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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

VALÉRIA BUSSOLA MARTINS

O DESPERTAR PARA A LEITURA


POR MEIO DE MÍDIAS DIGITAIS

São Paulo
2011
1

Valéria Bussola Martins

O despertar para a leitura por meio de mídias digitais

Dissertação de mestrado apresentada ao


Programa de Pós-Graduação em Letras da
Universidade Presbiteriana Mackenzie como
exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Letras

Orientadora: Profª. Drª. Maria Lucia Marcondes Carvalho Vasconcelos

São Paulo
2011
2

M386d Martins, Valéria Bussola.


O despertar para a leitura por meio de mídias digitais /
Valéria Bussola Martins
107 f. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade


Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2011.
Bibliografia: f. 104-107

1. Leitura. 2. Mídias digitais. 3. Prática pedagógica. 4.


Reescrita. I. Título.

CDD 372.4
3

VALÉRIA BUSSOLA MARTINS

O despertar para a leitura por meio de mídias digitais

Dissertação apresentada à Banca Examinadora


da Universidade Presbiteriana Mackenzie como
exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Letras

Aprovado em

Banca Examinadora

__________________________________________________
Profª. Drª. Maria Lucia Marcondes Carvalho Vasconcelos
Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

__________________________________________________
Profª. Drª. Marlise Vaz Bridi
Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

__________________________________________________
Profª. Drª. Mônica Cristina de Moura
Universidade Estadual Paulista - Bauru (UNESP - Bauru)
4

A meu amor de todos os dias, de todas as


horas, de todos os minutos.
5

AGRADECIMENTOS

A Deus, sempre presente em minha vida.

A meu amor, pelo estímulo diário durante a escrita deste trabalho.

A meu pai, pelo carinho e pelo exemplo de homem trabalhador desde os primeiros
anos.

À minha mãe, pela criação tão intensa e tão dedicada.

À Profª. Drª. Maria Lucia Marcondes Carvalho Vasconcelos, pelo apoio e pela
orientação para a concretização deste trabalho e por representar o modelo de uma
verdadeira educadora.

À Profª. Drª. Marisa Philbert Lajolo e à Profª. Drª. Mônica Cristina de Moura, pelas
contribuições durante a qualificação desta dissertação.

A meus alunos, pelo contato diário de energia pura que fez com que eu me
mantivesse jovem e sempre tivesse energia extra para buscar atividades cada vez
mais interessantes e relevantes para a formação de cada um.
6

Se é triste ver meninos sem escola,


mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados
em salas sem ar, com exercícios estéreis,
sem valor para a formação do homem.
(Carlos Drummond de Andrade)
7

RESUMO

A importância da leitura na formação de cidadãos críticos e reflexivos sempre foi


inquestionável. Normalmente, a leitura oferece autonomia a qualquer indivíduo para
que ele viva em sociedade. Restringindo tal realidade ao plano educacional, se no
passado a escola conseguiu levar significativa parcela de seus alunos a lerem várias
obras literárias sem grandes problemas, na atualidade, porém, veem-se discentes
ligados, quase que por um cordão umbilical, a jogos eletrônicos e à internet,
elementos que desviaram da leitura a atenção de parte desses jovens. Os jogos e o
mundo virtual, portanto, tornaram-se mais atraentes e mais procurados do que os
livros. Entretanto, esses instrumentos que, em primeira instância, servem como
passatempo e diversão não precisam ser excluídos do ambiente escolar. A partir
desses questionamentos cotidianos, é que este trabalho foi idealizado. Trata-se,
portanto, de um instrumento de reflexão sobre a prática pedagógica na área de
Língua Portuguesa no Ensino Fundamental II, que busca alternativa para incentivar
o gosto dos alunos pela leitura. O objetivo desta pesquisa é refletir acerca do papel
do professor de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental II na formação de
leitores efetivos e expor práticas pedagógicas, calcadas em mídias digitais, que se
demonstraram eficazes durante as aulas de leitura e produção de texto e que
resultaram em novas formas de avaliação do processo de leitura de livros
paradidáticos. Por fim, considera-se a necessidade de se repensar a formação dos
docentes de Língua Portuguesa e a importância da constante atualização dos
professores em pleno exercício.

Palavras-chave: leitura, mídias digitais, prática pedagógica, reescrita.


8

ABSTRACT

The importance of reading in the education of critical and informed citizens has
always been unquestionable. Reading normally offers autonomy for individuals so
that they can live well in society. Narrowing this reality down to the educational field,
if in the past school was able to make most students read literary works without much
trouble, nowadays it sees its students connected – as if to an umbilical cord – to
electronic games and the internet, elements that have been deviating pupils from
reading practices. Games and the virtual world have actually become more attractive
than books. However, these instruments which are primarily used for entertainment
do not have to be excluded from the school ambit. This research has been idealized
based on these daily queries. It intends to reflect upon the pedagogical practice in
the Portuguese language teaching in the Brazilian middle school and junior high and
to search alternatives to promote the taste for reading. The aim of this study is to
ponder upon the role of Portuguese teachers in enabling students to become
effective readers and to show pedagogical practices which, based on digital
technology, have proved to be efficient during reading and writing classes and which
resulted in new forms of reading comprehension assessment. Finally, the research
considers the need for rethinking Portuguese teachers’ education and the great
importance of continuing professional development.

Keywords: reading, digital technology, pedagogical practice, rescript.


9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 10

CAPÍTULO 1 - O PAPEL DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA E A


FORMAÇÃO DE LEITORES .................................................................................. 17

1.1 O HÁBITO DE LER ........................................................................................... 17


1.2 O MUNDO MODERNO E A FORMAÇÃO DE LEITORES ................................ 20
1.3 O PAPEL DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA .............................. 22
1.4 A FORMAÇÃO DE LEITORES E OS TEXTOS LEGAIS .................................. 27
1.4.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ...................................... 27
1.4.2 Parâmetros Curriculares Nacionais ........................................................... 33
1.4.2.1 Parâmetros em Ação .................................................................................. 38

CAPÍTULO 2 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO DE LEITURA NAS AULAS DE


LÍNGUA PORTUGUESA ........................................................................................ 40

2.1 O ENSINO TRADICIONAL E A FORMAÇÃO DE LEITORES .......................... 40


2.2 A PRÁTICA REFLEXIVA POR UM ENSINO RENOVADO ............................... 48
2.3 DIÁLOGO ENTRE O PROFESSOR E O ALUNO ............................................. 53
2.4 A IMPORTÂNCIA DE VARIAR AS ESTRATÉGIAS ......................................... 57

CAPÍTULO 3 - REESCRITA DE OBRAS POR MEIO DE MÍDIAS DIGITAIS:


RELATO DE EXPERIÊNCIA .................................................................................. 61

3.1 O COMPUTADOR EM SALA DE AULA ........................................................... 61


3.2 PREPARAÇÃO DAS PROPOSTAS DE TRABALHO ....................................... 67
   
10

3.3 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E O SOFTWARE HAGÁQUÊ ...................... 78


3.4 REESCRITA ANIMADA .................................................................................... 85
3.5 UMA PRÁTICA PARA TODOS ......................................................................... 96

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 98

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 104


11

INTRODUÇÃO

O nascimento do pensamento é igual ao


nascimento de uma criança: tudo começa com um
ato de amor. Uma semente há de ser depositada
no ventre vazio. E a semente do pensamento é o
sonho. Por isto os educadores, antes de serem
especialistas em ferramentas do saber, deveriam
ser especialistas em amor: intérpretes de sonhos.
Rubem Alves

A formação efetiva de leitores críticos vem à tona com uma frequência cada
vez maior no ambiente educacional e na sociedade como um todo. Pais sofrem com
filhos que dizem, sem constrangimento, que não gostam de ler. Educadores
preocupam-se com alunos que leem apenas por obrigação e que burlam a leitura de
todas as formas possíveis, como por meio de resumos e análises virtuais, para
conseguir obter notas satisfatórias nas avaliações sobre os livros paradidáticos1
sugeridos.

Hoje se pode dizer, portanto, que grande parte dos jovens não tem o hábito
da leitura presente no seu dia a dia. A leitura, como uma das formas de ajudar na
formação do cidadão, afasta-se da educação familiar. A importância do ato de ler,
que se justificava, facilmente, como uma das formas mais simples de conhecer o
mundo e situar-se nele, está esquecida.

Roger Chartier (2009, p. 78), professor e pesquisador da Escola de Altos


Estudos em Ciências Sociais e professor do Collège de France e especialista em
história da leitura, explica que é necessário

dar à leitura o estatuto de uma prática criadora, inventiva, produtora,


e não anulá-la no texto lido, como se o sentido desejado por seu
autor devesse inscrever-se com toda a imediatez e transparência,
sem resistência nem desvio, no espírito de seus leitores.

1
Esta pesquisa considerou livros paradidáticos as obras, adotadas pelos professores, que devem, obrigatoriamente, ser lidas
pelos alunos e cuja leitura, normalmente, é cobrada no ambiente escolar por meio de algum tipo de instrumento de avaliação.
12

Paulo Freire (2009, p. 8) refere-se a essa situação quando diz que

a leitura da palavra é sempre precedida da leitura do mundo. E


aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada,
aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto, não numa
manipulação mecânica de palavras mas numa relação dinâmica que
vincula linguagem e realidade.

No início da alfabetização, as crianças de forma geral, quando não


apresentam dificuldades no processo ensino-aprendizagem, têm um maior gosto
pela leitura, pois a descoberta de letras que formam sentidos para elas tem um
gosto de vitória, de obstáculo vencido. Entretanto, depois de alguns anos de
escolaridade, parte dos educandos perde o prazer pela prática e o professor tem de
lidar, diariamente, com a difícil tarefa - quase uma luta - de fazer com que os alunos
leiam as obras que serão “cobradas” em avaliações.

Por outro lado, é, muitas vezes, questionável a forma por meio da qual os
docentes oferecem as oportunidades de leitura aos seus alunos. Frequentemente,
os professores escrevem o nome da obra na lousa, solicitam a compra do exemplar
e pedem a leitura para uma data, em que será aplicada uma avaliação escrita.
Nasce, a partir deste ponto, a quase interminável discussão sobre a necessidade da
prática pedagógica reflexiva do professor para que este perceba a importância do
seu papel na formação de cidadãos-leitores.

Foi a partir desse precário contexto educacional das aulas de leitura que
surgiu a ideia geradora desta pesquisa. Este trabalho objetiva refletir sobre o
despertar do prazer pela leitura no Ensino Fundamental II. Como o docente de
Língua Portuguesa pode fazer germinar em seus discentes o gosto pela leitura? A
partir do relato de uma experiência profissional voltada para a leitura de obras
literárias e para a reescrita das mesmas, tarefa desenvolvida como instrumento de
reflexão, estas páginas buscam oferecer aos professores de literatura alternativas
mais atraentes para o trabalho com os livros paradidáticos adotados.

No primeiro capítulo, tratar-se-á do hábito de ler e de como a formação de


leitores tornou-se mais complexa em um mundo no qual o lado virtual ganha cada
vez mais espaço na vida de crianças e adolescentes. Nesse momento, foram de
grande importância as obras de Paulo Freire, Marisa Lajolo e Roger Chartier.
13

Ao reafirmar a necessidade de professores e alunos posicionarem-se


criticamente ao vivenciarem a educação, Paulo Freire fez surgir, ao longo de seus
escritos, a ideia do ato de ler como prática concreta de libertação:

E aqui devemos ser todos sujeito, solidários nesta tarefa conjunta,


único caminho para a construção de uma sociedade na qual não
existirão mais exploradores e explorados, dominantes doando sua
palavra opressora a dominados. (FREIRE, 2009, p. 8)

Marisa Lajolo (2008, p. 7) corrobora as afirmações de Freire ao afirmar que

lê-se para entender o mundo, para viver melhor. Em nossa cultura,


quanto mais abrangente a concepção de mundo e de vida, mais
intensamente se lê, numa espiral quase sem fim, que pode e deve
começar na escola, mas não pode (nem costuma) encerrar-se nela.

Para complementar essa preocupação com o ato de ler, Roger Chartier


(1998, p. 77) traz à tona a ideia de que a leitura representa sempre um ato de
apropriação, de invenção e de produção de significados, afastando-se, assim, do
leitor meramente passivo. Durante o ato de ler,

o leitor é um caçador que percorre terras alheias. Apreendido pela


leitura, o texto não tem de modo algum – ou ao menos totalmente – o
sentido que lhe atribui seu autor, seu editor ou seus comentadores.
Toda história da leitura supõe, em seu princípio, esta liberdade do
leitor que desloca e subverte aquilo que o livro lhe pretende impor.

Por que, então, esse processo que, pelo menos, deveria ser tão prazeroso,
acaba, na escola, tornando-se tão penoso? A partir desse questionamento, ainda no
primeiro capítulo, também se aborda a importância do professor de língua
portuguesa no processo de formação de novos leitores.

Finalizando o capítulo, serão trazidos à tona textos legais que registram, de


forma evidente, a relevância da leitura para a formação efetiva de um cidadão ativo,
reflexivo e questionador. Ao analisar a legislação da educação brasileira,
inicialmente, será introduzida a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
14

Lei nº 9.394. Refletir-se-á sobre o artigo que trata, especificamente, da leitura. A


seguir, haverá reflexões sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais por também
pregarem a importância de uma leitura constante e efetiva durante a formação dos
discentes e sobre os Parâmetros em Ação, que fazem parte do Programa de
Desenvolvimento Profissional Continuado do Ministério da Educação e da Secretaria
de Educação Fundamental.

Na sequência, no segundo capítulo, serão expostas estratégias de ensino de


leitura nas aulas de Língua Portuguesa. Por meio, novamente, dos ensinamentos de
Paulo Freire, Marisa Lajolo e Roger Chartier, dar-se-á destaque para a prática
reflexiva do professor na busca por um ensino renovado, que considera essencial o
diálogo entre o professor e o aluno e que reconhece a importância de se variar as
estratégias de ensino.

Ainda ao longo do segundo capítulo, foi imprescindível aproximar-se das


mídias digitais. Nesse contexto, Pedro Demo (2006, p. 11) foi de imensa valia ao
afirmar, durante as reflexões sobre a utilização de mídias digitais no ambiente
escolar, que “como a tecnologia não espera, nem saberia esperar, vai ocupando o
espaço à revelia do educador”.

Não há mais como negá-la no ambiente escolar:

Estudantes reagem ao instrucionismo, à medida que descobrem que


aprender não é escutar alguém falando, tomar nota e fazer prova. No
mundo digital, a comunicação já não exige uma referência física fixa
e os estudantes podem criar ambientes virtuais de aprendizagem
com grandes vantagens. [...] os estudantes [...] aprendem a
desconstruir e a reconstruir sua aprendizagem. (DEMO, 2006, p. 27)

É a partir dessa realidade que surge o terceiro capítulo, no qual são


desenvolvidas as ideias de Fernando Hernández, José Moran, Pierre Lévy, Regina
Zilberman, Tânia Rösing e Valdemar W. Setzer.

Na sequência, são relatadas duas experiências, desenvolvidas nos


laboratórios de informática de uma instituição particular, por meio das quais o gosto
pela produção de texto e pela leitura foi aflorado.
15

Se antes o aluno era um ser receptor, que apenas copiava em seu caderno o
que o professor escrevia na lousa, atualmente, ele tem um equipamento, movido a
megabytes, que, rapidamente e de uma forma muito mais atraente, oferece tudo o
que o discente precisa e muito mais.

Primeiramente, será descrita uma atividade de reescrita de obras literárias


que se deu por meio de um software gratuito chamado Hagáquê, da Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP). Trata-se de uma ferramenta virtual que permite
a criação de histórias em quadrinhos, já ofertando modelos prévios de design, mas
permitindo que o aluno crie novas estruturas e importe-as para o software.

Descrever-se-ão, posteriormente, trabalhos confeccionados no programa


PowerPoint do pacote Office da empresa Microsoft Corporation, que além da
reescrita da obra literária também permitia a utilização de sons e a criação de
movimentos durante as cenas descritas. Será assinalada aí a importância da
alfabetização visual, área do conhecimento, muitas vezes, deixada de lado na
maioria das escolas da rede pública e particular.

Por fim, nas Considerações Finais, considera-se a necessidade de se


repensar a formação dos docentes de Língua Portuguesa e a importância da
constante atualização dos professores em pleno exercício. Muitos docentes também
não são bons leitores ou apenas o foram durante a sua formação. Se a formação
destes fosse permanente, como propõe Demo (2006, p. 39), talvez a nossa
realidade educacional fosse outra:

Formação permanente supõe que tenhamos a coragem de, de


tempos em tempos, fazer uma faxina em nossa cabeça,
desconstruindo o que lá colocamos e reconstruindo novos
horizontes. É comum que professores continuem dando a mesma
aula por décadas, ou que cultivemos as mesmas ideias, tornando-as
por vezes ideias fixas. [...] Formação permanente sugere que tais
repetições podem estar apagando a luz da criatividade, colocando
tudo no fosso da rotina.

É a partir desse processo de formação do educador que nascem a dúvida e a


busca por esclarecimentos. Entende-se que não há área do conhecimento humano
em que a pesquisa esteja ausente. Graças também à investigação é que surgiram
tantas conquistas na história da humanidade.
16

No campo educacional, pode-se dizer que os professores possuem uma das


mais importantes chaves para a melhoria do ensino, visto que mudanças em sala de
aula só ocorrem se os docentes sentirem necessidade das mesmas. Nesse
contexto, a pesquisa pode indicar aos mesmos as falhas bem como as alternativas
para as soluções.

Se decisões são tomadas baseadas somente no senso comum, corre-se o


risco da parcialidade ou de ações calcadas em pouca segurança. De acordo com
Lori Gressler (1998, p. 27):

A pesquisa é importante porque subsidia as soluções dos problemas


em virtude da mesma ser colocada acima de posturas individuais. É,
portanto, um meio de aperfeiçoamento que pode indicar as falhas e
oferecer possíveis direções para que as decisões sejam mais
eficientes e mais econômicas.

A pesquisa pode ser uma fonte de esclarecimento. Sérias decisões não


devem ser tomadas sem um bom embasamento. Há necessidade de estudos
sistemáticos para clarear e entender um problema.

O ser humano cresce intelectualmente à medida que enfrenta as questões de


maneira científica: delimitando problemas, analisando as variáveis que os
influenciam, formulando hipóteses com um embasamento teórico, coletando dados
sistematicamente, analisando e discutindo para chegar a uma conclusão,
submetendo-se a reaplicações, confirmações ou rejeições em relação ao tema
tratado.

Levando-se em consideração todos esses fatores, optou-se, para o presente


trabalho, pela pesquisa qualitativa, partindo-se da bibliográfica uma vez que foram
feitas consultas a diferentes autores e a suas teorias para os assuntos em questão.
Segundo Sílvio Oliveira (1997, p. 119), “a pesquisa bibliográfica tem por finalidade
conhecer as diferentes formas de contribuição científica que se realizaram sobre
determinado assunto ou fenômeno”.

Interessa ao pesquisador, o que já houve, o que está havendo, o que foi feito
e o que se está fazendo. Não somente o quê, mas também o como. A pesquisa
bibliográfica contribui para o desenvolvimento e para a base do pensamento crítico.
17

Almejando a busca da compreensão e proposta de solução do problema que


envolve a formação de novos leitores e de leitores efetivos, foi adotado o
levantamento bibliográfico para o desenvolvimento desta pesquisa com a
possibilidade de ampliar o conhecimento sobre o assunto em questão.

Em relação a este aspecto, faz-se necessário relatar também que foi usado o
método qualitativo para a elaboração do trabalho, devido ao fato das pesquisas
qualitativas preocuparem-se, conforme Elisabete Pádua (1997, p. 31) “com o
significado dos fenômenos e processos sociais, levando em consideração as
motivações, crenças, valores, representações sociais, que permitem a rede de
relações sociais”.

