Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
RESUMO
1 INTRODUÇÃO
Acari foi uma das povoações que surgiram no sertão da Capitania do Rio Grande do
Norte, ainda na primeira metade do século XVIII. Sua gênese está ligada à expansão das
fazendas de gado, cujos proprietários, geralmente, mantinham a chamada “casa da rua” 2,
situada na povoação. Referimo-nos à Povoação do Acari, que, a partir de 1738, passou a
contar com a Capela de Nossa Senhora da Guia, no derredor da qual o tecido “urbano”
desenvolveu-se de forma gradativa.3
A partir do momento em que a povoação foi elevada à Vila do Acari (1833), as
edificações urbanas proliferaram-se, obedecendo aos ditames do Código de Posturas
Municipal. O espaço urbano aos poucos foi sendo regulado e moldado sofrendo
transformações em variados níveis de intensidade, vivendo seu ápice de melhorias posterior a
1850, onde a localidade passou a se reconfigurar. (APMA, 1850-1900)
1
Discente do Curso de Licenciatura em História – UFRN-CERES-Campus de Caicó. E-mail para contato:
cicerojs38@gmail.com
2
O termo casa da rua é usado aqui para nomear a residência que os fazendeiros mantinham no Acary, pois em
sua maioria residiam em suas fazendas, nos arredores da povoação e depois vila, fazendo uso de casa da rua
apenas em ocasiões de festas religiosas ou em dias de feiras.
3
Sintetizamos, neste parágrafo, o conteúdo encontrado na historiografia tradicional de e sobre Acari (SANTA
ROSA, 1974; MEDEIROS, 1985; CASCUDO, 1968) acerca do processo sócio histórico de produção do espaço,
cujo marco principal, apontado, é a “fundação” do povoado, nas primeiras décadas do século XVIII.
2
4
A origem de Caicó está ligada ao Arraial do Queiquó, “fundado” em 1700 por Manuel de Souza Forte, no lugar
onde havia, no fim do século XVII, a Casa Forte do Cuó e Capela da Senhora Santana do Vale do Acauã. Esse
arraial foi elevado a Povoação do Caicó em 1735, em cuja sede foi instalada a Freguesia da Gloriosa Senhora
Santa Ana do Seridó no ano de 1748. A povoação foi elevada ao status de Vila Nova do Príncipe em 1788, tendo
sido transformada em cidade em 1868 (com o título de Cidade do Príncipe). Em 1890 essa cidade teve seu nome
alterado para Seridó e, poucos meses depois, para Caicó, denominação que guarda ainda hoje (MEDEIROS
FILHO, 1988).
5
Por volta de 1790, Antonio de Azevedo Maia erigiu uma capela em sua fazenda Conçeição, essa iniciativa
atraiu para a orbita do templo, a construção de casinhas que aos poucos foi dando alguma importância a
localidade, dando origem ao aglomerado Conçeição do Azevedo. A povoação cresceu, tendo sido criada sua
freguesia em 1856, e logo dois anos depois em 1858, recebeu foros de vila.
6
O atual território de Currais Novos teve sua gênese ligada ao ciclo do algodão, quando em 1754, Cipriano
Lopes Galvão fixou-se no Totoró. Em 1808, foi erigida uma Capela e consagrada a Sant´anna, onde o
aglomerado começou a se expandir. Em 1884, surge a freguesia da Senhora Sant´anna de Currais Novos,
desmembrada da freguesia de Nossa Senhora da Guia do Acari, em 1890 receberia o titulo de vila ao se
emancipar da referida cidade.
7
A documentação mencionada trata-se de livros de atas, encontrados no arquivo da prefeitura municipal de
Acari bem como documentos digitalizados e disponíveis na internet.
3
8
Publicações acadêmicas resultantes de esforços de investigação de arquitetos incluem, igualmente, Acari dentre
as cidades que detém importante conjunto arquitetônico. Estamos nos referindo a Arquitetura no Rio Grande do
Norte: uma introdução, de Pedro de Lima (LIMA, 2002) e ao capítulo “Arquitetura no Rio Grande do Norte”, de
autoria de Jeanne Fonseca Leite Nesi, que integra o Caminhos da Arte no Rio Grande do Norte (NESI,
OLIVEIRA e ALMEIDA, 2001).
