Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Foge Nicky Foge167
Foge Nicky Foge167
Nicky Cruz
e Jamie Buckingham
In t ro d u ç ã o
P re â m b u l o
N I N GU É M ME Q U E R
Capítulo 2
N A S E LV A D O Q U A D R O -
N E GR O
Capítulo 3
S O ZI N H O
Capítulo 4
B AT I S MO D E S AN GU E
Capítulo 5
T U M U LT O N A S R U A S
DE S DE O PRINCÍPIO, eu e Is r a el n os t or n a m os
qu a s e in s ep a r á veis . Tr ês n oit es d ep ois , ele p a s s ou p elo
m eu a p a r t a m en t o p a r a d izer qu e ia h a ver u m “quebra-
pau” com os Bis h op s . “Por fim ”, p en s ei, “uma
op or t u n id a d e p a r a u s a r m eu r evólver — u m a op or t u -
n id a d e p a r a lu t a r .” E n qu a n t o Is r a el d es cr evia o p la no
senti-me arrepiar.
Os Ma u -Ma u s d ever ia m r eu n ir-s e n a Pr a ça
Wa s h in gt on p er t o d e De Ka lb . Dever ía m os es t a r lá , p or
volta das nove da noite. O nosso conselheiro de guerra já
h a via s e en con t r a d o com o con s elh eir o d e gu er r a d os
Bis h op s , u m a qu a d r ilh a d e r a p a zes d e cor , p a r a m a r ca r
a h or a e o lu ga r . Dez d a n oit e n o p a r qu e a t r á s d o 6 7 .°
Distrito.
Is r a el d is s e: “Leva s eu r evólver . Tod os os ou tros
r a p a zes t êm a r m a s . Algu n s fizer a m s u a s p r óprias
es p in ga r d a s , e Heit or t em u m r ifle s er r a d o. Va m os d a r
u m a liçã o n os Bis h op s . S e t iver m os d e m a t a r ,
m a t a r em os . Ma s s e ca ir m os , ca ir em os lu t a n d o. S om os
os Ma u -Ma u s . Os t a is . Os Ma u -Ma u s a fr ica n os b eb em
sangue, cara, e nós somos iguais a eles.”
A ga n g já es t a va r eu n id a , qu a n d o eu ch egu ei à
p r a ça à s oit o e m eia . Ha via m es con d id o s u a s a r m a s n a s
á r vor es e n a gr a m a a lt a , com m ed o qu e a p olícia
ch ega s s e. Ma s n a qu ela n oit e n ã o h a via p olícia , e Is r a el e
Ca r los es t a va m d a n d o or d en s . Às d ez h or a s h a via m a is
d e cem r a p a zes va gu ea n d o p ela p r a ça . Algu n s d eles
t in h a m r evólver es . A m a ior ia t in h a fa ca s . Un s p ou cos ,
t a cos d e b eis eb ol, p or r et es com p r egos n a s p on t a s , ou
cla va s feit a s em ca s a . Ou t r os t in h a m cor r en t es d e
b iciclet a , qu e er a m a r m a p er igos a qu a n d o b a t ia m n a
ca b eça d e a lgu ém . Ca r los t in h a u m a b a ion et a d e cer ca
d e s es s en t a cen t ím et r os , e Heit or , a s u a es p in ga r d a
s er r a d a . Algu n s r a p a zes d ever ia m ir d ois qu a r t eir ões
a b a ixo, p a s s a r p or t r á s d o p á t io d a es cola , n a Av. Pa r k ,
para cortar a retirada dos Bishops. Deveriam esperar até
ou vir o b a r u lh o d a lu t a e en t ã o a t a ca r p ela r et a gu a r d a .
O r es t a n t e a va n ça r ia d a R. S t . E d wa r d , a o la d o d a
es cola , t en t a n d o for ça r os Bis h op s a r ecu a r em p a r a
on d e o n os s o p elot ã o d e r et a gu a r d a cor t a r ia s u a
retirada.
Movemo-n os s ilen cios a m en t e, a p a n h a n d o n os s a s
a r m a s n os es con d er ijos a o s a ir m os . Tico es t a va a o m eu
lado, rindo. “Que tal, Nicky, está com medo ?”
“Ra p a z, eu n ã o ! É is t o qu e eu es t a va es p er a n do”,
d is s e, a b r in d o o b lu s ã o p a r a qu e ele p u d es s e ver o m eu
revólver.
“Qu a n t a s b a la s t em a í?” p er gu n t ou . “E s t á ch eio,
m en in o. Cin co b a la s .” “Puxa”, d is s e Tico, a s s ob ia n d o
baixo, “não está nada mal. Você deve pegar um daqueles
b a s t a r d os p r et os es t a n oit e, s em d ú vid a . E u ? Fico
com a minha faca.”
Dividimo-n os em gr u p os p equ en os , a fim d e p a s -
s a r m os d es p er ceb id os p ela d elega cia qu e h a via n a es -
qu in a d a s r u a s Au b u r n e S t . E d wa r d . Reu n im o-nos
defronte da escola, e Carlos deu o sinal de ataque.
Cor r em os a o r ed or d o ed ifício, e en t r a m os n o
p á t io. Os Bis h op s es t a va m n os es p er a n d o. “E ia ! eia !
m a t em ! p egu em !” gr it á va m os , en qu a n t o en xa m eá va m os
em d ir eçã o a o p á t io, e cor r ía m os p elo es p a ço a b er t o qu e
separava as duas quadrilhas.
Ar r em et i à fr en t e d o gr u p o, t ir a n d o o r evólver d o
cinto. Israel desviou-se para um lado, girando o seu taco
d e b eis eb ol. Ra p a zes volt ea va m a o m eu r ed or , gr it a n d o,
xin ga n d o e a t a ca n d o u n s a os ou t r os . Devia h a ver
d u zen t os r a p a zes n o p á t io, m a s es t a va es cu r o, e er a
d ifícil d is t in gu ir -s e a s qu a d r ilh a s . Vi Heit or cor r er p or
u m a qu a d r a d e b a s qu et e, e vi a lgu ém cor r en d o em
d ir eçã o a ele com u m a t a m p a d e la t a d e lixo. Heit or ca iu
p a r a t r á s , d is p a r a n d o a es p in ga r d a a o m es m o t em p o,
com um barulho ensurdecedor.
