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Epidemiologia

Modelos do Processo Saúde/Doença

Profa. Dra. Ivana Maria Saes Busato


Olá!

O vídeo a seguir mostra os conteúdos que serão estudados nesta aula.


Venha conferir!

Introdução

Nesta aula, estudaremos os principais indicadores epidemiológicos,


começando pelas medidas de associação, especialmente no conceito de risco
e fator de risco.

O conhecimento dos indicadores epidemiológicos mostrará como


podemos avaliar o nível de saúde de um indivíduo ou população por meio das
medidas de frequência de doenças, agravos ou eventos de saúde nas
dimensões de tempo, espaço e população. Esses conceitos são importantes
para a quantificação dos problemas de saúde que ocorrem em populações,
suas implicações e interpretações.

Vamos discutir, ainda, as transições demográfica e epidemiológica e os


movimentos transicionais. Destacaremos os seus conceitos separadamente.

Boa aula!

Medidas de Associação

As medidas de associação mostram a quantificação da diferença


encontrada entre dois grupos populacionais, um exposto e outro não, quando
são contrastados pela ocorrência de doença, agravo ou evento da saúde.

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As medidas de associação podem ser absoluta e relativa:

Absoluta apresenta a diferença das frequências de doença entre grupos


quando necessitamos avaliar o quanto a frequência de uma doença no grupo
dos expostos excede em relação ao grupo dos não expostos.

Relativa é a razão dessas diferenças e se baseiam na força da associação,


ou seja, quantas vezes o risco é maior em expostos quando comparado ao
risco nos não expostos.

A escolha da medida de associação depende do objetivo do


estudo e da escala de mensuração.

Conforme Almeida Filho e Rouquayrol (2013), a definição de risco é “a


probabilidade da ocorrência de uma doença, agravo, óbito ou condição
relacionada à saúde (incluindo cura, recuperação ou melhora) em uma
população ou grupo, durante um período de tempo determinado”. Essa
probabilidade se refere a modelos abstratos de distribuição populacional. O
risco é probabilístico e não determinista.

O risco é estimado sob uma forma de proporção: matematicamente, é


uma razão entre duas grandezas, da qual o numerador está necessariamente
contido dentro do denominador. Na definição epidemiológica de risco, deve-se
observar a ocorrência de casos de óbito-doença-saúde (numerador), a base de
referência populacional (denominador) e a base de referência temporal
(período).

Risco = doentes
população

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População é o número total de pessoas residentes e sua estrutura relativa,
em determinado espaço geográfico e no ano considerado, e expressa a
magnitude do contingente demográfico e sua distribuição relativa. (REDE
INTERAGENCIAL DE INFORMACAO PARA A SAÚDE, 2008)

O fator de risco é o atributo de um grupo da população que apresenta


maior incidência de uma doença ou agravo à saúde em comparação com
outros grupos definidos pela ausência ou menor exposição a tal característica.
A epidemiologia tem grande interesse em saber identificar atributos,
propriedades ou fatores que permitam reconhecer grupos menos vulneráveis
(ou mais protegidos) em relação a um certo problema de saúde, o que
podemos chamar de “fator de proteção” na medida em que esse conhecimento
é importante para a implementação de medidas de prevenção do risco e
promoção da saúde.

Fator de risco é a probabilidade de que o dano ocorra no futuro; por isso não
devemos confundir risco com fator de risco.

Como podemos determinar o fator de risco?

Comparando o risco de expostos com risco de não expostos. Assim,


temos a principal medida de associação da epidemiologia tipo razão: o “Risco
Relativo” ou “Razão de Risco” – conhecido pela sigla RR. É calculado desta
forma: RR = risco expostos/risco não expostos.

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A tabela de contingência tipo 2x2 a seguir mostra como devemos
analisar as medidas de associação:

Fator de Risco
Risco
Sim Não Total

Sim A B Expostos: fator de risco = A + B

Não C D Não expostos: fator de risco = C + D

Total Risco = A + C Sem risco = B + D População = A + B + C + D

Risco de adoecer da População = A + C/A + B + C + D

Risco com fator de risco = A/A + B

Risco sem fator de risco = C/C + D

Risco relativo RR = A/(A+B)/C/(C+D)

A chance de adoecer é expressa em uma medida de frequência do tipo


razão, na qual o numerador (probabilidade de adoecer) não está contido no
denominador (1 − probabilidade de adoecer). Como vimos no conceito de risco,
o numerador está contido no denominador (probabilidade); sendo assim, é uma
medida de frequência tipo proporção.