4
9
Consideramos, para fins deste trabalho, como historiografia o conjunto da produção de obras de cunho
histórico-historiográfico, seja de natureza acadêmica ou não acadêmica. A historiografia regional compreende as
obras cuja finalidade foi abordar a região do Seridó, enquanto a local corresponde aos livros que tratam,
especificamente, da realidade de Acari.
5
10
Sobre a História da Cultura Material, enquanto dimensão do conhecimento histórico, ver, também, as
contribuições de MENEZES (1983) e REDE (2012).
6
11
A bandeira do município exibe a data da confirmação, no entanto a emancipação política do município é
comemorada em 11 de abril. Na documentação escrita e disponível no Arquivo da prefeitura Municipal, os
documentos já fazem menção à Vila do Acari, mesmo aqueles datados de 1833 e 1834.
12
LABORDOC/FCC/1ºCJ/DIV/CAIXA 481 Municipio do Acary – Obras publicas, cota atual.
7
O visual da “urbe” brasileira é gerado por normas urbanísticas, que regulam a largura
das ruas, a altura das construções e a exemplos os impostos sobre o solo. Essas orientações
refletem ideais estéticos, higiênicos e morais, onde a forma urbana e as edificações refletem
os valores sociais vivenciados no espaço público (MARTINS, 2010). Essa situação pode ser
observada nos dias atuais, mas, neste estudo, lançamos nosso olhar para o período imperial,
época em que as Posturas tiveram grande influência na concepção formal do espaço urbano.
No Brasil Colonial, e com mais vigor no Império, as Câmaras Municipais eram
responsáveis pela realização das obras públicas e pelo estabelecimento das Posturas
municipais, que podem ser compreendidas como uma legislação inicial na tentativa de
organizar o espaço urbano. As Posturas padronizavam e uniformizavam as construções das
casas, com o objetivo de garantir uma melhor estética visual das vilas e aglomerações
urbanas. A Altura, a largura, o alinhamento e até a cor da fachada eram impostos por lei.
Foi durante a administração do Marquês de Pombal que as Províncias do norte
receberam maior atenção no sentido de ordenar e organizar os seus núcleos urbanos,
principalmente os que ficavam no interior. A estética das edificações e do espaço público era
das preocupações vigentes.
Sebastião José de Carvalho Melo, Marquês de Pombal, foi Primeiro-ministro do Rei
Dom José I, entre 1750 e 1777. No período em que se manteve no cargo, deu muita atenção as
questões relativas ao espaço urbano, especificamente, aos aspectos estéticos das
aglomerações. No Rio Grande do Norte, as atuais cidades de Portalegre, Vila Flor e São José
de Mipibu são exemplos da intervenção Pombalina. Seus projetos urbanos foram resultantes
de uma série de ideais, que tinha a regularidade do espaço como premissa. O traçado urbano
das localidades se expressava em forma xadrez e também circular. (TEIXEIRA, 2005, p. 189-
8
206). A particularidade dessas três aglomerações é que tiveram suas origens em aldeamentos
indígenas.
Depois de termos verificado aspectos da organização e instalação do poder municipal
na Vila do Acari, é necessário acompanhar suas atribuições e ações no que diz respeito à
organização e controle do espaço urbano.
Em 1835, com a confirmação do título de Vila, a localidade recebe seu primeiro
Código de Posturas Municipais, e no artigo nº 8 chama atenção para o cuidado com o asseio
das ruas bem como as casas da aglomeração. “Em todo o cabeça de casal será obrigado a ter
limpas as frentes de suas casas nas povoações, nas quatro festas principais, de cada hum ano,
sob pena de pagar por cada vez que faltar a limpeza, duzentos réis para as despesas da
Câmara” (ACARI, Lei nº 7, de 04 de março de 1835). Esse artigo nos mostra uma
preocupação com a higiene da aglomeração, não deveria haver mato, sujeira ou entulho, nem
em via pública nem nos quintais das construções, onde até as formigas deveriam ser
eliminadas, tudo isso para garantir a salubridade da vila.
