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PARTE I

ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS
NAS ORGANIZAÇÕES

1 Administração de Indivíduos
2 Administração de Equipes e Grupos
3 Administração de Liderança, Treinamento e Motivação
4 Administração de Recursos Humanos
5 Administração da Cultura Organizacional
CAPÍTULO UM
ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS

Visão, Ser e Sentimento

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
No final deste capítulo, você será capaz de:  Definir valores e como eles orientam o
 Entender como a psicologia contribui para comportamento individual
o comportamento organizacional  Definir e descrever um conjunto de teo-
 Descrever o processo de percepção e de rias da personalidade
como ele pode afetar de modo significati-  Explicar como a psicologia positiva pode
vo o desempenho no trabalho contribuir para que o local de trabalho seja
saudável e feliz.

ANTES DE COMEÇAR . . . der fazer de você um gestor melhor. Esses li-


vros declaram que os gestores hoje precisam
Algumas palavras de Anna Quindlen, jor- ser qualificados em competências técnicas es-
nalista norte-americana vencedora do
Prêmio Pulitzer:
senciais como controle e planejamento. En-
tretanto, atualmente, a tarefa do gestor exige
Quando você sair da faculdade, ha- habilidade para tratar de um grande número
verá milhares de pessoas com o mes-
mo diploma que o seu; quando você
de questões relacionadas às relações humanas
conseguir um emprego, haverá mi- – por exemplo, habilidade de motivar, acon-
lhares de pessoas fazendo o que selhar e desenvolver uma equipe, inspirar e
você deseja fazer profissionalmen- transformar organizações, comunicar em di-
te. Mas você é a única pessoa a ter versos contextos culturais e espirituais, pro-
a custódia de sua própria vida.
(Quindlen, 2000)
mover e construir com sucesso a cultura da
organização, pensar como membro da comu-
nidade global, projetar e administrar equipes
INTRODUÇÃO de trabalho de alta performance e proporcio-
Uma olhada na seção sobre administração na nar estabilidade e harmonia em um ambiente
maioria das livrarias revela uma grande varie- cada vez mais complexo, ambíguo e incerto.
dade de livros de autoajuda que afirmam po- Espera-se que os gestores possuam algumas
80 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

qualidades de psicólogo, terapeuta e conselhei- portamento organizacional, e a felicidade.


ro ocupacional e, para isso, precisam de um Antes de explorar estes fascinantes tópicos,
entendimento básico dos princípios e teorias vamos primeiro construir um entendimento
da psicologia para ajudá-los na complexa ta- da psicologia e sua aplicação no trabalho.
refa de administrar pessoas.
As propriedades psicológicas podem ser
analisadas tanto em nível individual quanto A PSICOLOGIA NO TRABALHO
grupal, ambos importantes para a administra-
ção de pessoas no trabalho. Este capítulo ex- A psicologia surgiu na Grécia, há mais de 2.500
plica conceitos e princípios psicológicos bási- anos; quando os filósofos tentaram explicar a
cos que consideramos fundamentais para a natureza do eu, da alma e da personalidade. A
administração de pessoas nas organizações: os palavra psicologia possui uma etimologia clássica.
grupos e equipes serão abordados no próximo Fundamental-
capítulo. Em primeiro lugar, discutiremos a mente, a psicologia O termo psicologia é de-
rivado da palavra grega
percepção e como ela pode afetar o modo trata de responder a psyche, significando os
como nos comportamos e vemos as coisas. pergunta, “por que pensamentos e senti-
Nós, humanos, não somos criaturas feitas com somos como somos?” mentos de um indivíduo,
e do sufixo logia deriva-
a perfeição que acreditamos; a forma como e se ocupa das funções do do sufixo grego logos,
percebemos as coisas, prestamos atenção ou da mente (como per- que significa razão e, em
ignoramos, como interpretamos as pessoas e cepção, atenção, língua por tuguesa,
apresenta-se como lo-
tomamos decisões a seu respeito, é passível de pensamento, memó- gia, denotando uma
muitos erros. Por este motivo, entender o pro- ria, afeto, em níveis área de estudo.
cesso de percepção é fundamental para nos intrapessoais e inter-
tornarmos melhores gestores. Em segundo pessoais de análise), e de desenvolvimento,
lugar, examinaremos os valores, pois são a base possibilidades, degradação e limitações do
da cultura da administração, da diversidade e cérebro.
da comunicação (todos estes tópicos são abor- A aplicação da psicologia no trabalho tem
dados neste livro detalhadamente). É impor- ocorrido por meio da área da psicologia in-
tante verificar como nossos valores são forma- dustrial e organizacional aplicada. Entretan-
dos e como eles nos impulsionam na vida de to, é geralmente no campo do comportamen-
trabalho; como nos unem, mas também como to organizacional que a teoria, a pesquisa e a
nos separam e nos isolam dos outros; e como prática da psicologia são aplicadas à vida or-
eles estabelecem conflito entre as pessoas e a ganizacional.
sociedade. Em terceiro lugar, a personalidade O Comportamento na Organização (CO) envolve
é claramente importante porque é vista entendimento, pesquisa e abordagem dos fe-
como a essência que nos faz ser quem so- nômenos de um ponto de vista multidiscipli-
mos, determina como nos comportamos e nar, incluindo a psi-
Comportamento na Or-
molda nossos sentimentos. Neste aspecto, cologia, a sociologia, ganização (CO) refere-
tem-se uma pergunta: “É possível classifi- a antropologia econô- se ao estudo do compor-
car as pessoas como tipos ou cada um de mica, a ciência políti- tamento humano em
contextos organizacio-
nós é um indivíduo exclusivo?” Finalmen- ca, etc. nais. CO é uma discipli-
te, encerraremos o capítulo abordando as Nesta obra, resu- na aplicada que se volta
emoções na perspectiva da “psicologia posi- mimos a natureza in- para processos e práti-
cas, em nível de indiví-
tiva” (PP) – nos concentraremos em dois dos terdisciplinar da área duo, de organização e de
tópicos que a PP colocou em foco: a toxici- do CO. O livro é es- grupo, que inibem ou vi-
dade organizacional, conceito que trouxe crito por um sociólo- abilizam o desempenho
da organização.
uma importante contribuição para o com- go que trabalhou em
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 81

MOMENTO PARA EXERCITAR

Quem sou eu? de cozinha, etc.).Você se descreveu também em


termos de caráter e emoções (bom, feliz, depres-
Pare e reflita por um momento sobre quem você é.
sivo, honesto, confiante, tímido, etc.)? Aparên-
Antes de continuar, responda à pergunta “quem
cia (gordo, magro, alto, baixo, feio, bonito, etc.)?
sou eu?” e escreva uma lista das coisas que você
Afiliação institucional (cristão, muçulmano, judeu,
acredita que fazem você ser quem é. Vamos lá!
budista, conservador, liberal, democrata, verde,
etc.) ou suas crenças e percepções (pró ou con-
tra o aborto, pró ou contra a imigração, etc.)?
Ou até mesmo a demografia (Geração x, y, gê-
nero, estado civil ou onde você mora ou de onde
você vem, etc.)?
Mantenha a lista à mão e ao completar este
capítulo, revise-a. O que você acrescentaria, mu-
Agora, olhe a lista. Que tipos de coisas fazem daria ou tiraria de sua lista original? Como res-
você ser quem é? Descreva-se em termos de ponderia a pergunta “Quem sou eu?” sabendo
papéis (filha, filho, estudante, voluntário, mãe, o que sabe agora após a leitura deste capítulo –
pai, etc.) e profissão (contador, advogado, chefe e talvez do livro inteiro?

administração por quase 20 anos e possui for- mos em esferas específicas dependeria de nos-
mação na ciência comportamental (Stewart), sas disposições genéticas – inteligência, des-
um filósofo e estrategista que trabalha nas áreas treza, habilidade matemática, raciocínio e as-
de administração e design (Martin) e um psi- sim por diante. Em outras palavras, nascemos
cólogo (Tyrone) que também trabalha em com predisposição, como a personalidade, a
administração. Nos Capítulos 1 e 4 lançamos capacidade de liderança ou a inteligência. Ou-
mão das contribuições da psicologia ao CO; tros dizem que nascemos tabula rasa – isto é,
mais adiante, algumas influências se tornam como uma lousa em branco – e que aprende-
aparentes – todas fazendo parte de uma rica mos nossa personalidade, aprendemos a nos
mistura que compreende o estudo da admi- tornar líderes e somos fortemente influenciados
nistração e organização de hoje. Agora, va- por contextos sociais como o status socioeconô-
mos adiante. mico de nossa família, sua cultura, apoio so-
Então, por que somos do jeito que somos? cial, o ambiente em que nos criamos, nossa
Podemos responder até certo ponto, mas como educação, etc.
respondemos depende de nossa crença na na- As visões opostas apresentadas pelas teo-
tureza humana. Nos últimos cem anos, hou- rias referidas estabelecem muito do que você
ve muita teoria, pesquisa e prática abordando irá aprender no campo do CO, porque a psi-
estas questões na psicologia. Nossa intenção é cologia diz muita sobre a teoria, a pesquisa e a
orientá-lo quanto à sua necessidade de conhe- prática do CO. Alguns teóricos e pesquisado-
cimento da psicologia no trabalho. res aderem a um ou outro desses lados com
Em quase todos os campos da psicologia, muita convicção. Há aqueles que, como nós,
dois temas principais impulsionam a teoria e preferem teorias mais moderadas, integrado-
a pesquisa. O primeiro está centrado no de- ras, sobre o tema. Nossa opinião é a de que
bate sobre a natureza versus modo de criação nascemos com alguns dos aspectos que for-
do indivíduo. A questão é: se somos o que mam nossa constituição, mas muito do que
somos devido à genética, nesse caso, viríamos somos é aprendido com o tempo, e o contex-
ao mundo pré-programados, e o que realiza- to tem um impacto profundo em nosso de-
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senvolvimento. A forma como você encara a mico ocorrem porque o comportamento hu-
questão da natureza e o modo de criação in- mano é baseado no interesse próprio, que é
fluencia fortemente a maneira de administrar melhor servido pela operação de mercados li-
as pessoas, bem como as suposições sobre seu vres e desimpedidos no fornecimento de bens
funcionamento. e serviços. Por exemplo, se nós consumidores
Um importante tema que emergiu na teo- queremos mais lazer e o expressamos pelas
ria e pesquisa do CO sugere que o modo de nossas decisões nos mercados – talvez pela
criação é ignorado devido às forças fundamen- compra de serviços para aproveitar as férias
tais que sustentam a natureza humana. Alguns ou produtos de entretenimento, em vez de eco-
argumentos reforçam a perspectiva do “gene nomizar – os negociantes que vendem paco-
egoísta”: somos programados para a competi- tes de férias e novidades que ajudam a poupar
ção numa luta fundamental para perpetuar o trabalho são recompensados. Compramos e
nossos genes sobre os outros. Há quem enfa- vendemos em mercados que alcançam o equi-
tize que a força e a sobrevivência dependem líbrio entre a oferta e a procura de bens, de
muito mais do fato de que somos animais so- modo que, em longo prazo, as eficiências pre-
ciais buscando afiliação e relações humanas; valecerão e o mecanismo do preço manterá o
portanto, estamos mais comprometidos com equilíbrio. Pelo fato de sermos autointeressados,
a cooperação do que a competição para asse- criamos demandas que os mercados buscam
gurar nossa sobrevivência como espécie. Mui- atender; estes mercados beneficiam toda a
tos estudiosos e teóricos da administração sociedade, criando um sistema economica-
usam a teoria de Darwin para validar suas afir- mente autorregulador.
mações sobre a natureza humana como ba- O interesse próprio fundamental não ne-
seada em instinto e luta competitiva. A psico- cessariamente proporciona o bem-estar, pro-
logia evolucionária tem feito tanto progres- dutos ou serviços que não podem ser possuí-
so na pesquisa e teoria da administração que dos de modo privado para gerar renda, e disso
agora está imersa na tradição darwiniana da decorre o argumento de que o governo preci-
“sobrevivência do mais apto”. Alguns dos sa fornecer tais bens públicos. Quando uma
que acreditam fortemente na sobrevivência mãe solteira de 16 anos ganha um bebê e pre-
do mais apto como fator competitivo são cisa de apoio para seu sustento, nenhum ne-
os primeiros a reivindicar um transplante gociante irá ajudá-la, porque ele não vê lucro
de fígado ou rim. No mundo ideal da so- nisso, a não ser que alguém esteja financian-
brevivência do mais apto, esses indivíduos do. Assim, o governo proporciona a segurida-
seriam abandonados até a morte por não te- de social e sustento básico. Com certeza, as-
rem nascido suficientemente adaptados. Por sim agindo em longo prazo, o governo subsi-
outro lado, alguns dos que acreditam que dia o negócio em geral, pois viabiliza (no caso
os sobreviventes mais fortes são aqueles que do bebê que está para nascer) a reprodução de
mais cooperam são os primeiros a se quei- mais um “recruta” para a próxima geração de
xar quando os impostos aumentam para trabalhadores e consumidores. Não é surpre-
gerar mais bens públicos. sa que a responsabilidade social e econômica
Antes de Darwin publicar On the Origin e a sustentabilidade ambiental tenham sido
of Species by Means of Natural Selection ou Pre- percebidas como algo que o governo deva re-
servation of Favoured Racer in the Struggle gular ou uma tarefa para uma instituição be-
for Life em 1859, uma obra que explicou sua neficente (ver o Capítulo 10, Administração
visão evolucionária da biologia, Smith de Modo Sustentável: Ética e Responsabilida-
(1961[1776]), economista político e filósofo de Social Corporativa.)
reconhecido como o pai do capitalismo, de- As visões de Adam Smith certamente ti-
fendeu que o progresso e crescimento econô- veram muita influência. Veja as reportagens
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 83

