmissivo. [...] Esse tempo
professor relacionar o “conhecimento científico prolongado para as trocas de ideias possibilita aos es-
com problemas e fenômenos conhecidos tudantes ‘tempo para pensarem, discutirem, reformu-
pelos alunos, respeitando os conhecimentos larem análises e registrarem interpretações desenvolvi-
que adquirem na comunidade em que vivem, das’ (MELGAÇO, 2015 p. 90-91).
81
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Hannel (2017), em sua tese, problematizou Nas primeiras semanas de aula, nos primeiros dez dias de
como personalizar o ensino para conduzir o aula, são realizadas atividades avaliativas para se verificar
aluno em sua trajetória pessoal rumo ao apren- de onde vamos partir. Então, eu converso com os alunos,
dizado significativo, sanando dificuldades de eu uso uma ou duas avaliações, e muita atividade oral.
Eu pergunto diretamente: ‘O que vocês viram no ano
conteúdo, colocando em evidência a necessi-
passado? Até onde foram?’ E a partir daí começo o
dade de o professor conhecê-lo e identificar
trabalho com a turma (LOPES, 2013, p. 100).
aquilo que ele sabe ou não para promover uma
aprendizagem significativa. Recorre à teoria da
aprendizagem significativa de Ausubel (1968), A autora explicou que os professores, ao iniciarem
que considera a existência de conhecimentos o ano letivo, realizam um período de sondagem,
prévios nos quais o estudante possa ancorar levantando dados que apontam o perfil da turma
as novas ideias, o que pressupõe a quantida- e as suas reais necessidades. As informações ob-
de e qualidade de subsunçores, como o fator tidas nesse processo permitem que os docentes
de maior relevância para o aprendizado signi- reorganizem seu planejamento considerando “a
ficativo. Subsunçor é o nome dado por Ausu- aproximação entre os conteúdos escolares e os
bel a “um conhecimento específico, existente não escolares, o que possibilita aos alunos o aces-
na estrutura de conhecimentos do indivíduo, so aos dois contextos, atribuindo significado ao
que permite dar significado a um novo conhe- conteúdo escolar” (LOPES, 2013, p. 151). A pesqui-
cimento que lhe é apresentado ou por ele des- sadora observou algumas situações que exempli-
coberto” (MOREIRA, 2012, p. 2, apud HANNEL, ficam a aproximação do conteúdo escolar com
2017). Logo, para o aluno atribuir significados o não escolar. Relata o caso de uma professora
a novos conhecimentos, é preciso contar com que utiliza exemplos de fatos vivenciados pelos
conhecimentos prévios especificamente rele- alunos como forma de introduzir e explorar os
vantes e com a interação entre conhecimentos conteúdos da disciplina de língua portuguesa. A
prévios e conhecimentos novos. Nesse proces- professora explica para a pesquisadora:
so interativo, aquilo que o aluno já sabe serve
de ideia-âncora para um novo conhecimento.
Com relação ao conteúdo que os alunos trazem, isso
se faz no cotidiano da sala de aula. Quando se trabalha
Lopes (2013, p. 72), que analisou práticas pe- leitura e compreensão de texto, normalmente, a gente
dagógicas de professores dos anos finais do sempre traz o que se chama introdução ao tema, este
ensino fundamental da disciplina de língua é um momento que eles gostam muito e em que
portuguesa, verificou, nas observações realiza- participam trazendo exemplos de situações vivenciadas
das em sala de aula, situações em que os pro- por eles (LOPES, 2013, p. 73).
fessores se valem “dos conhecimentos trazidos
pelos alunos, levando-os, assim, a uma maior Lopes (2013) também identificou em sua pesquisa
compreensão dos conceitos trabalhados na sé- a preocupação dos professores em fazer os alunos
rie, tornando a aprendizagem mais significati- perceberem a ligação entre um conteúdo e outro,
va e enriquecedora”. Uma das professoras que tanto para retomadas de assuntos de anos anterio-
participou do estudo busca conhecer os alu- res tendo em vista dar continuidade ao conteúdo
nos já nas primeiras semanas de aula, a partir da série, como também para os estudantes com-
de exercícios e dinâmicas propostas: preenderem que um determinado conteúdo já foi
82
O que evidenciam as pesquisas em educação
trabalhado em anos anteriores e, com a sequência porém de geografia. A autora teve por objetivo
das séries, os conceitos vão sendo ampliados e exi- compreender como ocorre a prática pedagógica
gem novos desafios para a sua compreensão. desses professores, tendo por referência sua for-
mação inicial e os processos de recontextualização
Vimos até aqui que, com o conhecimento da na sala de aula. A autora também discutiu a impor-
compreensão dos estudantes, o professor é tância de o professor dominar sua disciplina para
capaz de identificar concepções alternativas, que possa identificar os conhecimentos prévios
avaliar os argumentos de seus estudantes e assim dos alunos tendo em vista definir uma proposta
desencadear um processo de aprendizagem. No de intervenção que promova uma aprendizagem
entanto, é preciso ressaltar que esse processo significativa. A autora fundamenta-se em Basil
não é trivial, ou seja, identificar os conhecimentos Bernstein para analisar os dados da pesquisa com
prévios dos estudantes e saber fazer uso deles base na estrutura do conhecimento pelo discurso
exige que o docente tenha conhecimento do vertical e o discurso horizontal e suas contribui-
conteúdo específico que é objeto de ensino. ções na construção do conhecimento geográfico.
Nas teses de Moreira (2015) e Rosa (2017) essa Ela explica que Basil Bernstein fundamenta-se em
questão é abordada. uma constelação de conceitos e/ou categorias de
análise que deram suporte à sua teorização.
Moreira (2015, p. 196) investigou o desenvolvi-
mento do conhecimento pedagógico do conteú- Na análise sobre como a professora considerou
do, também conhecido pela sigla PCK, para o en- os conhecimentos prévios dos alunos em suas
sino de argumentação científica (PCKarg) de um práticas, aborda o uso do discurso vertical e ho-
professor de química recém-formado. O PCK é um rizontal nesse processo. Rosa (2017) explica que
constructo formulado por Lee Shuman e diz res- o discurso horizontal diz respeito à aquisição de
peito aos modos de o professor formular e apre- uma competência comum que ocorre por meio
sentar o conteúdo de maneira compreensível aos das práticas cotidianas e/ou do senso comum,
alunos, o que engloba o entendimento, por par- normalmente organizadas de forma segmenta-
te do docente, daquilo que facilita ou dificulta o da e dependente de um contexto específico. Já
aprendizado de um conteúdo específico, além das o discurso vertical tem relação com o discurso
concepções errôneas dos alunos e suas implica- de natureza acadêmica, também intitulado co-
ções para a aprendizagem (SHULMAN, 1987). Em nhecimento escolar ou oficial. Diferentemente
sua pesquisa, Moreira (2015, p. 196) observou que, do discurso horizontal, o vertical se apresenta
quando o professor não tem um conhecimento em forma de uma estrutura coerente, explícita
robusto do conteúdo específico, a identificação e com princípios sistemáticos. A autora explica
das concepções alternativas dos alunos torna-se que se espera que o professor de geografia pro-
inviável, uma vez que o docente pode não ser “ca- blematize conteúdos com exemplos de situa-
paz de identificar quais concepções dos estudan- ções do cotidiano para, então, explicá-los com
tes podem ser aceitas e quais estão desalinhadas base no conhecimento escolar. Isso significa
com as concepções científicas”. promover o acesso simultâneo aos dois tipos de
discursos – vertical e horizontal – e, assim, in-
Assim como Moreira (2015), Rosa (2017) desen- troduzir os princípios que permitem a distinção
volveu uma pesquisa com professores iniciantes, entre eles. Para Rosa,
83
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
o que não pode acontecer é que o discurso horizontal A autora explica que são essas diversas ativida-
seja valorizado e se torne o estatuto da escola. Pois, o des que acontecem fora da sala de aula que dão
discurso da escola é vertical. Não se pode correr o risco corpo à outra face do projeto da escola, que é
de ensinar geografia, considerando o conhecimento formar para a cidadania, preparando os alunos
do dia a dia como o contexto privilegiado de referência.
para atuarem no mundo em que vivem e serem
Esse é um notório desafio para os professores: estreitar
sujeitos de sua transformação. Nas escolas do
o fosso entre a visão empírica que o aluno tem do
mundo à sua volta e as variadas explicações científicas
campo analisadas por Silva (2009, p. 385), a “valo-
para os fenômenos desse mesmo mundo. Porém, o rização dos saberes populares num diálogo com
discurso vertical não suprime o horizontal, uma vez que os conhecimentos científicos produziram muitos
cada um tem sua legitimidade/validade nos contextos frutos, desencadeando mudanças significativas
específicos em que se realizam (ROSA, 2017, p. 82-83). nos processos administrativos e pedagógicos
das escolas”. A autora observou que o respeito
à cultura dos sujeitos, em um diálogo com a
A discussão sobre o discurso vertical e horizontal cultura científica e com a cultura midiática, foi
coloca em destaque o papel dos conhecimentos trabalhado nas escolas como conteúdo educa-
prévios em relação aos seus limites e possibilidades tivo. Nesse caso, “o conhecimento passa a ser
no processo de aquisição do conhecimento pelo entendido como proveniente de diferentes
aluno. Desse modo, recorrer aos conhecimentos fontes e sujeitos, o que faz da escola um espa-
prévios dos alunos provenientes de suas práticas ço de diálogo e de múltiplas conexões, já que
cotidianas é uma forma de facilitar o acesso ao ele não está em um único lugar, nem em um
discurso vertical da escola. Porém, como bem único sujeito” (SILVA, 2009, p. 383).
adverte Rosa (2017), é preciso cuidar para que
o discurso horizontal não tenha maior destaque Ela argumenta, assim, que se trata de um movi-
que o discurso vertical. A autora explica que mento de mão dupla na produção do conheci-
é importante promover o acesso simultâneo mento, uma vez que a escola se modifica com os
aos dois tipos de discurso e, ao mesmo tempo, conhecimentos provenientes da realidade e, con-
introduzir “os princípios que permitem a distinção sequentemente, as comunidades se modificam
entre eles” (ROSA, 2017, p. 82). por meio dos novos conhecimentos ampliados e
sistematizados pela escola.
Na tese de Silva (2009), que trata das práticas
pedagógicas que se desenvolvem em escolas Há ainda o artigo de Baptista (2015), que mostra
do campo, não só o resgate dos conhecimentos como um curso de formação continuada
prévios das crianças sobre as temáticas envolvendo etnobiologia pode contribuir para
estudadas é uma atitude constante, como que os professores sejam mais sensíveis, não
também a interação entre professores, alunos e apenas aos conhecimentos dos alunos, mas
conhecimento abrange a escola como um todo também à diversidade cultural. O curso apoiou
e as atividades planejadas podem acontecer em os profissionais na investigação e compreensão
outros espaços (na comunidade, nas visitas a dos conhecimentos culturais dos estudantes
espaços públicos, nas aulas de campo, atividades com relação à natureza, e, do mesmo modo, da
esportivas e recreativas etc.), não se limitando, própria prática pedagógica voltada ao diálogo
assim, à sala de aula. entre saberes culturais. Com base nisso, os
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O que evidenciam as pesquisas em educação
85
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
algo novo ou praticado de forma diferenciada médio “esteja também atento à criatividade como
pelo professor. Os resultados da pesquisa um processo a ser cultivado e desenvolvido em
sugerem que as possibilidades oferecidas ao sala de aula” (p. 332).
desenvolvimento e expressão da capacidade de
criar dos estudantes nas disciplinas do ensino Os resultados da pesquisa desenvolvida por
médio na escola investigada são limitadas. Otaviano, Alencar e Fukuda (2012) com alunos de
Almeida e Alencar relatam que escolas públicas e particulares do ensino médio
convergem com os dados obtidos no estudo de
Almeida e Alencar (2010). Os resultados também
há alguns professores empenhados em construir um
apontaram relação positiva da percepção dos
ambiente de aprendizagem de excelência e promotor
da criatividade, enquanto outros precisam rever várias alunos quanto ao uso de estratégias em sala
de suas práticas no sentido de fomentar a expressão de aula para desenvolver a criatividade pelos
criativa (ALMEIDA; ALENCAR, 2010, p. 331). professores. Logo, as práticas de ensino centradas
no professor contribuem para reduzir a expressão
do potencial criador do aluno, bem como a sua
Entre os estudantes que discordaram da ideia de motivação para aprender. No caso do ensino
que a criatividade seja desenvolvida em sala de da matemática, o incentivo do professor para o
aula, vários deles compreendem que os docentes aluno fazer perguntas, bem como a criação de
variam pouco as metodologias de ensino e um ambiente amigável, caracterizam um clima
as aulas facilmente se tornam monótonas e propício à expressão da criatividade (OTAVIANO;
cansativas, o que prejudica o interesse não só pela ALENCAR; FUKUDA, 2012).
aprendizagem, mas pela escola como um todo.
Na tese de Stefanelli (2018), a questão da
Os resultados do estudo revelaram ainda criatividade foi observada nas práticas
que a ênfase exagerada no conteúdo e em pedagógicas de ensino-aprendizagem com
sua reprodução, bem como a falta de tempo audiovisuais desenvolvidas na escola básica. A
para expressão e incremento de ideias novas, intenção do autor foi destacar a sua condição
são fatores que atrapalham a expressão e o de método ativo e colaborativo, explicitado
desenvolvimento da criatividade. Por outro teoricamente com as categorias conectividade
lado, as práticas docentes favorecedoras da e dodiscência, conforme teorizações de base
criatividade são o estímulo à análise de diferentes freiriana. O autor recorre à definição do próprio
aspectos de um problema, além da percepção e Freire para explicar essas categorias: “quem ensina
conhecimento dos pontos de vista divergentes aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao
sobre o mesmo problema ou tema em estudo. aprender” (FREIRE, 1996, p. 25, apud SFANELLI,
Os autores advertem, ainda, para a importância 2018, p. 89). O autor explica que, no ato educativo,
da criatividade em uma sociedade em constante o que de fato ocorre “é a simultaneidade da
transformação, que tem exigido, cada vez aprendizagem e do ensino na docência e na
mais, “indivíduos com competência para lidar discência, portanto, na dodiscência. Por isso, a
criativamente com problemas e desafios” conectividade é o ato de ensinar do professor
(ALMEIDA; ALENCAR, 2010, p. 332). Assim, e a ação de aprender dos alunos – ou vice-versa
recomendam que o professor que atua no ensino – em meio à interação, à intersubjetividade”
86
O que evidenciam as pesquisas em educação
(STEFANELLI, 2018, p. 89). Segundo Stefanelli Acho-me um professor pioneiro, em que busco conectar
(2018), na perspectiva freiriana, a dodiscência é com as tecnologias para a educação, particularmente,
procuro aperfeiçoar uma metodologia que explore
um processo, fundamentalmente,
o uso da ferramenta “filmar/gravar” existente nos
aparelhos celulares para estimular meus alunos
de conectividade ensino-aprendizagem que significa: à criatividade, à pesquisa, à organização. Por isso,
ato ou ação de aprender ensinando; envolve em ação busco me aprofundar na dinâmica e novidades dos
comunicativa (dialógica) e em práticas colaborativas recursos audiovisuais. Tenho, além das observações e
que unem teoria e prática (práxis), educandos e experiências em sala de aula, realizado cursos que me
educadores, que se motivam uns aos outros, que capacitem para a direção de filmes, para o trabalho de
ensinam a si mesmos e a outros; é a ação pedagógica edição, efeitos e sonoplastia. É algo que a gente está
de quem ensina, ao mesmo tempo em que aprende, construindo (STEFANELLI, 2018, p. 185).
sobre um determinado conhecimento; ou aquele que
organiza a produção dos conhecimentos preexistentes Para o professor Zaldo, o processo de estimular a
(docente) coparticipando da aprendizagem dos
dodiscência conectiva em sala de aula tem como
aprendizes (discentes) e do seu próprio processo de
base a criatividade, a pesquisa e a organização
aprender (STEFANELLI, 2018, p. 90-91).
didático-metodológica. Stefanelli (2018, p. 189)
argumenta a favor de transformar o audiovisual
Na pesquisa desenvolvida por Stefanelli (2018), em um conteúdo indispensável para potencializar
que contou com a participação de professores, “a criatividade, a generosidade e a dialogicidade
alunos e ex-alunos para compreender as do saber aprender e ensinar (dodiscência) na
interações de suas percepções sobre as práticas cultura escolar”. Na tese há vários outros relatos de
escolares com audiovisual vividas em seu professores e alunos que evidenciam que o ensino
processo de escolarização, ficou evidente que com audiovisual, na perspectiva da dodiscência
metodologias que se utilizam fortemente do conectiva, é promissor para promover a experiência
ensino com audiovisual transformam de modo estética e a criação artística e comunicativa no
significativo as inter-relações pedagógicas espaço escolar.