As Posturas municipais eram abrangentes, davam conta de vários aspectos do espaço
urbano. Além da limpeza, as leis cobriam também os aspectos estéticos e formais das ruas. No
artigo nº 13 há uma preocupação com o alinhamento das construções, caso fosse
desobedecido a casa seria derrubada à custa do proprietário (ACARI, 1835).
As questões higiênicas também são cobertas pelas Posturas municipais. O espaço
urbano insalubre e propício a doenças precisava ser saneado, havia preocupações com os
enterramentos nas igrejas, que deveriam ser feitos em cemitérios fora dos limites urbanos. As
ruas seriam mais largas para facilitar a circulação do vento, as casas com maiores janelas, de
modo que o sol pudesse dissipar a umidade, os dejetos humanos e animais teriam que ficar
longe das fontes de água. Essas características aliadas ao aspecto retilíneo, são expressões de
uma evolução na forma urbana das vilas e cidades, esse processo acentuou-se principalmente
no decorrer do século XIX.
As epidemias eram constantes, varíola, febre e cólera apareciam em surtos, e melhorar
a higiene seria fator decisivo para conter tais situações. A Câmara Municipal mostrou, em
algumas oportunidades, certa preocupação com as fontes de água e as latrinas, por medo de
contaminação13. Em 1833, a Câmara da Vila do Acari recebeu 40 exemplares da Sociedade
13
Como, por exemplo, visto em ata do dia 10/01/1844, onde o fiscal foi orientado a fazer a correção das fontes
de água, dos muros das casas, e punisse aqueles que acumulassem lixo e entulho em seus respectivos quintais,
sendo assim também proibido, jogar dejetos animais mortos e imundícies próximo as fontes de água.
9
Médica do Rio de janeiro, com o parecer sobre questões ligadas à higiene pública e
principalmente a cólera.
À medida que o espaço da municipalidade ia se transformando, o governo provincial
precisou elaborar planos e políticas de higiene para o espaço público. O pensamento social no
século XIX foi fortemente influenciado pelo olhar médico, era preciso diagnosticar os males
urbanos e encontrar soluções para erradicá-los. A teoria dos miasmas tinha uma explicação
para essas epidemias: eram causadas pelos odores exalados de cadáveres em decomposição,
espalhando a pestilência através do ar respirado. Os ideais sanitaristas tiveram reflexo direto
no espaço da vila, uma vez que os enterramentos nas igrejas deveriam ser proibidos, como
visto em carta do governo provincial à Câmara da Vila do Acari em 1855.
Art. 15. Os proprietários que vivem nesta vila e povoações do município são
obrigados a manterem caiadas (limpas) e pintar as fachadas de suas casas, e caiar
(limpar) 5 m de extensão de largura na parte frontal e lateral [...] dentro dos
próximos 11 meses a partir da data que esta lei for aprovada. Devem mantê-los em
bom estado. Os transgressores irão pagar uma multa vale 5.000 réis, e no caso de
não ter dinheiro será preso a uma taxa de 1.000 réis por dia15.
14
Documento obras publicas do município de Acari. LABORDOC/FCC/1ºCJ/DIV/CAIXA 481.
15
APMA, Documentos antigos, Pasta nº 38, 1845 a 1864.
10
A aplicação dessas leis era feita pelo fiscal que, se necessário, recebia auxílio de um
Inspetor de Quarteirão. As principais funções deste estavam ligadas à fiscalização e execução
das orientações legais, alertando e multando os que não cumprissem as determinações da
Câmara, além de ter que apresentar um relatório de suas atividades. Como agente muito
importante do espaço urbano nesse período, o fiscal devia prestar conta de seu trabalho, a fim
de melhorar a atuação do poder municipal, como visto a seguir:
[...] Compareceu o fiscal do termo desta vila Manoel Severiano, o qual prestou
contas das correições que tinha feito, e pedindo a Câmara que lhe mandasse
satisfazer a quantia de 6.000 réis, que tinha sido despendido com dois serventes, o
que sendo ouvido pela Câmara ordenou ao procurador para mandar satisfazer o
fiscal [...] (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI, 1851).