sobre o comportamento corporativo para A PERCEPÇÃO NO TRABALHO


traçar paralelos com as noções de sobrevi-
vência do mais forte, a centralidade do in- Em termos gerais, Percepção é o processo
teresse próprio e a busca primordial pela ri- toda administração de receber, responder a,
queza econômica como finalidade da ativi- começa pela percepção, processar, armazenar e
usar estímulos para com-
dade humana. Hoje, este conjunto de cren- porque administra- preender e elaborar nos-
ças supõe que as ações econômicas em be- mos o que achamos sa visão do mundo. Os es-
nefício próprio estão na base racional do que percebemos estar tímulos podem ser expe-
riências por meio de qual-
comportamento humano. Portanto, estamos acontecendo. quer um dos sentidos,
a um pequeno passo da afirmação de que A Figura 1.1 re- como visão, audição, ol-
nossa racionalidade é formada, deste modo, presenta um modelo fato, paladar e tato.
como uma característica constituinte de básico de processa-
nossa natureza humana. Tomando Darwin mento de informações. O modelo mostra de
e Smith como autoridades, alguns estudio- forma simplificada o processo perceptivo de
sos como Nicholson (2000) diriam que a como lidamos com estímulos em nosso am-
competição é geneticamente uma predispo- biente. Vamos dar um exemplo para ajudar a
sição humana. racionalizar este modelo. Vamos supor que
Os valores são importantes no modo que você esteja numa festa e a música (Estímulo A)
percebemos e como interagimos. Opiniões esteja excelente – The Arctic Monkeys, Kai-
sobre o provimento do bem-estar, demissões ser Chiefs, Mike e até alguma coisa antiga
por excesso de pessoal, licença maternidade como Blur and Pulp. Você percebe que uma
ou paternidade, liberdade religiosa no local de suas colegas (Estímulo B), a quem você con-
de trabalho, impostos e tantas outras ques- sidera muito atraente, está sozinha, e você se
tões estão ligadas inextricavelmente a valo- aproxima para conversar – descobre que vo-
res, atitudes e crenças sobre o mundo, mol- cês têm tanta coisa em comum que não per-
dando o modo de vê-lo, interpretá-lo e ope- de uma palavra dela (atenção) a ponto de
rar dentro dele. Por esta razão, nossa capa- você esquecer que a música está tocando,
cidade de entender nossos valores, bem embora seja a sua música favorita (filtro) –
como os daqueles com quem trabalhamos e filtrar pode ser intencional ou subconsciente
administramos, é um dos aspectos mais im- e no fundo é a mesma coisa que a percepção
portantes para ser um gestor – tanto admi- seletiva, ou o processo de selecionar e pro-
nistrando a nós mesmos como aos outros. cessar informações consistentes com valo-
Entretanto, os valores não são pré-progra- res, crenças e atitudes de alguém. Quanto
mados; nós os desenvolvemos, os vivemos e mais você ouve a pessoa, mais coisas em co-
os compartilhamos socialmente. A forma mum você encontra, mais atraente lhe pa-
como absorvemos, processamos, armazena- rece e mais ela reforça que você acredite em
mos, adicionamos e usamos a informação é sua atração. Então, as informações cuida-
questão fundamental na pesquisa e teoria dosamente selecionadas são armazenadas e
da percepção humana. Precisamos entender processadas em relação a esquemas existen-
como o processo da percepção funciona a tes (organização). O
fim de compreender a fundo como os valo- processo de organi- Esquemas são conjun-
tos de combinações
res impulsionam o comportamento, como zação acontece por cognitivas desenvolvidas
damos sentido à nossa própria personalida- meio de esquemas. pelas interações sociais
de e à dos outros e, até, como alcançamos a O próximo passo que organizam nossos
pensamentos, emoções
felicidade. Na próxima seção, discutiremos é a interpretação: todas e atenção (Baldwin,
o processo da percepção, suas estruturas e as informações que 1992; Epstein e Baucon,
seus erros comuns. você coletou e organi- 2002).
84 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

FIGURA 1.1 Um modelo bási-


co de processamento de per-
cepção (adaptado de S.K.
Reed, 2007).

zou sobre aquela pessoa atraente (atratividade, bém conhecidos como schemata). Os esque-
sorriso, interesses mútuos, linguagem corpo- mas são usados para estruturar e organizar as
ral) foram agrupadas num conjunto de esque- informações que experimentamos em nosso
mas que compreendem um possível relacio- mundo social e são frequentemente hierárqui-
namento (seja sexual ou afetuoso) e assim você cos (meu carro é um Mini Cooper, um Mini
armazena todas estas informações como reali- Cooper é um carro
dade ou representações do que você está vi- pequeno, um carro é Esquemas pessoais
venciando. O problema é que as pessoas in- um automóvel, um são estruturas de sen-
terpretam estímulos de formas diferentes, por automóvel é um veí- tido que afetam pensa-
mento, planejamento e
vezes não da mesma forma que a sua. O que culo, um veículo é comportamento em re-
você não notou é muito importante, ou seja, um meio de trans- lação a outros indiví-
a pessoa achou você amigável e o reconhe- porte). Há vários ti- duos; existem esque-
mas/diagramas pes-
ceu de um evento anterior – não foi inte- pos de esquemas , in- soais idealizados que
resse romântico, mas simples afabilidade que clusive esquemas pes- servem como protóti-
a pessoa demonstrou em relação a você. As- soais e autoesquemas . pos e os que usamos
para estabelecer com-
sim, na sequência, você se depara com pala- Você se acha uma parações com todas as
vras que você nunca esperava ouvir. “Este é pessoa aberta, honesta outras pessoas (veja
meu namorado, vou lhe apresentar, vocês e atraente, então não se Horowitz, 1991).
vão se dar bem”. Todas as informações que surpreenda se uma pes-
você armazenou sobre um possível interesse soa em uma festa tam-
Autoesquemas são auto-
amoroso são recuperadas e reinterpretadas. bém lhe achar atraen- conceitos específicos que
O que antes você achou que era “real”, não te: auto-esquemas são possuímos sobre nós
é mais e então precisa reanalisar e atualizar importantes para nos- mesmos e que acredita-
mos ser autodescritivos
suas informações. É claro, alguns não fazem sa personalidade e in- e extremamente impor-
isto, e ainda se atém à crença original – neste cluem autoesquemas tantes de se possuir
exemplo, se você o fizesse, correria o risco idealizados e autoes- (Markus, 1977; Forg e
Markus, 1982).
de seu comportamento ser considerado quemas projetados.
como assédio. Outros tipos de
Um comportamento muito importante no esquemas incluem es- Esquemas documentais
processamento de informações perceptual são quemas documentais, es- referem-se a esquemas
os esquemas, porque eles atestam de muitas quemas sociais e esque- sobre a maneira como
operamos em nosso
formas o que abordamos neste capítulo – nos- mas de papéis. Todos mundo, como compreen-
sos valores, nossa personalidade e nossas emo- nós temos scripts, de- demos e memorizamos
ções podem estar ligados aos esquemas (tam- rivados de esquemas informações.
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 85

documentais que nos Esquemas sociais, como para pessoas com boa habilidade na língua
permitem funcionar o nome sugere, refe- inglesa. O cérebro lê a primeira e última letra,
em nossas vidas diárias rem-se ao nosso conhe- combina as palavras de um dos lados e rapi-
cimento social (como o
– temos scripts para ir conhecimento sobre damente apela para scripts de linguagem que
ao restaurante, à uni- questões públicas, leis, se encaixam na ideia geral do texto. “The ha-
versidade, para andar política, mídia, as artes mun brian” não faz sentido (a menos que al-
e tudo o que for social-
de bicicleta, etc. mente importante). guém realmente se chame Hamun Brian),
(Schank e Abelson, então seu cérebro procura a melhor combina-
1977). Em todas estas situações existem con- ção, “the human brain”.
dições (como ir ao restaurante porque você está Para os psicólogos cognitivos, esquemas,
com fome, você tem dinheiro para pagar pela como já mencionamos, são combinações bá-
comida e o restaurante tem comida), papéis sicas que contêm informações sobre nossos
padrões para atores principais (você é a estrela valores, a forma como nos vemos como pes-
desempenhando o papel principal de cliente) e soas, como percebemos os outros, como nos
para atores coadjuvantes (garçonete, chefe adaptamos e reagimos a mudanças, como ope-
de cozinha e outros clientes), acessórios (me- ramos em nosso mundo e como vivemos as
sas, cadeiras, etc.) e resultados (o ator prin- emoções. Os esquemas são tão poderosos que
cipal ficou com me- evidenciam que são um dos componentes mais
Esquemas de papéis re-
nos dinheiro, mas ferem-se a esquemas importantes da terapia comportamental cog-
não está mais com sobre compor tamento nitiva. A terapia de esquemas é usada para re-
fome) (Reed, 2007). adequado e inadequado velar e desfazer os processos de pensamento e
em contextos específicos
Desenvolvemos estes (por exemplo: o papel da estruturas básicas de pessoas e para transplan-
scripts a partir de es- mulher como mãe, filha, tar aqueles psicologicamente mais sadios (Gi-
quemas sociais e es- profissional, esposa, esen-Bloo et al., 2006; Young et al., 2003).
amiga, etc.).
quemas de papéis . Vamos rever os esquemas mais tarde neste con-
Uma vez estabelecidos nossos esquemas, texto quando tratarmos da personalidade e
torna-se cada vez mais difícil mudá-los e falsi- também da busca pela felicidade. Veremos
ficá-los, isto é, nossa tendência é prestar aten- agora como a percepção e os esquemas po-
ção às informações que reafirmam ou se adap- dem ser problemáticos, especialmente em con-
tam a nossos esquemas, em vez de questioná- textos de trabalho.
los sempre que experimentamos informações Provavelmente, não há melhor exemplo da
que os contradizem (Reed, 2007). Como forma como os esquemas estruturam nossos
exemplo, tente a questão abaixo, antes de pros- entendimentos, crenças e valores do que o
seguir com a leitura. Este exemplo funciona debate da ciência versus religião, da evolução

O QUE QUER DIZER?