Sendo a pesquisa em questão na área educacional e por esta envolver um


setor em que se deve valorizar mais o processo do que o produto final, julgou-se que
o método qualitativo seria o mais adequado, privilegiando-se o relato de
experiências como caminho metodológico a ser percorrido.
18

CAPÍTULO 1 - O PAPEL DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA E A


FORMAÇÃO DE LEITORES

Como ser professor desse novo homem? Como


auxiliar na sua formação sem comprometê-la?
Somente conseguiremos cumprir essa tarefa, se
tivermos professores com preocupações
formativas, além de informativas; preocupações
voltadas para a pertinência de sua atuação e com
a visão ampla e abrangente do processo
educacional.
Maria Lucia Vasconcelos

1.1 O HÁBITO DE LER

Em 2006, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a


Cultura (UNESCO) publicou um relatório intitulado Literacy for life2 que manifestava,
de forma bem evidente, a forte e inseparável relação entre letramento e educação e
a importância da educação escolar nesse contexto, ao afirmar que “a escola tem
sido e continua sendo o lugar onde a maior parte das pessoas adquire suas
principais habilidades relativas a letramento, leitura, escrita e aritmética”3.

Ao abordar, especificamente, o letramento, o relatório conclui dizendo que:

O letramento para todos está no centro da educação básica para


todos, e criar ambientes e sociedades letrados é essencial para
alcançar os objetivos de erradicar a pobreza, reduzir a mortalidade
infantil, controlar o crescimento populacional, conquistar igualdade
entre os sexos e garantir o desenvolvimento sustentável, a paz e a
democracia.

Partindo do exposto acima, que coloca o letramento como uma das formas
mais importantes de real inserção do indivíduo na sociedade em que vive, torna-se,

2
Letramento para a vida.
3
(www.unesco.org/en/efareport/reports/2006-literacy. Acesso em: 25 agosto 2010).
19

no mínimo, inquietante pensar na atual situação da alfabetização e do hábito de ler


no Brasil.

No Brasil, atualmente, a Educação Básica é composta por:

• Educação Infantil, que abrange as creches e as pré-escolas. Em termos


etários, esta etapa recebe crianças que têm até seis anos.
• Ensino Fundamental I, que abrange do 1º ao 5º ano. Em termos etários, esta
etapa recebe alunos a partir dos seis anos.
• Ensino Fundamental II, que abrange do 6º ao 9º ano. Em termos etários, esta
etapa recebe alunos a partir dos onze anos.
• Ensino Médio, que abrange da 1ª à 3ª série. Em termos etários, esta etapa
recebe alunos a partir dos quinze anos.

A alfabetização, oficialmente, inicia-se na Educação Infantil. Entretanto, esta


não é, constantemente, a realidade encontrada, uma vez que mesmo iniciada, vários
alunos chegam ao Ensino Fundamental II sem, realmente, estarem aptos a
desenvolver uma leitura dinâmica, eficaz e reflexiva, fato que desencadeia uma frágil
produção textual.

Nos tempos atuais, busca-se o início do processo de alfabetização cada vez


mais cedo, porém não há, infelizmente e de maneira geral, a preocupação com a
sua plena efetivação. Logo, frequentemente, também não se chega ao letramento.

Vê-se discentes que até sabem ler e escrever, mas que não fazem uso
competente e frequente da leitura e da escrita. Estão alfabetizados, porém não
letrados, ou seja, o uso da leitura e da escrita é muito parco, limitado e não permite
maior envolvimento em reais práticas sociais.

Mal preparados e instrumentalizados, os discentes acabam por não


desenvolver o apego ao exercício da leitura que é, indiscutivelmente, um
instrumento do exercício da cidadania.

Além do desapego, por conta de ausência de sensibilização, de


contextualização, de ludicidade e de incentivos nas propostas de leitura por parte de
alguns professores, os alunos, muitas vezes, desenvolvem ojeriza pela prática da
leitura, principalmente quando se trata dos cânones literários, a priori, mal
trabalhados e mais distantes do universo do adolescente brasileiro.
20

Lajolo (2008, p. 12) comenta essa realidade ao expor que:

O problema é que os rituais de iniciação propostos aos neófitos não


parecem agradar: o texto literário, objeto do zelo e do culto, razão de
ser do templo, é um objeto nem sempre discreto, mas sempre
incômodo, desinteresse e enfado dos fiéis – infidelíssimos, aliás –
que não pediram para ali estar. Talvez venha desse desencontro de
expectativas que a linguagem pela qual se costuma falar do ensino
de literatura destile o amargor e o desencanto de prestação de
contas, deveres, tarefas e obrigações.

Chartier (1998, p. 103) também trata do afastamento dos jovens da prática da


leitura e explica que:

Encontramos ainda o discurso segundo o qual as classes mais


jovens afastam-se da leitura. Sim, se concordamos implicitamente
sobre o que deve ser a leitura. Aqueles que são considerados não-
leitores leem, mas leem coisa diferente daquilo que o cânone escolar
define como uma leitura legítima. O problema não é tanto o de
considerar como não-leituras estas leituras selvagens que se ligam a
objetos escritos de fraca legitimidade cultural, mas é o de tentar
apoiar-se sobre essas práticas incontroladas e disseminadas para
conduzir esses leitores, pela escola mas também sem dúvida por
múltiplas outras vias, a encontrar outras leituras. É preciso utilizar
aquilo que a norma escolar rejeita como um suporte para dar acesso
à leitura na sua plenitude, isto é, ao encontro de textos densos e
mais capazes de transformar a visão do mundo, as maneiras de
sentir e de pensar.

O processo da alfabetização que racionalmente levaria ao letramento deveria


ser natural, como descreve Freire (2009, p.15) ao tratar de sua infância e da
importância de seus pais ao longo desse percurso:

E foi com eles, precisamente, em certo momento dessa rica


experiência de compreensão do meu mundo imediato, sem que tal
compreensão tivesse significado malquerenças ao que ele tinha de
encantadoramente misterioso, que eu comecei a ser introduzido na
leitura da palavra. A decifração da palavra fluía naturalmente da
“leitura” do mundo particular. Não era algo que se estivesse dando
superpostamente a ele. Fui alfabetizado no chão do quintal de minha
casa, à sombra das mangueiras, com palavras do meu mundo e não
do mundo maior dos meus pais. O chão foi o meu quadro-negro;
gravetos, o meu giz.
21

Em muitos casos, as leituras estão distantes do universo e da realidade


infantil e juvenil e a maior parte dos educandos chega, portanto, à vida adulta sem o
hábito de ler. Para eles, a leitura envolve apenas uma obrigação e deixou de ser, há
muito tempo, sinônimo de distração, prazer e lazer.

1.2 O MUNDO MODERNO E A FORMAÇÃO DE LEITORES

Se antes a leitura era considerada como um hobby que propiciava prazer e


lazer, hoje, com o arrebatador desenvolvimento da tecnologia, tal prática, no seu
sentido tradicional, ou seja, a leitura do livro afasta-se do cotidiano de crianças e
adolescentes de forma quase que assustadora na medida em que estes preferem os
videogames, as conversas virtuais no msn ou o acompanhamento do diário de
algumas pessoas no Twitter.

Alguns estudiosos enaltecem as novas possibilidades que oferecem os


computadores, afirmando que elas podem transformar a maneira de aprender,
facilitando a aquisição de habilidades cognitivas. Outros falam da possibilidade do
computador transformar-se em uma ajuda pessoal para os educandos já que
poderia estar adaptado ao ritmo e às necessidades de cada um.

Em entrevista concedida à revista Nova Escola, em 2007, questionado, pela


jornalista Cristina Zahar, sobre a possibilidade do atual suporte tecnológico auxiliar
ou não a leitura e o aprendizado, Chartier afirma que:

Pesquisas realizadas em vários países mostram que o uso do


computador na Educação, quando acompanhado de métodos
pedagógicos, melhora, sim, o aprendizado, acelera a alfabetização e
permite o domínio das regras da língua, como a ortografia e a
sintaxe. É preciso desenvolver políticas públicas que tenham por
objetivo a correta utilização da tecnologia na sala de aula.4

4
(revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/fundamentos/roger-chartier-livros-resistirao-tecnologias-digitais-610077.shtml
Acesso em: 15 janeiro 2011).
22

Todavia, há, também, aqueles profissionais que assinalam o perigo de uma


informatização exagerada nos ambientes escolares que poderia levar a uma
mecanização do raciocínio, como se a máquina passasse a pensar pelo aluno,
negligenciando, assim, habilidades mais intuitivas ou artísticas.

Embora a utilização de mídias digitais no ambiente escolar seja, ainda hoje,


muito questionada, não há como negar a sua presença no dia a dia da maior parte
da população.

Infelizmente, porém, não se vê, de forma geral, a preocupação das escolas de


se plugarem às mídias digitais. Várias se defendem explicando que ainda não
existem propostas plausíveis que justifiquem a sua utilização. Jorge Falcão (1989, p.
254) explica que:

Neste sentido, admitir que muitas das propostas atuais para o uso do
computador em sala de aula têm eficácia duvidosa ou
comprovadamente nula não implica a defesa do abandono, e sim do
refinamento desse instrumento, o que inclusive pode e dever ser feito
a partir das experiências já em andamento.

A escola e o professor não podem ficar de braços cruzados ignorando novas


práticas pedagógicas por meio das tecnologias. Ambos devem ajudar no processo
de criação e aplicação de novas propostas de trabalho.

Afastando-se ainda mais do moderno mundo tecnológico de hoje, várias


escolas, muitas de renome, fecham-se em propostas de livros paradidáticos que
ampliam a distância entre os educandos e o hábito da leitura.

Na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I, a descoberta das letras e


dos sentidos garante uma realização mais plena da leitura durante as aulas de
Língua Portuguesa. Já no Ensino Fundamental II, a realidade altera-se ao se lidar
com alunos que, mesmo no 6º ano, já buscam, na internet, resumos dos livros
paradidáticos para que não precisem realizar a leitura da obra inteira.

Faz-se necessário ressaltar que não se pode ser ingênuo e achar que isso só
acontece nos dias de hoje. Mesmo quando a internet não existia, discentes
procuravam resumos em bibliotecas, em livros preparatórios para o vestibular, por
exemplo. Porém, nos dias de hoje, o acesso é mais fácil e rápido. Poucos cliques
23

são necessários para se encontrar o tão desejado resumo e a tão necessária


resenha, que nem sempre são de má qualidade.

É diante desse quadro que o professor, principalmente o de Língua


Portuguesa, tem de propor a seus alunos a leitura de obras. Como pode esse
docente propor atividades de leitura que realmente deem prazer e suscitem a
curiosidade de seus discentes?

1.3 O PAPEL DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA

Uma das mais belas profissões é, sem dúvida, a do educador. Como


participante de uma atividade importantíssima na vida de todo ser humano, ele é um
agente de transformação e de multiplicação. Na maioria das vezes, principalmente
durante a Educação Básica, é no professor que o aluno busca o seu ponto de
referência existencial para o desenvolvimento de sua personalidade e da postura
que julga ser capaz de levá-lo a fazer o percurso desejado para sua vida.

Levando em conta esta árdua realidade, será que o professor de língua


portuguesa tem ao seu lado algum tipo de aliado no momento de formação de novos
leitores?

O termo educação, que tem sua origem no verbo latino educare, significa
alimentar, criar. Embora, ao menos superficialmente, esse significado pareça
simples, no mundo de hoje, com intensas e constantes transformações, a educação
ganha novo significado.

Da Antiguidade até o início do século XIX, predominou na prática escolar


uma aprendizagem de tipo passivo e receptivo. Aprender envolvia quase
exclusivamente memorizar, sendo que a compreensão desempenhava um papel
muito reduzido. Segundo Zilberman & Rösing (2009, p. 71), é “o que se observa, por
exemplo, no modelo de bom aluno repetidor, cuja competência mais valorizada é
dizer aquilo que o livro didático ou o professor já disse: quanto mais literal a
repetição, melhor”.
24

O processo de desenvolvimento da prática da leitura passava pelo mesmo


exercício mecânico, já que a leitura, frequentemente, resumia-se à repetição do que
era ouvido ou à memorização de textos. De acordo com Tânia Dauster e Lucelena
Ferreira (2010, p. 23),

o método de aprendizado da leitura era sempre o mesmo: advindo de


textos já conhecidos de cor pelos alunos, de modo que algo já
aprendido oralmente com a família ou com a Igreja era, com
orientação do professor, dividido em palavras pelos alunos, que
deveriam escrever as letras e pronunciar as sílabas. O processo da
leitura consistia em soletrar as letras para que se falassem as sílabas
(p-a, pa), e então a palavra (Pa-ter, Pater). O jovem leitor ligava os
sinais identificados na página ao texto que ele já sabia de cor (Pater
Noster, qui es). Quando as crianças conseguiam ler sílabas, podiam
ir diretamente para os textos de preces.

Essa forma de ensino baseava-se na concepção de que o ser humano era


semelhante a um pedaço de argila que podia ser modelado à vontade. O
pensamento humano era como se fosse uma tábua lisa, um papel em branco sem
nada escrito, no qual tudo podia ser impresso.

Ao analisar essa dinâmica mecânica, Freire (2009, p. 17) explica que:

A memorização mecânica da descrição do objeto não se constitui em


conhecimento do objeto. Por isso é que a leitura de um texto, tomado
como pura descrição de um objeto é feita no sentido de memorizá-la,
nem é real leitura, nem dela portanto resulta o conhecimento do
objeto de que o texto fala.

A leitura mecânica que se propunha ao aluno, não tinha sentido. Por meio da
repetição de exercícios, o discente passava a executar certos atos complexos, que,
aos poucos, tornavam-se hábitos. O estudo caracterizava-se pela recitação de cor,
os conhecimentos a serem adquiridos eram reduzidos e para que os alunos
pudessem repeti-los correta e adequadamente, o docente utilizava o procedimento
de perguntas e respostas, tanto em sua forma oral quanto escrita.

Embora Rousseau já defendesse, desde o século XVIII, uma mudança ao


longo das etapas escolares, propondo uma educação natural que respeitasse o
desenvolvimento da criança bem como levasse em consideração o mundo do qual
25

ela fazia parte e a intervenção do adulto como guia ao longo do desenvolvimento


escolar, o importante nesse modelo vigente de aprendizagem, contrário ao
apregoado por Rousseau, era que o aluno reproduzisse literalmente as palavras e
as frases decoradas. Freire (1987, p. 58-9) denominou essa prática como educação
“bancária”:

Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem


de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os
depósitos, guarda-los e arquivá-los. [...] Na visão “bancária” da
educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que
julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações
instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da
ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da
ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro.

O mundo, porém, desenvolveu-se em um ritmo que, cada vez mais, ganhou


uma característica desenfreada e esta educação tornou-se, consequentemente,
antiquada. Era necessário pensar um ensino mais estimulante e adaptado aos
interesses reais dos alunos e às suas condições de aprendizagem. Uma educação,
ainda, que formasse para a vida cidadãos críticos e comprometidos com o mundo do
qual fazem parte.

Com o passar do tempo, o conhecimento passou a ser encarado não como


algo que alguém transmite, mas, sim, como uma descoberta que a própria pessoa
realiza, um ato que se dá no interior do indivíduo, sendo uma das funções do
educador ajudar o aluno a descobrir, inclusive por si mesmo, a verdade.

Entretanto, adotando-se essa forma de pensar, evidentemente, surge a


seguinte questão: como ajudar o aluno a descobrir essa verdade?

Daí a importância de um bom professor com uma consciente prática


pedagógica. Existem meios, práticas e atividades que podem fazer com que o
docente desenvolva melhor sua aula. Tendo consciência de sua prática e refletindo
diariamente sobre ela, o educador, provavelmente, atingirá seus alunos com muito
mais êxito.

É imprescindível, portanto, que o professor entre em contato com a realidade


do aluno, saiba em que condições ele vive, do que ele gosta, o que faz sua família,
26

quais são seus medos e aflições e assim por diante. É preciso que o professor
conheça o alcance de sua ação como mediador do conhecimento apresentado ao
educando e se perceba como alguém que auxilia o aluno no ato de conhecer e
conhecer-se de maneira autônoma e crítica.

A leitura, durante as aulas de Língua Portuguesa, deveria partir, portanto, de


temas do dia a dia do aluno e não de assuntos que passam muito longe de sua
realidade. A compreensão desses temas mais próximos seria mais simples e efetiva.
Mikhail Bakhtin (1999, p. 95) expõe que:

Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos,


mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou
triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre
carregada de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que
compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que
despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.

Entretanto, o que se constata, hoje, é que poucos professores têm essa visão
mais ampla sobre a importância de partir da realidade do aluno. Além disso, muitos
também optam, por comodidade, pelos materiais pré-fabricados pelas editoras que
não se aprofundam na diversidade que envolve o mundo das crianças e dos
adolescentes. Lajolo (2008, p. 15) explica muito bem esta dura realidade ao afirmar
que:

Não parece que o que fazer com o texto literário na sala de aula seja
ainda de sua competência. Já faz alguns anos que decidir isso é da
competência de editoras, livros didáticos e paradidáticos, muitos dos
quais se afirmaram como quase monopolizadores do mercado
escolar, na razão direta em que tiraram dos ombros dos professores
a tarefa de preparar as aulas.

O docente de Língua Portuguesa, se quer fazer brotar em seus alunos o


verdadeiro gosto pela leitura e pela literatura, não pode restringir a verificação desta
por meio dos encartes que compõem o livro.
27

Assim como em todas as áreas profissionais, o professor teve de se


modernizar e deixar de lado a velha cartilha, a infinita cópia de várias palavras, o
caderno de caligrafia e os cansativos ditados com fonemas semelhantes.

O estudo da leitura, a partir da década de 1970, também sofreu alterações.


Regina Zilberman e Ezequiel Silva (1991, p. 8) explicam que, com a Estética da
Recepção5, proposta por Hans Robert Jauss:

O desenvolvimento das ciências da linguagem conferiu novo status à


leitura, de um lado liberando-a de seus vínculos mais imediatos com
a alfabetização e a aprendizagem da escrita, de outro ampliando seu
âmbito de atuação e abrangência, já que passou a incorporar as
contribuições da psicolinguística, sociolinguística e análise do
discurso, entre as áreas de mais recente expansão, da teoria da
literatura e da pedagogia, entre as mais consolidadas.

Além disso, em um mundo em que a informação virtual domina vários


aspectos da vida cotidiana e em que tudo muda muito rapidamente, o docente da
área de Língua Portuguesa também ganhou um novo desafio. Por que não utilizar,
durante as aulas de leitura e literatura, mídias digitais em sala de aula?

Chartier (2007) argumenta, em entrevista à Revista Nova Escola, que

é papel da escola incentivar a relação dos alunos com um patrimônio


cultural cujos textos servem de base para pensar a relação consigo
mesmo, com os outros e o mundo. É preciso tirar proveito das novas
possibilidades do mundo eletrônico e ao mesmo tempo entender a
lógica de outro tipo de produção escrita que traz ao leitor
instrumentos para pensar e viver melhor.6

Unir uma dupla extremamente bem aceita pelos alunos, o computador e a


internet, a outro elemento que não é visto, de forma geral, como algo prazeroso,
seria de grande valia. Representaria, pelo menos, um início para a transformação
didática pretendida.