Per t o d ele u m r a p a z n egr o ca iu p a r a a fr en t e, com
s a n gu e es cor r en d o d e u m fer im en t o n a ca b eça . Pa s s ei
cor r en d o p er t o d ele e ch u t ei s eu cor p o. Pa r ecia u m s a co
de milho.
De r ep en t e, fu i em p u r r a d o p or t r á s , e m e es p a r -
ramei no cimento duro da quadra. Estendi as mãos para
d im in u ir o im p a ct o d a qu ed a , e s en t i a p ele d a p a lm a
d a s m in h a s m ã os es fola r -s e. Olh ei p a r a ver qu em m e
em p u r r a r a , e d es viei r a p id a m en t e a ca b eça exa t a m en t e
n o in s t a n t e em qu e u m t a co d e b eis eb ol es p a t ifa va -se
contra o pavimento, ao meu lado. Ouvi o taco estilhaçar-
se ao bater. Um golpe direto teria me matado.
Um gr a n d e gr it o leva n t ou -s e d os Ma u -Maus,
quand o o r es t o d a n os s a qu a d r ilh a a t a cou p ela
retaguarda. “Aca b em com eles , t u r m a , a ca b em com eles
!” Leva n t ei-m e ca m b a lea n d o, en qu a n t o os Bis h op s , a go-
r a em con fu s ã o, com eça va m a fu gir p ela s r u ela s qu e
d a va m p a r a a Ru a S t . E d wa r d . Is r a el es t a va a m eu la d o,
gritando: “Atira naquele lá, Nicky, atira nele.”
E le a p on t a va p a r a u m m en in o qu e t en t a va fu gir
mas fora ferido e estava tentando correr, meio coxeando,
ficando cada vez mais para trás dos Bishops que fugiam.
Fiz m ir a com o r evólver n a d ir eçã o d a figu r a
ca m b a lea n t e, e p u xei o ga t ilh o. A b a la d is p a r ou , m a s
ele a in d a cor r ia . Aga r r ei o r evólver com a m b a s a s m ã os ,
e puxei o gatilho outra vez.
“Você a cer t ou , ca r a , você a cer t ou .” Vi o r a p a z ca ir
p a r a a fr en t e, a o im p a ct o d a b a la n a coxa . E le a in d a
r a s t eja va , qu a n d o Is r a el a ga r r ou o m eu b r a ço e gr it ou :
“Vamos nos mandar, rapaz; aí vêm os tiras.” Ouvimos os
a p it os e gr it os d os gu a r d a s d ia n t e d a es cola , e a p olícia
r od ea n d o, cer ca n d o os Bis h op s qu e fu gia m p elo b eco,
t en t a n d o es ca p a r . Cor r em os n a d ir eçã o op os t a ,
espalhando-n os p elo fu n d o d o p á t io d a es cola . Olh ei
p a r a t r á s , a o p u la r u m a cer ca d e cor r en t e. Na
penumbra, pude ver ainda três rapazes caídos no pátio e
vá r ios ou t r os s en t a d os , a p er t a n d o os fer im en t os . A
batalha não durara mais de dez minutos.
Cor r em os s eis ou s et e qu a r t eir ões , a t é fica r m os
exa u s t os . Ca r los e m a is d ois r a p a zes u n ir a m -s e a n ós , e
p u la m os n u m a va let a d e es got o, qu e h a via a t r á s d e u m
posto de gasolina.
Is r a el es t a va s em fôlego, m a s r ia t a n t o qu e qu a se
n ã o a gü en t a va . “Você viu es s e Nick y m a lu co ?” a r qu ejou
ele en t r e ga r ga lh a d a s . “Ra p a z, ele p en s ou qu e er a u m
filme de mocinho e ficou dando tiros para o ar.”
Os ou t r os es t a va m r et om a n d o o fôlego e r in d o
t a m b ém . Pa r t icip ei d a a legr ia ger a l. E s t á va m os d eitados
d e cos t a s n a va let a , r in d o. At é p en s a m os qu e n os s os
p u lm ões ir ia m es t ou r a r . Is r a el t om ou fôlego e, com o
d ed o es t ica d o, fez: “Ba n g! Ba n g! Ba n g!” ca in d o ou t r a vez
n a r is a d a . Nós a p er t á va m os a b a r r iga e r olá va m os n a
valeta, rindo a mais não poder.
Sentia-m e b em . Tin h a vis t o s a n gu e cor r er . Ha via
a t ir a d o em a lgu ém , e t a lvez o h ou ves s e m a t a d o, e
h a vía m os con s egu id o es ca p a r . E u ja m a is t iver a a qu ela
s en s a çã o d e p er t en cer a u m gr u p o com o a qu e s en t ia a li
d en t r o d a qu ele fos s o, com a qu eles r a p a zes . E r a qu a s e
com o s e fôs s em os u m a fa m ília , e p ela p r im eir a vez n a
vida senti que era aceito e querido.
Is r a el es t en d eu o b r a ço e colocou -o a o r ed or d os
m eu s om b r os . “Você é d os b on s , Nick y. E s t a va es -
p er a n d o a lgu ém com o você h á m u it o t em p o. S om os d o
mesmo tipo — nós dois somos doidos.”
Ca ím os n a r is a d a ou t r a vez, m a s d en t r o d e m im
p en s ei qu e er a m elh or s er lou co e d es eja d o, d o qu e s er
normal e viver sozinho.
“E i, t u r m a , qu e t a l a gen t e b eb er ?” d is s e Ca r los ,
ainda empolgado pelo êxito. “Quem tem grana?”
Estávamos todos “duros”.
“Vou arrumar dinheiro”, disse eu.
“O qu e é qu e você va i fa zer ? a s s a lt a r a lgu ém ?”
perguntou Israel.
“Cer t o, m eu ch a p a . Qu er ir t a m b ém ?” Is r a el d eu
u m s oco n o m eu b r a ço: “Você é lega l, Nick y. Ra p a z, você
n ã o t em cor a çã o, n em s en t im en t os . Tu d o o qu e você
quer é brigar. Vamos, cara, nós estamos com você.”
Olh ei p a r a Ca r los , qu e d evia s er o líd er . J á es tava
d e p é, p r on t o p a r a s a ir . Foi a m in h a p r im eir a in d ica çã o
d e qu e os ou t r os r a p a zes s egu ir ia m o qu e fos s e o m a is
cruel, o mais sedento de sangue, o mais corajoso.
