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Projeto Pé-de-pincha: Conservação e Manejo de Quelônios Manual para


Gestores Ambientais

Book · December 2015

CITATION READS

1 4,311

10 authors, including:

Paulo Cesar Machado Andrade Sandra Helena Azevedo


Federal University of Amazonas Federal University of Amazonas
70 PUBLICATIONS   213 CITATIONS    6 PUBLICATIONS   14 CITATIONS   

SEE PROFILE SEE PROFILE

Jânderson Rocha Garcez Paulo Henrique Guimarães de Oliveira


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (IFAM) 12 PUBLICATIONS   27 CITATIONS   
23 PUBLICATIONS   26 CITATIONS   
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MANEJO COMUNITARIO DE QUELÔNIOS - PROJETO PÉ-DE-PINCHA View project

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Projeto Pé-de-pincha: Conservação e
Manejo de Quelônios
Manual para Gestores Ambientais

Baseado nas diretrizes do protocolo básico simplificado para o monitoramento


reprodutivo e manejo conservacionista de quelônios amazônicos do RAN/
ICMBio e PQA/IBAMA.

Paulo Cesar Machado Andrade


Organizador/Editor

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Editor/Organizador
Paulo Cesar Machado Andrade

Fotos
Acervo Técnico do Projeto Pé-de-pincha/UFAM; Paulo Cesar Machado Andrade; Sandra Helena
Azevedo; Eleyson Barboza; Thiago Luiz Anízio; Rafael Antônio Machado Balestra; Paulo Henrique
Guimarães de Oliveira

Projeto Gráfico, diagramação e capa


Marcela Costa de Souza

Ficha Catalográfica

Fundação de Apoio Institucional Rio Solimões (UNISOL)/ Universidade Federal do


Amazonas (UFAM)
Andrade, P.C.M.; Azevedo, S.H.; Duarte, J.A.M.; Garcez, J.R.; Oliveira, P.H.G.; Pinto,
J.R.S.; Almeida Jr., C.D. Projeto Pé-de-pincha: Conservação e manejo de quelônios -
Manual para Gestores Ambientais - N.2 Editor/Organizador: Paulo César Machado
Andrade - Manaus: UNISOL/UFAM, 2015.

152 p. : il. color.; 21,0 cm X 29,7 cm.

Bibliografia

ISBN 978-85-9510-009-1

1. Quelônios. 2. Tartarugas. 3. Tracajás. 4.Manejo. 5. Proteção. I. Andrade, Paulo


César Machado. II. Universidade Federal do Amazonas. III. Projeto Pé-de-Pincha. IV.
Programa Petrobras Sócioambiental. V. UNISOL. VI. Título.

Manaus-AM

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PREFÁCIO
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O Projeto Pé-de-pincha é um programa de extensão da Universidade Federal do


Amazonas (UFAM) criado em 1999 para atender aos pedidos de comunitários de Terra
Santa/PA que queriam saber como fazer para proteger e aumentar as populações de
tracajás (Podocnemis unifilis) que estavam acabando em seus lagos. Através da parceria
entre a UFAM, as comunidades e órgãos ambientais nós começamos a divulgar e ensinar
técnicas de proteção de ninhos e filhotes de quelônios baseadas nas publicações do Projeto
Quelônios da Amazônia e na experiência dos antigos vigilantes dos tabuleiros (praias de
reprodução) de quelônios. Ao longo dos 17 anos de existência do projeto, capacitamos
dezenas de ribeirinhos interessados em defender tracajás, tartarugas e iaçás de suas
regiões, socializando esse conhecimento e permitindo que essas comunidades se apropriem
dessa tecnologia e se tornem, realmente, atores nesse processo de gestão participativa
dos recursos naturais.
O bom treinamento dos monitores de praia permite não só a proteção desses
animais, mas também a geração de dados sobre a produção de ninhos e filhotes, sendo
esse monitoramento participativo importantíssimo no processo de avaliação e decisão
dos gestores ambientais. Contudo, para uma gestão mais eficiente da conservação de
quelônios, apenas os dados reprodutivos não bastam, é necessário se conhecer parâmetros
da estrutura de cada população de tartarugas, tracajás e iaçás. Informações como quais
espécies existem na região, sua distribuição, abundância, distribuição em classes de
tamanho/peso, razão sexual, taxas de crescimento, migração, bem como, informações
sobre a captura/consumo de subsistência e tráfico de quelônios em cada lugar.
Reunimos neste manual a metodologia utilizada pelo Pé-de-pincha adaptada as
recomendações do protocolo de conservação e manejo de quelônios estabelecidas pelo
Centro de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios (RAN-ICMBio) tanto para proteção
e registro dos aspectos reprodutivos, como para coleta de informações sobre a estrutura
das populações de quelônios em cada área, o que permitirá a geração de informações
mais robustas para a conservação e manejo destas espécies. O Projeto Pé-de-pincha tem
o patrocínio da Petrobras através de seus programas socioambientais.

O Editor

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SUM
UMÁÁR I O
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

7 INTRODUÇÃO

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Paulo Cesar Machado Andrade; José Ribamar da Silva Pinto; Paulo Henrique
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Paulo Cesar Machado Andrade; João Alfredo da Mota Duarte

14 7 REFERÊNCIAS

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Manual para os gestores ambientais

6 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

INTRODUÇÃO
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Paulo Cesar Machado Andrade

O consumo de quelônios e seus ovos fazem parte da cultura e da alimentação dos


povos da Amazônia, contudo, a exploração descontrolada dos estoques naturais fez com
que as populações de tartarugas (Podocnemis expansa) e tracajás (Podocnemis unifilis)
fossem reduzidas drasticamente. Os índios já exploravam esse recurso consumindo os
ovos e a carne de quelônios (Smith, 1974 e 1979; Andrade, 1988). Com a chegada dos
colonizadores portugueses no século XVI, essa exploração tornou-se mais intensa. Na Vila
da Barra de S. José do Rio Negro (Manaus) foram abatidas milhões de tartarugas
(Podocnemis expansa), tracajás (Podocnemis unifilis) e iaçás (Podocnemis sextuberculata),
e também, utilizados milhões de ovos destes quelônios para produção de óleo para ilumi-
nação pública. Em 1849, surge a primeira proibição na Comarca do Amazonas e em 1855,
já como Província, emitiu a Resolução Nº.54 protegendo os tabuleiros do Solimões, Mé-
dio Amazonas e Negro, pois estas espécies, principalmente, a tartaruga, começavam a
desaparecer (Andrade, 1988).
A captura comercial de quelônios é uma dos fatores que mais contribuem para o
declínio de suas populações, pois em função de características como baixa taxa de sobre-
vivência de ninhos e filhotes e idade tardia na primeira reprodução, essas populações tem
potencial sensibilidade à elevadas taxas de exploração (Eltringham, 1984; Zimmer-Shaffer
et al., 2014).
No Brasil, em 1967, o Governo Federal assumiu oficialmente a proteção da fauna
silvestre como um bem da União, e que deveria, portanto, ser conservada e protegida
pelo Poder Público. A Lei No 5.197/67 ou Lei de Proteção à Fauna, proibiu a captura e a
comercialização de animais da fauna silvestre, tornando ilegal a exploração dos quelônios
que há séculos era feita pelos povos da Amazônia. Em 1979, surge o Projeto “Quelônios
da Amazônia” através do qual o Governo passa a proteger as áreas de reprodução de
quelônios ainda existentes na Amazônia, ou seja, os grandes tabuleiros, principalmente,
nos rios Purus e Juruá (IBAMA, 1989; Portal e Bezerra, 2013). Graças a esse trabalho de
conservação do Governo Federal, associado às inúmeras iniciativas comunitárias de pro-

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Manual para os gestores ambientais

teção, em 1996, a tartaruga da Amazônia, saiu da lista de animais ameaçados de extinção


no Brasil (Cantarelli et al., 2014).
Contudo, devido à captura de adultos e a coleta de ovos, as populações de quelônios
continuam desaparecendo dos rios da Amazônia (Smith, 1979; Fachín-Terán et al., 2004;
Pezzuti et al., 2010). Em geral, esses recursos são explorados pelas comunidades locais
para consumo de subsistência ou vendidos para as cidades próximas ou grandes centros
regionais como as cidades de Manaus, Manacapuru, Parintins e Tefé (Canto et al., 1999;
Andrade, 2008; Ohana, 2009; Nascimento, 2009). Em alguns municípios do rio Juruá
(Carauari, Juruá e Itamarati) e da zona fisiográfica do Médio-baixo Amazonas (Parintins,
Barreirinha, Nhamundá, Terra Santa, Oriximiná e Juruti), todavia, algumas áreas foram
protegidas por iniciativa dos próprios ribeirinhos e por associações comunitárias
ambientalistas (Pereira e Pinto, 2011; Andrade et al., 2005; Cantarelli et al., 2014).
No Amazonas e parte do Oeste do Pará (Terra Santa, Oriximiná e Juruti) existem 138
áreas de reprodução de quelônios com 212 praias protegidas, em 12 calhas de rio, que
recebem algum trabalho de proteção, principalmente de ninhos e filhotes, com uma produ-
ção média de 1.077.768±115.466 filhotes/ano (35,3±26,1% de P.expansa; 19,3±25,4% de
P.unifilis e 40,9±32,6% de P.sextuberculata), contudo, o tráfico ainda retira, anualmente,
milhares de tartarugas, tracajás e iaçás para o comércio clandestino na região. Entre 1974 e
2014 foram protegidos 153.798 ninhos e 14.522.286 filhotes de P.expansa, 117.287 ninhos
e 2.299.454 filhotes de P.unifilis, 531.245 ninhos e 5.161.016 filhotes de P.sextuberculata.
Embora o Estado possua o maior número de criadores de quelônios registrados no país (85),
a oferta de carne de quelônios criados legalmente, ainda não conseguiu atender a demanda
e superar o comércio ilegal (Garcez, 2009; Andrade, 2008, 2015).
A maioria das áreas de reprodução de quelônios no Estado é protegida pelo trabalho
de comunidades locais interessadas na manutenção deste recurso natural. De 1994 a 2014,
as áreas de manejo comunitário de quelônios no Amazonas ampliaram de 12 para 122 loca-
lidades (93,4% das áreas protegidas). Ao mesmo tempo, o Governo Federal reduziu, em
termos relativos, o volume de recursos destinados à proteção dessas espécies na região.
Essa situação foi mais agravada com a divisão do órgão ambiental responsável por este tra-
balho em duas instituições distintas (IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - e ICMBio – Instituto Chico Mendes de Biodiversidade) em
2007. Hoje, do total de filhotes de quelônios produzidos em áreas protegidas no Amazonas,
73,8% são resultantes do trabalho de proteção comunitária (Andrade, 2008, 2015).
Apesar de explorados de forma predatória, sem a existência de técnicas para o
extrativismo de forma sustentável, tartaruga (P.expansa), tracajá (P. unifilis) e iaçá (P.
sextuberculata) têm ampla distribuição e potencial reprodutivo, sendo uma alternativa