The Hamun Brian is so Azaming, as Inog “The human brain is so amazing ...”. Contudo, se
as the Frist and Isat Iteter is the Smae yuo você ler a frase exatamente como as letras apa-
wlil Mkae Snese of the Snetecne! recem, verá que a maior parte não faz sentido. O
que você acha que vê e o que realmente ali está
Esta frase é um exemplo da forma como os es- são duas coisas diferentes.
quemas são organizados e influenciam a percep-
ção pela percepção seletiva. Seu cérebro auto- (©Tyrone S. Pitsis (2008) Organizational Bahavi-
maticamente completa as informações para você, or in Practice. Tutors Guide for the Executive MBA.
para que haja sentido – muitas pessoas verão U. of Tecnology, Sydney).
86 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

versus criacionismo. O argumento a favor ou ra definir e explorar alguns erros que come-
contra o design inteligente (DI) é um destes temos em julgamentos, interpretações, su-
debates. Atualmente existe um movimento posições e crenças sobre nosso mundo so-
forte nos EUA que busca incluir DI como cial, as pessoas inseridas nele e nosso lugar
parte integrante do currículo evolucional. Na no referido mundo. Neste capítulo, discu-
melhor das hipóteses, os proponentes de DI tiremos a estereotipagem, profecias autor-
querem que seja lecionado juntamente à teo- realizáveis, o efeito estereotipagem, erro de
ria evolucionária de Darwin, na pior, querem atribuição e dissonância cognitiva. Todos
que substitua completamente os ensinamen- estes erros têm implicações importantes, não
tos sobre a evolução. O principal argumento só em nossas funções como administrado-
é que Deus (uma entidade inteligente) proje- res, mas na vida em geral.
tou o mundo e os humanos e que grande par- O primeiro erro
te deste projeto pode ser cientificamente tes- de percepção é a este- A estereotipagem refe-
re-se ao processo de
tado e subtestado para (a) provar que Deus reotipagem. Na realida- agrupar objetos em ca-
existe e (b) para provar que a teoria evolucio- de, enquanto muitos tegorias simplificadas,
nária está errada. Aqui temos um exemplo dos livros-texto apresen- com base em percep-
ções generalizadas de
argumentos usados: tam a estereotipagem alguém sobre aqueles
como um erro, ela objetos.
A visão cristã do mundo começa com a Cria- serve como um im-
ção, com um ato deliberado de um Ser pessoal portante processo para lidar com informa-
que existiu por toda a eternidade. Esta dimen- ções de uma maneira adequada e nem sem-
são pessoal é fundamental para o entendimen- pre é negativa.
to da Criação. Antes de trazer o mundo à exis- A estereotipagem ocorre mais comumente
tência, o Criador fez uma escolha, tomou uma na ausência de um número suficiente de da-
decisão: Ele elaborou um plano, um design in- dos sociais para se fazer uma avaliação bem
teligente (Colson e Pearcey, 1999). informada (Kawakami et al., 1998). Os este-
reótipos são problemáticos quando os obje-
A ciência, é claro, rejeita tais informações e tivos que estereotipam forem complexos,
organizações, instituições como a National como as pessoas tendem a ser. As questões
Science Teachers’ Association e US National mais comuns sobre estereotipagem giram em
Academy of Science reagiram dizendo que DI torno da cultura e raça. Exemplos de lin-
não é uma ciência, e de fato alguns a denomi- guagem sobre estereotipagem incluem afir-
nam Ciência Fajuta. Ironicamente, as próprias mações explícitas que pretendem ser positi-
coisas que DI defende ou a que se opõe con- vas e que são, no entanto, falsas e racistas
tradizem o design inteligente; por exemplo, a de forma velada: “os irlandeses adoram ba-
existência e extinção da maioria dos dinossau- tatas”, “os ingleses não tomam banho fre-
ros, a presença da doença mental e física e o quentemente”, “os norte-americanos são es-
argumento de que todo ser humano na Terra palhafatosos e detestáveis”, “asiáticos estu-
teve sua origem em Adão e Eva (ou seja, so- dam muito e dirigem carros caros”. Por ou-
mos resultado de produção interna), são pro- tro lado, muitas vezes a estereotipagem pode
vas fracas de design inteligente. ser explicitamente racista e abertamente
ofensiva: “Os mexicanos são preguiçosos”,
“os árabes são terroristas” e assim por dian-
PERCEPÇÃO E ERROS COMUNS te. A estereotipagem também se relaciona
às funções das pessoas com base no gênero.
Munidos do entendimento básico da per- Por exemplo, atualmente na Austrália, no
cepção, seu processo e estrutura, vamos ago- Reino Unido e nos Estados Unidos ainda
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 87

existe diferença de gênero em termos de igual- os pesquisadores escolheram aleatoriamente


dade de salários, mesmo após 100 anos de 20% dos alunos de 18 turmas diferentes e fa-
movimento dos direitos da mulher. Apesar laram aos professores que os escolhidos eram
de a situação estar realmente melhorando, estudantes dotados e que exibiriam progres-
as mulheres recebem aproximadamente 80% sos em suas habilidades acadêmicas com o tem-
do que os homens recebem pela mesma fun- po. Os estudantes retornaram à sala de aula e
ção e cargo (Iyer e Ryan, 2006; Joo-Kee, no final do ano mostraram significativo pro-
2006; Taylor, 2006). gresso. Entretanto, o que causou a melhora?
Muitas vezes, para evitar a estereotipagem, Os professores trataram os alunos dotados de
pede-se às pessoas que acabem com seu com- modo diferente porque foram percebidos
portamento estereotipado. Em estudos sobre como dotados. Sentavam perto do professor,
pessoas preconceituosas descobriu-se que, en- recebiam mais atenção e geralmente eram tra-
quanto a supressão funciona em curto prazo, tados de forma diferente do outro grupo não
sua tendência é de funcionar apenas com in- selecionado. Os estudantes “normais” foram
divíduos altamente motivados que querem pa- vistos como menos brilhantes e receberam
rar de estereotipar as pessoas. Em longo pra- menos tempo para responder às perguntas, e
zo, até as pessoas motivadas tendem a voltar à certas qualidades foram atribuídas a seu com-
estereotipagem (Wyer, 2007). Na verdade, pes- portamento porque foram diferenciados. A
soas não preconceituosas tendem a não este- implicação para nós como administradores é
reotipar, independentemente de estarem mo- que facilmente permitimos que nossas profe-
tivadas ou não (Wyer, 2007) e até mesmo cias autorrealizáveis obscureçam nosso julga-
quando não possuem dados sociais elas ainda mento sobre as pessoas, assim podemos rotu-
evitam estereotipar (Kawakami et al., 1998). lar algumas pessoas como realizadoras e com
Buscar mais informações sobre os outros e perfil de membro de equipe e outras ao con-
aprender a respeito de suas culturas e subcul- trário – portanto, começamos a tratar as pes-
turas, o conhecer e viver com outros povos, soas de modo diferente e a profecia se realiza.
comunicar-se abertamente e praticar a empa- A fim de evitar tais profecias autorrealizáveis,
tia, são meios de evitar a estereotipagem de precisamos ter cuidado para que a forma como
pessoas. julgamos as pessoas seja baseada em informa-
Os seguintes erros O conceito de profecia
ções sadias, seja feita com precisão, reflexão
de percepção vêm das autorrealizável foi origi- crítica, equidade e justiça.
profecias autorrealizáveis. nalmente concebido pelo Assim como na
sociólogo Robert Merton O conceito do efeito de
A profecia autorreali- (1957), para se referir ao
profecia autorrealizá-
estereotipagem foi pri-
zável afeta tanto a for- processo pelo qual uma vel, o efeito de estereoti- meiramente desenvolvi-
ma como percebemos pessoa que possui uma pagem também com- do pelo psicólogo
crença ou expectativa, Edward Thorndike
os outros e como agi- independentemente da
preende o preconcei-
(1920) e refere-se ao
mos e interagimos validade da mesma, faz to no ato de julgar, o processo pelo qual, caso
com eles, quanto a com que essa predição que afeta o comporta- cer tas características
se torne realidade, por- sejam atribuídas a uma
forma como nos per- que as pessoas se com-
mento.
pessoa em uma situa-
cebemos e agimos co- portam e agem como se Um exemplo po- ção, com base em uma
nosco mesmo. Um assim o fosse. deria ser a nossa ex- dada condição, tende-se
dos estudos mais fa- pectativa de que um a aplicá-las a essa pes-
soa em outras situações
mosos sobre a profecia autorrealizável foi o comediante engraça- e outras condições.
estudo seminal de Rosenthal e Jacobson do no palco seja en-
(1992) sobre o efeito Pigmaleão – um experi- graçado em todos os contextos e seja geral-
mento que sob hipótese alguma seria permiti- mente mais feliz do que nós, mais positivo e
do no mundo de hoje. Em seu experimento, boa companhia. Ou porque alguém dirige um
88 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

carro luxuoso e veste um terno, deve ser rica e Outro compo- A atribuição externa re-
bem-sucedida. Em termos de negócios e CO nente da atribuição é fere-se a atribuir a cau-
o efeito de estereotipagem parece ser predo- a estabilidade: se per- sa de um comportamen-
to individual a um fator
minante. A publicidade espalhafatosa de ne- cebermos as causas externo ou situacional,
gócios vistos como bem-sucedidos cria uma atribuídas como está- como ser “católico” ou
aura ao redor deles. Por exemplo, “Cisco” foi veis, então esperare- “judeu”.
uma das companhias mais populares e, fre- mos o mesmo resulta-
quentemente, considerada como exemplo de do daquele comportamento numa próxima
como os negócios devem operar – até, é claro, vez. Pelo contrário, se a causa atribuída for
a Cisco ter seus problemas financeiros (Ro- instável, esperaremos que os resultados vari-
senzweig, 2007). De modo semelhante, a En- em na próxima vez. O componente final refe-
ron havia recebido uma série de elogios bem re-se ao ato de controle: se acreditarmos que a
pouco antes de seu colapso histórico, portan- situação é controlável, então iremos supor que
to precisamos ser céticos e cuidadosos ao usar na próxima vez poderemos controlar o resul-
exemplos como prova tado: se a situação for incontrolável, acredita-
O efeito perverso refere-
se a imputar, de maneira
de sucesso. É interes- remos então que ela provavelmen-
geral, interpretações ne- sante notar que um te não pode ser alterada, indepen-
gativas a pessoas com efeito semelhante e dentemente de nossos esforços (veja
base em um traço nega-
tivo de determinada si-
menos abordado é o Weiner, 1980;
tuação (por exemplo, o efeito perverso. 1992). A pesquisa
caso de um homem Os dois últimos mostra como atri- Visite ww.uk.sagepub.com/
managingandorganizations/
egresso da prisão que
não consegue emprego
erros de percepção buímos motiva- para acesso gratuito a um ar-
quando isso é divulgado, que tendemos a co- ções negativas a tigo de Glenn D. Reeder e
mesmo que tenha cum- meter são os erros de pessoas de quem seus colegas se quiser
aprender sobre pesquisas
prido sua pena).
atribuição e de disso- discordamos e per- interessantes sobre George
nância cognitiva. Vamos começar pelo erro de atri- cepções mais favo- Bush e sua decisão de ir a
buição; para isso, precisamos primeiro falar ráveis àquelas com guerra do Iraque e sobre ati-
tudes em relação a casa-
sobre a teoria da atribuição. quem concorda- mento gay e aborto.
A teoria da atribuição mos. Portanto, se
A teoria da atribuição, aborda o modo como concordarmos com a guerra ou o casamento
em sua definição mais explicamos nosso pró- gay, provavelmente atribuiremos motivações po-
simples, refere-se ao
modo como as pessoas prio comportamento e sitivas àqueles que também sustentam nossas
“atribuem” sentido (cau- o comportamento dos percepções e atitudes.
se) a seu próprio com- outros em nossa vida, No âmbito da atribuição, estamos propen-
por tamento e ao com-
por tamento de outros com base em dois tipos sos a dois erros-chave.
(Heider, 1958). gerais de atribuições. O primeiro é o erro fun- O erro fundamental de
Mais adiante, conside- damental de atribuição . atribuição é a tendência
de fazer atribuições inter-
raremos o lócus interno e externo de controle, Quando vemos al- nas ao explicar as cau-
uma teoria cognitiva social da personalidade. Na guém fracassar ou agir sas do comportamento
essência, o lócus de de certa forma, acre- dos outros.

A atribuição interna re-


controle é uma teoria ditamos que seja de-
fere-se à explicação ou de atribuição de perso- vido à sua personalidade, atitude ou disposi-
atribuição da causa de nalidade. A teoria da ção. Por exemplo, nos últimos anos, pesqui-
comportamento de um atribuição envolve três sas têm mostrado que ao se falar sobre crimes
indivíduo devido a fato-
res internos ou de dispo- componentes gerais, de estupro as pessoas culpam as próprias víti-
sição, tais como ser sendo uma delas as atri- mas devido ao seu modo de vestir, influência
mesquinho ou generoso. buições internas/externas. de drogas e/ou álcool – e, portanto, sem con-
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 89

