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TEORIA CRÍTICA EM SECRETARIADO

TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL


para uma concepção humanizada e politécnica do
secretariado

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Moura, Jefferson Sampaio de


Teoria crítica secretarial [livro eletrônico]: para uma
concepção humanizada e politécnica do secretariado / Jefferson
Sampaio de Moura. -- 1. ed. -- Brasília: Ed. do Autor, 2021.
PDF
Bibliografia
ISBN 978-65-00-16176-2
1. Ciências sociais
2. Secretariado - Formação profissional
3. Secretariado - Manuais, guias etc.
4. Secretariado como profissão
5. Teoria crítica I. Título.

21-54869 CDD-651.374

Índices para catálogo sistemático:

1. Secretariado administrativo : Profissão : Manuais 651.374

Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

JEFFERSON SAMPAIO DE MOURA

TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL


para uma concepção humanizada e politécnica do
secretariado

1º edição

Brasília – DF, 2021

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL


para uma concepção humanizada e politécnica do
secretariado

Capa e Diagramação: Jefferson Sampaio de Moura

Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou duplicada


sem autorização expressa do autor.

JEFFERSON SAMPAIO DE MOURA


contato@jeffersonsampaio.com.br
www.jeffersonsampaio.com
@umsampaio

Brasília – DF, 2021

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Não me veja como um teórico convencional, daqueles que


remendam citações para justificar seus apontamentos ou que
criam teorias despregadas da realidade, como se a teoria
viesse antes da ação. Veja-me como um louco, acho que me
enquadro bem neste adjetivo, um louco inconformado com
rumos que não valorizam a profissão que escolhi e tanto
respeito. Você não precisa concordar comigo, pode até
construir um artigo, nos padrões científicos eurocêntricos em
vigor, criticando tudo que digo neste livro. Preciso dizer que
vivo sempre muito receoso de estar fugindo de meus valores
em prol dos meus desejos, por isso tenho focado a minha
escrita para o grande público, para a massa secretarial,
utilizando um discurso mais coloquial como estratégia de
aproximação a esse público. Meu foco é na reflexão, no
questionamento de estruturas rígidas que nos impedem de
sermos mais. É neste campo de disputa paradigmática e de
valores que me constituo teórico latino crítico secretarial.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................... 10
PREFÁCIO ............................................................................................... 16
Para fins metodológicos .................................................................. 22
CAPÍTULO 1 - OS PILARES EPISTEMOLÓGICOS DA
FORMAÇÃO EM SECRETARIADO..................................................... 28
1.1 O amadurecimento no processo de formação humana ... 28
1.2 Uma teoria interdisciplinar que oriente a formação .......... 31
1.3 Uma formação crítica em secretariado para além da
técnica .................................................................................................. 35
1.4 Uma formação “madura” em secretariado........................... 42
1.5 Organização de eventos: um exemplo de ferramenta
didático-pedagógica ......................................................................... 46
1.5.1 O desenvolvimento de habilidade técnicas, atitudinais e
relacionais ......................................................................................... 48
1.6 Concluindo sem finalizar .......................................................... 52
CAPÍTULO 2 – OS PILARES EPISTEMOLÓGICOS DO FAZER
SECRETARIAL ........................................................................................ 58
2.1 Sobre a reflexão da prática secretarial ................................. 59
2.2 Um resumo sobre a atuação em secretariado .................... 62
2.3 Uma análise crítica das técnicas secretariais ..................... 66
2.4 Uma análise crítica da competência assessorial ............... 69
CAPÍTULO 3 - TEMAS TRANSVERSAIS EM SECRETARIADO .. 76
3.1 Ensaio sobre a nomenclatura da profissão ......................... 76
3.1.1 Uma análise histórica da nomenclatura “secretária/o” ..... 77

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3.1.2 Uma análise técnica e semiótica da nomenclatura


“secretária/o”..................................................................................... 80
3.1.3 Um convite à reflexão............................................................ 84
3.1.4 Para fins de registro: nomenclaturas possíveis ................ 86
3.2 Ensaio sobre as questões de gênero no secretariado ..... 87
3.3 Ensaio sobre o preconceito secretarial ................................ 92
CAPÍTULO 4 - PARA UM ATIVISMO SECRETARIAL .................... 98
4.1 Os desafios da reflexão ............................................................. 98
CAPÍTULO FINAL - AGENDA URGENTÍSSIMA DE TRABALHO
.................................................................................................................. 106
Primeiro Momento ........................................................................... 107
Segundo Momento .......................................................................... 108
Terceiro Momento............................................................................ 110
Instituições de Ensino Superior .................................................. 113
Discentes ........................................................................................... 114
Representações de Classe............................................................ 115
Profissionais ..................................................................................... 116
Para novas práticas dentro das Instituições de Ensino
Superior .............................................................................................. 118
Formas alternativas de desenvolvimento da criticidade .......... 119
Pontos de atenção ......................................................................... 122
“Verdade, uma ilusão” ................................................................... 124
NOTA DE ENCERRAMENTO ............................................................. 128
REFERÊNCIAS...................................................................................... 132
SOBRE O AUTOR ................................................................................ 141

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

APRESENTAÇÃO

O autor, Jefferson Sampaio de Moura, faz parte de um grupo de


docentes e pesquisadores que vieram para ampliar as
perspectivas de análise e contribuições para o secretariado. Sua
juventude traz consigo energia, paixão e criticidade para dedicar-
se ao secretariado com muito empenho, vocês terão exemplos
dessa experiência ao longo do texto.

Para quem me conhece e conhece a história da pesquisa no


Secretariado compreenderá quando me entusiasmo com “a
juventude” (sujeito jovem) que tem assumido papéis importantes
neste movimento secretarial. Como pesquisadores, ainda somos
um grupo pequeno que tem se empenhado muito para ampliar
horizontes e debater sobre o futuro do secretariado no Brasil.
Precisávamos de pesquisadores há 10 anos, hoje, precisamos
ainda mais, nós da velha guarda (me incluo aqui porque estou
mais perto de me aposentar do que em tempo de contribuir) já
estamos quase perdendo o fôlego. E, contar com os jovens que
abraçam a causa na medida em que Jefferson Sampaio de
Moura e tantos outros o fazem, é uma honra, um orgulho, uma
esperança.

Nesta obra, Teoria Crítica Secretarial: para uma concepção


humanizada e politécnica do secretariado, o autor demonstra
um pouco da sua dedicação. Com uma apresentação um tanto
peculiar, fugindo às regras acadêmicas convencionais, Jefferson
Sampaio traz reflexões prementes ao Secretariado. Sua
apresentação quase informal da discussão faz parte da
irreverência, da crítica, da reflexão que propõe. E, na minha
opinião, está aí uma excelente contribuição para o secretariado.
Refletir epistemologia pressupõe conhecer as teorias

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

fundamentais que os posicionamentos epistemológicos


pressupõem. A abordagem Crítica está incorporada na
confecção desta obra. Isso mesmo, incorporada, encarnada,
vivenciada e compartilhada na composição dos capítulos, na
linguagem, nos exemplos, na postura e posicionamentos
assumidos pelo autor. Trata-se de uma abordagem que desvela
as entranhas do que está posto na construção do secretariado
no Brasil, sem meias palavras, nos apontamentos do que se faz,
no que se propõe – não apenas como crítica aos outros
pesquisadores ou gestores ou profissionais, mas como forma de
mostrar que a construção social precisa ser levada em
consideração, e ela não acontece isoladamente, mas na
coletividade, nas relações que envolvem o secretariado. E,
justamente por ser coletivo e diverso, precisa de argumentação,
negociação e convencimento.

Mas o viés epistemológico não se limita à crítica, a opção


epistemológica do autor revela também a necessidade de
emancipar o sujeito desta prática, o que Jefferson Sampaio
Moura chama de Humanização.

Este livro traz uma motivação nobre, refletir na tentativa de


compreender o que acontece nos bastidores da prática do
secretariado, nas relações que a constituem: a pesquisa, os
cursos de formação (nas várias modalidades e graduações), os
estudantes, as instituições que a regulamentam e legitimam no
contexto de trabalho brasileiro, os profissionais que atuam na
prática e pela prática. Um debate profundo, com um discurso
crítico e reflexivo, mas com uma linguagem acessível e exemplos
vivos. Vejam que a apresentação do tema traz um tom de debate
epistemológico o tempo todo, quando questiona as intenções e
discursos que se estabelecem e se constroem no contexto social

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

da prática de secretariado – isso é teorizar de forma coerente


com a postura crítica (epistemologicamente argumentando). Um
questionamento que não apenas acusa, mas traz os sujeitos
relacionais da prática ao contexto. Será que conseguiremos
construir ou defender uma posição sem construir culturalmente a
mudança que desejamos?

Para aqueles que ainda não alcançaram o nível epistemológico e


teórico da discussão – e não quero aqui criticar, mas elucidar a
magnitude do debate – é preciso que compreendam o caminho
para um debate coerente. Falamos há algum tempo de construir
uma mudança de sentido, de significado – como as reveladas
nesta obra, cujo cerne está na valorização do secretariado, por
meio dos seus praticantes, da sua atuação, do enfrentamento
aos aspectos que a desvalorizam, imagens ruins, mitos sobre a
prática e a pesquisa na área.

Percebemos no contexto da prática muitos discursos e ações


que demonstram que lutamos em níveis diferentes, mas temos
lutado muito para construir algo que desejamos. Diante disso, a
questão principal é: quem deseja? Para que? E os praticantes
querem? O que querem? E os outros sujeitos do contexto,
querem o que? Qual sua força? Como movimentar essa
mudança?

A proposta do autor mais uma vez se revela generosa – não quer


dar certezas nem impor verdades. Quer expor sua opinião com
autenticidade e argumento. E quer também convidar à reflexão
para ouvir outras propostas e dar continuidade à construção do
secretariado.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Aqui recorro aos estudiosos da sociedade (particularmente Pierre


Bourdieu e Silvia Gherardi), que nos explicam que o movimento
de mudança de uma prática social precisa das relações para
implementar e legitimar concepções e significados. Não basta
algumas pessoas importantes desejarem ou criarem regras e
leis, todos os sujeitos das relações sociais que constituem a
prática precisam ser acionados na proposta de mudança. Assim,
precisamos nos questionar sobre dois aspectos muito bem
desenhados pelo autor: i) entender o cerne do que queremos
(enquanto sujeitos coletivos da prática, e não como entidades
separadas); ii) como podemos fazer com que essa mudança _na
plenitude do seu significado_ permeie todas as esferas. Se
conseguirmos isso talvez consigamos uma construção cultural
“da e sobre a” prática secretarial.

E aqui outro movimento importante para a reflexão


epistemológica: esta é uma realidade que se constrói
constantemente. Sim, precisamos ter energia para participar
ativamente do processo de viver e construir o secretariado como
uma prática social, pois as práticas sociais mesmo que
culturalmente construídas e enraizadas nunca são as mesmas,
elas reproduzem concepções significativas, mas se modificam,
estão cercadas pela criatividade, dinamicidade e inovação
proposta pelos sujeitos praticantes (sejam secretários,
professores ou pesquisadores).

Convido você a conhecer esse debate a partir do ponto de vista


deste ser humano gentil, generoso, astuto, e muito conhecedor
das suas propostas. E não se enganem, a linguagem acessível e
aproximada da autoetnografia não diminui a profundidade da
análise. Esta foi uma escolha metodológica do autor, mais uma
vez generoso na proposta de levar um debate tão profundo a um

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

público tão amplo que ainda não domina o conhecimento letrado


dos mestres e doutores. Um público que pertence ao
secretariado, que tem potencial, energia e muita força para uma
construção coletiva. Um público que precisa compreender e
acima de tudo precisa fazer parte desta construção – e quando
digo fazer parte é ter acesso a um conhecimento que poucos
dominam, é compreender, é sentir-se instrumentalizado e capaz
de julgar, opinar e participar – tanto quanto precisam os nossos
mestres, doutores, pós-doutores além daqueles que nos
representam nas instituições políticas, econômicas, legais e por
aí vai – essa é a EMANCIPAÇÃO do sujeito da prática de
secretariado de que falei ao início e que o autor revela no seu
texto.

Obrigada Jefferson Sampaio de Moura, um grande ser humano e


amigo – pela oportunidade de reconhecer em você um pouco do
que desejo em mim. Desejo aos leitores que gostem das
reflexões e, mais que isso, que possam dar continuidade
intencionalmente, conscientemente, criticamente aos rumos do
secretariado.

Dra. Fabiana Regina Veloso1


Pró-Reitora de Extensão da UNIOESTE (2020-2023)

1
Graduada em Secretariado Executivo Bilíngue pela Universidade
Estadual do Oeste do Paraná (1995), Mestre em Administração pela
Universidade Estadual de Londrina (2003), Doutora em Administração pela
Universidade Positivo (2017). Atualmente é professora adjunta da
Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Pró-Reitora de Extensão da
UNIOESTE (2020 a 2023). Atua como docente e pesquisadora
principalmente nos seguintes temas: secretariado executivo, comunicação
empresarial, assessoria e consultoria, estudos organizacionais,
significados culturais e teoria da prática.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

PREFÁCIO

Secretariado: quando a renovação é necessária

Enquanto escrevo, escuto Cartola. É incrível como ele


consegue alcançar os nossos corações com canções tão
simples e, ao mesmo tempo, tão verdadeiras e humanas. A
que escuto agora é "Preciso me encontrar", uma das minhas
favoritas. Gosto especialmente da parte em que ele diz:

"Eu quero nascer, quero viver... Deixe-me ir, preciso andar,


vou por aí a procurar, sorrir pra não chorar"

Eu quero nascer. Não um nascer carnal, mas espiritual, de


alma, em um mundo onde eu possa ser eu mesmo, sem
padrões desnecessários, imposições, medo de ser feliz e
dores. Um mundo em que as pessoas me vejam como um ser
humano, não como uma máquina produtora de resultados,
que estará à disposição, dia e noite, durante a alegria e a dor,
com um sorriso no rosto, paletó alinhado e gravata.

Foi no ensino médio quando decidi que faria graduação em


Secretariado Executivo, era um mundo que me encantava. Via
as secretárias do lugar onde eu trabalhava, como menor
aprendiz, e ficava encantado, achava o máximo como elas
dominavam o espaço. Elas eram deusas, mutantes,
angelicais, sorridentes, faziam com que tudo ao redor
funcionasse. Tinham uma rotina pesada, mas com cuidado
faziam o ambiente se tornar mais leve. Eram verdadeiras
heroínas.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Entrei na faculdade. Logo no primeiro semestre, decidi que


seria professor de secretariado. Os anos se passaram e aqui
estou: professor da área de secretariado. O mundo conspira a
nosso favor. Integrei duas coisas que amo: o secretariado e o
ato de ensinar.

...

A profissão me encantou, pela beleza do fazer secretarial:


ajudar, assessorar, apoiar, doar-se, fazer a coisa acontecer,
etc. Nascemos da necessidade de ajuda e secretariar é isso:
ajudar pessoas dia e noite.

Todavia, em algum momento da história desandamos (talvez


seja este o momento em que você começa a não gostar do
texto e desista de lê-lo até o final, eu te entenderei se assim o
fizer). Em algum momento da história, apropriamo-nos do
poder que tínhamos em nossas mãos e esquecemo-nos de
ser humanos. A profissão se elitizou, características do modo
capitalista de ser tomou conta das/os profissionais: a
competição, o individualismo, o se achar melhor que o outro
pelo fato de ocupar o posto de secretária/o da/o presidente da
empresa, fala mais de uma língua ou fez o curso em uma
instituição de renome; o consumismo exacerbado de produtos
de luxo, de modo que esteja sempre alinhada/o; o diminuir
outras pessoas para conseguir uma promoção; e várias outras
características que poderíamos passar dias citando. Nesse
meio caminho, o ser humano foi esquecido. Não só o ser
humano que era atendido, mas o ser humano por trás da/o
profissional. A acidez foi tomando conta, o romantismo só

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

cabia para relações com pessoas que poderiam, de algum


modo, ofertar algo ou algum benefício; e para chefias e
autoridades superiores. Talvez por isso tudo é que foi criado o
Código de Ética da Profissão (magnífico, bem estruturado e
de uma preciosidade), documento ainda ignorado por uma
parcela expressiva de profissionais. Esse é um problema que
evitamos visitar e que muitos tentam invisibilizar e/ou
minimizar os seus efeitos.

Cursos de secretariado estão fechando as portas por falta de


alunos em todas as partes do país. Escuto falas desmotivadas
de secretárias/os que atuam na docência, quando falam do
curso de secretariado, e isso me dói. Em meio ao silêncio,
meu coração grita gritos de não: não é isso, não desanime,
não destrua isso, não diga isso, não faça isso, não, não...
Vários nãos. O maior deles é o que digo para mim mesmo:
não se conforme com isso.

Esse último “não” me motiva a querer mudar essa realidade.


Temos profissionais movidas/os tão somente pelo sucesso,
dinheiro e pelas demandas do mercado, mas temos tantas/os
outras/os que são movidas/os pelo desejo de ajudar o outro a
ser mais, a ser melhor, que orientam suas práticas nas
demandas do mercado, mas não se descaracterizam e nem
diminuem outras pessoas que não seguem os mesmos
padrões que eles, como usar determinada roupa, falar de
determinada forma, portar-se de tal jeito, ser formal, dentre
outros. As empresas têm mudado, mas muitas/os profissionais
não aceitam essas mudanças.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Hoje não basta ser competente se você não tomar uma


postura simpática2 e respeitosa para com o outro. As
máquinas fazem boa parcela de nosso serviço, mas não
conseguem manter vínculos afetivos a ponto de firmar
parcerias, estabelecer novos contatos, mudar ideias, buscar
soluções para conflitos humanos e criar um clima amistoso,
onde as pessoas não são movidas por relações de poder, mas
por relações de confiança, respeito e troca. Ouso dizer que a
profissão de secretariado nunca acabará, conseguimos fazer
coisas que as máquinas não fazem.

Nesse sentido, necessitamos de nos apegar ao ser humano


que reside em nós e nas outras pessoas. A formação
secretariado necessita articular os saberes técnicos da área
com essa humanidade que nos liga e demanda coisas.
Nascemos da necessidade de ajuda, podemos retomar isso e
recriar a profissão. Isso é o que me move.