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real de proteína (qualidade e quantidade) na dieta dos habitantes da Amazônia. Contudo,


para o uso deste recurso é necessário que seja desenvolvido um programa de manejo
para evitar uma superexploração (IBAMA, 2003; Vogt, 2003). As taxas de exploração da
população, sua sobrevivência, recrutamento e tamanho, podem ser estimados por estu-
dos de estrutura e dinâmica de populações (Bataus, 1998; Vogt, 2003; Andrade, 2015).
O manejo de espécies ameaçadas é baseado em informações sobre a estrutura e a
dinâmica das populações, com conhecimento de suas principais taxas demográficas (Cullen
Jr et al., 2003; Mourão et al., 2006; Germano e Rathbun, 2008; Zimmer-Shaffer et al.,
2014). Entretanto, no caso dos quelônios que são organismos, em geral com grande
longevidade, quase sempre se encontram lacunas nestes dados (Frazer et al., 1990; Crouse,
1999; Fáchin-Téran, 2000; Bjorndal et al., 2000).
Para projetar planos de manejo eficazes para reverter o declínio populacional de
quelônios, parâmetros demográficos devem ser quantificados e, os efeitos potenciais de-
pendentes da densidade sobre estes parâmetros, devem ser avaliados. A dependência
dos parâmetros de densidade demográfica é crítica para a modelagem de crescimento da
população, para a compreensão de recuperação dos estoques de organismos aquáticos
em geral e para estimar em que medida, as populações naturais podem ser capturadas
em uma base sustentável (Bjorndal et al., 2000; Zimmer-Shaffer et al., 2014).
O monitoramento de longo prazo de populações animais são parte integral para
medidas efetivas de conservação orientadas pela pesquisa e pelo manejo (Thomas, 1996).
Além de parâmetros como a taxa de nascimentos, taxa de sobrevivência, taxa de mortali-
dade, faz-se necessário calcular também as taxas de crescimento de juvenis de tartarugas
e alometria existente entre o comprimento reto de carapaça, massa corporal e quantida-
de de ovos nas fêmeas (Dodd Jr., 1997; Congdon et al., 1999; Bjorndal et al., 2000; Cantarelli,
2006). Estudos de longo prazo de populações naturais são difíceis, devido às migrações
extensas empreendidas (movimentos de forrageamento) e pela predação humana que
pode extirpar diversos indivíduos de uma população em um curto espaço de tempo
(Bjorndal et al., 2000; Soares, 2000).
Mesmo que as populações de quelônios permaneçam, em sua maioria, dentro da
área de proteção, deve-se registrar e analisar, também, os impactos da caça e coleta de
ovos de quelônios para a subsistência (alimentação) dos ribeirinhos que, em muitos lo-
cais, pode ser maior que os impactos do tráfico ilegal.
Estudos de monitoramento de filhotes e adultos de quelônios aquáticos marcados
podem melhorar os modelos de predição, bem como, obter mais dados sobre as diferen-
tes fases de recrutamento até que os animais atinjam a vida adulta. Isto tornará possível a
geração de modelos mais robustos para acompanhar o manejo participativo de quelônios
na Amazônia (Andrade,2015).

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Manual para os gestores ambientais

Os programas de conservação de quelônios realizados, há longo tempo, através do


Governo (IBAMA, ICMBio) ou através do manejo comunitário (Programa Pé-de-pincha)
tem demonstrado que sendo mantido o esforço de proteção, existe uma tendência ao
incremento populacional local no número de fêmeas desovando e de filhotes produzidos
em cada praia (IBAMA, 1989; Andrade, 2008; Portal e Bezerra, 2013; Cantarelli et al., 2014).
Porém, é necessário saber se, efetivamente, o trabalho de proteção aos ovos e filhotes de
quelônios, em áreas manejadas, contribui com eficácia para o aumento do recrutamento
e garante uma maior taxa de sucesso/sobrevivência de ninhos e filhotes tanto em áreas
protegidas pelo Estado, como em áreas protegidas pelas comunidades.
A sistematização dos dados de proteção de ninhos e filhotes de quelônios, em ta-
buleiros protegidos pelo Governo Federal e pelos programas comunitários de conserva-
ção de quelônios, associados aos parâmetros de estrutura e à dinâmica populacional des-
tes estoques, permitirão estimar modelos populacionais para tartarugas (Podocnemis
expansa), tracajás (P.unifilis) e iaçás (P. sextuberculata), que possibilitarão a avaliação da
eficiência destes programas e a previsão dos possíveis impactos futuros destes tipos de
manejo na conservação destas espécies.
Para realizar a conservação e o manejo das praias de nidificação de tartarugas,
tracajás e iaçás na Amazônia, o Projeto Quelônios da Amazônia (PQA) desenvolveu proto-
colos básicos de atividades que, anualmente, eram repassados para os gerentes ou gestores
de projeto em suas reuniões de capacitação técnica e planejamento (IBAMA, 1989b). Es-
ses protocolos tinham por base, o conhecimento e as técnicas desenvolvidos pelos anti-
gos “capitães de praia”, que antes de 1967, eram os responsáveis locais por zelar e vigiar
os tabuleiros (praias com grande número de ninhos de tartarugas) (Andrade, 2015; Andrade,
1988; Alfinito, 1978). Esses protocolos foram aperfeiçoados, ao longo do tempo, pelos
gestores do PQA e do extinto CENAQUA (Centro Nacional de Quelônios da Amazônia) e
serviram de base para o monitoramento de ninhos e filhotes das praias de nidificação de
quelônios desde 1979 (Portal e Bezerra, 2013; IBAMA, 1989).
Em 2011, o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios (RAN)
do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) inicia uma série de encontros e
oficinas para aperfeiçoar o protocolo básico de manejo conservacionista de sítios de
nidificação de quelônios, bem como, tenta incorporar a esse protocolo, ações de levanta-
mento e monitoramento populacional dos estoques de quelônios em cada área protegida
ou unidade de conservação. Em 2014, durante a realização do Plano de Ação Nacional
para conservação de quelônios (PAN-quelônios), o PQA/IBAMA e o RAN/ICMBio definem
as diretrizes do protocolo básico simplificado para o manejo conservacionista e monitora-
mento reprodutivo e populacional de quelônios amazônicos.

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Manual para os gestores ambientais

O Programa Manejo Comunitário de Quelônios – Pé-de-pincha, da Universidade


Federal do Amazonas (UFAM) trabalha, desde 1999, orientando e executando, junto com
118 comunidades ribeirinhas, a conservação de quelônios no Estado do Amazonas e Oes-
te do Pará. Durante os últimos 16 anos, o Programa Pé-de-pincha tem executado ações
proteção e de monitoramento comunitário de conservação de quelônios em 18 municípi-
os (15 do Amazonas e 3 do Pará), com a parceria do IBAMA e da Secretaria Estadual de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS). Além disso, realizou o diagnóstico
de todas as áreas de conservação de quelônios definidas pela SDS, bem como, capacitou
os gestores e monitores das unidades de conservação estaduais, para o trabalho de prote-
ção de praias de reprodução de quelônios e para o fomento das ações de criação e mane-
jo de quelônios.
No âmbito estadual, o Amazonas apresenta 52% de Áreas Protegidas, sendo 12%,
representada por Unidades de Conservação (UC) Estaduais, o que totaliza 42 UC sob ges-
tão da SDS. Nesse sentido a SDS, por meio do Centro Estadual de Unidades de Conserva-
ção (CEUC) também tem apresentado iniciativas de proteção e monitoramento de quelônios
em suas UC, por meio do ProBUC (Programa de Monitoramento da Biodiversidade e do
Uso de Recursos Naturais em Unidades de Conservação Estaduais do Amazonas) e dos
gestores dessas UC em parcerias e colaborações diretas em campo, com a UFAM (Progra-
ma Pé-de-Pincha), o Centro de Pesquisa e Proteção em Quelônios Aquáticos (Eletrobrás),
Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Prefeituras, Associações e morado-
res, e outros atores locais (Amazonas, 2010).
O ProBUC é um programa participativo que objetiva identificar ameaças à integri-
dade das Unidades de Conservação, e por meio do monitoramento participativo envolver
as populações locais para, de forma coletiva, subsidiar informações para propostas de
manejo da biodiversidade e do uso de recursos naturais em UC estaduais do Amazonas
(Amazonas, 2014). Para o monitoramento de quelônios, as atividades do ProBUC tem se
concentrado na RDS de Uacari, na RDS do Uatumã, na FLORESTA e RESEX Canutama, RDS
Igapó Açu, PAREST Rio Negro setor Norte e RDS Puranga-Conquista. Além dessas, existem
outras áreas que se constituem em áreas em processo maduro de proteção e monitora-
mento (RDS Mamirauá, RDS Piagaçu-Purus, APA Nhamundá, RDS Madeira), que antece-
dem ações de monitoramento com metodologia e protocolos técnico-cientifico definidos,
sendo que, nessas áreas, as ações só são possíveis mediante o trabalho realizado em par-
ceria com outras instituições (Sociedade Civil Mamirauá, Instituto Piagaçu-Purus, Secreta-
rias Municipais de Meio Ambiente).
De acordo com a Lei Complementar 53 (05/06/2007), o Sistema Estadual de Unida-
des de Conservação (SEUC), deve buscar contribuir para a manutenção da diversidade

