Resumo
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Pós-graduada em Inclusão e Gestão escolar, professora da Secretaria de Estado de Educação do distrito Federal
a 21 anos. Desenvolve trabalho na área de gestão escolar e processos de aprendizagem. Desenvolveu pesquisa
em PROJETO OBEDUC – UnB em parceria com CNPQ/ Leppae. E-mail cindcarpina@gmail.com.
ISSN 2176-1396
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Introdução
agir docente, cultural e socialmente enraizado em sua constituição enquanto sujeito. Entende-
se que ao pensar quais seriam suas ações pedagógicas em sala de aula, o professor, talvez de
forma quase que como automaticamente refaz em suas falas, em seus movimentos, a forma
como ele vê o mundo, suas concepções de vida e suas considerações a respeito das
construções sociais e da própria criança com a qual ele constrói relações em seu dia a dia e
assim, delimita ou amplia o papel social da escola. Em consonância com o descrito, Vygotsky
(2004a) afirma que,
Diante dessa temática, temos que aliar a discussão entre o que passa pela formação
profissional e aquele que irá receber o produto dessa formação e quando os assuntos tratados
são relacionados aos aspectos constituintes da aprendizagem, a literatura apresenta um campo
vasto de aporte teórico, principalmente quando o foco é o sujeito que aprende e as ações que
permeiam a aprendizagem. Em decorrência disso, o tema aqui apresentado está diretamente
relacionado à análise dos processos envolvidos no ato de pensar o planejamento pedagógico e
as relações que são estabelecidas entre o planejamento e o sujeito que aprende com aplicação
de conceitos que subsidiam o professor no entendimento da produção de pensamento por
parte do aluno, a partir do sujeito que ensina. Neste aspecto, Madeira-Coelho (2009, p. 41)
dispõe que,
momento em que se dá o planejamento das aulas, a criança deveria sim, ocupar um espaço
relacional no pensar pedagógico do professor ao delinear suas ações para que outro as realize.
Nesses momentos, a criança não interfere de forma objetiva e muito menos ativa, no
sentido de requerer do professor uma ação/resposta imediata a uma demanda criada por ela.
Necessário se faz que o sujeito que ensina decida permitir a presença dos sujeitos que
aprendem em suas construções mentais para que o planejamento atinja sua finalidade:
desenhar caminhos para acessar a construção do pensamento da criança provocando a
aprendizagem.
Por isso, a necessidade de se discutir esse tema e aprofundar estudos sobre como se
pode fomentar ações qualitativas na constituição dos processos de aprendizagem a partir da
ação de planejar do professor entendendo seus aspectos e objetivos principais (conteúdos ou
singularidade dos sujeitos que aprendem) no contexto da heterogeneidade da sala de aula
como representação social e suas possibilidades sob a ótica da análise dos processos da
construção da linguagem escrita dos sujeitos envolvidos nos processos de aprendizagem em
turmas regulares do 2º ano do Ensino Fundamental, identificando o que se apresenta como
fator mais importante: as representações sociais que são constituídas a partir dos elementos
conceituais que são inseridos nos contextos da aprendizagem escolar.
Desenvolvimento
E, sobre o exposto, voltando o olhar para o desencadear das ações pedagógicas dos
professores e das crianças nos espaço da escola, somos remetidos a pensar sobre a pluralidade
dos sujeitos envolvidos e também sobre a tentativa desses sujeitos de concretizarem a
inclusão de si e de outros nos processos de aprendizagem debaixo de uma égide educativa que
foi determinada socialmente, a tempos e que de forma bem falseada, dita o que deve ser feito
e pensado dentro do ambiente escolar, tanto por professores quanto desses em relação aos
supostos aprendizes. Aqui, o termo inclusão não se refere à política de inclusão escolar, mas
sim à democratização dos saberes escolares, independente de quem esteja recebendo estes
saberes; que ela permita a participação de todos.
Considerando a complexidade da aprendizagem escolar e conformando ao descrito
acima, Mitjáns e Tacca (2011, p.8) afirmam a necessidade de “enfocar a aprendizagem
escolar a partir da importância de enfatizar as condições e oportunidades que, na escola,
permitem aos sujeitos superarem obstáculos pessoais, subjetivos, relacionais e sociais no seu
processo de aprender”.
