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Senado Federal

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Forma de aquisição da posse por meios violentos!) clandestinos e
precários!) a invasão não pode ser considerada legal
unz AUGUSTO GERMANa

or motivos econômicos,
algumas vezes políticos, ou
em menor escala sociais, vêm
se tornando cada vez mais
freqüentes as ameaças de invasão de
terras, improdutivas ou produtivas. Ao
proprietário rural, na realidade, pouco
importa o motivo ou o critério da esco-
lha do imóvel a ser invadido; importam
a agressão que sofre e a necessidade de
proteger sua propriedade.
A invasão (ou ocupação, como os
agressores querem denominar, com o
fim de descaracterizar a própria agres-
são), do ponto de vista jurídico, não
passa de um esbulho que no conceito
legal significa uma forma de aquisição
da posse por meios violentos, clandestinos e precários. politicamente e que, até, podem servir ao jogo de extre-
Tal agressão é, inclusive, passível de acarretar uma forma mistas que utilizam movimentos sociais como massa de
de defesa também violenta, que no caso não parece ser manobra para atingir fins ideológicos.
a medida mais adequada a ser tomada, vez que envolve O proprietário rural não pode esquecer que existem
meios caros, perigosos, nada confiáveis, inconvenientes soluções preventivas, não-violentas, legais, dentro do

SETEMBRO DE 2003 • REVISTA DE AGRONEGÓCIOS DA FGV 12


Estado Democrático de Direito que a grande maioria a geração de trabalho, emprego e renda na atividade
da população deseja preservar. Uma dessas soluções, de agricultura familiar, estimulando a qualidade de
como mecanismo jurídico/processual inicial à proteção produção, a escolaridade e a saúde dos beneficiados
da propriedade, é o interdito proibitório. Ele pode e deve diretamente pela reforma agrária. Afirmou que um dos
ser utilizado no momento em que o proprietário tem instrumentos para atingir tais objetivos é a desapropria-
informações de que seu imóvel pode vir a ser invadido, ção de terras com boa capacidade de produção e bem
ou simplesmente receia que a invasão venha a ocorrer. localizadas em relação às infra-estruturas já existentes,
A concessão liminar do mandado de interdito depende para que os assentamentos sejam mais prósperos e menos
das provas apresentadas, documentais e/ou testemu- custosos aos cofres públicos. Tudo de acordo com o
nhais. Essas provas, apesar de geralmente os invasores Estado Democrático de Direito. Justificou ainda sua
serem bem organizados, são de fácil obtenção; ademais, visita como uma oportunidade de esclarecer o modelo
o Judiciário já mostra uma postura de aceitação menos de reforma agrária no qual está se inspirando e por
exigente em relação às provas a serem produzidas, con- sua intenção de reafirmar "a confiança e a fidúcia que
forme já fixado em jurisprudência: "Sendo fato público deve ser consolidada" - usando as palavras do minis-
e notório a constante inva- tro - entre seu ministério e
são de terras nos dias atuais, os proprietários rurais, even-
configura-se o justo receio de tuais futuros desapropriados
moléstia a posse" ( R T 631 .O intElrdito proibitódopode e deve para fins de reforma agrária.
/ 152 ). Assim, pode bastar ser uiilizado no momento em que o Por mais nobres que possam
um simples acampamento parecer os objetivos sociais
na região próxima à proprie-
proprietarioteminformações de q~e do ministério, é bem difícil
dade, e já estará configurado seu imóvel pode vir a serinvaditlo,ou falar em confiança e fidúcia a
justo receio como condição simplesmente receia qUe aimlélsão um proprietário, que há uma
suficiente para a obtenção venhaaocQrre.r.A~oncessão Ihninar. ou duas décadas se dedicou
de uma ordem judicial. do manqadode interdito dep~nde das a desbravar regiões total-
Muitos dirão que tais mente desprovidas de infra-
instrumentos legais são de
provas apresentadas estrutura, sem estradas, luz
pouca eficiência, pois ainda e demais serviços públicos,
que exista a ordem judicial de e que hoje, adequadamente
proteção do imóvel e mesmo servido em sua propriedade
esta ordem impondo pena financeira ao Poder Público, por essas facilidades - serviços públicos que, muito
a invasão pode ocorrer. Dirão também que ocorrendo provavelmente, foram implantados na região do imóvel
invasão - caso em que, automaticamente, o interdito rural muito em função da obra que o desbravador desen-
converte-se em uma reintegração de posse - o Executivo volveu com muito custo, até de natureza pessoal - que
estadual nada faz, ou demora a fazer algo para despejar propiciaram uma produção adequada, e agora tenha de
os invasores. Tais afirmativas são verdadeiras. Aqui vale se resignar em aceitar a desapropriação de seu imóvel.
uma sugestão: se, no momento em que se estabelece Também é muito difícil esperar, dos proprietários rurais,
um acampamento, todos os proprietários rurais da confiança e fidúcia. Eles sabem, por já terem sofrido ou
região interpuserem, cada um, seu interdito proibitó- acompanhado casos de colegas, das atitudes nada con-
rio, o próprio Judiciário estadual, de forma indireta, fiáveis, praticadas pela administração pública federal,
mas legítima, deverá pressionar o Executivo estadual, especialmente vistores e procuradores do Incra que, por
levando-o a tomar alguma providência em relação aos exemplo, deixam de juntar documentos fornecidos pelo
acampados da região. proprietário aos autos do processo administrativo de
vistoria; estabelecem inadequados cálculos de unidades
Difícil confiança animais; fazem inadequadas considerações em relação
Antes de se analisarem as invasões ditas justificadas aos volumes da produção agrícola; determinam como
por improdutividade do imóvel rural, cabe uma análise ilegal a fixação das áreas de interesse ambiental estabe-
de natureza política. lecidas pelo proprietário do imóvel, assim prejudicando
O ministro do Desenvolvimento Agrário, em recente os índices da área utilizável; enfim, cometem erros,
visita a São Paulo, expôs as principais diretrizes que omissões e ilegalidades, contra as quais a interposição
norteiam as atividades administrativas de seu ministério de impugnação administrativa interposta pelo proprie-
e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrá- tário acaba por ser desconsiderada, apesar da correção
ria (lncra), autarquia operacional que lhe é vinculada: das demonstrações e fundamentações inseridas. Nada