Citando mais uma vez as palavras de Chartier à Nova Escola (2007):

5
Teoria que toma como objeto de investigação o receptor e que considera dois vieses: o que envolve a obra e o que é
projetado pelo leitor de determinada sociedade. Volta-se, portanto, para as condições sócio-históricas de diversas
interpretações textuais.
6
(revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/fundamentos/roger-chartier-livros-resistirao-tecnologias-digitais-610077.shtml
Acesso em: 15 janeiro 2011).
28

A tecnologia reforça a possibilidade de acesso ao texto literário, mas


também faz com que seja difícil apreender sua totalidade, seu
sentido completo. É a mesma superfície (uma tela) que exibe todos
os tipos de texto no mundo eletrônico. É função da escola e dos
meios de comunicação manter o conceito do que é uma criação
intelectual e valorizar os dois modos de leitura, o digital e o papel. É
essencial fazer essa ponte nos dias de hoje.7

Por todos esses fatores, pode-se afirmar que cabe aos professores de Língua
Portuguesa, principais responsáveis, mas não os únicos, pela aquisição plena da
escrita e da leitura, a consciência de que as estratégias devem ser constantemente
repensadas.

Mesmo que caiba ao docente essa tarefa cotidiana, não se exclui desse dever
a esfera governamental que, por meio de leis, determina parâmetros e diretrizes
para a educação nacional.

1.4 A FORMAÇÃO DE LEITORES E OS TEXTOS LEGAIS

1.4.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Depois de aproximadamente oito anos de controversas discussões, em 23 de


dezembro de 1996, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, a
atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394) - LDB - passou
a vigorar.

De forma geral, a educação aparece, em diversos momentos, ligada à


preparação do indivíduo para o exercício da cidadania e à qualificação para o
trabalho. Vê-se no Artigo 2º, que trata dos Princípios e Fins da Educação Nacional, o
seguinte texto:

7
(revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/fundamentos/roger-chartier-livros-resistirao-tecnologias-digitais-610077.shtml
Acesso em: 15 janeiro 2011).
29

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos


princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem
por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo
para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
(BRANDÃO, 2006, p. 19)

De inspiração calcada nas questões de liberdade e solidariedade, a LDB


preconiza a união da família e do Estado em prol do desenvolvimento da educação,
visando tanto ao trabalho quanto à cidadania:

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:


I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da educação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da
legislação dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extraescolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
práticas sociais.8 (ibidem, p. 21-2)

Percebe-se que, ao longo dos Princípios e Fins da Educação Nacional, o


exercício da cidadania reaparece por meio da efetivação das práticas sociais. Mais à
frente, quando a LDB trata das Disposições Gerais da Educação Básica, no Artigo
22, o termo cidadania ressurge da seguinte forma:

Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o


educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o
exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no
trabalho e em estudos posteriores. (ibidem, p. 64)

8
Grifo nosso.
30

A cidadania volta à tona, inclusive, quando o documento trata do Ensino


Médio, especificamente nos Artigos 35 (inciso II) e 36 (inciso I), como se constata a
seguir:

Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com


duração mínima de três anos, terá como finalidades:

[...]

II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando,


para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores;

[...]

Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção I


deste Capítulo e as seguintes diretrizes:

I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do


significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de
transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como
instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da
cidadania; (ibidem, p. 94-5)

Seria, desta forma, de se esperar que a leitura tivesse papel importante ao


longo da LDB, na medida em que já se viu que é cada vez maior o número de
estudiosos que afirmam que a leitura efetiva é uma das melhores formas para se
atingir a plena cidadania e exercer, com eficácia, um trabalho digno e importante
para a sociedade.

A importância da leitura ao longo da formação escolar não está ausente na


principal lei que rege a educação no Brasil, como se vê no inciso I, do Artigo 32, que
trata do Ensino Fundamental:

Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove)


anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de
31

idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:


(Redação dada pela Lei nº 11.274, de 2006)

I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios


básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; (ibidem, p.
86)

O inciso I, do artigo 32, ao tratar a leitura como meio básico para o


desenvolvimento da capacidade de aprender, reafirma a importância do hábito de ler
na vida escolar. Entretanto, esta é a única aparição do termo leitura ao longo de toda
a lei.

Surge, então, um questionamento: se a leitura é um hábito tão importante


para a formação de cidadãos, por que a LDB, que enaltece o pleno desenvolvimento
do educando para o exercício da cidadania, só a cita uma única vez?

Talvez, encontre-se a resposta no fato do hábito de ler ter implicações


também políticas, como se observa em Alberto Manguel, lector de Jorge Luis
Borges, quando este, em Uma história da leitura (1997), afirma que o impedimento a
esta é uma das primeiras atitudes dos governos totalitários. Chartier (1998, p. 110)
também aborda esta questão ao colocar:

Até quando se estende este discurso defensivo, que julga mais


perigosos os riscos da leitura do que vantajosa a sua difusão?
[...]
De fato, o medo do excesso de livros é bastante antigo.
Encontramo-lo desde o tempo em que a produção do livro não
tinha, ainda, a dimensão que terá no século XIX ou no início do
XX.

Quando uma criança aprende a ler e começa a ter contato com livros, é
comum, no caso das famílias com possibilidades financeiras e onde o hábito de
leitura já existe entre seus membros adultos, ela ganhar exemplares dos pais e
passar a possuir critérios de leitura em função daquilo que lhe é apresentado.

Tal pressuposto não é, necessariamente, padrão em um país de proporção


continental e que abarca fortes diferenças sociais e culturais. Sob o ponto de visto
do senso comum, tem-se em mente que crianças pertencentes a classes sociais
32

menos favorecidas não desfrutam desses hábitos de leitura. Todavia, há de se levar


em consideração que essa conduta não é uma regra.

Ao entrar no universo escolar, as possibilidades de leitura expandem-se visto


que não são apenas os pais que ofertam novas leituras. Além disso, surgem
reflexões entre os colegas de classe e os professores. Durante debates, por
exemplo, podem despontar diferentes visões sobre o tema lido em função de um
livro paradidático adotado pelo professor. Ou então, os próprios alunos da sala, que
são mais próximos, indicam mais livros.

Nessa fase escolar, a realidade transforma-se e não há mais aquela visão


unilateral vinda apenas da própria família. É nesse momento que as habilidades de
leitura da palavra devem ser desenvolvidas, mas não ingênua e isoladamente e sim
uma leitura voltada, principalmente, para a leitura do mundo.

Entretanto, o desenvolvimento da capacidade de interpretar a realidade


dependerá, fundamentalmente, da filosofia da escola e das políticas educacionais
daquele momento. O tipo de aula e a educação oferecida nas escolas, particulares
ou públicas, influenciará todo o processo de aquisição e desenvolvimento da leitura
do mundo.

Todos esses fatores influenciam na formação dos discentes. O professor,


assim como a escola, reproduz uma ideologia. Cabe ao educador consciente estar
atento a esse fato, reconhecê-lo como um fenômeno natural e, apenas, tentar
afastar de si uma postura manipuladora. Freire (2009, p. 25) torna claro que:

Na medida em que compreendemos a educação, de um lado,


reproduzindo a ideologia dominante, mas, de outro, proporcionando,
independentemente da intenção de quem tem o poder, a negação
daquela ideologia (ou o seu desvelamento) pela confrontação entre
ela e a realidade (como de fato está sendo e não como o discurso
oficial diz que ele é), realidade vivida pelos educandos e pelos
educadores, percebemos a inviabilidade de uma educação neutra.

O mais próximo do ideal, então, seria os educadores reconhecerem-se como


cidadãos, assumirem suas posições e serem coerentes com elas, tentando, em sala
de aula, mostrar a diversidade de visões sobre um determinado assunto sem fazer
sobressair a sua visão pessoal sobre as demais.
33

No caso do objeto de pesquisa deste estudo, a leitura, não seria coerente, por
exemplo, um docente dizer que os alunos têm de ler pelo menos oito livros ao longo
do ano letivo se ele próprio não o faz. Não há coerência entre a opção proclamada e
a prática.

Antônio Joaquim Severino, no prefácio de A importância do ato de ler: em três


artigos que se completam, artigos estes de Paulo Freire, também comenta sobre o
caráter político da educação:

[...] a leitura da palavra é sempre precedida da leitura do mundo. E


aprender a ler, a escrever, a alfabetizar-se, é, antes de mais nada,
aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto, não numa
manipulação mecânica de palavras mas numa relação dinâmica que
vincula linguagem e realidade. Ademais, a aprendizagem da leitura e
a alfabetização são atos de educação e educação é um ato
fundamentalmente político [...] Projeto comum e tarefa solidária de
educandos e educadores, a educação deve ser vivenciada como
uma prática concreta de libertação e de construção da história.
(SEVERINO, 2009, p. 8)

Logo, sendo a educação uma prática de libertação e de construção da


história, não seria estranho que um governo não se preocupasse, como deveria,
com o hábito de ler. É por este motivo, também, que Freire (2009, p. 24) afirma “não
ser possível pensar, sequer, a educação, sem que se esteja atento à questão do
poder”.

Longe da educação que busca apenas a leitura da palavra, os discentes


ampliariam suas potencialidades, passariam a pensar por si próprios, refletiriam
sobre a sua realidade, proporiam mudanças e poderiam, inclusive, apontar falhas,
postura que os defensores da manipulação mecânica da palavra não gostam nem
um pouco.
34

1.4.2 Parâmetros Curriculares Nacionais

O Art. 210 da Constituição Brasileira, de 1988, proclama que “serão fixados


conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação
básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais”.

É como uma reafirmação deste artigo que surgem os Parâmetros Curriculares


Nacionais (PCN). Até dezembro de 1996, o Ensino Fundamental esteve estruturado
de acordo com a Lei Federal nº. 5.692, de agosto de 1971, que objetivava o pleno
desenvolvimento das potencialidades do educando como elemento de
autorrealização, a preparação para o mundo do trabalho e o exercício consciente da
cidadania.

Em março de 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial de Educação


para Todos, na Tailândia, convocada pelo Banco Mundial (BID), pela UNESCO, pelo
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Resultaram, desse encontro, objetivos na
luta pelas necessidades básicas de aprendizagem, capazes de tornar universal a
educação fundamental e de ampliar as oportunidades para todos.

Tendo como base tal consenso, o Ministério da Educação e do Desporto


(MEC) coordenou a elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos (1993-
2003), que continha diretrizes políticas voltadas para o desenvolvimento do Ensino
Fundamental.

Para se atingir, portanto, o desenvolvimento dessa etapa da educação,


surgiu, sob responsabilidade do MEC, os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN
como referências.

Na introdução do documento que traz os PCN, leem-se as seguintes palavras


que se dirigem ao professor:

Nosso objetivo é auxiliá-lo na execução de seu trabalho,


compartilhando seu esforço diário de fazer com que as crianças
dominem os conhecimentos de que necessitam para crescerem
35

como cidadãos plenamente reconhecidos e conscientes de seu papel


em nossa sociedade.
Sabemos que isto só será alcançado se oferecermos à criança
brasileira pleno acesso aos recursos culturais relevantes para a
conquista de sua cidadania. Tais recursos incluem tanto os domínios
do saber tradicionalmente presentes no trabalho escolar quanto as
preocupações contemporâneas com o meio ambiente, com a saúde,
com a sexualidade e com as questões éticas relativas à igualdade de
direitos, à dignidade do ser humano e à solidariedade. (1997, p.08)

Assim como na LDB, vê-se que a importância da formação de cidadãos


conscientes de seu papel na sociedade ressurge. Dir-se-ia, até mesmo, de uma
forma quase utópica, se comparada à realidade da educação brasileira:

Nesse sentido, o propósito do Ministério da Educação e do Desporto,


ao consolidar os Parâmetros, é apontar metas de qualidade que
ajudem o aluno a enfrentar o mundo atual como cidadão
participativo, reflexivo e autônomo, conhecedor de seus direitos e
deveres. (1997, p.08)

Utópica na medida em que cidadãos participativos, reflexivos e autônomos


são o sonho de quase, se não de todos, os educadores. Assim, os PCN
desenvolvem-se propondo, por meio de uma abordagem construtivista, a construção
do conhecimento, que levará em consideração a realidade externa à escola e
observará as capacidades individuais e necessidades sociais de cada discente.

No que envolve a leitura, objeto de estudo desta pesquisa, os PCN de Língua


Portuguesa abordam o tema com muito mais profundidade do que a LDB e definem-
na como espaço de construção da intertextualidade e como matéria-prima para a
escrita.

Ao longo do item “Prática de leitura” (1997, p. 41), há, por exemplo, uma
descrição muita rica do ato de ler:

A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de


construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu
conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe
sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema de
escrita, etc. Não se trata simplesmente de extrair informação da
escrita, decodificando-a letra por letra, palavra por palavra. Trata-se
36

de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão na


qual os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura
propriamente dita. [...] a leitura fluente envolve uma série de outras
estratégias como seleção, antecipação, inferência e verificação, sem
as quais não é possível rapidez e proficiência. É o uso desses
procedimentos que permite controlar o que vai sendo lido, tomar
decisões diante de dificuldades de compreensão, arriscar-se diante
do desconhecido, buscar no texto a comprovação das suposições
feitas, etc.
 
  Dessa forma, os PCN cumprem o papel de representarem eficazes diretrizes
nacionais para os professores da rede pública e da rede particular, já que tratam da
leitura como uma prática muito mais construtiva do que mecânica.

Além disso, ao longo do texto, as diretrizes aprofundam-se. Para se


compreender melhor o grau de seriedade com que é tratado o hábito de ler, ainda no
item “Prática de leitura”, o documento aborda o fato de que um leitor competente
deve mais do que compreender o que lê. Ele deve aprender a ler também o que não
está escrito, identificando elementos implícitos, estabelecendo relações entre o texto
que lê e outros textos já lidos.

Seguindo esta linha de raciocínio, os PCN expõem, também, que um leitor


competente deve saber que vários sentidos podem ser atribuídos a um texto e que
esta habilidade só se constitui a partir de uma prática constante de leitura em torno
de uma diversidade de textos que circulam socialmente.

No segundo item dedicado à leitura, intitulado “Tratamento didático” (1997,


p.41), a leitura, vista fundamentalmente como objeto de ensino, é encarada como
objeto de aprendizagem, sendo a escola responsável pela preservação da natureza
e da complexidade do ato de ler sem descaracterizá-lo, trabalhando com a
diversidade de textos e de combinações entre eles.

Ressalta-se, ainda, a importância de se trabalhar em sala de aula as


finalidades que caracterizam a leitura, como: para resolver um problema prático,
para informar-se, para divertir-se, para estudar, para escrever ou para revisar o
próprio texto. Dessa forma, os PCN almejam apagar das mentes de crianças e
adolescentes a visão distorcida de que a leitura de um livro só serve para se
conseguir uma boa nota em uma prova de leitura.

A parte do documento que aborda o tratamento didático também evidencia


(1997, p. 42) a necessidade de que as instituições de ensino venham a oferecer
37

bons materiais de leitura a serem trabalhados com o acompanhamento de adultos


leitores:

Se o objetivo é formar cidadãos capazes de compreender os


diferentes textos com os quais se defrontam, é preciso organizar o
trabalho educativo para que experimentem e aprendam isso na
escola. Principalmente quando os alunos não têm contato
sistemático com bons materiais de leitura e com adultos leitores,
quando não participam de práticas onde ler é indispensável, a escola
deve oferecer materiais de qualidade, modelos de leitores
proficientes e práticas de leitura eficazes.

 
Não basta oferecer bons materiais aos discentes. Os PCN abordam a
importância do desenvolvimento do trabalho por meio de adultos que estejam
preparados para realmente auxiliarem no processo de aquisição da leitura efetiva,
acompanhando todo o processo e ofertando textos do mundo. O documento que
volta a valorizar, portanto, a diversidade textual (1997, p. 42), conclui o item com a
afirmação de que sem “ela pode-se até ensinar a ler, mas certamente não se
formarão leitores competentes”.

O item seguinte dos PCN, cujo título é “Aprendizado inicial da leitura” (1997,
p. 42), volta-se para a visão mais moderna da alfabetização:

É preciso superar algumas concepções sobre o aprendizado inicial


da leitura. A principal delas é a de que ler é simplesmente
decodificar, converter letras em sons, sendo a compreensão
consequência natural dessa ação. Por conta desta concepção
equivocada a escola vem produzindo grande quantidade de “leitores”
capazes de decodificar qualquer texto, mas com enormes
dificuldades para compreender o que tentam ler. [...] É preciso que
antecipem, que façam inferências a partir do contexto ou do
conhecimento prévio que possuem, que verifiquem suas suposições -
tanto em relação à escrita, propriamente, quanto ao significado.
 

É como se os PCN defendessem a ideia de que entre a condição de


destinatário de textos escritos e a falta de habilidade temporária para ler
autonomamente é que reside a possibilidade de, com a ajuda dos já leitores,
aprender a ler pela prática da leitura.    
38

Encontra-se, novamente, por conseguinte, a relevante importância da figura


do educador que seria um mediador ao longo desse processo. Caberia ao professor,
por exemplo, agrupar os alunos, favorecendo a troca de informações vindas por
meio da leitura de um texto, garantindo que a heterogeneidade natural da sala de
aula, esteja a serviço da colaboração da própria aprendizagem da leitura.

Mais adiante, os PCN refletem sobre a necessidade de se trabalhar de forma


diversificada os vários tipos de textos (1997, p. 43):

Há textos que se pode ler rapidamente, outros devem ser lidos


devagar. Há leituras em que é necessário controlar atentamente a
compreensão, voltando atrás para certificar-se do entendimento;
outras em que se segue adiante sem dificuldade, entregue apenas
ao prazer de ler. Há leituras que requerem um enorme esforço
intelectual e, a despeito disso, se deseja ler sem parar; outras em
que o esforço é mínimo e, mesmo assim, o desejo é deixa-las para
depois.
 
Assim, uma prática docente consciente, trabalharia, em sala, com várias
leituras, pois o mito da interpretação única deve ser superado, assim como a única
forma de se trabalhar com textos na escola. Se o docente não desperta em seus
alunos o desejo de ler, é porque ele não tem uma prática pedagógica eficiente.

Quase que ao final do item “Aprendizado inicial da leitura” (1997, p. 44), os


PCN tratam de algumas condições que são imprescindíveis para o desenvolvimento
da prática e do gosto pela leitura: boa biblioteca na escola; acervo de livros na
própria sala de aula; momentos de leitura livre em que o professor também leia;
valorização da leitura como outras atividades do dia a dia escolar; escolha, por parte
dos alunos, de suas leituras; empréstimos de livros na escola; oportunidade de
indicar obras para serem adquiridas pelos alunos e política institucional de formação
de leitores.

Por fim, as diretrizes terminam com sugestões de trabalho com os alunos


(1997, p. 44): leitura diária (silenciosa, em voz alta e pela escuta de alguém que lê);
leitura colaborativa (professor lê o texto com a classe enquanto pode haver
questionamento dos alunos); projetos de leitura; atividades sequenciadas de leitura
(procura da obra de um escritor preferido, por exemplo) e atividades permanentes de
leitura.
39

Se grande parte dos professores seguisse, ou pelo menos tentasse seguir, as


diretrizes sobre a leitura expostas ao longo dos PCN, a realidade dos discentes
brasileiros, talvez, seria outra ou, pelo menos, mais prazerosa.

1.4.2.1 Parâmetros em Ação

Não se pode falar das aulas de leitura sem se preocupar com a formação dos
professores que colocam em prática os trabalhos com as obras literárias.

Alguns docentes, às vezes, muito distantes dos bancos acadêmicos, não


conseguem vislumbrar a possibilidade de mudança em suas rotinas didático-
pedagógicas. São vários os que, por exemplo, até tentam trabalhar com os
Parâmetros Curriculares Nacionais, mas que, infelizmente, não conseguem utilizar
as orientações na preparação e na execução de suas aulas.