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Manual para os gestores ambientais

biológica e dos recursos genéticos do Estado do Amazonas; proteger e evitar ameaças às


espécies endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção; contribuir para a preservação e a
restauração da diversidade de ecossistemas naturais; promover o desenvolvimento sus-
tentável e a melhoria da qualidade de vida das populações locais, regionais e globais,
especialmente das comunidades tradicionais; e promover a adoção dos princípios e práti-
cas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento. Entre outros, proteger
os recursos naturais necessários à subsistência de comunidades tradicionais, respeitando
e valorizando seu etnoconhecimento e sua cultura e promovendo-as, social e economica-
mente, através do manejo racional e sustentável de recursos faunísticos aquáticos rele-
vantes como os quelônios.
Entre as diretrizes desse Sistema (SEUC), está a de assegurar a participação efetiva
das populações locais bem como buscar apoio, cooperação e parcerias no desenvolvi-
mento de estudos, pesquisas cientificas e práticas de educação ambiental e monitora-
mento na criação, implantação e gestão das Unidades de Conservação (Art. 5, III e IV, (Lei
53, 2007).
Além disso, a partir de 08 de dezembro de 2011, o Governo Federal repassou, para
os Estados a responsabilidade sobre a gestão da fauna silvestre local, através do Artigo 8º.
da Lei Complementar Nº140, e pelo seu inciso XVII deverá fomentar as atividades que
conservem essas espécies da fauna silvestre in situ, reforçando a importância, para o Es-
tado, da implementação das ações do manejo conservacionista participativo dos
quelônios.Também, em 2011, o Governo do Amazonas por meio da SDS/CEUC, começou a
trabalhar no desenvolvimento da cadeia produtiva de quelônios, criando um Grupo de
Trabalho de Quelônios (Portaria SDS No. 128, de 5/8/2011) que teve como meta formular
as diretrizes para o manejo de quelônios em todo Estado do Amazonas, o que incluiu
definir as áreas prioritárias de conservação e manejo, incentivar sistemas de criação e
manejo comunitário, normatizar a comercialização, abate e beneficiamento, e propor pro-
gramas de qualificação de técnicos e comunitários, incluindo agentes ambientais voluntá-
rios, na conservação de quelônios (Amazonas, 2011).
Entendemos que a conservação das espécies não se dá apenas com os conheci-
mentos biológicos e técnicas de manejo ou pela conscientização ambiental. Acreditamos,
sobretudo, que ela está profundamente ligada a melhoria da qualidade de vida e do res-
gate social e econômico das comunidades locais, sendo fundamental, auxiliá-los nos pro-
cessos de discussão e busca do desenvolvimento sustentado dos recursos naturais.

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Manual para os gestores ambientais

As ações de conservação e manejo sustentável de recursos naturais exigem iniciati-


vas integradas também pelo monitoramento e gestão participativos, nas quais as informa-
ções recolhidas pelos usuários dos recursos ajudam a orientar os tomadores de decisão
locais sobre a gestão de conservação (Kennet et al., 2015).
A idéia de descentralização na gestão dos recursos naturais e o envolvimento de
populações locais conquistou muito espaço na formulação de políticas públicas e na ela-
boração de projetos de desenvolvimento regionais (Pereira, 1999; Ostrom, 1990) fugindo
às opções clássicas de privatização dos recursos ou exclusivo controle pelo Estado (IPEA,
2010; Ostrom, 1990). Essas mudanças vêm ocorrendo no mundo todo e têm forte ênfase
nas comunidades e nos impactos locais de políticas baseadas em gestão comunitária e co-
gestão (Pereira, 1999; Freitas et al., 2009; Berkes, 2009).
O presente manual pretende apresentar aos gestores ambientais (chefes de unida-
des de conservação, secretários de meio ambiente ou coordenadores de projetos de mane-
jo conservacionista de quelônios) informações sobre como selecionar áreas para proteção
de quelônios, como coordenar projetos de proteção a fauna com envolvimento comunitá-
rio, além das técnicas básicas sobre conservação de quelônios e de monitoramento.

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Manual para os gestores ambientais

14 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Capítulo 1
Quelônios e ssu
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Paulo Cesar Machado Andrade, João Alfredo da Mota Duarte, Janderson Rocha Garcez, Sandra
Helena Azevedo, Carlos Dias de Almeida Jr., Paulo Henrique Guimarães de Oliveira

Os quelônios existem, aproximadamente, desde o Jurássico (250 milhões de anos)


até hoje, e possuem 335 espécies de água doce, oito marinhas e 34 terrestres (Garschagen,
1995). Durante o fim do Cretáceo e o começo do Paleoceno, os répteis sofreram uma
extinção em massa, foi quando muitas tartarugas de diversas famílias foram extintas.
Os quelônios pertencem a ordem Chelonia ou Testudines, que inclui tartarugas,
cágados e jabutis. Podem ser terrestres, marinhos e de água doce, cujos corpos são
envolvidos por duas conchas ósseas, uma carapaça dorsal e um plastrão ventral, que estão
ligados lateralmente. São os únicos répteis que possuem carapaça, a qual é utilizada como
um instrumento de defesa. Muitas espécies podem recolher a cabeça, as pernas e a cauda
para dentro da carapaça, servindo como escudo de proteção, entretanto, algumas não
conseguem executar esse movimento, como por exemplo a tartaruga marinha. A dimensão
é variável de acordo com as espécies, encontrando-se formas de dois a três metros de
comprimento e também pequenas formas que atingem somente sete a doze centímetros
(Molina e Rocha, 1996).
Os quelônios não possuem dentes e as mandíbulas desenvolvidas assumem a forma
de um bico córneo. A língua se apresenta não extensível. Pálpebras presentes e pescoço
geralmente retrátil. Encontrados em regiões tropicais e temperadas, constituem doze
famílias, dentre elas a Podocnemididae. Pertencem a esta família quelônios caracterizados
pelo pescoço lateralmente retrátil (Pleurodira) com especializações vertebrais associadas,
13 escudos plastrais e pélvis fundida. Tanto a carapaça, quanto o plastrão, possuem uma
forma ovalada e achatada (Pritchard e Trebau, 1984). Cinco destas espécies vivem na
Amazônia brasileira, a maioria pertencendo ao gênero Podocnemis. Existem registros fósseis
do período Cretáceo, com representantes do gênero Podocnemis, tanto na América do
Sul, quanto na América do Norte, Europa, Ásia, Madagascar, Austrália e algumas ilhas do
Caribe (Wood, 1976; Alho, Carvalho e Pádua, 1979).

Paulo Cesar Machado Andrade 15

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Manual para os gestores ambientais

Na Amazônia brasileira, os quelônios do gênero Podocnemis são a tartaruga


(Podocnemis expansa), o tracajá (P. unifilis), o iaçá ou pitiú (P. sextuberculata) e a irapuca
(P. erythrocephala) (Figura 1). Sendo encontrados também outros quelônios como
cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus), jabuti (Chelonoidis carbonaria e o C.. denticulata),
matamatá (Chelus fimbriatus) muçuã (Kinosternon scorpioides), aperema (Rhinoclemmys
punctularia), jabuti-machado (Platemys platycephala), lalá ou tartaruga cabeça de sapo
(Mesoclemmys raniceps), cágado das poças (M.gibba) e cágado de igarapé (Rhinemys
rufipes) (Rueda-Almonacid et al., 2007; Vogt, 2009).

Figura 1: Filhotes de tartaruga (Podocnemis expansa), tracajá (P.unifilis), iaçá ou pitiú


(P.sextuberculata) e irapuca (P. erythrocephala) (de baixo para cima).
Foto: Pé-de-Pincha 2001 (Oliveira, P.H.).

16 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

CASCO

335 espécies de água doce, 8 de água salgada e 34 terrestres.

QUELÔNIOS – MARINHOS,
TERRESTRES E AQUATICOS
(AGUA DOCE)

Jabuti Perema Irapuca

Tartaruga

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Manual para os gestores ambientais

Classificação dos Quelônios

Testudines ou Chelonioidea

Pleurodira Cryptodira

Retraem a cabeça ao Retraem a cabeça para


lado do casco dentro do casco

Tartaruga (Podocnemis expansa) Jabuti (Chelonoidis denticulata)

Cágado de igarapé (Rhinemys rufipes) Muçuã (Kinosternon scorpioides)

Cágado de poças (Mesoclemmys gibba) Perema (Rhinoclemmys punctularia)

18 Paulo Cesar Machado Andrade

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COMO IDENTIFICAR O SEXO DOS QUELÔNIOS?

• Determinação do sexo nos PLEURODIRA:

Fonte: Andrade, 2009. Fonte: Andrade, 2010.

FÊMEA de tartaruga (Podocnemis expansa) MACHO de tartaruga (P. expansa) ou capitari

Macho: Abertura caudal do plastrão em formato de “U”,


cauda maior, mais comprida e grossa, em algumas
espécies apresentam pigmentos coloridos na cabeça
mesmo depois de adultos.

Fêmea: Abertura caudal do plastrão em formato de “V”,


cauda fina e pequena, sem pigmentos na cabeça.

Ex: Iaçá fêmea (Podocnemis sextuberculata) sem pintas na


cabeça à esquerda, e o macho ou anori com pintas amarelas na
cabeça à direita.
Fonte: Anizio, 2010.

• Determinação do sexo nos CRYPTODIRA: Machos plastrão côncavo e fêmeas plastrão


reto.

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Manual para os gestores ambientais

ONDE VIVEM OS BICHOS DE CASCO?

As três espécies de quelônios aquáticos mais conhecidas da Amazônia são a tartaruga-


da-Amazônia, o tracajá e a iaçá (gênero Podocnemis) que vivem na bacia do rio Solimões-
Amazonas e seus afluentes em rios de água branca (barrenta), preta e clara. A irapuca vive
apenas nos rios de água preta como o rio Negro, Nhamundá, Andirá, Uaicurapá, Marau e
seus afluentes.
Eles são encontrados nos rios, lagos, igarapés, paranás e até em poças de água na
terra firme (muçuãs, peremas) e na floresta (jabuti).

SECA: Praias de nidificação de tartarugas, tracajás e iaçás às margens dos rios - Tabuleiros.

CHEIA: Lagos e florestas inundadas de várzea e igapós, aonde os quelônios comem frutos, flores e
sementes.

