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1. INTRODUÇÃO
No presente estudo busca compreender a visão de trabalho docente que
os professores da escola pública, engajados numa perspectiva da educação
inclusiva possuem desse conceito.
Trabalho, em sentido amplo como proposto por Karl Marx em O Capital,
é toda a atividade humana que transforma a natureza a partir de uma matéria
fornecida, em outras palavras, "o trabalho é um processo entre o homem e a
natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e
controla seu metabolismo com a Natureza" (MARX 1996, p.297).
Assim sendo, o homem se transforma à medida que transforma a
natureza, e de acordo com Marx, o homem faz a mediação dessa
transformação da natureza pelo trabalho, porém as conceituações de trabalho
e do trabalho docente são termos para os quais nos parece indispensável
buscar um referencial teórico específico em relação ao processo de formação e
percepção que os professore(a)s da Educação Especial provavelmente terão
desses conceitos.
Hirata (2009) aponta para uma reinterpretação do conceito de trabalho
de Marx, agora não mais como relações de trocas entre o homem e a natureza
que tendem a ser naturalizadas e não historicizadas, modelo de trabalho
assexuado, mas sim como relações sempre específicas entre homens (os
homens e as mulheres) e as naturezas, em que o sujeito do trabalho está
sobre controle do capitalista ao qual pertence o produto do seu trabalho. Isto
nos fornece a possibilidade em pensar no sexo social, e na definição da divisão
sexual do trabalho.
Além disso, o surgimento da noção de trabalho assalariado, gerou a
história da separação entre o trabalho e o trabalhador, este trabalhador é o ser
da subjetivação, preso aquilo que deve se responsabilizar - o trabalho
(operações objetificadas).
De outro modo, a noção de trabalho doméstico é o oposto da
objetificação: o trabalho domestico é associado às relações de família baseada
na "ociosidade" que a maternidade e a vida conjugal das mulheres estão
estabelecidas. Nesse sentido, se inter-relacionam a captação do tempo e a
produção do viver, da reprodução: o trabalho assalariado e o trabalho útil, que
adotamos na presente pesquisa como categoria de analise do trabalho docente
na sala de recursos..
Barbara Castro e Mariana Roncato (2016) ao entrevistarem Helena
Hirata sobre o trabalho de mulheres, reafirmou na resposta dela, que o gênero
ainda não se estabilizou como categoria dentro dos estudos do trabalho,
mesmo passado mais de 40 anos em que o gênero foi introduzido como
categoria dentro da sociologia do trabalho.
Outra referencia muito citada em estudos culturais na Educação, Henry
Giroux (2003) concorda sobre a divisão sexual do trabalho, principalmente no
setor de serviços como a da educação em escola pública, que aponta o fato de
feminizar o ensino,.
Outro ponto de vista, em Londa Schienbinger (2001 p.349) esclarece
questões de sociedade e cultura, que embora a pesquisa dela é no contexto
norte-americano, também se aplica em países ocidentais, sobre a falsa noção
de individualismo que está incorporada numa divisão de trabalho social e
intelectual, que é mais significativa profissionalmente nas mulheres que nos
homens, onde permanecem estruturas básicas intocadas , por exemplo, as
divisões sexuais, as instituições de estrutura física e intelectual, tecnológica e
de objetos do cotidiano, que evidência a esfera privada para as mulheres e a
esfera pública para os homens.
Nesse ponto de vista, o que Londa Schienbinger diz é que diferentes
formas de organizar as vidas privadas e do trabalho produzem resultados
diferentes para as mulheres.
Silvia Federici (2004),. corrobora com Londa Schienbinger enfatizando a
tendência de atribuir a especialização das tarefas laborais, de modo exclusivo,
nas mudanças que o capitalismo introduziu na produtividade do trabalho. As
vantagens que a classe capitalista extraiu da diferenciação entre trabalho
agrícola e industrial e dentro do trabalho industrial, se reduzem quando
comparadas as extraídas da degradação do trabalho e da posição social das
mulheres. Esta autora defende que a diferença de poder entre mulheres e
homens e o disfarce de trabalho não remunerado das mulheres por trás da
farsa sobre a inferioridade feminina, permitiram ao capitalismo ampliar o
serviço não remunerado do dia trabalhado, e usar o salário (masculino) para
acumular trabalho feminino.