trole de seu próprio comportamento, ou de- desenvolver armas de destruição em massa, ele
vido à escolha da profissão, no lugar de culpar sentiu ansiedade e arrependimento – suas su-
as causas externas tais posições iniciais eram de que suas descobertas
como o ato criminoso Quando um viés de au- iriam levar a uma novas formas de geração de
toproteção (self-serving
e o comportamento bias) se apresenta, as energia, e não a uma possível destruição da
antissocial de outra pessoas atribuem seus humanidade e à morte de milhões de pessoas
pessoa (Vanderveen, próprios sucessos a (Braun e Krieger, 2005). Festinger (1957) foi
causas internas e seus
2006). Relacionada fracassos a causas ex- uma das primeiras pessoas a desenvolver e es-
ao erro de atribuições ternas. tudar a teoria da dissonância cognitiva. O es-
está a noção de self- tudo de Festinger, embora bastante antigo, não
serving bias, isto é, um viés de autoproteção. é apenas essencial para o entendimento da
Vamos supor que você faça uma entrevista dissonância cognitiva, mas é também fascinan-
de emprego e o consiga. Você poderá acreditar te. Junto a alguns colegas, ele estudou o com-
que conseguiu porque foi bem na entrevista, portamento e as cognições de determinado
possui todas as qualificações e habilidades ne- culto que afirmava saber a data do fim do
cessárias e sabe executar o trabalho. Mas supo- mundo e que esse fim se daria pelas enchen-
nhamos que você não conseguiu o emprego. Você tes. Muitas pessoas se convenceram e aderiri-
atribui o seu fracasso às perguntas mal formula- am ao culto, algumas com total comprometi-
das da entrevista, a alguém da banca que não mento, enquanto outras, com menos. Após
gosta de você, às perguntas que foram ridículas ter passado a data prevista, sem enchente ou
ou ao fato de que o cargo já havia sido preenchi- destruição, o que você acha que aconteceu?
do internamente. O erro de atribuição funda- Aqueles que não estavam muito convencidos
mental e a tendência à autoproteção são impor- acreditaram que haviam sido enganados e
tantes conceitos sobre os quais precisamos refle- abandonaram o culto. Mas um bom número
tir quando administramos pessoas e especialmen- ficou ainda mais fiel alegando que, na verda-
te quando fazemos julgamentos sobre seus com- de, foram sua fé e suas orações que impedi-
portamentos baseados em suas atribuições in- ram as enchentes.
ternas. Praticar a empatia colocando-se no lugar Portanto, quando as pessoas experimen-
do outro, tentando entender suas perspectivas, tam a dissonância cognitiva, elas procuram re-
e tentar responder pelas causas externas do com- conciliar seus sentimentos de ansiedade e des-
portamento são boas formas de evitar erros de conforto mudando suas crenças ou reinterpre-
atribuição. tando as informações que as contradizem (Fes-
O último tipo de tinger, 1957; Festinger e Carlsmith, 1959).
erro de percepção é a A dissonância cognitiva Existem implicações interessantes que surgem
dissonância cognitiva . refere-se à ansiedade e da dissonância cognitiva. Digamos que você
Geralmente não sen- ao desconforto que ex-
perimentamos quando
decida estudar uma matéria, percebe que ela é
timos a dissonância mantemos conjuntos de realmente difícil, então você luta e se esforça
até experimentarmos cognições (ou esque- muito e consegue ser aprovado, mas não mui-
informações confli- mas) inconsistentes e
conflitantes.
to bem. Agora digamos que esteja estudando
tantes e não confir- outra matéria muito fácil. Nem precisa estu-
madas. Por exemplo, um devoto pode contes- dar muito e passa com facilidade. O que a teo-
tar sua fé após sofrer uma tragédia em sua vida; ria da dissonância mostra é que o primeiro
pode questionar sua crença em Deus e na sua caso cria a dissonância porque você escolheu
religião. Pode se perguntar, “Por que Deus fez uma matéria e a achou difícil; portanto, redu-
isso comigo?” De modo semelhante, Alfred ziu a dissonância ao dizer “embora difícil, es-
Einstein desenvolveu a teoria da relatividade, tou aprendendo muito e vale a pena”. De ou-
mas quando seus estudos foram usados para tro lado, suas emoções em relação à matéria
90 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

MOMENTO PARA EXERCITAR

Suposições e inferências 2 Com muita frequência não distinguimos entre


nossas inferências e observações quando es-
1 Raramente questionamos o que sabemos.
tamos percebendo os objetos. Olhe a figura
Geralmente as pessoas falam em dualismos (por
abaixo, à esquerda. Que observações são ver-
exemplo, preto ou branco, A ou B, ou ... ou).
dadeiras em relação a ela?
Se o mundo é tão simples, tente este exercí-
cio: para cada item tente incluir o conceito que AFIRMAÇÕES
representa o meio-termo.
1 A caixa A possui coisas para comer.
2 Há 3 caixas.
(a) Bem __________________ Mal
3 A caixa B deve ser manuseada com cuidado.
(b) Seguro __________________ Inseguro
4 A caixa C é maior que a A e a B.
(c) Honesto __________________ Desonesto
5 A caixa C é mais pesada.
(d) Nós __________________ Eles
O fato é que apenas as informações 2 e 4 são
(e) Feliz __________________ Triste
observações, o restante são influências basea-
das em nossas suposições e interpretações.
Achamos difícil pensar numa forma de cate-
Supomos que haja comida na caixa A, porque
gorizar as pessoas e seus comportamentos.
lemos ALIMENTOS na caixa, supomos que a
Caso elas não se encaixem num extremo, a
caixa C é pesada, e a B é perigosa devido a
tendência é encaixá-las no extremo oposto.
nosso conhecimento sobre dinamite. Na pró-
Pense nas mais diversas situações em que
xima vez que fizer julgamentos, veja se pode
você faz este tipo de categorização das pes-
distinguir entre observação e inferência. Como
soas.
as inferências afetam suas observações? Po-
demos realmente separar inferências de ob-
servações? (Esta é uma velha questão na filo-
Caixa C sofia da ciência.)

Caixa B Estes exercícios são adaptados do Programa de


Interação da Comunicação da Fala da Universi-
dade Estadual de Oklahoma. Você não pode
Caixa A
Cimento deixar de visitar seu excelente site: http://
Dinamite scip3.okstate.edu. Contém vários recursos, módu-
Alimento los e discussões sobre uma variedade de tópicos
como a percepção, comunicação e experiência.

em que você se deu bem são menos intensas. vamente o que experimentamos para que se
A dissonância cognitiva é importante para o ajuste ao que já sabemos (Pitsis e Clegg, 2007;
processo de dar feedback às pessoas, porque Weick, 2004). O processo de percepção é im-
seu comprometimento com a tarefa, suas cren- portante e mostra que podemos cometer er-
ças, opiniões e expectativas determinarão ros com frequência. Muitas vezes esses erros
como elas irão reagir ao feedback. ocorrem porque nossas ideias se baseiam em
É muito interessante notar que raramente crenças irreflexivas e fazemos suposições e
nos perguntamos o que sabemos, como fica- inferências com base nestes sistemas de cren-
mos sabendo e o que achamos que sabemos, ças em lugar da decisão informada (veja os
porque assumimos determinadas coisas como dois exemplos no quadro acima Momento
certas, como, por exemplo, nosso conhecimen- para Exercitar).
to, experiências, valores e crenças; consequen- Uma última palavra: tudo o que discuti-
temente percebemos e reinterpretamos seleti- mos em relação à percepção é o que de certa
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 91

forma nos torna humanos. Nossas imperfei- mesmo tempo os valores próprios e os dos
ções, criatividade, excentricidade são o que nos outros. Entender os valores é atributo funda-
torna únicos, e a realidade é que alguns dos mental da administração de hoje. Além disso,
mais influentes teóricos, pesquisadores e líde- devemos também entender e apreciar como
res do mundo interpretaram coisas e as racio- nossos valores filtram as informações e criam
nalizaram de modo completamente diferente conhecimento, colorindo o mundo que vemos
do que faria a maior parte das pessoas. Além como se houvesse lentes coloridas. Nem to-
do mais, muitas questões relativas à percep- dos veem as coisas do mesmo modo. Embora
ção são essenciais para lidar com os estímulos existam muitas teorias e abordagens a respei-
que nossa mente recebe, em quantidade pra- to de valores, examinaremos o relato de
ticamente infinita. Assim, precisamos questio- Schwartz (1992) sobre o papel que os valores
nar seriamente que “erros” de percepção são universais desempenham em nível pessoal. Es-
funcionais ou disfuncionais. colhemos Schwartz por dois motivos: primei-
Percepção e cognição são definitivamente ro, porque seu livro apoia grande parte da
áreas fascinantes da pesquisa e teoria, embora pesquisa sobre valores hoje em CO, ainda que
nossa discussão sobre a percepção termine seu papel não seja muito destacado, embora
aqui. Entretanto, você agora possui fundamen- tenha desenvolvido sua teoria de valores a par-
tos sólidos para o restante da leitura, uma vez tir de uma amostra de mais de 60 mil pessoas
que grande parte do que foi abordado neste de todo o mundo (Schwartz, 1994); e segun-
tópico encontra fundamento nos estudos de do, seu trabalho é reconhecido e respeitado
percepção e esquema (eu, pessoa, função, so- na psicologia. De fato, acreditamos que nos
cial, scripts e assim por diante). Então, está na próximos anos o modelo de Schwartz sobre
hora de examinarmos valores, personalidade valores se tornará uma ferramenta dominante
e emoção. para entender os valores das pessoas – sejam
funcionários ou clientes – e alinhar os pró-
prios valores da organização a esses valores.
ADMINISTRAÇÃO DOS Diferentemente dos modelos de valores que
vimos no Capítulo 6, o modelo de Schwartz
VALORES PESSOAIS claramente distingue valores individuais de va-
lores culturais – o mesmo não ocorre com o
Para muitos estudiosos, os valores podem ser de Hofstede, Trompenaars ou Hampden-Tur-
considerados como a base da cultura (Howard, ner, orientados em um nível cultural mais
1988: 271-274; veja também pp. 280-283). amplo de análise. Na próxima seção, fornece-
Entretanto, os valores também podem ser remos a base necessária sobre a teoria dos va-
compreendidos dentro do contexto da admi- lores para que possa iniciar a administrá-los.
nistração de pessoas. Para formar, sustentar e
melhorar os relacionamentos com as pessoas
ou motivá-las, precisamos entender o que é e Valores
o que não é importante para elas. Como vi- Valores são crenças
consistentes de uma
mos na seção anterior, os valores não apenas Então, que são valores? pessoa ou grupo sobre
impulsionam o comportamento, mas também As pessoas são ani- algo no qual aplicam um
afetam e são afetados pela forma como perce- investimento emocional.
mais sociais vivendo Schwartz define valores
bemos e damos sentido ao nosso mundo. Em num estado de tensão como metas desejáveis,
termos amplos, a administração tem a ver com entre valores associa- variando em impor tân-
administrar pessoas de uma forma coordena- cia, que servem de prin-
dos com sua indivi- cípios norteadores para
da, a fim de garantir que os resultados organi- dualidade e valores as- a vida do ser humano
zacionais sejam alcançados, assegurando ao sociados com a con- (Schwartz, 1992; 1994).
92 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

formidade social (Aronson, 1960). Os valo- ou comprometidos. Na verdade, aqui o papel


res podem criar tensão porque alguns valo- do administrador se torna mais difícil: admi-
res que impulsionam nosso comportamen- nistrar e compartilhar o entendimento de va-
to como indivíduos não estão em consonân- lores, seja de um colega de trabalho, cliente,
cia com outros que regulam nosso compor- alguém hierarquicamente superior ou de ou-
tamento social. tras organizações. Entender valores é impor-
Por exemplo, grandes astros do futebol tante para ajustar o CO e administrar pessoas.
ganham mais dinheiro numa semana do que Por exemplo, se você for o técnico do time de
a maioria ganha numa vida inteira. Eles têm futebol inglês, preparando-se para a Copa do
tudo que querem para uma vida de excessos Mundo FIFA na África do Sul em 2010, como
competindo com outros jovens ricos e em boa administraria a vida privada de seus jogadores
forma. Não é surpresa que demonstrem va- diante dos paparazzi? Qualquer desejo dos
lores altamente competitivos e também va- jogadores pode ser facilmente satisfeito por-
lores baseados no trabalho de equipe. A ca- que são ricos, ficam entediados quando não
minho do sucesso, por vezes, seus valores com- estão jogando ou treinando e estão sempre
petitivos entram em conflito com as normas prontos para se envolverem em alguma ação
sociais. Além disso, às vezes, as normas da equi- de maior apelo.
pe que estimulam o compartilhamento com Schwartz (1992) Valores trans-situacio-
o outro podem entrar em conflito com as nor- identifica alguns valo- nais são aqueles que
não mudam, indepen-
mas sociais que respeitam a individualidade e res como “trans-situaci- dentemente da situação
privacidade dos outros, particularmente quan- onais”. Por exemplo, se em que você se encon-
do alguém entra em contato com pessoas fora você valoriza a vida e tra; eles o acompanham
sempre, aonde quer que
do seu círculo, as quais geralmente são seus a liberdade acima de você vá.
admiradores fanáticos. Uma série de casos fa- qualquer coisa e um
mosos de violência sexual por esportistas dia vê uma marcha em protesto contra a en-
profissionais ilustram este ponto. Por exem- trada de seu país na guerra, você provavelmen-
plo, da perspectiva dos valores sociais pode- te participará do protesto. Pode acontecer que,
se talvez considerar os jovens jogadores de num outro dia, você veja seu time de futebol
futebol como pessoas que recebem dinhei- ganhar com mais uma extraordinária vitó-
ro demais, têm excesso de apelo sexual, são ria. Neste momento, seus valores de vida e
imaturos e com pouca educação, enquanto liberdade podem não ocupar a linha de fren-
na perspectiva dos valores individuais, eles te de seus pensamentos, mas será que isso
são supercompetitivos e, portanto, devem significa que você deixou de dar valor à vida
ser recompensados adequadamente, mas e à liberdade ou passou a considerá-las me-
apresentam alguns problemas, mais relacio- nos importantes?
nados ao ajuste às normas sociais do que aos Valores parecem ter um forte aspecto
valores de equipe. motivador. Rokeach (1968; 1973) afirma
Os valores possuem um componente pes- que os valores orientam nosso comporta-
soal e um componente social. Por vezes aqui- mento na vida.
lo que nós, enquanto indivíduos, valorizamos Schwartz (1992) identificou uma série de
pode não ser valorizado pela sociedade e vice- tipos de valores motivadores, organizados de
-versa – a interação dos valores pessoais (au- acordo com um conjunto de valores associa-
toesquema) e valores sociais (esquema social) dos. Identificou 10 valores universais que acre-
podem resultar em tensão, pois os valores dita pertencerem às pessoas e aos povos. Al-
são algo que mobilizam fortemente os indi- guns deles são mutuamente exclusivos, mas
víduos. Em geral, as pessoas ficam muito muitos se sobrepõem, o que ele chama de
frustradas quando seus valores são ameaçados “contínuos”. Devido ao fato de que os valores
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 93

se sobrepõem, as pessoas se comportam e rea- Você lembra que Prioridades de valores


referem-se à ordem de
gem de modo diferente a certas coisas na dissemos que os 10 ti- valores em termos de
vida. Estude cada uma das representações pos de valores são uni- sua impor tância para
dos tipos de valores de Schwartz na Tabela versais e que todos nós nós, como indivíduos.
1.1 por um momento e observe seus valores possuímos estes valores. Entretanto, o que di-
associados. fere são as prioridades de valores.