Reprodução dos quelônios

O sexo nas espécies aquáticas do gênero Podocnemis pode ser identificado pelo
tamanho do animal (fêmeas maiores que os machos), pela forma do plastrão e fenda da
placa anal (formato de U para machos e de V para fêmeas adultas) (Pritchard & Trebbau,
1984) e pela manutenção de manchas amarelas ou amareladas (P.unifilis e P.sextuberculata)
ou vermelhas (P.erytrhocephala) na cabeça dos machos (as manchas dos filhotes
desaparecem nas fêmeas).
Segundo Alho & Pádua (1982) há uma sincronia entre o regime de vazante e o
desencadeamento do comportamento de nidificação. Os animais iniciam um processo de
migração no início da vazante, saindo dos lagos, igapós e florestas inundadas onde foram
durante a cheia para se alimentar e criar reservas de gordura para, posteriormente,
formarem os ovos. Isso ocorre nos meses de junho-julho no oeste da Amazônia (rios Juruá,

20 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Purus e Solimões), agosto-setembro no Médio-Baixo Amazonas, e outubro-novembro no


extremo norte da região (rio Branco/afluente do rio Negro) – Andrade (2015).
Para o Ibama (1989), a tartaruga (Podocnemis expansa) apresenta a maior parte do
desenvolvimento biológico entre 5 e 10 anos de idade. A maturidade sexual acontece aos
7 anos para os machos e 11 a 15 anos para as fêmeas. Em cativeiro, Andrade (2008) e
Garcez (2009) estimaram a maturidade sexual para P.expansa em 10 anos de idade e 10 kg
de peso para fêmeas de P.expansa e , em vida livre, para P.unifilis, foi estimada em 7 anos
e 3,3 kg de peso para as fêmeas (Andrade, 2012).
O tempo de postura de P. expansa pode estar relacionado diretamente com a
idade do animal ou com a variação do fenômeno de enchente e vazante do rio, no qual
há uma combinação com o desenvolvimento do processo de nidificação da tartaruga,
que cumpre o determinismo biológico de retornar ao mesmo local de postura, podendo
ser isolado ou em faixas marginais. (Alho & Pádua, 1982). Para Andrade (2012) nem
todas tartarugas são fiéis neste retorno a uma mesma praia para desovar, cerca de 60%
permanecem fiéis a praia de reprodução e 40% migram (podendo mudar para tabuleiros
distantes mais de 150 km do local de origem). Apenas as fêmeas maiores e mais velhas
ficam esperando nascimento dos filhotes. No caso dos iaçás, 57, 1% ficaram na área
original e 42,9% migraram (Distância média percorrida pelas iaçás = 21,7±16,6 km).Os
tracajás, por sua vez, retornaram fielmente para os mesmos locais de nidificação e lagos
de alimentação.
A tartaruga tem um hábito gregário na época de desova, diferente do tracajá (P.
unifilis) que desova isoladamente em solo íngreme à margem do rio, aproveitando local
menos exposto, é nessa fase que a tartaruga fica mais vulnerável à predação antrópica. Os
mecanismos de orientação que as tartarugas utilizam para encontrar a área de oviposição
são, provavelmente, os mesmos utilizados para encontrar seu caminho entre área de
forrageio e de repouso. A familiaridade com sinais locais é um método eficiente de
navegação que as tartarugas podem utilizar (Pough, Heiser & McFarland, 1993). Podem
se comunicar entre si através de infrassons, sendo que os animais mais velhos poderiam
guiar os mais novos durante o processo de migração (Ferrara, 2014).
Após a migração, as tartarugas chegam na frente das praias de nidificação, e se
posicionam nos remansos, em locais que os ribeirinhos chamam de boiadouros. Nesse
processo, os animais permanecem em “repouso” no leito do rio durante 4,5 ± 0,7 dias
observando a praia de dentro d’água, ou as fêmeas realizam 5,5 ± 0,7 subidas na praia
de desova durante a noite, sem desovar. Depois fazem um “passeio” para verificar os
possíveis pontos de abertura da cova e formação do ninho, cuja profundidade está
relacionada com o lençol freático que tem uma variação natural de 0,63 ± 0,27 m,
podendo ser depositados de 50 a 136 ovos (Alho e Pádua, 1982) ou de 80 a 300 ovos
(Andrade, 2008; Duarte, 1998).

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No período reprodutivo de P. expansa são observados os mesmos comportamentos


das tartarugas marinhas na fase de desova. Para Podocnemis expansa esse padrão
comportamental foi descrito por Vanzolini (1967) conforme vemos a seguir:
(1) Assoalhamento – essa etapa caracteriza-se pela agregação dos animais em águas
rasas, com subidas ocasionais na margem do tabuleiro (praia de desova) para exporem-se
aos raios solares;
(2) Subida à praia para a escolha do local da cova;
(3) Deambulação ou caminhada de vistoria – nessa fase os animais sobem a praia e
exploram o tabuleiro à procura de um local de postura;
(4) Escavação da cova – a primeira atividade é a limpeza da areia solta com o auxílio
das quatro patas, girando em torno de si mesma. Quando atinge a profundidade de 30 cm
a 40 cm passa a usar as patas traseiras até que seu corpo atinja uma posição de 45° a 60°
em relação à horizontal, fazendo uma câmara.
(5) Postura – nessa fase as tartarugas não mais se importam com a presença de
estranhos e podem ser tocadas sem reação. O valor adaptativo da estereotipia durante a
oviposição de P. expansa está relacionado ao sucesso da estratégia evolutiva dessa espécie.
A evolução da eficiência crescente da técnica estandardizada da postura de ovos resulta
numa taxa de reprodução melhor como conseqüência dos padrões motores (trabalho
muscular) de tal maneira a uniformizar o processo de oviposição, independente da
experiência ou aprendizado. O corpo do animal move-se para frente e para trás e também
executa uma lenta rotação para a direita e a esquerda. Quando aumenta a profundidade,
as patas traseiras têm mais ação. Com as unhas para baixo, uma pata é inserida na câmara
de postura, em escavação, fazendo pressão para o fundo e com uma ligeira rotação modela
a forma e tamanhos exatos da câmara, com 13-18 cm de altura e diâmetro de 20-25 cm. A
câmara é feita a uma profundidade de 50-100 cm. Durante esse processo, as patas dianteiras
ajudam na sustentação do animal. O ato é repetido, inserindo a outra pata na abertura da
câmara de postura. Assim que ela estiver pronta, com o ovipositor inserido e o corpo
cobrindo a cavidade de postura, inicia-se a oviposição. Cada fêmea deposita um ovo a
cada 10-15 segundos. Durante a postura, o pescoço da tartaruga, se mantém esticado
formando junto com a cabeça um ângulo igual ao do corpo em relação à horizontal. Há
contrações peristálticas a cada 10-15 segundos seguidas de liberação de ovos e líquidos;
(6) Reenchimento da cova – assim que começa a escavação os animais entram num
processo de ritualização do comportamento, com grande teor de estereotipia, fazendo
movimentos lentos no corpo para a direita e a esquerda, colhendo areia com as patas
dianteiras e traseiras, alternadamente. Em geral, a carapaça, cabeça e os olhos ficam
cobertos de areia lançada durante o fechamento da cova;
(7) Retorno à água – quando a tartaruga deixa a cova, normalmente faz uma trilha
formada de secreção mucóide que escorre da “cloaca” ao caminhar. A cauda posiciona-se

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para trás, rastejando a cloaca ainda em contração, sendo uma indicação da postura realizada
(marca da cauda arrastada entre as pegadas).
Soini (1997), no Peru, observou fêmeas de Podocnemis expansa formando uma
trilha pela liberação de secreção mucóide antes e depois da desova, fazendo um sulco na
areia. A caminhada para a água é lenta devido ao cansaço, caminhando 3-4 m,
alternadamente. As patas traseiras podem sangrar devido ao atrito na borda da carapaça,
assim como na parte posterior da carapaça durante a escavação. Após retornar à água, a
população adulta permanece nas cercanias da praia até o nascimento dos filhotes. Nas
horas mais quentes do dia pode-se observar as cabeças dos adultos fora d’água.
Na época próxima à eclosão os adultos ficam cada vez mais difíceis de serem vistos
nas cercanias da praia (Vanzolini, 1967; Alho, Carvalho & Pádua, 1979).
Os ovos de Podocnemis expansa ficam incubados de 40 a 70 dias, sendo em média
55 ± 21,21 dias e apresentam uma taxa de fecundação de 85 a 98%, desde que permaneçam
em equilíbrio a umidade e temperatura na câmara de incubação, pois a temperatura,
umidade e as concentrações de oxigênio e dióxido de carbono podem exercer efeitos
profundos sobre o desenvolvimento embrionário das tartarugas (Alho, Carvalho & Pádua,
1979; Alho & Pádua, 1982; Ibama, 1989).

O QUE OS QUELÔNIOS COMEM?

Tartarugas, tracajás, iaçás e irapucas são animais que podem comer tudo
(onívoros) mas na natureza comportam-se como herbívoros/frugívoros comendo
principalmente folhas, sementes, frutos, flores, talos e raízes, e às vezes, moluscos,
peixes, crustáceos e insetos.

Frutos de várzea que são alimentos de quelônios Quelônios em área de alimentação

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Alimentação Tartaruga-da-Amazônia

Alimentação de Tracajás

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Espécies de quelônios existentes nas áreas de atuação do Programa Pé-de-pincha:

Na região do Médio e Baixo Amazonas foram identificadas 13 espécies de quelônios:


tartaruga (Podocnemis expansa), tracajá (P.unifilis), iaçá ou pitiú (P.sextuberculata), irapuca
ou calalumã (P.erythrocephala), cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus), perema
(Rhinoclemmys punctularia), cágado de poças (Mesoclemmys gibba), muçuã (Kinosternon
scorpioides), jabuti (Chelonoidis denticulata e C.carbonaria), matá-matá (Chelus fimbriatus),
jabuti-machado (Platemys platycephala) e tracajá ou cágado de igarapé (Rhinemys rufipes).
As principais espécies protegidas pelos comunitários são do gênero Podocnemis:

A) Tracajás (Podocmenis unifilis):


São quelônios que vivem nas águas da Amazônia e fazem seus ninhos nas praias de
areia, nos barrancos e até no meio do capim. Os ninhos tem cerca de 18 cm de
profundidade. As fêmeas medem cerca de 33,6±7,8 cm (Máx=43 cm; Mín=8 cm) de
comprimento de carapaça (CC) e pesam 3,6 a 10 kg. Aos 7 anos de idade e 4 kg de peso
fazem pela 1ª.vez seus ninhos de 18-25 cm profundidade e põem em média 23-35 ovos
(Mínimo=10; Máximo= 50 ovos) alongados de casca dura com coloração bege a
avermelhada. Os machos são menores, pesam cerca de 3 kg e tem pintas amarelas na
cabeça igual aos seus filhotes, que nascem após 58 a 62 dias de incubação. Estes são os
verdadeiros Pés-de-pincha e são encontrados em todos os municípios do projeto.

