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Resumo
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Mestra em Educação pela Universidade de Brasília. Doutoranda em Educação pela Universidade de Brasília.
Participante do projeto de Pesquisa: Concepções sobre a alfabetização e letramento: uma pesquisa exploratória e
interventiva a partir das avaliações – Observatório de Educação – Capes. Professora do curso de Pedagogia da
Universidade Católica de Brasília. E-mail: pgomes@ucb.br.
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Introdução
condições materiais e das necessidades das crianças, deve ser visto como momento primordial
no processo de ensino e de aprendizagem. Mas se torna importante também que o professor
tenha uma visão da conjuntura sociocultural e complexa que envolve as crianças e o seu
papel, de modo a poder aquilatar sua prática e posicionar-se em relação à visão “salvadora” da
educação e de seus profissionais presentes em alguns discursos da sociedade.
A situação desafiadora vivenciada por muitos profissionais da educação básica
também faz surgir na escola um discurso determinista, segundo o qual as dificuldades do
ponto de vista estrutural e pedagógico – rotatividade de professores entre as escolas, falta de
material didático-pedagógico, condições físicas inadequadas da escola, gestores pouco pró-
ativos, escolas sem trabalho coletivo, adoecimento de professores, dentre outras –
transformam-se em fatores impeditivos. Observe o relato de uma das participantes do projeto
revelam esse posicionamento: “– Aqui é assim mesmo. A direção não faz nada. A família não
participa. Os professores, é cada um por si. Quem quer fazer.” (Fernanda, mestranda,
participante do projeto).
Esse discurso revela uma forma de a professora interpretar sua realidade escolar.
Porém, quando ela o comunica para outra pessoa, ela não somente expressa sua opinião, mas
essa opinião adquire uma força de “profecia realizável” para aquele que recebe a informação.
A cada desafio percebido no âmbito da escola, aquele comentário carregado de emotividade
parece ocupar o lugar de uma pretensa verdade e transformar-se em uma explicação para a
forma como a escola funciona. A discussão e aprofundamento dessa realidade realizada à luz
de construtos teóricos que interpretam a realidade, compreendida em seu caráter complexo e
multifacetado e motivado pelas escolhas subjetivadas pelos sentidos produzidos, funcionam
como elemento desmistificador de explicações deterministas, como aquela da professora
citada no parágrafo anterior.
Nesse contexto, os percursos da pesquisa interventiva se constituíram como um
ambiente de vivência do estudo, da crítica, do diálogo e da compreensão da realidade em sua
tessitura complexa e criativa, com espaços para outras formas de estar e realizar o fazer
pedagógico na escola. Percebemos que, numa certa medida, a pesquisa tem proporcionado
aprendizagens importantes sobre a docência. E a aproximação com os dilemas e com as
formas como a docência se manifesta na escola tem injetado na pesquisa novas questões,
capazes de ampliar o horizonte teórico e metodológico da própria pesquisa.
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Entendemos que o afeto não seja uma influência reflexa do pensamento sobre a parte
afetiva e volitiva, mas uma impulsão, uma força motriz e geradora, pois a psique, de acordo
com González Rey (2005), é um espaço ontológico diferenciado, multifacetado, sistêmico,
dialógico, dialético e complexo, definido como subjetividade.
Falar em alfabetização supõe pensar no pensamento como um orientador do processo
interventivo, supõe compreender a organização sistêmica do sujeito. Eis a dinâmica em que
pensamento e afeto se retroalimentam e dão mobilidade ao sujeito. Intervir implica descobrir
como o aluno se conecta às atividades propostas, quais os percursos de seu pensamento, quais
as pistas dadas, qual a sua forma peculiar de resolução no curso da atividade e como dispor de
possibilidades de impulsões ao seu desenvolvimento naquele momento.
As atividades de intervenção foram organizadas a partir de três eixos presentes no
currículo da educação infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental: 1) literatura
infantil; 2) artes plásticas – pintura, modelos com massa de modelar, desenho; 3) jogos
lúdicos e brincadeiras. Optamos por atividades que pudessem dialogar com a “cultura
infantil” e, por isso, atrair o interesse e mobilizar os aspectos cognitivos e afetivos, percebidos
como imbricados entre si e possibilitadores de processos de produção de sentidos sobre as
próprias crianças, sobre sua realidade e sobre a leitura e a escrita.
Essa escolha corrobora o entendimento de que as intervenções pedagógicas são
imprescindíveis ao desenvolvimento subjetivo do sujeito, implicam na abertura de espaços
relacionais dialógicos em que as situações comunicativas promovam a produção de sentidos
subjetivos2 e recursos subjetivos que impulsionem a aprendizagem e o desenvolvimento.
Nesse contexto, a intervenção apresenta-se como uma possibilidade de adentrar esse espaço
imprevisível da relação indissociável entre cognição e afeto e a subjetividade como espaço
ontológico diferenciado que nos permite buscar compreender as tramas tecidas nesta relação.
Nesse sentido, Tacca (2008, p. 141) aponta atitudes que coadunam com o trabalho do
professor como colaborador e provocador nesse processo interventivo:
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O sentido subjetivo é a integração de uma emocionalidade de origens diversas que se integra a formas
simbólicas na delimitação de um espaço da experiência do sujeito. No sentido subjetivo integra-se tanto a
diversidade do social quanto a do próprio sujeito em todas as suas dimensões, incluindo a corporal. As emoções
associadas à condição de vida do sujeito se integram em sua produção de sentido. (GONZÁLEZ REY, 2009, p.
127).
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Nos últimos anos, a formação de educadores tem se constituído um dos temas que
mais tem despertado a curiosidade acadêmica de muitos estudiosos e pesquisadores da área
educacional, assim como de muitos gestores, em razão da necessidade de atuação de pessoas
competentes na formação de nossos educandos. Isso revela a processual compreensão de que
a formação docente é uma atividade complexa, porém necessária, se de fato acreditamos ser a
educação um caminho privilegiado de transformação social.
O pensamento simplista de que, para ser educador, basta ter sido educando e ter um
bom nível de formação universitária, aos poucos, tem cedido lugar à compreensão de que essa
formação docente contínua é, antes de tudo, um processo necessário e complexo que requer
seriedade, consistência e constância em sua efetivação.
Considerações Finais
REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Autores Associados: Cortez, 1989.
______. Pedagogia da autonomia. 20. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GONZÁLEZ REY, Fernando Luis. Sujeito e subjetividade. São Paulo: Thomson Pioneira,
2005.
KLEIMAN, Angela B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo,
Santa Cruz do Sul, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez. 2007.
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VIGOTSKI, Lev Semenovich. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2005.