“Que um homem não te define


Sua casa não te define
Sua carne não te define
Você é seu próprio lar”
(Francisco, El hombre - Triste, louca ou má)

Um paletó não pode definir se um profissional é bom ou não.


Roupa não define competência. A seriedade não define
profissionalismo. Formalidade desnecessária, em momentos
desnecessários, pode te excluir e afastar do grupo. O

2
Uso aqui o conceito de simpatia adotado por Lynn Hunt, em seu livro “A
Invenção dos Direitos Humanos”, caracterizado como o momento em que
a sua humanidade sente a humanidade do outro.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

mercado hoje busca profissionais maleáveis, flexíveis,


inovadores, criativos, alegres, competentes naquilo que se
propõem fazer e humanos. Isso definirá se você conseguirá
postos ainda não obtidos pelo profissional de secretariado ou
viverá eternamente no mesmo posto de trabalho, o que
também não é um problema, existem pessoas que querem
mais e outras que são extremamente realizadas atuando
como secretária/o, é uma questão de perfil. O que não se
pode é viver reclamando por não conseguir coisas novas,
vivendo e adotando sempre as mesmas atitudes.

Sou secretário executivo, extrovertido, informal quando me é


permitido, sorrio aos quatro ventos, abraço quando é preciso,
faço piada, visto o que quero quando quero, sou do povão, da
realeza, do mundo, e ouso dizer que sou muito competente
naquilo que me proponho fazer. Não é sobre prepotência de
minha parte, mas sobre ser excelente sem precisar se limitar à
vestimenta; é possível ser uma secretária magnífica com seu
jeito espontâneo de ser e com seu piercing no nariz; é
imaginável ser secretária com seu corpo todo tatuado e
usando roupas mais informais... Existem instituições que terão
um código de vestimenta mais formal e outras que te deixarão
escolher o que vestir. Escolha as que cabem no seu perfil, as
em que você poderá contribuir sem se descaracterizar
enquanto sujeito. Existem empresas de todos os tipos e para
todos os perfis. Não se feche em empresas formais, se o seu
perfil é outro. Evite se descaracterizar porque uma profissional
disse que o modo de ser correto é este ou aquele. No fundo, o
que importa é se amar para poder amar e cativar outras
pessoas, esse é o segredo do sucesso para a/o profissional
de secretariado.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Precisamos refletir acerca dos padrões limitantes que


persistem no meio secretarial. O mundo mudou, as empresas
mudaram, precisamos acompanhar essas mudanças.
Necessitamos aceitar que muita coisa caiu no desuso e que
tantas outras são violentas e excludentes. Carecemos da
oferta de cursos de secretariado que não formem somente
para o elitismo, para a soberba, a padronização, a
homogeneização, a competitividade violenta, mas que formem
especialmente para o amor ao servir, para as relações
humanas, para a valorização do ser humano e pelo direito de
ser diferente, sem impor padrões excludentes, limitantes e
violentos.

Secretariar é lindo. Como comentei, cursos estão fechando e


muitas pessoas estão desistindo da profissão porque ainda há
um amor a morte: do ser humano, das relações humanas, da
personalidade das pessoas, do individual, do coletivo.
Precisamos pensar e ofertar cursos que formem para o amor
a vida: humana, da esperança em dias melhores para a
humanidade, do coletivo e do individual, da personalidade e
das diferenças. A profissão não acabará, repito, mas
necessitamos refletir sobre que tipo de formação estamos
mantendo em nossas faculdades e universidade, o público
atingido, que perfil estamos priorizando e para que empresa
formamos profissionais.

Falamos de uma formação que forme humanos que se


identificam com o ajudar outros humanos, que pautados em
atitudes humanistas construirão novos cenários de trabalho,
novas relações humanas, novos paradigmas, novas empresas

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

e novos rumos para a profissão. Não há possibilidade de se


formar para o novo, vivendo na mesmice e baseando-se em
padrões excludentes e antigos, repito.

Para a profissão manter-se viva, o foco necessita de ser no


ser humano, no ajudar o ser humano, ajudar empresas a
serem mais humanas. Essa é a tendência do momento: ser
um profissional humanizado com práticas humanizadas.

“Prefiro queimar o mapa


Traçar de novo a estrada
Ver cores nas cinzas
E a vida reinventar”
(Francisco, El hombre - Triste, louca ou má)

Para fins metodológicos

O campo teórico do secretariado é constituído por uma série


de disputas paradigmáticas que direciona para o seguimento
ou ruptura do entendimento relacionado ao ser secretária e
ser secretário. É na tensão entre essas disputas que surge
este livro, com o objetivo central de repensar as estruturas
teóricas e sociais da profissão de secretariado, propondo uma
leitura mais humanizada e com foco no sujeito, o que constrói
e o que é impactado pelo fazer secretarial.

Para alcançar o objetivo apresentado, conversaremos acerca


dos aspectos epistemológicos da formação e atuação

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

secretarial, em uma perspectiva crítica e humanizada,


articulando paradigmas funcionalistas, aqueles relacionados
às práticas rotineiras e funcionais da atuação; e interpretativa,
referente às diversas interpretações possíveis do fenômeno,
na compreensão da área (LEAL; SANTOS; MORAES, 2017).

Para fins de delimitação do conceito de epistemologia adotado


nesta obra, seguimos as ideias de Japiassu (1992, p.27):

Devemos falar hoje em conhecimento-processo e


não mais em conhecimento-estado. Se nosso
conhecimento se apresenta em devir, só
conhecemos realmente quando passamos de um
conhecimento menor a um conhecimento maior.
A tarefa da epistemologia consiste em conhecer
este devir e em analisar todas as etapas de sua
estruturação, chegando sempre a um
conhecimento provisório, jamais acabado ou
definitivo. É neste sentido que podemos
conceituá-la como essa disciplina cuja função
essencial consiste em submeter a prática dos
cientistas a uma reflexão que, diferentemente da
filosofia clássica do conhecimento, toma por
objeto, não mais uma ciência feita, uma ciência
verdadeira de que deveríamos estabelecer as
condições de possibilidade, de coerência ou os
títulos de legitimidade, mas as ciências em vias
de se fazerem, em seu processo de gênese, de
formação e de estruturação progressiva.

Falamos de processo, conhecimento em processo de


formação, um conhecimento vivo que se transmuta
diariamente no seio das grandes organizações. Junto a isso, o
presente livro apresenta um debate importante para a
compreensão da complexidade do secretariado, por uma via
funcionalista, percebendo as funções desempenhadas e

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

demandadas para esse profissional pelo mundo do trabalho; e


humanitária, pensando em uma análise que surja da
autocompreensão do sujeito secretário como estratégia de
colocação e formação especializada. A análise não pretende
apresentar ou propor elos de aproximação e pontos de
distanciamento entre as vias, mas sim uma reflexão
articulando-as à prática e formação em secretariado.

Todo o debate desenvolvido e apresentado nos próximos


capítulos tem caráter qualitativo e apresenta-se
descritivamente em relação aos aspectos estruturais e
funcionais da profissão de secretariado (MARCONI;
LAKATOS, 2003); e explicativo, quando ao registrar e
analisar, buscamos perceber e identificar as possíveis causas
do fenômeno, com base na interpretação possibilitada pelos
dados e observações obtidos qualitativamente (SEVERINO,
2007).

Em alguma medida o texto também se apresenta de modo


autobiográfico e memorial, construindo um debate que parte
da realidade vivenciada e experimentada pelo autor e por
estudantes e profissionais de secretariado próximos a ele.
Você vai perceber que em vários momentos o texto parece
narrar uma história.

Para a construção da linha de argumentação, unem-se o


raciocínio dedutivo, quando partimos de ideias universais,
inteligíveis, e caminhamos para análises mais complexas
menos universais, ou seja, menos conhecidas e utilizadas
pelo senso comum; ao raciocínio indutivo, quando partimos
de dados e fatos particulares, construídos com base na

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

vivência e experiência sensível e concreta, para uma


afirmação e compreensão mais universal (SEVERINO, 2007).

Ademais, os textos aqui apresentados são frutos de reflexões


publicadas no site do autor, construídas com base em
diversas leituras, sejam de livros, artigos ou normativas
específicas da área de secretariado. Leituras que auxiliaram
na construção das ideias e dos pensamentos, servindo como
embasamento teórico para a discussão. Todo material
utilizado está listado nas Referências e em notas de rodapé.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CAPÍTULO 1 - OS PILARES EPISTEMOLÓGICOS DA


FORMAÇÃO EM SECRETARIADO

Dias atrás, refletia sobre a vida e revisitei várias lembranças,


coisas do passado, e aquilo me fez refletir sobre diversas
coisas. Uma delas é que o tempo foi muito bondoso comigo e
hoje consigo entender melhor muitas coisas, tanto que chego
a me assustar com o fato de eu ter vivido durante tanto tempo
em meio à “ignorância”. O tempo passa e nós vamos
amadurecendo em relação a vários aspectos de nossas vidas,
do afetivo ao profissional, tudo amadurece e, no fim, você vai
se abrindo ao novo (ou pelo menos deveria ser assim).

1.1 O amadurecimento no processo de formação humana

O amadurecimento (físico, intelectual, afetivo, espiritual e


profissional) deveria estar mais ligado à capacidade de
adaptação do que aos aspectos mais rígidos da evolução
humana. Quando se amadurece, sabemos o que nos é bom e
o que nos faz bem, ao tempo em que desenvolvemos uma
capacidade imensa de querer o bem, fazê-lo e ofertar o nosso
melhor para as pessoas ao nosso redor. Amadurecer é
perceber a importância do outro para a sua construção
enquanto sujeito. Uma pessoa realmente madura é aquela
que todo mundo deseja estar ao lado dela, pois sua presença
emana boas energias e sabedoria. Ser maduro é ser sábio,
saber quando, como e de que modo falar e se posicionar;
entrar e sair nos lugares e deixar ali uma lembrança boa de
sua presença; tocar os corações com um abraço; manter a
coerência nos seus ideais e na sua postura; mover energias

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

boas para quem está precisando; e saber ouvir


empaticamente. Tudo isso não é fácil. Nunca foi.

No processo chamado vida, várias coisas acontecem para


nos auxiliar no amadurecer.

O trabalho, por exemplo. Marx dizia que o trabalho faz parte


da essência humana: o ato de transformar a natureza, para a
obtenção de um bem necessário para o nosso bem-estar e
bem-viver, está conosco desde os primórdios da sociedade. O
ser humano consegue julgar o que lhe é bom e se algo não o
é, pode mudá-lo, transformá-lo e/ou adaptá-lo para que seja.

O trabalho aqui é compreendido como algo muito mais amplo


do que o trabalho formal em organizações empresariais, é
encarado como o ato físico e/ou intelectual com o objetivo de
se obter, construir ou transformar algo. Nesse sentido mais
extenso, trabalhamos constantemente e assim construímos
teias conexas com outros sujeitos com foco em uma realidade
digna para ambos. Ao interagir com o outro, nesse processo,
permito-me aprender com ele e a trocarmos experiências em
que saio do desconhecimento e passo a fazer parte de um
conjunto social, onde se é esperado de mim uma postura que
prima pelo bem-estar do todo.

Outro exemplo é a vida acadêmica. Os estudos estão desde


cedo no nosso cotidiano, desde o ensino básico,
compreendido como a educação infantil, fundamental e média,
até a formação de nível superior, como a graduação e as pós-
graduações.

29
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

A educação, assim como o trabalho, está conosco


diariamente. Nesse livro, ela é compreendida como o ato de
construção, transformação e divulgação dos conhecimentos
historicamente construídos pela humanidade, de modo que
auxiliem os sujeitos a terem uma vida útil e digna. A educação
é entendida ainda em suas diversas formas, tanto formal
como não formal: aprendemos na escola, como também com
o convívio social fora dos muros dela. Não conseguimos nos
desprender dos processos educativos, educamos e somos
educados constantemente.

A educação pode ser uma ferramenta de amadurecimento,


como também um caminho para a soberba e para a
hierarquização social; pode ser libertadora, inclusiva,
emancipatória, empoderadora e humanizada, como também
pode ser excludente, violenta, elitista e desumanizada. Hoje
encontramos, no que se refere à educação formal, instituições
de ensino de tudo quanto é tipo, para todos os gostos e
bolsos, adaptadas à demanda da obtenção do diploma o mais
breve possível. É preciso trabalhar, trabalhar e ganhar
dinheiro e para se ganhar muito dinheiro é preciso ter
formação, uma lógica bem simples.

Quando a formação não permite o amadurecimento, a


libertação, a humanização e o empoderamento, ela abre
brechas para a desumanização humana, onde o produto que
oferto vale mais do que a minha essência, onde meu coração
é retirado e eu vou me mecanizando diariamente. Torno-me
máquina. As máquinas têm uma característica muito
interessante, elas conseguem produzir resultados rápidos e
em grande quantidade, quando bem programadas são

30
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

capazes até de resolver problemas pré-conhecidos, o que elas


não conseguem fazer é se adaptar a problemas novos e
inéditos, buscando soluções para eles e, assim, resolvendo-
os. Acredito que com o advento da inteligência artificial isso
possa vir a acontecer, mas creio que essa tecnologia demora
a ser acessível ao grande público. A questão é que a
educação formal de hoje nem sempre permitirá o
amadurecimento, pode ser que ela esteja só te preparando
para produzir resultados e, consequentemente, mecanizando
o seu ser. Fique atenta/o a isso.

As relações diárias também ajudam no amadurecimento.


Decepções, alegrias, perdões, amores, experiências e
contatos influenciam. Existem coisas que acontecem para te
mostrar como não ser e outras para te mostrar a como ser.
Toda experiência é válida, da mais alegre a mais triste. Todas
te ajudam a evoluir.

Ouso dizer que uma de nossas missões na terra é o


amadurecimento. Às vezes dói, mas edifica.

1.2 Uma teoria interdisciplinar que oriente a formação

O argumento de que o cerne da atuação da/o secretária/o


está na assessoria é constante nos textos da área, sejam os
que trabalham aspectos teóricos, quanto os aplicados que
direcionam para a compreensão de competências específicas
desses profissionais. A partir desse argumento, foram
estabelecidos os perfis desejáveis para os egressos dos

31
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

cursos de formação em secretariado, dispostos na Lei de


Regulamentação da Profissão, n° 7.377/1985 (BRASIL, 1985);
no Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia,
para o curso Superior de Tecnologia em Secretariado; no
Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, para o Técnico em
Secretariado; e nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)
estabelecidas para os cursos de bacharelado em Secretariado
Executivo. Pelo fato de os cursos de bacharelado terem uma
tradição histórica, vista a criação do primeiro curso desta
modalidade em 1970 (SABINO, 2017), observemos, em
especial, o perfil apresentado em suas DCNs (BRASIL, 2005):

I - capacidade de articulação de acordo


com os níveis de competências fixadas
pelas organizações; II - visão generalista
da organização e das peculiares relações
hierárquicas e inter-setoriais; III - exercício
de funções gerenciais, com sólido domínio
sobre planejamento, organização, controle
e direção; IV - utilização do raciocínio
lógico, crítico e analítico, operando com
valores e estabelecendo relações formais e
causais entre fenômenos e situações
organizacionais; V - habilidade de lidar
com modelos inovadores de gestão; VI -
domínio dos recursos de expressão e de
comunicação compatíveis com o exercício
profissional, inclusive nos processos de
negociação e nas comunicações
interpessoais ou inter-grupais; VII -
receptividade e liderança para o trabalho
em equipe, na busca da sinergia; VIII -
adoção de meios alternativos relacionados
com a melhoria da qualidade e da
produtividade dos serviços, identificando
necessidades e equacionando soluções; IX
- gerenciamento de informações,
assegurando uniformidade e referencial

32
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

para diferentes usuários; X - gestão e


assessoria administrativa com base em
objetivos e metas departamentais e
empresariais; XI - capacidade de
maximização e otimização dos recursos
tecnológicos; XII - eficaz utilização de
técnicas secretariais, com renovadas
tecnologias, imprimindo segurança,
credibilidade e fidelidade no fluxo de
informações; e XIII - iniciativa, criatividade,
determinação, vontade de aprender,
abertura às mudanças, consciência das
implicações e responsabilidades éticas do
seu exercício profissional.

Observa-se nas DCNs dos cursos de bacharelado, uma


relação estreita entre as práticas que os profissionais de
secretariado devem dominar após sua formatura e, ainda que
indiretamente, as práticas de outras áreas do conhecimento
que perpassam a formação profissional em secretariado,
como por exemplo linguística, psicologia, administração,
gestão da informação e relações públicas. Essa articulação
interdisciplinar dá o tom da formação e do fazer secretarial e
lhe garante aspectos multi-identitários, perpassando todo o
campo teórico da área.

Alguns teóricos defendem a delimitação e o estabelecimento


de uma epistemologia própria da profissão (HOELLER, 2006;
NONATO JUNIOR, 2009), outros advogam na defesa de que
o campo teórico secretarial é de caráter interdisciplinar
(SABINO; MARCHELLI, 2009; NASCIMENTO, 2012;
DURANTE, 2012. Neste livro, defende-se a
interdisciplinaridade da formação secretarial, percebida como
a plena articulação dos conteúdos específicos que formam e

33
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

estabelecem uma formação com visão global para os


estudantes de secretariado.

O processo de teorização das práticas secretariais,


respeitando a interdisciplinaridade da área, rompe a ideia de
perfil único possível em secretariado e a compreensão
superficial das técnicas adotadas pelo profissional em seu
cotidiano. Passa-se a pensar em campos e áreas possíveis
para a atuação secretarial, já que esse caráter garante o
desenvolvimento de habilidades e aquisição de conhecimento
de diversas áreas do conhecimento.

Ao refletir sobre campos e possibilidades, esse processo


possibilita teoria aplicada para o desenvolvimento de nível
técnico, ao apresentar os processos e sistemas relacionados
às práticas rotineiras; e humano-social, ao permitir ao
estudante a identificação de postos de trabalho que melhor se
adequa ao seu perfil, questionando estruturas que violam
direitos e/ou estabelecem relações violentas no local de
trabalho, rompendo assim os processos de alienação do
sujeito trabalhador.