Macho adulto ainda com pintas Fêmea adulta sem pintas na cabeça
amarelas na cabeça

Filhote têm pintas amarelas na cabeça Fêmea após a desova

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B) Pitiús ou iaçás (Podocnemis sextuberculata): São quelônios menores que os


tracajás, que vivem em rios e lagos de águas barrentas ou claras. Medem cerca de 24,4±5,5
cm de CC (Máx=34 cm; Mín=6,5 cm). A fêmea pesa em torno de 3 a 5 kg e põem cerca de
6 a 25 ovos em ninhos na areia. Os filhotes nascem após 60 dias de incubação e tem seis
(6) “carocinhos”no plastrão (pequenas protuberâncias). Ocorre em Terra Santa, Oriximiná,
Barreirinha, Parintins, Juruti, Nhamundá, Carauari, Juruá, Itamarati e Novo Airão.

Detalhe das protuberâncias no peito de iaçá


juvenil
Figura 11. Filhote e fêmea de iaçá ou pitiú (P.sextuberculata).; Detalhe das 6 protuberâncias no plastrão
dos filhotes/juvenis.

C) Irapucas ou calalumãs (P. erythrocephala): São quelônios menores que o iaçá


que vivem em rios de água preta. As fêmeas pesam entre 3 a 4,5 kg e botam de 8 a 10 ovos
em praias de areia fina e no folhiço das campinas nas margens dos rios de água preta. Os
filhotes nascem após 65-75 dias de incubação e tem pintas vermelhas na cabeça. Ocorre
em Terra Santa, Barreirinha, Parintins, Juruti, Maués, Novo Airão e Barcelos.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 12. Filhote, macho e fêmea de irapuca ou calalumã (P.erythrocephala).

D) Tartaruga da Amazônia (Podocnemis expansa): São os maiores quelônios de água


doce, vivem em rios e lagos da Amazônia. Nas áreas onde o Projeto Pé-de-pincha
tradicionalmente atua existem poucas tartarugas, mas nos rios Juruá e Purus ainda existem
grandes populações. Medem em torno de 47,9±13,2 cm de CC (Máx=71,5 cm; Mín=34
cm) mas podem atingir até 90 cm de carapaça e 70 kg de peso. As fêmeas pesam cerca de
20-45 kg, botando de 51 a 171 105 ovos esféricos de casca branca e mole, em ninhos de
55 a 90 cm de profundidade feitos nas praias de areia textura grossa-média. Vive em rios
de água branca, preta e clara. Os filhotes nascem após 50-65 dias e pesam cerca de 22 g.
As fêmeas desovam a 1ª. vez com cerca de 10 anos de idade e 10 kg de peso. O macho é
menor que a fêmea e pesa cerca de 7 kg. São encontradas em Oriximiná, Terra Santa,
Nhamundá, Parintins, Barreirinha, Juruti, Barcelos, e nos rios Juruá (Carauari, Juruá e
Itamarati) e Purus (Canutama, Lábrea, Tapauá).

E) Cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus): Cabeçudos podem medir entre 10,5 e


45 cm e pesar 11,2±3,7 kg (machos são maiores que as fêmeas), vivem em rios de água
preta e barrenta e desovam em áreas de chavascais (2, 17), com muito folhiço, embaixo
de troncos ou buracos. Põem de 15 a 25 ovos, alongados com casca dura. São encontrados
em Terra Santa, Oriximiná, Juruti, Parintins, Nhamundá, Barreirinha, Maués, Borba,
Manicoré, Novo Airão, Barcelos, Juruá, Carauari, Canutama e Tapauá.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 14. Fêma, macho e filhote de cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus).

No quadro 1 apresentamos as imagens de outras espécies de quelônios encontrados


na Amazônia e as áreas do Programa Pé-de-pincha onde foram registradas.

Quadro 1. Espécies de quelônios encontradas na área de abrangência do Projeto Pé-de-


pincha.

Espécie Locais dos registros e biometria


dos exemplares encontrados
Matá-matá (Chelus fimbriatus): Terra Santa,
Barreirinha, Barcelos, Parintins, Oriximiná e Juruti. Os
exemplares registrados mediam 22,9±2,6 cm de CC e
pesavam em torno de 1.500±158 g.

Jabuti-vermelho ou piranga (Chelonoidis carbonária


= Geochelone carbonaria): Barreirinha, Parintins,
Juruti e Oriximiná. Medem cerca de 16,8±8,3 cm de
CC (Máx=33 cm; Mín=6,5 cm) e peso em torno de 1,6
a 4,9 kg

Jabuti-amarelo (Chelonoidis denticulata = Geochelone


denticulata): Terra Santa, Oriximiná, Parintins,
Barreirinha, Nhamundá, Juruti, Canutama e Carauari.
Medem cerca de 15,7±3,8 cm de CC (Máx=33,6 cm;
Mín=11,3 cm) e peso em torno de 1 a 3,9 kg.

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Manual para os gestores ambientais

Espécie Locais dos registros e biometria


dos exemplares encontrados
Muçuã ou peito-mole (Kinosternon scorpioides):
Barreirinha, Parintins, Maués, Novo Aripuanã e
Canutama. Medem aproximadamente 12,5±3,8 cm
(Máx=16 cm; Míni=3,6 cm) de CC e pesam 275±95,7 g
(máx-522g; Mín=58 g)

Perema (Rhinoclemmys punctularia): Terra Santa,


Barreirinha, Parintins, Oriximiná e Juruti. Medem
13,2±3,8 cm de CC e pesam 354,7±297,1g (Máx=1.160
g; Mín=104 g)

Rhinemys rufipes (=Phrynops rufipes): Foi relatado em


Barreirinha e Parintins, mas encontramos exemplares
em Nhamundá (16 cm de CC e peso de 268 g), Manaus
(24 cm de CC e 1543 g de peso) e Manacapuru.

Jabuti-machado (Platemys platycephala): Terra Santa


e Barreirinha. Medem cerca de 14,7±10,7 cm de CC
e pesam 255±39 g (Máx=300 g; mín=231 g)

Cágado de poças (Mesoclemmys gibba = Phrynops


gibus): Barreirinha. Animais encontrados em poças na
floresta medem entre 8 e 17,9 cm de CC, com peso
médio de 105 a 253 g (Máx= 570 g).

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Espécie Locais dos registros e biometria


dos exemplares encontrados
Tartaruga de igapó ou cabeça de sapo ou lálá
(Mesoclemmys raniceps = Phrynops raniceps):
Encontrada em rios de água branca, florestas
inundadas, chavascais nos rios Juruá, Purus e Madeira.
Média de 29,7±0,5 cm de CC e 2590±290 g.

Características dos ninhos das principais espécies manejadas

Na região do Médio Amazonas, os tracajás desovam em média 20,9±1,6 ovos. Cerca


de 50,1% dos ninhos transferidos de tracajás foram encontrados em praias de areia, com
granulometria fina a média, com uma profundidade média de 17,2±2,7 cm e largura de
12,2±2,1 cm, com uma média de 22,3±4,7 ovos (máximo=36 e mínimo=12) que pesavam
em torno de 24,5±2,8 g. Os ninhos transferidos do barro (49,9%) apresentaram
profundidade de 13,2±2,1 cm e largura de 13,6±2,9 cm, com uma média de 23,3±5,4 ovos
(máximo=34 e mínimo=10) que pesaram, aproximadamente, 23,7±2,6 g. A distância dos
ninhos de tracajá para água variou de 18,4± 14,1 m na areia e 15,4 ± 16,1 m no barro, e a
distância para vegetação variou de 3,8± 6,7 m na areia e 2,2± 6,1 m no barro.
Os ninhos de iaçás foram todos manejados em praias de areia próximas à águas
claras ou barrentas (embora existam registros de desova de iaçás no rio Andirá, no rio
Uaicurapá, no lago Grande/rio Igapó Açu e na praia da Velha/Rio Negro/PARNA Jaú que
possuem águas pretas). Os ninhos desta espécie apresentaram cerca de 15,7±1,4 ovos
(máximo=25 e mínimo=6), com peso médio de 20,8± 5,6 g, sendo encontrados à 18,2±20,9
m da vegetação e bem próximos da água (em média 6 metros).
Os ninhos de irapuca (P.erythrocephala) foram encontrados em praias de areia fina
às margens de rios de água preta, com uma média de 7,9±0,9 ovos. Já os ninhos de tartaruga
(P.expansa) foram encontrados em praias de areia grossa, algumas com pedregulhos e,
até mesmo no barro (no lago do Tucunaré, Igarapé dos Currais), tendo uma média de
85,0±12,7 ovos.
Verificou-se que os tracajás, ao desovarem na areia, distanciam-se mais da água,
chegando até próximo a vegetação, fazem covas mais profundas e menos largas que no
barro, isso talvez se deva ao fato de a areia ser mais fácil para cavar, bem como as covas
são mais distantes da água para evitar a umidade, já que a areia possuiria uma maior

30 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

capilaridade e, são mais fundas para garantir uma temperatura mais baixa (figuras 15 A e
B). No barro, as covas são mais próximas da água e da vegetação (na grande maioria dos
casos no meio do capim), contudo, a argila retém melhor a umidade (figura 15 C). Fazem
covas rasas para reduzir a umidade excessiva. Na areia, os pitiús desovam em covas mais
profundas (figura 15 D) que as dos tracajás, contudo o fazem mais próximo da água, longe
da vegetação, por não possuírem as mesmas habilidades do tracajá para andarem em
terrenos mais íngrimes.
O tempo médio de incubação, na areia foi :para tracajás = 57,9 ±2,7 dias (mínimo=54;
máximo=65); para pitiús = 59,2±3,3 dias (mínimo= 46; máximo= 66); e para tartaruga =
57,7±5,7 dias (mínimo= 53; máximo= 64). No barro, os ovos de tracajá tiveram um tempo
de incubação de cerca de 63,9±2,3 dias (mínimo= 62; máximo=71). Para irapucas o tempo
de incubação foi em torno de 65±2,6 dias. O tempo de incubação é maior para pitiús do
que tracajás e tartarugas.

