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O DESIGN ANTES DO DESIGN: A CERÂMICA RIO BRANCO

S. C. Caviquiolo
Rua General Carneiro 460 sala 813 Curitiba PR
su.cavi@gmail.com
Bolsista PIBIC - UFPR
V. S. C. B, Kistmann
Programa de Pós-Graduação em Design - UFPR
vkistmann@ufpr.br

RESUMO

Este trabalho apresenta os resultados de uma investigação de campo em


design cerâmico, com foco na produção de louça de mesa da Cerâmica Rio Branco,
empresa localizada no município de Campo Largo-PR, que funcionou entre 1955 e
1997, seguido de uma discussão relacionada ao contexto macro-econômico e da
constituição familiar. Ele visa a geração de dados que contribuam para a
identificação de elementos que possam influenciar a gestão do design de louça de
mesa daquela localidade na atualidade. A história apresentada foi conduzida a partir
dos relatos do seu proprietário e alguns colaboradores, considerando a sua
formação, desenvolvimento e fechamento. Durante a pesquisa, imagens,
convertidas em um banco de dados digital, e documentos existentes foram também
coletados. Os resultados demonstram como a produção da empresa foi determinada
pelo contexto da época em que funcionou, e como aconteceu seu encerramento,
evidenciando os fatores ligados à gestão do design.

Palavras-chave: Design cerâmico, História do design cerâmico, Louça de mesa e


objetos de adorno.

INTRODUÇÃO

Campo Largo é considerado um dos principais pólos cerâmicos nacionais,


produtor de louça de mesa e objetos de adorno. Em 2005, foi incluído pelo Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior como um Arranjo Produtivo Local
e uma das dez cidades selecionadas para integrar o projeto piloto do programa
(13)
Exporta Cidade . Este fato está ligado à história local, que desde o início do
século XX, demonstra a presença de inúmeras empresas produtoras de louça em
faiança, grés e porcelana.
A importância deste trabalho se apóia no fato de que, além de constituir um
APL, Campo Largo é um município que se autodenomina A Capital da Louça.
Apesar disto, existem muito poucos registros históricos que possam reconstituir a
memória do fazer cerâmico local. Isto constitui não apenas uma carência em termos
gerais, mas, particularmente, no que se refere ao design e sua gestão, uma lacuna
que interfere nas políticas de desenvolvimento de produtos.
Este trabalho de pesquisa é, portanto, uma forma de contribuição para a
construção de uma história local com respeito ao Design Cerâmico. Ele é o
resultado de um levantamento bibliográfico e de entrevistas realizadas com o
proprietário e alguns dos principais atores que participaram da história da Cerâmica
Rio Branco, empresa que esteve localizada na Cidade de Campo Largo-PR, seguido
de uma breve discussão a respeito da produção de cerâmica de mesa e objetos de
adorno, com o objetivo de contribuir para a identificação de elementos que possam
influenciar a gestão do design na região.

MATERIAIS E MÉTODOS

A escolha neste trabalho por um método de pesquisa baseado na história oral


se apóia no fato de que existe uma grande carência de documentos que possam
fundamentar uma visão sobre o design cerâmico na região. Além disso, devido às
particularidades da empresa Cerâmica Rio Branco, da qual o seu antigo proprietário,
hoje com 86 anos, encontra-se ainda vivo, bem como da eminência em se ter o seu
patrimômio arquitetônico e empresarial como bem cultural perdido, a escolha por
(4)
este tipo de pesquisa se reforça . O método utilizado foi, portanto, de entrevista
focalizada. Para tanto, foram elaborados dois roteiros diferentes para os dois
entrevistados, o Sr. Alberto Augusto, fundador e proprietário da fábrica, e seu
auxiliar, Balduíno Vidal Filho que trabalhou na fábrica entre anos de 1977 a 1993. As
entrevistas foram realizadas entre junho de 2005 e julho de 2006. Além desses
registros, houveram relatos coletados de maneira informal, que vieram à
complementar os depoimentos anteriores, relatos esses concedidos por Alberto
Augusto, Balduíno Vidal Filho, Regina Vidal (esposa de Balduíno), Olimpia Augusto
(esposa de Alberto Augusto) e Zita Augusto Metzel (Irmã de Alberto Augusto).
Paralelamente às entrevistas, foram fotografadas as louças que foram
preservadas e o interior da fábrica como se encontra atualmente. Houve também o
registro digital de um caderno de propriedade do senhor Alberto Augusto, que
continha as ilustrações desenvolvidas para a decoração das louças da empresa.
Serviu também de base para esta pesquisa a técnica de levantamento
bibliográfico. Neste aspecto, foram consultados livros sobre as temáticas apontadas
na revisão da literaura, compreendendo: design cerâmico, história do design, história
da industrialização do Paraná, história de Campo Largo, documentos e revistas de
época.

