Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ÍNDICE
A MORTE DO TIRANO
VIDAS PERPENDICULARES
O ASSOMBROSO PESADELO
UM ASSALTO GENIAL
O TRUQUE DE CORNÉLIUS
PREFÁCIO DA EDIÇÃO ESPANHOLA
papel, sem ter que censurar e corrigir tantos conceitos, suspeito que todas
as pessoas suscetíveis vão passar uns maus bocados. E penso que nas mesas
e nos livros, o saudável exercício da crítica; e leva as mãos aos olhos, para
alguém. Ainda que a crítica seja justa e que o seu autor tenha encharcado o
escandalizados.
certos serviços públicos, são poucas as pessoas que resistem a uma crítica e
muitíssimas as que nem sequer resistem a uma criticazinha, nem que seja
importante.
cartas em que vários cavalheiros me injuriavam por ter dado o seu apelido a
crítico.
enfermo gravíssimo.
lentamente no mundo das ideias, mas sem magoar ninguém, que era o que
se pretendia.
E quando um pés-de-chumbo amalucado tirava o chumbo dos pés — um
lápis nesta bela Espanha, vão passar a andar com mais leveza. |Sem tirar os
sapatos, claro, mas tirando para bem longe os bocados de chumbo que não
E durante algum tempo, até que toda a gente se habitue às piruetas que
do seu charco.
suscetibilidades feridas.
Mas terá que passar muito tempo para que se curem de todas as
Poderá dar rédea solta à sua fantasia por planícies mais amplas, sem
Poderá ainda entrar em terrenos que nunca estiveram fechados, mas nos
quais ninguém entrava, não só por causa das moscas, mas também por
Eu, que sou meio louco e impaciente como todos os humoristas, quero
E solto desde já, a rédea do meu humor, para que seja o primeiro a galopar
oferecer-lhe este remédio tão vulgar como eficaz: passar, repetidas vezes,
as unhas das mãos sobre a zona onde sentir a picadela, até que se acalme a
estava nervoso.
Por várias vezes, quando o criado do restaurante passou a seu lado, tirara
os olhos do prato, como para dizer-lhe qualquer coisa. Mas logo, temendo
sem dúvida ser ouvido pelos comensais das mesas vizinhas, se arrependera
sinal ao criado.
Logo que este chegou junto de si, o homem da barba disse um pouco
misteriosamente:
como se fora hábito que indivíduos com barbas lhe manifestassem tal
desejo. Os senhores, que parecem pessoas sensatas a julgar pelo bom gosto
imaginação humana não tem limites e que caibam nela os mais estranhos
muito elegante, de barba, lhe pedisse para fritar uma batata. Contudo,
— Com certeza, cavalheiro. Por favor passe à cozinha por aquela porta
satisfazer aquele curioso desejo, desapareceu pela porta que lhe tinham
indicado.
Se tudo aqui acabasse, nã0 teria merecido a honra de ser relatado por
batata, não é motivo suficiente para distrair o leitor das suas ocupações.
tubérculo fora da série, quer pela forma excecional quer pelas exageradas
dimensões.
Se me permito relatar este caso, é porque ele foi o prólogo de uma série
muito alto. Trazia um impermeável tão sujo e gorduroso que fazia pensar
que a chuva não é formada por gotas de água mas de azeite. O portador de
tão imunda veste, que ocultava os olhos sob umas sobrancelhas hirsutas em
A reação daquele foi idêntica à que teve ao ouvir a mesma pergunta nos
tenha o estranho desejo de fritar uma batata sem que isso seja digno de
inacreditável, é que este raro facto se repita ainda por três vezes! Porque,
com intervalos de poucos minutos, foram chegando três novos indivíduos
duplo sentido.
cozinha e fritar uma batata?»... era afinal uma contra senha. E aqueles
que lhes indicara o criado, não se dirigiam à cozinha mas desciam antes por
uma escadinha até uma adega onde celebravam as suas reuniões secretas.
célula de choque.
preconceitos burgueses.
cor pálida.
fanatismo.
para se aclarar.
canas e as iscas.
concentrar ali um grande número de trutas para que o tirano pesque com
má pontaria. Além disso, estão armados com carabinas tão velhas como
eles.