Levantamo-n os d o fos s o, e a t r a ves s a m os a r u a ,
cor r en d o p a r a u m a r u ela es cu r a . Na es qu in a , b r ilh a vam
luzes em um bar que ficava aberto a noite inteira. Dirigi-
me para lá.
Ha via t r ês p es s oa s n a la n ch on et e. Du a s d ela s , u m
h om em e u m a s en h or a , es t a va m p or t r á s d o b a lcã o. Um
velh o a ca b a r a d e leva n t a r -s e d u m b a n qu in h o, d ia n t e d o
b a lcã o, e es t a va p a ga n d o a con t a . Ch egu ei p er t o d ele e
empurrei-o con t r a o b a lcã o. E le vir ou -s e com s u r p r es a e
m ed o, lá b ios t r êm u los , a o ver -m e a p er t a r o b ot ã o d a
m in h a fa ca , a b r i-la , e en cos t á -la d e leve n o s eu
estômago.
“Va m os , velh o. Dá a qu i”, d is s e eu , fa zen d o s in a l
com a cabeça para as notas em sua mão.
O h om em qu e es t a va a t r á s d o b a lcã o com eçou a
mover-se em direção ao telefone público, na parede.
Is r a el a b r iu o p u n h a l e a ga r r ou o h om em p ela
p a r t e s u p er ior d o a ven t a l. E m p u r r a n d o-o com for ça con -
t r a o b a lcã o, ele d is s e: “E i, ca r a , você qu er m or r er ,
hein?” Ou vi a m u lh er en ga s ga r -s e e coloca r a m ã o n a
b oca p a r a s u foca r u m gr it o. Is r a el em p u r r ou o h omem
p a r a t r á s , s ob r e a ca ixa e t ir ou o fon e d o ga n cho. “Você
qu er ch a m a r os t ir a s , gr a n d ã o ?” zom b ou ele. “Pronto,
aqui está!” Deu um sorriso de mofa, enquanto arrancava
o r ecep t or d a p a r ed e e a t ir a va p a r a o h om em . “Pode
ch a m a r !” O h om em , es t on t ea d o, a p a n h ou o fon e e ficou
a s egu r á -lo p elo fio, qu e os cila va com o o fio d e u m
pêndulo.
“Vamos depressa, velho. Não posso esperar a noite
toda”, r os n ei. E le es t en d eu a m ã o t r êm u la à m in h a
frente, e eu a r r eb a t ei a s n ota s d e en tr e os s eu s d ed os .
“Is t o é t u d o?” p er gu n t ei. E le t en t ou r es p on d er , m a s
n en h u m s om s a iu d os s eu s lá b ios t r êm u los . Os olh os
com eça r a m a gir a r p a r a t r á s n a s ór b it a s , a s a liva a
cor r er d os ca n t os d a b oca , en qu a n t o d a va gr u n h id os
esquisitos.
“Vamos nos mandar daqui”, disse um dos rapazes.
Ca r los a p er t ou u m b ot ã o d a ca ixa r egis t r a d or a , e r a p ou
t od a s a s n ot a s , en qu a n t o n os a fa s t á va m os p a r a a p or t a .
O velh o d es p en cou p or t er r a , a p er t a n d o o p eit o com a s
mãos, produzindo ruídos, como de cacarejo.
“E i, es p er a ”, d is s e Is r a el, en qu a n t o a ga r r a va u m
p u n h a d o d e t r oco d a ca ixa r egis t r a d or a . Moed a s d e
t od os os t a m a n h os t ilin t a r a m n o ch ã o d u r o. Is r a el
es t a va r in d o. “Nu n ca s a ia d e u m a es p elu n ca s em d eixa r
u m a gor jet a ”, ga r ga lh ou . Tod os r im os . O hom em e a
m u lh er a in d a es t a va m p r es os à p on t a d o b a lcã o, e o
velho estava ajoelhado no chão, todo curvado.
Apanhei um pesado açucareiro e espatifei-o contra
o vidro da vitrine.
“Ra p a z, você é lou co”, gr it ou Ca r los e com eça mos
a cor r er r u a a b a ixo. “Isto va i a t r a ir t od os os t ir a s d e
Br ook lin . Va m os n os m a n d a r d a qu i.” O velh o ca iu
p a r a fr en t e, d e r os t o n o ch ã o. Cor r em os p ela r u a es cu r a
até em casa, rindo e gritando.
Dois m es es d ep ois Ca r los foi a p a n h a d o p ela p o-
lícia , e con d en a d o a s eis m es es d e ca d eia . Na qu ela n oit e
t ivem os u m a gr a n d e r eu n iã o d a qu a d r ilh a n o a u d it ór io
d a es cola p er t o d o 6 7 .° Dis t r it o. Nin gu ém p od ia en t r a r
n a es cola for a d o exp ed ien t e, m a s fizem os u m t r a t o com
Fir p o, vice-p r es id en t e d os Ch a p la in s , cu jo p a i er a
zela d or d a es cola . E le d eixa va a s qu a d r ilh a s u s a r em o
a u d it ór io d o p r éd io, d e n oit e, p a r a r eu n iões , p or qu e
t in h a m ed o d o filh o. Na qu ela n oit e p r om ovem os Is r a el à
p r es id ên cia , e eu fu i es colh id o com o vice-p r es id en t e p or
unanimidade.
Dep ois d a r eu n iã o d a qu a d r ilh a , t ivem os u m a
“festinha” n o p or ã o d a es cola . Ha via u m gr a n d e n ú mero
de “bonecas”, e u m d os r a p a zes m e a p r es en t ou s u a
ir m ã , Líd ia , qu e m or a va d efr on t e à es cola . Pica m os
m u it o t em p o n a es cola , n a qu ela n oit e, fu mando
m a con h a , b eb en d o vin h o b a r a t o, e s en t a d os n a
es ca d a r ia in t er ior , n a m or a n d o, en qu a n t o ou t r os
d a n ça va m a o s om d e u m fon ógr a fo. A es ca d a es t a va
fechada por um gradil que vários casais abriam, a fim de
subir ao primeiro andar, para fazer amor, no escuro.