RESULTADOS

A história da empresa

Conforme os relatos coletados, Alberto Augusto, nascido em fevereiro de 1921,


na cidade de Campo Largo, foi o fundador da Cerâmica Rio Branco. Seu avô era
comerciante, e seu pai trabalhou como lavrador e foi empregado das fábricas de
produtos cerâmicos Steatita e Brasileira(2).
Alberto Augusto e seu irmão Albino Augusto fundaram em 1953 a Cerâmica
Rio Branco, fruto de uma experiência anterior de 18 anos de trabalho também no
setor cerâmico. Alberto iniciou sua prática na cerâmica quando tinha 14 anos, em
1935, como funcionário da fábrica de louça de Darcy Portela. Posteriormente,
trabalhou em outra empresa do mesmo setor, a Cerâmica Brasileira, durante um
(2)
ano, voltando à Darcy Portela logo após . Esta experiência anterior o levou a
montar em 1940, sua própria fábrica de telhas, tijolos e de louça “preta”, considerada
por Augusto a louça com vidrado na cor preta. Esta fábrica, situada em Campo
Largo, se chamava Fábrica São João, e nela a produção era obtida a partir de
(2)
terracota . Até hoje existem exemplares das telhas produzidas, em poder do Sr.
Balduíno Vidal (16).
Em 1942, Alberto Augusto foi convocado para participar como pracinha junto
ao Exército Brasileiro na Segunda Guerra Mundial. Em virtude de sua ida para a
Itália, vendeu a sua parte da Fábrica São João para o sócio, Sr. Leonardo Gavalak2.
Depois de passar um ano na Guerra, Alberto Augusto retorna em 1945 à Campo
Largo e volta a atuar no setor cerâmico, passando a exercer o cargo no setor de
produção na então Cerâmica Aurora. Nesse período ele também construiu uma
pequena olaria, na mesma quadra onde é hoje a Cerâmica Rio Branco. Pouco
tempo depois, a vendeu para seu vizinho, Victorio Fallarz (2).
Alberto Augusto casou-se, em 1946, com Olímpia Perbecen, que é apontada
por ele como uma pessoa que muito o apoiou no início da montagem da Cerâmica
Rio Branco, em 1953(1). Para isso, foi necessária a participação de mais três sócios
no investimento. Estes eram capitalistas, que apoiaram a construção, enquanto que
o senhor Augusto exercia a função de diretor geral. A fábrica foi construída em dois
anos, sendo concluída em 1955 (1).
O primeiro forno foi construído em “serão”, no período da noite, em que Alberto
não estava trabalhando na Cerâmica Aurora, onde na época era empregado. O
segundo forno, utilizado para a queima do esmalte, foi construído através de
“empreitada”, em 1956. Cerca de 20 anos mais tarde, esses mesmos fornos foram
(2)
reconstruídos para ampliação da capacidade . À medida que a fábrica funcionava
e a louça era vendida, os investimentos começaram a dar o retorno esperado, o Sr.
Alberto Augusto adquiriu para a fábrica as parcelas de seus sócios (2).
Segundo Alberto(2005), os períodos mais difíceis enfrentados pela fábrica
foram no começo de seu funcionamento e durante crise que levou ao fechamento da
fábrica, crise esta que foi causada pela entrada de produtos importados da China no
mercado nacional e o crescimento do consumo de louça em vidro. Já para Balduíno
Vidal, o período mais difícil para a fábrica foi de 1980 a 1986, devido às mudanças
políticas e a criação de novos impostos (14).

