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TEXTO TEATRAL: PROFESSORA GUERREIRA!

PERSONAGENS:

PROFESSORA ANÍSIA

ALUNO RICARDO

ALUNO MARCELO

ALUNO RAMON

DIRETORA DONA SOFIA

MOÇA DROGADA

CENA 1:

(ENTRA A PROFESSORA NUMA SALA DE AULA)

PROFESSORA: Sou professora do ensino médio de uma escola pública da periferia de São
Paulo. Gosto de todos os meus alunos, embora como todo professor, eu tenha alguns bastante
difíceis, daqueles que nos fazem perder a paciência, nos esgotam e nos angustiam às vezes.
Sou uma professora que se preocupa muito com eles, com todos, mas principalmente com
aqueles que, por algum motivo, não querem ou não conseguem aprender. Posso me dar ao
luxo de dizer que tenho pouquíssimos alunos assim, pra ser sincera, apenas 3. Mas esses 3 eu
considero como o meu maior desafio. E ficaria feliz em poder ajudá-los. A não fazerem parte
de uma estatística muito ruim. A triste estatística daqueles que param de estudar e suas vidas
ficam bem mais difíceis... principalmente para se conseguir um bom emprego. E sem emprego,
então nem se fala. (E SENTA-SE TRISTE) Muitos viram até delinquentes, (E FAZ O NOME DO
PAI) Ai, meu Deus eu não quero isso para meus alunos! Será que não tem um jeito de eu fazê-
los se interessar mais pela vida na escola? Eu acho que... (PENSATIVA) só assim poderiam ter
um futuro. Só se eu soubesse como é a vida deles fora da escola, como vivem, onde moram, e
como são suas famílias. (E TENDO UMA IDÉIA) Eu poderia tentar saber, para poder ajuda-los
aqui na escola. Ricardo, por exemplo...

(ENTRA RICARDO) Ele está sempre com sono... (SENTA-SE NA CADEIRA BOCEJANDO) E com
preguiça... (SE ESPREGUIÇANDO) parece estar nas nuvens, não consegue se concentrar em
nada... e às vezes, meio apático.

(ENTRA MARCELO) Marcelo também não é muito diferente, percebo que ele poderia render
bem mais nas aulas, porém algo o atrapalha, parece que existe uma barreira que o impede de
se esforçar mais... e ir mais longe. (ELE DÁ UM PETELECO NA ORELHA DE RICARDO, QUE POR
SUA VEZ O EMPURRA, E A PROFESSORA PRECISA ACUDIR RICARDO) E as vezes me parece um
tanto violento. ( E SEGURANDO MARCELO) – Será que precisa essa violência, Marcelo?

MARCELO: Eu vou pegar você lá fora, seu imbecil!!!

RICARDO: E você acha que eu tenho medo de você, seu ignorante!!!

MARCELO: (IRADO) – Pois devia ter, devia ter...

PROFESSORA: Parem vocês dois, ninguém vai brigar lá fora, já pensou que vergonha para a
escola? (E VOLTANDO A SENTAR-SE, VOLTA A FALAR COM O PUBLICO) – Vocês estão vendo
como é, são alunos rebeldes, de comportamento muito difícil. Eu confesso que não sei como
lidar com eles, esta é a minha frustação! (E CAMINHANDO PARA O OUTRO LADO DO PALCO.
APARECE RAMON NA CENA) – E ainda tem o Ramon, um aluno muito indisciplinado, mal
educado, sempre com a cara fechada e com a língua muito afiada... (RAMON ENTRA COM
CARA DE RUIM, BEM BRAVO E VIOLENTO, EMPURRA A CARTEIRA COM FORÇA E SENTA-SE
COM DESAJEITO), Eu realmente não sei o que fazer com esses alunos, que Deus os ilumine e
proteja e os faça um dia seguirem um bom caminho. Mas eu sinto que posso fazer alguma
coisa para ajudar... eu queria tanto mudar isso... e vou tentar! (DE REPENTE, ENTRA A
DIRETORA BEM NERVOSA)

DIRETORA: - E aí seus vagabundos, vocês não prestam pra nada mesmo, eu quero saber quem
vai pagar o vidro quebrado lá da secretaria! (E A PROFESSORA VAI ATÉ O PÚBLICO:)

PROFESSORA: - E pior que a professora não ajuda muito!!!

DIRETORA: - Professora, eu não sei como a senhora aguenta essa turma de delinquentes, eu já
estou quase os expulsando dessa escola, não aguenta mais essa quadrilha... Cada dia uma
coisa!

PROFESSORA: - Diretora, calma! Pode deixar que eu vou dar um jeito de descobrir quem
quebrou o vidro.