TABELA 1.1 Valores de Schwartz por tipo e significado associado


Tipo de Valor Descrição Valores Associados
REALIZAÇÃO Valorização do sucesso pessoal Sucesso (alcance de meta)
pela demonstração de Capacidade (competência, eficácia, eficiência)
competência de acordo com Ambição (muito trabalho)
padrões sociais. Influência (a habilidade de influenciar pessoas
e eventos)
BENEVOLÊNCIA Preservação e melhoria do Assistência (trabalhar para o bem-estar dos
bem-estar das pessoas com outros)
quem temos contato pessoal Honestidade (autenticidade, sinceridade)
frequente Disposição para perdoar (perdoar os outros)
Lealdade (fidelidade aos amigos, grupo)
Responsabilidade (ser responsável, confiável)
CONFORMIDADE Contenção nas ações, Polidez (cortesia, boas maneiras)
inclinações e impulsos que Obediência (comprometimento,
possam desapontar ou cumprimento das obrigações)
prejudicar os outros e que Autodisciplina (autocontrole, resistência
possam violar expectativas à tentação)
ou normas sociais Honrar os pais e os mais velhos
(mostrando respeito)
HEDONISMO Status social e prestígio, prazer Prazer (gratificação dos desejos)
e gratificação para si próprio Prazer na vida (comida, sexo)
PODER Status social e prestígio, Prazer social (controle sobre outros,
controle ou domínio sobre domínio)
pessoas e recursos Autoridade (o direito de liderar ou comandar)
Riqueza (posses materiais, dinheiro)
SEGURANÇA Segurança, harmonia e Segurança da família (proteção das pessoas
estabilidade da sociedade, amadas)
das relações e do eu Segurança nacional (proteção contra os
inimigos)
Ordem social (estabilidade da sociedade)
Higiene (limpeza, organização)
Reciprocidade de favores (evitar dívidas)
AUTONOMIA Pensamento e ação Criatividade (exclusividade, imaginação)
independentes Liberdade (liberdade de pensar e agir)
Independência (autoindependência,
autoconfiança, autossuficiência)
Curiosidade (explorar)
Escolha das próprias metas (escolher sua
própria direção na vida e ter liberdade de
escolha)
(continua)
94 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

TABELA 1.1 Valores de Schwartz por tipo e significado associado (continuação)


Tipo de Valor Descrição Valores Associados

ESTÍMULO Emoção, novidade e desafio Ousadia (arriscar)


na vida Uma vida variada (desafio, novidade,
mudança)
Uma vida emocionante (experiências
estimuladoras)
TRADIÇÃO Respeito, comprometimento e Humildade (modéstia, autoanulamento)
aceitação de costumes e Aceitação do seu quinhão na vida
ideias trazidas pela cultura (submissão e aceitação das circunstâncias
tradicional e religião da vida)
Devoção (apegar-se à fé e à crença religiosa)
Respeito pela tradição (preservação dos
costumes honrados pelo tempo)
Moderação (evitar extremos sentimentos e
ações)
UNIVERSALISMO Entender, apreciar, tolerar e Mente aberta (tolerante a ideias e crenças
proteger o bem-estar de diferentes)
todas as pessoas e da Sabedoria (entendimento maduro da vida)
natureza Justiça social (correção da injustiça, proteção
dos fracos)
Igualdade (oportunidade igual para todos)
Um mundo de paz (livre de guerra e de conflito)
Um mundo de beleza (beleza da natureza e
das artes)
União com a natureza (harmonia com a
natureza)
Protegendo o meio ambiente (preservando
a natureza)
Fonte: Adaptado de Schwartz (1992; 1996) e Rohan (2000).

Muitas pesquisas apoiam as opiniões de seus valores são priorizados de modo diferen-
Schwartz sobre os valores e têm demonstra- te (Keele e Wolak, 2006) e a forma como pri-
do que todos nós temos mais ou menos os orizamos nossos valores exerce forte influên-
mesmos conjuntos de valores – independen- cia no fato de confiarmos ou não em institui-
temente da cultura, gênero e religião ções como igrejas, governos, etc.(Devos et al.,
(Schwartz, 1996). Entretanto, di- 2002). Por esta razão, tem havido grande in-
ferimos quanto às prioridades que teresse na última década em entender os valo-
atribuímos a nossos valores (Ro- res, especialmente nos cenários organizacio-
han, 2000). A nais, e o modelo de Schwartz está crescendo
pesquisa mostra em importância e popularidade (Lindeman e
Visite www.uk.sagepub.com/
managingandorganizations/
que a forma Verkasalo, 2005; Lönnqvist et al., 2006; Sa-
para acesso gratuito a um ar- como os valores giv e Schwartz, 2002; Tsui et al., 2007). Mais
tigo de Sapna Parashar e co- são priorizados adiante, analisaremos os valores em maior de-
laboradores que apresenta al-
guns insights sobre valores,
pode levar ao con- talhe (veja também Capítulo 5), quando abor-
sua definição e constructos flito entre pessoas darmos administração de liderança, adminis-
subjacentes e a forma como de mesmo partido tração de culturas e administração da susten-
são desenvolvidos no tempo.
político quando tabilidade. Parashar et al. (2004) proporcio-
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 95

EM ESSÊNCIA
Uma questão de valores ela considera o universalismo como valor de or-
dem maior. Olhe para os valores associados re-
Usando os valores de Schwartz, vamos tomar um lativos ao poder e universalismo na Tabela 1.1.
exemplo da forma como as pessoas pensam e Você acha que com o tempo Samanta e Ana te-
agem de acordo com seus valores. Imagine que rão dificuldade de se relacionar? O que você acha
uma pessoa que trabalha para uma grande em- que poderia acontecer a elas após discutirem
presa de TI conheça uma cliente numa reunião – questões importantes? Certamente, elas podem
vamos chamá-las de Ana (gerente geral de uma concordar que é um lindo e ensolarado dia, que
rede de livrarias) e de Samanta (a gerente de Brad Pitt é um “gato” e que o novo bebê africa-
atendimento de clientes da firma de TI). As duas no da Angelina é muito fofinho – mas e quan-
terão muito contato nos próximos anos uma vez do elas começarem a discutir por que motivo
que suas empresas estão agora celebrando uma os refugiados de diferentes credos conseguem
joint venture. Vamos supor que Ana valorize mui- entrar em seus países? É claro, como gesto-
to a tradição, o poder e a conformidade, mas não res nosso desejo é de que ambas falem ape-
muito o universalismo,1 assim ela respeita e man- nas sobre questões de trabalho, mas nas rela-
tém suas tradições culturais e religiosas e acre- ções de trabalho próximas é difícil controlar
dita que elas são dominantes e as pessoas que assuntos mais íntimos. Aqui surge a importân-
violam ou ameaçam tais tradições devem ser cia dos valores, pois nossa tendência é prefe-
convertidas e punidas. Assim como Ana, Saman- rir pessoas com os mesmos valores que nós e
ta também valoriza muito a tradição e a confor- normalmente achamos difícil tolerar quem tem
midade, mas em vez do poder como prioridade, prioridades diferentes.

nam um relato acessível e de agradável leitura mentos das pessoas e as classificamos. Veja o
sobre os valores e apresentam um estudo sobre seguinte exemplo. Um grupo de amigos vai
os valores dos estudantes, suas percepções a ao bar da universidade todas as sextas-feiras à
respeito de quais valores são importantes para noite. Uma amiga, Jô, está sempre brincando
a sociedade e as prováveis consequências des- e fazendo as pessoas rir; a outra, Sal, é quieta e
ses valores em suas ações como futuros profis- reservada. Jô é uma pessoa “legal” e dizem que
sionais. é extrovertida. Sal, contudo, é vista como in-
trovertida. Suas personalidades individuais
influenciam a forma como os outros reagem e
PERSONALIDADE se comportam diante delas, tanto no bar,
quanto no trabalho. No trabalho, dependen-
Por que os adminis-
A personalidade refere- do da tarefa, as personalidades diferentes de
-se a padrões estáveistradores precisam sa- Sal e Jô causam um profundo efeito na forma
de comportamento e de
ber sobre personalidade?
estados internos de es-
como os outros desempenham suas tarefas e
A administração, aci-
pírito que ajudam a ex- na qualidade de suas relações de trabalho. Esse
plicar as tendências de
ma de tudo, diz res- fato por si só justifica que a habilidade de ad-
comportamento de um
peito à administração
indivíduo (Monte, 1991).
ministrar diversas personalidades diferentes é
de pessoas. E pessoas, um importante elemento para o conjunto de
diferentemente de máquinas e números, pos- habilidades de um gestor. Além do conheci-
suem personalidades individuais. mento sobre os valores, saber sobre a persona-
Nós já somos, na grande maioria, teóricos lidade também é importante para entender-
da personalidade – quase todos os dias faze- mos por que e como os seres humanos agem,
mos observações sobre as ações e comporta- pensam e sentem; a personalidade das pessoas

N. de T.: Universalismo aqui na acepção da Tabela 1.1.


96 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

pode causar forte impacto em nossas escolhas, gem mais popular vem da análise de fatores. A
e na forma como executamos o trabalho análise de fatores é uma técnica de análise esta-
(George, 1992). tística de dados usada para explicar a variedade
Nesta seção, abordamos uma série de teorias entre variáveis randômicas observadas. Ela cor-
que tiveram origens bem distintas. A história relaciona os escores das variáveis entre si para
fascinante da forma como a personalidade é te- estabelecer padrões de relação. Desta forma, pro-
orizada revela vários caminhos diferentes. Vere- duz um número menor de variáveis randômicas
mos quatro abordagens amplas: a do traço, a não observadas denominadas fatores.
sociocognitiva, a psicoanalítica e a humanista. Vamos voltar para Jô. Jô é engraçada, amiga,
Cada abordagem vê a questão da personalidade fácil de se relacionar e talvez goste de experimen-
de uma perspectiva bem distinta. tar coisas novas e correr riscos. Cada um destes
traços reflete a personalidade de Jô. Traços que
Você é o que é: a abordagem do traço A abor- se aglomeram são chamados de fatores. Neste
dagem do traço se desenvolve a partir da ótica de exemplo, o fator seria a “extroversão”.
que personalidade é algo que pode ser claramente Sem dúvida a teoria mais conhecida sobre o
identificada, operacio- traço, usando a análise fatorial, é a teoria dos
Traços referem-se à mis- nalizada e medida. “Cinco Grandes” fatores de personalidade de
tura de influências bioló-
gicas, psicológicas e so- A perspectiva do McCrae e Costa (1996). A abordagem dos Cin-
ciais que caracterizam o traço se tornou popu- co Grandes fatores da personalidade tem sido
humor e o compor ta- lar nos anos 1930, considerada um dos métodos, baseados em tra-
mento de um indivíduo
no decorrer de sua vida. quando Allport e Od- ços, mais confiáveis para medir a personalidade
bert (1936) procura- (Schmitt et al., 2007; Howard e Howard, 2006;
ram identificar todos os traços que pudessem des- Endler e Speer, 1998). Quase todo livro-texto
crever as pessoas. Para tanto, decidiram recorrer sobre personalidade, comportamento organiza-
ao dicionário. Encontraram cerca de 18 mil pa- cional e administração inclui os “Cinco Gran-
lavras que poderiam ser usadas como descrito- des”, às vezes também chamados de NEO-PI e
res. Alguns psicólogos, a seguir, procuraram re- OCEAN. Os cinco fatores e seus significados
duzir e condensar esta enorme lista. A aborda- são apresentados na Tabela 1.2.