Talvez, tenha sido a partir dessa realidade, que surgiram os Parâmetros em


Ação. O próprio texto inicial do documento, da Secretaria de Educação Fundamental
e do Ministério da Educação, explica que os Parâmetros em Ação foram criados
para serem utilizados em um contexto de formação continuada de profissionais da
educação, buscando vínculos com as práticas locais. De acordo com a parte I (1999,
p. 09) do documento, a atividade tem como finalidades:

• Apresentar alternativas de estudo dos Referenciais Curriculares a


grupos de professores e a especialistas em educação, de modo que
possam servir de instrumentos para o desenvolvimento profissional
desses educadores.
• Analisar as Diretrizes Curriculares Nacionais (Educação Infantil e
Ensino Fundamental) elaboradas pelo Conselho Nacional de
Educação, norteadoras do trabalho das escolas.
• Contribuir para o debate e a reflexão sobre o papel da escola e do
professor na perspectiva do desenvolvimento de uma prática de
transformação da ação pedagógica.
• Criar espaços de aprendizagem coletiva, incentivando a prática de
encontros para estudar e trocar experiências e trabalho coletivo nas
escolas.
40

• Identificar as idéias nucleares presentes nos Referenciais


Curriculares e fazer as adaptações locais necessárias, atendendo às
demandas identificadas no âmbito do estado/município ou da própria
escola.
• Potencializar o uso de materiais produzidos pelo MEC.
• Incentivar o uso da TV Escola como suporte para ações de
formação de professores.

Trata-se, portanto, de um programa de formação continuada por meio do qual


debates, dramatizações, leituras orais e compartilhadas e exibição de filmes ocorrem
na busca por uma reflexão sobre a didática e sobre a linha metodológica do
professor que hoje não pode afastar-se do cotidiano dos educandos.

Depois da parte introdutória do documento, quando passa para os módulos


(1999, p. 123), o programa torna-se ainda mais coerente ao propor discussões, tais
como:

• Como a Língua Portuguesa pode contribuir para a construção da cidadania?


(p. 125)
• Qual é a importância da profissionalização do magistério para se atingir uma
maior competência profissional? (p. 128)
• Para realizar um bom trabalho com leitura, basta deixar a diversidade textual
entrar em sala de aula ou é preciso considerar também a diversidade dos
modos de ler? (p. 153)
• Como a escola encaminha as atividades de leitura? (p. 154)

Tem-se, então, mais um instrumento a favor do professor que quer se


aperfeiçoar para melhor atender aos alunos, para aproximar mais a rotina das suas
aulas à realidade de seus discentes e para tornar as aulas de leitura mais
interessantes e significativas.
41

CAPÍTULO 2 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO DE LEITURA NAS AULAS DE


LÍNGUA PORTUGUESA

É pensando criticamente a prática de hoje ou de


ontem que se pode melhorar a próxima prática.
Paulo Freire

2.1 O ENSINO TRADICIONAL E A FORMAÇÃO DE LEITORES

Embora as transformações sociais sejam constantes nos últimos tempos e o


uso contínuo da leitura e da escrita torne-se cada vez mais necessário no mundo
globalizado atual e, acredita-se, também no vindouro, ainda é grande o número de
escolas e de professores que segue um modelo de ensino que há muito tempo já se
mostra ineficaz e antiquado, no que diz respeito ao exercício da leitura e da escrita.

Celso Antunes (2010, p. 9), segundo seu próprio destaque, ao utilizar-se de


bom humor e não de ironia, no livro Professores e Professauros, compara alguns
professores a dinossauros e explica que

os dinossauros constituem espécies extremamente simpáticas e


prova disso é verificar como as crianças, principalmente os meninos,
os adoram. Usamos esse nome porque os dinossauros eram
criaturas de outros tempos, alguns de grandes comprimentos e
altura, outros de médio e ainda outros de pequeno porte. E, por
acaso, ainda não existem pelas salas de aula deste país continente
professores de outros tempos? Alguns são grandes, outros
pequenos, mas sempre se identificam pela dificuldade em incorporar
o novo, pela exasperação com que seguram a tradição de não
mudar, pela raiva que guardam dos que sempre estão aprendendo,
enfim, pela teimosa vontade de olhar a criança de hoje e pensar que
é exatamente igual à criança que um dia foi.
42

Como se pode pensar, então, em uma boa prática pedagógica que anseia
pela plena formação de leitores se, de forma geral, quase todo o contexto
educacional vive um atraso temporal? Se parte do corpo docente age como
dinossauros?

Infelizmente, um número grande de professores sequer conhece, e muito


menos utiliza, os novos modelos teóricos que estão presentes nos documentos
oficiais orientadores da organização da prática docente, como é o caso dos PCN.
Ainda há professores que se consideram o centro do processo de ensino-
aprendizagem e que apenas julgam o aluno como um receptor de saberes que
devem ser acumulados ao longo do ano letivo. Para eles, a repetição é a mãe da
aprendizagem e a memorização, a solução para tudo. O silêncio é valorizado e a
imobilidade do aluno, entendida como respeito:

O educador, que aliena a ignorância, se mantém em posições fixas,


invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão
sempre os que não sabem. A rigidez destas posições nega a
educação e o conhecimento como processos de busca. O educador
se põe frente aos educandos como sua antinomia necessária.
Reconhece na absolutização da ignorância daqueles a razão de sua
existência. (FREIRE, 2005, p. 67)

Tais docentes pouco podem fazer em prol da formação de leitores efetivos.


Trata-se de professores que ministram as aulas, muito frequentemente, da mesma
forma que avaliam seus alunos, utilizando, habitualmente, o mesmo instrumento e
que terminam o ano sem grandes reflexões pedagógicas.

Faz parte desse grupo aquele profissional que coloca toda a culpa do
fracasso escolar no educando, o professor que diz não fazer nada diferente porque a
escola não oferece recursos e o docente que sustenta que não vale a pena fazer
nada de novo porque os discentes não se envolverão com propostas de trabalho
distintas das atividades normais do dia a dia escolar:

O seu “humanitarismo”, e não humanismo, está em preservar a


situação de que são beneficiários e que lhes possibilita a
manutenção de sua falsa generosidade [...]. Por isto mesmo é que
reagem, até instintivamente, contra qualquer tentativa de uma
educação estimulante do pensar autêntico, que não se deixa
43

emaranhar pelas visões parciais da realidade, buscando sempre os


nexos que prendem um ponto a outro, ou um problema a outro.
(idem, ibidem, p. 69)

São desse grupo, também, os profissionais que cresceram em uma época na


qual não havia Nintendo DS, Nintendo Wii, Play Station, MP3 player, Ipod, Orkut,
Facebook, Twitter e Ipad e que não fazem o mínimo de esforço para, pelo menos,
saberem o que são essas invenções.

Nesse contexto tradicional, a formação de leitores acaba por ser prejudicada


na medida em que se “anula o poder criador dos educandos ou o minimiza,
estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade” (FREIRE, 2005, p. 69). Trata-se
do ensino da leitura baseado apenas no treino da habilidade de decodificação do
código escrito, distanciando-se das práticas sociais de leitura vivenciadas por
diferentes grupos, em vários contextos e épocas. Ignora-se o fato da leitura
representar um processo a partir do qual o leitor realiza um exercício de construção
do significado do texto, por meio do conhecimento de mundo, dos conhecimentos
linguísticos e da intencionalidade do autor.

O docente de Língua Portuguesa que se mantém preso a modelos


extremamente conservadores não está preparado para trabalhar textos literários
com alunos que dormem e acordam no mundo virtual. A concepção de ensino da
leitura tradicional não se adapta ao desenvolvimento socioeconômico-cultural da
sociedade moderna na qual os indivíduos convivem em contextos em que a leitura
faz-se presente de forma mais complexa.

Nesse contexto, a formação continuada do corpo docente seria


imprescindível. Por meio dela, o professor poderia refletir com outros parceiros de
profissão a necessidade da mudança de paradigmas no ensino da língua e da
leitura.

Demo (2006, p. 119), ao discorrer sobre a formação permanente, fala da


aprendizagem reconstrutiva que poderia conseguir resultados sistemáticos, como:

a) elaborar materiais didáticos próprios, tendo em vista que o aluno


só terá texto próprio se o professor tiver também [...];
b) elaborar o projeto pedagógico próprio, com o objetivo de subsidiar
o projeto pedagógico coletivo [...];
44

c) voltar a estudar sistematicamente, de tal sorte que o professor


possa acompanhar, minimamente, sua área de formação original
e seus temas preferidos [...];
d) voltar a ler sistematicamente, para que o professor possa
alimentar-se de argumentos atualizados em sua área [...];
e) desconstruir e reconstruir as práticas, com vista a superar seu
contexto instrucionista e ingressar em outro patamar da
aprendizagem reconstrutiva.

É evidente que para que essa mudança ocorra também é necessária uma
alteração na rotina profissional do professor, pois, frequentemente, ele não recebe
de seu empregador, seja ele a escola privada ou a pública, a chance de buscar
cursos de capacitação devido ao fato de ter de ministrar muitas aulas ao longo da
semana, para ter um salário suficiente para pagar suas contas:

Em jogo está a mudança do perfil do professor. É preciso superar


aquele professor que, uma vez formado, só dá aula, a vida toda,
quase sempre a mesma aula, e não estuda mais. Este perfil, nem de
longe, é “culpa” do professor. Antes, é resultado do ambiente
instrucionista de um lado, e, de outro, das agruras da vida de
professor, pois precisa trabalhar como um condenado para obter
remunerações indignas. (DEMO, 2006, p. 124)

Os textos literários, nessa nova perspectiva, não deveriam ser considerados


como algo pronto e acabado, mas como pressupostos e intenções que, somados a
fatores contextuais e intertextuais, criam um novo universo de leitura a ser
desvendado pelo educando:

É fundamental que exercícios e atividades trabalhem elementos do


texto que contribuam para um relacionamento mais intenso dos
alunos com aquele texto particular e que, como uma espécie de
subproduto da atividade ou do exercício, fique inspiração e caminho
para o inter-relacionamento daquele texto com todos os outros
conhecidos daquele leitor e – lição maior! – a intuição da quase
infinita interpretabilidade da linguagem de que os textos são
constituídos. É exatamente no exercício dessa reinterpretação que
cada leitor, assenhorando-se do texto, torna-se sujeito de sua leitura,
espécie de reescrita significante daquilo que o autor, ao escrever,
deixou [...]. (LAJOLO, 2008, p. 51)
45

Constata-se, infelizmente, que o modelo tradicional de educação não leva


isso em consideração, além de ignorar, também, o que ocorre fora da escola – como
as tecnologias que invadem o dia a dia de todos –, e como hoje o que ocorre além
dos muros da escola está cada vez mais longe do que ocorre dentro, a distância
entre educandos e educadores só aumenta. Eliana Albuquerque (2006, p. 13)
explica que isso ocorre

em decorrência da existência de um desequilíbrio entre o sistema de


ensino e a sociedade, desequilíbrio decorrente, de um lado, do
desenvolvimento da produção científica que ressalta, em
determinado período, uma distância significativa entre o saber
científico e o saber a ensinar, e, do outro, de mudanças ocorridas na
própria sociedade, como a existência de processos de
democratização do ensino que resultam em um novo perfil de
alunado, que não se adapta aos saberes até então prescritos para
serem ensinados, o que pode gerar uma crise no ensino e a
consequente necessidade de mudanças na natureza do saber a
ensinar.

Fernando Hernández (1998, p. 32), ao tratar a escola como fonte geradora de


cultura e não só de aprendizagem de conteúdos, comenta que:

Os problemas para aprender e pensar não são considerados como


produto de certas aptidões e de inescrutáveis processos cognitivos, e
sim como complexas interações entre personagens, interesses,
contextos sociais e culturais e experiências de vida. Leva-nos
também a reconhecer a complexidade conceitual e vital dos alunos
(desde os primeiros anos) e das situações de aprendizagem que
vivem dentro e fora da Escola. Tudo isso pode servir de antídoto
diante do reduzionismo da pedagogia cartesiana que continua
dominando boa parte de nossa cultura educativa, sobretudo no
Ensino Médio.

Convém ressaltar que, durante um tempo, o modelo tradicional fora


satisfatório quando os objetivos eram outros, porém, na atualidade, ele não
consegue mais acompanhar o mundo no qual se apresenta. Muitos indivíduos foram
educados de acordo com as práticas chamadas tradicionais. Vários deles são
excelentes profissionais ou estudiosos em função desse padrão. Todavia, hoje, as
necessidades são outras e os atrativos para as crianças e para os jovens também.
46

É difícil situar, com exatidão, o momento em que o contexto educacional


passou a ser questionado de forma mais intensa, mas é comum se utilizar do
movimento da Escola Nova para se justificar muitas reflexões.

Antunes (2010, p. 18) explica que, entre o final do século XIX e o início do
século XX, “instituíram-se muitas escolas para a formação de professores,
apareceram centros de educação infantil, ensino especializado para deficientes” e
“colônias específicas para preparação de trabalhadores agrícolas”.

Essas mudanças transformaram o contexto educacional e representaram


grandes realizações, pois passaram a atentar para a importância de se verificar as
condições socioculturais do aluno e considerar o educando como um ser único que
necessita esperar o melhor tempo para aprender:

O que leva a considerar que o melhor caminho para ensinar seja


mediante a pesquisa, observando os diferentes contextos sociais de
procedência dos estudantes e as vias ou estratégias que possam ser
utilizadas para interrogá-los, estabelecer relações e propor novas
perguntas. (HERNÁNDEZ, 1998, p. 56)

Nessa época, observou-se, também, que os indivíduos poderiam ter


diferentes estágios de desenvolvimento humano. A partir dessa premissa, o
professor, por exemplo, não mais compararia os alunos entre si e respeitaria o
avanço de cada um sem apressar o desenvolvimento de ninguém. A esse conjunto
de mudanças denominou-se o movimento da Escola Nova.

Todavia, faz-se necessário explicar que a Escola Nova não destruiu tudo o
que era preconizado no modelo convencional até então. Não se questionou, por
exemplo, o irrefutável valor dos sólidos conhecimentos, normalmente agrupados em
disciplinas. O foco de questionamento estava, sim, na forma como os conteúdos
eram desenvolvidos em sala de aula, na melhor maneira de fazer com que o
indivíduo realmente aprendesse a aprender.

Não existe modelo ideal de educação. Não há fórmulas pedagógicas mágicas


ou milagrosas. Contudo, seria muito proveitoso se a oposição entre professores e
alunos fosse superada de tal maneira que se fizessem “ambos, simultaneamente,
educadores e educandos”. (FREIRE, 2005, p. 67)
47

A busca pela autonomia do educando, a certeza de que os alunos são


diferentes, o respeito pela curiosidade natural do indivíduo, a valorização dos
interesses e necessidades dos discentes, a convicção de que a educação é um meio
essencial para capacitar o ser humano a desenvolver plenamente suas habilidades e
competências individuais e a integração entre a vida acadêmica e a social -
reflexões essenciais para a Escola Nova - inspiraram muitos professores e
incomodaram outros:

Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que,


enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser
educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do
processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de
autoridade” já não valem. Em que, para ser-se, funcionalmente,
autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não
contra elas. (idem, ibidem, p. 79)

Em verdade, o foco afastou-se do professor e passou a dar destaque ao


educando, sendo o genuíno educador aquele que contribui para que o aluno,
verdadeiramente, aprenda. Conduzida por meio da sutil perspicácia do docente, a
aula de qualidade primaria, então, pela ação ativa e autônoma do discente, que seria
estimulado a confrontar-se com diversas informações e situações, reconstruindo
seus conhecimentos prévios. Hernández (1998, p. 50) explica que “apresentar
exemplos da cultura que nos rodeia tem a função de aprender a interpretá-los a
partir de diferentes pontos de vista e favorecer a tomada de consciência dos alunos
sobre si mesmos e sobre o mundo”.

É a partir desses pressupostos que a prática pedagógica crítico-reflexiva


ganhou força na busca por um ensino renovado. O docente de hoje, que
provavelmente foi educado de acordo com o modelo tradicional de educação,
necessita parar, refletir e questionar o seu dia a dia pedagógico para conseguir
exercer, sem mentiras, o novo papel do educador moderno.

Reforçando a ideia de que a mudança no contexto educacional torna-se


imediata e imprescindível, é interessante comentar que os programas nacionais de
avaliação escolar, o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica) e o ENEM
(Exame Nacional do Ensino Médio), têm pontuado que o baixo desempenho dos
48

alunos nas provas deve-se à ausência de domínio da leitura compreensiva. Algo


precisa ser feito diante de tal séria constatação.

O educando, de modo geral, rejeita a aula monológica, puramente expositiva,


que parte, quase que exclusivamente, da enunciação do professor ou do autor do
livro didático. Em muitos casos, há uma disposição para aprender, ler obras
literárias, debater textos, compartilhar sentidos, porém, torna-se indispensável que
se mude o tratamento dado a essas atividades. É cada vez maior o número de
alunos que solicitam uma participação diferente no processo de ensino-
aprendizagem, o papel de sujeito, que os auxiliaria, na superação de suas
dificuldades:

Hoje os tempos são outros, menos eufóricos e mais amadurecidos.


Podemos, então, na colheita dos primeiros resultados e das
primeiras perplexidades, tentar corrigir os rumos, procurando
resgatar, no novo percurso, o já tantas vezes adiado projeto de
democratização e qualificação da educação brasileira. (LAJOLO,
2008, p. 18)

Hernández (1998, p. 33) complementa as ideias de Lajolo:

Essa visão destaca, por exemplo, a importância de ensinar a


reconhecer as influências mútuas entre as diferentes culturas, a
presença das representações de umas e outras em diversas formas
de conhecimento (filosófico, derivado da construção da identidade...),
nas artes (das formas de representação, da utilização dos símbolos e
procedimentos), nas ciências (desde o cálculo até a explicação das
leis da natureza) e nas crenças (na influência entre as visões
religiosas) na construção da realidade.

Escola e professor precisam refletir sobre sua postura. A escola deve abrir
suas reflexões para além de seus muros e o educador necessita compreender que
não é porque ele foi educado da forma tradicional que não pode mudar, visando a
uma formação mais coerente com a vida de seus educandos.
49

2.2 A PRÁTICA REFLEXIVA POR UM ENSINO RENOVADO

Educadores conscientes da ação que praticam e do papel que desempenham


não se contentam com a rotina pedagógica e com os hábitos escolares estruturados.
Querem saber sempre mais e conhecer o que há de novo em sua área para
refletirem sobre as novas práticas educativas. Freire (1996, p. 38) assegura que a
prática docente “crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico,
dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer”.

Na área educacional, assim como em outros campos profissionais, a reflexão


e a ação são companheiras inseparáveis. A reflexão desvinculada da prática leva a
uma teorização vazia e a ação que não é orientada pela reflexão dá rumo a uma
rotina fastidiosa. Por isso, o professor, realmente consciente de sua tarefa, deve
pautar-se na reflexão em busca de um ensino renovado.

A unidade constante entre reflexão e ação conduz a um ensino mais


proveitoso tanto para educandos quanto para educadores e permite que o professor
não confunda os meios com os fins e não se escravize pelas técnicas, que são
meros instrumentos. De acordo com Maria Oliveira e Marli André (1997, p. 94):

É possível ampliar horizontes e ir favorecendo uma visão em que a


Didática é concebida como tendo por objetivo a compreensão dos
diferentes determinantes da prática pedagógica e a construção de
formas de nela intervir que favoreçam a formação de sujeitos sociais
reflexivos, críticos e comprometidos com uma democracia plena para
todos.