— Não, disse o da barba. Há tanto tempo que faz o que quer sem lhe
acontecer nada que está cheio de confiança: E bem sabeis que na confiança
está o perigo.
— Do atentado.
— Depois dirigimo-nos para a fronteira cada um por seu lado, como está
França.
cultura histórica.
Revolução Francesa.
— E achas que haverá aqui uma revolução assim? — perguntou o calvo
preocupado.
solteiro,..
— Nem que tivesse dez filhos recém nascidos e oito velhos pais,
quem vai voltar atrás. Mas não gostaria que em vez de conseguirmos a
— Nem eu, olha a graça, — disse o calvo. — Não sou jovem e o que
uma triste sorte que, como dizem os: espanhóis, saíssemos de Málaga para
entrar em Malagon.
— Mas tu acreditas que pode haver uma situação pior do que a que nos
liberdade.
calvo.
Que barbaridade!
jornais. Não digo que aqui vá acontecer o mesmo, mas todos: os dias estala
verdade?
— Será que temos o trabalho e que não vai servir para nada? — juntou o
de cabelos brancos.
— Porque não há de servir? — estranhou o chefe.
certa preocupação:
coligação.
— Pois, e nesse caso, podemos preparar as malas e instalarmo-nos
palavra.
dúvida!
país ao caos.
espírito de libertador.
— Ninguém fala em continuar assim eternamente, — interveio o calvo,
nas veias?
— Pois com certeza, — apoiou o calvo. — Seria uma pena deitar tudo a
fazer as coisas bem feitas, mesmo que o sangue me ferva um pouco, do que
dizer o da barba.
— Um plano pode servir tanto para agora como para daqui a cinco anos,
disse o magricela.
— Estás louco? exclamou o chefe. Achas que vamos adiar o atentado por
cinco anos?
— Quero dizer, justificou-se o magricela, que o tempo não afetará em
todas favoráveis.
de vista. Mas, supondo que adiamos o atentado, o povo não nos perdoaria
asseguro-te que ali ninguém grita. Não digo que no fundo os meus vizinhos
não detestem a tirania tanto como nós, mas aguentam-na bastante bem.
as suas famílias. Isto faz-me supor que embora lhes pese o problema da
magricela.
esperar. E esperarão com muito gosto que nós lhes resolvamos o problema,
desde que lhes demos certas garantias de que não sei produzirá uma
confusão fenomenal.
corpulência.
enfâse solene. Manda-nos lançar já pela janela, que nos lançaremos sem
vacilar.
calvo.
praia?
aos nervos.
interessar-se.
— Todos os anos. Vou na próxima semana com a minha mãe para uma
aluguei junto ao mar, disse o calvo. Faz bem aos miúdos miudar de ares.
não consegui...
Dado que todos estamos de acordo em que é conveniente adiar por algum;
tempo o atentado...
depois do verão.
melhor.
***
O olhar que Susan lançou a seu marido foi glacial. Os seus lábios, que
bem que não fosse capaz de pronunciar uma única palavra, bastava olhá-lo
***
era rubra, nem castanha, nem morena, mas somente acobreada, com
tonalidades verdes. Uns raios de sol que caíam sobre ele, triturados pelos
pelo verdete.
— Enamorei-me de ti antes de te conhecer, confessou a Richard,
cedendo-lhe uma das suas mãos para que a acariciasse entre as suas.
Recordas-te?
'cheguei tinhas subido ao' trampolim mais alto, disposta a saltar. Detive-me
a contemplar-te.
— Se tivesse sabido que estavas a olhar para mim, não teria saltado.
— Era a primeira vez que via executar o «salto de anjo» por uma criatura
verdadeiramente angelical.
— Quando vi que o autor dos aplausos eras tu, fiquei toda corada.
pausa, continuaram triturando raios de sol por cima das suas cabeças.