A estrutura física da Cerâmica Rio Branco

Internamente a fábrica possui dois pisos. No primeiro estão localizados os


equipamentos para a feitura da massa, como o batedor, a prensa filtro e a maromba.
Entre os dois pisos há um elevador que levava a massa para a conformação dos
pratos, e retornava com a louça que devia ser queimada no forno de biscoito. No
segundo piso, a massa plástica que saía da extrusora era cortada na espessura
correta e logo ao lado eram conformados os pratos no sistema de torno. A estufa era
localizada no mesmo espaço onde acontecia a conformação. No segundo piso
também era misturada a barbotina para a conformação a liquido.
Pessoas e processos

O processo de fabricação utilizado na Cerâmica Rio Branco era o do fabrico de


louças em faiança por meio de dois tipos de conformação: massa plástica e massa
líquida (barbotina). Segundo o Sr. Alberto Augusto (2005), a massa era obtida a
partir de argilas obtidas em várias regiões, inclusive do estado de Santa Catarina.
Ela era composta por: a) argilas preta, marrom e branca; b) caulim; c) sabão de
caboclo; d) sílica; e) feldspato
Segundo Fernandes (1999), o caulim auxilia na estrutura da massa,
controlando dilatação e contração. O feldspato é chamado de fundente, pois
funciona como aglutinador dos outros componentes da massa em alta temperatura
(ibid). O sabão de caboclo é descrito como uma argila encontrada em perfurações
profundas e refere-se a solo típico da Formação Guabirotuba. A sua coloração é
típica de solo oxidado: apresenta cores variegadas de amarelo a cinza, com
(3)
resquícios de cinza, onde se encontram algumas superfícies polidas . O feldspato
utilizado na fábrica era adquirido de uma empresa de Minas Gerais, e queimado no
forno de vidrado à temperatura de 1000ºC, assim, era desmanchado com maior
facilidade e não foi necessária a aquisição de uma máquina específica para moê-lo
(1)
.
A mistura da massa acontecia em um batedor, decantava em um tanque e ia
para uma prensa-filtro. Nesta, a barbotina (massa líquida) passava por um processo
de filtragem e uma parte da água era retirada e retornava ao tanque com o auxílio de
uma bomba elétrica. Os discos de massa resultantes desse processo eram
colocados em uma extrusora, denominada “maromba”. A massa saía da maromba
em um formato cilíndrico e então colocada no elevador para a seção de
conformação de massa plástica. Geralmente, dois funcionários eram encarregados
da feitura da massa (2).
A massa líquida era utilizada como matéria prima na fabricação de canecas,
leiteiras, saleiros, estatuetas e outros objetos caracterizados por possuírem formas
com uma maior quantidade de detalhes. Este foi também o primeiro processo
utilizado na fábrica. O procedimento para a conformação a líquido é caracterizado
pelo enchimento, com barbotina, de um molde de gesso, cuja forma interior é igual à
(6)
forma exterior da peça que se deseja fabricar . A massa plástica era usada como
matéria prima de pratos, saladeiras e travessas. A conformação ocorria em um torno
tipo jaule, caracterizado por um molde em rotação e um contramolde fixo. A massa
era colocada sobre o molde e o contramolde era acionado pelo operador através de
um braço.
As peças iam para os fornos dentro de caixas de material refratário,
denominadas “cazão”, que também eram desenvolvidas na própria fábrica. O
chamote, que é formado por “argilas queimadas à temperatura igual ou superior à da
massa e posteriormente moídas”(6), era a matéria prima das caixas-refratário. Esse
material era conformado em moldes de ferro fundido, com o auxílio de uma prensa,
e a operação era realizada nos períodos de folga dos funcionários.
Na década de 90, tentou-se implantar o forno a gás, porém a adaptação à nova
tecnologia era difícil, haja vista a pouca experiência dos envolvidos na queima em
fornos à gás. Segundo o Sr. Alberto, a queima em forno a gás não proporciona a
mesma durabilidade da louça queimada em fornos à lenha. Houve poucas peças
queimadas com sucesso utilizando essa nova tecnologia (4).
Cada etapa do processo empregava um certo número de pessoas, na
preparação da massa eram duas, na conformação era necessário um único
operador para o torno, que repassava o produto conformado para outro indivíduo
fazer a limpeza. Para a colocação da louça nos fornos era necessário o emprego de
5 a 6 pessoas, e na decoração 4 pessoas. Segundo o Sr. Alberto (2005), as
mulheres encarregadas da decoração eram chamadas de “chapeadeiras”, pois eram
elas que, com o auxílio de um pincel, aplicavam o vidrado sobre uma máscara
vazada (chamada “chapa”), já os homens envolvidos no processo de decoração se
ocupavam da feitura do filete, uma linha que acompanhava a borda de pratos e
saladeiras. Eram ao todo quatro pessoas (2).