(dodiscência) nos ambientes escolares. Esse
tipo de prática possibilita ao professor orientar Assim como Stefanelli (2018), Braga (2012) recorreu
a curiosidade e a criatividade dos alunos na a Paulo Freire para analisar a prática pedagógica
produção de conhecimento. E por meio de docente-discente vivenciada em duas turmas dos
atividades de ensino com audiovisual, “os anos iniciais do ensino fundamental de uma escola
estudantes aprendem a escutar e a utilizar seus da rede pública municipal. Dentre os dados obtidos
potenciais na aprendizagem e no desempenho no estudo, o estímulo ao pensamento criativo e
dos diferentes trabalhos escolares” (STEFANELLI, à imaginação foi utilizado pelas professoras em
2018, p. 123). O desenvolvimento do conteúdo diferentes situações. Braga (2012) relata várias
curricular de audiovisual na sala de aula favorece a passagens das aulas observadas em que verificou
realização de práticas pedagógicas mais flexíveis, que a ativação da curiosidade, da imaginação
uma vez que oportuniza a liberdade de escolha, e da criatividade foi o meio encontrado pelas
a criatividade e o protagonismo dos estudantes. professoras, que se apoiaram no aporte freireano
Um dos professores que participou do estudo, para promover a participação ativa dos alunos
com o codinome Zaldo, relata: e, assim, sedimentar o prazer por aprender, por
87
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
conhecer. A busca pela criação de condições para querer “saber fazer” podem provocar “momen-
que todos os alunos aprendessem expressava-se tos de pausa, momentos de reflexão, ou mesmo,
nas atividades propostas pelas professoras que de debates críticos e criativos entre os colegas”
demandavam dos alunos criatividade na resolução (BRIGUENTI, 2014, p. 162). E são nessas ocasiões
de problemas, por exemplo. que o professor tem a possibilidade de “introdu-
zir questionamentos, relembrar ideias e concei-
A autora explica que a “diversificação na forma de tos, dar exemplos que contribuam e estimulem
solucionar um problema, seja na aula de matemá- os alunos a buscarem alternativas, diante das
tica, seja na vida cotidiana, é um princípio ineren- incertezas e das dificuldades do processo de
te ao respeito à autenticidade das ações criadoras aprendizagem e síntese do conhecimento que
do ser humano” (BRAGA, 2012, p. 174). Acrescenta, se defrontam” (p. 162).
ainda, que “em situações de escolarização, a prá-
tica pedagógica docente-discente se faz criativa Trata-se de um momento propício de mediação
quando o acolhimento à diversidade de formas de pedagógica em que “o professor encontra maior
aprender pressupõe a diversidade de formas de abertura dos alunos e melhores condições de
ensinar, pelo estímulo ao raciocínio lógico, à ima- retomar explicações, transformar dúvidas em
ginação, à intuição, à fantasia” (p. 174). Para Braga questões motivadoras e desafiadoras para o
(2012), ensinar a perguntar, bem como aguçar a aluno e estabelecer diálogos ricos no processo
curiosidade e, ainda, reconhecer no ser humano de aprendizagem e na construção de saberes”
a sua integralidade, são meios para o exercício (BRIGUENTI, 2014, p. 162). E, nesse processo, o
da criatividade. Nessa compreensão, o autor dife- autor adverte que a intervenção pedagógica
rencia a “pedagogia humanizadora das pedago- deve ser cautelosa para não ocultar processos
gias tradicionais, por reconhecer os seres huma- psicológicos espontâneos e dificultar, ou até
nos como seres históricos, que se desenvolvem, mesmo impossibilitar e descaracterizar, possíveis
se transformam, seres autobiográficos, criativos” resultados autênticos, decorrentes de esforços
(BRAGA, 2012, p. 40). criativos. Para o autor, o uso da cartografia
evidenciou a possibilidade de construir caminhos
A importância do estímulo ao pensamento cria- dinâmicos, criativos na sala de aula e, sobretudo,
tivo também tem presença no estudo desenvol- possibilitou que o ensino de geografia fosse mais
vido por Briguenti (2014), em que discute a me- afetivo, “permitindo ao aluno vivenciar desafios,
diação cartográfica de processos de aprendiza- definir critérios, generalizar e detalhar, conceituar,
gem em práticas escolares na disciplina de Geo- buscar alternativas criativas e socializar
grafia no ensino médio. Como contribuições do subjetividades” (BRIGUENTI, 2014, p. 226).
seu estudo, apresenta, dentre outros aspectos, o
esforço criativo como um importante momen- O artigo de Gemente e Matthiesen (2017) faz uma
to pedagógico. O esforço criativo “caracteriza-se discussão interessante sobre a possibilidade de a
num momento de intensificação na busca do educação física escolar estimular o pensamento
saber, no desejo em demonstrar para si, colegas criativo dos docentes e, também, o dos alunos.
e professor, capacidade, criatividade e autentici- O estudo foi uma pesquisa-ação que teve
dade” (BRIGUENTI, 2014, p. 161). O autor explica por objetivo oferecer um curso de formação
que momentos de ansiedade no processo de continuada de professores, com base em suas
88
O que evidenciam as pesquisas em educação
dificuldades e necessidades em trabalhar com o técnicas dos alunos para realizar determinados
atletismo na educação física escolar, verificando movimentos, e passa a ser o prazer e a satisfação
as possíveis contribuições para a sua prática em se movimentar, que está acessível a todos
pedagógica. O pressuposto era combater a os estudantes, que podem participar efetiva e
concepção de que o atletismo é uma modalidade atrativamente das atividades.
exclusivamente competitiva, para atribuir-lhe
um valor pedagógico-educacional, visando à Tendo em vista que a criatividade não deve ser um
formação de todos os alunos como cidadãos via luxo extracurricular, como bem adverte Cavallo
atletismo, para além da dimensão puramente e outros (2016, p. 144), é muito importante que
técnica/procedimental. atividades e práticas com potencial para promover
o desenvolvimento da criatividade ocupem mais
Para tanto, o curso possibilitou que todos os os espaços nos currículos da educação básica.
professores confeccionassem e/ou utilizassem
materiais alternativos para a realização de suas
Nos estudos analisados, o desenvolvimen-
propostas pedagógicas nos locais disponíveis
to do potencial criativo foi associado:
nas escolas (como a quadra esportiva/pátios),
favorecendo sua criatividade até para suprir a • à diversidade nas metodologias de ensino
falta de estrutura das instituições. Essa prática utilizadas pelos professores;
também estimulou a criatividade, a motivação • à abordagem de assuntos atuais que
e a autonomia dos alunos, já que eles também acontecem no país e no mundo, causan-
podiam participar da criação dos materiais e do boas discussões e trazendo curiosida-
vivenciá-los em outros espaços fora da escola. des para a sala de aula;
Como relatam as autoras: • ao uso de ferramentas e materiais peda-
gógicos diversificados para promover a
experiência estética e a criação artística e
O modo como o atletismo foi trabalhado na formação
inicial, a falta de vivência na modalidade de forma mais
comunicativa do espaço escolar.
lúdica e pedagógica ocasionou, a esses professores, • à receptividade e estímulo à expressão de
dificuldades no desenvolvimento desse conteúdo em novas ideias, aceitando-as e ajudando a
suas aulas [...] Devido às lacunas da formação inicial, elaborá-las;
os professores não se sentiam capazes de superar • ao estímulo à análise de diferentes aspec-
a falta de estrutura das escolas, não encontrando
tos de um problema, além da percepção e
muitas possibilidades para a utilização e confecção
conhecimento dos pontos de vista diver-
de materiais que pudessem proporcionar a vivência
gentes sobre o mesmo problema ou tema
e a construção de conhecimentos em torno do
em estudo; e
atletismo [...] Era preciso instigá-los a pensar sobre
diferentes possibilidades de saltar, lançar e arremessar, • à criação de clima propício à expressão do
fazendo uma aproximação com as provas do atletismo aluno.
(GEMENTE; MATTHIENSE, 2017, p. 189-191).
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
90
O que evidenciam as pesquisas em educação
como o professor pode, por meio de situações as dúvidas do grupo, supostas pelo professor, o
problematizadoras, favorecer o confronto dos fizeram modificar o design tradicional da aula”
conceitos espontâneos com os conceitos (FREITAS, 2003, p. 110).
sistematizados. É preciso dizer que a formação
de conceitos é considerada a base para a A tese de Silva (2015), com professoras dos
aprendizagem escolar, e é o resultado de uma anos iniciais do ensino fundamental, aborda a
atividade complexa, em que todas as funções importância de os conteúdos de ciências serem
intelectuais básicas (atenção, percepção, trabalhados com base na problematização de
memória, abstração, análise) tomam parte. E, temas com o objetivo de causar mudanças
como resultado da elaboração conceitual, tem-se conceituais. Explica que
o desenvolvimento das capacidades de análise
ou abstração e de síntese ou generalização dos
os alunos possuem conhecimentos prévios sobre
dados da realidade.
fenômenos naturais e os recursos tecnológicos,
muitos deles adquiridos do chamado conhecimento
No conjunto das produções analisadas, 20 de senso comum; ao trazê-los para o ambiente escolar
pesquisas fizeram referência ao papel das práticas cabe ao professor estruturá-los e sistematizá-los. À
de problematização no processo de aprendizagem medida que esses conhecimentos vão se tornando
e, sobretudo, na elaboração e consolidação de insuficientes para explicar determinado fenômeno,
conceitos científicos. Quando abordada nas ambos, professor e alunos, devem procurar buscar
produções analisadas, a problematização dos novas informações para resolvê-los, reconstruí-los e
até ampliá-los (SILVA, 2015, p. 75).
conteúdos é utilizada por professores não só como
disparadora do processo de ensino-aprendizagem,
mas, também, no processo de apropriação do A tese teve por objetivo investigar como a
conhecimento pelo aluno. formação continuada em serviço, por intermédio
de oficinas de experimentação em ciências
Freitas (2003) observa a prática de um professor de como metodologia de ensino, pode contribuir
biologia para compreender as formas pelas quais com as práticas pedagógicas dos professores
os conteúdos da disciplina são transformados de ciências. Durante a realização do curso e
durante o processo de escolarização, e mostra dos relatos das professoras sobre as práticas
a importância de se compreender o papel do desenvolvidas com os seus alunos, inspiradas nas
professor na construção do discurso pedagógico. oficinas de experimentação, Silva (2015) ressaltou
Quando percebe que “o significado para a importância de as professoras, durante as
homozigoto e heterozigoto que ele possui e quer experimentações, incentivarem os alunos a
ensinar, regulado pelas regras distributivas, não é problematizar, observar, levantar hipóteses,
conhecido por seus alunos” (FREITAS, 2003, p. 109), pesquisar, realizar relações etc. Todas essas ações,
o docente constrói um desenho, usa um novo segundo o autor, são necessárias para transformar
meio semiótico para fazer com que os alunos os conceitos adquiridos em aprendizagens.
compreendam os conceitos. Assim, “este trabalho
possibilitou evidenciar [...] que a orientação para O mesmo autor afirma que o trabalho com expe-
o trabalho criativo e significativo do professor foi rimentação é importante para o desenvolvimento
dada pela interação com os alunos, sendo que do aluno, uma vez “que é a partir das formulações
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
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O que evidenciam as pesquisas em educação
sistematizar os dados estatísticos da recolha feita, atenção na sua explicação, o que é confirmado
com o número de aniversariantes de cada mês, em seu depoimento: “eu entendo que meu aluno
ela não conseguiu efetivamente contribuir para aprende: prestando atenção; fazendo e tirando
o desenvolvimento de um ciclo de investigação as dúvidas. Quando eles trazem as dúvidas eu
estatística com os alunos. O autor explica que, se explico para eles aprenderem” (LIMA, 2017,
o tema é “aniversariantes do mês”, p. 135). A autora argumenta que é essencial que
o professor, no ensino da matemática, considere
alguns dos aspectos que constituem o processo
seria importante a professora, antes de recolher os
de elaboração de conceitos, a saber:
dados, elaborar junto com a turma quais seriam os
conjuntos de questões que se pretende responder com
essa mesma recolha, pois neste sentido, a estatística a criação de um ambiente de interações e mediações
seria um processo construído para analisar uma questão que sendo dialógico e problematizador possibilite
e não apenas se apresentaria como uma técnica para o desenvolvimento de tarefas que promovam a
justificar os dados coletados, pressuposto último, que elaboração conceitual; os processos de significação
ocorreu na proposta de Paula (CIRÍACO, 2016, p. 245). compreendidos na relação com a linguagem e
pensamento e, neste bojo, a comunicação das ideias
A percepção do grupo de professores iniciantes na sala de aula (tradução da língua materna para a
e de Ciríaco (2016) sobre a aula é de que a linguagem matemática); e, sobretudo, a correlação
técnica se sobrepôs ao significado das análises existente entre os conceitos espontâneos e os
científicos (LIMA, 2017, p. 107).
do contexto, comprometendo, assim, o potencial
da proposta. A discussão desses aspectos levou
à problematização, no espaço do grupo, de A autora acrescenta, ainda, em relação à prática
que seria desejável que as tarefas propostas aos realizada pela professora, que “as possíveis
alunos fossem congruentes em alguns aspectos, heurísticas dos alunos não foram nem geradas,
como, por exemplo, a importância de definir um nem tampouco conhecidas, comunicadas e
tema que parta da realidade dos alunos, que problematizadas, como propõe a perspectiva
oportunize uma problematização efetiva com a metodológica da resolução de problemas”.
turma e que seja desafiador do ponto de vista Como bem destaca a autora, o aluno precisa
da mobilização para a coleta dos dados e a sua ser concebido como “sujeito ativo e autônomo,
interpretação posterior. autor de descobertas, pois a descoberta é a mola
propulsora do conhecimento científico” (LIMA,
Lima (2017), durante a observação das aulas de 2017, p. 141).
uma das professoras que ensinam matemática
nos anos iniciais, com foco na resolução de Nos artigos de Otaviano, Alencar e Fukuda (2012),
problemas, notou que raras vezes os alunos eram de Starepravo e outros (2017) e de Barbosa e
instigados a desenvolver diferentes estratégias de Oliveira (2018), todos do campo da matemática,
resolução e, quando isso ocorria, elas não eram também se discute que o ensino de conceitos
problematizadas pela professora junto à turma. matemáticos tem sido um desafio para os profes-
Lima (2017) narra uma prática de ensino centrada sores, uma vez que ainda é recorrente o uso de
na professora, que entende que a aprendizagem práticas que consistem em apenas levar o aluno a
acontece quando a sala está em silêncio, prestando reproduzir o que lhe foi ensinado. Discute-se nes-
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
ses artigos a importância de estimular os estudan- poderá “planejar suas intervenções, escolher pro-
tes a visualizarem um problema matemático de blemas que mobilizem os conhecimentos que os
distintos ângulos, envolvendo-os nesse processo alunos já possuem, mas que os façam melhorá-
no sentido de criar hipóteses e investigá-las com -los, ampliá-los, aperfeiçoá-los” (p. 29). Logo, ad-
base na situação-problema proposta. É consenso vertem os autores, o jogo não deve ser escolhido
nesses estudos que a resolução de problemas é ao acaso, ele deve “fazer parte de um projeto de
essencial para o processo de elaboração de con- ensino do professor, com a intencionalidade de
ceitos matemáticos, que se tornam significativos participar, de fato, do processo de construção do
quando são utilizados pelos alunos como ferra- conhecimento pelo aluno” (p. 29).
mentas para solucionar problemas.
