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XXIII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HIDRÍCOS

TENDÊNCIAS E PROJEÇÕES FUTURAS DE PRECIPITAÇÃO E DE


VAZÃO NAS USINAS HIDRELÉTRICAS DE TUCURUÍ E ITAIPU

Wanderson Luiz Silva 1; Maria Elvira P. Maceira 2 & Otto Corrêa Rotunno Filho 3

RESUMO – As mudanças climáticas podem alterar o regime hídrico nas áreas de drenagem
correspondentes às usinas hidrelétricas brasileiras. Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é
apresentar uma análise das tendências detectadas, calibração de um modelo hidrológico, avaliação
de um modelo climático e cenários futuros de precipitação e de vazão, além da capacidade de
regularização dos reservatórios nas usinas de Tucuruí e Itaipu. Para as projeções futuras (2011-
2100), são utilizados os dados do modelo climático regional Eta aninhado aos modelos globais
HadGEM2-ES e MIROC5 nos cenários RCP4.5 e RCP8.5 do IPCC. O modelo hidrológico adotado
é o SMAP na escala mensal com a adição de um parâmetro de translação. Os resultados indicam
que os totais pluviométricos anuais estão aumentando na usina de Itaipu. As vazões estão reduzindo
em Tucuruí e se elevando em Itaipu. Os modelos conseguem capturar satisfatoriamente a
distribuição da precipitação e da vazão nas diferentes regiões brasileiras, além de suas
variabilidades sazonais. As projeções futuras são de redução dos volumes de chuva e das afluências
naturais em Tucuruí e de diferentes cenários em Itaipu, onde há mais incerteza. Diante de cenários
críticos futuros, faz-se necessário avaliar a capacidade de regularização dos reservatórios das usinas.

ABSTRACT – Climate change may alter the water regime in the drainage areas corresponding to
the Brazilian hydroelectric power plants. In this context, the objective of this work is to present an
analysis of the detected trends, calibration of a hydrological model, evaluation of a climate model
and future scenarios of precipitation and streamflow, as well as the regularization capacity of the
reservoirs in Tucuruí and Itaipu power plants. For the future projections (2011-2100), data come
from the Eta regional climate model nested to the HadGEM2-ES and MIROC5 global models in the
RCP4.5 and RCP8.5 scenarios of the IPCC. The hydrological model adopted is the SMAP in the
monthly scale with the addition of a translation parameter. Results indicate that annual rainfall is
increasing in the Itaipu power plant. Streamflows are decreasing in Tucuruí and increasing in Itaipu.
Models are able to capture satisfactorily the precipitation and streamflow distribution in different
Brazilian regions, as well as the seasonal variabilities. Future projections point to a reduction of
rainfall volumes and natural streamflow in Tucuruí and different scenarios in Itaipu, where there is
more uncertainty. In view of future critical scenarios, it is necessary to evaluate the reservoirs
regularization capacity of the power plants.

Palavras-Chave – Hidrometeorologia; Precipitação; Vazão.

1) Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL), wanderson@cepel.br


2) Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL), elvira@cepel.br
3) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), otto@coc.ufrj.br

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1. INTRODUÇÃO
O sistema brasileiro de geração e de transmissão de energia elétrica é interligado em sua
maior parte. O planejamento da operação em sistemas hidrotérmicos vem sendo desenvolvido no
Brasil através da definição de problemas de longo, médio e curto prazos, de acordo com as
características específicas de seu sistema elétrico (Maceira et al., 2002). A produção total de uma
dada fonte de energia no sistema brasileiro visa à otimização do sistema.
Dada a predominância de geração hidrelétrica no sistema elétrico brasileiro, a operação do
sistema de produção e de transmissão de energia torna-se bastante vulnerável à variabilidade das
chuvas tanto a nível sazonal quanto a nível anual, devido à dependência das vazões naturais que
chegam aos reservatórios das usinas hidrelétricas (UHEs). A redução de precipitações, além de
demandar a aplicação de outras fontes mais caras no parque gerador (como os combustíveis fósseis
através de termelétricas) para a geração de energia, pode acarretar o déficit de energia.
Além de se buscar o aprimoramento das previsões de precipitação e de vazão, deve-se levar
em consideração que as evidentes consequências da variabilidade temporal das afluências naturais
são os episódios de demasia hídrica nas estações chuvosas e a escassez nos períodos secos.
Portanto, torna-se razoável a recomendação de que esses estoques excedentes ocorridos no decorrer
do período úmido sejam utilizados no atendimento às demandas ao longo da estação seca,
desempenhando assim um papel regularizador das vazões naturais por meio de reservatórios.
Os relatórios periódicos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC) sobre as causas, impactos e medidas de
mitigação das mudanças climáticas globais representam uma referência padrão do assunto para toda
a comunidade científica, governos e indústrias em todo o mundo. O Quinto Relatório de Avaliação
(Fifth Assessment Report – AR5) do IPCC (IPCC, 2013) mostra que a temperatura média do Brasil
pode se elevar cerca de 2,0°C a 4,0ºC até 2100 nos cenários estudados até o momento. As mudanças
climáticas detectadas e projetadas por diversos pesquisadores tendem a modificar o ciclo
hidrológico e, consequentemente, o regime e a disponibilidade hídrica nas bacias hidrográficas.
Nesse contexto, o principal objetivo deste trabalho concentra-se em investigar os efeitos das
alterações climáticas nas vazões das áreas de drenagem de duas importantes usinas hidrelétricas no
Brasil: Tucuruí, localizada na região Norte e Itaipu, situada na região Sudeste do país. Ao final,
sobretudo, uma breve análise das tendências de precipitação e de vazão e dos impactos dos cenários
futuros nessas bacias hidrográficas terá sido apresentada e discutida. A implicação do clima no
regime hidrológico de uma bacia está diretamente vinculada à garantia de suprimento de energia
elétrica do país.