DIRETORA: - Nada disso, professora, eu já mandei chamar o pai de todos eles, e é com eles que
eu vou conversar!

MARCELO: - olha aqui, sua velha xarope, pois saiba que o meu pai não vem, é capaz dele dar
um tiro na sua cara se a senhora for procurar ele!

DIRETORA: - O Que você está me dizendo? Ora, como ousa, seu petulante!

RAMON: - Isso mesmo, sua velha careca, a gente sabe que a senhora usa peruca!

DIRETORA: - o quê mas vocês são muito confiados, quem te disse uma barbaridade destas?

MARCELO: - Eu mesmo, diretora, eu subi no muro da sua casa e vi lá de cima que a senhora
coloca uma peruca toda vez que vem pra escola... (DE REPENTE, RICARDO COMEÇA A DORMIR
E A RONCAR)

DIRETORA: - Como assim, o que você foi fazer lá na minha casa? Estava querendo me roubar é,
seu marginalzinho... Eu não vou lhes dar nem advertência, e nem uma suspensão, eu vou pular
para uma expulsão... Já para a Diretoria... Fora! Fora!

PROFESSORA: (PERCEBENDO UM BARULHO) - Calma, gente! Ouçam esse barulho estranho na


sala! Parece um... Roncooo... (E SE DIRIGINDO A RICARDO QUE CONTINUA DORMINDO NA
CARTEIRA) – Ah, é você que está aí quietinho, Ricardo? Acorde, rapaz!!! (E ELE ACORDA
BOCEJANDO)

DIRETORA: - Ah, e você está aí roncando? Mas essa turma é mesmo surreal!!! Você não dormiu
direito essa noite, ou ficou na rua sem dormir??? Você também considere-se expulso!!!

RICARDO: (LEVANTANDO-SE PARA SAIR) – Ebaaa!!!

PROFESSORA: - Espera aí, moço, ninguém vai deixar a minha sala de aula!

DIRETORA: - Como assim, professora! Eles não têm jeito, são ervas daninhas que podem
estragar os outros alunos!
PROFESSORA: - Calma, Dona Sofia, nós precisamos reajustá-los, expulsos eles oferecerão
perigo para a sociedade, não podemos simplesmente descarta-los como se eles fossem
ninguém! Eu vou arrumar um jeito de fazer eles aprenderem e serem alguém na vida!

DIRETORA: - Eu realmente admiro a sua paciência, professora! Esses alunos vieram do inferno,
são piores que o capeta!!! Mas se a senhora quiser continuar aguentando essas pestes, eu não
posso fazer nada! ( E JÁ ESTAVA SAINDO QUANDO SE LEMBROU: ) Só vou lhe pedir uma coisa:
(E GRITANDO COM ELA:) – Eu quero o dinheiro dos vidros que esses alunos quebraram... E pra
ontem!!!

PROFESSORA: - Pode deixar, dona Sofia, se eles não pagarem, eu pago.

DIRETORA: - Então tá bom! (E ANTES DE SAIR, CHEGA BEM PERTO DA PROFESSORA) Sendo
assim, eu só tenho mais uma coisa a dizer: Boa, sorte, professora, a senhora vai precisar!!!

PROFESSORA: - Obrigada, dona Sofia! (E QUANDO ELA SAI, SE APROXIMA DOS ALUNOS) –
Muito bem, gente, agora podem sentar!

MARCELO: - Professora, a senhor vai ter que pagar os vidros pra nós, porque nossos pais não
vão pagar!

RAMON: - Até porque nenhum de nós tem pai... (OS TRÊS RIEM)

PROFESSORA: - Tudo bem, eu pago, mas sentem-se e me ouçam. (ELA CHEGA FIRME PARA
ELES, E CADA UM SENTA-SE, A COMEÇAR POR MARCELO). – Eu não quero que a diretora
mande vocês embora, porque eu... eu gosto de vocês! E sinto que vocês têm muito a me
ensinar!

RAMON: - Como assim, Professora? Quem tem que ensinar aqui é a senhora!

PROFESSORA: - Eu sei, meus queridos, mas hoje eu que quero conhece-los melhor, me contem
como vocês vivem, o que fazem fora da escola... e porque faltam as vezes?

MARCELO: - Ih, nem queira saber, professora! Se a senhora souber o que o Ricardo faz fora da
escola, a senhora cai dura... (RINDO)

PROFESSORA: - É mesmo? Eu gostaria muito de saber...

MARCELO: - Porque será que o danado fica dormindo o tempo todo na sala, hein? (RINDO EM
TOM DE PROVOCAÇÃO)

RICARDO: - Cala a boca, desgraçado!