Todos os moradores deviam pedir licença para poderem construir suas casas, mas essa
situação poderia se aplicar a outras construções. Alinhamento das casas, limpeza, extensão e
largura/abertura de ruas/viela era o foco principal das orientações.
Em algumas ocasiões, como por exemplo, a registrada em ata de 30/10/1858 os
vereadores discutiram sobre casas que não respeitavam o alinhamento proposto e convocavam
seus donos para que as derrubassem. Em ata ordinária datada de 25/10/1858, a discussão era
sobre a abertura de um beco de nove palmos de largura. As casas eram obrigadas a ter suas
frentes caiadas (limpas), rebocadas e possuírem calçadas com 5 palmos de largura. (Pasta Nº
37, 1833-1849, artigo nº 15, 16/08/1849)
A principal função dessas leis era controlar o espaço urbano em seus aspectos estético-
formais. Acompanhando os artigos adicionados a esse instrumento legal de controle na Vila
do Acari e cruzando com as atas e circulares16, podemos evidenciar duas situações: nem
sempre as orientações do referido código eram cumpridas, ou por parte do fiscal ou por parte
da população, e, em certas ocasiões, as construções se davam de maneira espontânea. É
possível observar que em algumas oportunidades, o Governo provincial pediu à Câmara da
Vila do Acari que cumprisse suas posturas.
Mesmo que as Câmaras Municipais não fossem dotadas de um plano urbanístico para
as aglomerações como um todo, parece-nos claro que “a estética e a forma urbana das vilas
16
As atas de reunião da Câmara da Vila do Acari nos revelam que em algumas ocasiões existiram conflitos e
violência entre moradores e o fiscal encarregado de executar as leis municipais. Por vezes, os vereadores
apontam negligência por partes dos fiscais, cobrando-lhes um relatório de suas atividades. O governo provincial,
por várias vezes, demonstrou preocupação com o cumprimento das Posturas e enviou várias circulares às
autoridades políticas do Acari, pedindo que as recomendações fossem seguidas, mesmo que fosse preciso usar a
força policial. Essa documentação encontra-se no Arquivo da prefeitura Municipal.
11
foram moldadas pelas posturas municipais, e que estas acabaram por ser, ainda que de
maneira embrionária, uma espécie de pré-urbanismo” (TEIXEIRA, 2012, p. 58). No caso de
Acari, essa forma urbana perdura até hoje, principalmente no centro histórico, produto do
século XIX. O alinhamento, a largura, a extensão e as fachadas das ruas ainda mostram os
efeitos e a importância que essas orientações tiveram para a urbanização da cidade.
17
Valor equivalente a 89,650 kg de ouro ou o preço de cinco mil vacas na época. (MEDEIROS FILHO, 1981, p.
177)
18
Termo de origem árabe, que se aplica ao tijolo de terra ou barro, no qual se mistura frequentemente estrume ou
fibra vegetal para lhe dar maior consistência. O adobe difere do tijolo principalmente por não ser cozido, apenas
secado ao sol. (TEIXEIRA, 2012, p. 263)
12
Segundo Nobre (1971, p. 151), Acari “[...] tem boa casaria. É ornada de dois templos
sobressaindo o da padroeira da freguesia, para a construção e elegância do qual muito
concorreu o respeitável Vigário Tomaz Pereira de Araújo”. Observando essa descrição,
podemos concluir que o casario urbano de Acari já apresentava a alvenaria como técnica-
construtiva, em duas águas inspirado no estilo colonial20. Nobre era funcionário do governo
provincial e viajou pelo interior fazendo descrições de vilas e cidades no ano de 1877.
As transformações da forma urbana no espaço de Acari não escaparam da
secularização, que estava em curso nos demais lugares, Natal, Caicó, Assu. Para analisar essa
situação, observamos em um primeiro momento, uma petição de 05 de julho de 1886,
19
APMA, documentos antigos, pasta nº 4, 1890 a 1900.
20
A casa em estilo colonial se caracteriza em linhas geras por não possuir recuo lateral nem frontal, ser
germinada, ou seja, colada a outra. O pé direito e cumeeira muito altos, telhado em duas águas (LIMA, 2002, p.