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2. METODOLOGIA
2.1. Área de Estudo
Neste trabalho, a averiguação das tendências observadas e das projeções futuras é efetuada na
dimensão dos aproveitamentos hidrelétricos de Tucuruí e Itaipu (Figura 1 e Tabela 1). A seleção
desses empreendimentos foi realizada conforme a sua localização esparsa pelo Brasil associada a
diferentes bacias hidrográficas (rios) e distintos tipos climáticos, além da sua importância no que
diz respeito à capacidade de geração de energia em cada subsistema.

Figura 1 – Localização das usinas hidrelétricas de Tucuruí e Itaipu e suas respectivas bacias de drenagem
analisadas nesta pesquisa.

Tabela 1 – Características das usinas hidrelétricas de Tucuruí e Itaipu.


Área de Potência Subsistema/
Usina Hidrelétrica Bacia Hidrográfica
Drenagem Outorgada Submercado
Tucuruí 754.330 km² Rio Tocantins 8.535 MW Norte
Sudeste/
Itaipu 821.714 km² Rio Paraná 14.000 MW
Centro-Oeste

2.2. Dados Observados


As séries históricas de precipitações mensais consistidas são provenientes das estações
pluviométricas da Agência Nacional de Águas (ANA), obtidas através do Sistema de Informações
Hidrológicas (HidroWEB). Os dados observados de temperatura do ar média mensal foram colhidos
através do Banco de Dados Meteorológicos para Ensino e Pesquisa (BDMEP) do Instituto Nacional
de Meteorologia (INMET) para, posteriormente, calcular a evapotranspiração potencial através do
método de Thornthwaite. As séries observadas ou reconstituídas de afluências naturais mensais são
disponibilizadas pelo ONS.
Para estabelecer a precipitação média em cada bacia hidrográfica, aplica-se o método do
inverso do quadrado da distância (IQD). O método IQD consiste em criar uma malha de pontos

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contidos na área de drenagem estabelecida e assim calcular a precipitação estimada para cada ponto
através da média ponderada pelo inverso do quadrado da distância a partir da chuva observada em
cada estação pluviométrica. A malha construída para as bacias de drenagem analisadas possui uma
resolução horizontal de 25 km.
Para analisar a significância nas tendências observadas e projetadas de precipitação e de vazão
é utilizado o teste estatístico não paramétrico de Mann-Kendall Sazonal (Hirsch et al., 1982). A
curvatura de Sen é um método não paramétrico (assumindo uma tendência linear) utilizado para
estimar a magnitude das tendências (Sen, 1968) e também é aplicado às séries de dados.

2.3. Modelagem Hidrológica


O modelo hidrológico determinístico utilizado para a simulação das afluências naturais é o
SMAP – Soil Moisture Accounting Procedure, desenvolvido por Lopes et al. (1982). O SMAP é um
modelo chuva-vazão do tipo conceitual e concentrado e a versão utilizada nessa pesquisa possui
discretização temporal mensal (Figura 2).

Figura 2 – Representação do modelo SMAP com discretização mensal.