O ensino faz parte do contexto social e, como esse contexto é dinâmico, o


ensino também o é. Logo, o educador deve sempre atualizar a sua prática
pedagógica, planejando, dessa forma, novas ações que almejem resultados mais
condizentes com a realidade dos alunos:

O caráter multidimensional e contextualizado da Didática exige que


ela seja continuamente repensada à luz dos novos desafios que a
sociedade e a educação apresentam para a construção da
50

democracia e de uma cidadania plena, consciente e crítica. (idem,


ibidem, p. 94)

Erros todos cometem e sempre cometerão, porém o bom profissional é


aquele que faz uma autoavaliação, quase que diária, do seu próprio trabalho, de
seus métodos, práticas e resultados e que, por meio de uma análise crítica e
reflexiva, consegue visualizar os pontos que precisam ser aprimorados, buscando
possíveis progressos.

Freire (1996, p. 39) explana muito bem sobre esse processo ao estabelecer
que:

Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da


prática em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da
superação da ingenuidade pela rigorosidade. [...] Quanto mais me
assumo como estou sendo e percebo a ou as razões de ser de
porque estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de
promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênua para o de
curiosidade epistemológica.

Com professores mais reflexivos, críticos, conscientes e preocupados, ganha


o ensino na medida em que reflexões geram transformações e benefícios diretos
para alunos e para a própria sociedade. Segundo Vera Candau (1996, p. 20):

Nesta perspectiva, a reflexão didática parte do compromisso com a


transformação social, com a busca de práticas pedagógicas que
tornem o ensino eficiente (não se deve ter medo da palavra) para a
maioria da população. Ensaia. Analisa. Experimenta. Rompe com
uma prática profissional individualista.

É a partir dessa prática reflexiva de docentes e discentes, compromissada


com a transformação social, que a formação de leitores efetivos pode ocorrer de
forma efetiva a fim de garantir o processo de ensino-aprendizagem e de cidadania.

O ensino tradicional da Língua Portuguesa tinha como objetivo aproximar o


discente da norma culta, punindo qualquer tipo de desvio. Ignorava as variedades
linguísticas e ressaltava que a Língua Portuguesa, em seu padrão culto, deveria ser
utilizada em todas as situações comunicativas do aluno.
51

Por meio de práticas reflexivas, por exemplo, mesmo que o professor tenha
estudado em uma época na qual o ensino tradicional tenha imperado, ele trabalhará
em sala a eficácia e a proficiência no uso das modalidades linguísticas, adequadas
ao contexto comunicacional.

No caso das aulas de leitura, prática similar ocorre. O bom educador não
pode ministrar suas aulas da mesma forma que as teve em seu tempo de garoto.
Nesse momento, o professor deve refletir sobre a melhor maneira de apresentar
novos textos e diferentes obras a seus alunos. Não basta, portanto, que os discentes
leiam os livros apenas para que se preparem para uma dada avaliação.

Em um primeiro momento, o docente tem de se avaliar. Lajolo (2008, p. 108)


comenta que:

A discussão sobre leitura, principalmente sobre a leitura numa


sociedade que pretende democratizar-se, começa dizendo que os
profissionais mais diretamente responsáveis pela iniciação na leitura
devem ser bons leitores. Um professor precisa gostar de ler, precisa
ler muito, precisa envolver-se com o que lê.

Demo (2006, p. 124) reafirma esse perfil do professor exposto por Lajolo,
explicando que:

O perfil buscado de professor é daquele que, além de formação


original adequada, mantém-se em formação permanente como
condição fatal de sua profissão. Deve ser a imagem viva de quem
sabe aprender, estudar, pesquisar, elaborar, para poder construir tais
efeitos nos alunos. Para que o aluno saiba pensar, é indispensável
que o professor saiba pensar. Aí, a ideia de que a formação
permanente é a alma do negócio, encontrando nas novas tecnologias
apoio fantástico.

De forma geral, verifica-se, lamentavelmente, que esse não é o perfil do


professor nos dias de hoje. Também se faz indispensável, então, a leitura para o
docente. Ele não pode cobrar diversas leituras dos alunos se ele próprio não lê nada
ou se lê muito pouco.

Além disso, o ensino da leitura, vista agora como processo de interação entre
autor, texto e leitor, altera-se, ganhando dimensões de prática social. Isso significa
52

que o processo da leitura deve ser feito de modo a garantir que o ato de ler seja
desenvolvido de uma forma que se aproxime da realidade do educando. “Isso
implica trazer para a sala de aula os contextos significativos de leitura que envolvem
diferentes gêneros presentes no convívio social dos alunos e dos professores”
(ALBUQUERQUE, 2006, p. 22).

Daí a importância da prática reflexiva. Constantemente, o educador deve


pensar em textos que melhor se adequem à realidade dos alunos, sabendo que as
mudanças ocorrem com muita frequência. A partir disso, não é possível, nos dias de
hoje, o professor utilizar os mesmos textos em sala de aula e em suas provas por
vários anos, consecutivamente, por uma questão de comodidade.

Conceitos e conteúdos também precisam ser repensados. São inúmeros os


professores que limitam, por exemplo, as aulas de leitura e literatura, utilizando
manuais de teoria literária, tentando definir o que é literatura, sendo que esta
tentativa de definição já se encontra ultrapassada desde os anos 60 do século
passado.

Em Literatura: leitores & leitura, Lajolo (2001, p. 16), tratando do interminável


questionamento do que seja a literatura, interroga e, depois, explica:

Será que são literatura os poemas adormecidos em gavetas, pastas,


fitas, disquetes, CDs, cadernos e arquivos pelo mundo afora, os
romances que a falta de oportunidade impediu que fossem
publicados, peças de teatro nunca lidas nem encenadas e que jamais
encontrarão ouvidos de gente? Será que tudo isso é literatura? [...]
Será então que tudo o que foi publicado em livro é literatura? Mesmo
os romances pornô que nenhum professor manda ler, de que crítico
nenhum fala, que jornais e revistas solenemente ignoram? [...] A
resposta é simples. Tudo isso é, não é e pode ser que seja literatura.
Depende do ponto de vista, do significado que a palavra tem para
cada um, da situação na qual se discute o que é literatura.

O educador reflexivo chega à conclusão de que a literatura não pode ser vista
como uma ciência exata. Observa que a sua definição depende do olhar do leitor.
Toma a consciência de que os textos não devem ser trabalhados de forma linear e
fechada.
53

Chartier (1994, p. 09) expõe que:

As obras – mesmo as maiores, ou, sobretudo, as maiores – não têm


sentido estático, universal, fixo. Elas estão investidas de
significações plurais e móveis, que se constroem no encontro de uma
proposição com uma recepção. Os sentidos atribuídos às suas
formas e aos seus motivos dependem das competências ou das
expectativas dos diferentes públicos que delas se apropriam.
Certamente, os criadores, os poderes ou os experts sempre querem
fixar um sentido e enunciar a interpretação correta que deve impor
limites à leitura (ou ao olhar). Todavia, a recepção também inventa,
desloca e distorce.

Ademais, o educador reflexivo percebe que as leituras necessitam ter


objetivos e que estes devem ser apresentados aos alunos.

É comum, também, deparar-se com docentes que se preocupam em


preencher a rotina escolar dos discentes com a maior quantidade possível de textos.
Entretanto, essa prática não tem valia. O docente, que se importa com a quantidade,
ao se afastar da necessária qualidade do tratamento com o texto, distancia ainda
mais seus alunos da literatura:

A insistência na quantidade de leituras sem o devido adentramento


nos textos a serem compreendidos, e não mecanicamente
memorizados, revela uma visão mágica da palavra escrita. Visão que
urge ser superada. A mesma, ainda que encarnada deste outro
ângulo, que se encontra, por exemplo, em quem escreve, quando
identifica a possível qualidade de seu trabalho, ou não, com a
quantidade de páginas escritas. (FREIRE, 2009, p. 18)

O professor reflexivo, porém, leva esses questionamentos em consideração e


ao tomar tal postura percebe que a cada dia as dúvidas e as possíveis explicações
para as mesmas fazem dele um profissional melhor, autônomo, que entre todas as
suas tarefas, tenta dar autonomia também a seus alunos.
54

2.3 DIÁLOGO ENTRE O PROFESSOR E O ALUNO

O questionamento pessoal, por parte do profissional da educação, deve ser


uma constante, aliás, salientada na LDB, que preconiza, no inciso III, do artigo 63, e
no inciso II, do artigo 67, a formação continuada dos professores:

Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:


I - cursos formadores de profissionais para a educação básica,
inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes
para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino
fundamental;
II - programas de formação pedagógica para portadores de diplomas
de educação superior que queiram se dedicar à educação básica;
III - programas de educação continuada para os profissionais de
educação dos diversos níveis.9

[...]
Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos
profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos
dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:
I - ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;
II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com
licenciamento periódico remunerado para esse fim;10
III - piso salarial profissional;
IV - progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e na
avaliação do desempenho;
V - período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído
na carga de trabalho;
VI - condições adequadas de trabalho. (BRANDÃO, 2006, p. 137-41)

Curiosidade crítica e formação continuada podem levar o profissional a


conhecer e enfrentar as mudanças sociais. Ciente das transformações que ocorrem
nas relações sociais, o docente necessita ter consciência de que a relação
professor-aluno, por respeitar o aluno - sujeito do processo de aprendizagem - deve
estar calcada no diálogo.
9
Grifo nosso.
10
Grifo nosso.
55

Na escola tradicional, a ausência do diálogo era vista como uma situação


normal no cotidiano escolar. Aliás, o silêncio, desejo maior da maioria dos mestres,
era visto como sinônimo de respeito por parte dos alunos. Uma ilusão já que, muitas
vezes, o silêncio representava medo, desinteresse ou uma situação de submissão
em relação ao professor que era o detentor absoluto do saber.

Assim sendo, embora a escola se denominasse como uma instituição


preocupada com a interação do indivíduo no meio social no qual está inserido,
visando a um bom convívio em grupo e em sociedade, o diálogo não era uma prática
constante entre docentes e discentes.

Freire (1996, p. 135) afirma que “viver a abertura respeitosa aos outros e, de
quando em vez, de acordo com o momento, tomar a própria prática de abertura ao
outro como objeto da reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente”.

O professor, por maior que seja o seu conhecimento e a sua experiência, não
pode fechar-se em um mundo sem diálogo:

O fechamento ao mundo e aos outros se torna transgressão ao


impulso natural da incompletude. O sujeito que se abre ao mundo e
aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se
confirma como inquietação e curiosidade, como inconclusão em
permanente movimento na História. (FREIRE, 1996, p. 136)

Saber ouvir os educandos é fundamental para conhecer o contorno


geográfico, social e econômico dos aprendizes e, também, da escola. Essa prática
reflete respeito pelos educandos e gera o desenvolvimento de uma relação
intercomunicativa que pode conseguir grandes progressos ao longo do processo
ensino-aprendizagem.

E não se trata aqui de diálogos vazios, cheios de pena ou consolo. Freire


(1996, p. 138) fala de diálogos capazes de “desocultar verdades escondidas”, de
“desmistificar a farsa ideológica, espécie de arapuca atraente em que facilmente
caímos”, de “enfrentar o extraordinário poder da mídia, da linguagem da televisão,
de sua ‘sintaxe’ que reduz a um mesmo plano o passado e o presente”.
56

Dentro desse contexto educacional, o educador, portanto, não pode apenas


ouvir os seus educandos. Mais do que isso, ele precisar saber ouvir, melhor dizendo,
estar disposto a ouvir:

A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem


tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras
verdadeiras, com que os homens transformam o mundo. Existir,
humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo
pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos
pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar. Não é no silêncio que
os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.
(FREIRE, 2005, p. 90)

Ganhando esta nova dimensão, o diálogo também cria laços de afetividade na


relação professor-aluno. O educando sente-se valorizado ao ser ouvido e aproxima-
se do docente.

Chega a ser até mesmo estranho para alguns alunos quando um professor
demonstra-se aberto para o diálogo, porque, frequentemente, eles são calados pela
dinâmica da aula. Poucos professores estão realmente dispostos a ouvir seus
alunos. Muitos fazem de tudo para que suas aulas terminem com o sinal para que
perguntas não sejam feitas. Vários são os docentes que entregam suas avaliações
corrigidas ao término do período para que questionamentos não surjam.

Segundo Freire (2005), os indivíduos transformam-se e ganham significação


enquanto homens, quando reconquistam o direito de dialogar. Dialogar, muitas
vezes, é libertar-se de uma situação de opressão. É por esse motivo que o professor
não pode reduzir sua profissão à rotina de depositar informações e conhecimentos
no outro, a não ser que queira manter a situação opressora entre mestres e
aprendizes que, constantemente, instala-se no ambiente escolar. Nessa situação,
impera apenas a educação “bancária”11.

Um verdadeiro diálogo e uma real troca de ideias tornam-se fundamentais em


um ambiente que busca a formação da cidadania. Entretanto, nem todos os
professores estão preparados ou pré-dispostos a dialogar com seus discentes.

11
Termo consagrado por Freire (2005, p. 59).
57

Em primeiro lugar, muitos não desenvolveram tal habilidade nos cursos de


formação, ou seja, não receberam informações concretas sobre a importância dessa
prática no contexto educacional. Eles não sabem que o diálogo pode representar
uma ferramenta importantíssima na busca por uma aprendizagem significativa,
estreitando relações de afetividade entre educadores e educandos, ato que gera um
clima de confiança ao longo do processo ensino-aprendizagem.

Em segundo lugar, ainda de acordo com Freire (2005, p. 92), não há diálogo
sem amor ao mundo e aos homens:

Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, diálogo. Daí que


seja essencialmente tarefa de sujeitos e que não possa verificar-se
na relação de dominação. Nesta, o que há é patologia de amor:
sadismo em quem domina; masoquismo nos dominados. Amor, não.
Porque é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é
compromisso com os homens. Onde quer que estejam estes,
oprimidos, o ato de amor está em comprometer-se com sua causa. A
causa de sua libertação. Mas, este compromisso, porque é amoroso,
é dialógico.

Nesse caso, a realidade que se observa torna-se mais complexa na medida


em que não são todos os docentes que carregam o sentimento amor para as suas
salas de aula. Na fala de Freire, percebe-se o profundo vínculo entre o diálogo e a
afetividade, além do respeito ao educando na figura não só do aluno, mas, também,
no papel de indivíduo em processo de formação.

Logo, nota-se que a educação intelectual deve caminhar junto da educação


afetiva. O professor deve levar em consideração tanto os aspectos cognitivos quanto
os aspectos afetivos, porém é importante ressaltar que o desenvolvimento de uma
boa afetividade pode fazer com que o indivíduo tenha uma vida mais plena,
equilibrada e sadia e o diálogo é uma das peças mais fundamentais nesse processo.

Por fim, o diálogo também se torna determinante para o docente que reflete
constantemente sobre sua prática, pois, conversando com os alunos e discutindo as
propostas desenvolvidas em sala, o professor pode ter um retorno crítico dos
discentes sobre as atividades e perceber a necessidade de variar as estratégias
metodológicas para um melhor aproveitamento do próprio educador e dos
educandos.
58

2.4 A IMPORTÂNCIA DE VARIAR AS ESTRATÉGIAS

Um bom diálogo entre educador e educandos pode fazer brotar, em um


profissional consciente, a necessidade de repensar as estratégias utilizadas em sala
de aula.

Além disso, não há, hoje, como um professor ministrar suas aulas sem levar
em consideração que seu aluno, provavelmente, terá, em um dos bolsos, um celular
cheio de jogos e, no outro, um MP3 player. Uns com variedades mais sofisticadas e
outros, os alunos mais carentes, com versões mais simples e até mesmo piratas.

A tarefa é fazer com que o aluno assista à aula e tenha prazer na mesma,
tendo a forte concorrência de equipamentos que, de tempos em tempos, ficam cada
vez menores e melhores.

Muitos docentes afirmam ser a concorrência injusta, porém o problema é


outro. O professor não pode se comparar a um equipamento eletrônico. Ao longo do
processo ensino-aprendizagem, o educador é um elemento fundamental,
principalmente na Educação Básica na qual a formação não envolve apenas os
conhecimentos científicos e acadêmicos. É claro que existem alunos autodidatas,
mas esse não é o perfil geral dos alunos.

O que um educador sábio faz é alterar as suas estratégias para que a aula
não caia na monotonia, que faz tantos alunos não se interessarem por ela. Inúmeros
professores reclamam que seus discentes utilizam o celular durante a aula. Porém,
isso, normalmente, acontece quando estão sendo propostas atividades enfadonhas
e repetitivas. As aulas somente expositivas, por exemplo, podem ser um
desestímulo completo para uma criança e para um adolescente.

Poucas pessoas gostam de fazer sempre as mesmas coisas, de ter uma


rotina que não se altera e de realizar tarefas por obrigação, sabendo, às vezes, que
elas pouco farão diferença na vida prática de cada um.

O mesmo acontece no ambiente escolar. Talvez por uma questão de


comodidade ou costume, certos docentes ministram as aulas de uma única forma
59

dia após dia, sem propor atividades que suscitem a curiosidade ou que desafiem os
alunos.

Não há pior quadro do que esse. A esterilidade do universo escolar pode


prejudicar todo o período letivo de um aluno, fazer com que o mesmo perca o gosto
pelo estudo, afaste-se da leitura e deixe de perceber a importância de uma sólida
formação acadêmica.

Muitos discentes tornam-se desmotivados porque têm aula com professores


desmotivados. Encontra-se nesse ponto a importância de se variar as estratégias
usadas ao longo das aulas.

Também é interessante comentar que, em um primeiro momento, é muito


comum culpar os cursos de formação por essa lamentável realidade. Não são
poucos os professores que dizem não propor atividades diferentes a seus alunos
porque não aprenderam nada de inovador enquanto eram alunos dos cursos de
licenciatura.

Entretanto, habitualmente, o que se vê na prática é que as mudanças que


ocorrem na dinâmica da aula de muitos professores não são fruto de uma
apropriação direta de informações transmitidas por meio de cursos, livros ou
revistas.

Marc Weisser, citado por Albuquerque (2006, p. 15), explica essa realidade
dizendo que

os saberes não são o fruto de uma transmissão, mas de uma


apropriação e de uma produção; eles são ligados ao autor
profissional e à sua pessoa. A formação do professor tomará não o
aspecto de uma transferência de conhecimentos
descontextualizados, mas uma reinterpretação de um discurso
pedagógico próprio a cada um dos formados.

Isso significa que cada um reinterpreta, ou pelos menos deveria reinterpretar,


o discurso pedagógico que recebe nos cursos de formação para encontrar a própria
e mais adequada forma de ministrar a sua aula, levando em consideração a
realidade escolar na qual se está inserido. Observa-se, por exemplo, a infraestrutura
60

escolar, as possibilidades de cada aluno, a realidade da região que circunda a


escola e a proposta pedagógica utilizada.

Todos esses fatores influenciam na montagem das atividades a serem


desenvolvidas ao longo do ano letivo. Todavia, a postura do docente tem um papel
de destaque nesse processo na medida em que o professor não deve se conformar
com situações difíceis presentes no ambiente escolar. É muito fácil culpar os cursos
de licenciatura. É mais simples, mais cômodo e menos trabalhoso.

Aliás, às vezes, o contexto é precário porque, justamente, ano após ano, os


professores deixaram de se importar com o cotidiano da escola, não solicitaram
mudanças, manutenção ou compra de equipamentos, afastando-se, assim, dos
alunos. São esses mesmos profissionais que desvalorizam e até mesmo ironizam a
importância da formação continuada.

A utilização de variadas estratégias de ensino conduz a uma aprendizagem


integrada, capaz de estabelecer novos significados sobre o mundo ao mesmo tempo
em que desenvolve habilidades, valores e competências.

O educador consciente da sua tarefa não deve esperar por estratégias


milagrosas. Deve, sim, refletir, discutir com os colegas, criar propostas, desenvolver
projetos e avaliar os resultados.