Portanto, a conclusão de Federici é que historicamente a acumulação
primitiva do capital, na verdade é uma acumulação de diferenças,
desigualdades hierarquias e divisões que separaram os trabalhadores entre si
e, inclusive, alienaram a eles mesmos.
Retomando a presente pesquisa, do ponto de vista histórico temos um
paralelo na divisão que ocorre dentro do trabalho no sistema educacional
brasileiro como um todo.
Além disso, em Batista (2011) define a sala de recursos (SR) como
salas com materiais diferenciados e profissionais preparados especificamente
para o atendimento às diversas necessidades educativas especiais dos alunos.
Esse autor chama a atenção para a centralidade da sala de recursos como um
dispositivo pedagógico prioritário na política de Educação Especial
contemporânea, tendo em vista sua característica de não substituição do
espaço da sala de aula regular e sim como complementar/suplementar de tal
sala.
Lembremos que a inclusão escolar de pessoas com necessidades
especiais é um fato, porque a educação especial deixou de ser uma
modalidade substitutiva do ensino comum para pessoas com deficiência,
tornando-se uma modalidade transversal e complementar/suplementar da
formação de alunos com necessidades especiais, um sistema educacional
inclusivo como proposto na Meta 4 do PNE de 2014.
2. METODOLOGIA
O tipo de metodologia da pesquisa é qualitativa e o objeto de estudo é o
trabalho do professor(a) da sala de recursos em escolas municipais de Duque
de Caxias - RJ., que de acordo com o censo escolar de 2017,.esse município
possui 174 unidades escolares, dos quais foram selecionados 5 escolas de
diferentes regiões, que tenham sala de recursos para o corpus da pesquisa, e
mantenha a representatividade entre os distritos do município..
Elaborou-se um questionário para entrevistar em uma amostragem não
paramétrica dos professores que trabalham em escolas públicas municipais da
cidade de Duque de Caxias - RJ, lotados em sala de recursos (SR), de modo a
responder perguntas com objetivos específicos a serem analisados que
envolvessem as condições de trabalho e como encaminham o apoio que são
fornecidos aos processos inclusivos dos alunos matriculados na SR para a
comunidade escolar (professores de classe regular, famílias dos alunos, equipe
diretiva, funcionários e corpo discente).
As entrevistas foram enviadas por e-mail aos quatro participantes da
pesquisa. A escolha do envio por e-mail ocorreu devido à distancia, dificuldade
de horários compatíveis e falta de tempo dos entrevistados. Podemos garantir
que esse tipo de procedimento em momento algum empobreceu ou prejudicou
a coleta e análise dos dados, muito pelo contrário as questões foram
desenvolvidas de acordo com os objetivos gerais e específicos propostos por
este trabalho e contribuíram para a coerência do desenrolar desta pesquisa.
Perguntas Propósito
a) Dados de identificação: Idade, sexo, formação Conhecer aspectos gerais de sua
acadêmica, tempo de serviço no magistério, e tempo formação inicial e experiência;
de trabalho docente na sala de recursos.
Número de alunos atendidos por deficiências
b) - No contexto escolar quais os anseios, perspectivas e Conhecer o caminho
conquistas já alcançadas?” profissional traçado em sua
- Que dificuldades ocorrem para adaptar atividades formação continuada, vivência e
de alunos de Educação Especial na sala de recursos? formação humana
c) - Em sua opinião o que pode ser feito para melhorar Identificar a visão que o
o atendimento na Sala de Recursos? professor manifesta do próprio
trabalho docente
d) - Que materiais pedagógicos adaptados existem? Cite Perceber se a precarização do
os principais e quem os fornece. trabalho docente está presente
. .Na escola em que atua, há infraestrutura adaptada
para a inclusão de alunos publico alvo da Educação
Especial? Exemplifique
“Os anseios são que os alunos sejam atendidos em suas necessidades. As perspectivas
residem nos avanços significativos dos alunos. As conquistas são progressivas e
IV perpassam desde a situação da família que buscou um atendimento clínico ou cirúrgico
antes negligenciado, da escola que passou adotar uma atitude mais consciente frente aos
alunos especiais até o progresso do desempenho do aluno.”