Ao romper essa alienação do sujeito trabalhador,


compreendida aqui como a formação profissional que não
possibilita ao sujeito a compreensão das relações de trabalho
e sociais que perpassam a sua atuação e influenciam no seu
bem-estar e na construção de uma sociedade mais justa e
igualitária, bem como de uma vida digna para todos,
rompendo estruturas violentas, a exclusão social e a violação
de direitos humanos civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais, é possível estabelecer relações mais saudáveis para

34
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

os profissionais de secretariado, evitando demissões,


frustrações e doenças psíquicas.

1.3 Uma formação crítica em secretariado para além da


técnica

O campo de atuação secretarial é amplo, uma vez que a


assessoria administrativa pode ser ofertada a qualquer
empresa que apresenta demandas administrativas. O
profissional com formação pode atuar tanto em multinacionais
como em escritórios de pequeno porte, sendo este o
diferencial competitivo da área na era da hiperespecialização
(MORIN, 2006). A formação em secretariado pode possibilitar
a construção de um profissional global, capaz de atuar como
secretária/o em qualquer empresa, de qualquer ramo.

Com base nesse pressuposto, a adaptabilidade passa a ser


uma habilidade básica deste profissional, entendida neste
trabalho como a capacidade do sujeito em se adequar às
mudanças demandadas a ele. Essa adaptabilidade, quando
não trabalhada de modo crítico, pode causar a alienação do
sujeito, que se permite ser violentado e descaracterizado com
base em um discurso hegemônico que estabelece um perfil
padrão de atuação.

Essa alienação do sujeito pode ocorrer tanto na formação


como na prática profissional dentro das organizações. Na
realidade, a primeira interfere diretamente na segunda.
Quando há o incentivo à desapropriação identitária do
estudante de secretariado em prol da construção do perfil que
é desejado pelo mercado de trabalho, isso naturaliza a ideia

35
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

da descaracterização como algo positivo e necessário. “Quem


vive sob este modelo de educação não ‘recebe educação’,
verdadeiramente, ‘padece educação’” (BITTAR, 2007, p. 321).

Constituiu-se, ocultamente, um lócus específico para esse


profissional, geralmente relacionado à assessoria executiva
formal de alta gestão, e com base nele o ensino é
padronizado com as demandas de mercado relacionadas tão
somente a ele. Esse enviesamento do perfil é percebido em
diversos livros da área, que se postulam em formato de
manual (DURANTE; SANTOS, 2010). Isso é tão notório que o
professor Marco Aurélio Nunes de Barros, ao prefaciar o livro
Guia do Secretariado – Técnicas e Comportamento, de
Denize Rachel Veiga, sinaliza uma preocupação sua em
relação ao entendimento da obra pelo público: “confundi-lo
com um simples manual seria o erro mais primário que se
poderia cometer” (VEIGA, 2007, p. 14). Poderíamos tecer uma
série de análises sobre o que este discurso transmite, mas
deixemos isso para outra oportunidade.

É na formação que se baseia tão somente na padronização e


adaptação ao mercado que se fertiliza o discurso da
resiliência, adaptabilidade e inteligência emocional como
ferramentas necessárias para o exercício secretarial. Ora, são
mesmo, já que o processo de formação parte da demanda,
não do perfil identitário do estudante. Vale dizer que não anulo
o caráter funcional da profissão, mas defendo a ideia de que a
reflexão teórica das questões que constituem o ramo de
atuação secretarial precisa romper os parâmetros objetivos e
imediatistas.

36
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

A formação em secretariado necessita de ofertar ferramentas


que possibilitam a/o estudante, e futuramente a/o profissional
de secretariado, refletir de modo crítico a sua prática. Pensar
na formação profissional no secretariado é trazer à tona a
necessidade do desenvolvimento de habilidades técnicas,
atitudinais e relacionais ao tempo em que o discente é levado
à constante reflexão das questões sociais que permeiam a
construção simbólica do ser e atuar secretarialmente.
Vejamos: a proposta é provocar a reflexão crítica durante o
processo de formação, de modo a possibilitar o que Paulo
Freire (1979) chama de práxis, a compreensão da prática, das
relações que a permeiam, das ideologias por trás do fazer, da
utilidade da ação e do papel social do sujeito manifestado por
meio do trabalho que ele desenvolve.

Kosik (2002) traz, ainda, uma reflexão muito pertinente em


relação ao que estamos falando sobre essa práxis:

A práxis é ativa, é atividade que se produz


historicamente – quer dizer, que se renova
continuamente e se constitui praticamente - [...]
sendo o modo específico de ser do homem, a
práxis com ele se articula de modo essencial, em
todas as suas manifestações, e não determina
apenas alguns dos seus aspectos ou
características. A práxis se articula com todo o
homem e o determina em sua totalidade (KOSIK,
2002, p. 222 – 223).

Com base nisso, a formação em secretariado precisa trazer


uma nova roupagem que vai além da padronização dos
sujeitos. Ao proporem a reflexão crítica como ferramenta
didático-pedagógica na formação profissional em secretariado,
a instituição e os docentes estão contribuindo para a
37
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

constituição de um sujeito trabalhador mais consciente e,


consequentemente, com maior propriedade crítica para
questionar suas práticas nas organizações, sem limitações e
imediatismos.

[...] a formação técnico-científica de que


precisamos é muito mais do que puro
treinamento ou adestramento para o uso de
procedimentos tecnológicos. No fundo a
educação de adultos como a educação em geral
não pode prescindir do exercício de pensar
criticamente a própria técnica [...] A compreensão
crítica da tecnologia é a que vê nela uma
intervenção crescentemente sofisticada no
mundo a ser necessariamente submetida a um
crivo político e ético [...] Uma ética, a serviço das
gentes de sua vocação ontológica, a do ser mais
e não de uma ética estreita e malvada, como a
do lucro, a do mercado [...] (FREIRE, 2000, p.
101-102).

Para se propiciar essa formação crítica, pensemos em dois


passos. O primeiro está relacionado à necessidade de
maleabilidade das instituições de ensino no que se refere ao
perfil do egresso que deseja formar, pois ao trabalhar com a
criticidade nos processos formativos, é preciso valorizar a
identidade dos sujeitos envolvidos nele.

O segundo passo refere-se à necessidade de refletir os perfis


de atuação em secretariado, de modo crítico e sem
hierarquizações, para que a/o discente consiga identificar a
trajetória que deseja seguir na área, ao tempo em que
estabelece fluxos mais efetivos e condizentes com o seu perfil
pessoal e seu plano de carreira.

38
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

A partir do sujeito, delimitamos o perfil daquele egresso.


Passamos a falar então em perfis possíveis, abrindo o leque
de atuação, evitando práticas didático-pedagógicas que
limitem e descaracterizem os sujeitos. Essa delimitação
individualizada exige do docente em Secretariado maior
cuidado no planejamento didático-pedagógico e maior
dedicação na construção de mediações intencionalizadas que
favoreçam o real desenvolvimento do sujeito para uma melhor
atuação no mercado secretarial.

Ao partirmos do sujeito para refletirmos a profissão,


rompemos a estrutura meramente funcionalista da formação e
atuação secretarial. Como consequência disso, teremos
processos educativos mais humanizados e coerentes com
uma ciência social aplicada, em que a prática é observada,
questionada e refletida no contexto social. Interpretar a
profissão de secretariado no contexto das ciências sociais é
compreender que o fazer secretarial é forjado nas relações
sociais e que a ação não é à parte do sujeito, mas parte
constituinte dele.

Nesse sentido e por esse sentido, os pilares


epistemológicos da formação em secretariado passam a
se constituir na plena articulação das relações do sujeito
secretário com o meio às influências do meio para a formação
desse profissional. A formação se dá em uma via de mão
dupla: a/o profissional de secretariado se forma para uma
atuação específica, respeitando o que é demandado pelo
mercado para essa atuação; e, ao mesmo tempo, mantendo-
se em uma postura crítica que lhe permite refletir sua prática,
diariamente, propondo novas formas de se fazer, rompendo

39
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

estruturas que violentam, exploram e descaracterizam a sua


ação.

Pensando nessa proposta epistemológica, a formação


secretarial que conversa com a atuação no mercado de
trabalho toma uma roupagem que vai além do técnico, mas
propicia e possibilita a compreensão dos aspectos
humanitários e comportamentais na profissão. O fazer técnico,
que não é anulado em uma atuação estratégica, toma
roupagem politécnica através de uma educação politécnica
(MACHADO, 1989), aquela que educa para o trabalho e para
além dele, com foco no desenvolvimento integral do sujeito e
a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, onde
todos tenham o direito de ter uma vida digna de ser vivida.

[...] a educação politécnica traduz os interesses


da classe trabalhadora na crítica à fragmentação
dos conhecimentos, à separação entre educação
geral e específica, entre técnica e política, e à
divisão entre trabalho manual e intelectual; além
disso, afirma o domínio dos fundamentos
científicos das diferentes técnicas que
caracterizam o processo de trabalho moderno na
relação entre educação, instrução e trabalho, da
perspectiva desenvolvida por Marx e Engels e
apropriada pelas experiências socialistas
(FRIGOTTO; CIAVATTA, 2012, p. 277).

É com base nessa proposta que as técnicas secretariais


transcendem para uma complexidade politécnica, em que o
fazer é contextualizado nos aspectos locais, sociais e
históricos relacionados ao posto de trabalho do sujeito
secretário e ao próprio sujeito. Tais técnicas, como práticas,
passam também a ser encaradas como gestão.

40
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Utilizemos como exemplo a organização de eventos, uma


técnica secretarial que exige do profissional de secretariado
habilidades de nível técnico: conhecimento relacionado à
ordem de precedência, à composição de mesa, harmonização
das cores e decoração de acordo com o perfil do evento, à
construção do roteiro do cerimonial, dentre outros. Em uma
perspectiva crítica e humanizada, essa técnica passa a ser
analisada também em relação às habilidades
comportamentais, relacionais e atitudinais, exigidas para esse
profissional no seu exercício, como a habilidade de
relacionamento com sua equipe, a divisão estratégica das
funções de acordo com o perfil de seus colaboradores, o
pensamento estratégico em relação aos imprevistos que
possam vir a surgir, a adaptabilidade de acordo com o
orçamento financeiro estabelecido, a mediação de conflitos na
equipe, a inovação em relação ao mercado e o que ele tem
demandado, a proatividade necessária para o
desenvolvimento das atividades, dentre outras.

Quando se fundamenta em uma perspectiva meramente


funcionalista (LEAL; SANTOS; MORAES, 2017), a formação
corre o risco de perder o teor social da atuação e ficar presa
aos parâmetros técnicos relacionados ao fazer e às demandas
do mercado, sem refletir as possibilidades de transcendência
secretarial possibilitada pelo próprio profissional de
secretariado, agente e sujeito fundamental que nutre a
profissão no seio das organizações.

41
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

1.4 Uma formação “madura” em secretariado

Com o passar dos anos, percebi o quanto a profissão de


secretariado é madura em sua essência. Secretariar é
amadurecer-se todos os dias. A rigidez não cabe na profissão,
não deveria ter cabido. Quando se fala que a profissão surgiu
da necessidade de apoio, é importante ressaltar que o apoio
sempre foi para seres humanos, não para um CNPJ, para
pessoas diferentes, parecidas em alguns aspectos, mas
distintas em suas essências. Trabalhar com o diferente exige
flexibilidade e amadurecimento.

A/o profissional de secretariado que não é flexível, não


entendeu a lógica da profissão. Várias/os palestrantes da área
sinalizam a importância da flexibilidade na atuação nas
empresas, fala-se disso em tudo quanto é evento, virou até
um grande provérbio que todos conhecem, mas nem todos
aplicam. Ser adaptável é a grande tarefa diária. Está aí
outro desafio que não é fácil.

Em que medida os cursos de graduação em secretariado


formam profissionais adaptáveis e flexíveis? De que modo
isso é feito? Dois questionamentos-chave para entendermos o
porquê da dificuldade de ser adaptável e flexível na atuação
profissional.

Temos uma educação básica que forma para a


homogeneidade, tanto que se você não está no nível da turma
é reprovado. Tentam constantemente padronizar os alunos e
quando algum não se adequa, facilmente é patologizado com
déficit de atenção ou hiperatividade. É mais fácil patologizar e,

42
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

assim, medicar para resolver o problema do que buscar


formas alternativas de educação que permitam a todos
aprenderem. Depois disso, o sujeito vai fazer uma faculdade
que não foge muito deste padrão.

As graduações formam profissionais no perfil que o mercado


deseja. Mas que mercado é esse? Os professores e gestores
escolares, comumente, focam em um mercado específico e
assim formulam seus cursos com foco nele. Isso acontece
constantemente no secretariado, formamos nossas/os
alunas/os para atuarem em grandes empresas, em ambientes
formais, atendendo executivos (homens, ainda temos
dificuldade de usar o termo “executivas”, mesmo sabendo da
existência delas) de nome, ganhando salários altos e
mantendo um status de vida de alto padrão. Quando falamos
em outras possibilidades, damos algumas pinceladas e
quando aprofundamos em alguma área diferente é naquela
que exige formalidade e ganha muito dinheiro.

Pois bem, essas vagas são poucas e a maior parte de


nossas/os alunas/os não chegarão a elas e isso não é
necessariamente um problema. A maior parte das/os
discentes não tem nem perfil para elas. Na sala é possível ver
alunas/os que se adequam bem à assessoria de alta gestão,
mas têm outras/os que gostam mais da assessoria
tecnológica, outras/os que são magníficas/os na organização
de eventos, algumas e alguns que amam trabalhar em
pequenas empresas e assumir a chefia de setores, fora as/os
que curtem a assessoria digital, de mídias sociais, ainda há
espaço para aquelas e aqueles que preferem trabalhar na
assessoria especializada para Organizações Não

43
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Governamentais (ONGs) e Movimentos Sociais, fora as


diversas outras possibilidades.

A formação da/o profissional de secretariado precisa permitir


que a/o discente veja todas essas possibilidades e escolha a
que melhor se adequa ao seu perfil. É literalmente uma
educação libertadora e emancipatória. Se a assessoria é uma
área tão ampla, por que mostrar só um tipo que não será
alcançado por todas/os?3

O que acontece é que discentes com perfis distintos estão


sendo formadas/os para um perfil único e, no fim, acabam
frustradas/os por não atingir aquele patamar que, por vezes,
não conversa com o seu perfil. É preciso que a formação
discorra sobre o maior número possível de atuação, sem
padronizar e fechar as possibilidades. Não é exigir que as/os
discentes usem terninho ou terno e gravata para realizar uma
atividade, mas é mostrar que podem ser formais com outras
roupas; é formar para assessoria de alta gestão ao tempo em
que forma para a pequena gestão; é abrir leques, mostrar à/ao
discente que ela/e pode seguir a área que melhor se adequa
ao seu perfil; é ensinar a ser elegante, vestindo roupas finas e
lidando com pessoas importantes, mas também ensinar a ser
básica/o, lidar com as equipes de serviços mais braçais da
empresa de modo igualitário, respeitoso e com o valor que é
dado a gestão da instituição; é ensinar a ser elegante sempre,
seja no restaurante premiado ou na lanchonete da empresa; e
é mostrar que a/o discente pode ser a/o melhor secretária/o

3
Verifique a pasta “Mercado de Trabalho e Secretariado”, disponível na
Biblioteca Secretarial, que pode ser acessada em
http://www.jeffersonsampaio.com/p/biblioteca-secretarial.html

44
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

na empresa de grande porte como também no escritório


odontológico, já que sempre existirão alunas e alunos que
preferem cargos que vemos, erroneamente, como inferiores, o
que não é um problema, nunca foi, é somente questão de
interesse.

Vale dizer que a ideia não é ofertar uma educação “fraca” ou


simplista para pessoas que preferem vagas mais simples, mas
ofertar uma educação tão boa que lhe permita ser a/o melhor
naquilo que vai fazer, seja na recepção de uma loja ou numa
multinacional. A/o discente conhecerá ambas as instituições e
poderá escolher, sem pré-julgamentos, onde deseja atuar. Se
um dia quiser sair do telemarketing e seguir para a gerência
de um banco, fará, pois, estará preparada/o para isso. Isso é
uma educação libertadora e emancipatória.

As/os alunas/os precisam de, urgentemente, conhecer novas


possibilidades no secretariado para que assim sejam mais
felizes durante e depois de suas formações, consigam seus
postos de trabalho e façam aquilo que as/os fazem felizes. A
felicidade é a meta.

Não é possível permitir o amadurecimento se não priorizarmos


a felicidade profissional de nossas/os estudantes. Quando
atentarmos para uma formação libertadora, em que a/o
aluna/o pode ser quem ela/e deseja ser, estaremos permitindo
e influenciando o amadurecimento profissional, humano e
social de nossa população.

45
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

1.5 Organização de eventos: um exemplo de ferramenta


didático-pedagógica

Vamos pensar a formação em secretariado como um


processo sistêmico de constituição de um profissional
polivalente, multifuncional e humanizado. Para que
alcancemos essa formação, a/o docente em secretariado
utiliza uma série de mediações, ferramentas e métodos
pedagógicos. Esses métodos são como se fossem um norte
que direcionam o fazimento em sala de aula. A escolha do
método se faz articulada ao processo de reflexão de que
profissional desejo formar, qual é o perfil da/o egressa/o, quais
são as demandas do mundo do trabalho e as de cunho social.
Se desejo formar um/a profissional crítico/a, devo trabalhar
com instrumentos que permitam o desenvolvimento dessa
criticidade. Não dá para esperar resultados humanos, com
práticas e métodos estritamente técnicos.
Nesse sentido, a docência em secretariado tem a missão
de formar para a profissão e para o mundo. A atuação em
sala de aula exige da/o docente uma postura crítica e
responsável desde o planejamento da aula até a avaliação.
Cabe ainda à/ao docente tentar articular conteúdos técnicos e
estratégicos, com pautas mais sociais e humanas, como, por
exemplo, o respeito ao outro, a empatia com o próximo, a
responsabilidade social, a sustentabilidade, a ética, a moral, a
diversidade, a superação dos problemas sociais, a construção
de uma sociedade mais justa e igualitária, a superação dos
cenários de violência, a solidariedade, entre outras.