Nas teses de Goulart (2011), de Briguenti (2014)
Starepravo e outros (2017), por exemplo, e de Rosa (2017) sobre o ensino de geografia, a
defendem que situações ativas, promotoras discussão relativa ao processo de apropriação
de autorregulação por meio da resolução de de conceitos geográficos pelos alunos é pauta
problemas presentes nos jogos, podem ser uma presente. Todos os três defendem a construção
proposta efetiva na construção de conceitos de conceitos e o desenvolvimento de habilidades
matemáticos. Por meio de um estudo empírico, geográficas como necessários e fundamentais
analisam as contribuições do Jogo do Resto para a para que o aluno realize leituras do mundo.
compreensão do conceito de multiplicação. Para
os autores, o jogo tem “um papel desencadeador Goulart (2011) investigou como a pedagogia de
do processo de autorregulação por meio das projetos interfere na aprendizagem dos alunos
situações problematizadoras que oferecem e professores e nas práticas pedagógicas de
ferramentas essenciais e necessárias para a geografia. Briguenti (2014) desenvolveu um
construção do conhecimento” (STAREPRAVO et estudo em que o principal objetivo foi discutir
al., 2017, p. 22). Logo, quando o jogo é intencional, a mediação cartográfica de processos de
propõem que a preocupação do professor aprendizagem em práticas escolares. E a pesquisa
esteja centrada no processo de construção dos de Rosa (2017), centrada na formação e atuação
conceitos envolvidos na proposta, tornando- docente realizada por professores iniciantes
se um agente importante na mediação entre o de geografia, buscou, dentre outros aspectos,
jogo, o aluno e o conhecimento matemático. compreender a prática pedagógica desses
Assim, a sua intervenção com questionamentos professores com destaque aos fundamentos
que levem à reflexão quanto aos procedimentos didático-pedagógicos da geografia escolar.
adotados pelos alunos é pertinente.
Nas discussões sobre o processo de elaboração e
Starepravo e outros (2017) explicam que o jogo consolidação dos conceitos geográficos, por meio
é uma rica oportunidade para os professores ob- de estratégias didáticas que exigem participação
servarem, por exemplo, “como os alunos organi- ativa dos alunos, como pedagogia de projetos
zam suas ações e se são capazes de avaliar os seus ou a adoção de uma didática que envolve o
resultados, quais conhecimentos mobilizam e a uso da cartografia escolar, os três pesquisadores
que tipo de estratégias recorrem” (STAREPRAVO et recorreram a Vygotsky para fundamentar a análise
al., 2017, p. 29). Com essas informações o docente dos dados.
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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O que evidenciam as pesquisas em educação
lhe seja necessário” (FREITAS, 2013, p. 19). Para dos processos individuais, relatando os eventos em
tanto, é imprescindível diversificar o tempo que a docente realiza testagens com as crianças e
de aprendizagem para que todos tenham um identifica as hipóteses formuladas por elas sobre
bom desempenho. como o sistema de escrita se constitui e, com base
nisso, propõe situações de conflito produtivas para
Essa questão é abordada em 12 das pesquisas cada aluno, de acordo com seus conhecimentos.
analisadas. Do mesmo modo que na categoria A pesquisadora observou diferentes situações em
sobre a construção de sentidos e a motivação que a professora demostrou preocupação em
no processo de aprendizagem, as pesquisas contemplar todos os alunos, como, por exemplo:
na área de alfabetização e de linguagens ao deslocar-se pela sala tendo em vista atender as
foram aquelas que mais abordaram práticas crianças, sem privilegiar determinado grupo; ou ao
relacionadas aos ritmos de aprendizagem e às diminuir o ritmo da leitura coletiva das palavras-
necessidades dos alunos. chave do painel para que mais crianças pudessem
acompanhá-la (PICCOLI, 2009, p. 131).
A atenção aos ritmos de aprendizagem e aos
tempos escolares ganha relevância nos estudos Piccoli (2009) relata que a professora é
sobre as práticas de letramento e alfabetização, relativamente flexível na sequência de atividades
uma vez que há um ciclo da alfabetização de, que propõe para o período de aula para que seja
no mínimo, três anos, que deve considerar os possível atender à progressão de aprendizagem
diferentes ritmos das crianças e assegurar que dos alunos, seus interesses e necessidades. Em
todos estejam alfabetizados ao final dele. O diferentes momentos, a pesquisadora observou
desafio é trabalhar com práticas que respeitem um enfraquecimento na ritmagem da aula
o ritmo de cada criança considerando as para que os diferentes tempos requeridos pelas
particularidades etárias, sociais e psicológicas, crianças durante a realização de cada proposta
além do tempo de descobertas e de construção fossem respeitados. Segundo o autor, o controle
de hipóteses de escrita por cada criança. do tempo exercido pelo aluno não significa
“o aceite e a concordância passiva da professora em
A tese de Piccoli (2009), por exemplo, que relação ao tempo utilizado e à produção realizada,
descreve a prática pedagógica de uma já que procura auxiliar as crianças, por meio de
professora alfabetizadora da rede municipal de intervenções pedagógicas, na compreensão e
ensino de Porto Alegre, retrata a importância conclusão das atividades no tempo hábil por ela
de se recorrer a estratégias diversificadas para definido” (PICCOLI, 2009, p. 179).
alfabetizar contemplando atividades organizadas
de tal modo que a leitura e a escrita tenham A pesquisa desenvolvida por Braga (2012) traz
diferentes formas de representação infantil tanto relatos de professoras que tinham como princípio
lúdica como textual. Piccoli (2009) observou orientador de sua prática o respeito aos alunos, o
que a professora alfabetizadora que participou que as levava“a exercitar a escuta das/os estudantes
da pesquisa realizava intervenções específicas como uma possibilidade de reconhecimento das
para auxiliar cada criança, cuidando para atender diferenças individuais em termos dos ritmos de
cada uma de forma equitativa. A autora realça o aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo
domínio da professora sobre as especificidades e social dos/as estudantes” (BRAGA, 2012, p. 198).
97
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
O exercício de escuta, segundo a autora, se constitui língua portuguesa, lidam com os diferentes
em ponto de partida das ações a serem efetivadas na ritmos de aprendizagem apresentados pelas
relação com as crianças que têm como mediação o turmas. A autora explica que esses professores
conhecimento. Ela descreve uma cena que ilustra a valorizam e consideram as especificidades
possibilidade de acompanhamento individualizado culturais dos alunos levando em conta as suas
da professora a cada aluno: diversidades e singularidades, construindo uma
pedagogia diferenciada e responsiva. Lopes
(2013) relata que, nas atividades desenvolvidas
Seis estudantes sentaram-se ao chão para resolver a
em sala de aula, duas professoras estabeleciam
tarefa de geometria – Cl., J., Jo., Ce., M. e Cr.. Depois,
se achegaram a C. e a Clr.. Enquanto isso, a professora um tempo para a realização das tarefas, porém
percorria todas as carteiras, dedicando maior flexibilizavam esse tempo quando necessário
atenção àqueles/as estudantes que ela percebia para atender todos os alunos. As docentes
que apresentavam maior dificuldade em relação ao também acompanhavam a tarefa proposta,
conteúdo trabalhado – D., Ca., U.. Sentou-se ao lado circulavam entre os grupos e realizavam
deles/as e orientou-os/as na realização da tarefa, tirando intervenções individualizadas junto àqueles
dúvidas (BRAGA, 2012). alunos que precisam de algum tipo de ajuda.
Uma das professoras narra que, quando percebe
A autora também ressalta que a desenvoltura a dificuldade de algum aluno na compreensão
manifesta das docentes diante de diferentes ritmos dos conteúdos que são objeto de estudo,
de aprendizagem dos alunos revelava, dentre realiza intervenções individualizadas e propõe,
outros aspectos, “flexibilidade, conhecimento do paralelamente, atividades complementares aos
assunto trabalhado, respeito e compromisso com demais alunos:
cada um/a que ali se encontrava” (BRAGA, 2012,
p. 203). Também é uma prática democrática, que
A gente vai trabalhando sempre revendo e repetindo
tem início no planejamento das aulas quando as
atividades. Por exemplo, eles estavam fazendo a
professoras “levam em consideração os interesses, descrição dos ambientes, então o aluno faz uma
as curiosidades, as limitações, os pontos de vista descrição do ambiente e não fica tão boa, passa uns dois
e os ritmos de aprendizagem dos/as estudantes” dias, volto para lá. Como têm os alunos que realmente
(BRAGA, 2012, p. 124). A autora explica que, na sempre estão à frente, eu tenho tentado incentivar
perspectiva de Shör e Freire (1986), esses alunos a utilizarem este tempo com leituras.
Então, em um período em que esses alunos terminam a
tarefa, vinte minutos antes dos outros, ou eu proponho
o reconhecimento das diferenças individuais em termos algum texto do próprio livro didático para eles irem
dos ritmos de aprendizagem e do desenvolvimento lendo, ou eu peço para eles trazerem um livro de casa.
cognitivo e social dos/as estudantes se constitui no Assim, eles não precisam ler somente aqueles livros que
trabalho pedagógico coordenado pelas professoras como eu tenho na caixa. Com este encaminhamento, consigo
traço da rigorosidade metodológica (BRAGA, 2012, p. 150). organizar um tempo para atender mais individualmente
alunos que apresentam um pouco de dificuldade na
realização das tarefas propostas. É um tempo pequeno,
Já Lopes (2013) dedica várias passagens da tese mas considero necessário, faz a diferença e percebo
para relatar como cinco professores dos anos que há retorno (LOPES, 2013, p. 88).
finais do ensino fundamental, da disciplina de
98
O que evidenciam as pesquisas em educação
A flexibilidade no ritmo de aula, tendo em vista Uma das professoras relata a preocupação de
atender ao tempo de aprendizagem demandado não enfatizar as diferenças entre os alunos em
pelos alunos, também foi observada nas aulas do sala de aula para que não haja rótulos. Cuida para
professor Bruno. organizar suas aulas pensando sempre no melhor
para os alunos:
Na entrevista, ele comenta:
99
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
comprometendo o sucesso escolar de muitos estu- Essas questões e dificuldades abordadas pelos
dantes e das instituições escolares como um todo. professores que participaram do estudo de
É esperado que esses alunos fiquem desmotivados Lopes (2013) remetem às discussões sobre a
com a escola e que seja mais difícil para o professor simultaneidade – garantir que um professor
atender às suas necessidades e favorecer o seu pro- ensine a muitos alunos, a um só tempo – e sobre
gresso. Entretanto, mesmo em situações adversas, o o tempo escolar e a complexa relação entre
professor e a escola não podem se furtar de lançar tempo e diferença.
mão de práticas que favoreçam o ensino equitativo.
Pinho e Souza (2015) explicam que “a relação entre
Além de turmas com diferentes faixas etárias, ou- tempo e diferença tornou possível a identificação
tro aspecto apontado pelos professores como do problema do tempo escolar reduzido a um
dificultoso no atendimento aos ritmos e necessi- ritmo padronizado. Ora compreendido como
dades dos alunos é o fato de as turmas serem nu- uma propriedade individual, ora como uma
merosas: “o número de alunos em sala é terrível imposição de um tempo hegemônico, o do
não só para mim, mas para todos os professores. relógio” (p. 667). Os autores explicam que o ritmo
Ter uma sala de aula com trinta e cinco alunos, uniforme sempre foi uma preocupação, e que a
não se consegue, não existe como dar atenção e heterogeneidade de ritmos foi enfrentada, pela
garantir um mínimo de entendimento numa tur- pedagogia tradicional, “com a criação do ritmo
ma tão grande” (LOPES, 2013, p. 110). As diferen- médio, a fim de que todos os alunos pudessem,
ças de faixa etária e o número de alunos em sala supostamente, acompanhar ou se adaptar ao
são exemplos de dificuldades que os professores tempo da escola” (PINHO; SOUZA, 2015, p. 669).
enfrentam para garantir, em sua ação pedagógi-
ca, um atendimento mais individualizado às ne- Os professores do estudo de Lopes (2013) se veem
cessidades apresentadas pelos estudantes. diante da dificuldade de adequar os ritmos dos
sujeitos e das turmas ao ritmo do tempo escolar, o
Outro aspecto abordado pelos professores em mesmo movimento observado por Pinho e Souza
relação aos ritmos de aprendizagem diz respeito (2015) no estudo que desenvolveram em duas
às diferenças de ritmos entre as turmas: escolas públicas, ambas localizadas na Ilha de
Maré. Os autores problematizam os modos como
Olha, esse tempo todo que eu leciono eu ainda não o tempo escolar se constituiu historicamente
consegui ter duas turmas com o mesmo ritmo. Eu até, a partir da modernidade, questionam a ideia
entre aspas, invejo os professores que conseguem dar de aluno médio e apontam a necessidade de
o mesmo conteúdo ao mesmo tempo em todas as
superação do tempo como ritmo padronizado,
turmas. Eu não consigo fazer isso. Eu não lembro de ter
propondo outra concepção de tempo, a de
conseguido fazer isso porque numa turma eu levo duas
simultaneidade. Para Pinho e Souza (2015), a
semanas, noutra levo quatro, noutra uma. Eu não consigo
ter o mesmo ritmo. O conteúdo que trabalho com uma
compreensão do tempo escolar depende não só
turma, às vezes, se diferencia da outra em termos de de um olhar atento para os outros tempos sociais
compreensão e consequentemente de tempo. Muitas que atravessam a escola como, também, de uma
vezes, é necessário impor um certo ritmo para que eles atenção especial às interações realizadas entre os
avancem, mas no final do ano, geralmente, consigo dar sujeitos no interior da sala de aula: “o tempo escolar
conta de todo o programa (LOPES, 2013, p. 104). é acontecimento que se dá no encontro com o
100
O que evidenciam as pesquisas em educação
outro. Tudo isso aponta para se pensar o tempo Essas estratégias parecem exigir agilidade do
escolar como simultaneidade, que pressupõe professor tanto na preparação do planejamento
não a imposição, mas a coexistência de múltiplos como durante o ensino propriamente dito,
tempos e temporalidades, sejam eles individuais, já que é preciso modular as estratégias
sociais ou naturais” (PINHO; SOUZA, 2015, p. 676). pedagógicas em função dos conteúdos, das
habilidades e necessidades dos alunos de faixa
As pesquisas desenvolvidas com professores que etária diferentes.
atuam em turmas multisseriadas também trazem
relatos de práticas que visam a atender aos ritmos Mesmo em uma turma de mesma faixa etária,
de aprendizagem e às necessidades dos alunos. A Gauthier, Bissonnette e Richard (2014) explicam
tese de Araújo (2010), por exemplo, que objetivou, que é importante o professor modular as
dentre outros aspectos, descrever e analisar as estratégias e o tipo de apoio pedagógico
práticas pedagógicas de professoras que atuam (scaffolding15) que será oferecido aos alunos
em classes multisseriadas da escola do campo e em função de três elementos: do nível de
em classes cicladas da escola urbana, traz exemplos competência dos alunos, do tempo disponível
de como lidar com a heterogeneidade de alunos e da complexidade da tarefa a ser realizada.
presentes e atender aos seus diferentes ritmos de Levar em conta esses elementos e adaptá-
aprendizagem. A pesquisadora observou que as los às necessidades dos alunos e da turma
práticas das docentes das classes multisseriadas durante o planejamento pode não só favorecer
são “marcadas por uma rotina de trabalho que o atendimento aos diferentes ritmos de
as obriga a adotarem uma dinâmica polivalente aprendizagem, como também contribui para
de serviço e atitude, um fazer pedagógico ativo definir o tipo de apoio pedagógico, ou seja, se o
dentro de sala, bem como um planejamento diário aprendizado será dirigido, guiado ou autônomo
que viabilize tanto a elaboração como a aplicação ou, ainda, se haverá variações nas formas de
de várias atividades diferenciadas” (ARAÚJO, 2010, apoio ao aprendizado.
p. 110). As principais estratégias observadas foram:
Ainda em relação aos tipos de apoio pedagógico
que o professor pode oferecer aos alunos,
a) divisão dos alunos em grupos de trabalho; b) atividades
tendo em vista atender às diferenças de
diferenciadas para cada grupo, baseando-se nos níveis
de aprendizagem de cada grupo formado em sala; ritmos e necessidades, a tese de Hannel (2017)
c) elaboração de atividades específicas para crianças em apresenta uma discussão sobre estratégias
sala de aula com dificuldades pontuais; d) atividades de personalização na sala de aula recorrendo
espontâneas de acordo com o ritmo da aula, quando há aos recursos de aprendizagem sociais, como,
necessidade de elaboração de atividades no momento por exemplo, pequenos grupos e tutoria entre
em que a aula acontece; e) ajuda mútua entre os alunos pares. A pesquisa de Hannel (2017) teve por
dos diferentes anos escolares presentes em sala de objetivo investigar os modos de personalizar o
aula; f ) elaboração de 15 a 20 atividades diárias para a sua
ensino para conduzir o aluno ao aprendizado
classe (ARAÚJO, 2010, p. 159).
significativo, sanando dificuldades de conteúdo.