Quadro 6: Resumo das respostas ao indagar os docentes a seguinte questão: Que materiais
pedagógicos adaptados existem? Cite os principais e quem os fornece.
Docente Resposta
Na SR há um computador, um teclado colmeia, um mouse leitor e livros em braile,
que foram fornecidos pelo Governo Federal. Os jogos de madeira [...] foram
comprados pela escola e a maioria, pela própria professora. Não há softwares
educativos, que facilitariam muito a aprendizagem dos alunos NEE. Porém, a
I
professora, baixa em seu próprio celular [...] jogos que facilitam a aprendizagem,
para trabalhar com os alunos, principalmente os autistas. Os outros materiais
adaptados são feitos com sucata, pela própria professora.
Todos os materiais adaptados que pode imaginar e que necessito, eu tenho, comprado
II com os meus recursos
Quadro 7: Resumo das respostas ao indagar os docentes a seguinte Como são estabelecidos os
contatos entre você e o prof(a) da Classe Comum para discutirem sobre os alunos que estão sob
responsabilidade de ambos?
Docente Resposta
I Em encontros semanais, quando possível, dentro das 4 horas de planejamento ou através
de mensagens por Whatsapp, quando é algum problema mais urgente.
II Nos grupos de estudos e visitas às escolas onde estes estão matriculados no ensino
regular
Quadro 8: Resumo das respostas ao indagar os docentes a seguinte questão: Você acredita que
incluir alunos público-alvo da Educação Especial em classes comuns é uma forma adequada de
inclusão? Por que?
Docente Resposta
I Em parte. Para o aluno NEE é importante que ele esteja com os demais alunos, pela troca
e interação. Isso facilita o desenvolvimento deles. Porém, os professores do ensino
regular ainda têm muita resistência para receber esse público em sala de aula, além de não
terem, muitas vezes, formação adequada
II Depende do aluno e do grau de déficit apresentado e suas reais necessidades
III Acredito plenamente na inclusão, no uso comum dos espaços, recurso e profissionais.
Embora tenha plena consciência das dificuldades que enfrenta o professor do ensino
regular, como em tempos anteriores, a negativa de acesso de grupos “diferentes”, não
facilita o processo educacional, mas o mascara. [...] .Saberes e tecnologias foram
desenvolvidos na busca de oferecer as novas gerações sua inclusão nos processos sociais
e superação das dificuldades não vencidas pelas gerações anteriores, neste sentido,
portadores de deficiência não são atemporais, possuem uma identidade, na qual devem
partilhar com sua geração, processos de acesso e superação. [...] A vida se dá em um
contínuo, no qual o encontro e a superação não devem acontecer somente na escola, mas
devido a sua importância histórica como mecanismo de sobrevivência e superação, por
ela deve ser defendido.
IV Depende de como é realizado. ´Há casos que são indispensáveis o agente de apoio à
inclusão. Na nossa escola, uma professora entrou em estresse máximo devido à ausência
deste auxilio numa turma de educação infantil [...]
III Considerando-se a inclusão escolar deste público, como um processo que a princípio se
respaldaria em anteriores processos de inclusão social, notadamente a existência de
políticas públicas, que se mostram ausentes ou insuficientes, em diferentes setores,
possibilitando acessos e interações a estes grupos, e a escola, assim como outros espaços,
teriam garantidos recursos necessários as adaptações estruturais e a construção de novos
significados.
Neste processo, a escola se somaria a este movimento, e não seria como hoje nos querem
fazem crer, a principal responsável pela aceitação, participação e significado social destes
alunos.