RAMON: - É verdade, professora! O Ricardo chega muito cansado! (RINDO CINICAMENTE)

RICARDO: - Pelo menos, o meu serviço é limpo, não tem a sujeira que o seu tem. Nem a do
Ramon que é pior ainda que o meu!

RAMON: - Se você contar o nosso serviço, eu e o Marcelo quebramos a sua boca!

PROFESSORA: - Ora, calma, rapazes, não há de ser nada tão ruim assim, pois saibam que eu
antes de ser professora, tive que estudar, e meus pais eram muito pobres, então eu tive que
fazer uma coisa muito feia também, eu fiz book rosa!

RICARDO: - O quê??? (OS TRÊS FICAM SURPRESOS E SENTAM NA CARTEIRA) A senhora fez
então uma coisa pior que nós três!!!
PROFESSORA: - Isso mesmo, eu acho que sim... eu fazia programas, e isso me ensinou muito,
eu aprendi muita coisa ruim, eu sofri muito, foi um tempo muito difícil para mim... haviam
muitas pessoas más, muita gente mal intencionada, ganhei dinheiro, mas perdi minha
dignidade, e pra reconquistá-la tive que parar... foi quando eu me formei e passei a dar aulas...
aí tudo se tornou melhor pra mim... porque eu consegui estudar, consegui me tornar alguém...
porque se eu não tivesse estudado, hoje eu não sei oque eu seria...

RAMON: - Nossa, professora! A senhora é tão certinha, tão educada, nunca pensei que tivesse
passado por isso!!!

MARCELO: - É verdade, professora! Isso é novidade!

PROFESSORA: - Sim, meus alunos, mas nada como um dia após o outro, eu fui uma prostituta,
mas hoje não sou mais, aprendi muito com isso, amadureci, sinto que foi necessário pra mim,
mas hoje não preciso mais... E o mesmo acontece com vocês, sei que vocês também tem um
segredo, e tem vergonha de contar, não deve ser uma coisa que vocês consideram muito
digna, mas está lhes servindo para ensinar alguma coisa!

RAMON: - Será mesmo, professora?! Eu acho que não, está servindo apenas para nos estragar
a vida!

PROFESSORA: - Tudo nos ensina, coisas boas e coisas más, até uma doença como um câncer
nos ensina a dar mais valor para nossas vidas. Não há nada que sirva apenas para nos destruir,
a não ser que um dia não deixemos de fazer aquilo que nos faz mal, que nos corrompe, que
nos causa mal... Ou se for algo que estiver além do nosso controle, mas só se for uma doença
incurável ou um acidente mortal, mas não é o que acontece com vocês, não é mesmo?
(PAUSA) – Agora eu gostaria que cada um de vocês contasse o seu segredo, assim como eu
contei o meu...

MARCELO: - Bem professora, como a senhora vai pagar o vidro quebrado pra diretora, e como
o meu segredo não é tão grave como o seu, eu vou lhe contar o meu segredo.

(SAEM OS TRÊS DE CENA E FICA SÓ MARCELO, APAGA A LUZ)

CENA 2:

(ACENDE A LUZ, MARCELO ESTÁ AGORA NO MEIO DO PALCO, CONVERSANDO COM O


PÚBLICO)

- Hoje eu quero vender todo o bagulho, tenho que encontrar um trouxa que aceite ficar
viciado nessa droga... Preciso de dinheiro pelo menos pra pagar o atravessador. (DE REPENTE
ENTRA UMA MOÇA QUE CHEGA PARA MARCELO BEM SORRATEIRAMENTE)

MOÇA: - E aí, cara, quanto você tem hoje pra me arrumar?

MARCELO: - Boa menina, hoje eu tenho um bagulho muito do bom, esse é de primeira, vai te
deixar bem louquinha... mas esse também é um pouco mais caro!

MOÇA: - Ora, seu interesseiro, você é muito mercenário, quem me garante que esse bagulho é
bom?

MARCELO: - Muito bem, se a mocinha não acredita na minha palavra, então esqueça, vá
comprar com outro, vá ciscar em outro terreiro!
MOÇA: - Tá bom, tá bom eu pago, quanto você quer por ele? (E COMEÇA A TIRAR DINHEIRO
DE UMA BOLSA)

MARCELO: (ARRANCANDO A BOLSA DELA) – Pode me dar tudo o que você tem na bolsa! (TIRA
TUDO E JOGA A BOLSA) – Você ainda vai sair no lucro, essa droga é muito boa!!! (RINDO
SATISFEITO)

MOÇA: - É? Eu não vejo a hora de experimentar!