15 O termo scaffolding pode ser traduzido como “andaime” e é frequentemente usado para descrever o suporte que pode ajudar o aluno no processo
de aprendizagem. Refere-se a uma variedade de estratégias usadas pelo professor para mover os alunos progressivamente em direção a uma
melhor compreensão e, consequentemente, uma maior independência no processo de aprendizagem.
101
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Para tanto, fez uso do ambiente virtual (Moodle16), colagens e trabalhos manuais. Nessa ocasião, a
entendendo que esse espaço é uma ferramenta professora atendia às necessidades individuais.
que não só apoia o professor no atendimento Buscou-se também que o aprendiz fosse mais
mais personalizado, como permite que o aluno responsável pelo seu aprendizado, tendo certo
interaja no seu próprio ritmo de estudo, acesse controle sobre seu ritmo.
os conteúdos necessários ou aprofunde-se em
algum conteúdo. A pesquisa foi desenvolvida Utilizou como subsídio teórico para o desenvol-
com a participação de 256 alunos dos anos finais vimento das práticas a teoria da aprendizagem
do ensino fundamental do Colégio Militar de significativa de Ausubel. No processo de perso-
Porto Alegre. No ensino personalizado usando nalização, o professor buscava apoiar a constru-
TIC, o papel do professor, segundo Hannel (2017), ção de novos conceitos com base naquilo que
é de criador de caminhos, de atividades tanto em o aluno já conhecia. Hannel (2017) explica que
grupo como individuais. O docente passa a ser o professor procurava identificar os subsun-
um gestor e orientador de trajetórias, sejam elas çores comuns em grupos de alunos de acordo
previsíveis e/ou imprevisíveis. A autora se apoiou com suas dificuldades de conteúdo, e que esses
em Bloom (1984) para definir a personalização do grupos de alunos realizavam atividades no Am-
ensino entendida por ele como biente Virtual de Aprendizagem (AVA). Uma vez
identificadas as dificuldades, o aluno recebia ma-
terial direcionado às suas dificuldades, o que, se-
a diferenciação da instrução e fornecimento de feedback
gundo a autora, aumentava as oportunidades de
corretivo regular, com base nas necessidades de cada
aluno. Isto incluiu personalizar tanto o caminho como acerto, estimulando e incentivando o seu pros-
o ritmo – identificar e abordar falta de conhecimento seguimento nos estudos. Além disso, o ensino
pré-requisito, e passar mais tempo, quando necessário, personalizado auxiliava o trabalho do professor,
para garantir que os alunos tenham o domínio de temas “pois a tarefa de identificar o tempo, as dificulda-
alcançados antes de prosseguir (HANNEL, 2017, p. 15). des e o melhor caminho/trajetória de aprendiza-
do de cada aluno é um processo custoso. Com
A autora explica que a tecnologia possibilita uma um ambiente personalizado, o aluno chegará aos
integração, entre o mundo físico e digital, de todos objetivos seguindo o seu ritmo de estudos, em
os espaços e tempos. Espera-se que o professor paralelo às atividades de sala de aula” (HANNEL,
se comunique com os alunos presencialmente e 2017, p. 17-18).
que a comunicação também ocorra digitalmente.
No projeto-piloto desenvolvido e analisado, o Os resultados do estudo demonstraram a
ensino foi híbrido, houve atividades pelo Moodle, viabilidade do ensino personalizado com uso do
como sala de aula invertida, exercício de redação Moodle. Os alunos que participaram da pesquisa
colaborativa e atividades em sala. Nas atividades conseguiriam atingir melhores resultados
presenciais, enquanto um grupo trabalhava no quando participaram de um ensino voltado
computador preparando uma apresentação, às suas necessidades particulares. Hannel
outro trabalhava lendo um livro e outro fazia (2017), fundamentada em Schneider (2015),
16 O Modular Object Oriented Dynamic Learning Environment (Moodle) – é um sistema de código aberto para a criação de cursos online. Também
conhecido como Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), a plataforma é utilizada por alunos e professores como ferramenta de apoio ao ensino a
distância. Funciona como uma sala de aula online onde professores podem disponibilizar material didático e propor tarefas interativas, como testes
e discussões em fóruns.
102
O que evidenciam as pesquisas em educação
103
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
do próprio processo de aprendizagem, que as teúdos que estavam demandando por maior
ajudas oferecidas pelo professor aos estudantes atenção, por parte da professora e/ou dos/as
sejam adequadas às suas possibilidades reais estudantes” (BRAGA, 2012, p. 148). A autora re-
e que sejam incentivados a realizar o esforço lata que o erro era assumido pelas professoras
que lhes permita continuar progredindo. como possibilidade e busca do acerto, e traz
Logo, a função básica da avaliação é a de um excerto de uma das aulas que observou
impulsionar a aprendizagem do aluno na para ilustrar como a professora Creusa conduz
medida em que tem o potencial de propiciar uma situação de correção coletiva que tinha
a autocompreensão, motivar o crescimento e como finalidade identificar as dificuldades de
aprofundar a aprendizagem. compreensão dos alunos em relação ao conte-
údo trabalhado.
No conjunto das produções analisadas, 17
estudos trazem em seus resultados algum tipo
Antes de proceder à correção de matemática a professora
de consideração sobre as práticas de avaliação
Creusa dirige-se aos/as estudantes:
em sala de aula. A maioria conta com exemplos
— Quem não conseguiu concluir a atividade em casa?
e análises de práticas de avaliação, sejam elas
Poucos/as estudantes levantam a mão.
convencionais ou baseadas em uma perspectiva
formativa. Também há estudos que abordam Logo depois, segue com a correção coletiva, na lousa,
que é, também, um momento de revisão, de ver quem
o papel do erro e da correção das atividades,
não está acompanhando o conteúdo. Há estudantes que
tarefas, trabalhos e provas. Apenas duas pesquisas
permanecem silenciosos, como a Débora, o Ulisses e a Maria
abordam explicitamente a autoavaliação da
aprendizagem, e apenas uma trata do portfólio — Quem acertou? A partir das respostas do grupo, ao
percorrer com o olhar atento todo o semicírculo formado
como instrumento de avaliação.
pelos/as estudantes, tem clareza de quem está, ou não,
com dificuldades naquele assunto. Reitera essa conduta
A tese de Braga (2012) é um exemplo de pes-
perguntando:
quisa que aborda o papel do erro e da corre-
— Quem errou? Quem respondeu de outra forma?
ção na gestão dos aprendizados. A autora, que
analisa a prática de cinco professoras dos anos Diante da pronúncia dos/as estudantes, por palavras,
iniciais do ensino fundamental, com ênfase gestos ou expressões, ela disse:
nos elementos constituidores da dimensão hu- — A gente erra para poder acertar, não é? (BRAGA, 2012).
manizadora da pedagogia de Paulo Freire, traz
análises sobre o olhar avaliativo diferenciado e
formativo das docentes. A autora relata que a Braga (2012) explica que a professora estava
avaliação dos conteúdos tratados em sala de sempre atenta a cada aluno e buscava solu-
aula, nas diferentes áreas do conhecimento, “se cionar as questões em seu caderno individu-
dava a partir da concepção de erro como pos- almente. E, quando um estudante relatava que
sibilidade circunstanciada de cada estudante” não acertara a tarefa ou atividade, de imediato
(BRAGA, 2012, p. 148). O erro era identificado retomava a explicação e se dirigia a ele para
pelas docentes por “diferentes instrumentos e se assegurar de que estava compreendendo.
situações avaliativas, em que tanto a professora Segundo a autora, “não havia postergação de
quanto os/as estudantes identificavam os con- suporte ao estudante em seus ‘erros-tentativas
104
O que evidenciam as pesquisas em educação
de acerto’. O erro se apresentava como tenta- A tarefa iniciada na aula anterior [...] foi continuada em
tiva de acerto, como a oportunidade para a total silêncio e concentração, afinal, tratava-se de uma
professora pensar sobre as possibilidades, para avaliação de matemática. Nem por se tratar de uma
mobilizar situações de aprendizagem” (BRAGA, atividade avaliativa, os/as estudantes são fiscalizados/
as pela professora, que os/as deixa sentados/as em
2012, p. 149). A autora relata que a professora
semicírculo, uns/umas bem próximos/as dos/as outros/
Creusa envolvia toda a turma na correção da
as. Muitos/as vão até a professora para saber se estão
atividade, conforme o trecho já citado nesta fazendo corretamente e ela, prontamente, diz que
publicação (BRAGA, 2012, p. 150). sim ou não [...]. É grande o nível de concentração da
professora e dos/as estudantes em desempenhar suas
A pesquisadora observou que o respeito funções: ela de oferecer suporte, esclarecer dúvidas,
como elemento constituidor da rigorosidade corrigir em tempo real as questões; eles/as, de responder
metodológica das professoras também se com cuidado cada item, fazendo o melhor que podem,
manifestava na correção imediata das produções esgotando todas as possibilidades que possuem. Débora
dos alunos, não só aquelas feitas e corrigidas em entregou a tarefa, foi sentar-se na carteira. Em seguida,
a professora a chama e faz ponderações sobre uma de
sala de aula, como também as que as docentes
suas respostas, levando-a a refazê-la. A sineta tocou
levavam para fazer a correção em casa. Era
dez minutos antes das 17h, mas a professora disse que
uma prática que evidenciava o respeito pelas os/as meninos/as que ainda não tivessem concluído
produções das crianças e, sobretudo, o “incentivo a avaliação, continuassem, pois ela esperaria. Nesse
às elaborações dos/as estudantes, que ao momento, havia, ainda, dezesseis estudantes realizando
obterem retorno em tempo real se apercebem a atividade avaliativa (BRAGA, 2012, p. 152).
de quais investimentos devem fazer para superar
suas próprias dificuldades” (BRAGA, 2012, p. 198).
A pesquisadora analisa que esse e outros
A autora relata que o acompanhamento das momentos de avaliação individual ocorriam sem
singularidades de cada criança no que diz fiscalização acirrada, e que o clima em sala de
respeito aos percursos realizados no processo aula não se modificava “mesmo num momento
de aprendizagem foi sistemático e contínuo, que supostamente deveria ser de tensão, pelo
seguido, inclusive, “de uma reflexão, por parte caráter de ‘prestação de contas’ com a professora.
das professoras, acerca da prática pedagógica, Ao contrário, se configura como o momento
acompanhada da criação de novos desafios de prestação de contas a si próprio/a, para
que levassem os/as estudantes a superarem os dimensionar se o investimento realizado fora, ou
estágios cognitivos em que se encontravam” não, suficiente” (BRAGA, 2012, p. 152).
(BRAGA, 2012, p. 151). Observa-se, aqui, que as
professoras avaliam com o objetivo de auxiliar o Os dados da tese de Braga (2012) corroboram com
aprendizado dos alunos e, portanto, promovem pesquisas sobre o ensino analisadas por Gauthier,
uma avaliação formativa. Bissonnette e Richard (2014). Os autores explicam
que esses estudos observam que o fato de avaliar
Inclusive nas situações de prova, denominada os alunos frequentemente e por meio de estraté-
pelas professoras de tarefa, a condução era gias variadas favorece o aprendizado. Ressaltam o
descolada do mérito e da competitividade como valor de se aplicar avaliações frequentes, inclusive
retratado no relato que segue: em forma de tarefas, brincadeiras, pelo fato de elas
105
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
estimularem o aprendizado dos alunos na medida aula, tendo em vista conhecer como integram
em que exigem deles um esforço. Acrescentam, o equipamento ao cotidiano escolar e quais
ainda, que quando o professor fornece feedbacks práticas pedagógicas surgem com o uso do
frequentes e específicos relacionados aos objeti- laptop educacional. Participaram da pesquisa
vos de aprendizagem, indicando aos alunos o que seis professoras dos anos iniciais do ensino
devem fazer para melhorar, influencia positiva- fundamental de uma escola do Ceará.
mente o desempenho dos estudantes.
17 O Ministério da Educação e Cultura, em ação conjunta com universidades brasileiras e com as redes de ensino municipais e estaduais, implementou,
nos anos de 2010, o uso pedagógico do laptop em sala de aula por meio do projeto Um Computador por Aluno (UCA). O projeto UCA visa à
distribuição de laptops para os alunos de escolas públicas brasileiras.
106
O que evidenciam as pesquisas em educação
os acertos, é necessário que o professor os acompanhe a resultou em uma perspectiva do uso do laptop
fim de entender os processos de construção e articulação totalmente diferente. Explica que é importante
do pensamento dos alunos (ALMEIDA, 2014, p. 137). o professor compreender que “o laptop deve
agregar alternativas que favoreçam aos alunos o
A professora denominada como P2 também uso de seus recursos, com o objetivo de avançar
trabalha com a autocorreção e acompanha de em sua aprendizagem e não apenas como um
perto as dificuldades dos alunos, oferecendo recurso para realizar as atividades” (ALMEIDA,
apoio quando necessário. Sobre a autocorreção, 2014, p. 137).
explica: “Eu uso o exercício de autocorreção. Nas
atividades, eu percebia que a criança não achava Almeida (2014) conclui em sua tese que a
que errava, eu percebi também que isso ocorria abordagem do erro construtivo se torna
devido à falta da autocorreção por parte da própria possível com o uso do laptop desde que o
criança” (ALMEIDA, 2014, p. 135). A professora P2 feedback seja reflexivo e questionador, em vez
também faz uso da correção coletiva: “Ao trabalhar de simplesmente indicar a quantidade de erros.
com ordem alfabética, fiz uma lista de nomes, Segundo a autora, ao longo da pesquisa foram
escrevi os nomes de todos os alunos na lousa e várias as situações, relacionadas ao uso do laptop,
solicitei que organizassem em ordem alfabética. que proporcionaram um ambiente adequado
Colocamos em ordem alfabética coletivamente, à abordagem do erro construtivo. Relata que,
no laptop!” (ALMEIDA, 2014, p. 135). ao usar o laptop, as docentes articularam novas
estratégias no acompanhamento pedagógico
Para Almeida (2014), a professora mostra dos estudantes:
as possibilidades de se agregar o uso do
laptop a atividades de correção coletiva e
utilizaram a internet para motivá-los, estimulando a
autocorreção. Ressalta que a professora faz essa
correção; chamaram a atenção para a necessidade de
mediação recorrendo a perguntas, reflexões mostrar um texto apresentável devido à publicação da
e questionamentos. A professora P2, segundo atividade na internet. Usaram o diálogo e a flexibilidade;
a pesquisadora, entende e consegue agregar deram oportunidades aos alunos para retornar à
o laptop às atividades de produção textual atividade, repensar e mudar as respostas (ALMEIDA,
desenvolvidas em sala de aula. A autora relata 2014, p. 216).
que, diferentemente das professoras P2 e P6,
Processo semelhante foi observado na
pesquisa desenvolvida por Weckelmann (2012),
a professora P1 faz uma abordagem tradicional do erro,
que buscou apreender se a integração do
apontando e mostrando ao aluno, sem dar oportunidade
para que perceba e avance [...]. Quando o aluno não computador portátil nas práticas pedagógicas
tem consciência desse erro, eu procuro mostrar! Pego implicaria mudanças no relacionamento entre
a máquina, aí eu vou fazer e mostrar para eles que alunos, e destes para com suas professoras, bem
seria melhor fazer dessa forma. Eu mesma fazendo na como se ocorreriam alterações nas estratégias
máquina e mostrando para eles! (ALMEIDA, 2014, p. 137). didáticas. Trata-se de uma pesquisa-ação que
se desenvolveu em processo de recíproca
A pesquisadora explica que a mesma atividade colaboração entre pesquisadora, professores e
realizada pela professora P2, por exemplo, alunos do 4º ano da educação básica portuguesa
107
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
108
O que evidenciam as pesquisas em educação
os professores pareciam já saber que os alunos instrumentos avaliativos, considerando seus objetivos
não alcançariam um desempenho satisfatório e adequações aos conteúdos avaliados, bem como as
e, “para evitar a frustração e o constrangimento diferentes finalidades da avaliação (MORAIS, 2014, p. 79).
de ambos, passam a avaliar mais as questões
comportamentais e a disposição dos alunos No estudo desenvolvido por Resende (2017) com
em relação às atividades propostas” do que o três docentes no 5º ano do ensino fundamental,
processo de aprendizagem propriamente dito. as práticas de avaliação também se mostraram
Desse modo, avaliam os alunos principalmente pouco favorecedoras dos processos de
“pelo seu esforço e envolvimento nas propostas, aprendizagem. Na análise da autora, as formas de
pois os professores parecem entender que talvez avaliação utilizadas pelos professores “estavam
estes sejam os únicos meios para que os alunos mais voltadas à reprodução dos conteúdos
sejam bem avaliados” (SANTOS, 2017, p. 267). estudados e à memorização mecânica do que
à aprendizagem propriamente dita” (p. 127).