39-47). Além dessa tipologia, existia também o sobrado, elemento de certa distinção de classe. No Seridó, o
primeiro sobrado foi construído em 1810, pertencente ao padre Francisco de Brito Guerra (MACÊDO, 2007, p.
151) Em Acari, esse tipo de edifício seria construído por volta de 1880, de propriedade do também Padre José
Modesto Pereira de Brito, sobrinho de Brito Guerra (SANTA ROSA, 1974, p. 77).
13
encaminhada pelo vigário Tomaz Pereira de Araújo. Nela, o mesmo pede à Câmara dos
Vereadores que retire a feira semanal do domingo e transfira para outro dia, por este ser dia
santo. Os vereadores responderam dizendo que não possuíam competência e, tão pouco,
justificativa para atender tal desejo. O texto da ata contem o seguinte teor:
Na feira estabelecida aos domingos, costume esse reprovado, tanto do ponto de vista
físico, pois não se pode consumir todo tipo de alimento, e moral pois trata-se de um
dia santo, onde o senhor nosso Deus descansou depois de ter criado céus e terra,
então venho em nome da moral e do progresso espiritual dessa vila pedir que a feira
seja estabelecida na segunda.
“O outro elemento que evidencia esse espaço urbano cada vez mais laico, foi a
secularização do cemitério público local, em 6 de dezembro 1898.” (CÂMARA MUNICIPAL
DA VILA DO ACARI 1885-1908). Sobre a secularização dos cemitérios em específico,
podemos citar a tese de Santos (2011). O Processo de Dessacralização da Morte e a Instalação
dos Cemitérios no Seridó (XIX-XX).
Na festa de translado da padroeira esse uso sagrado e profano do solo é visível, ao
passo que se estima que 8 mil pessoas e 18 sacerdotes tenham assistido a cerimônia, 60 mesas
de jogos foram vistas espalhadas pela vila.
De acordo com o censo de 1890, o total da população dentro dos limites municipais de
Acari foi de mais de 9.000 habitantes. A vila continha 198 prédios e 10 ruas. (SANTA ROSA,
1974, p. 87). O título de cidade foi concedido em 1898, uma boa evidência do
desenvolvimento urbano local. Em1899, as lideranças políticas de Acari viam claramente a
necessidade de organizar as ruas e praças e adotar uma nova malha urbana 21, também
mostravam preocupações estéticas no que diz respeito às paredes que se destacavam nas
artérias da cidade. Ao consultar um corpus documental22 disponível no Arquivo da Prefeitura
Municipal, ficou claro que esse Código de Posturas de 1899 já apresenta um discurso em
função da modernidade.
A “modernização” da malha urbana se expressava no surgimento das novas ruas largas
e retilíneas. A necessidade de modernizar o meio urbano da cidade se deu por uma forte
21
Essas ideias foram postas na pauta de discussão pelos vereadores, quando discutiam sobre o novo código de
postura da cidade em 1899 em reunião no Conselho da Câmara. As orientações que pautavam o discurso eram
ideias de modernidade e progresso, corroborando o positivismo vivido pelo alvorecer da República.
22
Os artigos, adicionados às Posturas municipais da Vila do Acari em 1896, exibem uma considerável
preocupação com a expansão e alargamento das vias urbanas, como o tamanho, a forma e até a posição das ruas,
que ficavam principalmente no centro da vila.
14
remodelação na parte mais antiga do aglomerado urbano, sobretudo, no largo que se abria em
frente à antiga matriz, onde várias construções da fase inicial da povoação foram destruídas23.
É das reuniões da Câmara e das Posturas Municipais de 1896 que se pode detectar o
desejo de reconfigurar o espaço urbano de Acari, pois as preocupações com as questões
estético-formais continuavam. Contudo, paulatinamente, vai se percebendo que as orientações
apontam agora para a criação de novas ruas grandes e largas, e para efeito disso, as casas
pequenas e de técnicas construtivas frágeis seriam substituídas, sucessivamente, por
construções de maiores proporções, mas sem fugir do trinômio fachada/limpeza/alinhamento.