Figura 15: A) e B) Tracajá (P.unifilis) fazendo ninho e desovando na areia. C) Tracajá desovando
na várzea no meio do capim. D) Iaçá ou pitiú (P.sextuberculata) desovando na areia da praia
da Aliança, Lago do Piraruacá.

Os filhotes, ao nascerem, foram colocados em berçários (tanques de alvenaria,


gaiolas de madeira e tela, tanques-rede, caixas d’água), sendo que a taxa média de eclosão
na areia para tracajás foi de 85,6 ±18,2%, para pitiús de 83,6±57,9%, para tartarugas de
67,1±22,1% e para irapucas 86±26,1%. No barro, a taxa de eclosão para tracajás foi de
53,7±13,7%. A reduzida taxa de eclosão no barro foi motivada pelo acúmulo de água e
umidade no fundo dos ninhos, por causa da impermeabilidade da argila. Os filhotes, muitas

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Manual para os gestores ambientais

vezes, já estavam prestes a sair do ovo, mas com as chuvas, a cova ficava inundada e os
filhotes morriam afogados dentro dos ovos. Alguns ninhos foram salvos, colocando-se
capim e folhas secas no fundo, e afofando-se novamente a terra. Outra solução encontrada
foi evitar as chocadeiras no barro, fazendo caixas de areia com uma camada de 40 cm de
areia no local de transplante dos ninhos.
Covas naturais de tracajás e pitiús na areia, tiveram uma taxa de eclosão inferior a
das covas transferidas , 37,7 e 55,5 % contra 85,6 e 83,6%, respectivamente. Acredita-se
que isso se deva, em parte, a predação de ovos e filhotes por larvas de Dípteros (moscas)
das famílias Sarcophagidae e Ephidridae, encontradas em vários ninhos naturais. No barro,
a presença das larvas se deu em número muito menor e não houve problema de pisoteio,
sendo a taxa de eclosão das covas naturais de cerca de 95,5%. O maior predador de ninhos
naturais nas comunidades do projeto, depois do homem, foi o jacuraru ou téiu (Tupinambis
teguixin). Nos ninhos transferidos, tivemos problema apenas com um cachorro que entrou
uma noite no cercado de proteção da Aliança - Lago do Piraruacá e comeu os filhotes e
ovos de duas covas, e também com ataque de mucuras (Didelphis marsupialis).
Na maioria da áreas do projeto, os ninhos transferidos tiveram maior taxa de eclosão
e sobrevivência de filhotes do que as covas naturais.
Os tracajás apresentaram uma taxa de ovos inférteis de 3,4±3,3% e os pitiús,
4,2±14,1%. Quanto aos ovos gorados ou inviáveis, os tracajás apresentaram uma taxa de
15,7±12,8% e os pitiús, 22,2 ±22,1%.
Os tracajás nasceram medindo, em média, 39,3±1,7 mm de comprimento de
carapaça, os iaçás com 40,5±2,4 mm e as tartarugas com 46,9±1,4 mm. Os tracajás pesaram
em média 14,9±1,4 g, iaçás 14,3±1,8 g, tartarugas 22,5±1,4g e calalumãs, 11,2±2,6 g. Os
filhotes que nasceram em covas transplantadas para o barro foram maiores (comprimento
da carapaça = 39,8±0,9 mm), mais pesados (peso=15,6±0,2 g) e menos pigmentados do
que aqueles que nasceram na areia (comprimento da carapaça=39,0±2,2 mm;
peso=14,3±1,7 g). Até os dois meses de vida, os tracajás que nasceram no barro tiveram
um ganho diário de peso (GDP) de 0,05 g/dia enquanto que os que nasceram na areia
tiveram um GDP=0,08 g/dia. Os iaçás tiveram GDP=0,06 g/dia e as tartarugas, GDP=0,15
g/dia.

Uso e etnoconhecimento sobre quelônios nas comunidades ribeirinhas

O nível de relação entre o caboclo ribeirinho amazônico e os quelônios existentes


em sua região parece estar diretamente ligado a importância que cada espécie ocupa
como possível fonte de alimento ou renda. Quanto maior a utilização e consumo de uma
determinada espécie de quelônio, maior o grau de conhecimento sobre características
biológicas e ecológicas sobre a espécie. Para analisarmos este nível de conhecimento local

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Manual para os gestores ambientais

e compará-lo com os resultados dos levantamentos de fauna tradicionais, realizamos um


diagnóstico sobre os quelônios e seus usos em algumas áreas aonde o Projeto Pé-de-
pincha tem atuado.
O diagnóstico foi fundamentado em entrevistas com os comunitários das áreas
visitadas com a utilização de pranchas das espécies, e identificação e biometria de cascos
ou quelônios cativos trazidos pelos comunitários. A utilização dessa metodologia de
entrevistas/diagnóstico e sondagem nas comunidades pode ser uma ferramenta muito
útil a ser utilizada pelos gestores ambientais como um método de levantamento rápido
que possibilitará uma avaliação preliminar da situação dos quelônios na sua unidade ou
área protegida.
Procuramos utilizar o etnozooconhecimento dos comunitários locais, para realizar
a identificação das possíveis espécies de quelônios encontradas. Posteriormente,
associamos os dados de captura de animais na natureza, animais de cativeiro e biometria
de carapaças encontradas nas casas.
Entre 2004 e 2005 foram aplicados 136 questionários em famílias de comunidades
rurais da Serra de Parintins e do rio Andirá em Barreirinha. Através destes foram
identificadas 13 espécies de quelônios na região, das quais 15,1% nos rios, 11,9% nos
lagos e 11,5% nas florestas. Alimentam-se de peixes (23%), frutos (22%) e plantas (20%).
Seus ovos são na maioria amarelados e compridos, tracajás colocam 32,6 ovos, tartarugas
115,8 ovos e cabeçudos 19,4 ovos. As espécies mais consumidas foram os tracajás (55%),
jabutis (21%) e cabeçudos (10%). Eram usados para consumo da carne e como remédio
(banha, 36,9%), artesanato (carapaça, 27,1%), sendo capturados com malhadeira (27%),
espinhel (17%) e arpão (16%). Nas comunidades, 47,7% afirmavam que esses animais eram
comercializados, ao preço médio de R$20,2/tracajá e R$83,5/tartaruga (Andrade et al,
2005; Oliveira et al., 2006).
Em 2005 e 2006, fizemos o levantamento na Resex do Baixo Juruá. Foram aplicados
52 questionários em 11 localidades/comunidades. Estes questionários foram
acompanhados de cópias coloridas de pranchas de identificação de quelônios amazônicos.
Ao entrevistado foram feitas perguntas como “dentre quais daquelas espécies das imagens,
ele conhece e quais já viu na região?”. Marcadas as espécies existentes, o entrevistador
fez perguntas sobre o local onde o entrevistado viu determinada espécie, de que ele se
alimenta, quando reproduz, onde põem seus ovos, o tempo de incubação e demais
perguntas contidas no questionário. Verificou-se que a preferência alimentar pelas famílias
usuárias da RESEX do baixo Juruá são respectivamente: tracajá (Podocnemis unifilis),
tartaruga (Podocnemis expansa), Jabuti amarelo (Geochelone denticulata), iaçá
(Podocnemis sextuberculata), tartaruga de igapó (Phrynops raniceps) e matá-matá (Chelus
fimbriatus). Os subprodutos utilizados na medicina tradicional são: Banha da tartaruga –
para confecção de creme para a pele e cabelo, rendidura (hérnia escrotal) e dor muscular;

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Manual para os gestores ambientais

Chá da escama da carapaça do jabuti – para tosse, asma e assadura, se o paciente for
homem tem que ser de jabuti fêmea e vice-versa; Chá da escama assada da carapaça do
Matá-Matá – para assadura; Carapaça – de capitari (macho da tartaruga), de tracajá e de
iaçá - é usada como comedouro p/ animais domésticos e principalmente para remover a
massa de mandioca para o forno na casa de farinha. As espécies de quelônios mais
comercializadas na cidade de Juruá e na RESEX são: tracajá R$25-30,00, tartaruga R$200,00
ou R$4,00 o quilo, iaçá R$5-6,00, existem muitos regatões na margem do rio Juruá
navegando em chalanas (barcos regionais movidos com um rabetão de popa ao invés de
um motor de centro), eles transportam os quelônios para comercializar na cidade de Juruá,
Fonte Boa, Tefé, Manacapuru e Manaus-AM. Muitos comunitários também levam e vendem
pois há comércio nas próprias comunidades, mas não é tão intenso como na cidade
(Andrade et al., 2006; Oliveira et al., 2006).
Os comunitários do Baixo Juruá identificaram 10 espécies de quelônios entre os
animais mostrados nas pranchas coloridas: Podocnemis expansa (tartaruga, 14%),
Podocnemis unifilis (tracajá, 14%), Podocnemis sextuberculata (iaçá, 13%), Peltocephalus
dumerilianus (cabeçudo, 5%), Rhinoclemmys punctularia (perema, 11%), Platemys
platycephala (jabuti-machado, 2%), Geochelone denticulata (jabuti amarelo, 14%),
Geochelone carbonaria (jabuti vermelho, 8%), Chelus fimbriatus (matá-matá, 13%) e
Phrynops raniceps (lálá ou tartaruga de igapó, 6%). Verificou-se que a designação ou
nomenclatura popular é diferenciada de outros locais da Amazônia pois eles chamavam
de perema a P.nasutus no lugar da Rhinoclemmys punctularia, chamavam de lálá a Platemys
platycephala no lugar da P.gibus e da P.raniceps, e chamavam de tartaruga de igapó é a
Phrynops raniceps que era chamada só de lálá em outros lugares (Andrade et al., 2006).
No Médio Amazonas, em Parintins e Barreirinha, Oliveira et al. (2006) dos 136
questionários aplicados em 4 comunidades, e identificaram 13 espécies de quelônios:
tartaruga (Podocnemis expansa), tracajá (P.unifilis), iaçá (P.sextuberculata), irapuca
(P.erytrocephala), cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus), aperema (Rhinoclemmys
punctularia), lalá (Phrynops nasutus), muçuã (Kinosternon scorpioides), jabuti (Geochelone
denticulata e G.carbonaria), matá-matá (Chelus fimbriatus) e Phrynops spp.(2 espécies).
Andrade & Nascimento (2005), aplicaram 45 questionários em 9 comunidades na Resex
Médio Juruá e identificaram 8 (oito) espécies de quelônios : P. expansa (16%), P.unifilis
(16%), P. sextuberculata (16%), P. dumerilianus (4%), R. punctularia (11%), G.denticulata
(16%), G. carbonaria (5%) e C. fimbriatus (16%). Verifica-se que, ao contrário dos mamíferos,
é reconhecida uma maior diversidade de quelônios no leste do Estado do Amazonas,
provavelmente, em função de uma diversificação maior dos ambientes aquáticos como
grandes rios de águas preta e praias de areia branca e fina misturando-se a ambientes de
grandes várzeas inundáveis da calha do Médio Amazonas. Essa influência se faz notar em
ambientes como os da região do Andirá.