Devemos observar a diferença entre risco e chance:

Chance de adoecer = (doentes/população)/1- (doentes/


população)

Apesar de a chance de adoecer ser pouco utilizada, sua compreensão é


importante para enterdermos uma das medidas de frequência mais utilizadas
na Epidemiologia como medida de associação: a “Razão de Chances” ou
“Odds Ratio” (OR). Se o objetivo é responder se a chance de desenvolver a

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doença no grupo de expostos é maior (ou menor) do que no grupo de não
expostos, devemos utilizar a razão de chances como medida de associação.
Inicialmente, temos que conhecer a chance de adoecer entre o grupo de
expostos e do grupo de não expostos ao fator de risco.

A razão entre essas duas chances é a razão de chance − OR.

OR= chance de adoecer entre o grupo de expostos/chance de adoecer


entre o grupo de não expostos

Chance de adoecer entre o grupo de expostos= A/(A+B)/B/(A+B)= A/B

Chance de adoecer entre o grupo de não expostos= C/(C+D)/D/(C+D)= C/D

OR= A/B/C/D= AD/BC (razão de chance de doença em relação à


exposição)

Podemos, também, querer estimar a razão de chance OR entre a


chance de exposição entre os doentes e não doentes da seguinte forma:

OR= chance de exposição entre os doentes/chance de exposição entre os


não doentes= A+C/(A+B+C+D)/1-A+C/(A+B+C+D)= A+C/B+C

Chance de exposição entre os doentes= A/C

Chance de exposição entre os não doentes= B/D

OR= A/C/B/D= AD/BC (razão de chance de exposição em relação à


doença)

Razão de chance/exposição = Razão de chance/doença

O Risco Atribuível (RA), ou Diferença de Riscos, é uma medida de


associação tipo absoluta, calcula a diferença entre risco dos expostos e risco
dos não expostos e representa a diferença atribuída à exposição ao fator de
risco.

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RA = risco expostos - risco não expostos = (A/A + B) – (C/C + D)

Quando as medidas de associação do tipo razão (relativa) apresentam


valor igual a 1 (valor nulo), as frequências de doenças entre expostos e não
expostos são iguais e não existe associação. Com valores maiores do que 1, a
frequência de doença maior nos expostos em relação aos não expostos
mostram que a exposição é um fator de risco para a doença. Quando os
valores ficam entre 0 e 1, significa que é menor a frequência de doença nos
expostos em relação aos não expostos e sugerem fator de proteção.

Se você quiser aprofundar o conhecimento sobre outras medidas de associação,


estude os conceitos de “Razão de Taxas” ou “Taxa Relativa” (RT), Razão de
Prevalência (RP) e Razões de Incidência (RI) nas páginas 186 e 187 do livro de
Medronho (2009), presente nas referências.

Na primeira parte da aula, vimos a importância das medidas de


associação. Agora vamos exercitar o nosso aprendizado!

Supondo que, em uma fábrica com 1000 funcionários (população), 600


trabalhem na sala de máquinas (evento) durante 30 dias; estes podem ter
alguma doença ou agravo à saúde causado pelo local de trabalho (risco):

Fator de Risco Risco de acidente com máquina


Contaminação
Sim Não Total
com Gás

Sim 500 (A) 200 (B) Expostos: fator de risco= 700 (A+B)

Não 100 (C) 200 (D) Não expostos: fator de risco= 300
(C+D)

Total Risco = 600 Sem risco = 400 População= 1000 (A+B+C+D)

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(A+C) (B+D)

Vamos calcular o risco:

Risco= evento/população

Risco= 600/1000 = 0,6

Podemos afirmar que os trabalhadores dessa fábrica têm 0,6 vezes o


risco de ter algum agravo ou doença provocada pelo local de trabalho – a sala
de máquinas.