46
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

A docência em secretariado é uma possibilidade de atuação


da/o profissional de secretariado e, nessa altura está o grande
desafio de quem escolhe essa área, pois é exigido que ela/e
tenha uma formação ao nível de pós-graduação e que, além
disso, domine conteúdos da didática, ramo da ciência
pedagógica que trabalha métodos e técnicas de ensino com
foco no aprendizado da/o estudante. Somos formados em
cursos de bacharelado e/ou tecnologia, logo não detemos
conhecimentos específicos dos cursos de licenciatura, o que
dificulta um pouco quando escolhemos a docência. Isso é uma
falha em nossa formação? Não. Somos um ramo de atuação
específico da área de gestão e negócios, não do ensino. A
docência é uma possibilidade, não um objetivo formativo
final.
O exercício docente é muito mais complexo do que alguns
teóricos/as colocam, percebo que essa simplificação da
docência é feita geralmente por profissionais sem formação ao
nível de licenciatura. Como disse, nosso curso não é uma
licenciatura, então para se atuar na docência é importante que
a/o secretária/o estude, compreenda os fundamentos
educativos, o compromisso social da escola, o papel do/a
educador/a, a realidade social do país e princípios didáticos,
para que assim consiga uma atuação mais efetiva em sala de
aula. Dar aula não é só transmitir o que se sabe, mas fazer
mediações intencionais que direcionam para uma
formação profissional e cidadã. A/o docente tem um
compromisso social, isso é um fato irrefutável.

47
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

1.5.1 O desenvolvimento de habilidade técnicas,


atitudinais e relacionais

Quando pensamos na formação da/o profissional de


secretariado, é importante que se permita um cenário de
desenvolvimento de habilidades específicas (técnicas,
atitudinais e relacionais), de modo que a/o discente em
secretariado consiga, ao término de sua formação, dominar as
técnicas secretariais, os conhecimentos específicos de outras
áreas de atuação envolvidos em sua prática e, assim, formar-
se um/a profissional competente.
Para permitir essa formação tão ampla, nós docentes
preparamos aulas, mediações, atividades e avaliações que
trabalham, o máximo possível, a articulação dessas
habilidades. Como assim? Propomos ações que permitem o
desenvolvimento de habilidades múltiplas, não só técnicas,
atitudinais ou relacionais, mas a articulação de pelo menos
duas delas. Quando a/o docente pede que a/o aluna/o
organize uma série de documentos, não se trabalha somente
a organização de arquivos, mas o pensamento estratégico, o
raciocínio lógico, a interação, a leitura e interpretação de texto,
dentre outras habilidades.
Venho, então, com um questionamento: qual é a ferramenta
que melhor realiza essa articulação de habilidades de uma só
vez? Enquanto professor e teórico4 da área, consigo pensar

4 Não me veja como um teórico convencional, daqueles que remendam


citações para justificar seus apontamentos ou daqueles que criam teorias
despregadas da realidade, como se a teoria viesse antes da ação. Veja-
me como um louco, acho que me enquadro bem neste adjetivo, um louco
inconformado com rumos que não valorizam a profissão que escolhi e
tanto respeito. Você não precisa concordar comigo, pode até construir um

48
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

em várias, mas por questão de tempo, vamos trabalhar uma


que julgo ser a mais forte: a organização de eventos.
Essa ferramenta é muito utilizada pelas/os docentes em
secretariado em todo o Brasil e, por vezes, por falta de
reflexão especializada sobre, ela é utilizada sem uma
compreensão mais profunda, a ponto de alguns docentes
elencá-la como uma ferramenta frágil, uma vez que
“secretariado não é só organizar eventos”. O secretariado não
se resume na organização de eventos, mas se utiliza dessa
ferramenta, riquíssima, para conseguir desenvolver as
habilidades necessárias para seu exercício profissional.
Evento é uma reunião de pessoas com o mesmo objetivo,
envolvendo questões financeiras ou não, em um mesmo
espaço (físico ou digital). Para se organizar um é preciso
planejamento, colocá-lo em prática, em ação, controlar e
avaliar a execução do que foi planejado.
No planejamento, eu estabeleço a ideia do evento, penso em
questões orçamentárias, divido tarefas, fecho contratos,
estabeleço metas e funções, emito convites, dentre outras
ações. Na ação, quando coloco o planejamento em prática, o
momento de execução do evento, eu preciso verificar se tudo
está em ordem, se o que foi contratado corresponde ao que

artigo, nos padrões científicos em vigor nos moldes eurocêntricos,


criticando tudo que digo neste livro. Preciso dizer que vivo sempre muito
receoso de estar fugindo de meus valores em prol dos meus desejos, por
isso tenho focado a minha escrita para o grande público, para a massa
secretarial, utilizando um discurso mais coloquial como estratégia de
aproximação a este público. Meu foco é na reflexão, no questionamento de
estruturas rígidas que nos impedem de sermos mais. É neste campo de
disputa paradigmática e de valores que me constituo teórico latino crítico
secretarial.

49
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

está sendo servido e entregue, acompanhar o andamento das


atividades e atentar-se aos imprevistos que possam surgir. No
final, o processo de avaliação é aquele que vai me permitir ter
uma visão do alcance e dos resultados que obtive com a
realização do meu evento. É um ciclo, até porque a avaliação
de um evento pode direcionar para o planejamento de outro.
Quando se propõe uma atividade que pretende a organização
de um evento, possibilitamos um cenário que permite o
desenvolvimento das técnicas secretariais em seus três níveis
de habilidades.
Habilidades técnicas: construção de checklist, divisão de
tarefas, construção de convite, leitura, produção e
interpretação de texto, organização da agenda, construção de
relatórios, domínio de ferramentas digitais, confecção do
roteiro do evento, produção do script, domínio de técnicas de
atendimento e telefonema, manuseio correto de instrumentos
eletrônicos, pagamento e controle de despesas, domínio dos
princípios de ordem de precedência, cerimonial e protocolo,
conhecimento das legislações específicas referentes à
organização de eventos, controle e gestão de questões legais
por trás da organização de eventos, harmonização de cores,
princípios básicos de decoração, domínio de cálculos básicos
de matemática e conhecimentos básicos de layout e
disposição de espaços.
Habilidades atitudinais: proatividade, saber lidar com
situações intensas, trabalhar sobre pressão, otimização dos
recursos, pensar estratégias de economia, automotivação,
buscar os melhores preços, ser crítico perante as
possibilidades encontradas referentes aos serviços de

50
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

alimentação, decoração, brindes e convites, saber as


tendências do mercado e adaptar à realidade do cliente,
indicar serviços, angariar fundos e administrar conflitos.
Habilidades relacionais: negociação, interação empática, ter
empatia para com as dificuldades dos integrantes da equipe,
senso de coletivo, liderança, trabalhar com a diversidade,
trabalhar em equipe, articular parcerias, buscar patrocínios,
comunicar sem violência, dividir as tarefas de acordo com as
aptidões dos membros da equipe, administrar conflitos
coletivos, trabalhar a autonomia da equipe, orientar, monitorar
e supervisionar o grupo, respeitar as diferenças do próximo,
sem preconceito de nenhuma vertente, atender a todos de
modo igualitário, adaptar o atendimento de acordo com as
necessidades da pessoa que está demandando, evitar
desgastes desnecessários e administrar a rotina de modo
geral da equipe.
Perceba o tanto de habilidades que são trabalhadas na
organização de eventos. Existem outras ferramentas que
conseguem abarcar boa parte das habilidades que eu listei,
todavia não de modo tão amplo e completo, além de que
muitas das práticas profissionais do secretariado, mesmo
atendendo à necessidade de terceiros, são realizadas de
modo solitário, por exemplo: a redação de um ofício que foi
demandado por alguém, mas tem seu fazimento realizado por
uma única pessoa. No arquivamento comumente é assim, na
organização da agenda e na confecção de cartas oficiais,
todos envolvem pessoas, mas o fazimento se dá de modo
isolado. E é nesse gargalo que a organização de eventos
entra como ferramenta de excelência, uma vez que consegue
trabalhar tanto habilidades individuais como coletivas, o

51
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

específico e o geral ao mesmo tempo. O docente alcança um


público bem maior e consegue ofertar uma atividade que
permite o desenvolvimento pleno de diversas habilidades.

1.6 Concluindo sem finalizar

Os processos formativos têm sido tema de debate em


diversas áreas do conhecimento, não se privando somente ao
campo da didática e das práticas de ensino. Isso se dá devido
às demandas específicas dos cursos de formação. O
secretariado, não obstante, também apresenta demandas
específicas.

Ao pensarmos que estamos ofertando uma formação


globalizada na era da hiperespecialização (MORIN, 2006), já
que a formação em secretariado permite a atuação em
qualquer empresa com demandas administrativas, os desafios
apresentam-se ainda maiores, já que os processos formativos
precisam garantir o desenvolvimento de habilidades e
competências específicas da assessoria administrativa como
trabalhar a criticidade do profissional para que ele seja capaz
de adaptar as suas atividades às demandas das
organizações, respeitando os perfis da empresa e da área,
bem como evitando a violação de direitos e processos de
violência no âmbito de sua atuação.

Isso é o que chamamos de formação interdisciplinar e crítica,


em que o caráter formativo vai além da formação técnica,
abrangendo assim outras demandas sociais e humanas
(MACHADO, 1989; FRIGOTTO, 2012; FRIGOTTO;

52
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CIAVATTA, 2012). Formação riquíssima que pode ser, e


vemos como uma necessidade urgente, ofertada nos cursos
de secretariado.

O objetivo de refletir sobre a formação secretarial, pelo olhar


interdisciplinar e politécnico foi cumprido neste capítulo, ainda
que algumas ideias para pesquisas futuras tenham surgido no
processo de construção dele.

Para fins de registro, sugerem-se estudos mais aprofundados


sobre como tem se dado a formação em secretariado no
Brasil nas instituições formais de ensino, se há ou não a
presença e/ou previsão do desenvolvimento politécnico em
seus documentos básicos e em suas práticas diárias. Ainda se
apresenta como importante maior fortalecimento dos debates
e pesquisas relacionados à formação secretarial, já que é na
formação e pela formação que o sujeito torna-se um
profissional de secretariado.

Os desafios da formação em secretariado são grandes, sendo


essa uma realidade. Trabalhar com possíveis perfis de
atuação exige da instituição de ensino e do corpo docente um
deslocar de olhar para perceber que não há uma atuação de
maior complexidade ou com mais prestígio no secretariado. O
que percebemos são diferenças salariais, entre os benefícios
recebidos e institucionais. Fora isso, temos profissionais de
secretariado prestando serviços de assessoria administrativa
a um/a executivo/a ou a um setor. Sendo assim, é
fundamental que trabalhemos os aspectos listados nas
normativas que orientam a formação em secretariado e que
não hierarquizemos as possibilidades de atuação. Ao

53
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

fazermos isso, o estudante terá um rico espaço fecundo para


se encontrar no secretariado, não somente, sem excluí-la da
lista de possibilidades, na assessoria executiva formal de alta
performance.

O secretariado no Brasil tem procurado se estabelecer


enquanto campo do conhecimento. Assim sendo, que
façamos isso com um olhar humano, inovador, disruptivo,
encarando a nossa realidade latino-americana, não tentando
se encaixar em caixas que não nos contemplam em nossa
abrangência de atuação e demandas específicas de
formação. Então, se estamos no início, podemos iniciar com
um modelo diferente, que busque não propagar discursos de
violência, de violação de direitos humanos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais, e que dignifique a profissão e
os profissionais que nela se encontram.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CAPÍTULO 2 – OS PILARES EPISTEMOLÓGICOS DO


FAZER SECRETARIAL

Quando conheci o secretariado, em meu primeiro emprego, eu


pensava ser a profissão mais linda do mundo: imagina você
cuidar da agenda de alguém e fazer as coisas acontecerem
no escritório? Fiquei apaixonado pelo trabalho de Graça e
Mônica, as duas secretárias que me inspiraram a escolher a
profissão.

Nos meus 15 anos, decidi que faria graduação em


secretariado. Escolhi ser secretário, não aconteceu por um
acaso. E nele eu me encontrei. Se antes eu pensava que a
profissão era a mais linda, eu passei a ter certeza disso.

O secretariado é meu lar e eu falo isso sempre com muito


orgulho. Escolhi secretariar e, ao fazer isso, escolhi também
servir e ajudar o próximo, um servir de excelência, elaborado
e repleto de cuidado, zelo e profissionalismo.

Ainda vivemos em uma era onde muita gente não entende


essa profissão e, por vezes, menosprezam o fazer secretarial
ou minimizando o efeito da ação dele. O desafio diário é
superar essa tensão e mostrar ao mundo o quão excelente
somos e, assim, lutar pela legitimação da excelência
secretarial.

58
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

2.1 Sobre a reflexão da prática secretarial

Começo este tópico levantando dois grandes pontos que


precisam fazer parte do nosso discurso quando falamos de
um senso crítico epistemológico em secretariado.

Primeiro, a excelência do secretariado não está ligada ao fato


de ser ou não uma ciência. Tivemos alguns teóricos tentando
escrever sobre uma ciência secretarial, esses não obtiveram
tanto sucesso, nem tanto apoio. Penso que a profissão vai
além, utilizamos constantemente saberes e conhecimentos de
outras áreas no nosso fazimento diário. Materializamos a
interdisciplinaridade e a articulação intencional e estratégica
de ciências específicas.

A heterogeneidade dos perfis das empresas faz com que


umas exijam determinadas habilidades de seus colaboradores
enquanto outras demandam algumas mais específicas. Cada
empresa acaba se tornando um mundo específico, logo
algumas funções são desempenhadas peculiarmente,
dificultando assim a catalogação e a padronização de algumas
atividades e exercícios. Conhecer outras áreas e buscar nelas
formas de se fazer algo de modo otimizado, é ir além do que
está posto e do que lhe é pedido. A interdisciplinaridade faz
parte do DNA do secretariado, a formação desse profissional
é permeada por ela, não conseguimos fugir disso. Não
necessitamos de ser uma ciência para sermos excelentes,
quando se tem um modelo de ciência tão excludente,
como o visto na atualidade, eurocêntrico e fragmentado,

59
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

onde a superespecialização direciona para a ignorância


do todo.

O segundo ponto é que não é porque não somos uma ciência


que não vamos refletir de modo sistemático e elaborado a
nossa atuação. Estamos hoje nas Ciências Sociais Aplicadas,
quando falamos do curso de bacharelado, e no eixo Gestão e
Negócios, quando falamos do curso superior de tecnologia.
Estar nesses grupos nos permite fazermos várias reflexões e
entendermos o porquê de algumas questões bem específicas.

O secretariado é uma área de atuação dentro das ciências


sociais aplicadas, como citado, logo seu cerne está nas
relações sociais. Ele surge de pessoas, para pessoas,
com foco na manutenção, transformação e/ou reinvenção
de serviços que beneficiam pessoas. O secretariado é um
fenômeno social, é importante ressaltar. Não obstante, ele
também é aplicado. Essa aplicação não é vazia de teoria,
mas pode ser vazia de reflexão, caso a/o profissional não
tenha uma formação que lhe direcione para isso.

No primeiro capítulo, afirmo que o fazer secretarial precisa ser


articulado ao processo de reflexão, isso é básico para uma
atuação consciente. É um ciclo contínuo: ação-reflexão-ação.
Ajo, reflito os resultados dessa ação, o modo como ela foi
desenvolvida e aplicada, visito as teorias que conversam com
ela, questiono-as de modo que consiga aplicar à realidade que
vivo e, posteriormente, reinvento-a ou a mantenho. É
necessário pensar em um fazer aplicado e teorizado, uma
ação teorizada (teorizAÇÃO), uma teoria da ação. Tivemos
algumas tentativas de construção de uma teoria da ação

60
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

secretarial, essas não obtiveram muito êxito. Refletindo sobre


isso, cheguei à hipótese de que tais debates não fluíram e não
obtiveram êxito, por questões de aplicabilidade. Reitero que o
secretariado é uma área de atuação nas ciências sociais
APLICADAS. Não há motivos para ignorar isso, a teoria
necessita de estar relacionada à aplicação.

Não distante disso, o secretariado também faz parte do eixo


de Gestão e Negócios. Logo, nossa formação necessita de
conversar com esse pilar articulado aos pilares das Ciências
Sociais Aplicadas.

A/o profissional de secretariado é sujeito integrante, em


alguns momentos protagonista, do processo de
negociação e gerenciamento empresarial. Por meio da
atuação estratégica e intencionalizada, ela/e consegue
direcionar esforços para a obtenção de resultados favoráveis
e maximizados para a organização. Gerenciar e negociar não
são funções exclusivas das executivas e dos executivos, uma
vez que ambas as ações podem ser materializadas formal ou
informalmente no escritório por outros sujeitos, um exemplo
claro disso é o exercício da liderança desempenhado pela/o
profissional de secretariado. Lideramos equipes, mesmo que
pequenas, e nos lideramos para o alcance de metas
previamente delimitadas. Essa liderança é a materialização da
gestão no fazer secretarial, como aponta Marcela Brito, em
seu texto Mudança de paradigma: novos pilares para o
Secretariado.

Partindo desses dois pressupostos, podemos seguir então a


nossa reflexão.

61
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

2.2 Um resumo sobre a atuação em secretariado

Penso que seja importante começarmos pelo "O QUE NÃO É


O SECRETARIADO":

• Não é uma formação para servir café;


• Não é uma formação estritamente técnica;
• Não é uma área de atuação somente para mulheres;
• Não está relacionado a favores sexuais;
• Não é sobre ser amante do chefe;
• Não se limita à assessoria de grandes empresários;
• Não é só glamour, poder e glória;
• Não é uma área em que qualquer um pode atuar sem
formação específica;
• Não é uma atuação simples, prática, direta, sem pré-
requisitos;
• Não é um dom e nem intuitivo;
• Não é ser a segunda esposa, nem o mordomo do
chefe.

Agora podemos ir para “O QUE É O SECRETARIADO”.


Inicialmente, é uma profissão, tem Lei de Regulamentação,
registro profissional e Código de Ética. Em 1985, o
secretariado teve sua Lei de Regulamentação sancionada, a
7.377. Por meio dela, passou-se a ser obrigatório o registro
para atuação profissional como secretária/o, para ter o registro
é obrigatório ter formação, logo temos uma sequência: quero
ser secretário - preciso do registro - preciso de formação.