A avaliação com ênfase no comportamento e dis- Também chamou a atenção da pesquisadora que
posição dos alunos também emerge na tese da os professores pareciam mais preocupados com
Morais (2014), que teve por objetivo analisar as con- os resultados das atividades avaliativas do que os
tribuições da Provinha Brasil para a reorganização alunos. Resende relata que alguns professores
das práticas pedagógicas alfabetizadoras, com vis-
tas a garantir a aprendizagem dos alunos. A auto-
afirmaram que eram cobrados pelos pais dos alunos e
ra observou que as lacunas formativas dos alunos
pela direção da escola quando os alunos não alcançavam
eram avaliadas pelo seu comportamento em sala boas notas, o que pode explicar em parte seu empenho
de aula, evidenciando a informalidade da avaliação. para que os estudantes obtivessem bons resultados. Os
A autora explica que, na escola em que o estudo alunos pareciam acomodados com essa situação, pois
foi realizado, é comum os professores associarem de certa forma os professores sempre ‘davam um jeito’ de
avaliação com prova, compreendendo o erro como aprová-los. Suas palavras podem esclarecer essas ideias:
lacuna e não como possibilidade do acerto. Logo, ‘Antes da prova sempre faço perguntas oralmente’ (P1);
as práticas avaliativas reforçam o binômio certo- ‘Se eu sei que o aluno é aplicado, mas naquela prova
tirou nota baixa por algum motivo, dou nova chance’
-errado, demarcando lugares de saber e não saber
(P2); ‘Considero tudo o que dá pra considerar’ (RESENDE,
com pouca implicação das docentes no processo
2017, p. 127).
de produção do sucesso/fracasso escolar dos alu-
nos. Morais (2014) argumenta “que o modo como
os professores avaliam deveria estar intimamente Para Resende (2017), há uma incongruência entre
relacionado com o modo como desenvolvem o en- as práticas de avaliação adotadas pelos professores
sino, compreendendo a avaliação como ponto de e o modo como desenvolviam os conteúdos,
partida e de chegada da ação docente” (p. 79). Para segundo seus próprios relatos. Nesse sentido, “a
a autora, a avaliação deve ser utilizada preocupação com os resultados parecia impedir
que aprendessem sobre o real conhecimento
adquirido pelos alunos e sobre o seu ensino”
como elemento mediador para replanejar a ação e
(p. 127). A pesquisadora relata que a aplicação
refletir acerca dos níveis de construção do conhecimento
do aluno. [...] há que se considerar não somente os de prova escrita era o principal instrumento de
conteúdos a serem avaliados, mas ainda os próprios verificação da aprendizagem, no entanto, outras
109
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
atividades realizadas pelas crianças, bem como diferentes estratégias avaliativas, no que diz res-
a sua participação em sala de aula, ajudavam a peito aos processos vivenciados, aos conteúdos
compor a nota final. Resende (2017) analisa que ensinados e aprendidos e às metodologias utili-
as docentes “mostraram suas limitações quanto a zadas. Tudo isso foi balizado por critérios de ava-
aliar avaliação e aprendizagem, preocupando-se liação construídos coletivamente em situações
mais com os resultados do que com os processos ede assembleia. Silva (2009) explica que a defini-
acrescentando pontos para que as notas ficassem ção das instâncias de avaliação, dos critérios e
num nível elevado, embora não representassem o instrumentos a serem utilizados para a avaliação
conhecimento dos alunos” (p. 131). dos educandos são estabelecidos coletivamente.
Busca-se avaliar, inclusive, o processo de ensino
O desafio das professoras, segundo Resende vivenciado com a família e a escola.
(2017), era desenvolver uma avaliação que fosse
além de atribuir nota, aprovar ou reprovar me- A autora explica que a avaliação envolve
diante provas escritas ou orais. Uma avaliação todos os momentos e, também, os recursos
que promova a aprendizagem do estudante na que o professor utiliza durante o processo de
medida em que “considera o ritmo de aprendiza- ensino-aprendizagem, e o principal objetivo é
gem do aluno, seu progresso em relação à aqui- “o acompanhamento do processo formativo
sição dos conteúdos e o desenvolvimento de ha- dos educandos, verificando como a proposta
bilidades, considerando as contingências que o pedagógica vai sendo desenvolvida ou se
cercam e o esforço despendido”. Segundo a pes- processando, na tentativa da sua melhoria, ao
quisadora, os professores entrevistados demos- longo do próprio percurso” (SILVA, 2009, p. 223).
travam pouca familiaridade “com a necessidade São consideradas as seguintes dimensões de
de avaliar de forma a contemplar o modo como aprendizagem: “a avaliação dos conteúdos,
desenvolviam suas aulas. Afirmaram que faziam o a avaliação da participação dos sujeitos no
possível para que todos os alunos aprendessem e processo ensino-aprendizagem, a avaliação das
obtivessem boas notas, apresentando uma pos- metodologias e dinâmicas utilizadas durante o
tura de quem estava ao lado do aluno” (p. 131). trabalho” (SILVA, 2009, p. 223).
A maioria das produções que abordaram a No que toca a avaliação da participação dos en-
avaliação da aprendizagem fazem referência volvidos no processo ensino-aprendizagem, bus-
a prova, atividades, tarefas e trabalhos como ca-se “verificar os níveis de motivação, interesse,
instrumentos de avaliação. Apenas as teses de iniciativa, criatividade do grupo, o envolvimento
Silva (2009) e Stefanelli (2018) abordaram mais nas atividades, as atitudes com relação aos com-
especificamente a realização de autoavaliação promissos e as tarefas individuais e coletivas”
pelos alunos. (SILVA, 2009, p. 224). Para tanto, uma das estraté-
gias utilizadas é a autoavaliação, em que os es-
As escolas de campo investigadas por Silva tudantes consideram “a sua participação e com-
(2009) têm em comum a interação da escola com promisso nas diferentes atividades desenvolvidas
a comunidade, o que redimensionou os espaços no tempo escola e no tempo família” (SILVA, 2009,
educativos, o tempo curricular e o trabalho do- p. 257). A pesquisadora relata a tranquilidade e
cente. A pesquisadora observou nessas escolas seriedade com que os alunos realizam a autoa-
110
O que evidenciam as pesquisas em educação
111
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
os eles. Goulart (2011) relata que os portfólios poderiam “expressar, sem constrangimento,
produzidos pelos alunos, durante 15 encontros, especificidades do processo de aprendizagem,
foram fonte de avaliação, pela professora, das conhecimentos construídos, ansiedades em
aprendizagens dos alunos que, individualmente, relação às dificuldades de compreensão das
recebiam bilhetes que lhes permitiam acompanhar leituras, comentários, sentimentos, dificuldades
a própria trajetória. “Os conhecimentos produzidos de relacionamento com a professora, necessidade
e aqueles que necessitavam adquirir (conceitos de auxílio” (GOULART, 2011, p. 145).
geográficos e habilidades de leitura e escrita) eram
referidos por meio de bilhetes, linguagem por Para Goulart (2011), o portfólio coloca em evidên-
meio da qual efetivava a conversação” (GOULART, cia as características de uma avaliação de proces-
2011, p. 144). A pesquisadora explica que essa so, o que significa que as dificuldades podem ser
interlocução sistemática permitiu à professora não identificadas, trabalhadas e superadas. Logo, “esse
só compreender o processo de aprendizagem, mas, acompanhamento da trajetória da aprendizagem
sobretudo, fazê-los compreender o conhecimento permite que professor e aluno compartilhem cada
como algo que se adquire na convivência com etapa da aprendizagem e planejem ações mais
o outro. Segue o relato de como o portfólio foi condizentes com as demandas” (p. 148).
proposto aos alunos:
112
O que evidenciam as pesquisas em educação
• transmitir aos alunos a avaliação dos resul- mico, desenvolvimento social e emocional, cola-
tados com relação às suas capacidades e boração” (LEPAGE; DARLING-HAMMOND; AKAR,
ao esforço realizado; e 2019, p. 280) e, ainda, a construção de atitudes.
• promover práticas de autoavaliação para
que o aluno tenha a oportunidade de Os resultados das pesquisas analisadas co-
regular a própria aprendizagem, o que locam em evidência algumas das práticas
favorecerá a aquisição de autonomia de que contribuem para a gestão da classe e
forma progressiva. que foram agrupadas nas seguintes cate-
gorias, a saber:
113
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
participante da pesquisa de Lopes (2013, Apesar das combinações realizadas, no dia a dia os alunos
p. 159), três aspectos podem ser destacados: apresentam alguns comportamentos que requerem
(i) a necessidade de estabelecer com as turmas uma ação bem pontual por parte do professor [...].
normas de convivência e que as relações sejam Essas combinações são resgatadas no dia a dia, conforme
de respeito; (ii) a importância de que as normas/ surge a situação já vou pontuando, não deixo passar
(LOPES, 2013, p. 123, 129).
combinados sejam recorrentemente lembrados/
retomados; (iii) o imperativo de cuidar para que
os alunos tenham uma participação ativa nas Vê-se que o contrato pedagógico por si só não
aulas e estejam sempre com os seus materiais. garante que o que foi acordado seja cumprido
por todos, é preciso cuidar diariamente das
Os outros quatro professores que participaram condições de funcionamento das relações que
da pesquisa de Lopes (2013, p. 123), que analisou se estabelecem em sala de aula no âmbito
práticas pedagógicas de professores de língua acadêmico, relacional e afetivo, lembrando que o
portuguesa de escolas da cidade de Porto Alegre, contrato não opera em uma dimensão proibitiva.
que haviam atingido as metas de 2009 propostas Como bem destaca Aquino (2002), ao contrário,
pelo Ideb, reiteram esses mesmos aspectos. os combinados permitem aos professores e
alunos conhecer o que é necessário para que se
Todos eles abordam o cuidado em estabelecer possa dar conta da efetivação do processo de
normas de convivência e combinados relativos ensino-aprendizagem.
à dinâmica das aulas e do desenvolvimento do
programa da disciplina. Relatam que a organização Lopes (2013) analisa variadas situações viven-
das normas acontece no primeiro dia de aula e, ciadas pelos professores que participaram do
nessa ocasião, conversam com os alunos sobre estudo, destacando o cuidado e empenho em
a importância de se estabelecer normas para promover um clima de aula pautado em rela-
um convívio mais produtivo entre professor e ções de confiança e respeito e, também, as di-
alunos e entre os alunos. De modo geral, são ficuldades por eles vivenciadas em relação ao
destacados os seguintes pontos: atitudes de comportamento de alguns alunos, como, por
respeito, educação e cortesia; respeito às regras exemplo: desrespeito com colegas e professo-
escolares; responsabilidade para com os estudos; res, uso de palavras de baixo calão e, pontu-
e pontualidade nas entregas de trabalhos. almente, roubo de materiais e agressão física.
Pelos relatos dos professores e situações de ob-
Também é unânime entre os professores a ne- servação da pesquisadora, esses eventos têm
cessidade de os alunos terem de ser lembrados e sido conduzidos pelos professores com certa
cobrados diariamente de que existe um contrato tranquilidade e, normalmente, contam com o
pedagógico. Nas palavras dos professores Adria- apoio da equipe gestora.
na, Bruno e Daniela, respectivamente:
LePage, Darling-Hammond e Akar (2019)
Sempre que eu vejo que tem mais de três ou quatro que descrevem pesquisas que retratam que o
estão saindo fora do que foi pensado, do combinado, comportamento do professor exerce efeito
eu retomo [...] faço uma fala reforçando a importância significativo sobre o comportamento e a
do que combinamos e logo tenho o retorno dos alunos
aprendizagem dos alunos. Isso significa dizer
(LOPES, 2013, p. 120).
114
O que evidenciam as pesquisas em educação
que o professor que está sempre em estado diálogo da professora com as crianças sobre o
de alerta em sala de aula, ou seja, atento aos conceito de regras e registradas em um cartaz
comportamentos e às interações, tem maior que ficou afixado na sala de aula, ao longo do ano
possibilidade de intervir e lidar com situações letivo. Em outro momento, quando a professora
novas/inusitadas ou possíveis problemas. retoma as regras da turma por meio da leitura
coletiva do cartaz, tendo em vista validar as
O estudo de Piccoli (2009) também analisou normas, conversa com as crianças sobre as suas
situações relacionadas à prática pedagógica atitudes em relação a cada regra estabelecida
de uma professora alfabetizadora no que diz anteriormente, registrando, inclusive, a realização
respeito à sua atuação em sala de aula para de novos acordos.
promover relações de cooperação, respeito,
responsabilidade e autonomia, especialmente O clima harmonioso de ensino e de aprendizagem
no que se refere aos princípios de convivência foi observado pela pesquisadora nas aulas que, se-
presentes na sala de aula. gundo Piccoli (2009, p. 158), têm origem nos “acor-
dos explícitos entre os alunos e a professora e, so-
A análise dos dados se deu na perspectiva da bretudo, na sua própria postura pedagógica, carac-
teoria bernsteiniana e da noção de dispositivo terizada pelo equilíbrio entre a afetividade e o limite
pedagógico. A autora discute as relações entre necessários, mostrando-se compreensiva e sensível
o discurso instrucional e o discurso regulador no diante das situações difíceis de vida” vivenciadas por
que se refere às regras do dispositivo pedagógico. algumas crianças, mas também tinha uma postura
O primeiro diz respeito aos conhecimentos, “firme quando era preciso (sobretudo nas situações
competências cognitivas e processos científicos, de desrespeito entre colegas)”.
chamados de “conteúdos” instrucionais. O segundo
contempla atitudes, valores, regras de conduta Piccoli (2009) explica que foi o equilíbrio no dis-
e princípios de ordem social, denominados de curso regulador, em primeiro lugar, que possibi-
“conteúdos” do discurso regulador (PICCOLI, 2009). litou que todas as outras dimensões da prática
A autora explica que, segundo Bernstein (1998), pedagógica, especialmente as que se referem ao
o discurso regulador é o dominante, uma vez discurso instrucional, fossem desenvolvidas de
que, como discurso moral, “regula os critérios que modo a proporcionar a aprendizagem dos alu-
produzem o caráter, a maneira de ser, a conduta e nos. A autora destacou que a ênfase na conside-
a postura dos sujeitos. Ele cria as regras de ordem ração que a professora tem por todas as crianças
social, uma vez que estabelece, na escola, o que as nas situações de aprendizagem, retratada na ma-
crianças devem/podem fazer, onde podem ir, como neira como valoriza a participação de cada uma
devem agir, que ideal formar” (PICCOLI, 2009, p. 28). de acordo com suas possibilidades, respeitando
as diferenças individuais, é um dos princípios que
Piccoli (2009) relata o evento em que a professora regula a sua ação pedagógica. Acrescenta, ainda,
alfabetizadora estabeleceu, com as crianças, que a solidariedade entre os alunos é outro valor
os princípios de convivência, privilegiando promovido e estimulado pela professora “tanto
“competências sociais, tais como cooperação, pelo incentivo ao auxílio mútuo no momento de
respeito, responsabilidade e autonomia” (p. 156). realização de atividades quanto pelo empréstimo
As normas foram estabelecidas após um longo de material escolar” (PICCOLI, 2009, p. 157).