Supondo que, em um dia nessa fábrica, houve uma ocorrência em que


700 trabalhadores ficaram expostos a um gás de uma das máquinas, vamos
calcular o risco entre os expostos e os não expostos:

Risco expostos= 700/1000= 0,7

Risco não expostos= 300/1000= 0,3

Na mesma fábrica, vamos calcular o risco relativo, que é a divisão entre


o risco dos expostos e o risco dos não expostos:

RR= 0,7/0,3= 2,3

Ou seja, o risco relativo da contaminação de gás foi 2,3 vezes maior


entre os expostos do que os não expostos. Agora vamos calcular a chance
desses trabalhadores de adoecer:

Chance de adoecer= (doentes/população)/1-(doentes/ população)

Chance de adoecer= 600/1000/1-600/1000= 0,6/1-0,6= 1,5

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Podemos, assim, calcular a Razão de Chance (OR):

Chance de adoecer entre o grupo de expostos= A/(A+B)/B/(A+B)= A/B=


500/200= 2,5

Chance de adoecer entre o grupo de não expostos= C/(C+D)/D/(C+D)=


C/D= 100/200 = 0,5

OR= A/B/C/D= AD/BC= 2,5/0,5= 5 (razão de chance de doença em relação


à exposição)

Calculando o risco atribuível:

RA= (A/A+B) – (C/C+D)= 500/500 + 200 – 100/100 + 200

RA= 0,7- 0,3= 0,4

Vejamos como interpretar as medidas de associação que calculamos


com os dados de fábrica tomada como exemplo: o risco de trabalhar na sala de
máquinas é de 0,6; o risco relativo de contaminação por acidente com gás
entre os expostos e os não expostos é de 2,3; a chance de adoecer entre os
expostos é de 1,5; a razão de chance entre os expostos e os não expostos é
de 5; o risco atribuível entre os expostos e os não expostos é de 0,4.

Essas medidas são importantes para o entendimento da Epidemiologia.


Por isso, guarde bem os conceitos e suas diferenças!

Vamos saber mais sobre a Rede Interagencial de Informações para a


Saúde (Ripsa) no vídeo a seguir. Confira!

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Medidas de Frequência de Doenças, Agravos ou
Eventos de Saúde

As informações sobre o comportamento das epidemias − como elas


estão evoluindo −, a avaliação do efeito das atividades de prevenção, a cura
pelos tratamentos disponíveis ou o aumento da sobrevida dos pacientes, entre
outros questionamentos, interessam tanto para os profissionais de saúde como
para a população em geral.

A Epidemiologia contribui para a obtenção das respostas que envolvem


o conhecimento das doenças nas populações; suas respostas se baseiam em
algum tipo de medida de frequência. Há a necessidade de alguns critérios para
a seleção de indicadores de saúde:

 Validade − ser capaz de discriminar corretamente um dado evento de


outros, assim como detectar as mudanças ocorridas com o passar do tempo;

 Reprodutibilidade − obtenção de resultados semelhantes, ou seja, a


quantidade que a mensuração é repetida;

 Representatividade (cobertura) − um indicador será tanto mais apropriado


quanto maior cobertura populacional alcançar;

 Obediência a preceitos éticos – a fim de que a coleta de dados não


acarrete malefícios ou prejuízos às pessoas investigadas e haja o sigilo
desses dados;

 Oportunidade, simplicidade, facilidade de obtenção e custo compatível


− não deve causar perturbações ou inconvenientes, sob pena de limitar a
colaboração dos profissionais de saúde, o que pode resultar em baixa
cobertura e confiabilidade dos dados obtidos.

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Morbidade
As medidas de frequência para morbidade são definidas a partir de dois
conceitos epidemiológicos fundamentais:

Prevalência Incidência

Além da frequência de doenças ou agravos, essas medidas podem ser


aplicadas à mensuração de quaisquer eventos relacionados à saúde, incluindo
fatores determinantes. A prevalência expressa um número de casos
acumulados (casos antigos e novos) até um dado momento; a incidência
representa a frequência com que novos casos ocorrem em um determinado
período de tempo.

As medidas de frequência devem, obrigatoriamente, referir as


dimensões: tempo, espaço e população.

A prevalência é definida como frequência de casos existentes de uma


determinada situação, em uma população específica e em um dado momento.

Casos existentes são aqueles que aconteceram em algum momento do passado


(casos antigos), somados aos novos casos, excluindo aqueles que deixaram de
existir por qualquer motivo: cura, morte ou erro do diagnóstico.

Os indivíduos são observados uma única vez. Isso mostra como uma
doença subsiste na população. Podemos comparar com uma fotografia;
portanto mostra, naquele momento, a fração de casos existentes.