Há que levar em conta, no âmbito social da aprendizagem, a perspectiva histórico-
cultural e a profundidade de sua colaboração, como processo para o entendimento do sujeito
da aprendizagem partindo da premissa da subjetividade humana. Evidenciar então, o caráter
singular do processo de aprender, traz à luz da discussão a reprodução da dualidade professor
que ensina e criança que aprende o que o professor ensina. Em proposição a isso, Vygotsky
(1990a: 12) nos fala sobre os estímulos excitantes, em especial, aqueles que provêm das
pessoas, os excitantes sociais, dentre os quais podemos, sem dúvidas, destacar o professor.
Excitantes sociais que,
procedem das pessoas; eles se destacam porque eu mesmo posso reproduzir esse
excitante, porque para mim se convertem prontamente em reversíveis e, por
conseguinte, em comparação com os restantes, determinam meu comportamento de
forma distinta. Eles fazem com que eu me pareça comigo mesmo, me identificam a
mim mesmo. No sentido amplo da palavra, é na fala que reside a fonte do
comportamento e da palavra.
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parquinho por que os adultos os chamam assim. Contudo, quando é solicitado a desenhar o
parquinho, a criança traz da sua abstração de parquinho, de seus processos mentais, a imagem
concreta do parquinho que ela conhece. Aqui se comprova a aprendizagem. O mesmo
acontece com a aquisição da linguagem escrita, tornar concreto o que lhe é abstrato, e não o
contrário. Necessário se faz não confundir conceitos como abstrato e abstração.
O processo acima, não ocorre dissociado da ancoragem que é tornar o que é
desconhecido, conhecido, familiar, dar nome, categorizar. Acontece principalmente na
construção da linguagem escrita, pois na falada, a criança cresce ouvindo a família dizer que o
objeto de sentar à mesa se chama cadeira. Ela aprende a falar cadeira, contudo, graficamente,
não escreve cadeira. A cadeira lhe familiar enquanto objeto, mas não o é enquanto grafia. O
processo de escrita é o ato de tornar concreto o que está ancorado em sua mente enquanto
objeto. É ancorar o conceito de “cadeira” na palavra CADEIRA graficamente representada.
Em se tratando de linguagem é importante ressaltar a valência social e sua influência
sobre a formação dos nichos e comunidades sociais, igrejas, escolas, famílias e outras e na
difusão das representações. Moscovici (2013) explica que
Em consonância à esses processos, González Rey (2011, p. 38), nos faz refletir sobre
as estratégias pedagógicas escolares de forma a pensar no sujeito que aprende associado “a
compreensão da aprendizagem como uma prática dialógica”. O fato de se aprender o que se
ensina sem a oportunidade de posicionamento, de questionar, de elaborar conclusões e
explicitá-las, impede que o vínculo emocional com o que se aprende aconteça e, portanto, a
emergência dos sentidos poderão não ocorrer. Isso, de certa forma, explica porque se aprende
o que se gosta e porque a música e as histórias bem contadas percorrem um caminho tão
estimulante em nossos sentidos.
Nesse particular, destaca-se o papel das bases culturais nas representações sociais dos
processos de elaboração de estratégias pedagógicas que permeiam as relações de ensino-
aprendizagem bem como o seu impacto nos sujeitos envolvidos, seja ele positivo ou negativo,
não só de dação de conteúdos e cumprimento do currículo letivo. Nesse ponto, se manifesta a
relação do professor com a criança que há por detrás do planejamento, a subjetividade afetivo-
relacional do professor com seu aluno na hora de pensar atividades e estratégias que serão
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utilizadas pelas crianças e que poderão ou não levá-las ao caminho da real aprendizagem.
“Trata-se de um processo recursivo e sistêmico: para que a aprendizagem ocorra, há que se
promover situações pedagógicas que impactem na constituição subjetiva do aprendiz,
podendo, então, incidir, no desenvolvimento e gerar novas possibilidades de aprender”.
(MARTÍNEZ, 2011, p. 76).
Importante se faz levar em consideração a forma como a realidade dos sujeitos
envolvidos diretamente no processo ensino-aprendizagem que se encontram configuradas
subjetivamente e culminam na aprendizagem, estando traçado anteriormente no contexto do
que o cotidiano da escola permite que tanto um quanto outro aja e reaja ao que lhes é exposto
no contexto escolar.