***
Esta desordem no penteado, que por ser muito negro tinha reflexos
um certo ar de bruxa.
Nunca!
— Por despeito.
— Não entendo.
avermelhado.
chegado a nascer, não serias o seu verdadeiro pai. No meio de tudo isto foi
***
voltando-se a cada dezena de passos para repetir o seu adeus agitando uma
mão.
***
inspiras.
mais minha que tua. Todos os móveis foram comprados pelos meus pais
***
Pela mais famosa destas avenidas, a Quinta, Richard dirigia-se para casa
Para além disso ficava também outra razão de alegria — o êxito amoroso.
Naquele mesmo dia, um velho tio de Richard, que sempre vivera nos
bens.»
Quando o notário explicou que todos os bens do tio eram meia dúzia de
O petróleo que acabava de lhe deixar o seu tio arredondava a fortuna que
estranheza que lhe dirigiu um: homem dum táxi ao ouvi-lo falar sozinho,
***
6,35 da tarde, em Brooklyn.
uma curiosa mescla de cheiro: cheiro a suor dos trabalhadores que tomarão
tinha à sua frente. Depois, por cima do ombro quadriculado, olhou através
da escuridão do túnel que o comboio cruzava. Mas não queria ver nada.
continente americano.
Toda a sua vida, até àquele momento, fora uma sucessão ininterrupta de
deu-se conta que tinha feito maquinalmente o mesmo trajeto que todas as
subir. Era, perto num daqueles arranha-céus que projetavam largas sombras
sobre a cidade.
Foi assim que momentos depois, num ascensor que trepou velozmente
Uma vez ali, abriu a janela para respirar esse ar puro que os seus
ia apagando. Mas Fred, ao chegar à janela, não olhou em frente, mas para
baixo.
trânsito.
***
luz verde, dois crânios destroçados e dois corpos jaziam numa confusão.
metálica.
homem. Tão horrível, que o tremor de todo o meu corpo demorará, com
Sonhei que era noite e que caminhava por uma rua muito larga, por entre
Cheguei por fim ao portão da casa onde vivia com os meus pais e subi ao
piso que ocupávamos. Não mie cruzei com ninguém nem no portão nem na
cobri o rosto até aos olhos. Pela ampla espiral da escada, subia até aos
pai. Uma voz interior, que no pesadelo era ião audível como se eu próprio
urgentemente... Que te importa que seja teu pai?... Ele para ti não significa
que na vida real. Se bem que os murros que me dava não me doessem,
Abriu então muito os olhos enquanto os seus lábios, inchados pelos meus
tornozelo e fazer-me tombar. Logo, com redobrada fúria, caiu sobre mim.
um autómato:
— Tu, canalha!... Tu, canalha!...
tesouras com que fizera saltar a fechadura da gaveta. E tão cego estava
Também fiquei admirado por vê-lo ficar imóvel com tanta rapidez, depois
pescoço até à cintura, parecia uma gravata vermelha pintada sobre a pele.
Quis soltar um grito enorme ao ver o; que havia feito, mas a minha
suas feições. Muito pálida, coberta com a sua larga camisa branca, tinha um
dilacerante.
do que fazia, levantei a mão e deixei-a cair pesadamente sobre uma das
Que alegria senti ao dar conta que tudo fora um espantoso pesadelo! Tão
encostada. E senti nos dedos a agradável frescura autêntica das pedras que
mais compacto.
seus lugares, esperando que a porta se abrisse para surgir alguma notícia do
acontecimento.
coisa do que acontecia por detrás dela e dos seus vidros de cristal,
— Como não?, disse o cliente que devia ser meio «despistado» para não
se dar conta de que alguma coisa de anormal acontecera. Mas ainda faltam
— Porquê?
trabalhavam metodicamente.
digitais.
que a do diretor; mas não se nota porque a pele tem o tom amarelento,
quase esverdeado, dos burocratas que ganham a vida longe do sol. Nota-se,
rosto. O inspetor sentado junto dele, é um homem que impressiona pela sua
assim:
— Vamos, acalme-se, disse o polícia ao caixa. Quer que mande vir outro
copo de água?
intervenções.