A prevalência pontual é utilizada por grande parte dos estudos e também é


chamada de instantânea ou estimada.

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A quantidade de casos de problemas de saúde de uma população é um
dos fatores determinantes da demanda por assistência. Dessa forma, a
prevalência é uma medida relevante para o planejamento de ações e para a
administração de serviços de saúde. Usada em estudos em que não se tem
precisão de início, como doenças crônico-degenerativas não letais ou doenças
com longos períodos de incubação. O cálculo da prevalência é o seguinte:

Prevalência = nº de casos conhecidos de uma dada doença x 10n

População

A frequência com que determinado evento ocorre em uma população


que, no momento inicial do período de observação, estava “livre” do evento e
exposta ao risco de ocorrência do mesmo é denominada incidência − medida
dinâmica, pois expressa uma mudança no estado de saúde dos sujeitos que
são avaliados no mínimo em duas ocasiões, em um determinado período de
tempo, a fim de conseguir detectar casos novos (mudança do estado).

A incidência de um evento pode ser medida de diferentes


formas e a mais simples é o número absoluto de casos
incidentes (novos).

O risco de ocorrência de um evento pode ser medido e interpretado da


mesma forma que uma probabilidade. No nível individual (risco), representa,
portanto, a probabilidade de um indivíduo vir a adoecer ou se acidentar. Em um
grupo de indivíduos (proporção de incidência), calculando a proporção dos que
adoecem, temos o risco médio de adoecimento nesse grupo. O risco médio ou
proporção de incidência é também denominada incidência acumulada, cuja
fórmula é:

Inc. acumulada = casos novos num período de tempo x 10n

grupo de indivíduos sob observação, livres do desfecho no tempo zero

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A taxa de incidência é definida como a razão entre o número de casos
novos de uma doença que ocorrem em um intervalo de tempo determinado e
em uma população delimitada que está exposta ao risco de adquirir a referida
doença no mesmo período − pessoa-tempo.

Pessoa-tempo significa o período durante o qual um indivíduo esteve


exposto ao risco de adoecimento e, caso viesse a adoecer, seria
considerado um caso novo ou incidente.

Somadas as experiências individuais, tem-se o total de pessoa-tempo


gerado por uma determinada população ao longo do período em que se
desenvolve um determinado estudo.

Taxa de incidência = número de casos novos em um


período de tempo / total de pessoa-tempo expostas ao
risco de adquirir a doença no referido período.

Vimos que os indicadores de prevalência e incidência são utilizados para


avaliar a morbidade de doenças e agravos. Agora vamos aprender a calcular a
prevalência em um exemplo hipotético:

Em 01/01/2001, existiam 2300 casos de pneumonia em tratamento


(antigos) no município Delta; ao longo desse ano, foram notificados 250 novos
casos, 1010 pacientes tiveram alta por cura e 10 pacientes morreram. Todos os
pacientes foram tratados com os mesmos medicamentos implantados no ano
em questão. A população residente estimada no município era de 1 milhão e
200 mil habitantes.

Vamos, então, calcular a prevalência inicial e final do tratamento:

Prevalência no início de 2001= 2300 (antigos)/1.200.000


hab X 1000 =1,9.

Prevalência e final de 2001= 2300 (antigos) + 250


(novos) – 1010 (cura) – 25 (óbitos)/1.200.000 hab X
1000= 1,3

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Podemos concluir que o município Delta iniciou o ano de 2001 com uma
prevalência de pneumonia de 1,9 casos por 1000 habitantes e terminou o ano
com prevalência de 1,3 casos por 1000 habitantes. Essa diminuição pode ter
ocorrido pela introdução de um novo tratamento. Observa-se que o número de
casos curados foi maior do que o número de casos novos.

Em seguida, vamos calcular a incidência com a investigação de um


surto de intoxicação alimentar por meio de outro exemplo.

Um grande número de casos de gastroenterite (GEA) foi atendido em


um hospital: 105 pessoas foram atendidas por GEA em uma mesma noite,
sendo que todos haviam participado de uma festa de aniversário para 150
pessoas naquele mesmo dia algumas horas antes do início dos sintomas.
Vamos calcular a incidência com esses dados:

Incidência acumulada= 105/150 x 100 = 70%

Foram realizadas entrevistas quanto à ingestão dos alimentos servidos


na festa a fim de investigar a provável fonte de infecção das 105 pessoas que
apresentaram GEA e, ainda, porque 45 pessoas não apresentaram qualquer
sintoma.