Pu xei Líd ia p ela m ã o: “Va m os ca ir for a .” Qu a n do
s a ím os p ela p or t a , ela ch egou -s e a m im : “S ou s u a p a r a
sempre, Nicky. Sempre que você me quiser, eu sou sua.”
Nos qu a t r o m es es s egu in t es h ou ve b r iga s , r ou bos,
e ou t r a s a t ivid a d es d a qu a d r ilh a . Fu i a ga r r a d o p ela
p olícia qu a t r o vezes , m a s em n en h u m a d ela s p u d er a m
provar cois a a lgu m a con t r a m im . Tod a s a s vezes s a í
livre, recebendo apenas uma advertência.
Os m em b r os d a qu a d r ilh a gos t a va m d e m im e m e
r es p eit a va m . E u n ã o t in h a m ed o d e cois a a lgu m a , e
es t a va d is p os t o a b r iga r t a n t o à p len a lu z d o d ia , com o
sob o manto das trevas.
Cer t a t a r d e u m d os Ma u -Ma u s con t ou qu e Líd ia
h a via m e d ela t a d o a u m Ap a ch e. Meu s a n gu e fer veu e
eu d is s e qu e ia m a t a r Líd ia . Volt ei a o m eu a p a r t a mento
p a r a p ega r o r evólver . Um d os r a p a zes con t ou a o ir m ã o
d ela e ele cor r eu a a vis á -la . Qu a n d o ch egu ei a o
a p a r t a m en t o d ela , con ver s ei com Lu ís , s eu ir m ã o m a is
velh o. E le m e d is s e qu e u m d os Ap a ch es en con t r a r a
Líd ia n a r u a , n a n oit e a n t er ior , e b a t er a n ela , p a r a s a b er
onde eu morava, pois queria me matar.
S a í d e lá e s egu i p a r a o a p a r t a m en t o d e Is r a el.
Saím os p r ocu r a n d o o Ap a ch e d e qu em Lu ís n os fa lara.
Encontramo-lo n a es qu in a d a s r u a s La fa yet t e e For t
Gr een e, d efr on t e à Ca s a d e Ca r n es Ha r r y. Ma is s eis
Mau-Ma u s r eu n ir a m -s e a n ós for m a n d o u m p equeno
cír cu lo. Dei u m s oco n o r a p a z, d er r u b a n d o-o, e b a t i n ele
com u m ca n o d e m et a l. E le r ogou -m e qu e n ã o o
m a t a s s e. A t u r m a es t a va r in d o; con t in u ei golp ea n d o-o;
acertei-o r ep et id a s vezes , e ele ficou cob er t o d e s a n gu e.
Os es p ect a d or es cor r er a m , en qu a n t o a su rra
con t in u a va . Fin a lm en t e, qu a n d o ele n ã o p od ia m a is
leva n t a r os b r a ços p a r a p r ot eger -s e con t r a os golp es , eu ,
maldosamente, amassei o cano contra os seus ombros, e
con t in u ei b a t en d o n ele a t é qu e ca iu , in con s cien t e, em
uma poça de sangue.
“E s t ú p id o, s eb en t o ! Is t o t e en s in a r á a n ã o b a t er
n a m in h a ga r ot a .” S a ím os cor r en d o. E u es t a va a n sioso
p a r a d izer a Líd ia o qu e fizer a p a r a d efen d er s u a h on r a ,
embora uma hora antes estivesse disposto a matá-la.
À m ed id a qu e o ver ã o a va n ça va , a s b r iga s d e r u a
tornavam-s e p ior es . O ca lor n os a p a r t a m en t os er a
in s u p or t á vel, e n ós ficá va m os n a r u a a m a ior p a r t e d a
n oit e. Dificilm en t e u m a n oit e s e p a s s a va s em a t ivid a d e
das quadrilhas.
Nin gu ém d e n os s a ga n g t in h a ca r r o. S e qu er ía mos
ir a a lgu m lu ga r , t om á va m os o m et r ô, ou r ou bávamos
u m ca r r o. E u n ã o s a b ia gu ia r , m a s u m a n oit e Ma n nie
Du r a n go ch egou p a r a m im e d is s e: “Va m os r ou b a r u m
carro e dar uma volta.”
“Você sabe de algum ?” perguntei.
“S im , m eu ch a p a , logo a li vir a n d o a es qu in a . É
u m a b eleza , e o b ob o d o d on o d eixou a s ch a ves n o
contato.”
Fu i com ele e vi o ca r r o, d efr on t e a u m p r éd io d e
a p a r t a m en t os . Ma n n ie t in h a r a zã o, er a u m a b eleza . E r a
u m Ch evr olet con ver s ível com a ca p ot a a b a ixada.
Pu la m os p a r a d en t r o e Ma n n ie s en t ou -s e a t r á s d o
vola n t e. Reclin ei-m e n o b a n co a o s eu la d o, e fu m a va u m
cigarro, sacudindo as cinzas por sobre a porta, como um
grã-fin o s ofis t ica d o. Ma n n ie vir a va a d ir eçã o p a r a u m
la d o e p a r a ou t r o, fa zen d o r u íd os com a b oca , im it a n d o
pneus derrapando e motor de carro de corrida.
“Rr r u u u u u m m m m m m m ! Rr u u u u m m m m m m m !
Rroooouurrrrr!” Comecei a rir.
“Ei, Mannie, você sabe mesmo guiar este carro?”
“Claro, rapaz, olhe só.”
E le gir ou a ch a ve qu e es t a va p en d u r a d a n o con -
t a t o e o ca r r o r u giu . E n ga t ou em m a r ch a -r é e ca lcou o
p é n o a celer a d or , t r om b a n d o com u m ca m in h ã o qu e
es t a va es t a cion a d o a t r á s . Ou vim os b a r u lh o d e vid r o
quebrado.
“E i, m eu ch a p a ”, fa lei, r in d o, “você é u m m ot orista
b a ca n a . Pu xa , você s a b e m es m o m exer com es s e t r oço.
Quero ver agora se sabe andar para a frente.”
Ma n n ie en ga t ou a m a r ch a , eu m e r et es ei n o b a n -
co, e o ca r r o ch is p ou p a r a a fr en t e, b a t en d o n a t r a seira
d e ou t r o ca r r o. De n ovo h ou ve u m es t r on d o for t e d e
vidro quebrado e de lata amassada.