11
detalhes.
ideias. Esta manhã na minha seção houve muito pouco movimento. Hão de
ver isso. Nas pequenas sucursais da cidade, como a nossa, a clientela tem
as suas manias. Neste bairro, por exemplo, dá-lhes para não vir às sextas-
doze e cinco porque demoro dez minutos nesta operação. Quando o homem
— Como era?
— Perdão. Era alto e forte. Trazia uma gabardine escura de gola subida e
de violino. Mas sempre pensei que essas coisas fossem fantasias dos
realizadores...
respondeu. Como resposta tirou o chapéu e pô-lo de copa para cima sobre o
guichet, debaixo do meu nariz. O seu comportamento pareceu-me um
impaciência.
— Não: um arco.
— Não, disse o subalterno: um arco dos que se usam para tocar violino.
depois?
— Apanhei um susto, continuou o caixa. Porque o homem de repente,
surpresa.
tocar violino?
pela música. 0 arco daquele violinista, em cada arpejo, formava uma ponte
emoção tão intensa. Não encontro palavras para a exprimir porque sou um
simples empregado de Banco com pouca cultura. Não sei sequer o nome do
autor daquela peça tão bonita, tão docemente melancólica. A única coisa
que posso dizer é que me quedei fascinado sem poder afastar os olhos das
embora.
que será difícil apanhar este ladrão. A polícia costuma descobrir assaltos à
mão armada. Mas um assalto tão genial como este, à mão armada de
violino...
NÃO É FÁCIL MORRER
a grande viagem.
que lhe restava, por certo em bastante mau estado, fora-se na última
transe amargo, e com ela passou Pascoal o último pedaço de vida que a
de Pascoal. Por fim as polpas dos seus dedos captaram um ténue latejo,
— Em quê?
sociedade civilizada.
— Não, claro.
— Pois para morrer como uma pessoa, notou o doutor, deve cumprir
óbito.
obter esse impresso tem de ir à Conservatória. Mas como a estas horas está
fechada, tem de chamar o guarda noturno da rua onde está a repartição que
— Muito bem, disse Pascoal. Contudo, permita-me que lhe faça uma
observação.
— Diga.
— Dado que esses certificados têm que ser feitos pelos médicos, não
seria mais lógico que os impressos estivessem nas vossas mãos, para
— A qual deles ?
— Ao que quiser.
pessoalmente.
número de coroas de flores, a hora do enterro. Esta última não poderá dizê-
la com exatidão, mas sim aproximadamente : fixe o enterro para amanhã às
cinco da tarde.
— O quê ?... Não vai dizer-me que para morrer é preciso uma licença
municipal.
— Para morrer, não; mas para que o seu enterro possa passar pelas ruas
alma.
saúde...
— Para quê?
— A certidão sim, admitiu o médico. Mas isso não tem nada que ver.
assinatura que morri, porque tem que vir outro médico comprová-lo? Acaso
ser oficial. E você sabe o que acontece àqueles que ocupam cargos
particulares.
mais um trâmite.
alguma coisa?
cama com toda a agilidade que lhe permitiam as suas fracas forças, para
documentação completa.
Hoje foi o dia mais feliz de toda a minha vida! Tanto foi o prazer que
Porque hoje o honorável pai de meu pai, o nosso grão avô Minoru San,
Por tão alegre motivo toda a minha família se reuniu em nossa formosa
filhos!
avô com os seus honoráveis maridos. Não faltaram tão pouco os respetivos
Bisavô.
Não sou, como pode ver-se, pela minha juventude e ignorância, a pessoa
que vivem na formosa casa do grande avô se levantaram das suas esteiras e
com a guerra as rações que recebemos por pessoa são exíguas. Por sorte,
O jardim que rodeia a nossa formosa casa, luzia em todo o esplendor das
— Que lindo aniversário vai ter o grande avô!, profetizou mamã, que
Trabalhámos com brio para honrar o nosso venerável parente, que pela
ocasião.