Alimento Ingestão Com GEA Sem GEA Total

Maionese Sim 58 34 92

Não 34 24 58

Bolo de Sim 86 22 108


Chocolate
Não 6 36 42

Carne assada Sim 32 44 76

Não 40 14 54

Tabela 1: Total de pessoas participantes da festa por ingestão de alimento segundo adoecimento por GEA

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Alimento Com ingestão Sem ingestão Razão

Maionese 58/92 X100 = 63,04 34/58 X100 = 58,62 63,04/58,62 =1,08

Bolo de 86/108 X100 =79,63 6/42 X100 =14,28 79,63/14,28 = 5,57


Chocolate

Carne 32/76 X100 = 42,10 40/54 X100 = 74,07 42,10/74,07 = 0,57


assada

Tabela 2: Cálculo da incidência acumulada por ingestão de alimento

Com esses dados, podemos concluir que o bolo de chocolate


provavelmente foi a fonte de infecção. Tal afirmação pode ser feita quando
avaliamos a razão de incidência acumulada entre os indivíduos que comeram
(expostos) e os que não comeram (não expostos): o bolo possui razão de
incidência de 5,57 vezes; a maionese de 1,08; e a carne assada de 0,57.

Vamos aprender a calcular a taxa de incidência pela análise dos casos


de infecção hospitalar nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) para adultos,
em um período de 60 dias, nos hospitais A e B.

Qual o risco estimado de contrair a infecção?

Primeiramente, vamos calcular a incidência acumulada:

Incidência acumulada de A= 12/150 x 100 = 8%

Incidência acumulada de B= 16/150 x 100 = 10,6%

Em segundo lugar, temos que calcular a pessoa-tempo de cada hospital,


em cada período, conforma mostra a tabela a seguir.

Tempo de Pacientes com Pessoa-tempo Pacientes com Pessoa-tempo


internação infecção A A infecção B B

60 dias 3 3x60= 180 5 5x60= 300

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45 dias 2 2x45= 90 8 8x45= 360

30 dias 4 4x30= 120 3 3x30= 90

15 dias 3 3x5 = 45 0 0x15 = 0

Total 12 435 16 750

Tabela 3: Cálculo da pessoa-tempo dos hospitais A e B: total de pacientes dos hospitais A e B = 150
respectivamente

Taxa de incidência de infecção hospitalar no hospital A=


12/435= 0,027 x 100= 2,7 pacientes a cada 100

Taxa de incidência de infecção hospitalar no hospital B=


16/750= 0,021 x 100= 2,1 pacientes a cada 100

Assim, avaliamos que o risco de contrair infecção hospitalar no hospital


A é 22% maior do que no hospital B, mesmo que este tenha mais casos (16) de
infecção no mesmo período que o primeiro (12). A incidência acumulada no
hospital A foi de 8% e no hospital B de 10,6%.

Como vimos, os cálculos são simples e, usando a matemática básica,


chegamos a resultados essenciais no trabalho dos profissionais de saúde.

Assista ao vídeo a seguir, no qual diferenciamos a prevalência da


incidência a fim de fixar seus conceitos.

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Mortalidade
A mortalidade é analisada por meio de diversos indicadores
epidemiológicos. Os principais são:

Taxa bruta de mortalidade

Corresponde ao número total de óbitos por mil habitantes na população


residente em determinado espaço geográfico, no ano considerado. Expressa a
intensidade com a qual a mortalidade atua sobre uma determinada população.

As taxas brutas de mortalidade padronizadas permitem a comparação temporal e


entre regiões.

O método do cálculo é:

número total de óbitos de residentes/população total


residente x 1.000

Mortalidade proporcional por causa de óbito

Mostra a distribuição percentual de óbitos por grupos de causas


definidas na população residente em determinado espaço geográfico, no ano
considerado. Mede a participação relativa dos principais grupos de causas de
morte no total de óbitos com causa definida. O seu método do cálculo é:

número de óbitos de residentes por grupo de causas


definidas/número total de óbitos de residentes,
excluídas as causas mal definidas x 100

Mortalidade materna

Mede o número de óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos de mães
residentes em determinado espaço geográfico, no ano considerado. O conceito

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de morte materna é estabelecido pela Organização Mundial de Saúde e estima
a frequência de óbitos femininos ocorridos até 42 dias após o término da
gravidez, atribuídos a causas ligadas à gravidez, ao parto e ao puerpério em
relação ao total de nascidos vivos.