Caracterização dos produtos e seu design

Os primeiros produtos da Rio Branco eram de natureza experimental. Todos


eram cópias de outros existentes, porém com algumas alterações na forma e
acabamento, produzidos através da conformação por enchimento. Segundo Alberto
Augusto (2005), a fábrica chegou a produzir 85 tipos diferentes de produtos, que iam
desde objetos de adorno, como estátuas religiosas, a leiteiras e canecos para
chopp.
Durante a trajetória da Cerâmica Rio Branco, a produção era constantemente
aperfeiçoada por meio das experiências do Sr. Alberto, prática evidente no
desenvolvimento do vidrado azul. Regina Vidal, sua filha, descreve-o como “químico”
da fábrica, que após observar o comportamento dos vidrados em altas temperaturas,
desenvolveu uma cor para a decoração que preservava suas características mesmo
(16)
após a queima . Com o passar do tempo, por volta de 1970, o Sr. Alberto
percebeu que as peças conformadas em torno tinham um melhor acabamento em
relação às conformadas a líquido, pois, na segunda, era mais difícil manter uma
espessura regular. Apesar de não produzir mais tantas canecas, jarros e leiteiras, a
conformação a líquido permaneceu na conformação das travessas (15).
Na década de 80, a variedade de peças diminuiu, segundo o Sr. Balduíno, em
razão do aumento de impostos e da especialização na fabricação de xícaras e
canecas pela da cidade de Pedreira-SP. Os produtos fabricados pela Rio Branco
nessa época se restrigiam aos pratos, conjuntos de saladeiras e travessas (14).
A Cerâmica Rio Branco possuía o seu próprio cunho, porém não eram todas as
peças que o recebiam. O motivo, segundo o Sr. Alberto Augusto, era o fácil
desgaste quando entrava em contato com a peça biscoitada que era muito áspera,
chegando a ser utilizado mais de um carimbo por dia (1).
A decoração da louça acontecia tanto na forma do produto, com relevos que
faziam alusão à natureza, como espigas de milho ou ramos de flores, quanto na
superfície, com acabamento de vidrados coloridos. Há também o registro de peças
em terracota, lixadas e pintadas à mão. A decoração da superfície era de tais tipos
(5)
: a) pistola: vidrado colorido aplicado com uma pequena pistola, resultando num
efeito gradiente;
b) filete: vidrado aplicado com pincel enquanto a peça gira em um torno
manual, desenhando uma linha que contorna a louça;
c) “stêncil”: máscaras em estanho ou película plástica, onde figuras eram
vazadas com o auxílio de lâminas. As figuras eram cópias de estampas
encontradas em tecidos adaptadas pelo Sr. Alberto Augusto, ou criações dele
próprio, que as desenhava em um caderno que funcionava como um guia para
a decoração das peças;
d) decalque: começou a ser utilizado na fábrica a partir da década de 80,
caracterizado por motivos florais aplicados, geralmente, nos pratos.
Um pequeno caderno, contendo os motivos aplicados na louça da Cerâmica
Rio Branco foi emprestado à pesquisadora pelo Sr. Alberto Augusto. Este caderno,
era na verdade um catálogo de referência para as cores e motivos que eram
aplicados na louça, e utilizado como um guia para a compra de tintas e o recorte
vazado das máscaras. Essas imagens são motivos que, segundo Regina e Balduíno
Vidal, foram criados pelo Sr. Alberto Augusto, por meio de composições de figuras
que encontrava nas estampas de tecidos e toalhas de mesa da época (14).
Os grafismos encontrados nas últimas peças produzidas pela Rio Branco –
prato, saladeira e travessa – são mais sintéticos e geometrizados. Um deles foi
inclusive patenteado para evitar a cópia de outros fabricantes (15).
Durante a década de 80, são aplicados os primeiros decalques, porém a
decoração com máscara em saladeiras e travessas continuou a existir, sendo
aplicadas somente nos pratos. A partir dos anos 90, os pratos passam a ser
vendidos sem decoração a outras empresas que os decoravam (15).