No caso das aulas de leitura, foco desta pesquisa, o docente não pode, por
exemplo, solicitar uma leitura sempre da mesma maneira. Diversos professores
escolhem um livro, às vezes, até mesmo sem lê-lo, colocam o nome da obra na
lousa e pedem para que os alunos o adquiram o mais rápido possível porque haverá
uma avaliação escrita, frequentemente, com perguntas e respostas rápidas, sobre a
narrativa em questão.

Cansados do mesmo instrumento de avaliação que é usado desde os


primeiros anos da vida escolar quando o objetivo é verificar a leitura de um livro
paradidático, os discentes optam por burlar a proposta, procurando um resumo ou
uma análise da obra na internet. O questionamento que fica, então, é o seguinte:
quem agiu de forma insatisfatória? O professor que aplica sempre a mesma
proposta ou o aluno que não aguenta mais o mesmo tipo de atividade e que não
consegue enxergar outros objetivos com a leitura obrigatória?
61

Ao utilizar tal proposta de trabalho, tão exaustivamente usada pelos


professores, a leitura perde o seu valor. O prazer pelo ato de ler não existe e o aluno
sequer gasta seu tempo folheando algumas páginas:

Os professores, na qualidade de profissionais da educação,


poderiam apelar para o verso de Drummond: “Teus ombros suportam
o mundo.”12 No entanto, seguidamente, se questionam sobre a
natureza de seu ofício, ao interrogarem a si e a seus colegas sobre o
que deve a escola oferecer. Relativamente à leitura, que ocupa a
base do ensino e da qual se espera tanto, a pergunta talvez seja: que
tipo de leitura caberia à escola estimular? (ZILBERMAN & RÖSING,
2009, p.13)

Para maior resultado formativo, recomenda-se ao docente flexibilidade para


mudar o rumo da ação, já que estratégias, por si, têm o caráter de incerteza e
imprevisibilidade, próprios dos processos humanos presentes no cotidiano escolar e
extraescolar.

Foi a partir dessa preocupação com a repetição dos instrumentos de


avaliação que verificam a leitura de um livro paradidático que nasceu a proposta de
trabalho geradora desta pesquisa.

Surgiu, então, a ideia de averiguar a leitura de um livro por meio da reescrita


virtual da obra em questão. Além da mudança de ambiente educacional na medida
em que a proposta ocorrera no laboratório de informática, as mídias digitais foram
usadas a favor no processo de busca pelo prazer durante o ato de ler.

É essa proposta de trabalho que será descrita, passo a passo, no próximo


capítulo.

12
ANDRADE, Carlos Drummond de. Os ombros suportam o mundo. In: _________. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 2002, p. 80.
62

CAPÍTULO 3 - REESCRITA DE OBRAS POR MEIO DE MÍDIAS DIGITAIS:


RELATO DE EXPERIÊNCIA

Não devemos nos equipar com micros por


modismo, sem antes saber se ele pode
modernizar o ensino. Nem devemos recusá-lo com
base em alguma antipatia nostálgica. Finalmente,
não devemos adotá-lo pensando que sairemos
ilesos da aventura e que prosseguiremos com
nossas boas e velhas aulas, com alguns passeios
para ver computadores como se fazem excursões
ao zoológico para ver bichos estranhos.
Cristina Marques

3.1 O COMPUTADOR EM SALA DE AULA

Os computadores foram introduzidos no universo escolar brasileiro,


gradualmente, a partir da década de 1980 e, desde o início da sua utilização, há
constantes discussões sobre a sua eficácia para o processo ensino-aprendizagem,
principalmente pela ausência, sobretudo no Brasil, de relatos de experiências e
estudos que possam subsidiar posicionamentos mais concretos sobre o tema em
questão.

Em 1997, o governo federal, em uma ação conjunta com o Ministério da


Educação (MEC), criou o Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo).
Inicialmente, o projeto previa, em apenas dois anos, a aquisição de mais de 100 mil
computadores para as escolas públicas da Educação Básica e se propunha a

melhorar a qualidade do processo de ensino-aprendizagem, criando


o que chamava de nova ecologia cognitiva nos ambientes escolares
mediante incorporação adequada das novas tecnologias da
informação pelas escolas [...], propiciando uma educação voltada
para o desenvolvimento científico e tecnológico, educando para uma
63

cidadania global em uma sociedade tecnologicamente desenvolvida.


(OLIVEIRA, 2006, p. 20)

O objetivo era usar o computador como uma ferramenta de investigação, de


construção, de divulgação e de produção de conhecimento. Todavia, após os dois
anos previstos, apenas metade das máquinas havia sido instalada.

Além disso, não se pode ignorar o fato da rede particular apresentar, grosso
modo, uma infraestrutura completamente diferente do que se encontra na rede
pública. Enquanto a maior parte das escolas da rede privada possui laboratórios de
informática, o mesmo ainda não acontece nas escolas do governo. Faz-se
necessário ressaltar também que a capital do estado de São Paulo, onde ocorreram
as propostas de trabalho que deram origem a esta pesquisa, infelizmente, não
reflete o real contexto educacional brasileiro.

Contudo, apesar dessas discrepâncias, é cada vez mais evidente que muitos
pais escolhem a escola de seus filhos levando-se em consideração se a instituição
oferece uma gama de recursos tecnológicos aos discentes. Várias escolas ressaltam
em suas propagandas os seus laboratórios de informática de última geração como
um diferencial no mercado. Todavia, a mera oferta de ferramentas tecnológicas não
garante a real utilidade desses recursos ao longo do processo de desenvolvimento
social, motor, psicológico e cognitivo do aluno.

Por outro lado, há os profissionais que se negam a utilizar computadores em


sala de aula, alegando achar inadmissível que a máquina substitua o papel do
professor. Entretanto, de acordo com as ideias de Pierre Lévy (1998, p. 29), a
inserção da linguagem dos computadores na vida cotidiana dos alunos e,
consequentemente, no universo escolar é inevitável:

As crianças aprenderão a ler e escrever com máquinas editoras de


texto. Saberão servir-se dos computadores como ferramentas para
produzir sons e imagens. Gerirão seus recursos audiovisuais com o
computador, pilotarão robôs, consultarão familiarmente os bancos de
dados. Todas as evoluções que se estão esboçando na área
educacional estão em congruência com as modificações das
atividades cognitivas observadas em outras áreas. O uso dos
computadores no ensino prepara para uma nova cultura
informatizada.
64

Outros docentes chegam, até mesmo, a dizer que não entendem como um
computador pode ser mais interessante e atrair mais a atenção dos educandos do
que o próprio professor. Valdemar W. Setzer (2005, p. 114) explica que se o
computador

atrai mais a atenção dos estudantes do que um professor, isso pode


significar que este não tem uma ideia adequada do que vem a ser
uma criança ou um jovem, ou está atrelado a um currículo, método e
ambiente que contradizem as qualidades de seus alunos.
Provavelmente suas aulas são demasiadamente abstratas, dirigidas
para o intelecto dos alunos, e não para os seres completos deles.
Assim, os alunos não conseguem identificar-se com o conteúdo
sendo transmitido, sentindo-se oprimidos e achando que as aulas
são monótonas.

Na verdade, na Educação Básica, nem os professores serão substituídos por


computadores nem os computadores são, ou serão, mais atraentes do que os bons
educadores. Demo (2006, p. 86) torna essas afirmações muito evidentes ao dizer
que:

Quem aprender é o ser humano, não a máquina. Quem é interativo é


o ser humano, não o software. [...] Pode ser que esta maneira de
colocar ignore potencialidades vertiginosas das máquinas, que até o
momento não alcanço observar. Vejo as máquinas como ferramentas
extremamente úteis, mas não percebo nelas o traço humano de
inteligência. O computador ultrapassa o poder da mente humana em
várias dimensões, como processar e armazenar informação, calcular,
sem falar na velocidade crescente de seu funcionamento, mas tudo
isso não consegue, pelo menos ainda, sequer simular o que uma
máquina hermenêutica, interpretativa, semântica, complexa e não-
linear faz, como é o cérebro humano.

O foco dessa questão, de fato, centra-se na dinâmica da aula preparada pelo


docente e na postura do mesmo durante as atividades realizadas ao longo do ano
letivo.

Partindo de uma fórmula equivocada, alguns professores levam seus


discentes aos laboratórios de informática e deixam-nos livremente navegando na
internet. Durante esse tipo de aula, por exemplo, não é difícil ouvir alunos
questionando o que eles devem fazer, qual site devem investigar:
65

Apesar da falta de resultados positivos, os professores encaram o


computador como a ferramenta que finalmente pode levar os alunos
a estudar. Nesses casos, o computador é visto como um adoçante
artificial, transformando aquilo que é hoje o remédio amargo da
aprendizagem escolar em algo palatável para crianças que
cresceram nas calorias vazias da TV. [...] Usar o computador como
adoçante educacional é uma desonestidade pedagógica,
introduzindo um aditivo prejudicial na dieta educacional, que muitas
vezes se acaba tornando um vício. (SETZER, 2005, p. 113)

Docentes malformados, pouco informados, sem nenhum entusiasmo e com


falta de amor pelos alunos usam ferramentas tecnológicas sem nenhum propósito
evidente. José Moran (2000, p. 22) expõe que

há uma expectativa de que as novas tecnologias nos trarão soluções


rápidas para o ensino. Sem dúvida as tecnologias nos permitem
ampliar o conceito de aula, de espaço e tempo, de comunicação
audiovisual, e estabelecer pontes novas entre o presencial e o virtual,
entre o estar juntos e o estarmos conectados a distância. Mas se
ensinar dependesse só de tecnologias já teríamos achado as
melhores soluções há muito tempo. Elas são importantes, mas não
resolvem as questões de fundo. Ensinar e aprender são os desafios
maiores que enfrentamos em todas as épocas e particularmente
agora em que estamos pressionados pela transição do modelo de
gestão industrial para o da informação e do conhecimento.

O computador não é um recurso milagroso. Ele não é a solução para todos os


atuais problemas da educação que ainda se mostra profundamente tradicional e, até
certo ponto, cansativa e maçante. Sem objetivos claros para a sua utilização, ele
acaba atuando como outras ferramentas que parecem só maquiar o contexto
educacional para que as escolas promovam-se como modernas:

Apelar para o computador em busca de socorro porque ele pode


processar abstrações de maneira suave e atrativa, mostrando uma
paciência infinita, obedecendo cegamente aos comandos que se lhe
dão, e não dar notas baixas é simplesmente uma questão de achar
uma forma mais sedutora de ensinar da maneira errada tradicional.
(idem, ibidem, p. 114)

Se a aula é extremamente “chata” e desgastante, o computador - ou qualquer


outra ferramenta, se bem utilizada - será, sim, mais motivadora. Assim sendo, para
66

que a máquina seja empregada da melhor forma possível em sala de aula, faz-se
necessário, antes de mais nada, que o docente prepare-se, organize-se e justifique
o seu uso ao longo de qualquer atividade.

Nesse contexto, também é indispensável que as tecnologias realmente


estejam à disposição do corpo docente das escolas públicas e privadas:

Resta sempre outro desafio também preocupante, que é o acesso


aos meios eletrônicos, em particular em localidades distantes e
menos desenvolvidas. As secretarias de educação municipais e
estaduais precisariam ocupar-se disso, no sentido de garantir tal
acesso minimamente, como regra sob a perspectiva coletiva (lugar
ou lugares coletivos de acesso). Uma “casa do professor” onde ele
possa trabalhar com a Internet, entre outras atividades
reconstrutivas, poderia ser ideia apropriada. [...] Seria fundamental
retirar o contra-argumento do professor de que não tem chance, não
tem livro, não têm Internet. (DEMO, 2006, p. 122)

É importante lembrar que a sociedade moderna torna-se altamente centrada e


dependente de máquinas que estão presentes em muitas atividades humanas
rotineiras. Setzer (2005, p. 88) expõe que:

De fato, não se encontra um automóvel ou uma máquina de lavar


roupa dentro de um escritório, de um dormitório ou entre as
máquinas de uma fábrica. No entanto, pode-se muito bem encontrar
computadores nesses locais. Devido a esse uso universal, cada vez
mais crescente, é necessário ensinar tanto o que eles são como a
usá-los em aplicações de utilidade geral, mostrar como podem ser
bem e mal empregados.

Seria de grande proveito se a maioria dos alunos adquirisse, ao longo dos


Ensinos Fundamental e Médio, conhecimentos básicos sobre a estrutura e o
funcionamento das máquinas, bem como formasse um posicionamento reflexivo
sobre seus benefícios e malefícios. Os discentes chegariam, então, à conclusão de
que o computador deveria representar apenas um instrumento de trabalho, usado a
favor de ser humano e, talvez, esse espírito crítico em relação aos computadores
impediria que tantos jovens permanecessem ligados à máquina durante a tarde
toda, por exemplo. Ou então, mostraria também o perigo da internet ser usada como
um livro aberto sobre a vida e o dia a dia de cada um.
67

A fim de que os educandos realmente atingissem uma postura crítica em


relação ao computador, o professor deveria criar dinâmicas, durante o cotidiano
escolar, que se fizessem úteis para o desenvolvimento dos mesmos. A grande
questão que se coloca consiste em determinar de que maneira os computadores
devem ser empregados.

Se os discentes gostam tanto da linguagem do computador e apreciam tanto


a máquina, o educador pode trazê-la para as aulas de produção de texto como uma
ferramenta motivadora ao longo de atividades previamente planejadas:

O trabalho de produção de textos no computador deve levar em


conta todas as possibilidades de interação com imagens e símbolos,
penetrando em um novo universo de criação e estruturando o
aparecimento de novos gêneros ligados à interatividade. [...] O texto
é posto em movimento, envolvido em um fluxo, vetorizado,
metamórfico. (LÉVY, 1996, p. 48)

O ensino não se faz apenas por meio dos instrumentos tecnológicos, mas,
hoje, é inegável que eles sejam ferramentas de extrema relevância no processo de
ensino-aprendizagem de jovens que habitam um mundo que se torna, diariamente,
mais informatizado, interativo, midiatizado e virtual.
Freire (2009, p. 87), há anos, tendo em vista as características da educação
do Brasil, já ditava: “Não tenho dúvida nenhuma do enorme potencial de estímulos e
desafios à curiosidade que a tecnologia põe a serviço das crianças e dos
adolescentes”.
Não se trata, assim, de um aprendizado individual que se concentra, única e
exclusivamente, na livre navegação em sites e na coleta de informações na internet.
Durante a criação dos textos, há trocas entre professor e aluno e entre os próprios
alunos.

E se as produções forem postadas na internet, a proposta ganha ainda mais


relevância na medida em que os alunos abandonam a velha ideia de que os textos
só serão lidos pelo professor:

Na situação escolar existem relações muito rígidas e bem definidas.


O aluno é obrigado a escrever dentro de padrões previamente
estipulados e, além disso, o seu texto será julgado, avaliado. O
68

professor, a quem o texto é remetido, será o principal – talvez o único


– leitor da redação. Consciente disso, o estudante procurará escrever
a partir do que acredita que o professor gostará (e,
consequentemente, dará uma boa nota). Mais precisamente, fará a
redação com base na imagem que cria do “gosto” e da visão de
língua do professor. (BRITO, 1999, p. 120)

Os textos deixam de ser feitos só para a atribuição de uma nota e ganham um


caráter público. Todos os colegas podem ver o que os outros escrevem. A
responsabilidade sobre o ato da escrita aumenta, assim como amplia-se também a
responsabilidade do professor que deve orientar todas as etapas da produção
textual.

Vê-se, portanto, que embora as máquinas propiciem um ambiente de


aprendizado mais livre, no qual o ritmo individual de aprendizado é mais respeitado,
o papel do professor como mediador, como guia, continua sendo fundamental.

O educador deve criar roteiros de trabalhos, contendo combinados,


cronogramas, explicações e diretrizes para a plena concretização de uma proposta.
Além disso, os critérios de avaliação do que for produzido também devem ser
previamente criados e expostos aos educandos.

Só a partir de uma sólida e bem organizada proposta, é que trabalhos com os


computadores em sala de aula podem atingir êxito. As duas propostas de trabalhos,
que serão descritas a seguir, partiram desses pressupostos.

3.2 PREPARAÇÃO DAS PROPOSTAS DE TRABALHO

Na escola, as metodologias ineficazes das aulas de leitura, a própria


obrigação do ato de ler, a carência de trabalhos interdisciplinares nascidos a partir
de propostas de leitura, a escassez de diálogo entre o texto literário e outras formas
textuais e as cobranças inadequadas das devolutivas dos livros lidos levam os
alunos ao caminho do desprazer frente à leitura, tão importante na construção do
cidadão engajado com seu cronotopo.
69

Ciente dessa problemática, pretendeu-se, com base na realização de


propostas de trabalho com livros paradidáticos que realmente fossem motivadoras
para os alunos, criar projetos de reescrita de obras literárias a serem executados no
laboratório de informática.

O objetivo maior era fazer com que os alunos adquirissem o gosto pelo hábito
da leitura não por causa da reescrita digital ou por causa da utilização do
computador, mas sim pela leitura em si.

É por esse motivo que se faz necessário explicar que em nenhum momento o
projeto buscou valorizar apenas o ambiente virtual que hoje oferece, facilmente, a
leitura de obras literárias. Na realidade, a meta era tentar mostrar ao aluno que a
leitura, realizada por meio de um livro, poderia ser divertida e poderia suscitar a
imaginação de uma forma muito prazerosa. E mais: mostrar que ler na tela do
computador é diferente de ler um livro:

Os gestos mudam segundo os tempos e lugares, os objetos lidos e


as razões de ler. Novas atitudes são inventadas, outras se
extinguem. Do rolo antigo ao códex medieval, do livro impresso ao
texto eletrônico, várias rupturas maiores dividem a longa história das
maneiras de ler. Elas colocam em jogo a relação entre o corpo e o
livro, os possíveis usos da escrita e as categorias intelectuais que
asseguram sua compreensão. (CHARTIER, 1998, p. 77)

Muitos alunos, atualmente, leem obras diretamente na tela do computador e


pouco conhecem a profunda relação que pode existir entre o leitor e o livro. Esses
mesmos alunos, frequentemente, também não analisam a nova postura que se tem
ao fazer a leitura diretamente na tela do computador:

Aquele que escreve na era da pena, de pato ou não, produz uma


grafia diretamente ligada a seus gestos corporais. Com o
computador, a mediação do teclado, que já existia com a máquina de
escrever, mas que se amplia, instaura um afastamento entre o autor
e seu texto. A nova posição de leitura, entendida num sentido
puramente físico e corporal ou num sentido intelectual, é
radicalmente original: ela junta, e de um modo que ainda se deveria
estudar, técnicas, posturas, possibilidades que, na longa história da
transmissão do escrito, permaneciam separadas. (idem, ibidem, p.
16)
70

Ao tratar desse fenômeno, Chartier (1998, p. 70) explica, com muita clareza,
que “a obra não é jamais a mesma quando inscrita em formas distintas. Ela carrega,
a cada vez, um outro significado” e completa esse raciocínio explanando que

todo leitor diante de uma obra a recebe em um momento, uma


circunstância, uma forma específica e, mesmo quando não tem
consciência disso, o investimento afetivo ou intelectual que ele nela
deposita está ligado a este objeto e a esta circunstância. Vemos
portanto que, de um lado, há um processo de desmaterialização que
cria uma categoria abstrata de valor e validade transcendentes, e
que, de outro, há múltiplas experiências que são diretamente ligadas
à situação do leitor e ao objeto no qual o texto é lido.