115
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Zibetti e Souza (2010) também relatam a prática mantê-los(as) ocupados(as) enquanto auxilia as
de uma professora alfabetizadora que guarda al- crianças mais lentas” (ZIBETTI; SOUZA, 2010, p. 467).
gumas semelhanças com o estudo de caso de-
senvolvido por Piccoli (2009). A análise da gestão Ainda em relação à gestão da classe da professo-
da classe dessa professora evidenciou que ela ra alfabetizadora, as autoras também observaram
atua com base em um amplo conjunto de infor- que ela dialoga com cada um dos alunos, possi-
mações sobre as crianças e sobre as possibilida- bilitando a adequação da intervenção às necessi-
des didáticas de sua atuação pedagógica. Rela- dades das crianças, além de colocar-se como uma
tam algumas das práticas mobilizadas pela pro- participante do grupo. Zibetti e Souza (2010) ob-
fessora que favorecem a criação de um clima de servaram um episódio em que a professora está
aula pautado em relações de confiança e respei- sentada em roda com crianças e uma das alunas
to. Destacam, por exemplo, que a professora va- demonstra “intenção de compartilhar com os co-
loriza os combinados na gestão da aula e procura legas aquilo que ouviu de sua mãe, mas, ao fazê-
deixar claro seu papel de gestora da classe. As -lo, sente-se intimidada e a professora vem em seu
pesquisadoras observaram um episódio em que auxílio com perguntas que garantem à aluna sua
um dos alunos desafiou as regras estabelecidas, participação na atividade” (p. 467).
quando as crianças se preparavam para mudar
de ambiente e observaram que, diante da reação As autoras falam da complexidade do trabalho
do aluno, a docente, imediatamente, retoma os com crianças pequenas e ressaltam que, entre
combinados que devem guiar o comportamento aquilo que o professor planeja e a realização
da turma e chama a atenção das crianças para as da intervenção, há situações que não podem
consequências decorrentes da violação das re- ser antecipadas. Nessas ocasiões, os docentes
gras já explicitadas. “precisam lançar mão dos saberes disponíveis,
mobilizando-os em favor dos objetivos traçados
Para Zibetti e Souza (2010, p. 467), uma situação e modificando-os nas circunstâncias de atuação”
como essa requer que se mobilize uma série (ZIBETTI; SOUZA, 2010, p. 466). As autoras recorrem
de saberes que permitam ao docente atuar, “ao a Erickson (1982) para chamar a atenção para o
mesmo tempo, com a sala toda e com cada componente de improviso presente em situações
um(a) dos(as) alunos(as)”. Essa mobilização e de interação em sala de aula. Explicam que
movimento também ocorrem quando os alunos
estão realizando atividades e a professora precisa
as lições escolares podem ser definidas como ‘encontros
estar atenta não só ao desempenho do grupo,
educacionais’, pois são situações em que professores
mas, também, das duplas e de cada criança. Para e alunos seguem regras normativas, culturalmente
tanto, ao mesmo tempo atende as duplas ou cada aprendidas, mas também inovam juntos, dando novos
aluno em suas carteiras. Sempre que percebe sentidos a circunstâncias do momento. Nesse processo,
que uma criança concluiu a atividade, acrescenta os alunos são considerados participantes ativos e não
mais um exercício ou propõe outra atividade. apenas destinatários da ação do professor (ZIBETTI;
As autoras explicam que “o oferecimento de SOUZA, 2010, p. 468).
tarefas extras para as crianças que concluem
o exercício, tais como leitura de livros, revistas, A improvisação na gestão da classe é abordada
fichas ou a realização de desenhos, contribui para na tese de Resende (2017), que investigou
116
O que evidenciam as pesquisas em educação
práticas de três docentes no 5º ano do ensino A autora recorre a Rego (1996) para analisar a
fundamental sob a perspectiva dos alunos, das questão da indisciplina, que normalmente é
próprias professoras e da pesquisadora. No que vista pelos próprios professores como um fator
diz respeito à gestão da classe, a autora relata que dificulta o aproveitamento dos alunos. Isso
que as docentes afirmaram que aprenderam, no significa dizer que uma condição necessária para
exercício do trabalho, a improvisar, a ter paciência o bom aproveitamento escolar está ligada ao
e a ter cuidado com o que falavam em sala de cumprimento de regras que possibilitam uma
aula e, ainda, que algumas estratégias de ensino e convivência harmoniosa nesse espaço. Entretanto,
de manejo de sala de aula às vezes funcionavam como bem destaca Resende (2017, p. 191), os
e outras vezes não. Falaram da importância de conceitos de disciplina e indisciplina “não são
ter controle sobre o trabalho desenvolvido em estáticos e se relacionam a um conjunto de valores
sala de aula e, sobretudo, de saber conduzir uma que vão se transformando ao longo do tempo e
classe em seu aprendizado. de diferentes formas em diversas culturas”. Ainda
fundamentada em Rego (1996), a autora reforça
A pesquisadora explica que a improvisação a importância de as normas na escola deixarem
também fazia parte da rotina docente. Embora de ser vistas como prescrições inibidoras de
todos os três professores tenham afirmado que determinados tipos de comportamento, e
suas aulas são planejadas, essa preparação nem passarem a ser compreendidas como condição
sempre correspondia às necessidades ou à necessária ao convívio social.
realidade da turma. Para Resende (2017, p. 122),
“as incertezas do cotidiano, as flutuações de É importante considerar que as respostas para
humor dos alunos, a falta de tempo para planejar a melhor maneira de lidar com a indisciplina
e a escassez de recursos para desenvolver o na sala de aula podem estar no tipo de vínculo
trabalho em sala de aula podem levar a situações pedagógico que o professor estabelece com os
em que a improvisação se torna inevitável e até alunos, o que inclui a maneira como conduz a
mesmo bem-vinda”. gestão dos aprendizados e a gestão da classe.
Resende (2017) observou que as professoras ti- É importante ressaltar que, diante de compor-
nham a preocupação em criar um clima de cola- tamentos disruptivos em sala de aula, há muitas
boração e respeito na sala de aula, incentivando estratégias e possibilidades a que o professor
os alunos a ajudar uns aos outros. No entanto, de pode recorrer. Entretanto, as escolhas, segundo
modo geral, a pesquisadora percebeu que a difi- LePage, Darling-Hammond e Akar (2019, p. 293),
culdade de gerir a indisciplina de algumas crian- devem ser “baseadas em vários fatores, que in-
ças se apresentava como um ponto de tensão cluem a situação e as necessidades particulares
que “os professores parecem enfrentar todos os de aprendizagem do aluno, a história compor-
dias: o desafio de manter a turma atenta aos con- tamental dele, o contexto da turma, a gravidade
teúdos estudados, evitando conversas paralelas do problema e a política escolar”. Para os auto-
que não estejam relacionadas à aula, especial- res, em situações de gestão do comportamento
mente durante as explicações sobre a matéria, dos alunos, também é necessário analisar a cau-
desenvolvendo um clima de respeito e coopera- sa subjacente e a gravidade, o que inclui avaliar
ção na escola” (RESENDE, 2017, p. 116). a frequência e duração do comportamento.
117
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
118
O que evidenciam as pesquisas em educação
sala de aula, mostrando como esse saber pode colaboração se dá em ambientes e processos
favorecer a aprendizagem, a convivência e a sa- democráticos, pelos quais professor e alunos
tisfação no âmbito escolar”. O autor buscou ana- entendem que ambos aprendem e ensinam, ou
lisar os fundamentos teórico-metodológicos que seja, que existe conectividade na relação profes-
dão suporte às práticas pedagógicas de ensino- sor/aluno (dodiscência), que deve ser estimu-
-aprendizagem com audiovisuais desenvolvidas lada e que pode ser fortemente facilitada pela
na escola básica, destacando sua condição de linguagem contemporânea do audiovisual. Os
método ativo e colaborativo, tomando como re- estudantes também relataram as dificuldades
ferência teórica Paulo Freire para discutir as cate- de vivenciar processos colaborativos, ressaltan-
gorias conectividade e dodiscência. do que eles próprios têm pouca vivência social
por meio de uma perspectiva cooperativa e co-
Para Stefanelli (2018, p. 149), saber colaborar, é a letiva. Avaliam que, fora dos muros da escola, as
pessoas estão sendo formadas em um viés mais
competitivo do que cooperativo.
condição essencial para que haja conectividade nas
atividades dodiscentes de ensino-aprendizagem,
Para Stefanelli (2018, p. 165), o bom professor
conseguindo diminuir inclusive o famoso antagonismo
que ocorre entre professores e alunos na maioria“é aquele que possui uma prática de ensinar
que tende a desenvolver a conectividade
das escolas brasileiras [...] fruto de relações estáticas
com os discentes, para que, juntos, adquiram
preconizadas por muitos: o professor manda e ensina;
o aluno obedece, escuta e, se conseguir, aprendea capacidade crítica de aprender”. Acrescenta
(STEFANELLI, 2018, p. 149). ainda, que na prática dodiscente a conectividade
se dá pelo debate, em que se busca superar a
A autora analisou várias falas de ex-alunos que ambiguidade vivida entre autoridade e liberdade
participaram de uma proposta de trabalho em no processo pedagógico, constituindo, assim,
sala de aula em que a colaboração era condição ambientes democráticos.
sine qua non. Sua análise das verbalizações con-
siderou alguns aspectos a esse respeito: (i) que Um aspecto transversal nas pesquisas que
para existir colaboração, é indispensável viven- abordaram a importância de as relações na
ciar experiências “em” e “com” o grupo, o que sala de aula serem pautadas na confiança e no
implica a dialogicidade de tanto saber aceitar, respeito, construindo assim um clima amistoso e
como fazer críticas construtivas; (ii) que a cola- favorável à aprendizagem, é o de os professores
boração contribui para ampliar a estrutura cog- criarem vínculos com os alunos, o que pressupõe
nitiva dos aprendentes, por meio do diálogo, o conhecê-los e, mais especificamente, saber o
que favorece a conectividade e a dodiscência; que eles pensam, o que sentem, quais as suas
(iii) que o saber colaborar perpassa pelo ato de condições de vida, necessidades e expectativas.
o professor saber aprender-ensinar com outros,
o que significa criar um ambiente propício, sem A tese de Santos (2017), por exemplo, desenvol-
abreviar os processos de construção de conhe- vida com professores dos anos finais do ensino
cimentos pelos alunos à medida que expõe fundamental, discorre sobre esse aspecto com
unicamente suas próprias ideias para acelerar destaque ao lugar (ou não) da cultura juvenil na
a produção do grupo de educandos; (iv) que a sala de aula e na escola. A autora teve por obje-
119
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
120
O que evidenciam as pesquisas em educação
• cuida para que os alunos sejam ativos nas Zabala (1998) explica que reunir um grupo de
aulas, valorizando a participação de cada alunos da mesma idade, em uma mesma aula,
um deles de acordo com suas possibilida- e dependentes de um professor ou de diversos
des, respeitando as diferenças individuais. professores é a forma mais habitual de organizar
os alunos, que teve início no século XVI. Apesar
de terem surgido, no final do século XIX e início
Organização do espaço da classe e do século XX, outras formas de organização
das interações que rompem com esse modelo único (como,
por exemplo, grupos fixos e móveis, equipes de
“A professora organiza o espaço da sala de aula
conforme sua ação e intenção pedagógica. Durante as
trabalho, grupos homogêneos e heterogêneos,
aulas acompanhadas, percebemos a preferência pela estudos individualizados), o que predominou
disposição das mesas em forma de U, privilegiando, nas escolas foram os processos individuais de
por um lado, o trabalho coletivo em grande grupo, mas aprendizagem. A afirmação do autor, nos anos de
também possibilitando a realização de intervenções 1990, de que dificilmente as escolas realizam uma
individuais. Também houve o agrupamento das reflexão fundamentada das opções disponíveis
crianças em duplas, trios ou quartetos, para motivar para a organização do espaço da classe e das
a interação e o auxílio mútuo entre elas [...]. Outra interações ainda é verdadeira.
forma recorrente de organização do espaço, na prática
pedagógica examinada, são as rodas para conversa
Apenas cinco dos estudos analisados trataram,
ou para leitura”.
de uma forma mais detida, a organização do
Este relato, extraído da tese de Piccoli (2009, espaço da classe e das interações e sua relação
p. 159), retrata diferentes formas de organização com o aprendizado dos alunos. Outros cinco
do espaço da classe e das interações a depender fazem referência principalmente ao uso ou não
da intenção pedagógica do docente. Isso significa do trabalho em grupo, sem uma análise das
dizer que as escolhas em relação às formas formas de agrupamento como parte da gestão
possíveis de agrupamento dependem de vários da classe pelo professor.
aspectos, como, por exemplo, os objetivos de
aprendizagem, as necessidades formativas dos Nas teses de Rodrigues (2014) e Lima (2017), da
alunos, os tempos, os espaços, as caraterísticas área da matemática, por exemplo, as autoras
dos estudantes, dentre outros. Para Zabala (1998), relatam que a orientação para o trabalho em
em uma mesma sequência didática, é desejável equipe foi presenciada poucas vezes nas aulas
que se recorra “a formas diversas e sucessivas de observadas e, portanto, o trabalho individual
agrupamentos dos alunos e de organização das foi soberano. Ambas as pesquisadoras relatam
atividades que serão mais adequadas do que o cenário de ensino frontal, do professor
outras para os objetivos que se quer alcançar” trabalhando com toda a turma ao mesmo tempo
(ZABALA, 1998, p. 135). Logo, a forma de agrupar e os alunos sentados em fila.
os estudantes não é simplesmente uma decisão
técnica definida previamente pelo professor, Rodrigues (2014) menciona um estudo de
bem como não é independente do que se quer revisão de literatura sobre o efeito-escola e o
ensinar ou do aluno que se deseja formar. efeito-professor, de Bressoux (2003), em que já se
observava que
121
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
os alunos da escola elementar até os primeiros anos do entre colegas, conversação, diálogo, autonomia,
collège – equivalente ao nosso ensino médio, passavam corresponsabilidade” (LIMA, 2017, p. 63).
mais tempo fazendo exercícios individuais do que em
qualquer outra atividade e que, embora o objetivo dos Santos (2017), que desenvolveu um estudo com
professores considerados eficazes fosse levar os alunos a
professores que atuam nos anos finais do ensino
dominarem a resolução dos exercícios, o nível de atenção
fundamental da rede municipal de ensino de Por-
e envolvimento dos alunos nessa atividade individual era
to Alegre com o objetivo de analisar os processos
menos elevado (RODRIGUES, 2014, p. 110).
de recontextualização curricular protagonizados
por eles, traz um exemplo de uma professora de
Nesse caso, um dos desafios do professor é saber matemática que adotou o trabalho em grupo ao
como manter os alunos engajados na tarefa, o “identificar que a presença dos alunos era muito
que “envolveria uma sólida compreensão dos oscilante e que isso provocava níveis distintos de
conceitos pelos alunos, além da supervisão direta aprendizagem, uma vez que os alunos acabavam
do trabalho do aluno pelo professor, circulando não participando de forma homogênea das au-
pela classe e fornecendo explicações breves aos las” (SANTOS, 2017, p. 264). Observou, portanto,
que tivessem necessidade” (RODRIGUES, 2014, no trabalho em grupo, uma estratégia profícua
p. 110). Ao contrário do que alguns professores para evitar situações de indisciplina e para pro-
céticos podem pensar, é possível o professor mover aprendizagens mais equitativas. A autora
introduzir formas de agrupamento que facilitem relata que essa professora
a aprendizagem, como, por exemplo, organizar
os alunos em grupos ou duplas, em equipes
reconhece ser muito difícil atingir e atender a todos, por
móveis ou fixas.
isso o trabalho colaborativo entre os alunos tornou-se para
ela uma estratégia importante. Assim, com postura firme
Lima (2017), fundamentada em Zabala (1998), e rigorosa, ela passava boa parte da aula atendendo os
explica que essas formas de organização do grupos e alunos de maneira bastante personalizada, tirando
espaço da classe e das interações favorecem dúvidas, esclarecendo a matéria. Além disso, ela realizava
atividades avaliativas com muita frequência e deixava isso
bastante explícito para os estudantes. Em quase todas as
o atendimento às características diferenciais da aulas os alunos precisavam produzir algo para entregar
aprendizagem dos alunos porque permite distribuir para a professora. Os alunos se envolviam muito nas
trabalhos em pequenos grupos; permite ao professor atividades, porque sabiam que estavam sendo avaliados.
atender aqueles grupos ou alunos que mais necessitam; Ela providenciava as correções muito rapidamente, o
permite distribuir tarefas conforme possibilidades e que deixava os alunos muito envolvidos com os retornos
interesses ou que exijam diferentes níveis de elaboração; das atividades. Quando o resultado não era satisfatório, a
permite um atendimento personalizado por parte do professora em geral solicitava correções, que permitiam aos
professor; possibilita que os próprios alunos se ajudem alunos melhorarem suas ‘notas’. Tais dinâmicas tornavam a
entre si (LIMA, 2017, p. 63). aula de matemática geralmente os momentos nos quais
os alunos mais se envolviam e apresentavam menos
A autora acrescenta, ainda, que trabalhos em problemas disciplinares (SANTOS, 2017, p. 264).