REVISTA DE AGRONEGÓCIOS DA FGV· SETEMBRO DE 2003


mais resta ao proprietário rural, a não ser se socorrer do por vários outros representantes da sociedade, princi-
Judiciário que, diante de argumentos bem fundamenta- palmente ligados ao agronegócio. Com certeza seria
dos, não titubeia em determinar a concessão de liminar, um comitê bastante representativo de todos os setores
impedindo o prosseguimento do processo administrativo sociais que, direta ou indiretamente, cooperariam com
viciado, ou trazendo para si a incumbência de julgar se as metas estabelecidas na Lei de Política Agrícola (LPA).
o imóvel rural é ou não passível de desapropriação com De tais metas, destaca-se, no tema fundiário, o dever de
fins de reforma agrária. compatibilizar a produção rural com as metas de reforma
Entretanto, e aí está a maior causa de desconfiança, agrária, tendo em vista que só a ocorrência de tal com-
o Incra muitas vezes, apesar da ordem judicial, dá pros- patibilidade daria os devidos contornos legais à fixação
seguimento ao processo administrativo, declarando o de índices mínimos de produção rural; portanto, a LP A
imóvel improdutivo, encaminhando-o à Presidência da exige que a fixação de tais índices esteja condicionada
República para a decretação de interesse social na desa- à análise e mensuração do conselho. Em função dessa
propriação. Novamente o proprietário se vê obrigado a condicionante e sob o ponto de vista estritamente jurí-
bater às portas do Judiciário para buscar a declaração dico, só os índices mínimos nascidos do CNPA deveriam
de nulidade do decreto presidencial sob alto desgaste receber a tarja de índices legais para conseqüentemente
financeiro e emocional. Assim, esperar que haja con- passarem a ser exigidos do produtor rural no exercício
fiança recíproca entre executores da reforma agrária e o de sua atividade.
proprietário rural é esperar que os primeiros mudem suas Inexistindo o CNP A, toda e qualquer instrução nor-
atitudes, especialmente no que diz respeito à adequada mativa expedida pelo lncra isoladamente, que tenha o
interpretação e aplicação da objetivo de fixar parâmetros
lei e ao respeito às ordens mínimos de produtividade
judiciais. na atividade rural, carece
Do ponto de vista polí- Ê bem difídl féJlar em confiança e fidúda de legalidade, pois está des-
tico, podemos pois depreen- a um proprietário que há décadas se provida do aval do conselho.
der que o Incra tem intenções Como conseqüência jurídica
de desapropriar terras nobres
oeou:ou a desbravar regiões totalmente ulterior, todo e qualquer
e bem localizadas. desprovidas de infra~estrutura, sem processo administrativo de
Quanto à melhor pro- estradas, luz e demais serviços públicos, avaliação de imóvel rural
teção contra invasões por hoje adequadamente servido em sua com fins de reforma agrá-
improdutividade, há muita propriedade por essas fadlidades ria, sustentado na insufi-
discussão e insegurança em ciência de índices mínimos
relação aos índices mínimos de produção, está fadado
de produção agropecuária à nulidade, inviabilizando
estabelecidos em instruções qualquer desapropriação de
normativas nascidas no Incra. Para o proprietário imóvel rural. Assim não há como se falar em impro-
rural, são verdadeiros tormentos, na maioria das vezes dutividade, e a invasão nela sustentada acaba por ser
emocional, e às vezes um tormento real, efetivado nos também injustificável.
laudos de vistoria e avaliação de imóvel rural, para fins Portanto, podemos concluir que o proprietário rural
de desapropriação por interesse social, promovidos pelo tem todos os instrumentos legais para se proteger das
instituto. Entretanto tais índices não têm sido estabe- invasões, sob qualquer aspecto ilegais e injustificáveis.
lecidos de forma absolutamente legal, tendo em vista
que estão sendo fixados sem a interferência, legalmente
exigida, do Conselho Nacional de Política Agrícola
(CNPA). Este foi instituído pela Lei de Política Agrícola
que estabelece quais as ações e instrumentos públicos a
serem aplicados na fiscalização e no controle das ativida-
des agropecuárias, especialmente no que diz respeito ao
cumprimento de sua função social, e fundamentalmente
entre seus objetivos administrativos, compatibilizando
as ações de política agrícola com as de reforma agrária.
Tal conselho, conforme estabelecido em lei, deveria ser
presidido pelos ministros da Agricultura e da Reforma lulZ AUGUSTO GERMAIII é professor de direito agrário da FGV
Agrária, hoje Desenvolvimento Agrário, e constituído germani@germaninet.com.br

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