Nós d ois r ía m os t a n t o qu e n ã o vim os u m h omem
s a ir cor r en d o d o a p a r t a m en t o, e gr it a r con os co. “Saiam
d o m eu ca r r o, s eu s ca ch or r os !” gr it a va ele, t en t a n d o
tirar-m e d o a s s en t o. Ma n n ie a r r a n cou p a r a r é e fez o
h om em p er d er o equ ilíb r io, joga n d o-o p a r a t r á s . Pegu ei
u m a ga r r a fa d e r efr iger a n t e qu e es t a va n o b a n co d o
ca r r o e d ei-lh e u m a for t e p a n ca d a n a m ã o, qu e s e
agarrava desesperadamente
à p or t a . E le gr it ou d e d or . Ma n n ie en ga t ou a
primeir a e n ós n os a r r em es s a m os p a r a a r u a . E u a in d a
est a va r ecos t a d o n o a s s en t o, r in d o d es b r a ga d a m en t e.
J ogu ei a ga r r a fa n a ca lça d a , e ou via qu eb r a r -s e, en -
quanto saíamos à toda.
Ma n n ie n ã o s a b ia gu ia r . E le vir ou a es qu in a , com
os pn eu s ca n t a n d o, e en t r ou n o la d o er r a d o d a Av. Pa r k .
Por p ou co n ã o colid im os com d ois ca r r os , e ou t r o,
b u zin a n d o in s is t en t em en t e, s u b iu n a ca lça d a , p a r a
evit a r u m a colis ã o. Nós d ois es t á va m os r in d o e gr it a n d o.
Ma n n ie a t r a ves s ou u m p os t o d e ga s olin a e s a iu por uma
rua lateral.
“Va m os p ôr fogo n es t e ca r r o”, d is s e Ma n n ie. “Não,
ca r a ! E s t e ca r r o é u m a b eleza . Va m os fica r com ele.
Vamos mostrá-lo as garotas.”
Por ém Ma n n ie n ã o foi ca p a z d e fa zer a volt a e
fin a lm en t e en fiou -o n a t r a s eir a d e u m ca m in h ã o qu e
parara d ia n t e d e u m s in a l ver m elh o. Pu la m os p a r a for a
e cor r em os r u a a b a ixo, d eixa n d o o ca r r o s er ia mente
danificado enfiado sob a carroceria do caminhão.
Mannie era o tipo ideal de companheiro para mim.
Mal sabia eu o horror que estava reservado para ele.
Todos os d ia s n os d á va m os a m u it a s a t ivid a d es
cr im in os a s . As n oit es er a m a in d a p ior es . Um a n oite,
Ton y e m a is qu a t r o r a p a zes a t a ca r a m u m a s en h or a qu e
volt a va d o s er viço p a r a ca s a , a r r a s t a r a m -n a p a r a u m
ja r d im , on d e os cin co a b u s a r a m d ela , d u a s vezes ca d a
um. Ton y t en t ou m a t á -la p or a s fixia , com o s eu
cin t u r ã o. Ma is ta r d e ela o id en tificou , e ele foi
condenado a doze anos de prisão.
Du a s s em a n a s d ep ois , eu e m a is qu in ze p ega mos
u m r a p a z it a lia n o a n d a n d o n os d om ín ios d os Ma u -
Ma u s . Rod ea m o-lo e joga m o-lo a o s olo. Coloquei-me
s ob r e ele, b r in ca n d o com a fa ca , es p et a n d o d e leve o s eu
p om o d e Ad ã o, e cu t u ca n d o os b ot ões d a s u a ca m is a .
Xingando-m e, ele d eu u m t a p a n a fa ca , a r r eb a t a n d o-a
d a m in h a m ã o, e a n t es qu e eu p u d es s e m over -m e, Tico
pegou-a e r is cou o r os t o d ele. O r a p a z gr it ou qu a n d o
Tico cor t ou s u a ca m is a e r is cou u m en or m e “M” n a s
s u a s cos t a s . “Olh e a qu i, ca r a , is t o é p a r a en s in a r você a
n ã o p is a r n os d om ín ios d os Ma u -Maus”, d is s e ele.
S a ím os cor r en d o, d eixa n d o-o en s a n gü en t a d o n a
calçada.
Tod os os d ia s os jor n a is es t a m p a va m r ep or t a gens
d e a s s a s s in a t o n os ja r d in s , n os m et r ôs , n a s t r a vessas,
n os s a gu ões d os p r éd ios d e a p a r t a m en t os , n os b ecos .
Todas as noites havia “quebra-pau”.
Os d ir et or es d a E s cola Técn ica d e Br ook lin m a n -
d a r a m coloca r t ela s d e a r a m e gr os s o s ob r e a s p or t a s e
ja n ela s d a es cola . Tod a s a s ja n ela s , m es m o a s d o qu in t o
andar, estavam cobertas de tela metálica.
Mu it os p r op r iet á r ios d e loja s es t a va m com p r a n do
cã es p olicia is , e d eixa va m -n os p r es os d en t r o d a s loja s ,
durante a noite.
As ga n gs es t a va m fica n d o m a is or ga n iza d a s , e
n ova s qu a d r ilh a s es t a va m s e for m a n d o. Tr ês ga n gs
n ova s h a via m s u r gid o em n os s o b a ir r o: a S cor p ion s , a
Viceroys e a Quentos.
Des cob r im os p ou co d ep ois qu e a lei d a cid a d e d e
Nova Yor k p r oib ia os p olicia is d e r evis t a r em m u lh er es.
Por is s o, d eixá va m os a s ga r ot a s ca r r ega r n os s os
r evólver es e fa ca s , a t é n a h or a em qu e p r ecisássemos
d eles . S e u m gu a r d a p a r a s s e p a r a n os r evis t a r , a s
ga r ot a s fica va m p a r a t r á s e gr it a va m : “E i, t ir a s u jo!
La r gu e d ele. E le n ã o t em n a d a , es t á lim p o. Por qu e você
n ã o vem m e r evis ta r ? d ep ois eu t e p on h o n a ca d eia . E i,
tira, você não quer pôr as mãos em mim? Venha!”