Com a entrada de portadores de deficiência no ensino regular, ganhasse muito em relação
ao necessário desequilíbrio das certezas, que fundamentam algumas práticas, mas também
se ressaltam as necessidades estruturais, de tempo, organização e aprendizagem que estes
grupos necessitam, e que hoje se mostram insuficientes para qualquer outro grupo já
incluído nos processos escolares.
Sendo, notadamente impossível, para o espaço escolar, oferecer, por seus próprios meios,
o que se mostra necessário a estes grupos; se torna comum, em um processo de
incertezas, esquecer-se daquilo que se pode oferecer, do significado do conviver, e sua
função no aprender, deles e nosso.
IV As ações devem levar em conta as necessidades dos alunos e não de atender um pré-
requisito imposto. Assim, alguns alunos precisam ter o seu tempo na escola abreviado,
pois um tempo maior pode ser gerador de prejuízos para todos.
Quadro 10: Resumo das respostas ao indagar os docentes a seguinte: O que você faz na escola
fora o ato de dar aula (atividade sindical, cursos, etc) ?
Docente Resposta
I : Participo de cursos, mas nenhum deles financiados pela prefeitura. O que faço é por
conta própria, procuro estar sempre lendo artigos acadêmicos e livros, para me atualizar.
Porém, tudo isso eu faço fora da escola, não no meu horário de trabalho. Participo de
atividades sindicais, quando há e dentro do possível.
II ----------------------------------------------------------------------------------------------
III Nas unidades de ensino de Duque de Caxias, temos como pressuposto, a relação do
contínuo aprender, neste sentido, a participação nas capacitações (hoje mais raras),
acessos a espaços culturais e participação nos movimentos sindicais se mostram
permanentes.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho docente na educação especial tem características
peculiares, que colocam em evidência a questão dos intelectuais como previsto
por Henry Giroux. e a feminização do trabalho docente, muito estudado por
feministas desde os anos 70.
Podemos observar que os docentes envolvidos no estudo buscaram se
utilizar dos questionários da pesquisa para “serem ouvidos”, ou melhor, usaram
a oportunidade para terem visibilidade e relatar a “preocupação”, com as
crianças e adolescentes que são atendidas por elas em sala de recursos,
visando o desenvolvimento através da inclusão em classes comuns.
Pertile e Rossetto (2015) reforça a pesquisa do presente artigo em
seus estudos por analise documental das atribuições do professor que atua em
sala de recursos. Esses documentos estabelecem como é o trabalho direto
com o aluno em período de contraturno; o trabalho colaborativo para subsidiar
as ações e a formação do professor da sala regular; a elaboração de materiais
específicos para uso dos alunos nas salas de aula; a orientação à família; e a
articulação com setores e profissionais externos à escola que possam
colaborar para o atendimento às necessidades especiais dos alunos. Eles
apontam a responsabilização que é atribuído a esse profissional que não se
direciona apenas ao ensino, mas a várias atividades organizativas e
articuladoras dentro do espaço escolar e, possivelmente, fora dele. Nesse
sentido, por meio do programa da SRM (Sala de Recursos Multifuncionais), o
mesmo professor pode trabalhar com várias áreas. No entanto, cada área tem
um conhecimento específico e aprofundado.
Também em Hypólito (1997) que analisou o processo de feminização do
magistério em sua evolução histórica (considerando-se seus aspectos sociais,
políticos, econômicos e culturais), caracterizando-o como fenômeno que se
generalizou no ensino brasileiro e nos sistemas educacionais de vários países
ocidentais, ainda nos é contemporâneo, talvez ao longo desse novo século;
Finalizamos, citando Federici (2004, p171) diz que o Trabalhador
proletário é a negação do trabalhador individual e a afirmação do trabalhador
coletivo. Na análise desses pesquisadores, o docente é proletário na medida
em que sofre um processo de precarização e assalariamento e se afirma como
um trabalhador coletivo.
5. REFERENCIAS