TABELA 1.2 Os Cinco Grandes fatores da personalidade


Fator Descrição
Estabilidade emocional A estabilidade emocional refere-se à pessoa calma versus ansiosa, autos-
satisfeita versus autocomplacente, segura versus insegura, emocionalmen-
te estável versus emocionalmente instável.
Extroversão Extroversão refere-se à pessoa sociável versus reservada, ou determina-
da versus tímida.
Abertura Abertura se refere à postura da pessoa diante da vida – independente
versus conformada, mente aberta versus mente estreita, criativa versus
prática.
Amabilidade Amabilidade se refere à forma como a pessoa se relaciona com as outras
– amável versus cruel, confiável versus desonesta, prestativa versus
egoísta.
Conscienciosidade Conscienciosidade se refere à alta versus baixa tolerância a riscos, bem
organizada versus desorganizada, bem disciplinada versus impulsiva.
Fonte: Adaptado de McCrae e Costa (1996) e Costa e McCrae (1999).
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 97

Você é o que pensa: a abordagem sociocog- Lócus de Controle de Rotter no “Momento


nitiva A abordagem sociocognitiva busca ex- para Exercitar”, p.98.
plicar como a aprendizagem, o comporta- Você talvez se lembre de nossa discussão
mento social e a cognição compõem e mode- sobre esquemas e teorias da atribuição, atri-
lam nossa personalidade. Sua popularidade co- buições internas e externas e erros de atri-
meçou com a obra de buição – são todas concepções encontradas
Por determinismo recí-
proco, Bandura acredita- Alfred Bandura e seu no Lócus de Controle de Rotter. Para ter
va que a nossa persona- conceito de determi- uma ideia sobre o método do lócus de con-
lidade é o produto de nismo recíproco (Ban- trole, considere o seguinte exemplo. Você
nosso comportamento,
de nossos pensamentos dura, 1986). está caminhando na rua e tropeça: olha para
e de nossas emoções Por exemplo, Sal trás e vê um tijolo no caminho. Talvez você
em interação com o meio talvez venha de uma pense: “Como sou idiota. Não vi aquele ti-
ambiente.
família bem quieta e jolo,” ou “Qual foi o idiota que colocou
reservada. Ela foi criada na calma e quietu- aquele tijolo ali?” No primeiro caso, você
de, o que ajudou a formar muito de sua internaliza seu comportamento (é sua cul-
personalidade. O fato de que o bar é baru- pa ter caído), no segundo, você externaliza
lhento e cheio de pessoas deixa Sal descon- (a razão por você ter caído é a ignorância de
fortável, por isso ela fica ainda mais quieta alguém). No primeiro, você descreve um
e reservada. Não que ela não seja sociável: lócus interno de controle, que se refere à
Sal talvez seja sociável e acolhedora em casa, crença de que você controla seu próprio des-
mas não no bar, porque este é o meio ina- tino. No segundo, você descreve um lócus
dequado para a sua personalidade. externo de controle, que é a percepção que
Uma das mais interessantes teorias forças de fora, ou até o acaso, determinam
sociocognitivas de personalidade é conhecida predominantemente seu destino – seu des-
como o lócus de controle, desenvolvido por Rotter tino está fora de seu controle. As pessoas
(1966). Você pode completar a pesquisa sobre que possuem o lócus interno de controle

IMAGEM 1.1 “Desnu-


dando” o lócus interno
de controle.
98 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

MOMENTO PARA EXERCITAR

A Escala de Lócus de Controle 10 (a) No caso de um estudante bem prepara-


desenvolvida por Rotter do, é raro existir, caso exista, uma prova
que ele considera como injusta.
Responda as perguntas honestamente e escolha (b) Muitas vezes, as questões de exames
apenas uma opção (a ou b) para cada questão: têm tão pouco a ver com o curso, que se
1 (a) Crianças têm problemas porque rece- torna realmente inútil estudar.
bem muito castigo dos pais. 11 (a) Fazer sucesso é questão de muito traba-
(b) O problema das crianças hoje é que seus lho. A sorte tem pouco ou nada a ver com
pais são muito permissivos. ele.
2 (a) Grande parte do infortúnio na vida das (b) Conseguir um bom emprego depende
pessoas é devido à falta de sorte. principalmente de estar no lugar certo,
(b) As desgraças das pessoas decorrem dos na hora certa.
erros que elas cometem 12 (a) O cidadão comum pode influenciar as
3 (a) Um dos principais motivos da guerra é decisões do governo.
que as pessoas não se interessam o su- (b) Este mundo é governado por poucos no
ficiente pela política. poder, e não há muito que um simples
(b) Sempre haverá guerras, não obstante o indivíduo possa fazer.
quanto se tente fazer para evitá-las. 13 (a) Quando faço planos, tenho quase certe-
4 (a) Com o passar do tempo, as pessoas con- za de que darão certo.
seguem o respeito que merecem. (b) Não é aconselhável planejar um futuro
(b) Infelizmente, o valor individual frequen- distante porque, de qualquer modo, tudo
temente passa despercebido, indepen- depende da boa ou má sorte.
dentemente de quanto o indivíduo se em- 14 (a) Há certas pessoas que simplesmente
penhe. não conseguem ser boas no que fazem.
5 (a) A ideia de que os professores são injus- (b) Existe o bem em todo mundo.
tos com seus alunos é absurda. 15 (a) Em meu caso, conseguir o que quero tem
(b) A maioria dos estudantes não percebe pouco ou nada a ver com a sorte.
até que ponto suas notas são influencia- (b) Muitas vezes poderíamos decidir o que
das por acontecimentos acidentais. fazer, jogando uma moeda.
6 (a) Sem a oportunidade certa, ninguém pode 16 (a) Quem consegue a posição de chefe, de-
se tornar um líder de fato. pende muitas vezes da sorte de estar no
(b) Pessoas capacitadas que deixam de ser lugar certo, na hora certa.
líderes não sabem aproveitar as oportu- (b) Conseguir que as pessoas façam a coi-
nidades. sa certa, depende da habilidade. A sorte
7 (a) Por mais que você se esforce, algumas tem pouco ou nada a ver com isto.
pessoas não irão gostar de você. 17 (a) No que diz respeito às questões do mun-
(b) Pessoas que não conseguem fazer com do, a maioria de nós é vítima de forças
que os outros gostem delas, não sabem que não entendemos nem controlamos.
se relacionar com os outros. (b) Participando ativamente em questões po-
8 (a) A hereditariedade desempenha um pa- líticas e sociais, as pessoas podem con-
pel fundamental na formação da perso- trolar os eventos do mundo.
nalidade. 18 (a) A maioria não nota até que ponto suas
(b) São as experiências de vida que deter- vidas são controladas por acontecimen-
minam o que as pessoas são. tos acidentais.
9 (a) Muitas vezes acho que o que vai aconte- (b) Realmente esse negócio de “sorte” não
cer, acontecerá. existe.
(b) Confiar no destino nunca funcionou 19 (a) Devemos sempre estar dispostos a ad-
para mim tão bem quanto tomar a de- mitir nossos erros.
cisão de seguir determinada trajetória (b) Geralmente é melhor acobertar nossos
de ação. erros.

(continua)
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 99

MOMENTO PARA EXERCITAR (continuação)

20 (a) É difícil saber se alguém gosta de você 27 (a) Dá-se ênfase demais aos esportes na es-
ou não. cola secundária.
(b) O número de amigos que temos depen- (b) Esporte em equipe é um excelente meio
de de nossa simpatia. de se formar o caráter.
21 (a) Com o tempo, as coisas ruins que acon- 28 (a) O que acontece comigo é da minha
tecem se equilibram com as boas. conta.
(b) A maior parte dos infortúnios é resultado (b) Às vezes sinto que não tenho suficiente
de falta de habilidade, ignorância, pre- controle sobre o rumo da minha vida.
guiça ou das três. 29 (a) Muitas vezes não consigo entender por
22 (a) Com bastante esforço, podemos erradi- que políticos agem da forma como agem.
car a corrupção política. (b) Em longo prazo, as pessoas são respon-
(b) É difícil controlar as ações dos políticos sáveis pelo mau governo tanto nacional
em seus gabinetes. como local.
23 (a) Às vezes não entendo como professores
chegam às notas que atribuem aos alu- Contabilize um ponto para cada uma das res-
nos. postas: 2(a), 3(b), 4(b), 5(b), 6(a), 7(a), 9(a),
(b) Há uma relação direta entre a forma 10(b), 11(b), 12(b), 13(b), 15(b), 16(a), 17(a),
como eu estudo e minhas notas. 18(a), 20(a), 21(a), 22(b), 23(a), 25(a), 26(b),
24 (a) Um bom líder espera que as pessoas de- 28(b), 29(a).
cidam o que fazer. Quanto mais alto o escore, maior o lócus exter-
(b) Um bom líder deixa bem claro a todos no de controle (máximo: 23).
as tarefas que devem cumprir. Quanto mais baixo, maior o lócus interno de
25 (a) Muitas vezes acho que exerço pouca in- controle.
fluência sobre o que acontece comigo.
(b) É impossível acreditar que o acaso ou a Direitos reservados © 1966 pela American
sorte desempenhe um papel importante Psychological Association. Reimpresso com au-
em minha vida. torização: Tabela 1, 11-12 de Rotter, J. (1966) Ex-
26 (a) As pessoas são solitárias porque não pectativas generalizadas para reforços de con-
procuram ser simpáticas. trole interno versus controle externo, PSYCHO-
(b) De pouco adianta querer agradar as pes- LOGICAL MONOGRAPHS: GENERAL AND APPLI-
soas; elas gostam de você ou não. ED, 80(1), (Whole no 609): 1-28.

chegam a um alto nível de realização, são cial e querem liderar e serem liderados de
muito mais independentes, têm uma saúde forma autocrática (Beukman, 2005).
mental e física melhor e sabem usar melhor O lócus de controle é muito importante
estratégias para enfrentar dificuldades no que diz respeito à forma como as pessoas
(Myers, 2001). Além disso, possuem um agem nas organizações e como lidam com a
melhor desempenho nas avaliações subjeti- incerteza e a mudança (Chen e Lei Wang,
vas e objetivas do CO (Beukman, 2005; 2007; Herscovitch e Meyer, 2002; Spector,
Spector, 1982). É interessante notar que as 1982); aqueles que possuem alto lócus inter-
pessoas com alto nível de controle externo no de controle conseguem administrar melhor
se dão melhor e são mais felizes quando, as condições de incertezas e estresse no traba-
idosas, vão para asilos onde a vida é estru- lho (Rahim,1997). E também, o tipo de ló-
turada e controlada (Cicirelli, 1987); esses cus de controle pode até mesmo prever como
indivíduos tendem a criar um ambiente so- você se comunica. Lam e Mizerski (2005) rea-
100 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