Ap r en d em os a fa zer r evólver es p a r a b a la s ca libre
vin t e e cin co, u s a n d o a n t en a d e ca r r o e p eça s d e
fech a d u r a . Oca s ion a lm en t e u m d es s es r evólver es
exp lod ia n a m ã o d e a lgu ém , ou a t ir a va p a r a t r á s
cegando-o. Ma s n ós con s egu im os fa b r ica r gr a n d e
n ú m er o d eles e ven d ê-los p a r a m em b r os d e ou t r a s
quadrilhas — s a b en d o qu e eles os u s a r ia m con t r a n ós ,
se tivessem oportunidade.
Na qu ele ver ã o, n o d ia qu a t r o d e ju lh o, t od a s a s
ga n gs r eu n ir a m -s e n o p a r qu e d e d iver s ões d e Con ey
Is la n d . Os jor n a is ca lcu la r a m qu e m a is d e oit o m il
joven s , m em b r os d e qu a d r ilh a s , con ver gia m p a r a Coney
Is la n d . Nin gu ém p a gou . E les a p en a s en t r a r a m
em p u r r a n d o o p or t ã o, e n in gu ém ou s ou d izer cois a
alguma. O mesmo aconteceu no metrô.
No dia primeiro de agosto, Israel foi apanhado pela
p olícia . Qu a n d o s a iu d a ca d eia , d is s e-n os qu e a s cois a s
es t a va m m es m o p r et a s p a r a ele, e qu e qu er ia a s s u m ir
u m a p os içã o s ecu n d á r ia , a t é qu e a s it u a çã o es fr ia sse.
Con cor d a m os , e a qu a d r ilh a m e elegeu p r es id en t e,
d es ign a n d o Is r a el p a r a s er vir com o vice-p r es id en t e a t é
qu e t u d o es fr ia s s e. E u fa zia p a r t e d a qu a d r ilh a h á s eis
meses, quando passei a ser chefe.
Nã o levei m u it o t em p o p a r a p er ceb er qu e os Ma u -
Ma u s er a m m u it o t em id os , e qu e eu h a via ga nhado
r ep u t a çã o d e s er u m va len t ã o s a n gu in á r io. E u m e
gloriava dessa reputação.
Cer t a n oit e, fom os t od os a u m gr a n d e b a ile qu e
er a p r om ovid o p elo cen t r o s ocia l d a igr eja d e S t . E d wa r d
— S t . Mich a el. A igr eja es t a va fa zen d o u m a t en t a t iva
p a r a a fa s t a r os r a p a zes d a s r u a s , e h a via a b er t o u m a
ca n t in a logo a b a ixo d a d elega cia d e p olícia , p a r a r ea liza r
b a iles n os fin s d e s em a n a . Tod a s ext a -feir a h a via a li u m
con ju n t o d e d a n ça e t od os os m em b r os d a s qu a d r ilh a s
ia m a o cen t r o p a r a d a n ça r . Fica va m n a r u a t a m b ém ,
d efr on t e a o cen t r o, e b eb ia m cer veja e vin h o b a r a t o. Na
s em a n a a n t er ior n ós h a vía m os n os em b eb ed a d o, e
qu a n d o os p a d r es t en t a r a m fa zer -n os fica r qu iet os ,
b a t em os e cu s p im os n eles . A p olícia veio e n os p ôs a
correr. Raramente passava-se uma sexta-feira sem que o
baile da cantina não se transformasse em tumulto.
Na qu ela n oit e, eu for a com Ma n n ie e Pa co. E s -
t á va m os b eb en d o m u it o e fu m a n d o m a con h a . Ma r quei
u m a b on it a ga r ot a lou r a e d a n cei vá r ia s vezes com ela .
E la m e d is s e qu e o ir m ã o es t a va com p lica d o com a ga n g
Phantom Lords. Eles iam matá-lo.
“On d e es t á s eu ir m ã o?” p er gu n t ei. “Nin gu ém va i
machucá-lo sem minha ordem. Vamos falar com ele.”
Levou-m e a u m ca n t o d a s a la , e a p r es en t ou -me ao
ir m ã o. E le d is s e qu e a t u r m a Ph a n t om Lor d s d a Av.
Bed for d qu er ia m a t á -lo p or qu e ele n a m or a va u m a d a s
suas “bonecas”. O r a p a z es t a va com p let a m en t e b êb ed o e
muito amedrontado.
“Olhe”, d is s e eu “s u a ir m ã é u m a m en in a b a ca na.
Ach o qu e vou qu er er s a ir com ela m a is vezes , e com o
gosto dela, vou tomar conta de você também.”
E u já m a r ca r a en con t r o com a ga r ot a , p a r a levá-la
a o cin em a . Dis s e-lh e qu e t er ia d e fa zer t u d o o qu e eu
quisesse, porque eu era o presidente dos Mau-Maus. Ela
ficou a m ed r on t a d a , e d is s e qu e ir ia com igo, m a s n ã o
qu er ia qu e n en h u m d os ou t r os r a p a zes t oca s s e n ela .
Nós n os b eija m os e eu d is s e qu e en qu a n t o ela es t ives s e
comigo eu cuidaria dela.
Leva n t a m os os olh os exa t a m en t e n o in s t a n t e em
qu e t r ês Ph a n t om Lor d s en t r a va m p ela p or t a . E s t a vam
ves t id os com p a let ós es p a lh a fa t os os e ca lça s xa d r ez, e
t in h a m ch a veir o com cor r en t e lon ga . Um d os r a p a zes
p a s s ou p er t o d e n ós gir a n d o a cor r en t e e p is cou p a r a a
m in h a ga r ot a . E la d eu -lh e a s cos t a s e eu p u s o b r a ço a o
seu redor.
“E i, m en in a ”, zom b ou ele, “qu e t a l s a ir com igo?
Meu ir m ã o es t á com o ca r r o a í for a , e o b a n co d e t r á s
fica r es er va d o s ó p a r a n ós ...” “E s t á qu er en d o m or r er ”,
rosnei. “Bruto”, r iu o r a p a z, “n ós já es t a m os p la n eja n do
m a t a r o s eu a m igo b êb ed o, e b em p od em os m a t a r você
também, vagabundo.”
Ma n n ie d eu u m a ga r ga lh a d a zom b et eir a . O r a paz
virou-se rápido: “Quem foi?”