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Manual para os gestores ambientais

Posteriormente, tanto para as áreas do Médio Amazonas (Barreirinha e Parintins),


quanto para o Médio e Baixo Juruá, foram confirmadas, através de estudos de captura de
exemplares de diferentes espécies de quelônios, que os comunitários haviam acertado
100% das espécies de quelônios existentes em sua região (Andrade, 2012), o que garante
que este tipo de diagnóstico preliminar das espécies através de entrevistas com pranchas
poderia ser utilizado como ferramenta de pesquisa com relativo grau de confiabilidade.
Entre 2013-2014, realizamos este mesmo diagnóstico nas unidades de conservação
estaduais no entorno da rodovia BR-319. Foram aplicados 15 formulários de identificação
de quelônios por comunitários na Floresta de Canutama e áreas no entorno (Aramiã,
Caratia/Pamafari, Belo Monte, APA Jamanduá). Também foram aplicados 15 questionários
na Resex Canutama: Nova Aliança, Glória, Boca do gavião, Vista Alegre,Colégio, Meio
Mundo, Sacado do Axioma, Espirito Santo, São Braz, Mapicari e Santa Barbara. Na Floresta
Tapauá foram aplicados 22 formulários nas comunidades de Trevo, Mangueirão,
Castanheira, Jacinto, Igarapé do Angelim, Baturité, Jatuarana, Nova Olinda, Primavera,
Mata Fome, Porto Central, Novo Brasil, Porto Pinheiro, Ponta do Inajá e Saudade. NA RDS
Madeira foram aplicados 22 formulários para as comunidades dos seis pólos (vide tabela
I em anexo). Na RDS Igapó Açú foram aplicados 14 questionários na sede da comunidade
(margem direita e esquerda do rio Igapó Açú), no Jacarétinga (Fundiária) e no Jará (Sapatu).
Na Floresta Canutama, tracajás(P.unifilis), tartarugas(P.expansa) e jabutis amarelo
(C.denticulata) foram as espécies mais citadas pelos entrevistados (100%).
cabeçudo(P.dumerilianus), Perema (R.punctularia) e tartaruga de igapó (P.raniceps) foram
as espécies menos conhecidas, sendo citadas em apenas 20% dos questionários. Na Resex
Canutama foram citadas 10 espécies de quelônios como existentes na unidade. Entre os
entrevistados 100% responderam que existem tracajás (P.unifilis), tartarugas(P expansa) e
iaçás (P.sextuberculata), sendo razoavelmente conhecidas jabuti (C.denticulata),
lalá(P.nasuta), mata-matá(C.fimbriatus) e cabeçudo (P.dumerelianus). Perema
(R.punctularia), tartaruga de igapó(P.raniceps) e o jabuti vermelho(C.carbonaria) foram as
espécies menos encontradas citadas (10% das afirmações). Na Floresta Tapauá, cabeçudo
e tracajá foram as espécies mais conhecidas (95,5% e 86,4% ,respectivamente). Perema e
jabuti-vermelho foram as espécies menos conhecidas, citadas apenas em 18,2 e 9,1% dos
questionários. Foram identificadas 11 espécies de quelônios na RDS Madeira (tracajá, iacá/
pitiú, tartaruga, matámatá, jabuti amarelo, cabeçudo, lalá, jabuti machado, muçuã,
aperema e Phrynops). Verificou-se que o tracajá foi identificado como a espécie mais
ocorrente nesta área (19,64%), seguido do iacá/pitiú (16,96%), tartaruga (15,18%),
matámatá (13,39%), jabuti amarelo (11,61%) e cabeçudo (8,04%). O gênero de quelônios
com menor freqüência foi Phrynops, sendo identificada apenas uma vez durante todo o
levantamento (0,89%). Dos animais identificados na RDS Igapó Açú os mais citados foram
tracajás e cabeçudos, ambos com 30,2%, seguidos da lalá (11,6%), mata matá (9,3%). Os

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Manual para os gestores ambientais

menos citados foram o jabuti amarelo (2,3%) quelonios terrestre encontrado na floresta
local, e a tartaruga (2%) encontrada apenas em uma localidade muito distante chegando
em uma área onde moram descendentes de índios.
Quanto aos ambientes que frequentam na Floresta Canutama (figura 16), os tracajás,
tartarugas e iaçás são encontrados, em grande maioria, nos lagos e rios (40 a 60%) próximos
as comunidades. Para outras espécies foram citados outros ambientes, como para lalá as
áreas de igarapé (40%), para jabutis vermelhos e amarelos, as áreas de florestas de terra
firme (40-80%) e para o matá-matá, os chavascais (40%). Quanto ao hábito alimentar, a
maioria das espécies foram relatadas como consumidores de frutos (27%), peixes (17%)
plantas aquáticas (17%) e sementes (14%).
Na Resex Canutama, os lagos foram o citados como local de maior incidência de
tracajás (52,9%), tartarugas (47,1%) e iaçás (41,7%), também são citados neste ambiente,
em menor proporção o cabeçudo (33,3%). Habitam nos rios em maior quantidade iaçás e
tartarugas (41,7 e 41,2%). Nos igarapés foram citados a mata-matá, lálá e cabeçudo (42,9%,
33,3% e 33,3%). Na poças foram registradas, em pequenas quantidades, Lalás, Peremas e
Matá-matás. Nas praias temos registradas a presença apenas de tracajás, tartarugas e
iaçás. Na floresta temos a presença considerável dos Jabutis amarelo e vermelho e da
Perema (100 e 80%). No chavascal, temos em pequena quantidade lalá (8,3%), e em
quantidade maior o matá-matá (14,3%).
A figura 17 apresenta diferentes tipos de alimentos utilizados pelos quelônios que
foram citados pelos comunitários da Resex Canutama. Segundo eles, os quelônios
alimentam-se principalmente de frutos (35%), peixes (23%), plantas aquáticas (21%) e
sementes (20%). Os principais alimentos presentes na alimentação das espécies em ordem
decrescente são os frutos para tracajá, tartaruga, iaçá e jabuti; as plantas aquáticas ou
macrófitas para tartarugas e iaçás; o peixe para tartarugas, lálás e matá-matás. E flores e
insetos, consumidas pelos tracajás.
Na Floresta Tapauá, foi relatado que a tartaruga pode ser encontrada mais em rios
(91,7%) e lagos (66,7%), assim como o tracajá (84,2%) e a iaçá (100%). O jabuti amarelo foi
citado como 100% encontrado na floresta de terra firme, mas o jabuti vermelho foi 100%
na floresta e nas campinas. A matá-matá foi citada em lagos e rios (41,7%), igarapés (33,3%)
e chavascais (25%). O cabeçudo foi citado mais em lagos (90%) e P.raniceps mais em igapós
(57,1%). O P.gibbus foi relatado em igarapés (75%) e chavascais (50%). Quanto ao hábito
alimentar, a maioria das espécies foi relatada como consumidores de frutos (75,9%), peixes
(60,6%), plantas aquáticas (42,1%) e sementes (31,2%). Tartarugas e iaçás consumiriam
principalmente frutos (84,6 e 80%) e plantas aquáticas (30,8 e 60%).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 16: Habitat Tracajá (Podocnemis unifilis), Tartaruga (Podocnemis expansa), Iaçá
(Podocnemis sextuberculata), Jabuti (Chelonoidis sp), cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus) e
Mata mata (Chelus fimbriatus) na Floresta Canutama. (Fonte:Andrade et al, 2015).

De acordo com os comunitários, na RDS Madeira os quelônios são encontrados


principalmente nos rios e chavascais (ambos com 17%), depois em lagos, igarapés e praias
(ambos com 15%), o ambiente onde os quelônios são menos encontrados são as poças
(8%). Considerando a espécie de quelônio, foi diagnosticado que os tracajás vivem princi-
palmente em rios e lagos, mas também são encontrados em igarapés e praias. As tartaru-
gas são mais encontradas em lagos e praias e por último nos rios. Os iaçás preferem rios,
praias e lagos. Os cabeçudos são encontrados apenas em lagos. Muçuãs vivem em ambi-
entes de chavascal, e também, mas em menor proporção, em poças de água. Os matámatás
vivem principalmente em poças e igarapés, porém podem ser encontrados também nas
cabeceiras dos rios. Os jabutis machado vivem em igarapés e poças, e finalmente os jabutis
amarelos são encontrados na floresta. Foi diagnosticado que a alimentação dos quelônios
é bastante diversificada, eles se alimentam de peixes, sementes, plantas, frutos, flores e
insetos, o que demonstra o caráter onívoro da nutrição das espécies de quelônios. Porém,
verificou-se que os quelônios alimentam-se principalmente de peixes (22%), plantas (19%),
sementes (19%) e frutos (18%). Ao relacionar a preferência alimentar com a espécie, ob-
servou-se que o matámatá alimenta-se principalmente de peixes. O muçuã prefere comer
plantas aquáticas e sementes. O jabuti amarelo tem preferência por plantas e frutos. O
iaçá se alimenta mais de peixes, frutos e sementes. A tartaruga tem maior preferência por
peixes, plantas sementes e frutos. O tracajá se alimenta principalmente de peixes, e de-
pois de plantas.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 17: Hábito Alimentar de Quelônios: Tracajá – (Podocnemis unifilis), Tartaruga-


(Podocnemis expansa), Iaçá – (Podocnemis sextuberculata), Cabeçudo – (Peltocephalus
dumerilianus), Aperema – (Rhinoclemmys punctularia), Jabuti amarelo – (Chelonoidis
denticulata), Jabuti vermelho – (Chelonoidis carbonária), Mata matá – (Chelus fimbriatus) na
Resex Canutama (Fonte: Andrade et al. 2015).