lizaram um estudo sobre a forma como os con- Segundo, o ego nos permite lidar com o
sumidores passam informações “boca a boca” mundo baseado no princípio da realidade
sobre marcas. Os pesquisadores descobriram (com a consequência de que à medida que
que as pessoas com alto lócus externo de con- crescemos, nos tornamos mais cientes do
trole tendem a passar a informação a seus “in- ambiente real e da necessidade de se adap-
groups” (grupos internos) – pessoas mais ínti- tar a ele). O ego reconhece desejos e os sa-
mas, ao passo que as pessoas com alto lócus cia, mas de forma a garantir a mínima dor e
interno de controle tendem a comunicar-se destruição. O ego é a “sala de controle” de
boca a boca com “out-groups” (grupos exter- nossa personalidade.
nos) – pessoas não intimamente associadas ou Terceiro, o superego – nosso monitor so-
ligadas a eles. cial e pessoal, constantemente julgando nosso
Você é aquilo que não sabe: a abordagem comportamento, pensamentos e sentimentos,
psicanalítica Diferentemente das aborda- observando como devemos agir perante os
gens anteriores, a abordagem psicanalítica olhos daqueles que ao nosso redor constituem
é caracterizada por desejos inconscientes e nossa sociedade. O superego e o id estão ge-
mecanismos de defesa voltados à luta con- ralmente em conflito, por isso o ego precisa
tra a ansiedade sexual contida e o temor manter os dois em harmonia – e, como vere-
generalizado da morte. Sigmund Freud é mos, é onde começa o problema.
considerado o pai da abordagem psicanalí- Freud (1935) acreditava que o desenvolvi-
tica da personalidade. Foi um dos mais con- mento da personalidade coincidia com deter-
testados teóricos (por muitos psicólogos e minadas fases psicossexuais. Por exemplo, na
feministas) e, ao mesmo tempo, um dos fase oral (até 1 ½ ano de idade) a criança se
mais admirados (por muitos artistas, escri- fixa em prazeres orais, como chupar, salivar e
tores e psiquiatras). Certamente, Freud, jun- mastigar, ao passo que na fase anal (entre 1 ½
tamente a outras figuras como Charles e 2 ½ anos), a criança se fixa na fase anal do
Darwin e Adam Smith, muito fizeram para desenvolvimento, focando tudo que se rela-
definir o modo como entendemos a nature- ciona com seu próprio ânus. Piadas sobre ga-
za da realidade em que vivemos. Freud acre- zes intestinais funcionam bem com aqueles
ditava que a personalidade era composta de fixados nessa fase – lembrem dos personagens
pensamentos e ações que emergem do que da série South Park, Terrence e Philip. Dos três
ele chamou de inconsciente. O inconsciente a seis anos, a criança está na fase fálica (aqui
vem à tona em sonhos e erros da língua, por- se percebe porque feministas não gostam de
que contém desejos, pensamentos e senti- Freud: por causa da natureza “falocêntrica” de
mentos que ficaram inconscientes ou repri- sua teoria!) e experimenta prazer e excitação
midos. Para Freud, absolutamente nada com estímulos na região genital. Depois, por
acontece por acaso; há explicação provavel- volta dos seis anos até a puberdade, as pessoas
mente escondida no inconsciente. É no fun- entram numa espécie de hibernação – ou o
do do inconsciente que armazenamos nos- que Freud chama de latência – onde tudo é
sos sentimentos e pensamentos atribulados dormente. Finalmente, o indivíduo passa à fase
e a mente os mantém escondidos de uma genital, ao chegar à puberdade e começa a se
maneira extraordinária. De acordo com interessar pelo sexo.
Freud, nossa mente está estruturada de três Muitos termos linguísticos de hoje têm sua
modos. Primeiro, a mente inconsciente (o origem na teoria freudiana baseada nas fases
id) opera baseada no princípio do prazer e é sexuais do desenvolvimento – por exemplo, a
impulsionada por desejos como a fome, sexo noção de um lapso freudiano, o complexo de
e agressão. O id precisa ser controlado ou Édipo, a inveja do pênis, fixação, repressão e
seria impossível protelar a satisfação. muitos outros conceitos de uso diário. A Ta-
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 101

bela 1.3 dá uma descrição de alguns destes canismo imperfeito porque alguns pensamen-
conceitos relacionados às três fases psicosse- tos ainda escapam. Freud acreditava que tais
xuais (oral, anal e fálica). pensamentos se manifestariam pelo simbolis-
Obviamente, se tal desenvolvimento da mo ou lapsos de linguagem. Por exemplo, o
personalidade significasse a totalidade da teo- fato de que os mísseis são projetados numa
ria de Freud do mundo e constituisse um forma semelhante ao pênis sugere a alguns psi-
retrato preciso da realidade, a maioria das cólogos que os homens criam estas armas de
pessoas teria problemas em suas realizações. destruição em massa devido aos seus sentimen-
A ansiedade, a culpa e o temor que sentimos tos sexuais e de agressão reprimidos. Segun-
constantemente seriam insuportáveis. Contu- do, usamos a formação reativa para bloquear
do, Freud afirmou que existe um sistema in- nossos sentimentos e impulsos e agir de for-
trincado de controle mútuo que nos ajuda a ma contrária. Um problema social comum
agir no mundo – mecanismos de defesa que hoje é a violência que alguns jovens praticam
nos permitem reinterpretar a realidade e en- em relação aos homossexuais. Os freudianos
ganar a nós mesmos dizendo que está tudo diriam que tais jovens estão tentando resolver
bem. Existe uma série de mecanismos; aqui, seus pensamentos e sentimentos homossexuais
brevemente analisaremos três: a repressão, a com violência dirigida às pessoas que eles te-
formação reativa e a projeção (adaptado de mem vir a ser. Assim, ser macho ajuda a re-
Myers, 2001: 494). primir qualquer ansiedade e a demonstrar
Primeiro, através da repressão bloqueamos aos outros, pela supercompensação, o pró-
nossos pensamentos e sentimentos incestuo- prio tipo de sexualidade que almejam. Ter-
sos e tentamos apresentar uma face tranquila ceiro, a projeção: quando temos sentimen-
ao mundo. Entretanto, a repressão é um me- tos e pensamentos que nos ameaçam, nós

TABELA 1.3 As três fases do desenvolvimento segundo Freud


Fase Descrição

Oral Traumas ou disciplina rígida durante a fase oral criam fixação pela fase. Por consequência,
uma pessoa oral se fixa em prazeres da boca, que podem ser bem sensuais. Constante-
mente colocam coisas na boca, tendem a exagerar na comida e provavelmente fumam.
Estas pessoas podem vir a ser artistas. Ou negam sua dependência excessiva de prazeres
orais e, como compensação, se tornam agressivas, podendo terminar trabalhando como
“segurança” num bar, ou sendo um faixa preta no judô.
Anal Castigos durante esta fase podem conduzir a pessoa ao que Freud chama de “analmente
retentiva”. Elas descobrem que podem controlar seus pais negando-a se ir ao banheiro,
ou indo ao banheiro em momento e lugar inadequado. São pessoas muito rigorosas,
orientadas para o controle, com tendência a escolher carreiras em contabilidade ou
algo parecido. Ou podem se tornar analmente expulsivas – extremamente desorganiza-
das e bagunçadas.
Fálica Nesta fase é que começamos a perceber alguns problemas reais. Por exemplo, baseado
na tragédia grega de Édipo, que matou seu pai e casou com sua mãe, Freud acredita que
os homens desenvolvem o complexo de Édipo. A satisfação sexual e excitação do bebê
derivam do cuidado materno realizado durante a higiene. Aos poucos, os meninos desen-
volvem sentimentos sexuais pela sua mãe e ódio pelo pai, visto como concorrente ao afeto
materno. Estes sentimentos criam intensa ansiedade e culpa nas crianças e elas passam a
temer a castração pelos pais. A única forma de lidar com estes sentimentos opressivos é
reprimir e esconder todos estes medos bem no fundo do inconsciente.
Fonte: Adaptado de Hall e Lindzey (1957; 29-75).
102 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

os projetamos nos outros. Por exemplo, um Mais importante para Maslow (1968) e
gestor desconfiado e incompetente pode tra- Rogers (1967) é a noção da forma como ex-
tar qualquer um que venha ao seu escritó- pressamos o autoconceito. Quando tentamos
rio com desconfiança e considerá-lo como responder “quem sou eu?”, o autoconceito re-
incompetente. Ele nega sua incompetência, fere-se aos nossos pensamentos e sentimentos
projetando-a nos outros. em relação a nós mesmos. Nós nos vemos de
Embora Freud tenha produzido uma das diversas formas dentro do mundo. Primeiro,
mais interessantes teorias sobre a personalida- temos um eu real e um eu ideal, e nos esforça-
de, há evidências inconsistentes na fundamen- mos para reduzir a distância entre os dois,
tação de seus conceitos. Mesmo assim, não há chegando o mais próximo possível de nosso
dúvida de que ele foi, historicamente, um dos eu idealizado. Quando agimos de forma con-
psicólogos teóricos e práticos mais influentes. sistente com nosso eu ideal, temos uma auto-
Suas conceituações têm apresentado apelo in- imagem positiva. Se sentirmos lacunas entre
telectual e ainda permanecem como os aspec- o eu ideal e o eu real, temos uma autoimagem
tos mais notáveis de sua obra. Ainda assim, a negativa.
teoria de Freud tem uma visão muito negati- Rogers abordou a personalidade da pers-
va da humanidade e coloca forte ênfase no pectiva de que todos nós somos únicos e fun-
desejo sexual como o principal motivador do damentalmente “boas” pessoas, todos lutando
comportamento e pensamento. Imagine cha- pelo que Maslow chamou de autorrealização.
mar a atenção de um funcionário dizendo que Para Rogers, o segredo da autoimagem positi-
ele tem fixação pela fase fálica de desenvolvi- va é o ambiente no qual crescemos, porque
mento e age assim porque quer dormir com ele nos oferece três condições básicas viabili-
sua mãe e matar seu pai – isso poderia não dar zando aquele crescimento:
muito certo! Felizmente, existem outras teo-
rias da personalidade que abordam o assunto  As pessoas precisam ser genuínas, hones-
de um lado positivo – a abordagem humanista. tas e abertas sobre seus próprios senti-
mentos.
Você é aquilo que cultiva: a abordagem hu-  As pessoas devem ser receptivas, no senti-
manista Os humanistas colocam o sentido do de valorizar a si mesma e os outros. Até
do self no centro da personalidade. Seu obje- os fracassos devem ser vistos com olhos po-
tivo é assegurar que os seres humanos reali- sitivos, o que Rogers chama de “Olhar Po-
zem seu crescimento pessoal e desenvolvam sitivo Incondicional”.
seu potencial. A tradição humanista viveu seu  O último fator importante para Rogers é
maior crescimento nos anos 1960, à medida a empatia; a empatia se relaciona à forma
que psicólogos se tornaram cada vez mais crí- como comunicamos nossos sentimentos ao
ticos à confiança depositada na objetividade mundo e como, de nossa parte, comparti-
do estudo da personalidade, baseada na abor- lhamos e refletimos sobre estes significa-
dagem dos traços em que inventários escritos dos. A empatia é muito importante para
e análise de fatores substituem as habilidades mais conceitos como a inteligência emocional
interpretativas dos analistas. Foram também mais e é parte integrante de nossa habilidade de
cautelosos no tocante à orientação exagerada- agir no mundo social.
mente negativa de Freud, pela qual nossa per-
sonalidade é baseada principalmente na su-
pressão de pensamentos maus e desejos sexuais Personalidade e administração
incestuosos. Sem dúvida, os psicólogos huma-
nistas mais conhecidos são Carl Rogers e A personalidade é claramente algo complexo.
Abraham Maslow (veja também o Capítulo 3). Embora todo mundo tenha uma personalida-
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 103

IMAGEM 1.2 Símbolos do self.

de, não sabemos o que ela é ou como deve ser tente levar isto em consideração ao lidar com
concebida. Muitas pessoas bem-sucedidas são elas. Veja que nem todo comportamento é
a favor de mascarar a verdadeira natureza de óbvio e mensurável, e que as pessoas são, às
sua personalidade. À semelhança da imagem vezes, levadas pelo subconsciente e por moti-
da máscara simbólica nesta página, apresen- vos reprimidos. E também, tente ser um hu-
tam ao mundo uma face serena, porém ines- manista prático facilitando o crescimento hu-
crutável. Então, se existe tanta coisa oculta e mano e seu potencial.
obscura na personalidade, de que modo usá-
la como ferramenta para administrar pessoas?
Talvez o melhor seria aproveitar alguns pon-
tos de cada teoria. Tente identificar os traços
PSICOLOGIA POSITIVA:
dos que trabalham com você e tente ajustar EMOÇÕES E FELICIDADE
suas expectativas e comportamento adequa-
damente. Seja sensível às conceituações que No início desta jornada pela percepção, valo-
as pessoas formam sobre o lócus de controle. res e personalidade, declaramos que abordarí-
Perceba que algumas pessoas terão caracterís- amos a perspectiva psicológica. A psicologia,
ticas que as configuram como “analmente re- em geral, se associa ao estudo de desvios e anor-
tentivas” em intensidade maior do que outras; malidades, mas está se interessando cada vez
104 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