62
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

É uma atuação complexa, que envolve o desenvolvimento de


habilidades técnicas (práticas relacionadas ao fazer, saber
fazer bem), habilidades relacionais (aquelas ligadas ao modo
como eu me relaciono com as pessoas, interajo com elas e
comigo mesmo) e habilidades atitudinais (é sobre o
desenvolvimento de uma postura mais profissional, proativa,
adaptável, flexível e humanizada).

É uma profissão que tem um campo de atuação muito amplo,


podendo o profissional de secretariado atuar em qualquer
empresa que tenha serviços administrativos, sendo nomeado
como secretária/o, assistente administrativa/o, assessor/a
especial, assessor/a de presidência, técnica/o
administrativa/o, auxiliar administrativo, técnica/o de assuntos
educacionais, executive assistant... A nomenclatura muda,
mas o cerne da atuação continua.

Preciso dizer que o secretariado é mais complexo que


qualquer serviço administrativo técnico, mas que nem sempre
será pelo nome que distinguiremos um do outro, mas pelo
perfil da vaga e do campo de atuação previsto para ela. Veja
bem, se temos uma vaga para secretária/o que apresenta um
perfil estritamente técnico, ela pode ser exercida por nós; se
temos uma vaga para auxiliar administrativo que apresenta
uma demanda de um profissional técnico, mas que saiba se
relacionar e cuidar da gestão do tempo do escritório e da
chefia imediata, além de manter a gestão da informação e da
rotina cotidiana do setor, provavelmente é uma vaga para
profissionais de secretariado, mas que pela falta de
conhecimento de quem está contratando, a nomenclatura
passa a ser outra.

63
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

É uma área de atuação altamente profissional. Somos


preparadas/os para atuar como secretárias/os. A conta é
simples: desenvolvemos habilidades para atuarmos
profissionalmente, logo fugimos do mito de que secretariar é
um dom. Ouso dizer que todo mundo tem perfil para ser
secretária/o, começando pelo interesse em querer ajudar o
próximo, algo comum para nós, seres sociáveis e humanos. A
diferença de uma pessoa que ajuda o próximo e o profissional
de secretariado está nas habilidades técnicas, atitudinais e
relacionais que esse segundo tem e desenvolveu através de
formação específica (curso técnico ou superior). Olha a
sequência de novo: gosto de ajudar o próximo - não sou
secretária/o. Gosto de ajudar o próximo - tenho formação -
desenvolvi habilidades específicas - sou secretária/o.

É uma atuação profissional que pode prestar serviços


particulares, como a organização da agenda pessoal da
chefia, cuidar das contas da casa, do escritório e das escolas
dos filhos da/o demandante, organizar eventos sociais, como
churrasco, casamentos e festas de aniversário. Tudo isso será
feito com um nível de excelência que só a/o profissional de
secretariado poderá garantir. Veja bem: podemos atuar com
prestação de serviços pessoais, isso não se refere ao
caráter profissional do secretariado, mas às
possibilidades de atuação. Um economista não deixa de ser
economista quando presta consultoria para uma pessoa física
com foco na organização financeira pessoal dela, ele continua
sendo um profissional altamente qualificado, mas que atua
também na prestação de serviços particulares.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

É uma atuação altamente qualificada. Hoje temos cursos


técnicos, superiores e de pós-graduação. Existe o Técnico em
Secretariado (com duração de um ano a um ano e meio), o
Tecnólogo em Secretariado (de dois a três anos), o
Bacharelado em Secretariado Executivo (de três a cinco
anos), que pode ser bilíngue ou trilíngue, e Especializações
em Secretariado e Assessoria Executiva (de seis meses a um
ano e meio).

É uma profissão assexuada, podendo ser exercida por


homens e mulheres. Não é dom, não é um puxadinho do
serviço doméstico, nem do materno e matrimonial. É uma
profissão que trabalha com desenvolvimento de
habilidades, logo qualquer um pode fazer a formação em
secretariado e desenvolver o perfil secretarial.

É uma profissão com bons salários, variando de R$2.000,00


até R$20.000,00 reais, a depender da vaga, da organização,
das atividades e do perfil demandado.

É uma profissão que trabalha com o pensar, com a estratégia,


com a inovação e a criatividade (nos relacionamentos e nas
rotinas). É dinâmica, todo dia é uma novidade, mesmo
executando rotineiramente as mesmas atividades. Seus
profissionais são formados com um perfil flexível, responsável
e competente. Se em algum momento você foi atendido por
um profissional que não tinha esse perfil, provavelmente ele
não tinha formação em secretariado.

65
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

2.3 Uma análise crítica das técnicas secretariais

Para o fazer secretarial acontecer nas organizações, técnicas


são adotadas pela/o profissional de secretariado, essas nós
chamamos de técnicas secretariais. É importante que as
pensemos de um modo mais amplo do que alguns teóricos as
colocam.

Técnicas secretariais não são rotinas administrativas, o que


não impede da primeira utilizar a segunda, isso é
extremamente comum. Rotinas administrativas são atividades
e ações desenvolvidas nas organizações de modo a contribuir
para o bom funcionamento administrativo da empresa. O
atendimento telefônico, a recepção, o arquivamento, a
redação de documentos oficiais, o recebimento de
correspondências e a organização de reuniões são exemplos
de rotinas administrativas. As técnicas secretariais são
atividades e ações intencionais e estratégicas, que podem
utilizar de rotinas administrativas ou não, com foco na
obtenção de resultados específicos e manutenção do
bem-estar organizacional. Elas são constituídas de uma
tríade fundamental de habilidades que direciona para a
competência geral da/o profissional de secretariado:
habilidades técnicas, habilidades atitudinais e habilidades
relacionais.

Nas habilidades técnicas, podemos encontrar algumas rotinas


administrativas, tais como: atendimento telefônico, redação de
documentos oficiais, organização de reuniões, de eventos e
de arquivos, recepção, organização de viagens, dentre outras.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Nas habilidades atitudinais encontraremos a automotivação, a


proatividade, o senso crítico, o poder de adaptação, a
autorregulação, a autogestão, o equilíbrio emocional, dentre
outras. No que se refere às habilidades relacionais, podemos
dizer que fazem parte desse grupo a comunicação não
violenta, a mediação de conflitos, a escuta empática, a
liderança, o senso de equipe, o senso de colaboração e de
cooperação, dentre outras.

As habilidades técnicas estão ligadas ao fazimento da


coisa, a parte prática, a mão na massa, com foco em
resultados objetivos, elas são a aplicação no exercício
secretarial. As atitudinais estão estritamente ligadas às
técnicas, elas funcionam como ferramentas motivadoras e
impulsionadoras do organismo para que a ação seja feita
o melhor possível, elas motivam a ação, dão-lhe sentido.
Não distante das demais, as relacionais direcionam para
um movimento de entendimento da importância e
valorização do outro para e no meu exercício profissional,
elas estão ligadas às questões sociais do exercício
profissional.

Elas formam uma tríade, onde há uma articulação contínua e


constante, uma complementa a outra e todas coexistem em
uma mesma atuação. Essa interlocução de habilidades é o
que chamo de técnicas secretariais.

Para ilustrar melhor, gostaria de recorrer a um exemplo: foi-


me demandado que eu organizasse um evento (voltemos ao
exemplo do evento). Para isso, precisarei conhecer algumas
questões técnicas, como ordem de precedência, construção

67
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

de convites, locação de espaços, organização de layout,


construção de orçamentos, construção de checklist, dentre
outras. Todavia, nesses processos precisarei dominar outras
habilidades para conseguir aperfeiçoar esse fazimento,
precisarei saber sobre negociação para conseguir os
melhores preços, terei que saber liderar a equipe que vai me
ajudar nesse processo, preciso saber me comunicar com
diferentes públicos, resolver problemas e conflitos que
possam surgir no meio do caminho, pensar estrategicamente
a todo o momento e me autogerir. As habilidades técnicas por
si só não bastam, elas vão precisar da ajuda das atitudinais e
relacionais.

As rotinas administrativas são práticas que qualquer um, com


um curso básico de formação administrativa, pode
desempenhar, as técnicas secretariais não. Seguindo um
modelo, qualquer um faz um ofício, por exemplo, mas para
dominar as técnicas secretariais é preciso de formação,
ampla, complexa, elaborada e interdisciplinar. Um bom auxiliar
administrativo não será um/a profissional de secretariado, mas
um/a profissional de secretariado será um bom auxiliar
administrativo, quando for preciso. Limitar as técnicas
secretariais às rotinas administrativas é um erro
gravíssimo e demonstra, por parte de alguns teóricos, o
despreparo para o entendimento filosófico e mais amplo
do exercício secretarial.

As técnicas secretariais são o sangue da profissão, elas estão


em todas as partes no fazimento desse profissional, dão vida
à profissão e permitem a sua existência e manutenção.
Compreendê-las em sua origem, composição e prática é de

68
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

fundamental importância para a compreensão do secretariado


como área de conhecimento de nível técnico e superior.
Existimos porque aplicamos e fazemos isso de modo único,
nossa formação direciona para essa unicidade. Não podemos
relativizar isso. Ao tempo em que aplicamos, refletimos,
construímos estratégias, transformamos e/ou quebramos
paradigmas e construímos novos rumos, em um processo
constante de consciência e criticidade.

2.4 Uma análise crítica da competência assessorial

Somos profissionais de excelência. Ao colocar isso, afirmo


que temos uma formação excelente que permeia diversas
áreas do conhecimento e nos permite a visão do todo
organizacional. Em uma era de hiper fragmentação do
conhecimento, conseguimos atuar amplamente e estratégico,
isso porque nossa formação nos permite tal perfil. Talvez você
tenha ouvido alguém questionar, ou até mesmo questionado,
sobre o porquê de determinado conteúdo ser trabalhado no
curso de secretariado. Nem sempre conseguimos ver sentido
de imediato em conteúdos que ainda não aplicamos ou não
percebemos a sua aplicação no nosso fazer diário, mas com o
passar do tempo nós entendemos e conseguimos explorá-lo
para obter resultados positivos e otimizados no local onde
trabalhamos.

Esses conteúdos, que passarei a chamar de conhecimentos,


são a base do processo de desenvolvimento de habilidades e
competência pela/o profissional de secretariado.

69
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

A nossa formação não só permite uma maior compreensão do


mundo, mas o desenvolvimento de funções cognitivas
avançadas (habilidades específicas que não dominávamos
antes de nossa formação). Não saímos da faculdade com
vários conhecimentos acumulados, saímos com
conhecimentos articulados que se materializam no
exercício da profissão, através de habilidades em ação.

As habilidades são conhecimentos articulados.


Conhecimentos aprendidos, construídos e ressignificados.
Ressignificamos quando pegamos conhecimentos de outras
áreas, muitas vezes com aplicação elaborada, e trazemos
para a nossa realidade profissional, agregando novos sentidos
para ele. Um exemplo disso é o arquivamento de documentos:
na arquivologia há todo um processo sistematizado de
arquivamento, na nossa ação buscamos compreender essa
sistematização de modo a encontrar alternativas mais simples
e diretas que nos ajudem a manter e conservar as
informações do setor e da empresa onde trabalhamos.
Pegamos algo elaboradíssimo e simplificamos de modo a
atender às nossas necessidades diárias. Vale dizer que não
estou afirmando que descaracterizamos o fazer complexo de
outras áreas, mas que aplicamos essa ação de modo
estratégico às nossas necessidades, não desmerecendo
quem aplica com rigor, mas ressignificando-o para atender
demandas específicas.

As nossas habilidades são compostas por conhecimentos.


Para melhor elucidar essa afirmação, proponho um exemplo:
uma de nossas habilidades é a organização da agenda, para
fazer isso precisamos deter de alguns conhecimentos básicos,

70
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

tais como: saber ler, escrever, interpretar textos, saber se


comunicar, entender a diferença dos compromissos e tarefas,
e saber elencá-los na agenda de acordo com a urgência e
prioridade, saber gerir o tempo seu e da/o executiva/o e por aí
vai. O agendar é a articulação de todos esses
conhecimentos com foco em uma ação de excelência.

No item 2.3 deste livro, comento sobre as principais


habilidades que dominamos no nosso dia a dia. Elas são
habilidades técnicas, atitudinais e relacionais.

As habilidades técnicas estão ligadas ao fazimento da coisa, a


parte prática, a mão na massa, com foco em resultados
objetivos, elas são a aplicação no exercício secretarial. As
atitudinais estão estritamente ligadas às técnicas, elas
funcionam como ferramentas motivadoras do organismo para
que a ação seja feita o melhor possível, elas motivam a ação,
dão-lhe sentido. Não distante das demais, as relacionais
direcionam para um movimento de entendimento da
importância e valorização do outro para e no meu exercício
profissional, elas estão ligadas às questões sociais do
exercício profissional.

Essas habilidades articuladas compõem as técnicas


secretariais e, ao mesmo tempo, agregam-nos a capacidade
de sermos competentes como assessoras executivas e
assessores executivos.

Temos aí uma nova questão importante: a competência


relacionada ao ser assessor/a executivo/a. Acácia Kuenzer
(2002, p. 11) é bem direta ao nos propor que:

71
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

a competência é a capacidade de agir, em


situações previstas e não previstas, com rapidez
e eficiência, articulando conhecimentos tácitos e
científicos a experiências de vida e laborais
vivenciadas ao longo das histórias de vida. ...
vinculada à idéia de solucionar problemas,
mobilizando conhecimentos de forma
transdisciplinar a comportamentos e habilidades
psicofísicas, e transferindo-os para novas
situações; supõe, portanto, a capacidade de
atuar mobilizando conhecimentos.

Mobilizamos conhecimentos específicos para atender certas


demandas que nos exigem habilidades específicas, de modo
que com isso conseguimos afirmar e/ou reafirmar a nossa
competência como assessoras/es executivas/os. A
competência é algo maior, o ser e o fazer amplamente. A
fragmentação dessa competência em domínios menores que
auxiliam na manutenção dela é o que chamamos de
habilidades. Essas habilidades só existem devido à
articulação de conhecimentos.

Sei ler, domino os cálculos básicos, consigo me comunicar


com os outros, compreendo a necessidade organizacional
daquele momento, conheço a visão da minha empresa e as
limitações dela. Com base nesses conhecimentos articulados
desenvolvo as habilidades de negociação e liderança, da
comunicação não violenta, da otimização de recursos e do
atendimento específico de demandas direcionadas. Essas
habilidades em ação me permitem ser um bom organizador de
eventos, por exemplo. Esse é só um exemplo, não limitante,
para tentar aplicar melhor a ideia de conhecimentos,
habilidades e competência.

72
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Para desenvolver habilidades específicas e formar


assessoras/es executivas/os competentes, é importante que a
instituição formadora se atente para a articulação de
conhecimentos, contextualizando-os ao fazimento da
profissão. O conteúdo não deve ser apresentado
fragmentadamente, ele precisa ter sentido na ação
profissional. Precisamos lembrar que fazemos parte das
Ciências Sociais Aplicadas, logo a aplicação deve ser uma
constante em nossa formação. Uma aplicação reflexiva.

Por falar em formação, temos hoje uma das formações mais


completas nas ciências sociais aplicadas, podemos atuar
como assessores em qualquer empresa, de qualquer ramo. A
assessoria vai ter um esqueleto comum em todas as
empresas, podem até exigir uma formação específica ao nível
de pós-graduação, mas o esqueleto temos e dominamos.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CAPÍTULO 3 - TEMAS TRANSVERSAIS EM


SECRETARIADO

Dia e noite tenho tentado tirar uma parte do meu tempo para
estudar sobre diversos assuntos, como atualidades,
economia, docência, direitos humanos, análise do discurso,
secretariado ou coisas aleatórias. Como professor e
pesquisador, preciso me manter atualizado sobre as temáticas
relacionadas aos meus escritos.
Vivo nas leituras transversais, nelas eu me entendo,
compreendo-me e construo os textos que irão me ajudar a
entender meu mundo.

3.1 Ensaio sobre a nomenclatura da profissão

Escrever sobre nós é um grande desafio. Primeiro, exige um


cuidado para não fantasiar demais aquilo que se vive, e
segundo nos exige uma postura verdadeira com nós mesmos,
enfrentar nossas questões e visitar temas que evitamos tocar.
Não é uma tarefa fácil. Aliás, visitar nossa formação e atuação
profissional é encarar isso tudo também.

Nestes últimos tempos, em que tenho me dedicado a refletir


sobre o secretariado, tenho me permitido questionar muitas
coisas e assim tentar entender melhor esse fenômeno
chamado “exercício secretarial”. Temos algumas ideias
postuladas: somos uma área de excelência; temos uma
formação interdisciplinar e multifuncional; somos únicas/os em
nossa atuação; temos à nossa disposição uma série de
76
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

conhecimentos de outras áreas, científicas ou não, que


conseguimos utilizá-los assertivamente em nosso exercício
diário; e, além disso, somos adaptáveis, humanos e
estratégicos. Isso tudo forma a/o profissional de secretariado.

Mas, ao mesmo tempo em que sabemos disso tudo e


conseguimos exercer diversas funções, encontramos
várias/os profissionais desempregadas/os, vemos muitas
vagas de emprego para secretária (nunca vi vaga para
secretário, todavia vejo várias para secretário/a executivo/a),
onde não exige formação específica, temos ainda vários
discursos preconceituosos acerca da profissão, ainda é
possível ver falas sexistas e machistas direcionadas ao
secretariado. Não obstante, quando conseguimos ser
inseridos no mercado, dificilmente conseguiremos ter um
plano de carreira ou promoção que nos permita chegar à
gerência ou à diretoria da empresa, ocupando esses cargos e
não sendo a/o secretária/o desses/as executivos/as.