duplas e grupos permitem ter como “conteúdo
de aprendizagem saber trabalhar em equipe, Como bem argumentam Cohen e Lotan (2017, p. 7),
que implica distribuição de trabalho, colaboração o trabalho em grupo, quando bem empregado e
122
O que evidenciam as pesquisas em educação
Apesar das vantagens do trabalho em grupo, é Era preciso que os alunos entendessem o real sentido do
comum professores relatarem o enfrentamento trabalho em grupo, o que não poderia ser feito através de
123
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
aulas expositivas, mas discutindo as ações produzidas a cisarão para o trabalho proposto. As autoras tam-
partir do momento em que escolhessem os colegas com bém chamam a atenção para o comportamento
quem iriam trabalhar. Encaminhar o trabalho em grupo de grupos orientados por tarefas. Há, segundo as
com aqueles alunos significava ensiná-los a produzir co-
autoras, problema de status, que se baseia em di-
nhecimento, orientá-los para que compreendessem o
ferentes expectativas de competência, e de hostili-
sentido dessa atividade e o que ela demandaria. Estavam
dade, indiferença ou falta de confiança: “um grupo
reunidos para aprender não só informações geográfi-
cas. Era um exercício de organização, de autonomia, de pode ser amigável e confiável e ainda assim apre-
respeito às diferenças, a colaboração. Essas eram carac- sentar uma hierarquia de status acentuada, com
terísticas fundamentais para que houvesse produção de alguns membros sendo percebidos como muito
conhecimentos (GOULART, 2011, p. 117). mais competentes do que outros” (COHEN; LOTAN,
2017, p. 27). São vários, portanto, os aspectos que
envolvem a condução de trabalhos em grupo, que
A autora avalia que parte das dificuldades vão desde preparar os alunos para a cooperação,
encontradas pelos alunos no trabalho em grupo definir papéis e responsabilidades, passando pelo
diz respeito às fragilidades e às dificuldades que planejamento do professor e pelo seu papel na
tinham para ler e escrever. Relata que em todos os gestão dos grupos, até as ferramentas para avaliar
grupos foi preciso uma ação diretiva da professora o trabalho em grupo na sala de aula.
para concretizar a organização dos materiais, bem
como a produção do trabalho final. Considera A professora de ciências que participou do estudo
que as interações indispensáveis à configuração de Melgaço (2015) organiza, recorrentemente, os
dos grupos tinham alguns limitantes – alunos no que denominou de grupos colaborati-
vos. Para ela, quando os alunos estão organizados
nesses grupos, eles têm a oportunidade de inte-
entre eles, aqueles ligados à participação. Trabalhar em
ragir, trocar ideais, refletir e formular explicações
grupo requer colaboração. Isso significava desprender-se
de algumas posições em relação à liderança e assumir consensuais sobre os fenômenos em estudo.
fragilidades cognitivas, o que nem todos estavam Para tanto, os estudantes precisam se apropriar
dispostos a fazer (GOULART, 2011, p. 129). das ideias científicas que, nesse caso, são gradu-
almente inseridas pela professora nos momentos
de discussão coletiva. A pesquisadora observou
A pesquisadora esclarece que a professora in- que a professora não só envolve os estudantes,
sistiu em criar situações de trocas, de colabora- como se envolve também durante todo o traba-
ção e de participação, porém obteve êxito em lho. Ela conduz e orienta a gestão da classe de
poucas situações. forma planejada, consciente e intencional, e não
deixa de observar ações individuais e específicas
Cohen e Lotan (2017) explicam que alguns dos dos estudantes, pois por mais que o aprendiza-
problemas motivacionais, disciplinares e de par- do possa se apoiar em um processo interpessoal
ticipação desigual podem estar associados ao e compartilhado, é sempre, em última instância,
“insucesso do professor em escolher e definir a uma apropriação pessoal.
tarefa mais adequada para a situação do trabalho
em grupo” (p. 26), bem como a falta de clareza de Recorrer a diferentes formas de agrupamento dos
como preparar os alunos nas habilidades que pre- alunos é uma prática que pode permitir ao professor
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O que evidenciam as pesquisas em educação
125
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
verifico se aprenderam o ‘processo’ para prosseguirem e Os autores explicam que o estudo das interações
busco desenvolver uma relação em sala onde todos dão o discursivas parte do pressuposto de que a
seu melhor. Eles participam, gostam das aulas de ciências linguagem é um artefato cultural mediador entre
e se envolvem com o conteúdo para aprender (MELGAÇO, o conhecimento e os aprendizes, e a ênfase recai
2015, p. 132).
sobre os intercâmbios que se estabelecem entre
os alunos, o professor e a aquisição da linguagem
Esta fala retrata a preocupação da professora em científica. Explicam, fundamentados em Altet
desenvolver um ensino mais dialogado com os (2000), que o êxito das estratégias de ensino
estudantes, promovendo o debate de opiniões mobilizadas pelo professor mantém relação
e ideias, escutando e respeitando os alunos. A intrínseca com as interações verbais promovidas
professora, segundo Melgaço (2015, p. 96), cuida em sala de aula, constituindo, assim, um dos
para usar uma linguagem clara e, também, se fatores determinantes do processo ensino-
preocupa em promover, por meio de interações aprendizagem. A investigação da linguagem
dialógicas, “o desempenho comunicativo e e das interações discursivas no ensino de
a apropriação da linguagem científica pelos ciências, segundo os autores, pode contribuir
estudantes” (MELGAÇO, 2015, p. 96). É nesse “para a compreensão de como professores
contexto que, segundo a autora, “as estratégias oportunizam a seus alunos os espaços e tempos
de ensino atuam também como mecanismos para sua participação ao redor da construção
reguladores e direcionadores da ação docente” do conhecimento científico em sala de aula”
(MELGAÇO, 2015, p. 132). (SANTOS; SANTOS; SILVA, 2014, p. 244).
A gestão da rede comunicativa que se estabelece Santos, Santos e Silva (2014) relatam que os
na aula é tratada em apenas quatro pesquisas resultados obtidos na pesquisa indicaram que
de forma um pouco mais aprofundada e, os alunos submetidos à prática do professor
normalmente, relacionada à discussão sobre que exerce maior controle sobre a comunicação
as formas de agrupamento na sala de aula, à tiveram menos oportunidade de intervir nas
valorização dos conhecimentos prévios e às atividades. Logo, as situações que se mostraram
contribuições dos alunos e, ainda, à construção mais favoráveis para a consecução das tarefas
de sentidos e motivação e à elaboração e pelos alunos foram aquelas em que os alunos não
consolidação de conceitos. apenas contaram com um canal de comunicação
com o docente, como sentiram maior liberdade
A pesquisa desenvolvida por Santos, Santos e para interferir nas definições e na organização das
Silva (2014) é a única que tomou como objeto atividades que seriam produzidas por eles com
de estudo as interações verbais entre professores base nas instruções do professor.
e alunos envolvendo atividades experimentais.
O estudo foi realizado com dois professores de É importante ressaltar que a qualidade da rede
química do ensino médio e que ensinam em comunicativa está muito atrelada ao papel que o
escolas pertencentes a diferentes contextos professor outorga aos alunos. Há estruturas mui-
socioeconômicos, e os dados foram analisados to lineares, cujas relações são unilaterais e os ní-
sob a perspectiva da sociologia da educação veis de comunicação se limitam à aceitação das
desenvolvida por Basil Bernstein. exposições e critérios estabelecidos pelo profes-
126
O que evidenciam as pesquisas em educação
sor. Por outro lado, os canais comunicativos po- Observa-se que nos três estudos até aqui
dem se ampliar quando a estrutura organizativa apresentados, o de Melgaço (2015), da área de
implica todos os alunos a se sentirem correspon- ciências biológicas, o de Santos, Santos e Silva
sáveis no processo de conviver e aprender. Assim (2014), da área de química e o de Rodrigues (2014),
sendo, atividades comunicativas que fomentam da matemática, destacam a importância de os
a bidirecionalidade das mensagens favorecem a alunos se apropriarem da linguagem científica
aprendizagem entre iguais (ZABALA, 1998). nas redes comunicativas que se estabelecem na
sala de aula.
A tese de Rodrigues (2014) confirma essa discussão
ao estabelecer associações entre diferentes Na tese de Andrade (2015), que teve como ob-
características de gestão de sala de aula com as jetivo analisar práticas docentes em situações de
práticas específicas do ensino da matemática, produção de textos com crianças dos anos iniciais
tendo em vista o desempenho dos alunos. Para do ensino fundamental, também há destaque na
a autora, a maneira como o docente incentiva importância de se promover um ambiente propí-
e organiza a comunicação entre os alunos, cio à interação e ao desenvolvimento da lingua-
negociando os padrões de comportamento gem. Para a autora, a produção de texto coletivo
e estabelecendo o tempo empregado nas exige que o professor tenha uma postura de me-
atividades propostas etc., por exemplo, pode diador na sala de aula, promovendo as condições
influenciar positiva ou negativamente os para que ocorra uma rede comunicativa entre
resultados de seus alunos. Desse modo, “a forma todos os participantes e para que a colaboração
como se estabelece a interação e a comunicação seja uma prática constante.
entre alunos e professores é essencial para que a
sala de aula se constitua em um ambiente com o A autora argumenta que “se concordamos que
clima propício e adequado para a implementação todas as atividades humanas ocorrem a partir
e manutenção de um ritmo de aprendizagem da cooperação entre várias pessoas e que a
profícuo” (RODRIGUES, 2014, p. 59). linguagem é certamente a principal forma de
colaboração entre os seres humanos, pode-se
Rodrigues (2014, p. 50) também avalia a impor- estabelecer uma relação entre seres humanos,
tância de propiciar aos alunos situações em que linguagem e trabalho” (ANDRADE, 2015, p. 53).
eles possam não só “expor suas ideias e validar Para defender essa premissa, a autora recorre
suas hipóteses, mas também para instigar a re- à “perspectiva bakhtiniana que define a lín-
flexão e comunicação sobre os diferentes pro- gua como atividade dialógica, sócio-históri-
cedimentos que eles adotaram na resolução das ca e ideologicamente construída” (ANDRADE,
tarefas matemáticas, e contribuir para o domínio 2015, p. 51). Fundamentada em Bakhtin (2000),
e aprimoramento da linguagem matemática”. A Andrade (2015) explica, “que o ouvinte ou o lei-
autora explica que o professor, ao solicitar que os tor, ao perceber e compreender o significado
alunos expliquem o procedimento por eles usado (linguístico) do discurso, ocupa simultanea-
na resolução de um determinado problema ou mente em relação a ele uma compreensão res-
o porquê de determinada resposta, solicitando ponsiva ativa” (ANDRADE, 2015, p. 52). É com
explicações matemáticas, favorece o desenvolvi- base nessa ideia que Bakhtin (2000) defende
mento da linguagem matemática pelos alunos. a concepção dialógica da linguagem. Logo,
127
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
A pesquisadora observou que as professoras incen- Foram criadas categorias para a modalidade
tivavam a participação das crianças nas atividades que diz respeito às práticas que os docentes
de produção textual coletiva: faziam questiona- realizam não diretamente com seus alunos
mentos aos alunos sobre o que deveria ser escrito na sala de aula, mas em seu desenvolvimento
no texto; não davam respostas prontas; formulavam profissional, individual ou coletivamente, prévia
questões que faziam com que as crianças refletis- ou paralelamente à docência. São elas:
sem para elaborar as respostas. Havia a preocupa-
ção em promover uma rede comunicativa, e cuida-
Categorias de análise da atuação do pro-
vam para dirigir questionamentos às crianças que
fessor com seus pares e com o próprio de-
não estavam participando da aula, seja por motivo
senvolvimento profissional: saberes profis-
de timidez ou por falta de iniciativa.
sionais, reflexão sobre a prática e sobre o
trabalho colaborativo. Essas categorias estão
Para construir uma rede comunicativa em profundamente imbricadas e foram separa-
sala de aula é importante ao professor: das para efeito de análise.
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O que evidenciam as pesquisas em educação
129
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
com base em sua experiência com leituras, tais temas, se esforçam para fazer o melhor. É certo que
palestras, eventos, grupos de estudos e troca tais evidências somente reforçam a ideia que temos sobre
suas inseguranças no momento de ensinar tais conteúdos
com outros docentes na formação continuada.
(SILVA, 2015, p. 98).
Como diz o autor, é um “sujeito que não está
estático, mas sim que procura entrar em sintonia
com as mudanças, sem abrir mão de um ensino Na mesma direção vai Resende (2017), em
de qualidade. Pode-se afirmar, então, que está sua análise sobre o percurso do aprender a ser
permanentemente reinventando a tradição da professor. Depois de entrevistar oito docentes,
educação física escolar” (CARLAN, 2012, p. 93-94). a autora concluiu que as principais fontes de
aprendizagem foram: a) a experiência em sala
A tese de Ciríaco (2016), que reflete sobre o de aula, na voz deles, a aprendizagem na prática
processo de construção do início da docência (62,5% das respostas), que incluía aprender com
entre professoras de matemática, também os próprios alunos; b) o curso de magistério
traz dados críticos sobre as licenciaturas: “os (37,5%); c) com outros professores (enquanto
programas de formação de professores pouco eram alunos) (6,2%); d) em outros cursos, como
têm contribuído para a aquisição dos saberes especializações e mestrado (6,2%)18 (RESENDE,
profissionais para o exercício da docência e 2017, p. 226).
que os professores vão aprendendo os ofícios
da carreira, quando ingressam na profissão” Analisando as dificuldades atribuídas por profes-
(CIRÍACO, 2016, p. 100-101). sores para ensinar química, o artigo de Quadros e
outros destaca as deficiências da formação inicial e
Outro trabalho, que analisa a formação a importância da formação constante:
continuada e a prática docente de professoras
de ciências naturais nos anos iniciais do ensino
Os professores de química, cuja formação foi centrada
fundamental, evidencia justamente – por meio
em disciplinas científicas, sem que o conhecimento
das falas das docentes – a sua falta de domínio fosse problematizado, baseiam-se nestas para realizar
de conteúdo da disciplina de ciências. Apoiando- sua atividade. Nesse caso, os professores podem ter
se em Shulman, Gilson Silva pondera: dificuldade em modelar esse conhecimento, situá-lo no
mundo de vida dos estudantes e voltá-lo para a solução de
situações problemáticas concretas. Considerando que os
Muito do que o professor possui de conhecimento é
conhecimentos profissionais exigem sempre uma parcela
adquirido durante a sua formação, mas vai se modelando
de improvisação do profissional, num processo constante
à medida que se mescla com outros conhecimentos que
de reflexão e discernimento dele, para além da formação
vai adquirindo durante suas práticas. No caso específico
universitária, torna-se necessário que o professor esteja
dessas professoras que ensinam para os anos iniciais,
em constante processo de ‘reciclagem’ ou atualização
isso fica demonstrado quando observamos que, na
(QUADROS et al., 2011, p. 161-162).
maioria das vezes, os conhecimentos que possuem sobre
ciências são incipientes; seus conhecimentos advêm
de suas práticas realizadas durante o período que estão A análise dos dados da pesquisa revelou fatores
ministrando suas aulas. É importante salientar que, embora
de diversas ordens que dificultam o ensino
possuam essa dificuldade, quando necessitam abordar
18 Percentual de respostas (professores responderam livremente e a mais de uma alternativa) e não de respondentes, por isso a soma é maior do que 100%.
130
O que evidenciam as pesquisas em educação
131
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Essa categoria está profundamente imbricada A tese de Karen dos Santos (2016) traz uma pers-
com a anterior – os saberes profissionais – e com pectiva mais sociológica para tratar desse assun-
a próxima – o trabalho coletivo –, e só foi separada to: apoia-se em Margareth Archer para trazer a re-
para efeitos de análise. Isso porque a reflexão sobre lação entre estrutura e agência, que “se traduzem
a prática alimenta-se dos saberes profissionais e, na relação entre hábito – como estrutura já ali
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
134
O que evidenciam as pesquisas em educação
sociais e acadêmicos.