Na Figura 2, P é a precipitação, ES é o escoamento superficial, ER é a evapotranspiração real,


SAT é a saturação do solo, RSOLO é a água no solo, REC é a recarga do reservatório subterrâneo,
RSUB é a água subterrânea, EB é o escoamento base e Q é a vazão final total.
Como o modelo SMAP foi primariamente construído para a simulação de bacias hidrográficas
pequenas, há uma meritória restrição associada à sua adequabilidade para médias e grandes bacias:
a geração de vazão ocorre no próprio intervalo de tempo, ou seja, não existe atenuação ou
prolongamento do escoamento. A fim de contornar essa limitação de maneira satisfatória, decidiu-
se calibrar um parâmetro LAG de tal modo que exprima a influência dos escoamentos superficial e
base do mês imediatamente anterior em relação à vazão do mês presente nos períodos úmido e seco.
O coeficiente de Nash-Sutcliffe (1970) calcula a eficiência das simulações das vazões. Esse
índice é usado como função objetivo na calibração dos parâmetros do modelo SMAP e é dado por:

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∑𝑁
𝑡=1(𝑄𝑜,𝑡 − 𝑄𝑠,𝑡 )
2
𝑁𝐴𝑆𝐻 = 1 − 𝑁 ̅̅̅̅
∑𝑡=1(𝑄𝑜,𝑡 − 𝑄 2
, (1)
𝑜)

onde Qs,t é a vazão simulada no mês t, Qo,t é a vazão observada no mês t e ̅𝑄̅̅̅𝑜 é a média das vazões
observadas no tempo N.

2.4. Modelagem Climática


Neste trabalho, o clima regional é simulado utilizando-se o modelo regional Eta do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que é procedente do modelo Eta de Mesinger et al.
(2012). O modelo climático regional Eta foi aninhado aos modelos climáticos globais HadGEM2-
ES e MIROC5 pelo método de downscaling dinâmico, denominando-se assim, Eta-HadGEM2-ES e
Eta-MIROC5, respectivamente (Chou et al., 2014).
No AR5 do IPCC (IPCC, 2013), os cenários são baseados em quatro diferentes cenários
rotulados como Representative Concentration Pathways: RCP2.6, RCP4.5, RCP6.0 e RCP8.5, que
correspondem a forçantes radiativas antrópicas de 2,6 W/m², 4,5 W/m², 6,0 W/m² e 8,5 W/m²,
respectivamente. Os resultados são apresentados para o membro controle no clima presente (1961 a
1990) e para os cenários RCP4.5 e RCP8.5 no clima futuro (2011 a 2100).

2.5. Regularização de Reservatórios


A regularização de vazões através de reservatório é efetuada acumulando-se os deflúvios em
meses de excesso hídrico, visando atender às demandas durante o período de estiagem. O diagrama
de massa, ou diagrama de Rippl, é definido pela integral da hidrógrafa (Rippl, 1883) e é empregado
nas análises deste trabalho. A capacidade mínima de um reservatório para atender a uma dada
hipótese de regularização (Cr) é obtida pela diferença entre o volume acumulado necessário para
atender aquela hipótese no período de sequências negativas (Volnec) e o volume acumulado que aflui
ao reservatório no mesmo período (Volaf), isto é:
𝑡 𝑡
𝐶𝑟 = ∫𝑡 𝑓𝑝𝑐 𝑄𝑟 . 𝑑𝑡 − ∫𝑡 𝑓𝑝𝑐 𝑄 . 𝑑𝑡 , (2)
𝑖𝑝𝑐 𝑖𝑝𝑐

onde tipc e tfpc são o início e o fim do período crítico, respectivamente, Qr é a vazão necessária e Q é
a vazão afluente.
As anomalias das projeções futuras de afluências naturais mensais produzidas pelo modelo
hidrológico SMAP são empregadas nos dados históricos de vazões do ONS para cada usina
hidrelétrica e analisadas a fim de se avaliar a capacidade de cada reservatório para atender a
hipótese de regularização nos climas presente e futuro. Para essa investigação, considera-se a vazão
média no clima presente (1961 a 1990) e no clima futuro (2011 a 2100). Os meses que necessitam
de regularização são aqueles em que a afluência observada ou prevista se estabelece abaixo da
vazão média, ou abaixo de um determinado percentual dessa vazão média.
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3. RESULTADOS
A Figura 3 ilustra as magnitudes das tendências geradas pelos testes estatísticos de Mann-
Kendall e da Curvatura de Sen (nível de confiança de 95%) dos percentis de precipitação e vazão.
Nota-se que um panorama de redução das menores afluências vem ocorrendo na área de drenagem
de Tucuruí. Observa-se que, no intervalo de classes de chuva entre os percentis 25 e 50, há uma
tendência enfática de elevação na área de drenagem de Itaipu, onde todos os indicadores de
afluências estão crescendo significativamente no período de 1941 a 1999, desde +60 m³/s.ano nas
vazões mais baixas até +120 m³/s.ano nas vazões mais altas.