3.1.1 Uma análise histórica da nomenclatura


“secretária/o”

Nossa profissão está permeada de paradigmas e


preconceitos, muitos deles estão diretamente ligados às
questões históricas. Quero relembrar, por exemplo, que
quando os homens foram para a guerra (primeira e segunda
guerras mundiais), as mulheres tiveram que assumir postos
de trabalho para sustentar a casa. Nesse período, as

77
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

mulheres entram no secretariado. Elas exerciam as mesmas


funções, ganhando bem menos do que os homens,
considerando uma série de aspectos, dos quais posso citar a
questão da formação profissional. No início do século XX,
ainda era muito restrito o acesso à educação profissional para
mulheres, era quase inexistente. Vivíamos uma era em que a
mulher era encarada como uma matriz genitora, onde seu
papel fundamental era ser mãe e esposa exclusivamente. As
que iam contra isso eram vistas como subversivas e/ou, até
mesmo, bruxas5. Logo, a formação feminina era voltada para
ser mãe e esposa, ponto. Há então uma quebra de
paradigmas com a guerra, todavia as mulheres que foram
atuar nas empresas, em sua grande parte, não tinham
formação além da básica, quando muito. Logo, empresários
espertos se sentiram no direito de pagar menos. Oras, faltava
“formação”, havia uma demanda alta, poucas vagas, logo
baixos salários seriam aceitos sem problema algum. Além
disso, no campo secretarial é percebido um movimento de
atrelar os interesses empresariais com as habilidades
domésticas das profissionais que estavam entrando no
mercado, como o cuidado com a limpeza da sala, com as
coisas pessoais do chefe, o fazer e servir o café, dentre
outros. Isso fez com que a profissão ganhasse novas
roupagens.

Tentemos construir uma lógica da atuação secretarial no


decorrer dos anos: temos os escribas como os primeiros
secretários, eram profissionais altamente qualificados que
andavam com reis e autoridades; depois com a criação das
5 Veja mais sobre isso no livro “Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e
acumulação primitiva”, de Silvia Federici.

78
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

organizações, tivemos a atuação profissional de assessores


executivos, profissionais com formação ampla e abrangente;
com as guerras mundiais, entram as mulheres na profissão,
sem formação, mas com necessidades diretas e imediatas
que direcionam para uma atuação adaptável; e, atualmente,
temos as/os profissionais de secretariado que são altamente
qualificadas/os.

Preciso dizer que o problema das mulheres entrarem na


profissão, com pouca formação profissional, é extremamente
social. Há uma construção entre o ser mulher e o ser homem.
É fato que os homens tiveram acesso à educação, logo
tinham mais preparo para algumas questões. As mulheres
entram com força no mercado de trabalho e na conquista de
direitos lá para meados da segunda metade do século XX.

Vejam bem, tivemos uma “ruptura” na formação profissional


do secretariado. Havia uma linearidade na atuação de
profissionais qualificados, em um momento entram várias
profissionais que não tinham formação para tal, que se
formaram enquanto faziam a coisa acontecer. Hoje, voltamos
para a excelência na formação e atuação.

Qual o motivo, então, de ainda vivenciarmos tantos


preconceitos e não conseguirmos estabelecer um senso
comum de que a/o profissional de secretariado é
extremamente excelente e que não só serve mais café?

79
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

3.1.2 Uma análise técnica e semiótica da nomenclatura


“secretária/o”

O termo secretária/o tem origem no latim e remete ao secreto,


guardar o segredo e dizer conselho privado. Esse significado
epistemológico do termo condiz com a realidade, a/o
profissional de secretariado guarda segredos e trabalha com
questões sigilosas. Não paramos nisso!

No Dicionário Online de Português, quando procuramos o


significado da palavra assessoria, vemos os seguintes
resultados:

Assessoramento; grupo de indivíduos


especializados, instituição, empresa ou
departamento que assessora, presta auxílio a
pessoas físicas ou jurídicas.
Órgão ou grupo de pessoas responsáveis por
assessorar, por oferecer um serviço
especializado, a um chefe.
Empresa, instituição ou entidade especializada
que pesquisa e fornece dados, informações,
sobre um assunto determinado.

Secretariar não é assessorar, pelo menos para os


empregadores. Esses termos não são sinônimos. Os salários
não são os mesmos, nem as funções, além disso, os
paradigmas envolvendo essas atuações são diferentes.

O termo assessoria foi unido ao secretariado quando se


percebeu que a atuação do assessor exige competências e
habilidades que estão presentes na formação do profissional
de secretariado executivo. Não sei quem fez primeiro essa

80
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

ligação, não encontrei vestígios históricos que indicassem a


origem, por sinal, temos poucos registros históricos de nossa
atuação antes do início da segunda metade do século XX.

Faça um teste rápido com dois conhecidos que não conhecem


de modo mais amplo o secretariado, pergunte quem é o
profissional de secretariado e quem é o profissional das
assessorias. Dificilmente articularão os dois. Fiz esse teste
com algumas pessoas, de perfis distintos, e percebi que
quando falavam do secretariado empregavam funções mais
operacionais e técnicas (“o que atende o telefone, recebe as
pessoas, organiza a sala…”), quando falavam do assessor
diziam que esse dominava funções mais gerenciais (“orienta
pessoas, resolve problemas, conflitos…”).

Qual é o senso comum da grande maioria da população


acerca do secretariado? Essa resposta eu não tenho, mas o
que posso dizer é que minha amostragem não sinalizou
grandes possibilidades de atuação para esse profissional. Não
há uma construção social significante para esse termo que
usamos, secretariado, que direciona para uma visão
estritamente positiva, é como se tivéssemos que provar
constantemente que somos bons, quando temos uma
formação que nos torna excelentes.

Os termos “secretariado” e “secretária” estão impregnados de


sentido que nem sempre são positivos e coesos com o que
somos. Desde a regulamentação da profissão, em 1985, e a
criação do Código de Ética, é feito um trabalho nacional de
orientação acerca da profissão, todavia alguns paradigmas
persistem. Poderíamos dizer que atuamos em uma profissão

81
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

nova e ainda temos algumas barreiras a vencer, mas existem


profissões regulamentadas depois do secretariado e que não
dispõem de tantos paradigmas negativos, por exemplo, a
Assistência Social, profissão regulamentada em 1993. São
profissões distintas, mas que contam com um significado
social construído sobre o seu ser significante que direciona
para o entendimento, ao nível de senso comum, da profissão.

Precisamos falar sobre significado e palavra. Os Estóicos, por


exemplo, comentam que a palavra é composta por som,
objeto e uma “entidade que é significada”, que é verdadeira ou
não, com base nos interesses sociais. Essa entidade
significada é toda a construção social por trás do termo que é
adotado (a diferença entre borboleta e barata, ambos sendo
insetos, uma achamos linda e outra indesejável, é construída
com base em um senso comum do belo). Santo Agostinho,
em seu texto Sobre a Dialéctica, afirma que a palavra é o
signo de algo, de modo que o receptor consiga entender a
mensagem. Esse signo não é vazio, ele é impregnado de
sentido, ao transmiti-lo a outra pessoa, transmitimos as
nossas leituras de mundo em relação a ele. Tzvetan Todorov,
um dos maiores filósofos e linguistas do mundo, em seu livro
Teorias do Símbolo, é enfático ao afirmar que as palavras são
dotadas de sentidos e significados que lhe são atribuídos com
o decorrer da história humana. As palavras conseguem
manter significados positivos ou negativos, dependendo da
intencionalidade do locutor e da forma como são utilizadas.

“Secretariado” e “secretária” são termos construídos


historicamente que estão impregnados de sentidos, em
grande parte minimizantes, excludentes, preconceituosos,

82
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

enviesados, pejorativos e simplórios. Para verificar melhor


essa minha afirmação, fiz uma pesquisa de vagas para
“secretária/o executiva/o” e para “assessor/a executivo/a”,
disponibilizadas no período de fevereiro a abril de 20186, nos
sites Emprego DF, Sine DF, Catho, LinkedIn, Indeed e BNE. A
pesquisa foi interessante para perceber algumas questões:
para o assessor é esperado atitudes e habilidades mais
gerenciais, relacionais e emocionais, e o domínio de rotinas
administrativas; para o profissional de secretariado, é
esperada (quase 90% das 23 vagas encontradas) uma
formação técnica, boa parte das vagas não exige formação
específica (em torno de 40%), outras pedem somente o
ensino médio (35%), salários baixos, ao contrário do assessor
executivo, e algumas vagas com exigências do tipo “fazer a
limpeza do escritório” e “cuidar da agenda pessoal do
executivo”. Nessa minha pesquisa, procurei vagas para
secretário e secretário executivo.

Veja abaixo as atribuições de uma vaga, encontrada na


pesquisa, para assessor executivo, disponibilizada pelo site
BNE:

Apoiar o presidente, priorizar demandas e


pendências; gerir a agenda, acompanhar e
assessorar o presidente em reuniões, realizando
a ata e acompanhando das pendências;
acompanhar e assessorar em eventos diversos
nos quais ele representa a entidade; preparar a
logística de viagens envolvendo a presidência,
solicitando veículos, adiantamento de despesas,
passagens aéreas, hospedagem e o que mais for

6
Foram localizadas 13 vagas para assessor/a executivo/a e 23 vagas para
secretária/o executiva/o.

83
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

necessário; receber notas fiscais e elaborar


relatório de despesas do presidente; garantir o
arquivo físico e digital de documentos da
presidência; prospecção de parceiros para
plataforma; prospecção de patrocinadores;
desenvolvimento de apresentações e projetos;
planejamento e desenvolvimento do relatório de
gestão; desenvolvimento de material de
divulgação.

Você também se viu contemplada/o nessa atuação? Sua


formação também considerou esses conteúdos? Bem, somos
formados para sermos assessores executivos, mas sofremos
dia e noite por alguns paradigmas por trás dos termos
“secretária” e “secretário”. Percebe-se que a atuação de um
secretário acaba sendo mais limitada que a de um assessor.
Isso é um absurdo imenso, chega a ser desumano: ter uma
pessoa preparada para algo, sendo subutilizado e/ou
subjugado devido aos preconceitos enraizados em uma
nomenclatura. Precisamos fazer algo acerca disso7.

3.1.3 Um convite à reflexão

Temos pernas e força para desconstruirmos todo o arcabouço


significativo por trás dos termos “secretária” e “secretário”?
Não seria mais assertivo mudarmos a nomenclatura da
profissão para “assessor” e “assessora”, uma vez que tais
termos conseguem nos representar de modo mais coeso e

7Esse é o momento do texto em que você espera, ou não, uma sugestão


minha do que fazer. Infelizmente, temos mais dúvidas do que respostas.

84
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

consciente, além de não estarem viciados com alguns


paradigmas negativos?

Se a atuação do assessor e da assessora, ambos executivos,


exige formação de nível superior (verificado nas vagas
encontradas) e habilidades relacionais, atitudinais e
emocionais articuladas com as rotinas administrativas
(articulação que chamo de técnicas secretariais, algo próprio
de nossa atuação profissional), não seríamos nós assessores
executivos?

Se somos assessores executivos, não seria interessante


adequarmos às normativas e formações para esse termo, ao
invés de gastarmos esforços na desconstrução, não
alcançada geralmente, de paradigmas que insistem em
permanecer, mesmo na era da informação?

Várias perguntas que me inquietam e tiram o sono.


Precisamos refletir sobre isso, urgentemente.

Temos uma construção social por trás dessas nomenclaturas


e o mercado faz bem essa distinção, como pude perceber.
Além disso, ainda temos sérios e graves problemas com
certas exigências em algumas vagas, o preconceito ao nível
de senso comum que para ser secretária/o não é necessária
formação, que a secretária é amante do chefe e que serve
café. São questões reais, boa parcela da sociedade ainda
alimenta esses discursos. Precisamos mudar isso, repito, seja
continuarmos lutando para a quebra de paradigmas ou
buscarmos nomenclaturas que nos contemplam e que não
têm seus significados enviesados socialmente.

85
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

3.1.4 Para fins de registro: nomenclaturas possíveis

Para fins de registro, caso pensemos na mudança de


nomenclatura como uma possibilidade, apresento algumas
sugestões de nomes para a formação e ocupação:
• Curso Superior de Tecnologia em Assessoria
Executiva;
• Curso de Bacharelado em Assessoria Executiva
(Bilíngue ou Trilíngue);
• Curso Técnico em Assessoria;
• Técnica/o em assessoria;
• Bacharel/a em assessoria executiva (bilíngue ou
trilíngue);
• Tecnóloga/o em assessoria executiva;
• Assessor/a executivo/a.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

3.2 Ensaio sobre as questões de gênero no secretariado

Durante muito tempo, escolhemos não tocar em algumas


questões polêmicas ligadas ao nosso exercício profissional.
Penso que isso seja uma questão histórica, talvez até cultural:
evitamos, como sociedade brasileira, falar da época de
escravidão no Brasil; não nos sentimos confortáveis ao
discorrer sobre o genocídio da população indígena, bem como
da juventude negra das periferias que morrem diariamente;
falar sobre ditadura “é pesado demais”, logo evitamos
também. O machismo, a misoginia e o sexismo são pautas
que ainda teimamos em não tocar. São assuntos que
incomodam porque não conseguimos conceber que cenários
de violência existiram e mataram muitos. Existiram e não
podemos mudar o passado, podemos mudar o futuro,
mantendo a consciência histórica, sem ignorar o que
aconteceu e a sua influência na sociedade que temos hoje.
Pensar em secretariado é pensar em uma profissão exercida
majoritariamente por mulheres. Temos visto hoje um
movimento forte de inserção do sexo masculino na profissão,
todavia ainda não há um equilíbrio desses números. O que
isso representa para nós diretamente?
Representa que não podemos ignorar o machismo e o
sexismo presentes em nossa sociedade que influenciam,
diretamente, na construção e manutenção de alguns
paradigmas destinados à profissão. Falar de feminismo no
secretariado é buscar as mesmas oportunidades para homens
e mulheres, salários dignos para ambos, lutar pela quebra de
paradigmas negativos e pela equidade de gênero. O fato de
eu conhecer cerca de cinco profissionais de secretariado do

87
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

sexo masculino e todos ocuparem cargos de gestão


(conseguiram promoções em seus trabalhos) e conhecer
muitas secretárias que não tiveram a mesma oportunidade, é
sintomático. A amostragem é pequena, mas é significativa.
Das secretárias mulheres que conheço, muitas dezenas,
somente uma ocupa um cargo de gestão. Como que as outras
também não conseguem? A resposta é simples: ainda se
mantém o discurso de que mulheres não têm estabilidade
emocional para ocuparem um cargo de gestão.
O sexo feminino foi visto durante muito tempo como inferior,
propriedade, a calda, a parceira, a coadjuvante, a passiva, a
secundária, a sem direitos e não mais que isso. Somente no
fim do século XIX e início do século XX é que vamos perceber
um movimento maior na luta pelos direitos das mulheres.
Você pode conceber que até 1962 as mulheres só podiam
trabalhar se o marido autorizasse? É o que constava no
Código Civil Brasileiro de 1916. “Também até bem pouco
tempo não era considerado juridicamente possível que
houvesse estupro entre cônjuges e assassinato por honra era
algo aceitável”, como afirma Marcela Tosi8.

Quando estas começaram a trabalhar, eram em empregos


onde o servir estava mais aflorado: passadeiras, domésticas,
faxineiras, cozinheiras, cuidadoras e, posteriormente,
professoras, enfermeiras e secretárias. Existe uma série de
textos que relatam o que pontuo, listei alguns nas referências.
Isso se deu pelo fato das mulheres não terem acesso à

8TOSI, Marcela. Direitos da mulher: avanços e retrocessos na legislação


e políticas públicas. Disponível em: http://www.politize.com.br/direitos-da-
mulher-avancos-e-retrocessos/

88
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

educação profissional nos séculos passados, logo o que


dominavam era o serviço doméstico, o que as aproximou a
esses exercícios profissionais.

Em relação ao secretariado, é importante levantarmos as


atividades que exercíamos no início do século passado:
atendimento telefônico (nas empresas que tinham), recepção,
organização de reuniões e da agenda do executivo,
organização do escritório e sim, servir o café se fosse
necessário. Para esse exercício profissional não era cobrada
formação específica, mas sim boa vontade de aprender e
desenvoltura. Com o passar dos anos, as coisas mudaram e
hoje temos a/o profissional de secretariado dominando muitas
outras habilidades, desenvolvidas nos cursos específicos de
formação.

Veja bem, somente em 1932 as mulheres passaram a ter


direito ao voto no nosso país (na Arábia Saudita, somente em
2015) e até 1981 as mulheres não podiam jogar futebol no
Brasil e vamos ter a nossa primeira senadora somente em
1990, a senhora Júnia Marise. Seria ilusão acharmos que tudo
mudou. Além disso, vale dizer que o primeiro curso de
secretariado só foi criado no Brasil em 1969, na Universidade
Federal da Bahia, de modo a garantir a profissionalização das
práticas dessas profissionais.

Se muitas piadas de mau gosto ainda são lançadas é devido


ao machismo e ao sexismo presentes em nossa sociedade,
não à falta de conhecimento de quem as profere. Machismo é
aquela relação de poder em que a mulher é inferiorizada, vista
como menos em relação ao homem, em que direitos iguais

89
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

para ambos são negados. Sexismo é quando imponho o que é


ser homem e o que é ser mulher, detalhes e parâmetros que
distinguem os grupos, além de criar limites e barreiras entre
eles. Se hoje temos uma profissão que não é tão atrativa para
o sexo masculino, todavia se esse opta por ela, consegue
promoções mais rápidas, e que não há uma valorização do
trabalho desenvolvido pelas secretárias, isso está diretamente
ligado ao machismo.

Diversos direitos foram conquistados pelas lutas feministas


nos últimos tempos, todavia existem outros básicos que ainda
precisam amadurecer, como, por exemplo, o respeito ao corpo
feminino, o respeito à moral da mulher e a inviolabilidade do
espaço dela. Já ouvi diversos relatos de amigas que foram
assediadas em seus trabalhos. Não podemos acreditar que
isso se deve porque elas não tomam uma postura profissional
no trabalho, mas problematizar essas práticas, sem velá-las,
para não cairmos no erro de auxiliar na manutenção delas
junto às relações sociais e profissionais.

Gostaria de comentar um exemplo de como o machismo está


internalizado em nossos discursos. No Congresso
Internacional de Secretariado, realizado em São Paulo, em
2017, um colega secretário falou em plenária que “não
estamos aqui para tomar o trabalho de vocês, mas para
ajudar”. Essa fala não foi postulada com um tom impositivo,
pelo contrário, veio em um tom manso de respeito e de oferta
de ajuda. Pergunto: as secretárias precisam mesmo dessa
ajuda? Uma secretária não é tão boa quanto um secretário?
Se a profissão sobreviveu ao século passado e conseguiu
vários avanços não foram devido à luta dessas secretárias?