González Rey (2005, p. 205), nos diz que o sentido subjetivo representa um
instrumento teórico para conhecer as consequências de um sistema social na vida da pessoa. É
um tipo de registro inseparável de outros registros da pessoa, da vida e da sociedade. Nesse
sentido, podemos afirmar que o ambiente escolar que é um espaço físico e mental repleto de
superação de conflitos, está constantemente em produção de sentidos subjetivos tanto para o
professor quanto para a criança. Contudo, a forma como a realidade do sujeito que ensina se
encontra configurada vai influenciar de maneira quase que decisiva na forma como o sujeito
que aprende estará construindo suas configurações subjetivas em relação ao espaço social
escola; e isso, se dá pela forma como o professor desenha os caminhos que serão percorridos
pelas crianças em seu momento cotidiano de planejamento.
As relações que são estabelecidas entre a escola, o professor e a criança desde a
entrada desta última em sala de aula estão inundadas por expectativas. De um lado, um
professor que espera um aluno imerso em uma cultura escrita permeada pelos estímulos
familiares e já com uma certa intimidade com o mundo das letras. Do outro, um aprendiz
ávido por desvendar os símbolos que o cercam nem sempre tão íntimo do complexo mundo
do be a bá. E por último, uma escola assentada em concepções reprodutivistas que espera do
aluno a sua obediência e submissão a conteúdos pré-determinados que pouco se encontram
com suas experiências e, aguardando também que tudo aconteça debaixo de uma ordem e de
uma organização tal que é da ordem do impossível.
Sobre ordem, Morin (1990, p. 74) constata que a organização não se reduz à ordem,
embora a compreenda; ele aceita e trabalha com o binômio ordem-desordem. A organização
mantém o todo irredutível. E dentro do contexto escolar, que envolve sujeitos, cada um com
suas características e apreensível que o movimento constante seja exatamente o da ordem que
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possam ser os responsáveis diretos para que o sucesso aconteça ou não no que diz respeito à
finalidade do currículo – aprendizagem.
Partindo desse mote, a culpabilização unilateral pelos desacertos pode retirar a
possibilidade de criação de estratégias que permitam acessar o pensamento da criança pela
necessidade de se cumprir um currículo e por este caminho, deixar de construir com ela,
vínculos permanentes de aprendizagens significativas. É certo que, facilmente aprendemos
aquilo nos interessa e o que nos dá prazer, por isso, o diálogo com empatia é essencial para
que os objetivos das ações desencadeadas em sala de aula aconteçam.
Essa análise nos levou ao caso específico de Roberto, aluno de uma escola pública do
Distrito Federal, cursando o 3º ano do Ensino Fundamental de 9 anos, fora da faixa etária
prevista para o ano (8 anos de idade) portanto, um aluno defasado idade/ano, que apresentava
dificuldades nos processos de aprendizagem ou não havia tido suas potencialidades em
relação aos processos de aquisição de leitura e escrita identificados e desenvolvidos. Roberto
é uma criança que demonstrava em sala de aula e fora dela um comportamento tímido, por
vezes permanecia em seu lugar quieto, aparentando uma postura observadora e até reflexiva
sobre o que acontecia em sua volta. Contudo, ele era visto pela professora e pela escola
apenas como um aluno que não conseguia aprender.
Ao conhecer um pouco mais sobre o funcionamento da escola, foi observado que, de
forma geral, ela não voltava suas atenções aos processos de aprendizagem e tão pouco na
busca coletiva para solucionar questões específicas em torno da problemática da evidência da
não aprendizagem das crianças que, já estavam no processo de alfabetização a pelo menos três
anos e algumas mais, como no caso de Roberto e ainda não sabiam ler e escrever.
Neste sentido, como um dos objetivos do projeto que estávamos implementando era
realizar processos interventivos em escolas que não apresentavam bons resultados em
avaliações externas (Provinha Brasil) e identificar possíveis fragilidades, analisá-las para
construir possibilidades, anualmente tínhamos grupos de crianças que eram encaminhadas ao
projeto pelas próprias professoras da escola em questão. E Roberto foi um deles.