É também desse período a demolição da Casa de Caridade erguida pelo Padre Ibiapina24.
Os valores de uma cidade republicana são vários: as praças, os nomes dos locais
públicos, das ruas, e, principalmente, a regularidade dos espaços urbanos, valores que são
vistos na cidade do Acari. O primeiro capítulo das Posturas municipais de 1899 é voltado
completamente para seus aspectos urbanos, nomes de ruas, dos espaços, numeração das casas
e pela primeira vez a necessidade de plantar de árvores. O primeiro artigo diz o seguinte:
As ruas que de agora em diante se abrirem dentro do perímetro desta cidade, terão,
pelo menos, a largura de 10 metros, salvo obstáculo invencível, e serão cortadas por
outras em ângulo reto e na distancia de 25 metros de uma para a outra [...] (ACARI,
Lei nº 1, de 14 de março de 1899, 1899).
23
Nessa onda avassaladora de modernização/demolição, subsidiada mediante a prosperidade trazida pela
economia algodoeira e o gado, muitas construções de pouco valor venal, como cita Santa Rosa (1974, p. 77)
foram destruídas, a exemplo de uma casa, considerada a primeira de Acari, que ficava à direita da Igreja do
Rosário, e veio abaixo em 1908 para dar lugar ao moderno prédio do Grupo Escolar Tomaz de Araújo.
24
A Casa de Caridade foi construída em junho de 1864 pelo Padre Mestre José Antonio de Maria Ibiapina. Na
casa, ficavam freiras, aleijados, cegos, paralíticos. Com boas provisões, abrigava entre 40 e 50 pessoas, o edifício
tinha dois hospitais, salas de jantar, no pavimento térreo, no primeiro andar, sala de dormida e muitos quartos.
Certamente, a casa foi construída em pedra e cal, ou, embora não seja mencionada por Manuel Ferreira Nobre, a
construção devia ter boas proporções e um apuro construtivo acompanhando o momento de melhorias no meio
urbano pelo qual Acari passava. (SANTA ROSA, 1974, p. 79)
15
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Acari viveu a partir de meados do século XIX, uma evolução e melhorias em seu seio,
mas nos fica claro que essa situação se deu de maneira menos intensa que em outras partes da
província. A pecuária e o algodão forneceram capital parar alavancar essas melhorias, fazendo
surgir novas tipologias arquitetônicas que transpareciam o bom momento vivido. O prédio de
mercado publico, a Casa de Câmara e Cadeia, são sem duvidas representantes da prosperidade
que o aglomerado viveu.
No século XX a cidade continuou a crescer em um bom ritmo, a “modernidade”
aparecia nas fachadas das casas e nas transformações vividas na parte “antiga” da cidade, o
embelezamento e ajardinamento, a preocupação com as artérias da urbs mostram esse desejo
de progresso.
Em linhas gerais acreditamos que conseguimos dar contar de responder as questões por nos
mesmos propostas, é obvio que há pontos que precisam e devem ser mais explorados e
problematizados em ocasião futura, por nos ou pôr outro pesquisador interessado na temática.
16
REFERÊNCIAS
BARROS, José D´assunção. Cidade e história. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
_______. História do Rio Grande do Norte. 2.ed. Natal: Fundação José Augusto, 1984.
FEIJÓ, Paulo Heider Forte. A arquitetura tradicional de Acari no século XIX: estudo
comparativo entre a casa – grande de fazenda e a urbana. Natal: Dissertação de Mestrado, 115
p., UFRN, 2002.
MACÊDO, Muirakytan Kennedy de. Rústicos cabedais: patrimônio e cotidiano familiar nos
sertões do Seridó (Séc. XVIII). Natal: Tese de Doutorado, 286 p., UFRN, 2007.
MACEDO, Helder Alexandre Medeiros de. Outras famílias do Seridó: genealogias mestiças
no sertão do Rio Grande do Norte. Recife: Tese de Doutorado, 360 p., UFPE, 2013.
MORAIS, Ione Rodrigues Diniz. Seridó norte – rio – grandense: uma geografia da
resistência. Caicó: 2005.