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Folhetim Nº.

13 Janeiro 2022

R e f e r e n c i a l

1. Há nove anos, nesta data, nasceu a Medu- teer e Henrique Manuel Bento Fialho — ami-
la. Em 2013 eu estava desempregado, a troika gos certos.
apertava o cerco. Criar uma editora seria uma
boa maneira de ocupar o espaço da inquieta- 2. Apesar de muitos não concordarem, ou ex-
ção. Não me enganei. Na Medula foi publicado pressarem a sua dúvida, a Medula assume-se,
o livro de estreia de F. S. Hill (Livro das coisas por inteiro, como um projecto editorial inde-
breves, 2014), mas também de João Alexandre pendente sem fins lucrativos. Não dependemos
Lopes (Hora Zero, 2017) e Maria Avelãs (As So- de distribuição comercial, nem de críticas nos
bras da Festa, 2019). De António Amaral Tavares jornais, pois, por opção, não enviamos livros a
publicámos, em 2014, Talvez seja essa certeza, que críticos. Assim, todo o dinheiro resultante da
recebeu o Prémio Nacional de Poesia Diógenes venda dos nosso livros é usado para financiar
futuras publicações. Continuaremos com as ti-
2014, e em 2016 o livro Animais Incluídos. De E.
ragens únicas de 100 exemplares, pois não há
Ethelbert Miller publicámos, em 2014 e em es-
dinheiro para mais. Se o dinheiro existisse, não
treia mundial, o livro Falta de Ar, sendo o único
duvidem, e acreditem!, que faríamos tiragens
livro por nós publicado em formato bilingue.
superiores a 100 exemplares. Mas como não so-
No ano de 2020 foi a vez de publicarmos pela
mos uma vanity press (não cobramos dinheiro
primeira vez no nosso país Os Cavaleiros Negros
aos nossos autores), tudo continuará na mes-
e Outros Poemas de Stephen Crane. E em 2021
ma.
recuperámos do esquecimento o poeta Antó-
nio José Fernandes. Houve ainda tempo para
3. A Medula só é possível devido ao exemplo
publicar um pequeno livro colectivo que con- do Américo Rodrigues (amigo maior) e devido
tou com a colaboração de Ana Bessa Carvalho, à influência da Averno, & etc, Frenesi, Fenda,
F. S. Hill, Henrique Manuel Bento Fialho, João Hiena, Edições Mortas e Black Son Editores. A
Alexandre Lopes, Jorge Aguiar Oliveira, José todos: o meu muito obrigado.
Ricardo Nunes, m. parissy, Maria João Lopes
Fernandes, Rui Almeida, Rute Mota e Tatiana manuel a. domingos
Faia. Falo-vos de Pombos Lerdos, publicado em
2018. E no meio de tudo isto publicámos livros
de Antonio Orihuela, Rui Almeida, John Ma-

[1]
Madalena de Castro Campos

Les destin des images

O mesmo das palavras.


O das que mostravam,
e o das que escondiam,
não as distinguia.
Arrastava os olhos
na desonra à qual
tudo e todos estavam destinados.
As que mostravam pelo que expunham,
e as que escondiam pelo que encobriam.
O que numas era culpa,
boca colada à lama do chão,
seria noutras condenação.
(Porque as palavras, como as imagens, despiam-se diante
do próprio pudor. Ofereciam-se, recusavam-se,
acusavam quantos as quisessem ver. Não havia o que ver.)

[2]
Mariano Alejandro Ribeiro

Monica Vitti b l a c k - fa c e d n u m a f i ta d e Antonioni

Um tango é como uma coisa que quando corta


a ferida não tende a sarar.

A cicatriz nunca chega a ser, depois vem a doença


como um soluço deprimente.
Depois morre-se, se assim estiver previamente combinado.

atrapalha como um vendaval nos arrabaldes


tende a ser impessoal como um vendaval 
um pouco quiçá um pouco mais enternecedor 
ela falava sorria em fotos que brilhavam no meu dispositivo
e eu pingava dos olhos como o meu pai quando ouvia
o tanguinho na aparelhagem do salão sozinho

a perna cruzada transportava-o como me transportavam a mim


as fotos cortadas aos quadrados nos dispositivos postadas diretamente
nos aplicativos
uma dança tribal para canecos de cerveja expectantes 
um sorriso de vitti pintada de preto
uma dança tribal de sacrilégios
desquecendo destrocando desmembrando númbaros
deixando bem presente uma questão pertinente
talvez penitente 

para que serve tudo isto

para que serve tudo isto quando já estás salvo


se já estás salvo e já foste salvo
ninguém te excomunga da redenção

[3]
um tango é como uma coisa que quando corta
dessangra ideias de navio a vapor
de fotografia antiga um bebé nos arrabaldes de uma povoação
As pessoas desaparecem com um jeitinho tão suave
que chega a ser comovedor.

[4]
M i g u e l d e C a r v a l h o

[5]
R o s a l i n a M a r s h a l l

let go of your home


let go of the floor
where your intellect sits
let go of the bed
where your light drifts
let go of your clothes and accessories
let go of the will you believe you need
in order to write truthfully
let it all go swimming into the deep end of the atlantic
they can have a ball there
if they get there

let go of the abandonment who got you pregnant


let go of all the things you appreciate in that concept
the romance of it all

strip it down
so you can hear
what a fork tastes like
when it brings nothing
into your mouth

let go of the non-fork


the non-action of fork to mouth

let go alphabetically

[6]

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