O número de nascidos vivos é adotado como uma aproximação do total


de mulheres grávidas e reflete a qualidade da atenção à saúde da mulher. O
método de cálculo da mortalidade materna é:

número de óbitos de mulheres residentes, por causas e


condições consideradas de morte materna/ número de
nascidos vivos de mães residentes x 100.000

Taxa de mortalidade infantil

Mostra o número de óbitos de menores de um ano de idade por mil


nascidos vivos na população residente em determinado espaço geográfico, no
ano considerado. Estima o risco de morte dos nascidos vivos durante o seu
primeiro ano de vida e reflete, de maneira geral, as condições de
desenvolvimento socioeconômico e infraestrutura ambiental, bem como o
acesso e a qualidade dos recursos disponíveis para a atenção à saúde
materna e à população infantil.

Classifica-se o valor da taxa como alto (50 por mil ou mais), médio (20 a 49 mil) e
baixo (menos de 20 mil) − parâmetros que necessitam de revisão periódica em
função de mudanças no perfil epidemiológico.

O método do cálculo é:

número de óbitos de residentes com menos de um ano


de idade/ Número de nascidos vivos de mães residentes
x 1.000

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Mortalidade proporcional por idade

Mostra a distribuição percentual dos óbitos por faixa etária na população


residente em determinado espaço geográfico, no ano considerado. Mede a
participação dos óbitos em cada faixa etária em relação ao total de óbitos.

Elevadas proporções de óbitos de menores de um ano de idade estão


associadas a más condições de vida e de saúde. O deslocamento da
concentração de óbitos para grupos etários mais elevados reflete a redução da
mortalidade em idades jovens, sobretudo na infância, e o consequente
aumento da expectativa de vida da população.

O método de cálculo é:

número de óbitos de residentes por faixa etária/número


de residentes por faixa etária, excluídos os de idade
ignorada x 100

A exclusão dos óbitos com idade ignorada resulta no


referimento do indicador ao total de óbitos com idade
conhecida.

Tempo de vida
A expectativa de vida − ou esperança de vida − apresenta o número
médio de anos de vida esperados para um recém-nascido, mantido o padrão
de mortalidade existente na população residente em determinado espaço
geográfico, no ano considerado. Expressa o número médio de anos que se
esperaria que um recém-nascido vivesse. O aumento da esperança de vida ao
nascer sugere melhoria das condições de vida e de saúde da população.

O método de cálculo da expectativa de vida se faz a partir de tábuas de


vida elaboradas para cada área geográfica: toma-se o número correspondente
a uma geração inicial de nascimentos (l0) e determina-se o tempo cumulativo

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vivido por essa mesma geração (T0) até a idade limite. A esperança de vida ao
nascer é o quociente da divisão de T0 por l0.

O indicador anos potenciais de vida perdidos é uma medida de


mortalidade baseada na dimensão do tempo que se deixou de viver em
decorrência de uma morte e mostra o efeito das mortes ocorridas
precocemente em relação à duração esperada da vida, ao somatório de óbitos
em uma determinada idade na população residente em determinado espaço
geográfico, no ano considerado. Somente são considerados os óbitos a seguir,
do limite de idade definido. O limite máximo de idade tem variado na literatura
de 60 a 85 anos.

O método de cálculo é o somatório de óbitos na idade definida multiplicado


pela diferença entre o limite máximo de idade e idade definida.