Ainda cedo ficou tudo preparado para a magna receção. Dois músicos
numa pequena tarimba junto ao posto de honra que ocuparia o grande avô.
Este duete de reputados professores tinha por missão amenizar a festa com
soldados.
familiares.
Fez-me grande alegria ver os filhos do tio Kazuki, que por serem filhos
dele são meus primos, pois não tinha voltado a vê-los desde os anos
regozijo.
Enquanto o grande avô partia, com o meu tio em companhia de meu pai,
conduzi ao jardim os meus primos que elogiaram o bom aroma das nossas
sessenta anos solteiras, o que me faz supor que são demasiado exigentes
o caminho nas suas bicicletas particulares. Ambas são ciclistas peritas, pois
compreender que não é fácil que se cumpra a oferta do avô, pois quando
alcançarem os oitenta anos o venerável ancião terá que estar à roda dos
cem. E vamos, com todo o meu respeito, não me parece fácil. Mas enfim:
suas gargantas, e a atirar pedras aos lagos com a marota intenção de acertar
Com o devido rubor, pois não é pensamento próprio para uma donzela da
minha idade, atrevo-me a dizer que sinto uma viva inclinação para
permissão de meu marido, muitos filhos. Tantos pelo menos como a minha
irmã Sun, que acaba de ter o quinto e está esperando o sexto. Creio que ela
não dá tempo ao seu jovem marido para tomar um copito de «sako» com os
amigos! Peço perdão por ter escrito esta frase tão atrevida, ditada sem
dúvida pelo contentamento que sinto. Foi um dia tão feliz, que tudo é
tivemos que servir refrescos a todos. Graças ao nosso peixeiro que teve a
O gelo escasseia tanto como o carvão. Assim acontece que, por causa da
calor no verão. Mas não quero lembrar-me dessa horrível guerra em que
Falar de algo tão trágico teria perturbado a felicidade que sentimos todos
prezado primo Sakae, quando pus nas suas mãos uma taça de refresco com
água de arroz.
púrpuras, que a rude vida militar te faz ser indulgente com as raparigas de
com um olhar que ultrapassava o nosso simples e leve parentesco, que não
Ao ouvir aquilo, tonta de mim!, tremi de tal maneira que não pude evitar
Fiquei tão consternada com a minha asneira que não pude balbuciar
limpava a água.
são as de sangue.
Esta formosa frase fez-me compreender porque a guerra dura tanto, sem
Saudei com uma profunda referência o meu tio político Fujiko, alto
bicho da seda. Apesar da sua elevada posição, que lhe permite o uso de
benévolo comigo.
minha família faltava na reunião. O avô Minoru San, sentado no seu rico
primorosa colher lisa para gelatinas e pudins de ovos que lhe ofereceu a
Machiko!
O gongo, tocado com arte pelas hábeis mãos da minha mãe, anunciou
papeizinhos dispostos com arte por mim, e aceitei com modéstia as lisonjas
Qual não seria a minha surpresa ao notar 109 que o valoroso sargento
nos calções!
Manchúria...
— Tanto como isso, não, contradisse ele, tirando o lenço para enxugar
desastrada...
jovem parente. E tão justa, valha-me Buda! Que seria do nosso potente
quando estiver junto a ti, não voltares a manejar nenhum recipiente que
contenha líquidos.
E soltou uma risada fresca, dando a entender que não ficara seriamente
afetado com a nova mancha que por minha culpa luzia nos seus calções.
excelência.
ao uso ocidental!, dizia o meu tio Kazuki com voracidade mal dissimulada.
doses.
copiosas. Devo juntar que também o chá se gastou às torrentes, assim como
sobremesa me tinham vindo as lágrimas aos olhos repetidas vezes. Era tão
minha irmã, nem um único membro faltara. Não era razão suficiente para
eu, se não fosse sargento, me poria a chorar de felicidade como tu. Mas
como o sou tenho que dominar os meus impulsos para não pôr a ridículo o
Exército Imperial.