mais por fenômenos mais positivos. Embora em ajudar as pessoas a serem “anormais”,
a essência da psicologia positiva tenha sido porém acima da norma. Uma área na qual
defendida a partir de William James, o con- PP é reconhecida internacionalmente é a
ceito pode ser atribuído a Martin E. P. Selig- busca da felicidade.
man e Mihaly Csikszentmihalyi, os quais re- Nem todo mundo está encan-
gistram que: tado com a PP; de fato alguns cri-
ticam certos setores do movimento.
A área da psicologia positiva em nível subjeti- Held (2004), por exemplo, acredi-
vo trata de experiências subjetivas valorizadas: ta que a PP para-
o bem-estar, o contentamento e a satisfação (no doxalmente se Visite www.uk.sagepub.com/
managingandorganizations/
passado); esperança e otimismo (no futuro); e apresenta numa para acesso gratuito a um
fluxo e felicidade (no presente). Em nível in- perspectiva nega- artigo de Barbara Held se
dividual, diz respeito a traços individuais po- tiva. Ela acredita quiser aprender que a
psicologia positiva pode não
sitivos: à capacidade de amar e à de escolher que alguns den- ser tão positiva como seus
uma vocação, à habilidade interpessoal, sensi- tro da corrente da adeptos sugerem.
bilidade estética, perseverança, capacidade de PP são negativos
perdoar, à visão de futuro, espiritualidade, ta- e repudiam ideias e opiniões que vão contra a
lento e sabedoria. Em nível de grupo, diz res- mensagem dominante da referida corrente: (a)
peito a virtudes cívicas e instituições que le- a negatividade sobre a negatividade em si, que
vam a uma melhor cidadania: responsabilida- é explorada pela forma de pesquisar sobre a
de, educação, altruísmo, civilidade, moderação, psicologia da saúde, da felicidade e estilos de
tolerância e ética no trabalho (Seligman e Csiks- enfrentamento em vez de depressão, etc.; e (b)
zentmihalyi, 2000: 5). negatividade relativamente ao tipo errado de
positividade, a alegada positividade não cien-
Em sua forma mais sim- A psicologia positiva, tífica, especialmente aquela que Seligman diz
na forma do compor-
ples, a psicologia posi- encontrar na psicologia humanística.
tiva é o estudo, a pes-tamento organizacio- A felicidade é algo que a PP busca espa-
quisa e a teorização das
bases psicológicas paranal positivo (COP), lhar, portanto será o foco desta seção final de
se viver da melhor ma- está crescendo e atrai capítulo. Antes de falar na felicidade, vamos
neira possível a partir do
a atenção da teoria, examinar brevemente o tópico geral das emo-
pensamento, sentimento e
compor tamento positi- pesquisa e prática da ções. Primeiro, veremos o que são e depois
administração. É um
vos. No sentido adminis- mostraremos a diferença entre “ler emoções”
trativo, a psicologia posi-
sucesso hoje, mas que e “sentir emoção”.
tiva busca compreender e
estava em processo há
promover valores cívicos, As emoções são
100 anos (Pitsis,
responsabilidade social, complexas e ao mes- Emoções são, por defi-
altruísmo, tolerância, fe- nição, sentimentos de-
2008c). Historica- mo tempo altamente monstrados como res-
licidade e bem-estar psi-
cológico. mente, a psicologia se pessoais e sociais. Fre- posta, ou por expectati-
interessava predomi- quentemente supõe-se vas, em relação a obje-
tos ou eventos.
nantemente pela patologia e tratamento de que as emoções sur-
uma variedade de doenças mentais. Como tal, gem como resultado de um processo cogniti-
sua aplicação inicial a disciplinas como CO vo irracional e que, portanto, é algo supérfluo
também uniu a psicologia da administração à para a função racional de administrar. Sabe-
patologia. A psicologia centralizava-se na mos agora que este não é o caso e que emo-
anormalidade abaixo da norma e seu obje- ções interferem fortemente no modo como os
tivo explícito era encontrar formas de aju- gerentes administram.
dar o indivíduo a se tornar “normal”. A psi- As primeiras obras sobre as emoções apre-
cologia positiva (PP) está mais interessada sentam-nas relacionadas ao instinto e à sobre-
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 105

MINICASO

Tire algumas fotos de seus amigos. Peça que Peça que cada um conecte uma emoção a um
eles assumam alguma atitude ou estado de rosto.
espírito. Grave e carregue as fotos no compu-
tador. Mostre agora as fotos e distribua uma • Quão consistentes são as pessoas na atribui-
lista de emoções a outro grupo de pessoas. ção de emoções?

vivência; entretanto, desde o final dos anos pular. Muitos livros- Inteligência emocional é
1990, pesquisadores e teóricos da emoção têm texto incluem uma um conceito popularizado
oferecido teorias a respeito das emoções que discussão sobre a inte- por Daniel Goleman, que
a concebe como a capa-
vão além dos primeiros relatos sobre as mes- ligência emocional, que cidade de reconhecer
mas (Veja, por exemplo, Campos et al., 1999). quase sempre acaba nossas próprias emoções
A cognição racional e irracional é um compo- abordando questões e as dos outros, bem
como a habilidade de ad-
nente importante das emoções e é bem possí- da personalidade. ministrar nossas emo-
vel que uma pessoa possa sentir tipos diferen- Enquanto o con- ções em nossos relacio-
tes de emoções quase ao mesmo tempo (Srou- ceito de Goleman namentos com os outros
(Goleman, 1997).
fe, 1979). Contudo, entender as emoções tem sobre a inteligência
sido problemático. Ekman, por exemplo, (Ek- emocional é extrema-
man e Friesen, 1986) estudou as emoções, mente popular, John D. Mayer, que juntamen-
observando expressões faciais e descobriu que te a Peter Salovey escreveu largamente sobre
estas podem ser consistentes nas culturas. Mas, QE (quociente emocional) no começo dos
o que isso significa? Quando alguém sorri, é anos 1990, argumenta que a afirmação popu-
sinal de que está feliz? Às vezes sorrimos mes- lar na literatura – “que pessoas com grande
mo estando tristes ou devolvemos um sorriso inteligência emocional possuem uma vanta-
a alguém em sinal de simpatia, ou simples- gem irrestrita na vida – parece exagerada hoje
mente porque achamos alguém atraente e fora dos padrões científicos razoáveis”
(O’Doherty et al., 2003) ou queremos vender (Mayer, 1999: 1). Mais importante ainda é
alguma coisa (Sutton e Rafaeli, 1998) ou por Mayer acreditar que a inteligência emocional
qualquer outro motivo. Os antropólogos de- é apenas isso, um fator de inteligência e não
monstraram que sorrir pode ser interpretado um fator da personalidade. Além do que, tes-
como sinal de afabilidade e felicidade, entre- tes destinados a medir a inteligência emocio-
tanto, culturalmente pode ser que alguém que nal ainda não são confiáveis como deveriam e
sorri esteja nervoso ou ansioso – como é o caso afirmações de que a inteligência emocional
encontrado nas culturas de nativos da Indo- leva a resultados significativos em termos de
nésia e Austrália. Naturalmente, outras vezes desempenho, ou outros resultados na vida, está
um sorriso realmente significa que a pessoa além da realidade – parece que chega a expli-
está feliz. car apenas de 2% a 25% da variança em re-
Conseguir ler as emoções de alguém é con- sultados. Em outras palavras, 98% a 75% de
siderado como uma importante habilidade importantes resultados na vida não podem ser
social; além disso, a habilidade de adminis- explicados pela inteligência emocional, mes-
trar suas próprias emoções e as das outras pes- mo naquelas pesquisas desenvolvidas por
soas se tornou um domínio de interesse po- Mayer et al. (2001). Portanto, tudo que se lê
pular. Recentemente, o conceito de inteligên- de positivo sobre a inteligência emocional deve
cia popular tem se tornado cada vez mais po- ser tratado com certo cuidado – ela funciona,
106 PARTE UM ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

mas não na extensão que muitos autores de tado de espírito, importante na sociedade com-
livros populares acreditam. plexa, ambígua e carregada de estresse do mun-
Entretanto, deve ficar bem claro que lei- do de hoje – a felicidade.
tura de emoções e experiência de emoções são Há poucas emoções tão debatidas nas ciên-
coisas bem diferentes. Imagine estar em pro- cias sociais como a felicidade. A vida, os ne-
funda depressão – os constantes sentimentos gócios, as empresas de treinamento para lide-
de tristeza, fadiga e falta de motivação podem rança, psicoterapeutas, institutos, livros de
ser muito debilitantes e até letais. Só na lógica autoajuda e DVDs, centros de pesquisa uni-
anedótica podemos acreditar que alguém agi- versitária têm girado em torno da emoção da
ria de uma forma totalmente diferente no seu felicidade. Mas, o que realmente significa fe-
dia-a-dia depois que a depressão passasse. As licidade? Ela afeta o desenvolvimento no tra-
emoções certamente afetam certos desfechos balho e na vida? As duas últimas perguntas
na vida (quando cientistas usam palavras bran- são as mais controversas e não temos tempo
das “sem emoção” do tipo “resultados na vida” para debatê-las aqui. No entanto, apresenta-
eles se referem a coisas como sucesso, fracas- remos as principais
so, vida, morte, alcoolismo, abuso de drogas, ideias e deixaremos A felicidade pode ser ge-
ralmente definida como
etc. As emoções in- você decidir sobre este pensamentos e senti-
A diferença entre humor cluem amor, fúria, tópico complexo, rea- mentos positivos sobre a
e emoções é a sua dura-
ção – um humor ou “cli- ódio, vergonha, felici- lizando pesquisa com- vida, e que podem ir da
alegria (presente quando
ma” dura mais e seus dade, tristeza, medo, plementar. A felicidade seu time ganha a grande
estados precisam de ressentimento, ale- é um conceito difícil final no fim de semana)
tempo para se desenvol-
ver. Emoções são consi- gria. Frequentemente de se estabelecer e a a um sentimento geral de
satisfação e contenta-
deradas como resposta se ouve a palavra hu- maioria a descreve mento com a própria
a um acontecimento, ou mor (ou clima) e para como um estado em vida: inclui sentir-se cal-
episódio emocional, a
emoção subsiste (às ve- muitos é difícil distin- que você se sente mo, contente, satisfeito,
realizado, inspirado, po-
zes, por minutos), mas guir entre humor e bem, ou se sente po- sitivo e livre.
os estados de um clima emoção (Parkinson et sitivo.
emocional permanecem
por horas, até semanas. al., 1996). Enquanto “bem” ou “bom” poderiam sig-
Outros dizem que nificar qualquer coisa em sentido subjetivo,
a distinção é superficial e não está baseada em como um sentimento geral de que a vida é
pesquisa e, na realidade, não é tão importan- boa (seja qual for a definição de boa), Vee-
te. Entretanto, alguns teóricos argumentam nhoven (2004) considera a qualidade de vida
que as emoções podem servir para influenciar como parte integrante da felicidade. Ele clas-
ou impulsionar uma ação ou comportamento sifica a qualidade de vida (felicidade) em duas
ao passo que o humor afeta a cognição (Da- partes, representadas na Figura 1.2. Primeiro,
vidson, 1994). É claro que a cognição pode existe uma distinção entre as chances de uma
criar humores e emoções também. Portanto, vida boa (chance de vida) e os verdadeiros
a questão da emoção é muito complexa. Ape- resultados da vida (resultados da vida). Se-
sar disso, vamos examinar uma emoção ou es- gundo, ele distingue entre qualidades am-

Qualidades externas Qualidades internas

Chances de vida Ambiente bom de viver Habilidade de vida da pessoa


FIGURA 1.2 Quatro qualidades
Resultados da vida Utilidade da vida Valorização da vida
de vida (Veenhoven, 2004).
CAPÍTULO UM ADMINISTRAÇÃO DE INDIVÍDUOS 107

IMAGEM 1.3 Um rosto


feliz e um estado de
espírito iluminado.

bientais (externas) e qualidades individuais bem na vida. Existe um leve problema nestes
(internas). estudos sobre a felicidade e saúde. A questão é
Felicidade, no modelo de Veenhoven, é que pessoas não saudáveis se classificam como
uma função de: (a) o tipo de ambiente em infelizes e pessoas felizes se classificam como
que vivemos (quadrante superior esquerdo) e saudáveis, mas é a saúde que causa o estado
se o ambiente oferece oportunidades de cres- de espírito ou é o estado de espírito que causa
cimento e felicidade; (b) o objetivo de vida a saúde? Além disso, tem-se falado que a feli-
(parte inferior esquerda) e se sentimos que cidade aumenta a produtividade no trabalho
temos um alto objetivo na vida e vivemos de e leva a outros resultados de produção organi-
acordo com nossos valores; (c) habilidade de zacional. A felicidade realmente leva à produ-
vida da pessoa (lado superior direito) que in- tividade organizacional? Parece uma questão
clui saúde, capacidades, habilidades de adap- simples, mas tem provocado uma reação mui-
tação (otimismo, enfrentamento de problemas, to complexa e grandes debates. O fato é que,
resiliência e assim por diante); e (d) valorização apesar de tudo que se tenha lido, não temos
da vida (lado inferior direito) que se refere à sa- uma resposta definitiva para essa pergunta –
tisfação na vida e tipicamente é uma experiência na verdade, se pensarmos bem, a felicidade
subjetiva. Felicidade, portanto, requer um am- pode não levar a certos tipos de desempenho.
biente positivo, objetivo e valores, saúde, capa- Por exemplo, sabe-se que a riqueza tem pouca
cidade e valorização da vida e satisfação. correlação com a felicidade (Kahneman et al.,
Por que ser feliz? Vários estudos mostra- 2006) e sentimentos de bem-estar, mas a ri-
ram que as pessoas felizes tendem a ser mais queza tem muita relação com boa saúde
saudáveis (Ward e Coates, 2006) e têm maio- (Bloom e Canning, 2000), o que torna a liga-
res oportunidades na vida, especialmente ção saúde/felicidade um pouco confusa. En-
quando fazem parte de uma comunidade fe- tretanto, o campo de pesquisa sobre a felici-
liz, pois as comunidades felizes tendem a ser dade e resultados relacionados ao trabalho é
mais saudáveis e mais ricas (Ross, 2005: Su- novo, e lentamente a pesquisa está começan-
bramanian et al., 2005) e, geralmente, se dão do a abordar a questão da confiabilidade, va-

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