Em momentos de observação em sala de aula, foi identificado que as atividades
desenvolvidas coletivamente e a forma com que a professora regente conduzia os processos denotavam campo aberto
para a interação e para o desenvolvimento da aprendizagem, contudo, Roberto que era
aparentemente saudável, ainda não tinha sido alfabetizado, o que nos leva a crer que dentro do
espaço da sala de aula, o professor não havia percebido a forma como ele funcionava
psicologicamente e pouco possibilitava atividades personalizadas que acessassem o curso de
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seu pensamento no desenvolvimento das atividades. Há de se dizer que, esta realmente não é
uma tarefa fácil e que também não acontece de uma hora para outra.
No caso de Roberto, pôde ser analisado em uma das aulas em que o objetivo final era
uma produção de texto coletiva, que a criança estava necessitando de intervenções mais
desafiadoras e sintonizadas ao movimento de seu pensamento, impulsionadas por situações de
aprendizagem convidativas ao seu desenvolvimento no processo da leitura textual.
Como Roberto foi encaminhado pela professora ao grupo de pesquisa para ser
atendido semanalmente em grupos separados, tivemos oportunidade de conhecê-lo mais de
perto. Nesses momentos, pudemos conversar sobre as cosias das quais ele gostava, quem ele
queria ser e o que gostaria de fazer quando crescesse, o que pensava sobre seu futuro, sobre
sua família e sobre a escola. O trabalho que desenvolvíamos estava sempre voltado par
produções individuais a partir de propostas de estudo de textos, e haviam várias
possibilidades.
Com o intuito de conhecer melhor as crianças com as quais estávamos propondo um
trabalho pedagógico e a partir dela alcançarmos processos de produções de textos coletivas e
individuais para percebermos a forma como as crianças construíam seus pensamentos sobre a
escrita da língua falada, a primeira estratégia escolhida foi colher dados das crianças que
estavam sendo atendidas através de uma entrevista que continha perguntas que se referiam ao
gosto pessoal das crianças, pessoas amigas, o que pensavam sobre a escola e sobre suas casas.
É importante ressaltar que, este trabalhado era realizado com base em encontros
semanais, com um grupo de mais ou menos 12 crianças, que eram atendidas pelas
pesquisadoras, em uma sala separada da sala de aula.
Todos participaram e foram entrevistados individualmente. E na ocasião, Roberto
apresentou respostas bastante curtas, como por exemplo, quando foi questionado sobre o que
ele mais gostava na escola e ele respondeu: “As atividades!”. As respostas dadas na entrevista
apoiariam, mais tarde, uma produção de texto coletiva, quando seria utilizado um sorteio para
que o grupo de crianças soubesse sobre quem o texto que eles produziriam juntos, iria falar.
O sorteio aconteceu e a criança sorteada para que a produção fosse feita a seu respeito
não foi Roberto. O texto produzido não falaria dele e sim de outra criança. As respostas dadas
à entrevista pela criança sorteada foram colocadas em um cartaz e lida em voz alta pela
interventora/pesquisadora. A cada frase lida, ela perguntava se estava claro o que ela havia
lido. Logo após, solicitou que cada criança lesse uma frase, momento no qual, Roberto
demonstrou interesse, mas também, dificuldade. Contudo, ele não se mostrou tímido diante
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Considerações Finais
Considero que com essa abordagem teórica de junção entre o estudo das
representações sociais e alguns de seus conceitos com as teorias dedicadas aos processos de
aprendizagem associados ainda a estudos psicológicos sobre sujeito, se possa aprofundar nos
estudos da construção de estratégias pedagógicas efetivas dentro dos ambientes escolares, de
forma a romper com paradigmas e, diante das perspectivas de promoção do sujeito dentro das
práticas sociais no ambiente escolar para a vida, talvez seja possível que se torne mais
acessível ao professor enquanto mediador das aprendizagens, conseguir compreender como os
processos de significação se processam ante a conceitos já utilizados de maneira dicotômicas
concreto/abstrato e uma nova abordagem frente a esses mesmos processos com os conceitos
de objetivação e ancoragem.
REFERÊNCIAS
MORIN, Edgar. Science avec conscience. Paris: Fayard. Coleção Points, 1990, p. 74.
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______. A formação social da mente. São Paulo, SP: Ed Martins Fontes, 2002.