(APAGA A LUZ SAEM OS DOIS)

CENA 3:

(ENTRA A PROFESSORA SEGURANDO UMA BOLSA E RAMON)

RAMON: - Professora, o meu serviço não é serviço, eu sou vagal mesmo, sou um cara do mau...
muito do mau... ( E AMEAÇANDO A PROFESSORA)

PROFESSORA: - Eu não acredito nisso, não, não existem pessoas totalmente más, você está me
assustando...

RAMON: - Isso mesmo! (APONTANDO UMA ARMA E TOMANDO A BOLSA DA PROFESSORA)


Passe a sua bolsa pra cá, deve carregar uma boa grana... é isso mesmo que eu faço nas minhas
horas vagas, professora! Eu roubo as pessoas, eu sou um ladrão, satisfeita agora? E a senhora
tem bastante grana aqui...

PROFESSORA: - Bem se você acha que é isso mesmo que tem fazer, pode roubar, pode levar...

O importante é que você logo vai deixar de fazer isso, porque isso não vai te levar a nada, isso
não tem futuro...

RAMON: - Como assim, professora? Dinheiro tem futuro sim...

PROFESSORA: - Mas não dessa forma, Ramon. Um dia você vai ter que parar, porque senão
Você terá algo que o fará parar a força. Ninguém consegue dessa vida nada de graça!

RAMON: ´- Como assim?

PROFESSORA: - Algo muito cruel poderá te acontecer se um dia você não parar!

RAMON: - Imagina, professora, eu me garanto!

PROFESSORA: - Bem se você pensa dessa forma, então vai em frente, atire em mim... Vai até o
fim...

RAMON: (PERDENDO A CORAGEM:) Como assim, professora? Eu nunca matei ninguém...


(BAIXANDO A ARMA) – A arma é só para assustar... ela nem é de verdade, é de brinquedo!

PROFESSORA: - Ora, Ramon, você não acha isso uma covardia, então que droga de serviço é
esse? Você não se cansa de brincar com uma arma e assustar velhinhas? Vem cá, rapaz, você já
não acha que é muito mais fácil e seguro para a sua vida, estudar, se formar e ganhar dinheiro
de maneira lícita? Pode ficar com o meu dinheiro, mas vamos voltar para a escola...

(ESCURECE A CENA. COLOCA-SE UM MINI PALCO NO MEIO DO PALCO)

CENA 4:
(ENTRA A DIRETORA, MUITO MALUCA, E EM SEGUIDA ENTRA RICARDO COM UMA FANTASIA
DE GOGO BOY, TOCA UMA MUSICA E ELE SOBE NO MINI PALCO E DANÇA PARA ELA QUE FICA
EUFÓRICA, ELA PEGA NAS PERNAS DELE E ELE SEGURA NO CABELO DELA E ACABA TIRANDO A
PERUCA E CONTINUAM BRINCANDO. ENTÃO ELE DESCE E FALA PARA O PÚBLICO, ENQUANTO
ELA FICA NO FUNDO COM UM PEDAÇO DA ROUPA DELE) – Está vendo, professora, porque eu
durmo a aula inteiro, essa mulherada me deixa cansado, eu sou um gogo boy!Eu sou o
Ricardão! (ELE DÁ RISADAAPAGA A LUZ, SAEM OS DOIS)

CENA FINAL:

(ENTRA A PROFESSORA MUITO PREOCUPADA)

PROFESSORA: Será que os meus alunos vão voltar para a escola hoje? Será que eu fiz o certo
de ter sido sincera com eles, ter aberto o meu coração, e ter contado o meu segredo? Será que
eu fiz o certo de querer saber o segredo deles? Eu acho que eu fui muito sincera com eles, mas
eles também foram sinceros comigo, nós três tínhamos algo em comum, todos nós nos
sentimos iguais, cada qual com seu segredo, um segredo que nos serviu para aprender uma
grande lição... A lição da vida, essa que nem a escola pode nos ensinar... (E OLHANDO PARA O
LADO DO PALCO, COMO SE FOSSE UMA PORTA) – Mas será que eles aprenderam mesmo? Que
tudo nesse mundo é uma aprendizagem... enquanto estamos vivos, vamos aprendendo a cada
dia, coisas boas e coisas ruins mas vamos aprendendo sim... (NISSO ENTRAM OS TRÊS, CADA
UM SEGURANDO UM PRESENTE)

MARCELO: - Aprendemos sim, professora, com a sua ajuda, aprendemos, e não poderíamos
deixar de voltar para a escola, para aprender muito mais e termos um futuro na vida!

RAMON: - Isso mesmo, professora, a senhora nos convenceu...

PROFESSORA: - Eu fico feliz com isso, essa é uma lição que jamais vou esquecer... Marcelo,
Ramon e Ricardo, eu amo vocês!!!

OS TRES EM CORO: - Nós também te amamos, professora!!!

FIM

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