Como admirei então o meu marcial primo, obrigado pelo seu dever
Soltou bastantes lágrimas uma cunhada que viera de Osaka e que teve
ritmo crescente.
— A nossa família tem muita sorte, observou Sakae, cuja língua
prima Tokuma, a guerra tem sido muito benigna para connosco. Aparte
uma pequena ferida num dedo ao abrir uma lata de biscoitos, não tivemos
— É verdade, reconheci com prazer. Não só não temos tido baixas, como
Sakae.
— Não deixo de dá-las todos os dias, disse com respeito o meu primo,
Isto mesmo, com palavras muito mais sábias e profundas foi o que nos
disse o grande avô Minoru San, quando acabámos de comer. A minha mãe,
sentimento. Isto foi o sinal para que todos guardássemos silêncio, com o
com a devida compostura. Depois, rompendo ele mesmo o pacto tácito que
— São poucos os apelidos que tiveram esta sorte imensa, disse por fim o
ancião em voz emocionada. Devemos, por isso, agradecer este favor divino
que evitou aos nossos olhos o pranto que produz a morte dos seres
queridos.
Como lamento que a minha ignorância me impeça de transcrever
fielmente as belas coisas que disse o avô Minoru San! Com a majestade dos
batemos por ser este um costume dos ocidentais, com quem estamos em
guerra.
alfinetes?, perguntou-me.
primo por afinidade?, juntou ela sorrindo com malícia, pois tinha
nosso tanque, mas gostaria de passar quanto antes para o meu diário as
impressões que senti durante este dia maravilhoso. São tão gratas e
numerosas, que receio esquecer alguma se não começo a escrevê-las quanto
antes!
Sobe ao teu quarto pois as tuas irmãs e primas me ajudarão a servir o chá.
Desce quando acabares que ainda aqui estaremos. Porque a sobremesa será
E que prolongada!
Até o tempo nos tem favorecido, obsequiando o avô Minora San com um
riem os meninos. As copas das árvores, balouçando com uma ligeira brisa,
zumbido de um avião que se aproxima pouco a pouco. Mas voa tão alto,
que o ruído dos seus motores não é mais intenso que o dum moscardo.
Que formoso dia! Foi, sem dúvida alguma, o mais feliz de toda a minha
vi...
era o 6 de Agosto de 1945 e ela não pôde escrever mais porque um avião
espetáculos desta espécie que se celebram na terra onde vivo. E não são
porque nunca conto o que descubro. Nem mesmo à minha família. Seria
E posso dizer, sem pecar por imodéstia, que até há pouco tempo
tamanhos e coloridas.
escolheu.
Até há pouco tempo, repito, este mundo de inocentes enganos não tinha
segredos para mim. Posso mesmo assegurar, que a minha diversão predileta
armadilhas.
no show não era demasiado airoso. O seu número estava no princípio das
de orquestra sinfónica.
que vos não revelo para não prejudicar esse honrado grémio que trafica
com a fantasia.
detalhe.
Estalou na sala uma salva de palmas estrondosa, a que uni as minhas até
sentir calor nas mãos. Pela primeira vez, desde há muitos meses, realizava-
descobrir!
tinha adormecido.
sabia por exemplo que existem falsas línguas em que se ocultam dez
dentes e ocultá-la num bolsinho? Porque era esta a única solução lógica que
que o pássaro era autêntico e que esvoaçava cheio de vida entre as mãos de
Cornelius.)
noite anterior. Mas estas variações nos meus ângulos de observação não me
Em vão abri os meus quanto pude para captar alguma leve falha que me
Não quero que o leitor perca o seu tempo com o relato de todos os shows
saber que todos foram inúteis. Uma atrás de outra fui ocupando todas as
me. Perdi peso e confiança. Até que por fim, dando-me por vencido, decidi
de notas desafinadas.
que ao natural era mais calvo do que na pista, e uma peruca encanecida que
debaixo da luz dos focos para entrar na sombra da intimidade. Mas não dei
«voo» ilusionista.
acabaram de enternecê-lo:
um pouco de tristeza.
— Porquê ?
tudo o mais?