Ma n n ie com eçou a r ir , m a s eu s en t i a t em p es tade
n o a r , e r es p on d i: “Ninguém.” Com ecei a m e a fa s t a r ,
m a s o r a p a z voou p a r a o la d o d e Ma n n ie, e d eu -lh e u m
s oco, d er r u b a n d o-o. Dep ois d e Is r a el, Ma n n ie er a o m eu
m elh or a m igo. Nin gu ém ir ia fer i-lo n a m in h a p r es en ça ,
s em r eceb er o t r oco. Volt ei e d ei n o r a p a z u m golp e
t er r ível n a s cos t a s , b em a cim a d os r in s . E le a p er t ou os
rins com as mãos, e gritou de dor.
Ma n n ie leva n t ou -s e a os t r op eções e p u xou d a
fa ca . E u p egu ei a m in h a t a m b ém e os ou t r os r a p a zes
for m a r a m u m s em icír cu lo e a va n ça r a m con t r a n ós . Nã o
h a via m u it os d e n os s o gr u p o p a r a b r iga r , p or is s o
r ecu a m os p a r a a p or t a . Qu a n d o ch ega m os à es ca d a , u m
r a p a gã o a r r em et eu con t r a m im com u m a fa ca . E le er r ou
o golp e, m a s a fa ca cor t ou m eu p a let ó. Qu a n d o ele
t r op eçou d evid o à violên cia d o golp e fr u s t r a d o, a t in gi-o
n a n u ca e ch u t ei-o p elos d egr a u s d e con cr et o a b a ixo.
Dois ou t r os p u la r a m s ob r e m im . Ma n n ie p u xou o m eu
p a let ó e n ós com eça m os a cor r er . “Vamos”, gr it ei. “Vou
procurar os Ma u -Ma u s , e volt a m os p a r a in cen d ia r es t e
lugar.”
Os r a p a zes olh a r a m u m p a r a o ou t r o. Nã o s a biam
qu e eu er a Ma u -Ma u , p ois es t a va ves t id o d e p a let ó e
gravata, naquela noite. Começaram a recuar para a sala,
e Mannie e eu viramo-nos e saímos.
No dia seguinte chamei Mannie e Paco. Estávamos
a t r á s d e S a n t o, o Ph a n t om Lor d qu e h a via a m ea ça d o o
ir m ã o d a lou r a . Ma n n ie e eu h a vía m os b eb id o, e
estávamos quase bêbedos. Fomos até a Loja de Doces da
Ru a Tr ês , e vi a lgu n s Ph a n t om Lor d s . “Qu a l d e vocês é
Santo?” perguntei. Um dos rapazes deu uma olhadela na
d ir eçã o d e u m r a p a z a lt o d e ca b elo a n ela d o. E u d is s e:
“Ei, garotão, qual é o seu nome? Santo do Dia?”
Mannie riu, e o rapaz olhou para mim e me xingou
de um palavrão.
“Olh e, m en in o”, d is s e eu , “es t á s en d o b ob o. S a b e
quem são os Mau-Maus?”
“S im , ou vi fa la r d eles . E les s ã o s a b id os d em a is
para ficar vadiando por aqui.”
“Hoje eles es t ã o a qu i, ca r a . Aqu i es t ã o os Ma u -
Ma u s . Meu n om e é Nick y. S ou o p r es id en t e. Você va i
lembrar este nome o resto da vida, moleque.”
O d on o d a loja es t en d eu a m ã o p a r a o t elefon e.
Pus a mão no bolso e espetei o dedo contra o forro, como
s e t ives s e u m r evólver n o b ols o. “Você a í!” gr it ei, “largue
isso!”
Os ou t r os fica r a m com m ed o e r ecu a r a m . E n -
caminhei-m e p a r a S a n t o e d ei-lh e d ois t a p a s n o r os to.
Con s er va va a in d a a ou t r a m ã o n o b ols o: “Qu em s a b e s e
você agora vai lembrar de mim, cara.” Ele vacilou, e eu o
golp eei n o es t ôm a go. “Vamos”, d is s e eu a Pa co, “vamos
s a ir d a qu i. E s s es ca r a s es t ã o com m ed o.” Vir a m o-n os e
começa m os a s a ir ; cu s p i p or s ob r e o om b r o. “Da p r óxi-
ma vez, diga à sua mamãe para não se esquecer de pôr a
fr a ld a em vocês , a n t es d e d eixá -los sair. Vocês ainda são
nenês.” Rim os u m p a r a o ou t r o e s a ím os . Qu a n d o
ch ega m os à r u a , Ma n n ie colocou a m ã o n o b ols o d o
p a let ó e a p on t ou o d ed o a t r a vés d o t ecido: “Ba n g! b a n g!
b a n g! Você es t á m or t o!” gr it ou ele. Rim os e d es cem os
bamboleando rua abaixo.
Na qu ela n oit e Is r a el foi à m in h a ca s a e d is s e qu e
os Ph a n t om Lor d s es t a va m s e p r ep a r a n d o p a r a u m
grande “quebra-pau”. p or ca u s a d a b r iga d a con feitaria.
Israel e eu passamos na casa de Mannie para apanhá-lo,
e d ir igim o-n os p a r a os d om ín ios d os Ph a n t om Lor d s , a
fim d e s u r p r een d ê-los a n t ecip a d a m en t e. Qu a n d o
ch ega m os p er t o d a p on t e d e Br ook lin , s ep a r a m o-nos.
Is r a el e Ma n n ie r od ea r a m o qu a r teirão, e eu d es ci
d ir et a m en t e p ela r u a . Pou cos in s t a n t es d ep ois , ou vi
Is r a el gr it a r e s a í cor r en d o a t od a , r od ea n d o o ed ifício.
E les h a via m s u r p r een d id o u m Ph a n t om Lor d s ozin h o, e
tinham-no deitado na calçada, pedindo misericórdia.
“Tir a a ca lça d ele”, or d en ei. Os r a p a zes d es a fi-
vela r a m o cin t o e t ir a r a m -lh e a ca lça . J oga r a m -n a n a
sarjeta de água suja, e depois rasgaram sua cueca.
“De p é, a b or t o, e com ece a cor r er .” Ob s er va m o-lo
en qu a n t o ele cor r ia a t er r or iza d o, r u a a b a ixo. Ficamos
rindo e gritando nomes.
