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PREFÁCIO:
CAP. I – Os funcionários:
Ser funcionário público no Brasil do século XIX era estar em relação constante
com os “donos do poder”.
Mas, e quando essa regra não era aplicada? Como pensar no funcionário público
que chegava e ascendia aos cargos mais elevados da Corte sem um padrinho ou outros
fatores marcados por essa sociedade do favor?
“Seria interessante para os historiadores avaliar qual era a proporção do esforço
pessoal e do mérito inicialmente desajudado, assim como da competência lentamente
adquirida, numa sociedade de prebenda e mercê, onde no fundo trabalhar era feio, o
funcionário parecia não trabalhar e frequentemente não trabalhava mesmo. Ignoro se há
estudos desse tipo. Mas gostaria de fornecer alguns dados sobre um burocrata imperial
que saiu do nada e chegou a posições elevadas, capitalizando o esforço para conquistar
apoios e praticamente reivindicando as vantagens com base no mérito. Não pretendo
forçar generalizações, mas apenas contribuir para caracterizar um tipo social daquele
tempo: o do alto funcionário que extravasa da burocracia sem todavia chegar às
lideranças. Por tabela, esta crônica de fatos talvez sirva para sugerir um dos modos
pelos quais se configurou o comportamento burguês no Brasil moderno, a partir do
recrutamento de pessoas das camadas modestas que, à medida que iam recebendo as
vantagens da ascensão, assimilavam os interesses, o ideário e o modo de viver das
camadas dominantes, perdendo qualquer veleidade potencial (estruturalmente viável) de
se tornarem antagônicas a elas. Finalmente, a história de funcionários deste tipo pode
ajudar a esclarecer um aspecto pouco conhecido da vida política e administrativa do
império: a relação entre o primeiro escalão, iluminado pelos faróis da história, e o
segundo, geralmente perdido para a memória da posteridade.” (p. 13)
Filho de lavradores modestos e criado por uma tia solteira, Maria Benedita
Tolentino.
Candido o caracteriza como “burocrata predestinado”.
Primeiras referências a Nicolau que constam nas buscas de Antonio Candido em
arquivos: 1858 (ofício ao Marquês de Olinda – ministro do império e presidente do
Conselho). Neste documento, Nicolau Tolentino alega que já servia ao Estado há 34
anos. Pelos cálculos, Nicolau teria ingressado no serviço público por volta de 1825.
Em 1862, em novo documento, ele dizia ter 37 anos de serviço público. Pelas
contas, voltamos ao ano de 1825. Para Candido, isso é indicativo de que Nicolau
ingressara no serviço público já aos 14 anos, daí o termo “burocrata predestinado”.
Na mesma página, Candido relata que essa posição, junto ao seu alto
desempenho, renderam um desfecho da missão favorável ao Brasil, o que garantiu o
prestígio da imagem de Tolentino no alto escalão do império. Volta ao Rio de Janeiro e,
1855 e se aposenta como diretor do Tesouro, sendo ainda condecorado com o título de
conselheiro, “galardão dos altos funcionários de boa folha” (p. 51).
Página 71: quando Tolentino começa de fato suas reformas, vê-se que a
intenção geral não era implementá-las a sério, mas erigir uma fachada de moralidade
com a qual se legitimaria o sistema eminentemente patronal.