A venda e distribuição

A louça da Cerâmica Rio Branco sempre foi vendida na própria fábrica e


chegava ao consumidor através dos armazéns, feiras e dos vendedores ambulantes,
que estacionavam caminhões carregados de louça em pontos de grande circulação
das cidades. A fábrica tinha clientes em Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, São
(14)
Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul . Antes da existência de
ambulantes, comboios de empresas vindos do Rio Grande do Sul carregavam seus
caminhões com a louça de Campo Largo, pois, segundo o Sr. Alberto (2005), na
década de 70-80, muita louça era vendida. Com o tempo, essas vendas foram
diminuindo até o ponto em que os compradores faziam o pedido na fábrica e
enviavam após um caminhão para o transporte da louça adquirida.
Segundo o Sr. Alberto Augusto(2006), nunca foram necessários anúncios e
propagandas da fábrica, pois durante o auge da fábrica, período dos “ambulantes”,
chegava a faltar produtos para a venda.
DISCUSSÃO

No Paraná, a indústria cerâmica, no período anterior à fundação da Cerâmica


Rio Branco, era caracterizada por produtos destinados principalmente à construção
(11)
civil , como telhas e tijolos. Desta forma, as fábricas destinadas à produção de
louça de mesa ocorriam em menor quantidade. Neste contexto, podemos entender o
fato do Sr. Alberto ter construído anteriormente duas olarias, uma delas a São João,
para a produção de telhas e tijolos.
Em virtude da pouca quantidade de produtores na época, se estabeleceu uma
grande oportunidade para a abertura de fábricas de louça de mesa. Em 1950 o país
avançava de modo mais intenso no seu processo de industrialização, o que
(10)
demandava com a nova classe operária produtos para o seu consumo . Assim, a
construção da Cerâmica Rio Branco se deu em uma época de surgimento de um
novo mercado consumidor, conseqüência do crescimento industrial, proporcionado
pelas rendas da cafeicultura e erva-mate, no caso do Paraná (12).
Pode-se estabelecer uma comparação entre o início da produção da fábrica
Rio Branco e a produção manufatureira de louça de mesa na Inglaterra do séc.
(7)
XVIII, ambas de caráter predominantemente empírico . Os processos
desenvolvidos ao longo da trajetória da fábrica refletem o caráter experimental da
produção, e o domínio da técnica pelo Sr. Alberto. É possível perceber, nos relatos
do Sr. Alberto Augusto, que esta vivência no fazer cerâmico foi iniciada por seu pai.
Esta vivência, como podemos observar no seu relato, resultou em uma série de
outros empreendimentos.
Na década de 70, ocorre uma redução na variedade de produtos,
provavelmente em razão de um amadurecimento quanto à segmentação de
mercado, e a produção racionalizada. O contexto econômico paranaense da época
(9)
era de um grande crescimento industrial comparado à década de 60 . Essa
produção é semelhante à louça produzida nas indústrias do início do século XX, em
razão de sua decoração ao estilo Art Decô em vidrado azul sobre fundo branco.
Os motivos utilizados na decoração da louça de mesa da Cerâmica Rio Branco
faziam parte do “universo gráfico” em que Alberto Augusto vivia. Em busca de traçar
uma comparação entre a cultura visual da época e os motivos aplicados na louça,
foram levantadas aleatoriamente imagens de revistas da época (1953 a 1960) onde
podem ser observadas certas semelhanças (Figura 1).
FIGURA 1 – Semelhanças entre motivos presentes na louça e outros produtos da época.
Fonte: Catálogo de decoração Cerâmica Rio Branco; Anuário das Senhoras v. 20, 1953, pgs 55 e
216.
Durante a década de 80, são aplicados os primeiros decalques, porém, a
decoração com máscara em saladeiras e travessas na cor azul continua a existir. Os
decalques eram aplicados somente nos pratos, e refletem uma certa perda de
identidade nos produtos da fábrica, que costumavam ser identificados pela cor azul
sempre presente em filetes e motivos decorativos. Na década de 90, até o
fechamento da fábrica, observa-se que o reflexo da situação econômica e política
vigente afeta ainda mais a produção da fábrica, que chega a vender seus pratos em
vidrado branco. Esses pratos eram vendidos à outras empresas que aplicavam a
decoração, “agregando valor”, ao produto e obtendo lucros maiores.
Através do registro dos produtos e dos relatos de indivíduos ligados à
Cerâmica Rio Branco, é possível desenhar o cenário que levou ao fechamento da
fábrica. O contexto é o da grande redução da produção de louça na região de
Campo Largo, encontrado em relatório do IPARDES (2003) que analisou os Arranjos
Produtivos Locais paranaenses na década de 90, quando as indústrias de louças e
porcelana entraram em crise com a concorrência da porcelana chinesa provocada
pela abertura de mercado.
Também foi possível perceber a falta de estratégias a fim de conquistar novos
mercados, a fábrica não desenvolveu nenhuma forma de divulgação de seus
produtos em outros meios, já que a venda sempre foi feita no interior da fábrica,
conforme os relatos(1). Nos depoimentos é corrente o uso da palavra freguês,
refletindo uma relação com os clientes na base da amizade e confiança, e que
muitas vezes resultava na falta de pagamento.