90
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Quem foi que lutou pela lei de regulamentação? Pelo Código


de Ética? Elas precisam mesmo de ajuda? Suponho que não.
O secretariado precisa de pessoas juntas para ajudar no seu
fortalecimento e na quebra de paradigmas, ponto.

Não proponho neste livro um feminismo secretarial, o que


também não o anula, o que proponho é que não ignoremos
essas questões quando formos falar da profissão, flexionar o
gênero em nossas falas e representar o secretariado. Não
somos só secretárias, como também não somos só os
profissionais de secretariado, somos as e os profissionais de
secretariado9.

Concluindo sem finalizar, proponho que busquemos a


equidade e igualdade de gênero em nossa sociedade e no
secretariado. Somos mais secretárias que secretários,
listemos assim. Não há porque flexionar o gênero para o
masculino, de modo que homens se sintam incluídos, e deixar
a representação nominal não ser coerente com a realidade
profissional. Flexionamos para ambos, quando formos falar
deles/as precisamos representar os dois, não só um, assim
evitamos esquecer um ou exaltar outro.

9
Coloco o “as” antes, pois é o que representa a maioria. É bem simples:
tem um auditório cheio de mulheres e dois homens, cumprimente com boa
tarde a todas e a todos, assim represento o grupo, sem ignorar as
especificidades dele.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

3.3 Ensaio sobre o preconceito secretarial

No capítulo 2, comento sobre a complexidade da prática


secretarial. A não compreensão dessa complexidade permite
que profissionais encarem muitas de suas atividades como
sendo intuitivas e/ou óbvias, mesmo sendo altamente
complexas, construídas com base no domínio de conteúdos
específicos trabalhados na formação profissional em
secretariado.

Junto a isso, a não compreensão influencia o profissional de


secretariado a julgar e a hierarquizar os seus colegas com
base somente nos salários, benefícios e importância da/o
executivo que atendem, não pelo viés da complexidade da
atividade, afinal nem todos a compreendem.

Surge aí o preconceito secretarial. Ele se estabelece nas


relações entre as/os profissionais de secretariado e está
relacionado à construção violenta, hierarquizante,
limitante e preconceituosa da leitura da prática do outro
profissional, baseando-se somente pela métrica
monetária. No preconceito secretarial, a/o secretária/o é
julgada/o pelo tamanho da empresa em que atua, pela
importância da/o executiva/o que assessora e nos valores do
salário e dos benefícios recebidos. O fator prática é anulado, a
complexidade do fazer secretarial é minimizada e, com isso,
relações identitárias profissionais existem somente com os
pares imediatos estabelecidos pela métrica monetária.

Percebemos o quanto o preconceito secretarial é violento


quando profissionais que atuam na alta gestão julgam

92
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

profissionais que atuam em pequenas e micro empresas,


alegando que eles não desenvolvem atividades significativas.
“Nem está registrado como secretário executivo”, dizem. Ao
mesmo tempo, não questionam a/o profissional que está
atuando como secretária/o com a nomenclatura de Business
Partner, ganhando quatro vezes o piso salarial da profissão.

Em que medida o profissional que atua em um pequeno


escritório de advocacia tem uma prática menos
significativa e complexa em relação à do profissional que
atua na assessoria de alta gestão em uma multinacional?

Enquanto em grandes empresas temos setores e atividades


bem definidos, com um organograma bem estabelecido; em
pequenas empresas, por vezes, o profissional de secretariado
desenvolve atividades no âmbito da Gestão de Pessoas,
Gestão de Materiais, Controle Financeiro, Criação e apoio no
controle de propagandas de Marketing, Fechamento e
controle de parcerias, Supervisão e liderança de equipes,
dentre outras atividades.

A questão então é: quem realmente desenvolve atividades


mais complexas? A resposta é simples: ambos profissionais
desenvolvem atividades complexas. O desafio é analisarmos
crítica e profundamente nossas práticas para percebermos os
fenômenos que estão por trás delas.

Provavelmente, o profissional de secretariado que atua em um


pequeno escritório não consegue perceber que tem atuado no
âmbito da Gestão de Pessoas quando contrata o auxiliar de
serviços gerais, supervisiona o trabalho da copeira, do

93
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

motorista, faz o controle da presença desse pessoal e cria um


fluxo de informações para enviar ao escritório contábil para
que o pagamento deles seja liberado, por exemplo. E o
grande problema está na ideia de que essas práticas são
desafios específicos, um erro, uma vez que o que soa como
desafio é, na realidade, uma das competências que
desenvolvemos no âmbito de nossas formações. Ora, não
tivemos disciplinas de Gestão de Pessoas, de Contabilidade e
de Psicologia Organizacional?

Necessitamos de voltar às nossas formações para


conseguirmos reconhecer a sua completude. Reconhecendo
isso, conseguiremos estabelecer melhores relações com
nossos colegas de profissão, sem relações violentas, exclusão
social e preconceito secretarial.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CAPÍTULO 4 - PARA UM ATIVISMO SECRETARIAL

ATIVISMO SECRETARIAL: ação crítica e reflexiva da/o


profissional consciente que se percebe enquanto sujeito ativo
na defesa da profissão de secretariado e estabelece uma
relação contínua com os demais profissionais da área, em
uma rede humanitária e solidária de troca de experiências e
auxílio mútuo.

ATIVISTA SECRETARIAL: profissional consciente e ativo na


defesa da profissão de secretariado, que estabelece uma
relação contínua com os demais profissionais da área, em
uma rede humanitária e solidária de troca de experiências e
auxílio mútuo.

4.1 Os desafios da reflexão

Pensar o secretariado é pensar nos desafios diários que


enfrentamos para conseguirmos desenvolver nossas
atividades e nos estabelecermos no ambiente corporativo.

Não dá para romantizar a profissão e pensar que tudo


depende somente da/o profissional de secretariado ou da/o
executiva/o. Existe uma série de relações e construções
sociais que permeiam a prática na profissão. O desafio, então,
a quem busca compreender crítica e profundamente os
fenômenos secretariais, é se permitir debruçar sobre teorias
construídas em outras áreas do conhecimento para conseguir
embasar as suas análises e, com isso, construir uma teoria
aplicada à e em relação à prática.

98
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Para elucidar o que apresento no parágrafo acima, pensemos:

• Ao trabalharmos as relações de assédio à secretária,


na prática secretarial, é preciso estudar sobre
machismo, feminismo, misoginia, divisão de gênero no
trabalho e teorias sociais relacionadas ao estudo de
gênero;
• Ao analisarmos os preconceitos relacionados ao
“servir”, necessitamos de estudar sobre antropologia,
escravidão no contexto brasileiro, semiótica, análise do
discurso, divisão social do trabalho, formação para o
trabalho, dentre outros temas relacionados à história do
Brasil e como a escravidão influenciou no nosso modo
de olhar as profissões;
• Ao refletirmos acerca da desigualdade salarial, do
“jeitinho brasileiro” em contratar o profissional com
outra nomenclatura para poder pagar menos,
necessitamos de ler sobre cultura, ética, moral, análise
do discurso crítica, sociologia do trabalho, dentre
outros;
• Para estudarmos sobre o que é ser “secretária/o” no
senso comum, é preciso saber sobre a história
brasileira, machismo, misoginia, divisão social do
trabalho, semiótica, análise do discurso crítica,
sociologia do trabalho, dentre outros.

Para se construir teoria real necessitamos de entendimento de


causa e compreensão dos processos que permeiam a prática.
Essa compreensão, quando divulgada e utilizada pelos

99
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

profissionais da área, funciona como uma estratégia de


superação da alienação no sujeito, quando esse é
“programado” para desenvolver determinada atividade e não
consegue mudar seu modo de fazer, pois só aprendeu um
único modelo de se fazer aquilo, sem criticidade, sem
questionamentos. A compreensão crítica permite que você
estabeleça novas, criativas e inovadoras formas de ação,
quando necessário; junto a isso, permite refletir e questionar
relações de violência e violação de direitos no trabalho.

Veja bem: é pensar na prática e o que influencia a realização


dela, as relações que estão por trás e os desafios que se
postulam. Para isso, é preciso LEITURA e ESTUDO, dos
textos básicos e manuais construídos para profissionais de
secretariado e textos de outras áreas relacionados à
compreensão dos fenômenos sociais no mundo do trabalho,
afinal somos uma área das Ciências Sociais Aplicadas.

Atualmente, temos profissionais de secretariado que estão no


auge do sucesso profissional, que encontram sentido em sua
prática, com bons postos e excelentes salários e benefícios,
eu fico tão feliz em conhecer tanta gente que está neste lugar.
Esses profissionais, comumente, praticam o processo de
autoconhecimento e estão em postos que conversam com os
seus perfis, a maior parcela deles atua na assessoria
executiva direta, formação “padrão” realizada nos cursos
superiores de secretariado ao redor do Brasil.

Todavia, essa não é uma realidade para uma imensa parcela


de profissionais que diariamente não consegue ver sentido no
que faz e desiste da profissão ou se submete aos postos de

100
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

trabalho que inferiorizam e minimizam as suas habilidades e


competências. Isso porque não consegue perceber outras
possibilidades de atuação que vão além do “padrão”.

Pensar em uma realidade diferente para os colegas de


profissão que não estão onde se sentem completos ou que
estão desmotivados com a profissão é uma TAREFA
URGENTE para TODOS nós do secretariado: docentes,
sindicatos, comitês, federação e profissionais. Necessitamos
nos unir para construirmos uma consciência secretarial que
valorize o sujeito e incentive-o a ser o melhor de si, não o que
idealizam dele.

Necessitamos, urgentemente, falar de identidades


10
secretariais e estudarmos sobre elas . As/os estudantes e
profissionais desmotivados precisam conhecer as diversas
possibilidades de atuação no secretariado, para que assim
consigam estabelecer trajetórias mais humanas na profissão,
em que eles trabalhem as suas potencialidades sem se
limitarem à assessoria executiva de alta gestão, por exemplo.

Repito o que já disse: a profissão não vai acabar. Existem


vários textos meus e de outros escritores, profissionais e
pesquisadores dizendo o mesmo. Estaremos sempre nas
organizações. Se isso é uma realidade, nosso desafio não é
mais pensarmos em como manter a profissão viva, mas como
10
No decorrer dos últimos anos, vários estudos foram realizados sobre
campos específicos de atuação da/o profissional de secretariado. Eles
podem ser acessados na Biblioteca Secretarial, espaço desenvolvido por
mim com o objetivo de agrupar trabalhos da área em pastas temáticas
para facilitar a consulta, disponível em
http://www.jeffersonsampaio.com/p/biblioteca-secretarial.html

101
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

manter os profissionais de secretariado com saúde e vivos. O


desafio que temos lançado para o novo século, acentuado
pelo isolamento social influenciado pela pandemia da COVID-
19, é o de pensarmos nas práticas profissionais com um olhar
mais humano, sustentável e respeitoso. Não há mais espaço
para o mero tecnicismo na era da globalização, logo não há
mais lógica em termos um arcabouço teórico meramente
técnico, composto somente por manuais. Precisamos de mais,
muito mais, está o meu convite para você que me lê: seja um
ativista secretarial, pense no próximo que faz parte da mesma
profissão que você, pois, juntos somos mais fortes.

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

CAPÍTULO FINAL - AGENDA URGENTÍSSIMA DE


TRABALHO

Chegamos ao fim de 2020 e, em meio a tantos desafios,


precisamos reunir forças para conseguirmos pensar
estrategicamente as nossas ações para o futuro. O
planejamento é um dos primeiros passos para delimitarmos
uma linha de ação e, com isso, estabelecermos novos rumos
para nossas realidades, tanto no âmbito profissional como no
pessoal.

Para os profissionais de secretariado, planejar é, ou deveria


ser, um hábito, já que temos uma formação que nos permite o
desenvolvimento de habilidades relacionadas ao planejar,
organizar e gerir as nossas rotinas, carreiras e projetos.

Enquanto categoria, temos demandas urgentes, ouso dizer


urgentíssimas. Em 2020, vimos a tecnologia digital dominar
nossas práticas com mais força do que em outros anos;
tivemos que nos adaptar ao trabalho remoto e estabelecer
uma rotina profissional em nossos lares; e, como em outros
anos, vimos cursos de secretariado serem extintos.

No dia 29 de dezembro de 2020, tirei a manhã para pesquisar


quantos cursos de secretariado temos ativos, em extinção e
extintos no Brasil. A consulta foi feita no Cadastro Nacional de
Cursos e Instituições de Educação Superior – Cadastro e-
MEC, do Ministério da Educação. Temos os seguintes
resultados:

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Primeiro Momento

• 132 cursos ativos:


o 24 em Instituições de Ensino Públicas
o 108 em Instituições de Ensino Privadas
• Autorizados a ofertarem 128.106 vagas:
o 1583 em Instituições de Ensino Públicas
o 126.523 em Instituições de Ensino Privadas
• Informação importante: A Universidade Paulista –
UNIP, está autorizada a oferecer 73.260 vagas

Os dados nos revelam:

As Instituições de Ensino Privadas podem ofertar mais vagas


que as Públicas e tem ativa a maior quantidade de cursos
específicos da área. Veremos, mais à frente, na tabela “Censo
da Educação Superior” quem tem formado mais alunos,
enquanto isso, pensemos em duas questões:

Em que medida as Instituições Públicas, enquanto órgãos


privilegiados e mantidos pelo dinheiro público, têm oferecido
apoio às Instituições Privadas em seus processos formativos e
manutenção dos cursos ativos, uma vez que não pode sanar
toda a demanda de formação existente no âmbito do
secretariado? Em que medida ocorre o intercâmbio de
informações motivado pelas próprias Instituições Públicas?

107
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Segundo Momento

• 58 cursos em processo de extinção:


o Estavam autorizados a ofertarem 6568 vagas
• Algumas das instituições que extinguiram o curso de
secretariado:
o Centro Universitário FACEX – Começou a ofertar
em maio de 1981
o Centro Universitário Newton Paiva – Começou a
ofertar em agosto de 1981 (EXTINTO)
o Pontifícia Universidade Católica do Paraná –
Começou a ofertar em fevereiro de 1984
o Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
Começou a ofertar em maio de 1984
o Universidade do Vale do Rio dos Sinos –
Começou a ofertar em agosto de 1984
o Centro Universitário Sagrado Coração –
Começou a ofertar em fevereiro de 1987

Os dados nos revelam:

Cursos antigos, fundados antes da promulgação da Lei de


Regulamentação da Profissão, nº 7.377/1985, estão fechando
as portas. Para sabermos os reais motivos, é preciso
pesquisa. Enquanto não temos os reais motivos, levantamos
hipóteses do que pode ter ocorrido: a diminuição da demanda;
a falta de interesse da instituição em continuar ofertando o
curso; o baixo retorno financeiro dado pelo curso em
comparação aos das áreas da saúde, construção civil e
tecnologias; dentre outros.

108
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

São 6568 vagas que não são mais oferecidas. Isso impacta
diretamente no mercado, que passa a receber menos
profissionais com formação específica das Instituições de
Ensino, o que pode causar uma série de questões
problemáticas a médio e longo prazo para o secretariado: a
extinção das instituições de representação de classe, por falta
de adesão; a extinção dos eventos específicos da área; a
dificuldade do mercado em preencher vagas com profissionais
qualificados, deslocando o pré-requisito somente para a
experiência profissional; dentre outros.

109
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Terceiro Momento

Para refletirmos de modo mais elaborado, precisaremos


recorrer a mais dados, contudo, agora do Censo da Educação
Superior, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, de 2018 e
2019, relacionados aos cursos de secretariado:

Os dados nos revelam:

As Instituições Privadas têm ofertado o maior quantitativo de


vagas para cursos de graduação em secretariado, ainda
assim são as Públicas com mais inscritos. Com a
consolidação do Sistema de Seleção Unificada – SISU, como
mecanismo de entrada para diversas Instituições Públicas, a
concorrência que antes sofria um recorte regional, hoje passa
a ser nacional: temos candidatos de diversas partes do país
concorrendo a uma mesma vaga. Com base em estudos e
rankings (inter)nacionais que confirmam a qualidade da
Universidade Pública brasileira e com a oferta de cursos em

110
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

períodos que facilitam o trabalhador-aluno trabalhar, a


demanda para essas instituições tende a aumentar, já que
“não custa nada tentar uma vaga em uma Universidade
Pública, mesmo que longe da minha casa”. Aí, precisamos
casar os dados de inscritos com a quantidade de vagas
ofertadas e a quantidade de ingressos.

Em 2018, dos 14.967 candidatos inscritos para as vagas das


Universidades Públicas, somente 1.485 candidatos
ingressaram. Para onde foram os 13.482 candidatos que não
contemplados? Novamente iremos trabalhar com hipóteses:
para outros cursos, já que o sistema os permite escolher mais
de uma opção; para outras instituições públicas, já que o
sistema também permite isso; para instituições privadas,
possivelmente com bolsas de desconto; para outros cursos
em instituições privadas, com a mensalidade mais barata. O
que não falta é hipótese.

É fundamental entendermos que a Universidade Pública


dispõe de uma série de limitações. Primeiro, a estrutura física
nos impede muitas vezes de ofertarmos mais vagas.
Segundo, pode até ser que a Universidade tenha a estrutura,
mas o corpo docente? Para contratação é preciso concurso, o
que envolve um altíssimo investimento, e justificativa em
número de que é preciso mais docentes para aquela área.
Terceiro, entra a divisão de carga horária docente, o professor
universitário precisa desenvolver pesquisa, extensão e ensino,
o que dificulta a abertura de novas vagas. No serviço público
nem todo querer é poder.

111
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Quem tem oferecido mais profissionais formados para o


mundo do trabalho são as Instituições Privadas. Isso demanda
de nós, profissionais formados, um cuidado especial com
essas instituições, oferecendo apoio para manter os cursos
ativos. Enquanto no âmbito público o sistema traz o candidato
(não se assuste ao ouvir, em uma sala de Universidade
Pública, alunos dizerem que estão fazendo o curso por ser o
que dava para conseguir com a nota que tinham e queriam
fazer um curso de graduação em uma Instituição Pública,
independentemente de qual fosse), para as Instituições
Privadas, esse processo de conseguir aluno é extremamente
complicado, pois, está diretamente ligado à demanda.