Figura 3 – Magnitudes das tendências dos percentis das precipitações mensais e das vazões mensais para as
UHEs Tucuruí entre 1971 e 2006 e Itaipu entre 1941 e 1999. Os marcadores preenchidos foram classificados
como estatisticamente significativos no nível de confiança de 95% por meio do teste de Mann-Kendall.

O modelo hidrológico SMAP foi calibrado e examinado com respeito às simulações das
vazões no clima presente (Figura 4). A UHE Tucuruí apresenta uma boa representação das vazões,
inclusive de sua variabilidade sazonal, com NASH de 0,936. A aplicação do parâmetro LAG nessa
grande bacia possibilitou a boa correlação das afluências observadas e simuladas (0,96), não
permitindo defasagem entre as vazões, uma vez que o tempo de percurso da água aqui possui muita
importância para a afluência final no mês em questão. Em Itaipu, o modelo SMAP consegue
simular muito bem os picos de vazão, além da crescente tendência das afluências identificada no
decorrer das últimas décadas, com NASH de 0,825 e correlação de 0,90.
Em relação às simulações do modelo climático Eta, verifica-se que o ciclo sazonal da
precipitação é bem capturado, contudo os dados tendem a subestimar ou superestimar em diferentes
ordens de grandeza esses volumes pluviométricos médios mensais (Figura 5). Dessa maneira,
emprega-se um fator linear mensal de correção de viés nesses dados por meio da razão entre as
climatologias observada e simulada, aperfeiçoando assim as simulações em cerca de 55%.

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Figura 4 – Gráficos de dispersão das vazões observadas (ONS) e simuladas pelo modelo hidrológico SMAP
para as UHEs Tucuruí (acima) entre 1971 e 2006 e Itaipu (abaixo) entre 1961 e 1999.

Figura 5 – Acumulados pluviométricos (mm) médios mensais observados (linha preta) e simulados pelos
modelos Eta-HadGEM2-ES (linha azul), Eta-MIROC5 (linha verde), assim como sua média (Eta-Média,
linha vermelha), nas UHEs Tucuruí e Itaipu para o período de 1961 a 1990.

Após analisar a climatologia e as tendências, calibrou-se o modelo hidrológico no clima


presente para obter os seus parâmetros. Além de avaliar o modelo climático e aplicar a correção de
viés, são realizadas as projeções futuras de precipitação (Figura 6). As propensões de redução dos
volumes anuais de chuva no decorrer do século XXI projetadas para a região Norte do Brasil estão
refletidas de maneira evidente nos gráficos de função densidade de probabilidade (FDP) de Tucuruí.
A maior incerteza ocorre na UHE Itaipu, onde há cenários futuros de decréscimo das chuvas a partir
do Eta-HadGEM2-ES e de aumento da precipitação conforme o Eta-MIROC5.

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Figura 6 – Gráficos de função densidade de probabilidade (FDP) acumulada dos totais pluviométricos anuais
para o membro controle das simulações do Eta-HadGEM2-ES (EH2) e do Eta-MIROC5 (EM5) no clima
presente (1961 a 1990) e para os cenários RCP4.5 e RCP8.5 do IPCC no clima futuro (2011 a 2100).

A Figura 7 apresenta as projeções futuras de vazão dos cenários RCPs 4.5 e 8.5 do IPCC em
relação às afluências observadas. Observa-se que as afluências naturais deverão diminuir em média
na UHE Tucuruí no decorrer dos meses do ano. No aproveitamento hidrelétrico de Itaipu,
considerando-se todos os possíveis cenários, nota-se que o comportamento das afluências no clima
futuro será bastante semelhante ao clima presente na média, inclusive com alguma redução dos
eventos extremos. Contudo, vale ressaltar que os cenários do modelo Eta-HadGEM2-ES são de
redução, enquanto que as projeções do modelo Eta-MIROC5 são de elevação.

Figura 7 – Gráficos de dispersão confrontando as afluências médias mensais (m³/s) obsevadas no clima
presente (1961 a 1990) e as vazões projetadas (2011 a 2100) pelos modelos climáticos Eta-HadGEM2-ES e
Eta-MIROC5 nos cenários RCP4.5 e RCP8.5 do IPCC.