CONCLUSÕES

Com este trabalho, é possivel identificar alguns elementos de influência na


gestão do design de louça de mesa na região de Campo Largo. Pois nele pode-se
visualizar uma trajetória que resultou no fechamento da fábrica ocorrido
principalmente em conseqüência da falta de estratégias competitivas frente ao
cenário da época. Temos, na questão econômica, a abertura de mercado que
possibilitou a venda de louça de mesa importada à custos menores. A dificuldade de
adaptação da produção às novas tecnologias e leis ambientais. E a base familiar da
empresa, que concentrava o conhecimento e as decisões na figura do fundador, fato
recorrente naquela localidade.
No entanto, por possuir informações baseadas na pesquisa oral, muitos dados
ainda permanecem ocultos. Uma continuidade do trabalho a partir de agora,
permitiria uma complementação do material, permitindo avançar nas discussões
propostas.

REFERÊNCIAS

1. AUGUSTO, Alberto. Entrevista concedida a Suelen Caviquiolo. Campo Largo:


2005.
2. ________. Entrevista concedida a Suelen Caviquiolo. Campo Largo: 2006.
3. BOSZCZOWSKI, Roberta Bomfim; CAMPOS, Tácio Mauro de;
NASCIMENTO, Franklin Antunes. Caracterização Físico-Química e
Comportamento Tensão-Deformação de Dois Solos da Formação
Guabirotuba. Disponível em:
www.lactec.org.br/.../downloads/Biblioteca/2004/006_2004_Caracterizacao_fis
ico_quimica_e_comportamento.pdf - Acesso em: 14.04.2007
4. CAVIQUIOLO, Suelen. Anotações de campo. Curitiba, 2005.
5. __________________. Anotações de campo. Curitiba, 2006
6. FERNANDES, Dulce Maria de Paiva. Introdução ao Processo Cerâmico.
Campo Largo, 1999
7. HESKETT, John. Desenho Industrial. 2 ed. Rio de Janeiro: José Olympio,
1998. p.17
8. IPARDES. Arranjos Produtivos Locais e o Novo Padrão de Especialização
Regional da Indústria Paranaense na Década de 90. Curitiba: 2003. p.41
9. IPARDES. O Paraná: Economia e Sociedade. Curitiba: 1981
10. KISTMANN, Virginia Souza de Carvalho Borges. A caracterização do design
nacional em um mercado globalizado: Uma abordagem com base na
decoração da porcelana de mesa. Tese (Engenharia de Produção) -
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis: 2001.
11. KRETZEN, As Grandes Potências Econômicas no Estado do Paraná
1951/1952. 2.ed. Curitiba: Escritório Sul-Brasil Econômico, 1951. p.29
12. MENDES, Mariuse Dunajski. Tradição e Modernidade na produção de móveis
artesanais com fibras na região de Curitiba: a fragmentária história da fábrica
de móveis de Martinho Schultz. Dissertação (Mestrado em Tecnologia) –
Universidade Federal Tecnológica do Paraná, Curitiba, 2005. p.62
13. ORBIS-MC. Requião e Furlan lançam programa: "Exporta Cidade" em Campo
Largo. Disponível em: www.orbis.org.br/noticias/noticias_12.php - Acesso em:
25 ago. 2006.
14. VIDAL Fº, Balduíno. Entrevista concedida a Suelen Caviquiolo. Campo Largo:
2005.
15. ________. Entrevista concedida a Suelen Caviquiolo. Campo Largo: 2006.
16. VIDAL, Regina. Entrevista concedida a Suelen Caviquiolo. Campo Largo:
2006.

DESIGN BEFORE DESIGN: THE CERÂMICA RIO BRANCO

ABSTRACT

This paper presents the results of a field research on ceramic design, with a
focus on the Cerâmica Rio Branco table ware production, which existed between
1955 and 1997 in Campo Largo-PR, Brazil followed by a discussion upon macro–
economic contexts and familiar heritage. It intended to generate data to contribute
for an identification of elements that can influence the design management at that
place. The history is conduct by the tellings of its owner and some colaborators
considering its formation, development and closure. During the work images,
converted in digital data, and documents about its history were also colected. The
results demonstrated how production in this company was determined by the social
and economical context at that time and how it was closed, showing the factors
related to design management.

Palavras-chave: Ceramic design, Design history, Tableware and Decoration in


Ceramics

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