Agora acompanhe os números e os cálculos da mortalidade infantil e


geral de cinco municípios do estado do Rio Grande do Sul:

População 2011 Óbitos Gerais de Nascidos Vivos Óbitos Infantis de


2011 de 2010 2011
Alvorada – 196795
Alvorada – 1475 Alvorada – 3054 Alvorada – 41
Caxias do Sul –
Caxias do Sul – 2497 Caxias do Sul - Caxias do Sul – 57
441850
6043
Novo Hamburgo – Novo Hamburgo –
Novo Hamburgo –
1601 Novo Hamburgo - 34
239426
2953
Porto Alegre - 11410 Porto Alegre - 175
Porto Alegre –
Porto Alegre -
1414779 Sant'Ana do Sant'Ana do
18321
Livramento – 684 Livramento – 16
Sant'Ana do
Sant'Ana do
Livramento – 81907
Livramento – 1084

Fonte: <http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0205&VObj=http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/
deftohtm.exe?sim/cnv/mat10>

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Mortalidade geral = número total de óbitos de residentes/população
total residente x 1000

 Alvorada – 1475/196795 x 1000 = 7,49

 Caxias do Sul – 2497/441850 x 1000 = 5,65

 Novo Hamburgo – 1601/239426 x 1000 = 6,68

 Porto Alegre – 11410/1414779 x 1000 = 8,06

 Sant'Ana do Livramento – 684/81907 x 1000 = 8,35

Mortalidade infantil = número de óbitos de residentes com menos de


um ano de idade/número de nascidos vivos de mães residentes x 1000

 Alvorada – 41/3054 x 1000 = 13,42

 Caxias do Sul – 57/6043 x 1000 = 9,43

 Novo Hamburgo – 34/ 2953 x 1000 = 11,51

 Porto Alegre – 175/18321 x 1000 = 9,55

 Sant'Ana do Livramento – 16/1084 x 1000 = 14,76

Esses dois indicadores são os mais usados por profissionais de saúde


na avaliação da situação de saúde em populações. Como vimos, com o
método de cálculo e os dados, torna-se fácil a utilização de indicadores
epidemiológicos.

Assista ao vídeo a seguir para conhecer os indicadores


socioeconômicos.

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Transição Demográfica

A teoria da transição demográfica surgiu no início do século XX com as


observações realizadas nos países europeus desde o século XVIII, em que
foram relacionadas as transformações demográficas por meio da natalidade e
mortalidade influenciadas pelo processo de industrialização. Assim, foram
indenticados três períodos principais nesse processo:

Essa teoria se consolidou como um modelo explicativo abrangente para


as mudanças demográficas verificadas no decorrer da história das sociedades
e seus determinantes históricos, sociais e econômico.

A palavra transição vem do latim “transitione” e significa atos, efeitos, ou modos


de passar lentamente de um lugar, estado ou assunto para outro; no dicionário,
remete à noção de passagem, trajeto ou trajetória.

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Portanto, transição demográfica é a passagem de um contexto
populacional em que prevalecem os valores elevados nos indicadores de
mortalidade e natalidade para outro em que esses indicadores alcançam
valores muito reduzidos. Em termos demográficos, uma sociedade possui
quatro fases distintas de transição demográfica:

I. Primeira fase ou fase 1 − caracterizada por sociedades com altas taxas de


natalidade e mortalidade, principalmente mortalidade infantil, com
crescimento populacional lento. Abrange a história da humanidade desde
suas origens até a Revolução Industrial, em meados do século XVIII;

II. Segunda fase ou fase 2 − chamada de fase intermediária, é própria dos


países em processo de industrialização; apresenta redução da taxa de
mortalidade, com taxa de natalidade ainda elevada, provocando um grande
crescimento populacional. Os países ricos passaram por essa fase no
século XVIII, mas há outros que iniciaram essa fase somente no século
XX;

III. Terceira fase ou fase 3 − a taxa de natalidade apresenta uma importante


redução, que está associada a uma descrescente taxa de mortalidade,
provocando, ainda, um crescimento demográfico. O efeito importante
dessa fase é o envelhecimento populacional; os países ricos completaram
o processo de passagem da fase 2 para a 3 no século XX;

IV. Quarta fase ou fase 4 − é típica das sociedades pós-industriais e


apresentam indicadores de mortalidade e natalidade reduzidos e
crescimento populacional equilibrado. É conhecida também como “fase da
modernidade” e se caracteriza por apresentar um aumento da expectativa
de vida e o envelhecimento da população de uma forma geral,
principalmente à custa da participação das mulheres.

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As pirâmides populacionais mostram em que estágio ou fase de
transição demográfica um determinado espaço geográfico se encontra:

Fonte: <http://7bilhoes.wordpress.com/>

Vamos conhecer a evolução da transição demográfica e epidemiológica


brasileira. Assista ao vídeo a seguir e confira!