A questão então passa a ser: como fazer com que o curso


de secretariado seja atrativo para os jovens de hoje e a
demanda continue existindo, no âmbito público e
privado?

É com base nesses dados e nos questionamentos elencados


que proponho uma agenda urgentíssima de trabalho para
todos os profissionais de secretariado. Divido a agenda em
quatro grandes grupos e para cada apresento demandas
específicas que podem nortear o seu trabalho. O primeiro
grupo é composto pelas Instituições de Ensino Superior,
compreendido aqui pelas instituições públicas e privadas, e
docentes; o segundo pelos Discentes, constituído pelos
alunos dos cursos de secretariado; o terceiro pelas
Representações de Classe, sindicatos, comitês e federação;
e o quarto, não menos importante, os Profissionais,
composto por secretárias e secretários não acadêmicos que

112
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

atuam na assessoria direta e/ou no empreendedorismo e


consultoria aplicados ao secretariado.

Instituições de Ensino Superior

• Ofertar uma educação contextualizada,


emancipatória, libertária, crítica e aplicada;
• Construir cursos com base em uma formação
holística para a excelência e incentivar o
autoconhecimento e as escolhas individuais dos
sujeitos envolvidos no processo formativo;
• Pensar em cursos que tenham o trabalho como
princípio educativo e não como fim “desprendido” do
processo formativo. Somos uma ciência social
aplicada, e eu não preciso de uma instituição
certificadora confirmando isso, o mercado confirma.
Onde está a grande massa dos profissionais
formados em secretariado? Reflita sobre isso;
• Projetar cursos com base em uma formação
humana, para o século XXI e para o letramento
digital;
• Estabelecer matrizes tecnológicas, que permitam o
pleno letramento digital do estudante;
• Possibilitar espaços de debates e de
compartilhamento de poder com foco no
desenvolvimento da criticidade e autonomia dos
discentes;
• Incentivar as representações estudantis, para
compartilhamento do poder decisório;

113
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

• Para as Instituições Públicas: oferecer apoio às


Instituições Privadas no processo de reformulação
de seus cursos. Prestar apoio também nos eventos
profissionais realizados por essas instituições.
Estabelecer elos de comunicação e intercâmbio
entre os alunos e os docentes. Respeitar as
limitações das instituições privadas e buscar janelas
e possibilidades de apoio e contribuição para a
formação profissional desses alunos; e
• Para os docentes: estabelecer elos de comunicação
direta com profissionais que atuam na assessoria
direta e/ou no empreendedorismo e consultoria
aplicados ao secretariado, sem nenhum tipo de
hierarquia, mas na perspectiva de troca de
informações e apoio mútuo. Atualizar-se acerca do
mercado, com base no intercâmbio entre academia
e mundo profissional e participação em eventos
profissionais, onde são apresentadas as novas
demandas do mundo do trabalho. Não encarar os
profissionais de secretariado como meros sujeitos
de pesquisa.

Discentes

• Articular parcerias com profissionais atuantes no


mercado, no sentido de conseguir compreender a
prática profissional e assim refletir sobre ela;
• Buscar áreas de atuação de maior interesse e tentar
pensar em uma trajetória profissional que lhe
permita chegar até elas;

114
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

• Conhecer-se e construir um plano de carreira com


base em suas aptidões e interesses pessoais;
• Participar dos processos decisórios do curso e da
categoria;
• Reivindicar espaço nos processos decisórios da
instituição de ensino na qual realiza seus estudos; e
• Sinalizar à Federação Nacional das Secretárias e
Secretários – FENASSEC, arbitrariedades
cometidas por docentes com formação em
secretariado, que vão contra o Código de Ética da
Profissão, na instituição em que estuda.

Representações de Classe

• Refletir com pesquisadores da área e IES a base da


profissão, os paradigmas negativos por trás da
profissão e como se sustentam, a articulação entre
teoria e prática na formação profissional e as
demandas atuais para o profissional de
secretariado;
• Criar um plano de ação exequível, plausível,
cauteloso, com metas e prazos bem estabelecidos
com base nos dados obtidos;
• Continuar na reivindicação de direitos para a
categoria e zelar pela dignificação da profissão; e
• Construir, em parceria com profissionais e discentes
uma nova realidade para o secretariado, de modo a
legitimar a excelência que a profissão detém.

115
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Profissionais

• Divulgar os pontos positivos e boas práticas ligadas


à profissão;
• Manter uma postura coerente com o Código de
Ética Profissional;
• Evitar atitudes que desmereça a profissão;
• Evitar a reprodução de paradigmas negativos;
• Zelar pela formação continuada e o aprimoramento
constante;
• Ser positivo em seus pronunciamentos,
incentivando estagiários e colegas de empresa a
fazerem o curso de secretariado;
• Participar de Representações de Classe, de modo a
incentivar e apoiar os coletivos que te ajudam na
luta por melhores condições de trabalho e
dignificação da profissão; e
• Auxiliar as IES e Representações de Classe na luta
pela legitimação da excelência do secretariado.

Temos muito a fazer e, penso eu que, precisamos ter uma


base bem consolidada para começarmos a pensar nos
próximos passos. O risco de acabarem os cursos de
graduação em secretariado nas instituições privadas de
ensino é latente e, com isso, perdermos mercado. Se ficarem
somente as instituições públicas, dificilmente manteremos
uma profissão com 704 formados por ano. O momento
demanda união e trabalho de base, repito. Precisamos fazer
primeiro o básico que é nos manter vivos nas instituições de
ensino e nas organizações.

116
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Reitero que a profissão não acabará, mas quais rumos ela


tomará? Estamos preparados para revisitar a nossa Lei de
Regulamentação e abrir a possibilidade de profissionais com
outras formações poderem solicitar o registro profissional de
secretário executivo, já que a demanda permanecerá?

Sabemos que no mercado existem organizações que têm


contratado profissionais para a assessoria executiva não pela
formação, mas pela competência, em especial as
multinacionais que regem seus processos de contratação nas
normativas do país de origem.

Permanecendo somente as Instituições de Ensino Públicas,


não alterando a Lei de Regulamentação, elas estariam
preparadas, por exemplo, para a certificação e validação do
conhecimento de profissionais que prestam assessoria
executiva, mas não têm formação específica para a obtenção
do registro profissional? Sobre isso, a Lei nº 11.892, de 29 de
dezembro de 2008, que institui a Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, e cria os Institutos
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, sinaliza em seu
Art. 2º que tais Institutos exercerão o papel de instituições
acreditadoras e certificadoras de competências profissionais.
Quais Institutos Federais já fazem o processo de acreditação
e certificação de profissionais que prestam assessoria
executiva?

Continuando o debate sobre a certificação e validação de


competências, ainda temos a Portaria Interministerial nº

117
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

1.08211, de 20 de novembro de 2009, que dispõe sobre a


criação da Rede Nacional de Certificação Profissional e
Formação Inicial e Continuada – Rede CERTIFIC, um
programa do Ministério da Educação (MEC) e do Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE). Quais Universidades aderiram ao
programa? Quais cursos de secretariado de Instituições de
Ensino Públicas participam dele?

Parece-me, e falo como docente de uma Instituição de Ensino


Pública, que estamos mais focados nas publicações que
pontuam e preenchem nossos currículos lattes do que com a
profissão como um todo.

Para novas práticas dentro das Instituições de Ensino


Superior

Assim como o fazer científico é subjetivo, refiro-me às ciências


humanas e sociais, e, por meio dos instrumentos e citações
específicas, conseguimos confirmar nossas hipóteses e
ideias, sei que a presente reflexão é passível de
questionamentos e contra-argumentações. Será!

Aos docentes e acadêmicos, espero que este texto te


desloque, em especial, no modo como fazemos a formação
em secretariado em nossas Instituições de Ensino.

Aos estudantes, não se calem, reivindiquem o direito a uma


formação aplicada e politécnica, unam-se e mantenham-se

11 Clique aqui para acessar a Portaria.

118
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

em constante diálogo com profissionais de secretariado que


atuam no mundo do trabalho.

Aos profissionais de secretariado, não se calem, reivindiquem


o lugar de fala nas Instituições de Ensino, façam valer o dever
que é invocado no nosso Código de Ética, o de contribuir com
a formação de nossas/os estudantes em secretariado,
apresentem a realidade do mercado a eles, percebam-se
como profissionais de excelência, não se vejam menos por
não ter um mestrado ou doutorado, lembrem-se: são vocês
que forjam e mantém postos de trabalho para o secretariado
no seio das organizações.

Convido-os, novamente, a um ativismo secretarial, aquele em


que as práticas, falas e posicionamentos direcionam para a
defesa da profissão em todos os âmbitos sociais.

Formas alternativas de desenvolvimento da criticidade

Existem formas alternativas e diversas que possibilitam o


desenvolvimento do perfil pesquisador e da criticidade no
âmbito da formação profissional.

Não podemos, enquanto docentes em secretariado, em


nenhuma hipótese, transferir para nossos alunos a
responsabilidade pela pesquisa que irá pontuar na nossa
progressão e nos editais internos das Instituições de Ensino
Superior nas quais atuamos.

119
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Necessitamos pensar em alternativas que melhor conversem


com o perfil do nosso alunado e do profissional que o mundo
do trabalho e a sociedade demandam. É urgente e latente a
necessidade de estabelecermos fluxos formativos que não
violentem, alienem e/ou descaracterizem nossos estudantes.

Em várias partes do país, temos visto os altos índices de


evasão nos cursos de secretariado12. Não é só uma questão
de mercado, nem um fenômeno a parte de nós, mas algo
diretamente relacionado às nossas práticas.

Nossos estudantes estão “fugindo” da profissão e dos cursos


de graduação em secretariado, enquanto tapamos os olhos.
Temos, diariamente, formado nossos alunos para uma
realidade utópica e insustentável em Secretariado,
reproduzindo parâmetros de outras áreas que pouco ou nada
conversam com a nossa realidade profissional, partindo
somente das nossas formações e visões limitantes do fazer
ciência.

Transferimos a profissionais de mentoria e coaching a


responsabilidade que é nossa: fazer com que o aluno
identifique a área que melhor se articula ao seu perfil no
secretariado.

12
Leia: CIELO, Ivanete Daga et al. Evasão nos cursos de Secretariado
Executivo no Brasil: uma análise necessária. Revista de Gestão e
Secretariado, [S.l.], v. 11, n. 1, p. 81-105, abr. 2020. ISSN 2178-9010.
Disponível em:
https://revistagesec.emnuvens.com.br/secretariado/article/view/1074

120
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Nossos alunos estão saindo para o mundo do trabalho com


uma visão limitante da atuação profissional, projetando-se
para a assessoria executiva de alta gestão como se essa
fosse a única possibilidade de atuação dignamente aceitável.
Não vos comove a frustração dos nossos egressos? Temos
“construído”, dia e noite, profissionais de secretariado que se
frustrarão com o mercado, pois projetamos uma atuação que
não é e nem tem vagas para todos. Precisamos nos
responsabilizar por isso.

Ainda olhamos para nossos alunos com um olhar julgador e


limitante: “fulano não tem perfil para o secretariado”, “sou
capaz de dizer que aquele ali irá trancar o curso”... Não
valorizamos as peculiaridades e identidades de nossos
estudantes, ao contrário: projetamos um perfil ideal e
queremos que eles se encaixem nele.

Veja, precisamos possibilitar o desenvolvimento dos melhores


secretários dentro de nossas instituições de ensino, mas será
na valorização da identidade do estudante que conseguiremos
pensar em um secretariado com infinitas possibilidades de
atuação, além de garantirmos a permanência e o êxito de
nossos estudantes, formando profissionais mais conscientes,
humanos e realizados.

O desenvolvimento do senso crítico, que invocamos para


nossas/os discentes, falta para boa parcela dos docentes em
secretariado que com muita prepotência anunciam seus
títulos, hierarquizando os grupos como se fossem eles que
estivessem forjando, no seio das organizações, postos de
trabalho. Enquanto não rompermos essa estrutura limitante e

121
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

violenta, teremos mais cursos fechando em todo o território


nacional.

Talvez questionem a minha coerência em criticar a academia


estando nela. Sou docente, acadêmico, mestre e farei um
doutorado e pós-doutorado, primeiro porque me identifico com
isso, segundo porque meu cargo exige de mim títulos e
produções, de mim. Ao tempo que tenho consciência disso,
policio-me constantemente para não transferir aos meus
alunos a responsabilidade que o cargo demanda de mim: a
produção e formação acadêmica. Tenho tentado propiciar
uma formação real em Secretariado, trabalhando as
necessidades do mundo do trabalho e da sociedade, não
limitando meus alunos, mas abrindo janelas em várias
paredes. O cerne da atuação do profissional de secretariado
não está no mundo acadêmico, mas na aplicação nas
organizações, no âmbito da gestão e dos negócios. Esse
cerne é que tem nos mantido vivos por séculos.

Pontos de atenção

• Nossa formação precisa de possibilitar o


desenvolvimento de habilidades e competências para o
exercício profissional e convívio em sociedade;
• No mercado de trabalho, em sua estrondosa maioria,
a/o executiva/o não irá pedir um artigo científico para o
profissional de secretariado sobre uma técnica
secretarial ou prática específica, irá solicitar que faça e

122
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

exigir que domine as práticas secretariais. A formação


deve propiciar o pleno desenvolvimento do estudante
para que domine o fazer secretarial;
• O teor acadêmico da área é forjado para os docentes,
não devemos transferir isso para os nossos estudantes;
• O senso crítico e o perfil pesquisador de nossos
estudantes podem ser desenvolvidos por vias que
favoreçam o pleno desenvolvimento de habilidades e
competências que o possibilitem entrar, permanecer e
ascender no mundo do trabalho. Saber construir um
artigo científico não sobrepõe o saber construir um
projeto ou uma proposta de intervenção, por exemplo,
considerando o teor da aplicação da área;
• A pesquisa e a extensão podem ser realizadas de
formas alternativas, respeitando as peculiaridades da
área e o perfil do egresso estabelecido nas Diretrizes
Curriculares Nacionais para os cursos de graduação
em secretariado. Existem diversos modelos de escrita e
produção textual no âmbito da pesquisa, o artigo
científico é somente um deles;
• Artigos pontuam para nós docentes13, publicações do
mesmo modo, não podemos transferir essa
responsabilidade para nossos alunos com o falso
discurso de que é pelo curso e pela avaliação que ele
terá junto ao MEC. Precisamos assumir que a pesquisa
faz parte da nossa carga horária, recebemos para fazer
isso; além de que no processo de avaliação, mesmo

13E para discentes que desejam seguir os estudos aos níveis de mestrado
e doutorado.

123
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

pontuando para o curso, o desenvolvimento de


pesquisas é analisado docente por docente;
• Pensando em pontuação na avaliação do MEC, outras
formas de produção são aceitas atualmente, de acordo
com o novo instrumento de avaliação de cursos, além
da publicação de artigos em revistas científicas, como,
por exemplo, a organização de eventos, a construção
de projetos específicos, a produção de material e de
documentos institucionais... O Ministério da Educação
reconheceu a diversidade da produção de nós
docentes e integrou às suas avaliações;
• Temos uma formação globalizada, o mercado demanda
dia e noite profissionais de secretariado e isso se dá há
décadas, desde os primórdios da sociedade
formalmente organizada. Enquanto várias profissões
surgem e somem, mantemo-nos vivos nas
organizações. Isso não precisa, necessariamente, ser
validado pela academia. Ouso dizer que o modelo
acadêmico eurocêntrico em vigor pouco comporta o
secretariado: profissão tão ampla, distinta e
diversificada que não cabe em caixas.

“Verdade, uma ilusão”

Sou pesquisador, docente, mestre em direitos humanos e


palestrante, mas antes de tudo isso eu sou secretário
executivo. É no Secretariado que repouso todos os dias.

124
TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

Este capítulo teve como objetivo incomodar você para


pensarmos em alternativas mais integradas, contextualizadas,
humanizadas e que respeitem a diversidade humana no
secretariado, pois a profissão é constituída por humanos, para
humanos e com humanos. Não deixemos isso de lado.

Sobre a agenda acadêmica que muitos docentes vêm


mantendo como a central (criação de um mestrado na área e
a inclusão do secretariado em tabelas específicas de órgãos
reguladores), repito que temos muito a fazer e, penso eu que,
precisamos ter uma base bem consolidada para começarmos
a pensar nos próximos passos. O secretariado chegou até
aqui sem a necessidade de validação da academia, isso é
sintomático, não acha? Precisamos mesmo dessa validação?
Isso nos tornará menos ou mais excelentes do que somos?
Reflitamos!

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NOTA DE ENCERRAMENTO

Você ficou com a sensação de que o presente livro não teve


um fechamento? Este é o objetivo: não finalizar. O debate
precisa de se manter vivo. Precisamos! Necessitamos! Você
faz parte disso, agora cabe escolher: manter-se em paz,
ignorando esse debate, defendendo que a culpa do insucesso
dos outros profissionais é falta de formação e interesse; ou
questionar as formações ofertadas pelas Instituições de
Ensino que dizem, simbólica e discretamente, que um
secretário que trabalha em um escritório odontológico é
inferior ao que atua na assessoria executiva de alta gestão.

Você está preparada/o para deslocar seu olhar e analisar o


secretariado pela ótica humana?

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TEORIA CRÍTICA SECRETARIAL

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SOBRE O AUTOR

Jefferson Sampaio de Moura


contato@jeffersonsampaio.com.br

Professor no Instituto Federal de


Brasília (IFB). Mestre em Direitos
Humanos e Cidadania, especialista
em Docência do Ensino Superior,
graduado em Secretariado
Executivo Bilíngue. Líder do Grupo
de Pesquisa em Gestão,
Assessoria Executiva, Secretariado
e Sociedade (GAEXS), Membro do
Comitê de Secretariado Executivo
do DF (COMSECDF), Secretário-adjunto da Associação
Brasileira de Pesquisa em Secretariado (ABPSEC) e Membro
da Academia Global de Inovação e Secretariado (Pepitas
Secretaries Club). Ministrou oficinas, palestras e cursos para
profissionais de secretariado em diversas instituições
brasileiras, como Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação
e Comunicação (MCTIC); Presidência da República; Ministério
da Educação; e em Universidades públicas e privadas.
Atualmente, escreve sobre a profissão de secretariado para o
site www.jeffersonsampaio.com

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