“Vamos”, d is s e Is r a el, “n en h u m d a qu eles m a lo-
qu eir os es t á p or a qu i. Va m os volt a r p a r a ca s a .” Co-
m eça m os a volt a r , qu a n d o r ep en t in a m en t e fom os
r od ea d os p or u m a t u r m a d e d oze ou qu in ze Ph a n tom
Lor d s . E r a u m a em b os ca d a . Recon h eci a lgu n s m em b r os
d e u m a ga n g d e ju d eu s com eles . Um r a p a z a va n çou
p a r a m im com u m a fa ca , e eu o fer i com u m ca n o d e
fer r o. Ou tr o a r r em et eu com ím p et o con t r a m im ; d ei u m a
guinada e golpeei-o no lado da cabeça com o cano.
Foi en t ã o qu e eu s en t i u m a exp los ã o n a n u ca , e
ca í n a ca lça d a . Min h a ca b eça p a r ecia qu e ia es t ou rar.
Ten t ei olh a r p a r a cim a , p or ém u m d eles ch u tou-m e o
r os t o com u m s a p a t o d e ch a p in h a . Ou t r o ch u t ou -me
n a s cos t a s , à a lt u r a d a cin t u r a . Ten t ei leva n t a r -m e, m a s
fu i a t in gid o a cim a d os olh os , com u m ca n o. E u s a b ia
qu e eles ir ia m m a t a r -m e, s e eu n ã o fu gis s e, m a s n ã o
con s egu ia leva n t a r -m e. Ca í d e volt a n a ca lça d a , d e
b r u ços , e s en t i qu e o r a p a z qu e t in h a ch a p in h a s n o
s a p a t o p u lou n a s m in h a s p er n a s e d ep ois s a p a t eou
s ob r e a s m in h a s cos t a s . As ch a p in h a s er a m a fia d a s
com o gilet es . S en t i o a ço a fia d o r a s ga n d o m in h a ca lça e
afundando-s e n a ca r n e d e m in h a s coxa s e n á d ega s .
Desmaiei de dor
A p r im eir a cois a d e qu e m e lem b r o a s egu ir , é d e
Is r a el e Ma n n ie a r r a s t a n d o-m e p or u m b eco. E u s a b ia
qu e es t a va m u it o fer id o, p or qu e n ã o er a ca paz d e fir m a r
a s p er n a s . “Va m os , cor r a !” con t in u a va m a d izer .
“Aqu eles b a s t a r d os vã o es t a r d e volt a n u m m in u t o.
Precisamos nos raspar “
Des m a iei d e d or ou t r a vez, e, qu a n d o r ecu p er ei os
s en t id os , es t a va n o ch ã o d e m eu a p a r t a m en t o. E les
haviam-m e a r r a s t a d o o ca m in h o t od o, a t é em ca s a , e
s u b id o os t r ês la n ces d e es ca d a , leva n d o-m e a t é m eu
qu a r t o. Ha via m -m e a ju d a d o a d eit a r n a ca m a , on d e eu
d es m a ia r a d e n ovo. O s ol for t e jor r a va a tr a vés d a ja n ela ,
qu a n d o a cor d ei e a r r a s t ei-m e p a r a for a d a ca m a . E s t a va
tão dolorido que mal podia mover-me. A parte inferior do
m eu cor p o es t a va cob er t a d e s a n gu e coa gu la d o. Ten t ei
t ir a r a s ca lça s , m a s o s a n gu e cola r a o t ecid o à m in h a
ca r n e, e eu s en t i qu e es t a va r a s ga n d o a p ele, a o t ir á -la.
Des ci ca m b a lea n t e u m la n ce d e es ca d a s , a t é o b a n h eir o
e fiqu ei d eb a ixo d o ch u veir o, d e r ou p a e t u d o, a t é qu e o
s a n gu e a m oleceu e p u d e a fa s t a r a r ou p a d a s fer id a s .
Min h a s cos t a s e qu a d r is er a m u m a ver d a d eir a m a s s a d e
cor t es p r ofu n d os e ch a ga s h or r íveis . Volt ei ca m b a lea n t e,
s u b i n u a s es ca d a s , lembrando-m e d o r a p a z qu e cor r er a
de nós, sem calças.
“Puxa”, p en s ei, “s e ele p u d es s e m e ver a gor a ...”
Arrastei-m e a t é o qu a r t o e p a s s ei o r es t o d o d ia fa zen d o
cu r a t ivos n os m eu s cor t es . S er p r es id en t e d os Ma u -
Ma u s er a b om , m a s h a via cer t a s h or a s em qu e p od ia
significar a morte. Desta vez ela chegara bem perto.
Capítulo 6
O INF E R NO
F I LH O D E LÚ C I F E R
Capítulo 8
A G A R G A LH A D A D O D I A B O
Capítulo 9
NA F OS S A
Capítulo 10
O E NCONT R O
Capítulo 11
S AI N D O D O D E S E R T O
Capítulo 12
E N V O LV I D O N A E S C O LA
“Querido Nicky :
Fico s a t is feit o em s a b er qu e você es t á in d o t ã o
bem. Ame a Deus e fuja de Satanás.
Pen a qu e eu n ã o t en h a d in h eir o em ca ixa , a gor a .
E s cr ever ei m a is t a r d e p a r a você, qu a n d o con s egu ir
algum dinheiro. Seu amigo, Davi.”
“Querido Nicky:
Fiqu ei s a t is feit o em r eceb er n ot ícia s s u a s . E n viei
dinheiro para a sua família, para que você possa ficar na
escola. Deus o abençoe.”
Capítulo 13
O N D E O S AN J O S T E ME M
AN D AR
Capítulo 14
G LÓ R I A
Capítulo 15
P AS S E I O AO I N F E R N O
Capítulo 16
C O M C R I S T O N O H A R LE M
E le t er m in ou a or a çã o. A Kom b i es t a va em
s ilên cio. E n t ã o Glór ia leva n t ou a voz — b ela , s u a ve —
terminando as palavras do salmo:
Capítulo 17
N O V A LE D A S S O M B R A S
Capítulo 18
NO T E R R IT ÓR IO D E
J E S US
Ep ílo go
Kathryn Kuhlman
Pittsburg, Pensilvânia
***
Nicky Cruz
Notas da digitalizadora: