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Será que a ciência, com suas demonstrações utilitaristas e materialistas pode nos dizer o que é a felicidade e como
obtê-la?
Para Richard Layard, a resposta é sim - digamos, um "sim por aproximações sucessivas".
Layard é fundador do Projeto Ação para a Felicidade, uma espécie de esforço de auto-ajuda social, "um movimento
para a mudança social positiva", destinado a criar uma sociedade mais feliz.
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Historicamente, a felicidade, expressão por excelência do espírito humano, foi o "objeto" de discussão da sabedoria
dos filósofos.
Mas será que a ciência e seus saberes tão precários - sempre prontos a mudar com a próxima pesquisa ou com o
próximo estudo - poderia também ser um guia confiável nesse caminho?
A chamada "ciência acadêmica", aquela feita por cientistas profissionais dentro dos muros das universidades, é muito
eficiente em lidar com as coisas físicas e com o controle da natureza.
Apesar do fim do domínio da religião sobre o saber no mundo ocidental, ocorrido ao longo dos últimos quatro
séculos, a ciência parece ter ficado traumatizada demais com a queima de livros, frequentemente acompanhados dos
seus autores. E tudo o que se relaciona à "alma humana", ou ao "espírito humano", coisas sobre as quais a religião
reivindicava autoridade, foi banido do chamado "conhecimento oficial".
O espírito humano dos filósofos foi reduzido à mente humana, novamente reduzida à consciência e finalmente
atribuída a um processo que, "de alguma forma", emana do cérebro humano.
Para a ciência oficial, pessoas são resultado de processos ainda não completamente entendidos do cérebro humano,
com corpos e comportamentos ditados por seus arranjos genéticos, e tudo o que são, ou expressam, resulta de suas
interações com o ambiente e de seus próprios arranjos ou desarranjos biológicos.
É claro que o restante do mundo, fora dos muros das universidades, não concorda exatamente com isso. Na
verdade, mesmo entre os cientistas, só os mais fundamentalistas, materialmente falando, fiam-se em tais explicações
ou ficam satisfeitos com elas.
Nas últimas décadas, o bom senso tem voltado a vigorar e o medo da exprobração pública pelos líderes políticos e
religiosos tem sido exorcizado e amainado, ou talvez psiquiatricamente resolvido em uma gigantesca terapia de
grupo não-declarada, fazendo com que um número cada vez maior de cientistas retome a coragem para estudar
assuntos menos relacionados ao corpo humano, e mais afetos ao espírito humano.
As ciências sociais, a antropologia, a psicologia e a neurologia têm avançado, ainda que a passos vacilantes, nessa
área tão fluida para quem se acostumou a lidar com sólidos inertes.
Até a biologia já levou alguns respingos, com pesquisadores propondo que os humanos nascemos para o amor, e
elaborando uma teoria que defende a sobrevivência do mais bondoso. O tradicional egoísmo inato dos animais,
biologicamente determinado, e longamente estendido ao comportamento humano, começa a ser questionado pelos
estudos sobre lealdade e justiça.
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Com isso, já é possível falar em uma "ciência da felicidade", e alguns pesquisadores, ainda dentro do paradigma
oficial utilitarista, estão tentando criar até um índice econométrico, chamado Felicidade Interna Bruta, capaz de medir
o nível de felicidade dos cidadãos de um país.
Estudos mostram, por exemplo, que o aumento crescente da renda não aumentou a felicidade das pessoas no
mundo desenvolvido: é como dizer que o dinheiro ajuda, mas não compra felicidade.
Assim, defender um crescimento econômico contínuo não é o mesmo que ter como objetivo uma sociedade mais
feliz.
Para o criador do Projeto Ação para a Felicidade, é isto que temos que começar a mudar: se queremos uma
sociedade mais feliz, então precisamos tornar isto um objetivo explícito. Somente assim mudaremos nossa maneira
de viver e caminharemos rumo a um mundo melhor.
E, segundo ele, devemos fazer isto usando aquilo que os experimentos científicos "comprovaram" que funciona.
Nesse processo, a ciência começa a "descobrir" que a felicidade é uma obra coletiva.
E, como tal, ela se fundamenta muito mais nas relações que temos com as outras pessoas do que nas relações que
temos com os bens e utensílios que utilizamos no nosso dia-a-dia.
Pode-se argumentar que os sábios e filósofos de todos os tempos sempre disseram isso, e inclusive já deram suas
receitas de como construir um paraíso na Terra.
Mas os cientistas, com seu eterno utilitarismo, constatam que os conselhos dos sábios não trouxeram felicidade para
o mundo até hoje. Logo, a ciência, com sua longa lista de sucessos, certamente a melhor forma de obter
conhecimento do mundo natural que o homem já inventou, tem direito a fazer sua tentativa.
Assim, além dos relacionamentos, eles recomendam dar uma olhada na saúde mental. Por exemplo, mostrou-se que
a psicoterapia traz 32 vezes mais felicidade do que o dinheiro. E também que a saúde mental vem piorando, ao
menos no mundo desenvolvido, desde os anos 1960: a depressão será a doença mais comum dentro de 20 anos
Mas a cavalaria já está a caminho, e os estudos sobre o uso da meditação e da ioga têm mostrado resultados
indiscutíveis na melhoria da saúde mental.
Para Richard Layard, isto é mais do que suficiente para se ter esperança.
E, como estudos têm mostrado que os esforços para o desenvolvimento de virtudes humanas- ensinar o amor, como
diz o filósofo Michel Serres - só funcionam quando essa educação é divertida, parece que o mundo feliz será
tambémum mundo muito mais alegre.
Isto é também a redescoberta do que Aristóteles disse há milênios, quando o filósofo grego afirmava que a virtude
deve ser desenvolvida como um hábito - assim, as ações virtuosas contêm em si mesmas o prazer de serem
exercitadas, como qualquer bom hábito.
Por outro lado, a sociedade ocidental idolatra o egoísmo e a competição, em detrimento do altruísmo e da
colaboração. É isso o que precisa mudar, garante Layard: "Naturalmente, há um lado profundamente egoísta na
nossa natureza, mas é o trabalho de cultura apoiar o nosso altruísmo natural contra o nosso egoísmo natural."
Como fazer isto? No site de sua organização, ele lista os seus 10 Mandamentos para Felicidade, todos, segundo ele,
fundamentados em experimentos científicos.
http://www.logosofia.org.br/livro-gratis/logosofia/51.aspx?gclid=CKnYnPuEuqgCFYg32godV2_8Bw