As curvas de regularização para cada aproveitamento hidrelétrico examinado são mostradas


na Figura 8, considerando o registro histórico (1961 a 1990), além dos 4 (quatro) cenários futuros
(2011 a 2100). Nesses gráficos, são apresentadas as curvas nas quais busca-se a regularização da
vazão média presente (registro histórico de 1961 a 1990). Nota-se que a UHE Tucuruí conseguiria
atender somente até 20% da afluência média sem a utilização de reservatórios. Estima-se que seja
necessário um reservatório da ordem de 135.000 hm³ para atender toda a vazão média de Tucuruí
durante as piores sequências negativas. Já em Itaipu, para que pelo menos 60% da afluência média
na usina seja atendida, um reservatório da ordem de 40.000 hm³ seria fundamental, conforme todos
os cenários.

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Figura 8 – Curvas de regularização das UHEs Tucuruí e Itaipu para atendimento da vazão média presente
(1961 a 1990) no decorrer do clima futuro. A curva em preto está associada ao período observado de 1961 a
1990, enquanto que as demais estão relacionadas com as projeções futuras de 2011 a 2100 conforme os
modelos Eta-HadGEM2-ES (EH2) e Eta-MIROC5 (EM5) nos cenários RCP4.5 e RCP8.5 do IPCC.

4. CONCLUSÕES
Neste trabalho, explora-se as tendências de precipitação e de vazão e as consequências das
mudanças climáticas nas UHEs Tucuruí e Itaipu. A verificação das tendências observadas no
transcurso, principalmente, da segunda metade do século XX identificou um aumento das chuvas e
das vazões na área de drenagem da UHE Itaipu. A bacia de drenagem da UHE Tucuruí apresentou
uma diminuição de suas vazões. Tais tendências detectadas são extremamente importantes no nível
nacional e podem subsidiar possíveis medidas de adaptação e/ou mitigação nos reservatórios.
O modelo SMAP mensal foi calibrado e validado como pré-requisito para o exame dos
cenários futuros de afluências naturais. A versão tradicional do modelo acrescida de um parâmetro
de dependência temporal dos escoamentos superficial e de base exibiu resultados satisfatórios. O
modelo climático regional Eta foi aninhado a modelos globais para a geração de cenários de
mudanças climáticas conforme os cenários RCP4.5 e RCP8.5 do AR5 do IPCC. Através do
emprego de uma técnica de correção de desvios sistemáticos, as principais características
fisiográficas presentes da precipitação e sua variabilidade sazonal foram muito bem simbolizadas.
Na análise das projeções futuras, observou-se um decréscimo significativo dos totais
pluviométricos e das afluências naturais no decorrer do século XXI na UHE Tucuruí. O mesmo
padrão é projetado para a UHE Itaipu através do modelo Eta-HadGEM2-ES, enquanto que
tendências de elevação da precipitação e da vazão são simuladas pelo modelo Eta-MIROC5.
Segundo as curvas de regularização, a UHE Tucuruí é a que mais necessita de um eficiente
esquema de regularização das afluências. Logo, é essencial uma reflexão acerca da coordenação dos
reservatórios diante dos cenários futuros de precipitação e de vazão. Contudo, a incerteza ainda é
seriamente profusa na esfera das mudanças climáticas.
Além do aprimoramento do modelo regional, novos processos de regionalização
(downscaling) podem ser engendrados. Os recentes cenários Shared Socio-Economic Pathways
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(SSPs; IPCC, 2016) do AR6 do IPCC poderão futuramente ser utilizados para a geração de novos
cenários de alterações climáticas. Por fim, tópicos ambientais e operacionais podem ser
incorporados à análise da capacidade de regularização a fim de se estruturar uma metodologia mais
robusta a respeito dos efeitos das alterações climáticas sobre os reservatórios.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Programa de Engenharia Civil da COPPE/UFRJ e ao CEPEL pelo apoio ao
trabalho. Agradecimentos são estendidos à FAPERJ, por meio dos projetos FAPERJ – Pensa Rio –
Edital 34/2014 (2014-2017) – E-26/010.002980/2014, FAPERJ no E_12/2015 e FAPERJ no E_22/2016,
bem como ao suporte oferecido pelo CNPq por meio do projeto Edital n o 12/2016 – Processo
306944/2016-2 e projeto Edital Universal no 14/2013 – Processo 485136/2013-9 e pela CAPES -
Código de Financiamento 001.

REFERÊNCIAS

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