Encontra-se nesse ponto, então, a importância do professor exercer a função


múltipla de guia, de facilitador, de instrutor ao longo dos trabalhos realizados nessa
tentativa de fazer nascer nos alunos o gosto pela leitura. Quando a leitura é dirigida,
o docente torna o trabalho mais significativo para o aluno. Esse é o papel do
verdadeiro educador:

Educar [...] é um ato consciente e intencional e abrange a etapa do


instruir, ultrapassando-a. Transmitir conhecimentos técnicos e
científicos sem contextualizá-los na vida prática da sociedade real,
onde cada aluno irá atuar, é, no mínimo, atitude irresponsável e,
portanto, inadmissível ao verdadeiro educador. (VASCONCELOS,
1996, p. 48)

Foi a partir de todos esses referenciais que a proposta aqui relatada ocorreu.
As experiências deram-se na cidade de São Paulo, maior centro educacional e
econômico do país. A escola, onde nasceu e concretizou-se o projeto, localiza-se na
região central da cidade e os bairros que a circundam, paradoxalmente, são
compostos por população das classes A, B, C e D.

Os alunos recebidos nessa instituição de ensino, que abrange da Educação


Infantil à Pós-Graduação Strictu Sensu, também pertencem a classes sociais
díspares, em função de bolsas de ensino governamentais e institucionais. Dentre os
alunos da Educação Básica, protagonistas do processo, muitos não possuem em
suas casas computadores pessoais e, consequentemente, acesso à internet.
71

Inicialmente, e muito antes da proposta ser exposta aos alunos, o projeto,


desenvolvido no Ensino Fundamental II, iniciou-se com a escolha dos livros que
melhor atenderiam às necessidades educacionais do 9º ano.

A seleção foi feita pela professora que ministrava aulas para as turmas que
executariam a proposta e deu-se a partir da ideia de se estabelecer relação com
conteúdos desenvolvidos nas outras disciplinas da série. Portanto, desde o início do
projeto, um enfoque interdisciplinar fez parte do trabalho. Segundo Ivani Fazenda
(1979, p. 08), a interdisciplinaridade

é a substituição de uma concepção fragmentária para unitária do ser


humano. É uma atitude de abertura, não preconceituosa, onde todo o
conhecimento é igualmente importante. Pressupõe o anonimato,
pois, o conhecimento pessoal anula-se frente ao saber universal. É
uma atitude coerente, que supõe uma postura única frente aos fatos,
é uma opinião crítica do outro que fundamenta-se na opinião
particular. Somente na intersubjetividade, num regime de
copropriedade, de interação, é possível o diálogo, única condição de
possibilidade da interdisciplinaridade. [...] neste sentido tornando-se
particularmente necessária uma formação adequada que
pressuponha um treino na arte de entender e esperar, um
desenvolvimento no sentido da criação e da imaginação.

Então, a partir desse ideal interdisciplinar, no primeiro ano em que o projeto


ocorreu, 2007, foi escolhido o livro Um certo capitão Rodrigo, de Erico Verissimo,
autor expoente da segunda geração do Modernismo brasileiro. A proposta, além da
disciplina Língua Portuguesa, envolveu a disciplina História, na medida em que a
obra trata da Revolução Farroupilha, uma sangrenta guerra civil que dividiu o sul do
Brasil, mais especificamente o Estado do Rio Grande do Sul, dividindo as famílias e
contrapondo irmão contra irmão.

É importante salientar também que seria muito enriquecedor se a disciplina


Artes, assim como outras, pudesse fazer parte do projeto. Entretanto, na ocasião, tal
integração não pôde acontecer porque a disciplina Artes, embora tivesse o nome
que, supostamente, levaria ao desenvolvimento da palavra arte em seu sentido
pleno, limitava-se apenas, dentro do projeto pedagógico do colégio em questão, ao
desenvolvimento de conceitos da área da geometria.
72

Talvez, se a disciplina Artes estivesse presente ao longo do projeto, além do


trabalho com a literatura e com a parte histórica da narrativa da obra escolhida, os
professores pudessem tratar da cultura visual na medida em que a escolha de
imagens poderia ter feito parte do projeto de reescrita do livro selecionado pela
docente.

Assim, o projeto contemplaria a chamada alfabetização visual - termo


cunhado por Donis A. Dondis e largamente trabalhado em Sintaxe da Linguagem
Visual (2007) - ao analisar com maior riqueza, por meio das linhas, das formas, das
cores, das luzes, das texturas por exemplo, as imagens usadas pelos alunos ao
longo do trabalho.

Guimarães (2010, p. 42) explica a importância desse estudo no universo


escolar:

Constata-se a necessidade do alfabetismo visual, já que as


consequências da leitura [...] dependerão de vários fatores, como
cultural, o psicológico, o social, o filosófico, além de experiências
anteriores que o observador possua e busque para o momento da
experiência. Não há, por conseguinte, como não entrar na questão
educacional, tendo em vista que o sujeito-receptor vive em uma
sociedade em que a linguagem midiática destrói, constrói e
reconstrói identidades, muitas vezes, não permitindo uma reflexão
sobre o que consome.

Nesse mesmo contexto que envolve o trabalho com a cultura visual, Fernando
Hernández (2000) considera necessário que os educadores levem em consideração
os objetos da cultura visual dos discentes, observando, ainda, os fatores histórico-
antropológico, estético-artístico, biográfico e crítico-social.

Mais uma vez, torna-se indispensável o papel do docente como facilitador


nesse processo de construção de conhecimentos. Segundo Guimarães (2001, p.
75),

Modernamente, o mundo é pavimentado de imagens. São tantos os


dizeres, compreensíveis ou não, legíveis ou não, ainda assim
legitimados, os quais rezam o cotidiano.
73

Em virtude desse fato, é que se clama o aprendizado, a análise


consciente do texto imagético, não obstante o deleite da arte e, pela
arte [...].
Para tanto, necessita-se de um leitor sensível, hábil e
instrumentalizado. Um leitor que prospere diante do texto imagético,
que adentre às camadas deste, dialogue com as mesmas e com o
que as sustenta para retornar em expansão à superfície.

No ano seguinte, a obra escolhida foi O Médico e o Monstro, do romancista


escocês Robert Louis Stevenson. Além de ser um clássico de mistério e suspense, o
livro possibilitou um trabalho interdisciplinar entre as disciplinas Língua Portuguesa,
Ciências e Ética. O objetivo era criar um projeto que realmente envolvesse os
alunos, transformando-os em protagonistas ao longo do trabalho:

Uma educação que abraça a interdisciplinaridade navega entre


dois pólos: a imobilidade total e o caos. A percepção da
importância do passado como gestor de novas épocas nos faz
exercer paradoxalmente o imperativo de novas ordens,
impelindo-nos à metamorfose de um saber mais livre, mais
nosso, mais próprio e mais feliz, potencialmente propulsor de
novos rumos e fatos. O processo interdisciplinar desempenha
um papel decisivo no sentido de dar corpo ao sonho de fundar
uma obra de educação à luz da sabedoria, da coragem e da
humanidade. (FAZENDA, 1998, p. 08)

Nesse contexto interdisciplinar, além da leitura e da reescrita literária digital, o


livro promoveu reflexões sobre a ética na Medicina, tão presente, hoje, nos meios de
comunicação, devido às descobertas que envolvem a bioética.

Após a escolha das obras, o passo seguinte dava-se com a apresentação das
obras aos alunos.

No primeiro dia em que o projeto iniciava-se, era solicitado que os educandos


obtivessem, por meio de uma pesquisa e utilizando o recurso que mais os
agradasse, informações sobre o autor do livro escolhido.

Uma semana depois, eram ouvidas, por todos os alunos da turma, as


informações coletadas previamente pelos discentes. A seguir, a professora de
Língua Portuguesa fazia comentários complementares, quando achava pertinente, e
expunha o contexto em que o livro fora escrito. Na sequência, o primeiro capítulo do
74

livro escolhido era lido e interpretado, pela docente, em sala de aula. Ocorria, assim,
uma leitura coletiva e reflexiva, prática libertadora na visão de Zilberman (2009, p.
27): “[...] seja no âmbito coletivo, seja no plano individual, a conquista da habilidade
de ler é simultaneamente o primeiro passo na direção da liberdade, de uma parte e
de outra, para a assimilação dos valores da sociedade”.

Depois dessa leitura, os alunos expunham suas sensações e, quando tinham


dúvidas sobre a obra ou sobre o conteúdo da mesma, colocavam suas questões.
Essa etapa de sensibilização é, sempre, imprescindível, pois abre espaço para o
diálogo entre professor e alunos e entre os próprios alunos. Percorrendo o objetivo
do projeto, lembra-se que:

Ao ler, estou abrindo uma porta entre meu mundo e o mundo do


outro. O sentido do texto só se completa quando esse trânsito se
efetiva, quando se faz a passagem de sentidos entre um e outro. Se
acredito que o mundo está absolutamente completo e nada mais
pode ser dito, a leitura não faz sentido para mim. É preciso estar
aberto à multiplicidade do mundo e à capacidade da palavra de dizê-
lo para que a atividade de leitura seja significativa. (COSSON, 2009,
p. 27)

Por fim, finalizada essa primeira etapa, os discentes eram convidados a dar
continuidade à leitura em casa, observando que durante todo o processo do ato de
ler, tinham o suporte da professora.

A verificação da leitura dos livros ocorreu no Laboratório de Informática da


Instituição de Ensino, sendo que todos os educandos eram informados a respeito
dessa questão que os levaria à reescrita da obra selecionada. Nessa ocasião, os
alunos recebiam uma cópia do projeto, juntamente com um cronograma.

A seguir, o material ofertado aos alunos:


75

Figura 1 – Primeira página do material entregue aos alunos no início do projeto


76

Figura 2 – Segunda página do material entregue aos alunos no início do projeto


77

O cronograma foi de grande serventia na medida em que os alunos não


tinham de ler o livro todo de uma só vez, mas percebiam a necessidade da leitura
prévia para a execução da proposta.

Duas semanas depois, os educandos eram encaminhados ao Laboratório de


Informática e iniciava-se a proposta de reescrita. Na primeira aula, a professora de
Língua Portuguesa explicava todos os recursos das ferramentas tecnológicas e
comunicacionais que seriam utilizados.

Para a concretização da proposta do livro Um certo capitão Rodrigo, foi usado


o software gratuito HagáQuê da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),
referência no contexto educacional universitário, que é disponibilizado no site
daquela Instituição de Ensino Superior.

O HagáQuê é um editor de histórias em quadrinhos que oferta prévias


estruturas de design, mas que, também, permite que o aluno busque na web
imagens e planos de fundo e importe-os para o software.

Como nem todos os alunos tinham muita familiaridade com o computador e a


maioria não estava habituada a realizar propostas de produção de texto no
laboratório, optou-se, inicialmente, por um recurso de fácil manuseio. Até mesmo o
layout do software ajuda em sua utilização, assemelhando-se muito ao Paint:
78

Figura 3 – Tela inicial do software Hagáquê

Semanalmente, os discentes dirigiam-se ao laboratório de informática e,


baseando-se na leitura prévia feita em casa, reescreviam as histórias, utilizando-se
de trechos narrativos e de textos em discurso direto. As imagens de fundo dos
quadrinhos eram retiradas de sites e os personagens eram confeccionados pelos
próprios alunos.

Por motivos que serão expostos mais adiante, no ano seguinte de execução
do projeto, foi escolhido o programa PowerPoint do pacote Office da empresa
Microsoft Corporation em vez do software Hagáquê e a temática do trabalho também
mudou já que o livro escolhido foi O Médico e o Monstro.

Porém, a preparação era a mesma: pesquisa sobre o autor, discussão em


sala sobre os dados coletados, contextualização histórica da obra, leitura do primeiro
capítulo em sala e em voz alta e sensibilização. Só depois de todas essas etapas,
ocorria a entrada no laboratório.
79

3.3 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E O SOFTWARE HAGÁQUÊ

No primeiro ano em que o projeto ocorreu, tudo foi pensado com grande
cuidado. Como os alunos não tinham o hábito de realizar tarefas no laboratório de
informática, era importante que a proposta fosse satisfatória para que outros
trabalhos também pudessem surgir nesse ambiente. Talvez, por esse motivo, as
etapas anteriores à entrada no laboratório tenham sido tão intensamente pensadas e
colocadas em prática com tanta cautela.

A partir do estímulo inicial e com a possibilidade da reescrita das obras por


meio de ferramentas tecnológicas de fácil utilização e, ainda, valendo-se da
liberdade de criação, os alunos sentiram-se instigados a ler os livros e,
posteriormente, comporem suas novas histórias.

Inicialmente, o Hagáquê oferece uma estrutura padrão que permite a


confecção de vinte e quatro quadrinhos, divididos em três páginas – oito em cada
página. Segue a seguir um exemplo, a partir de trabalho realizado por alunos:
80

Figura 4 – Primeira página do trabalho dos alunos Thiago Matheus Ferreira (13 anos) e Caio César
Mota (14 anos)
81

Figura 5 – Segunda página do trabalho dos alunos Thiago Matheus Ferreira e Caio César Mota
82

Figura 6 – Parte final do trabalho dos alunos Thiago Matheus Ferreira e Caio César Mota
83

Observa-se que tanto a parte verbal quanto a não verbal foram exploradas
com riqueza pelos discentes que ora reescreviam a própria recriação ora
procuravam o melhor plano de fundo, que estava ao seu alcance, para ilustrar as
cenas.

Nesse momento, foi importante a preocupação com a alfabetização visual,


pois nem todos os alunos escolhiam as imagens a serem utilizadas certos dos
motivos da escolha. Foi comum, portanto, durante a aula, reflexões com a
professora sobre o uso de uma ou outra imagem, de um ou outro plano de fundo.

Raramente, entretanto, os educandos utilizavam a primeira imagem que era


encontrada na internet e, em nenhum momento, eles demonstravam-se temerosos
com o processo de recriação.

Nesse sentido, o computador parece auxiliar mais o ato da reescrita. O lápis,


o papel e a borracha são menos compatíveis com a geração virtual de jovens de
hoje. Os botões backspace e delete possibilitam a reescrita sem fazer críticas aos
alunos e sem deixar marcas na produção.

Embora na primeira semana nem todos tivessem lido as páginas solicitadas,


na segunda semana, quase todos estavam com a leitura feita, pois percebiam que o
processo de criação seria inviabilizado pela não leitura dos capítulos agendados
para a semana seguinte. Se os alunos não lessem, como produziriam suas
reescritas?

Diante do entusiasmo dos colegas que na primeira semana já tinham lido o


que fora solicitado e que iniciaram as suas reescritas com criatividade e
originalidade, os outros se sentiram motivados a lerem também.

Manguel (1997, p. 54) explique que “ler, então, não é um processo automático
de capturar um texto como um papel fotossensível captura a luz, mas um processo
de reconstrução desconcertante, labiríntico, comum e, contudo, pessoal”. E foi
exatamente um processo de reconstrução que ocorreu ao longo das aulas.

A possibilidade de recriação, com os instrumentos de tecnologia da


informação e, também, com o acesso irrestrito às mídias de interesse dos alunos,
garantiu uma leitura eficaz e significativa das obras:
84

A criação artística deflagrada por procedimentos didáticos cria uma


tensão que estabelece ou rompe limites, possibilitando ao sujeito
produzir conhecimento sobre o objeto. Ao criar, o sujeito põe em
evidência a estrutura de valores e significados subjacentes aos
processos desenrolados na sala de aula. [...] Há, na criação artística
do aluno, uma tentativa de corresponder ao que foi pedido, mas
também de revelar a si mesmo. Na criação há uma marca pessoal.
(PEREIRA, 2010, p. 12)

Além disso, os grupos empolgavam-se a cada semana. Envolveram-se tanto


que alguns alunos chegaram a ultrapassar a quantidade inicial de quadrinhos
oferecida pelo Hagáquê (vinte e quatro quadrinhos) e abriam uma segunda
sequência de quadros para fazer uma reescrita mais completa, segundo os próprios
alunos.

Foi comum, também, perceber a indignação de alguns no momento de reduzir


as partes da narrativa durante a criação da história em quadrinhos. Certos alunos
diziam que a reescrita, dependendo de como fosse feita, alteraria o sentido original
da história ou reduziria sua importância. Alguns educandos afirmavam, ainda, que as
histórias em quadrinhos, de forma geral, resumiam muito o texto original. Tal
conclusão mostra que os discentes foram além da leitura do texto, chegando a um
patamar maior: ao da análise das suas próprias produções.

Outro fato interessante é que o Hagáquê possibilita a criação de balões de


fala ou de pensamento, como se observa nos exemplos abaixo:

Figura 7 – 4º quadrinho do trabalho das alunas Mariana Marques Silva (14 anos) e Flávia Oliveira de
Andrade (13 anos)
85

Figura 8 – 9º quadrinho do trabalho das alunas Amanda Ferreira Goulart (14 anos) e Bianca Costa
(13 anos)

Figura 9 – 35º quadrinho do trabalho das alunas Mariana Marques Silva e Flávia Oliveira de Andrade

Porém, embora esse recurso fosse muito importante para a prática da


reescrita, quando os alunos queriam utilizar o discurso direto, ao longo das aulas,
era frequente ouvir deles a informação de que os balões não permitiam falas um
pouco mais extensas. Vários discentes também reclamavam do tamanho, muito
pequeno, da letra dentro dos balões.

Foi muito interessante perceber que os discentes começaram a observar


como partes importantes da narrativa podem se perder em função da reescrita de
uma obra, em função do recurso escolhido para se recriar um texto. Alguns alunos
chegaram até mesmo a afirmar que agora entendiam porque, nas adaptações
cinematográficas, muitas vezes, vários trechos eram subtraídos em relação à obra
original.
86

Apesar da limitação que envolvia o espaço para a criação e recriação de


textos no Hagáquê, isso não desestimulou os discentes. Para solucionar o problema,
eles resolveram, então, utilizar mais a narração do que os balões. Essa limitação
justificou a mudança, no ano seguinte, da ferramenta usada para a recriação das
obras, como será, posteriormente relatado. Em vez do Hagáquê, o trabalho passou
a ocorrer no PowerPoint.

A passagem para o PowerPoint, além de aumentar a possibilidade da escrita


verbal, ampliou também, em função de seus inúmeros recursos, tais como
animação, inserção de sons e efeito de transição entre slides, a possibilidade de
reflexão e de escrita das imagens e dos sons, prática, como já destacada
anteriormente, parca no Ensino Fundamental.

Por fim, os trabalhos eram expostos durante as duas últimas aulas do projeto
no projetor multimídia para que os alunos acompanhassem também a produção dos
colegas. Na sequência, as criações eram publicadas na internet.

Essa etapa do projeto envolvia grande euforia por parte dos alunos, pois eles
diziam-se satisfeitos com a possibilidade de mostrar para pais e amigos suas
produções. O trabalho deixara, dessa forma, de ser escrito apenas para funcionar
como um instrumento de avaliação para o professor. Temos aí um ponto fortemente
positivo para a utilização da internet como forma de valorizar as produções dos
alunos. Os educandos, ainda, sentiam-se realizados quando viam seus trabalhos
postados no site oficial da escola.

3.4 REESCRITA ANIMADA

Reflexões advindas das queixas dos alunos sobre a impossibilidade de


utilização plena dos balões de fala motivaram a mudança de ambiente virtual para a
realização da proposta de trabalho que envolvia as reescritas.

Repensada a prática docente, o projeto passou, então, a ser realizado no


PowerPoint, programa que permite a criação e exibição de apresentações de temas
87

múltiplos, possibilitando a inserção de imagens, sons e textos que podem ser


animados de diferentes maneiras.

Se antes, por meio do Hagáquê, o clima lúdico dominava o ambiente de


aprendizagem, o PowerPoint incrementou ainda mais a proposta de trabalho, pois a
reescrita deixou de ser estática e passou a ser animada.

Os alunos entusiasmaram-se ainda mais e não estavam satisfeitos com as


imagens prontas da internet. A partir disso, começaram a criar as personagens,
utilizando sites que tornavam possível a montagem de bonecos, trocavam os
bonecos entre os colegas, introduziam efeitos entre as cenas e entre os diálogos
ocorridos entre as personagens e buscavam sempre o melhor plano de fundo para
ilustrar as suas cenas.