Transição Epidemiológica

A transição epidemiológica mostra o resultado das mudanças ocorridas


no tempo nos padrões de mortalidade, morbidade e invalidez, que caracterizam
uma população específica e, em geral, ocorrem em conjunto com outras

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transformaç es demogr ficas, sociais e econ micas. O processo engloba três
mudanças básicas:

 Substituição das doenças transmissíveis por doenças não transmissíveis e


causas externas;

 Deslocamento da carga de morbimortalidade dos grupos mais jovens aos


grupos mais idosos;

 Transformação de uma situação em que predomina a mortalidade para outra


na qual a morbidade é dominante.

No rasil, a transição epidemiol gica não tem ocorrido de acordo com o


modelo experimentado pela maioria dos países industrializados, pois ocorre
uma superposição entre as etapas. Há o predomínio de doenças transmissíveis
e crônico-degenerativas, com reintrodução de doenças, como dengue e cólera,
ou o recrudescimento de outras, como mal ria, hanseníase e leishmaniose.
Caracteriza uma transição prolongada, com contrates entre as diferentes
regi es em um mesmo país com discrepantes situaç es epidemiol gicas,
provocando a polarização epidemiológica.

O envelhecimento rápido da população brasileira a partir da década de


1960 teve um impacto na demanda por serviços m dicos e sociais somente
vista nos países industrializados. transição epidemiol gica brasileira se
caracteriza pela dificuldade do Estado em estabelecer um controle sobre as
doenças transmissíveis e a redução da mortalidade infantil no desenvolvimento
e na aplicação de estratégias para a efetiva prevenção e tratamento das
doenças crônico-degenerativas e suas complicações, levando a uma perda de
autonomia e qualidade de vida.

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Síntese

Assista ao vídeo a seguir, em que apresentaremos uma síntese dos


assuntos que estudados nesta aula e retomaremos os conceitos de indicadores
epidemiológicos.

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1. Supondo que o município X tenha 5777 pessoas acima de 50 anos, 235
pessoas com diagnóstico de catarata, antes do acompanhamento, 56
pessoas que morreram durante os cinco anos de acompanhamento, outros
casos novos por ano de acompanhamento: Ano 1 = 18; Ano 2 = 23; Ano 3 =
35; Ano 4 = 15; Ano 5 = 17.

Com esses dados, calcule a prevalência inicial (PI), a prevalência final (PF),
a incidência acumulada (IA) e a taxa de incidência (TI) por ano.

a. PI = 4,0%, PF = 4,0%, IA = 0,9% e TI = 2,8%

b. PI = 4,0%, PF = 4,9%, IA = 0,9% e TI = 34,3%

c. PI = 3,0%, PF = 4,9%, IA= 1,8% e TI= 2,8%

d. PI = 4,0%, PF = 4,9%, IA = 1,8% e TI = 34,3%

2. Supondo que o município X tenha uma população de 262144. A população


de 0–1 ano (nascidos vivos) é igual a 13020 e a população acima de 60
anos é de 33159. O número de óbitos é de 2785, 185 e 1840
respectivamente.

Calcule a mortalidade infantil (MI), a mortalidade geral (MG) e a mortalidade


proporcional (MP) por idade (acima de 60 anos):

a. MI = 17,20 MG = 10,62 MP= 5,54

b. MI =14,20 MG = 12,53 MP= 5,80

c. MI =14,20 MG = 10,62 MP= 5,54

d. MI =17,20 MG= 10,62 MP= 5,80

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Referências

ALMEIDA FILHO N; ROUQUAYROL M. Z. Introdução à Epidemiologia. 4.


ed., rev. e ampliada. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

ALMEIDA FILHO, N.; BARRETO, M. L. Epidemiologia & saúde: fundamentos,


métodos, aplicações. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012.

BARATA, R. B. Epidemiologia social. Revista Brasileira de Epidemiologia.


São Paulo: 2005, p. 7-17.

BONITA, R. et al. Epidemiologia básica. (tradução e revisão científica Juraci


A. Cesar). 2.ed. São Paulo: Santos, 2010.

MEDRONHO, R. A. et al. Epidemiologia. São Paulo: Atheneu, 2009.

REDE INTERAGENCIAL DE INFORMACAO PARA A SAÚDE (Ripsa).


Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. 2. ed.
Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2008.

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