Certamente, não se trata de negar a importância
Por outro lado, a autora também destaca que, em de momentos individuais de estudo, leitura
uma das escolas, o esforço coletivo para definir os e reflexão, mas o que os artigos e teses sobre
conhecimentos que precisam ser desenvolvidos práticas pedagógicas apontam é que, sendo
com os alunos parecem ocupar menor espaço na a aprendizagem e o ensino atividades sociais e
agenda da escola vis a vis a ações de caráter mais interativas, o trabalho em equipe é imprescindível
cultural ou integrador (SANTOS, 2017), revelando em todos os momentos da atividade docente,
que o trabalho colaborativo entre os professores, prévia, posterior ou durante as aulas. Apesar
voltados especificamente para os processos de desse consenso, muitos dos trabalhos analisados
ensino e aprendizagem, nem sempre são fáceis de revelam a dificuldade que é romper com a cultura
serem concretizados, ainda mais continuamente. do isolamento docente. Santos (2017) apoia-se
Como indica Resende (2017), esse modo de em Giméno Sacristán para ratificar que
colaboração entre pares geralmente não é visto
e apoiado pelos professores de ensino.
o individualismo profissional tem sido uma particulari-
dade da forma social de exercer o trabalho docente. [...]
Essa mesma pesquisadora recorre a Shulman O professor que atua individualmente não tem controle
para mostrar como a colaboração pode favorecer sobre certas variáveis de organização escolar, que são
os processos de ação, reflexão e emoção: competência da coletividade [...]. Um estilo individualista
“colaboração é um casamento de insuficiências circunscrito à aula como espaço “natural” de trabalho se
[...]; há dificuldades intelectuais e desafios desenvolve e se firma dentro de um espaço estrito de
profissionais que são quase impossíveis de problemas possíveis no qual só cabem alguns temas,
serem superados por um único professor, mas algumas decisões, algumas opções pedagógicas e não
outras (SACRISTÁN, 2000, apud SANTOS, 2017, p. 164).
são facilmente compreendidos e solucionados
com a ajuda de outros” (SHULMAN, 2004, apud
RESENDE, 2017, p. 51). Na esteira do que algumas Em sua pesquisa-ação com quatro professoras
teses já apontavam no que diz respeito à reflexão iniciantes de matemática, Ciríaco (2016) mostra
sobre a prática, há estudos que trazem autores que muitas das dificuldades que elas enfrentam
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
19 Importante ressaltar que essa aprendizagem colaborativa, construída coletivamente na interação, pode estar presente também na relação professor-
aluno: “os professores juntamente com seus alunos engajam-se em seus projetos na busca de uma resolução de um problema, na criação e produção
de novos saberes que façam sentidos e que os façam viver esses conhecimentos” (SANTOS, 2016, p. 90). De fato, em muitas teses e artigos analisados
está presente a ideia de que os docentes devem incentivar que seus alunos aprendam igualmente a trabalhar de maneira colaborativa.
136
O que evidenciam as pesquisas em educação
Santos (2016) salienta, ainda segundo Wenger, pesquisa na internet do assunto trabalhado na sala, su-
que as comunidades genuinamente de prática geriram a participação dos alunos na atualização do blog
ocorrem mais na informalidade do que em e nas atividades de uso do podcast, participaram na dis-
espaços institucionalizados: são pessoas que cussão e sugestões do roteiro de programação (SANTOS,
2016, p. 171).
buscam interagir com outras para resolver um
problema local, ampliar seu conhecimento
de mundo e melhorar sua prática. Visando à O artigo de Santos Júnior e Marcondes (2013)
esfera das práticas pedagógicas em ambientes também traz estudo que se refere às comunidades
formais, a autora empreendeu uma pesquisa- de prática, tendo por referência Lave e Wenger.
formação na qual propôs o termo e concretizou Trazendo elementos de pesquisa-intervenção,
uma “comunidade de formAção”, o espaço de o trabalho teve por objetivo analisar como um
aprendizagem em que os professores aprendem projeto colaborativo envolvendo professores
juntos práticas multiletradas: de química pode servir de instrumento para a
reflexão dos docentes sobre as suas concepções
e práticas pedagógicas. Na mesma linha das teses
A comunidade de formAção de professores de práticas
citadas, os autores ressaltam que
multiletradas é compreendida como espaço de aprendi-
zagem coparticipativa dos diferentes modos de significar
a linguagem: para si, lendo, ouvindo e vendo (problema- os ganhos obtidos pelos docentes que participaram
tizando); e para o mundo, escrevendo, falando, fotogra- desse projeto colaborativo não se restringiram apenas
fando (atualizando), tecendo ideias uns com outros, com- aos conhecimentos específicos para o exercício da do-
partilhando experiências, aprendendo e desenvolvendo cência. Ao participar do grupo, cada docente desenvol-
arquiteturas pedagógicas possibilitadas pelas tecnologias veu-se no que diz respeito às relações pessoais, como:
móveis (SANTOS, 2016, p. 94). maior tolerância, maior capacidade em lidar com ten-
sões, ponderação em administrar objetivos individuais
E a autora conclui que o trabalho colaborativo e coletivos. Tais capacidades são, sem dúvida, importan-
presente nessa comunidade de formAção tes para os profissionais que exercem atividades sociais,
como a docência, por exemplo. Também foi perceptível
fortaleceu o vínculo profissional entre colegas
o desenvolvimento da argumentação; essa competên-
que trocavam ideias e sugestões e criou diversas
cia pode não ser bem desenvolvida nas licenciaturas e
formas de significar a linguagem digital nas
é outro atributo importante para o professor (SANTOS
relações pedagógicas, concebendo a tecnologia JÚNIOR; MARCONDES, 2013, p. 709).
não apenas como recurso didático para ensinar
e aprender, “mas como dispositivo que amplia as
possibilidades comunicativas entre os professores Mas, ainda apoiando-se em Lave e Wenger, os
que estão juntos aprendendo a compartilhar autores (2013, p. 710) enfatizam que, “se o grupo
ideias” (SANTOS, 2016, p. 142). foi importante no sentido de propiciar a reflexão,
de todos os docentes, das suas concepções
sobre o processo de ensino aprendizagem”, os
Nesse processo de negociação de significados, pode-
resultados obtidos em um projeto colaborativo
mos observar práticas multiletradas dos professores que
juntos discutiram, compartilharam e planejaram ativida- dependem do “grau de engajamento de cada
des para o blog; aprenderam a postar textos, imagens, participante no grupo”.
vídeos, links e a fazer comentários. Mais que isso, fizeram
137
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
Por fim, há uma tese que se apoia na teoria da ou “comunidades de prática”, pois profes-
ação dialógica de Paulo Freire para mostrar a sores que aprendem a refletir juntamente
importância da colaboração (STEFANELLI, 2018). com seus pares colaboram para o desen-
Embora parta de referenciais diferentes, essa volvimento profissional dos outros e se en-
concepção aproxima-se do que foi descrito para riquecem mutuamente.
as comunidades de aprendizagem ou de prática:
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O que evidenciam as pesquisas em educação
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Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
140
O que evidenciam as pesquisas em educação
e de respeito mútuos, e uma rede comuni- O objetivo deste trabalho foi investigar, nas
cativa fluente. Destacam a relevância de dar pesquisas de campo realizadas e publicadas no
atenção à construção de sentidos e à motiva- Brasil sobre práticas docentes na educação básica,
ção dos alunos em relação ao conhecimento as características das práticas pedagógicas que
e ao processo de aprendizagem. Ressaltam se mostram relevantes para as aprendizagens
os cuidados que o professor precisa ter para de crianças, adolescentes e jovens. Buscou-se
promover conexões entre o conhecimento caracterizar as práticas reveladoras de ações
prévio e os conteúdos propostos, o que re- pedagógicas que propiciam a criação de
quer entender e valorizar os conhecimentos ambiências que favorecem aprendizagens –
trazidos pelos alunos e suas vivências cultu- cognitivas e relacionais – na educação básica e
rais, partindo do que sabem ou não, com a identificar suas características e as concepções
preocupação de problematizar questões re- que as fundamentam.
lativas aos conhecimentos curriculares.
Dado tudo o que foi exposto, é possível notar
que são poucas as pesquisas, no Brasil, que
Observam, ainda, a importância de se estimular apresentam alguma conceituação de “prática
buscas, e cuidar dos conceitos e soluções pedagógica”, bem como relatos detalhados e
valorizando a criatividade dos estudantes. E, nessecomentados de práticas docentes encontradas
movimento, sinalizam a necessidade de se estar nas escolas. Tanto a conceituação quanto o relato
atento aos ritmos de aprendizagem e à construção de práticas, em vários estudos, aparecem de
de momentos avaliativos que ajudam a perceber forma implícita ou subjacente.
dificuldades e facilidades que, trabalhadas com os
alunos, favorecem a continuidade do processo de É preciso reiterar que a maioria dos estudos se
seu desenvolvimento cognitivo. utiliza da abordagem qualitativa de pesquisa, e
muitos são estudos de caso. Assim, as práticas
investigadas circunscrevem-se a contextos que
A diversidade de metodologias e de ativida-
não podem necessariamente ser generalizados,
des, o uso de atividades lúdicas, a modulação
mas podem se constituir em inspiração para
de apoios a alunos em momentos específicos,
outros docentes. Este estudo mostra, portanto, a
a facilitação das interações alunos-professor e
quase ausência no país de pesquisas publicadas
alunos-alunos, em que a escuta mútua tem
em artigos de revistas qualificadas e teses de
lugar, e a criação do respeito às diversidades e
às diferenças nas ideias são meios para a cria- doutorado, com relato e análise mais completos,
ção de ambiência na qual o aprender pode como também pesquisas em larga escala (ou
fluir com gosto e ter significado. mesmo uma única pesquisa com vários casos)
sobre práticas docentes, que permitam inferir
Foto: © UNESCO/Edson Fogaça
141
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
142
O que evidenciam as pesquisas em educação
O objetivo deste trabalho foi investigar, nas mesmo uma única pesquisa com vários casos)
pesquisas de campo realizadas e publicadas no sobre práticas docentes, que permitam inferir
Brasil sobre práticas docentes na educação básica, com maior alcance quais ações se mostram
as características das práticas pedagógicas que mais constantes e quais são eventualmente
se mostram relevantes para as aprendizagens mais relevantes.
de crianças, adolescentes e jovens. Buscou-se
caracterizar as práticas reveladoras de ações A maioria dos trabalhos analisados investigam
pedagógicas que propiciam a criação de práticas consideradas exitosas, eficazes ou
ambiências que favorecem aprendizagens – reveladoras, por meio do acompanhamento e
cognitivas e relacionais – na educação básica e observação de docentes. Em outras palavras, os
identificar suas características e as concepções estudos que investigam práticas pedagógicas
que as fundamentam. buscam, em geral, explicitar “boas práticas”,
trazendo também contraexemplos de ações
Dado tudo o que foi exposto, é possível notar pedagógicas pouco efetivas.
que são poucas as pesquisas, no Brasil, que
apresentam alguma conceituação de “prática No conjunto das pesquisas, as práticas relativas
pedagógica”, bem como relatos detalhados e à atuação do professor diretamente com os seus
comentados de práticas docentes encontradas alunos foram as mais estudadas, especialmente
nas escolas. Tanto a conceituação quanto o relato aquelas que dizem respeito à gestão dos
de práticas, em vários estudos, aparecem de aprendizados e da classe, porém com maior ênfase
forma implícita ou subjacente. na primeira. É preciso observar que o corpus de
dados analisado reuniu pesquisas desenvolvidas
É preciso reiterar que a maioria dos estudos se no ensino fundamental I com crianças, no ensino
utiliza da abordagem qualitativa de pesquisa, e fundamental II com adolescentes e no ensino
muitos são estudos de caso. Assim, as práticas médio com jovens. Mesmo considerando que os
investigadas circunscrevem-se a contextos que segmentos de ensino possuem especificidades,
não podem necessariamente ser generalizados, optou-se por apreender as práticas pedagógicas
mas podem se constituir em inspiração para retratadas nas pesquisas, independente da
outros docentes. Este estudo mostra, portanto, a faixa etária/segmento em que o estudo foi
quase ausência no país de pesquisas publicadas desenvolvido, por entender-se que há princípios
em artigos de revistas qualificadas e teses de e práticas pedagógicas universais. Essa escolha
doutorado, com relato e análise mais completos, pode significar uma limitação deste estudo e,
como também pesquisas em larga escala (ou também, sinalizar para a necessidade de novas
143
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
144
O que evidenciam as pesquisas em educação
sem que se discutam transformações significativas primeiro lugar, sugestões específicas sobre
da escola como um todo e/ou do próprio sistema as práticas docentes que emergiram desta
de ensino. Em outras palavras, foram poucos os pesquisa e se mostraram efetivas, podendo
artigos e teses que se debruçaram sobre modelos servir como referenciais inspiradores para as
disruptivos de currículo e de organização dos práticas pedagógicas do professor da educação
tempos e espaços. básica. Em seguida, serão apontadas aquelas
recomendações de âmbito mais macro, das
Por fim, as práticas evidenciadas pelas pes- formações para a docência na educação básica,
quisas analisadas confirmam que os proces- algumas das quais já foram inclusive indicadas
sos formativos, como bem ressalta Shulman por vários outros estudos.
(1987), não devem treinar professores para que
se tornem seguidores de um manual, mas sim I – Recomendações na esfera micro
promover uma formação que os prepare para
refletir profundamente sobre seu ensino, o que A) Conceber a prática do planejamento como
acena para que a formação docente opere com um tempo e espaço de reflexão e socialização
concepções e premissas que guiem as ações das experiências em que é desejável:
do futuro docente que precisa aprender a usar
sua base de conhecimento para as suas esco- • planejar e avaliar as práticas já realizadas
lhas e ações didáticas. Assim, é no processo com os pares, contando com o apoio da
de desenvolvimento profissional, pela prática equipe da escola;
refletida, que o professor adquire consciência
das suas crenças, teorias e saberes, e, ao mes- • pensar mais sistematicamente sobre a rea-
mo tempo, ressignifica conceitos, proposições lidade, a proposta de trabalho e as práticas,
e princípios sobre as diferentes fontes do co- tendo em vista organizar as atividades pe-
nhecimento que estão na base da profissão dagógicas de modo adequado ao contexto
docente. A reflexão sobre a prática adquire dos alunos e, sobretudo, para não desper-
substância quando amparada em referentes diçar oportunidades de aprendizagem; e
teóricos e éticos, que fazem parte do repertó-
rio intelectual e cultural do professor. São es- • planejar de modo suficientemente elabo-
ses referentes que permitem saltar do senso rado, porém com uma aplicação plástica e
comum para compreensões mais elaboradas livre de rigidez, ou seja, adaptar o planeja-
e fundamentadas, que dão sentido e estofo às mento às diferentes situações da aula, o que
aprendizagens profissionais pela experiência. inclui considerar as contribuições dos alu-
nos, introduzir modificações e adaptações.
Há achados derivados das análises realizadas
nesta pesquisa que podem ser considerados B) Planejar e conduzir a gestão dos aprendi-
por parte das políticas, dos gestores, instituições zados mobilizando práticas que promovam
formadoras e seus docentes, no que se refere a compreensão aprofundada dos conteú-
ao seu papel em relação à formação inicial e dos pelos alunos. Esse processo é favorecido
continuada em geral e às práticas pedagógicas quando o professor:
em particular. Assim, serão aqui indicadas, em
145
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
146
O que evidenciam as pesquisas em educação
147
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
• incentivar discussões por áreas de conhe- F) Fortalecer a parceria entre instituições de en-
cimento; sino superior (IES) e escolas da educação básica,
com intermediação das secretarias municipais
• desenvolver e experimentar novas práticas e estaduais de educação.
pedagógicas, submetendo-as ao debate
crítico no âmbito das redes de ensino; G) Avaliar os resultados dos programas
de formação continuada e, portanto, sua
• propiciar o uso das tecnologias digitais; qualidade, por meio da apropriação, por
parte dos professores, dos conteúdos e
• discutir casos de ensino que retratem a das habilidades neles oferecidos, sempre
realidade escolar; diversificando as modalidades de avaliação.
Isso envolve observar a atuação docente
• aprofundar a discussão sobre como o aluno em sala de aula, visitar as escolas de forma
aprende; sistemática para discutir a prática pedagógica
e os problemas enfrentados pelos docentes,
• apoiar a interpretação e o uso pedagógi- e coadunar esforços entre equipes centrais e
co dos resultados das avaliações, especial- equipes escolares etc., que são ricas fontes de
mente aquelas que não foram desenvolvi- informação sobre a qualidade das ações de
das pelos professores, como as avaliações formação continuada e sobre a implementação
em larga escala; e de mudanças nas práticas pedagógicas.
148
O que evidenciam as pesquisas em educação
149
Práticas pedagógicas na educação básica do Brasil:
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