Seguem alguns slides de um dos trabalhos realizados no segundo ano de


confecção desta proposta de trabalho, produzidos pelos alunos Rafael Correia Laxer
(14 anos) e Victor Camillo Palandi (14 anos):

Figura 10 – Capa da reescrita animada


88

13
Figura 11 – Slide de apresentação das personagens montadas pelos próprios alunos

Figura 12 – 6º slide – Início da conversa entre as personagens que iniciam a narrativa do livro O
Médico e o Monstro – 1ª parte

13
Os educandos usaram o site http://www.toondoo.com para a criação das personagens.
89

Figura 13 – 6º slide – Continuação da conversa entre as personagens que iniciam a narrativa do livro
O Médico e o Monstro – 2ª parte

Figura 14 – 6º slide – Continuação da conversa entre as personagens que iniciam a narrativa do livro
O Médico e o Monstro – 3ª parte
90

Figura 15 – 6º slide – Continuação da conversa entre as personagens que iniciam a narrativa do livro
O Médico e o Monstro – 4ª parte

Figura 16 – 7º slide – Narração da cena que gera a conversa inicial exposta no primeiro capítulo da
obra O Médico e o Monstro – 1ª parte
91

Figura 17 – 7º slide – Narração da cena que gera a conversa inicial exposta no primeiro capítulo da
obra O Médico e o Monstro – 2ª parte

Figura 18 – 7º slide – Narração da cena que gera a conversa inicial exposta no primeiro capítulo da
obra O Médico e o Monstro – 3ª parte
92

Figura 19 – 7º slide – Narração da cena que gera a conversa inicial exposta no primeiro capítulo da
obra O Médico e o Monstro – 4ª parte

A qualidade das produções, tendo em vista a faixa etária dos alunos de 13 ou


14 anos e seu conhecimento de informática, foi inquestionável. A cada aula, os
alunos queriam melhorar o que tinham produzido na aula anterior e produzir mais
para poderem exercitar sua criatividade, demonstrando que seguiam envolvidos pelo
projeto mesmo terminada a aula.

Além disso, a troca de informações entre eles era fantástica. Se alguém


descobria um jeito para melhor demonstrar o que acontecia na cena original do livro,
essa pessoa era solicitada para ensinar a descoberta à turma.

Buscando o apoio teórico de Chartier (1998, p. 152), lembra-se que “a relação


da leitura com um texto depende, é claro, do texto lido, mas depende também do
leitor, de suas competências e práticas, e da forma na qual ele encontra o texto lido
ou ouvido”.

Alguns alunos empolgaram-se tanto que eles adiantavam parte da proposta


em casa para aproveitar melhor o trabalho conjunto com os outros discentes no
laboratório. Assim, a construção foi coletiva:
93

[...] no texto inscrevem-se elementos que vêm de fora dele e que os


sujeitos que se encontram no texto – autor e leitor – não são pura
individualidade. São atravessados por todos os lados pela história:
pela história coletiva que cada um vive no momento respectivo da
leitura e da escrita, e pela história individual de cada um; é na
interseção destas histórias, aliás, que se plasma a função autor e
leitor. (ZILBERMAN & RÖSING, 2009, p.104)

No segundo ano de execução do projeto, faz-se importante relatar também,


que alguns educandos trouxeram para a proposta escolar traços de afinidades
pessoais. Em um determinado momento, por exemplo, uma dupla solicitou à
professora de Língua Portuguesa se poderia utilizar os bonecos pré-fabricados do
msn ao longo do trabalho. Segue o exemplo:

Figura 20 – 1ª parte do 10º slide do trabalho das alunas Ana Beatriz P. Tavares (13 anos)
e Gisele Viviane Gercwolf (14 anos)
94

Figura 21 – 2ª parte do 10º slide do trabalho das alunas Ana Beatriz P. Tavares
e Gisele Viviane Gercwolf

Na mesma semana de trabalho, outro grupo propôs utilizar os planos de


fundo encontrados nos seus jogos de videogames favoritos, para a proposta de
reescrita. A tarefa era trabalhosa, mas como os alunos estavam motivados nem
perceberam que eles teriam muito mais trabalho.

Figura 22 – 1ª parte do 3º slide do trabalho confeccionado pelos alunos Gabriela Tavares Vicente (14
anos) e Murillo dos Anjos de Jesus Santos (13 anos)
95

Figura 22 – 2ª parte do 3º slide do trabalho confeccionado pelos alunos Gabriela Tavares Vicente
e Murillo dos Anjos de Jesus Santos

Figura 23 – 1ª parte do 20º slide do trabalho confeccionado pelos alunos Gabriela Tavares Vicente
e Murillo dos Anjos de Jesus Santos
96

Figura 23 – 2ª parte do 20º slide do trabalho confeccionado pelos alunos Gabriela Tavares Vicente
e Murillo dos Anjos de Jesus Santos

Vê-se, desta forma, que os alunos estabeleceram relação entre a proposta


solicitada na escola e os seus gostos pessoais.

O trabalho foi mais significativo e prazeroso, assim como a leitura da obra


solicitada foi realizada com maior profundidade uma vez que os discentes
descobriram que quanto mais conhecessem da obra mais poderiam explorar os
recursos da informática e, inclusive, perceberam que o conhecimento amplo da
narrativa permitia que as criações se tornassem mais originais.

A leitura, assim, ganhou um novo significado. Além disso, ela foi prazerosa.
Outra comprovação de que o projeto atingiu êxito é que, ao término da leitura do
livro solicitado para a execução do trabalho, por livre e espontânea vontade, alguns
alunos procuraram ler outras obras do mesmo autor.
97

3.5 UMA PRÁTICA PARA TODOS

É fundamental ressaltar que todos, até mesmo os alunos com grande


dificuldade na produção textual, executaram suas tarefas com enorme boa vontade
e os resultados foram muito mais satisfatórios do que quando advindos de
cobranças de leitura em provas tradicionais.

Hoje, é comum as escolas terem de desenvolver atividades diversificadas


para alunos com dislexia14, déficit de atenção15 (DDA) e transtorno do déficit de
atenção com hiperatividade16 (TDAH). O problema é que ainda há um número muito
pequeno de profissionais, mesmo que especialistas na área dos distúrbios da
aprendizagem, que sabem diagnosticar tais distúrbios de aprendizagem e propor as
chamadas atividades diversificadas que, supostamente, auxiliariam os alunos com
necessidades especiais.

A falta de atenção adequada e o desconhecimento por parte da escola de


muitos distúrbios da aprendizagem levam muitos educandos a se afastarem do
desejo de aprender a ler e, consequentemente, do ambiente escolar sadio.

De acordo com dados atestados pela Associação Brasileira de Dislexia


(ABD), em levantamentos feitos no Brasil, os distúrbios de aprendizagem atingem de
10 a 15% da população, o que significa uma média de três estudantes afetados em
uma sala de aula com vinte e cinco alunos.

Além das especificidades de cada distúrbio, também são necessárias


reflexões acerca de como tratar os discentes, porque, constantemente, não é a
dificuldade em si que os faz sofrer e, sim, a desinformação daqueles que estão
envolvidos no processo ensino-aprendizagem.

No caso dos alunos disléxicos, muitas vezes, a prática da produção de texto


torna-se um exercício muito árduo, chegando alguns discentes ao ponto de quase
não escreverem mais na medida em que acham que tudo que escrevem está errado

14
Distúrbio específico na aquisição da leitura e da escrita.
15
Disfunção neurológica que dificulta a concentração. Caracteriza-se por distração e desorganização em atividades rotineiras.
16
Transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que tem como sintomas a desatenção, a inquietude e a impulsividade.
98

ou tem pouco valor. É frequente, inclusive, certos docentes encararem tal postura
como descaso ou desinteresse pela atividade e como desrespeito pelo professor.

Já os alunos com déficit de atenção, distúrbio que ocorre como resultado de


uma disfunção neurológica no córtex pré-frontal, têm grande dificuldade de
concentrar-se durante longas atividades de escrita e quanto mais os indivíduos com
DDA tentam se manter atentos, pior para eles, pois a atividade cerebral no córtex
pré-frontal desliga ao invés de ligar. Na impossibilidade de realizar as tarefas
solicitadas, a desmotivação é inevitável e esses alunos também são,
constantemente, vítimas de docentes que interpretam a conduta de forma proposital.

Nesse contexto, o computador pode representar uma ferramenta auxiliadora


para esses alunos. De forma geral, a máquina exerce um fascínio que pode garantir,
principalmente no caso dos discentes com deficiências, atividades e resultados mais
concretos.

Durante as aulas de produção de texto que ocorrem no laboratório, o aluno


com dislexia passa pelo processo de autocorreção. O computador, sem fazer ironia,
brincadeiras ou comentários sobre os erros, avisa o educando que algo está errado,
indicando o problema gramatical na própria tela. Já o discente com déficit de
atenção consegue manter-se atento sem perceber o fato em si.

Alunos com distúrbios de aprendizagem têm, geralmente, inteligência média


normal ou acima da média, porém suas dificuldades de aprendizagem da escrita e
da leitura resultam em uma diferença grande entre o seu potencial e o seu
desempenho.

O computador pode ser em grande aliado nesse processo de aproximação


entre o potencial do educando e a avaliação concreta.

Cabe ao bom educador, crítico e reflexivo, buscar formas para que suas
atividades sejam para todos os discentes e não apenas para os alunos que têm
facilidade ao longo do processo ensino-aprendizagem, ainda que estes últimos
também estejam favorecidos por um ensino mais dinâmico e autônomo.
99

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atividade docente de que a discente não se


separa é uma experiência alegre por natureza. É
falso também tomar como inconciliáveis seriedade
docente e alegria, como se a alegria fosse inimiga
da rigorosidade. Pelo contrário, quanto mais
metodicamente rigoroso me torno na minha busca
e na minha docência, tanto mais alegre me sinto e
esperançoso também. A alegria não chega apenas
no encontro do achado mas faz parte do processo
da busca. E ensinar e aprender não podem dar-se
fora da procura, fora da boniteza e da alegria.
Paulo Freire

Ao trabalhar na área da educação, é sempre necessário tomar partido,


assumir posições. Entretanto, para se assumir posições conscientes, é fundamental,
antes, conhecer as teorias pedagógicas já existentes, ou seja, os modelos
anteriormente usados, testados, experimentados. Encontra-se nessa questão,
portanto, a importância da boa formação dos professores.

É no período de formação acadêmica que o docente tem a oportunidade de


conhecer mais a fundo todos os processos e procedimentos de ensino - até pelo fato
dessas questões fazerem parte do projeto pedagógico dos cursos de licenciatura -,
buscando e construindo uma metodologia própria, estabelecendo ligação entre
teoria e prática. Como afirma Candau (1996, p. 114):

É necessário articular o “pensar” sobre a didática com a didática


“vivida” no dia a dia da prática educativa. Em geral, o que se pode
ver é uma dissociação entre a didática que é vivenciada, inclusive
nas aulas de didática, e o discurso sobre o que deveria ser esta
própria prática.

Além disso, deveria ser, também, durante a formação, que o educador


desenvolveria dentro de si a consciência de que deve buscar constantemente a
atualização e o aperfeiçoamento de seu trabalho. Já é redundante a afirmação da
intensa necessidade sobre a mudança de comportamento dos docentes.
100

Isso ocorre porque mudar um comportamento não é fácil, principalmente


quando o profissional já tem hábitos arraigados. Alguns professores passam pelos
cursos de formação e seguem um único modelo, usando sempre os mesmos
instrumentos e práticas, durante toda a sua vida. Tornam-se docentes insatisfeitos,
que dizem apenas que os alunos não são mais os mesmos.

Nem todo profissional está preparado para o difícil momento da


autoavaliação. Toda mudança gera insegurança e alguns preferem não aceitar o
desafio de mudar. Porém, o mundo desenvolve-se cada vez mais rápido e,
felizmente, uma outra parte do corpo docente aceita esse desafio.

Há algum tempo a pesquisa e a reflexão, comprovadamente, são encaradas


como uma prática primordial no dia a dia docente. É, também, por meio delas que o
professor pode enriquecer a sua prática.

Quando se percebe que algo no cotidiano escolar não está satisfatório, são
fundamentais dados novos para se chegar a possibilidades de soluções que
resolvam os problemas detectados. É durante a formação inicial, somada à
continuada, que o docente pode conhecer estes dados que o ajudarão no futuro. Na
realidade, a formação de professores deve ser um processo permanente, cotidiano e
infindável, como propõem os Parâmetros em Ação (1999). O professor deve
transformar-se, então, em um incansável investigador e a reflexão e a pesquisa em
um exercício constante.

Para captar o cotidiano escolar, o docente deve observar, cuidadosamente,


os hábitos, as regularidades, os comportamentos espontâneos ou não, aceitáveis ou
não, as linguagens utilizadas pelos discentes, levando em consideração que toda a
atividade humana é heterogênea. Assim, o educador tem de transformar-se em um
novo professor a cada nova turma. Oliveira e André (1997, p. 80) dizem:

No cotidiano realizam-se ações de diferentes tipos. Na observação


de uma prática pedagógica é importante prestar atenção a esta
diversidade. Em geral, tende-se a supervalorizar o verbal e é
importante ampliar o campo de observação para que se possa
apreender as possíveis contradições entre o proclamado e o vivido
no cotidiano escolar.
101

É por meio de reflexões e pesquisas que se conseguirá incorporar as culturas


de referência de nossos alunos; desenvolver novos processos e instrumentos de
ensino e avaliação; trabalhar coletivamente; integrar a ação educativa em fins
sociais mais amplos, compreender os diferentes processos cognitivos dos alunos em
cada faixa etária e construir a própria prática pedagógica.

Nessa perspectiva, André (1992, p. 55) afirma que

a realização de estudos e pesquisas sobre o cotidiano da escola de


primeiro e segundo graus, utilizando diferentes enfoques teóricos,
tem sido considerada uma forma rica de conhecimento da prática
escolar e seus resultados têm oferecido importante contribuição para
o movimento de revisão crítica e redimensionamento da Didática.

Desta forma, o professor decide sua ação com base em uma sabedoria
prática e teórica, unindo o seu dia a dia a pressupostos teóricos plausíveis.

É durante a sua formação que o professor deve refletir sobre o fato de que o
saber pedagógico deve ser plural e estratégico, para que possa valorizá-lo
futuramente. O docente capacitado, além de representar um papel primordial no
interior das relações que unem a sociedade contemporânea, detém o saber das
disciplinas e dos currículos, levando sempre em conta os saberes profissionais e a
experiência que ganha ao longo da vida docente. Reafirmando tal questão, Oliveira
e André (1997, p. 83-84) ressaltam:

É importante que sejam estimuladas as iniciativas dos pesquisadores


da área de educação no sentido da aproximação, do
reconhecimento, da valorização e da incorporação dos saberes
docentes, principalmente dos saberes da experiência. Ainda são
pouco numerosos os trabalhos nesta linha. Em geral, nós,
professores universitários, temos bastante resistência em reconhecer
e valorizar o saber do professor e fazer esse saber interagir com o
saber acadêmico. Nos cursos de formação inicial esta questão é
ignorada. Quanto às atividades de formação continuada oferecidas
pela universidade ou outras agências, nelas os professores muitas
vezes são tratados como se não tivessem um saber, têm que partir
do zero, como se não tivessem ao longo de sua profissão construído
um saber, principalmente um saber da experiência, que tem de entrar
em confronto e interlocução com os saberes academicamente
produzidos.
102

Portanto, nesse complicado contexto de trabalho, a única saída continua


sendo, como já fora exposto acima, a reflexão-ação-reflexão:

A formação continuada deve alicerçar-se numa “reflexão na prática e


sobre a prática”, através de dinâmicas de investigação-ação e de
investigação-formação, valorizando os saberes de que os
professores são portadores. (NÓVOA, 1992, p. 30)

É nesse contexto de reflexão docente, que o professor de Língua Portuguesa


dos tempos atuais, deve perceber a necessidade de aproximar seus alunos da
leitura e da literatura, de trabalhar os textos literários de forma mais rica e mais
reflexiva.

A leitura e a escrita do texto literário operam em um mundo feito


essencialmente de palavras e, por essa razão, uma integração mais
profunda com o universo da linguagem se torna necessária. Ler e
escrever literatura é uma experiência de imersão, um desligamento
do mundo para recriá-lo ou, antes, uma incorporação do texto
semelhante ao ato de se alimentar [...]. (ZILBERMAN & RÖSING,
2009, p. 68)

E por que não alcançar a formação de um sujeito mais crítico com a leitura e
com a literatura por meio de mídias e linguagens digitais, se estas estão cada vez
mais presentes no cotidiano da população e chegam com mais força ao universo
escolar?

Seria, portanto, uma postura sábia, por parte do educador, tirar proveito das
ferramentas do mundo virtual. É evidente que cabe, também, ao professor
preocupar-se com a leitura que é feita por meio dos livros, na medida em que ela
gera um tipo de relacionamento mais próximo com as obras, porém se as mídias
digitais representam, em ambientes escolares, recursos que auxiliam o aluno na
leitura e na produção de texto não há porque negá-las.

É o que provaram as duas experiências descritas ao longo deste trabalho.


Além da leitura ter ocorrido de forma real e eficaz, a atividade gerou um
envolvimento e um aprendizado significativo por parte dos alunos.
103

Os educandos apropriaram-se das leituras, refletiram sobre a obra, sobre o


autor, sobre o contexto em que ela fora escrita. Além disso, como foi relatado
anteriormente, trouxeram traços de suas vidas pessoais para o trabalho escolar. A
meta era formar leitores com a competência de interagir com a literatura e de
articular contextos de acordo com seus gostos pessoais e com sua comunidade.

Entretanto, o mais surpreendente foi perceber que a proposta conseguiu


mostrar a riqueza que existe no ato de ler por meio de um livro, mas também
mostrou os benefícios da escrita no ambiente virtual. Os discentes apreciaram a
escrita em um ambiente que não deixa marcas ao se apagar o pensamento,
gostaram de utilizar uma ferramenta, como o Hagáquê ou o PowerPoint, que não
pune ou faz comentários pejorativos depois de um erro de gramática ou de
ortografia, entretanto, perceberam como os livros têm o poder emocional de prender
o leitor.

Utilizando as palavras de Chartier (2007), o fundamental, ao longo do


processo, foi “incentivar a relação dos alunos com um patrimônio cultural cujos
textos servem de base para pensar a relação consigo mesmo, com os outros e o
mundo”17.

Logo, os projetos valorizaram a leitura crítica, o alfabetismo visual, a


interdisciplinaridade, contudo, fundamentalmente, propiciaram o diálogo e a reflexão
constantes entre alunos e alunos, alunos e professor, professor e professor, relações
básicas e inerentes ao processo de ensino-aprendizagem. Como todo processo,
falhas foram detectadas e, mesmo elas, pretende-se que sejam parte da
contribuição uma vez que aqueles que as sanarem raciocinarão sobre o processo de
leitura, de ensino, de aprendizagem.

Embora o cenário educacional, muitas vezes, não pareça o mais propício para
o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem, não há como negar a
importância do papel, consciente, do educador, que, como explicitado, vive sob a
tensão de largas jornadas de trabalho, de baixa remuneração, de condições de
espaço físico e tecnológico não adequados, de parca formação, mas que movido por
sentimentos e posturas, largamente defendidos por educadores progressistas e
democráticos, aliados à constante busca pela formação o mais ideal possível de

17
(revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/fundamentos/roger-chartier-livros-resistirao-tecnologias-digitais-610077.shtml
Acesso em: 15 janeiro 2011).
104

seus educandos, pode conseguir resultados muito safisfatórios junto aos seus
alunos, o que, em verdade, deveria ser sua constante luta já que é este o seu real
papel.
105

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