Na RDS Igapó Açú os quelônios são encontrados, principalmente, nos lagos (43,5%)
e rios (27,4%) próximo as comunidades do Jacaretinga e Igapó Açu, sendo também cita-
dos em igarapés e cabeceiras (1,6%), poças (4,8%), praias (8,1%), chavascais (4,8%), cam-
pinas (1,6%) e igapós (1,6%). O tracajá é encontrado principalmente em lagos (41%) e rios
(41%). O Cabeçudo foi citado mais em lagos (44%), rios (12%) e igarapés (13%). A Lalá foi
citada em lagos (33%), chavascal, poças e igarapés (17% cada). As iaçás foram registradas
apenas no lago Grande (67%) e no rio (33%). As peremas são citadas em poças (33%) e
chavascal (33%) e no próprio rio 34%. A tartaruga e a irapuca em 100% das vezes foram
citadas no rio, e o mata matá em 100% das vezes são encontrados em lagos. Quanto a
alimentação dos quelônios, os moradores da RDS Igapó Açu, dizem em 51% das vezes que
os quelônios ingerem frutos, peixes (25%), plantas aquáticas (20%) e flores e sementes
(ambas 2%). Tracajás, cabeçudos e jabutis comem principalmente frutos.
Segundo Andrade et al. (2006), entre os ambientes habitados pelos quelônios na
Resex Baixo Juruá foi observado que para os comunitários a maioria das espécies vive em
rios, lagos, igarapés e cabeceiras (exceção do jabuti que vive na floresta) . Essa opinião é
similar ao Médio Juruá, onde segundo os moradores 66% dos quelônios habitariam em
lagos, rios e igarapés (Andrade & Nascimento, 2005). No Médio Amazonas, uma maior
diversidade de habitats foram citados, mesmo assim verifica-se uma predominância de
15,1% nos rios, 11,9% nos lagos e 11,5% nas florestas (Oliveira et al, 2006).
Na Resex Médio Juruá, segundo Andrade & Nascimento (2005), os comunitários
informaram que os quelônios se alimentavam principalmente de flores (21%), frutos (17%),

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Manual para os gestores ambientais

sementes (17%), insetos (15%) e peixes (13%). Oliveira et al. (2006), registraram que no
Médio Amazonas, os ribeirinhos observaram que os quelônios alimentavam-se de peixes
(23%), frutos (22%) e plantas (20%).
Em 2014, Garcez et al. conseguiram identificar a composição da dieta de Podocnemis
unifilis, P. sextuberculata e P. expansa no rio Juruá, através de capturas foram realizadas
no período da cheia e seca. Dos quelônios capturados foram coletados o conteúdo esto-
macal por meio de lavagem estomacal. Verificou que para o P. unifilis, os itens alimentares
mais importantes foram os frutos (41,54%), folhas (21,93%), caules, trocos e talos (16,77%),
raízes (5,93%), e outros itens (13,83%). P. sextuberculata durante a cheia se alimentaram
de sementes (54,74%), folhas (13,65%), material vegetal não identificado (8,70%), frutos
(8,37%), raízes (4,47%) e outros (12,88%), comendo quantidades mínimas de peixes, crus-
táceos, moluscos e insetos. P. expansa tiveram como itens principais na alimentação os
frutos (44,61%), seguido de folhas (17,35%), sementes (15,49%), caules, trocos e talos
(12,10%) e outros itens (13,83%). Para tracajás, no Médio Rio Amazonas, Garcez et al.
(2012) observaram que na cheia, os animais ingeriram folhas (36,42%), raízes (27,49%),
caules (18,78%), sementes (7,88%) e outros itens (9,43%) e na seca foram folhas (63,80%),
moluscos (11,33%), caules (7,96%), raízes (4,70%) e outros itens (12,21%).
Desta forma podemos verificar que, além da importância que os comunitários dão
ao recurso faunístico, influi também sobre o grau de conhecimento sobre os hábitos de
cada espécie pelo morador local, a abundância deste recurso. Ao comparar-se o nível de
similaridade entre a lista de alimentos proposta para os tracajás pelos moradores de co-
munidades do rio Juruá (área com muitos quelônios) e pelos moradores do Médio Amazo-
nas (área com populações de quelônios menos abundantes) e os dados reais de pesquisa
obtidos da coleta do conteúdo estomacal destes animais por Garcez et al (2012, 2014).
Verificou-se que os comunitários do Juruá acertaram mais itens do que come o tracajá do
que os comunitários de Parintins e Barreirinha, no Médio Amazonas.
A tabela 1 apresenta o número médio de ovos por ninho das diferentes espécies de
quelônios reconhecidas pelos comunitários da UC monitoradas e sua possível época de
postura.
O número médio de ovos e o período de postura de tartarugas, tracajás e iaçás na
RDS Madeira foram semelhantes aos registrados por Andrade (2008) para o tabuleiro do
Nazaré em Manicoré. No Baixo Juruá, o número médio de ovos por espécie, registrados
pelos comunitários foram para tracajá (30,59 ovos), tartaruga (130,14 ovos), iaçá (12,2
ovos), cabeçudo (28,3 ovos), Jabuti (6,1 ovos), matá-matá (13,5 ovos) e tartaruga de igapó
(9 ovos) – Andrade et al. (2006). No Médio Juruá, Andrade & Nascimento (2005) registra-
ram as seguintes médias de ovos por ninhos : tartaruga=122,5 ovos; tracajá=27,4 ovos;
iaçá=7,9 ovos;cabeçudo=5 ovos; jabuti=8,8 ovos; matá-matá=12,5 ovos. Essas médias,
foram inferiores as encontradas no Baixo Juruá, principalmente, para os Podocnemis, o

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Manual para os gestores ambientais

que provavelmente, resulta da influência maior, nessa região, de quelônios do rio Solimões,
que são animais muito maiores que a média dos animais da calha do Juruá (Andrade et al.
1999). No Médio Amazonas, a médias de ovos por ninho foi similar. Em média, tracajás
colocam 32,6 ovos, tartarugas 115,8 e cabeçudos 19,4 (Oliveira et al, 2006).

Tabela 1. Estimativa dos comunitários para o número médio de ovos por espécie de
quelônios nas unidades de conservação monitoradas (PIUC) (Fonte: Andrade et al., 2015).

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Manual para os gestores ambientais

O período informado pelos moradores para as principais espécies, corresponde aos


dados de produção nos tabuleiros (Andrade, 2001) da reserva, sendo que, para outras
espécies não há uma definição de época específica ou, realmente, desovam o ano inteiro.
O período de pico de desova nas praias (julho-agosto) e similar ao Médio Juruá e mais
cedo que no Médio Amazonas (outubro).

Preferência e utilização dos quelônios

No Médio Amazonas, os quelônios mais consumidos são os tracajás (55%), jabutis


(21%) e cabeçudos (10%) (Oliveira et al. , 2006). No Médio Juruá, as espécies preferidas
são o tracajá (31%), tartaruga (26%), jabuti (17%), iaçá (16%). No Baixo Juruá verificou-se
que, nas três regiões pesquisadas, o preferido foi o tracajá (43%). Em segundo lugar, de-
pendendo da abundância ou não do recurso no local, vêm a tartaruga (13%). Em locais
onde existem poucas tartarugas, a preferência recai sobre o jabuti (15%). O iaçá, apesar
de ser o mais abundante, não está entre os três preferidos (12%)
Ao verificar o gosto e a preferência alimentar dos comunitários pelos quelônios na
Floresta Canutama, observou-se que em sua grande maioria, eles preferem consumir a
tartaruga (17%), pelo tamanho e sabor. Porém, não gostam tanto de seus ovos, preferindo
os ovos de tracajás e iaçás (13%). A captura destes animais para o consumo é feita, princi-
palmente, com o uso dos seguintes petrechos : jaticá (30%); malhadeira (20%), arrastão
(10%), puçá (10%) e outros métodos para captura, como mergulho, pegar na praia, espinhel
e outras tipos de armadilha. (30%). Além do consumo, é muito comum usar o quelônios
para outros fins, como reaproveitamento dos cascos para pegar massa em casa de farinha
(33%), ou mesmo armazenar alguns subprodutos, como depósito de água servindo de
bebedouro para animais, a banha destes animais é usada para confecção de remédios
(50%), ou em casos mais raros, utilizar na iluminação com lamparinas. Algumas pessoas
usam os cascos para produzir artesanato, como é o caso dos escudos de times de futebol
que são pintados nos cascos, servem de enfeites para as residências (17%). A comerciali-
zação dos quelônios é uma realidade dentro da Floresta Canutama. Entre as pessoas en-
trevistadas, 80% afirmam comercializar este produto da fauna, justificando que não cos-
tumam pescar, porém estes animais ficam presos nas suas redes de pesca. E acabam rea-
lizando a venda para terceiros, como outros moradores do local, visitantes ou barcos que
passam pelo local. A tartaruga é vendida por R$133,00/unidade, o tracajá a R$63,00/
unid. e o iaçá por R$ 15,00/unidade. Dos quelônios comercializados na Floresta Canutama,
cerca de 50% são vendidos nas próprias comunidades, 25% vão para as cidades mais pró-
ximas e 13 % para regatão.
Na Resex Canutama, os comunitários preferem consumir o iaçá (18%) pelo sabor,
em seguida o tracajá (16%), ficando a tartaruga apenas em terceiro na escolha dos comu-

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Manual para os gestores ambientais

nitários. Também gostam muito de comer jabutis (C.denticulata) – 11%. Mas os ovos pre-
feridos são os ovos de tracajá (14%) são os primeiros na preferência popular, só em segui-
da escolhem-se os ovos de iaçá (13%). Para capturar os quelônios, os comunitários prefe-
rem a malhadeira (33%), sendo que 17% usam o Jaticá, 6% o espinhel e 6% o caniço para
pesca ou captura de quelônios. Cerca de 39% dos entrevistados indicaram que usam ou-
tros métodos para captura, como mergulho, pegar na praia (viração) e outros tipos de
formas de captura. Os cascos dos quelônios também são usados para pegar massa em
casa de farinha (40%), e a banha destes animais para remédio (10%). Cerca de 30% afir-
maram comercializar este recurso. Os preços médios praticados na venda ilegal de
quelônios na Resex Canutama variam conforme a espécie: Tracajá: R$ 57,5±11,9/unidade
e R$1,00/ovo; tartaruga=R$122,3±33,6/unidade; Iaçá=R$15,4±4,9/unidade e R$1,00/ovo.
As tartarugas por alcançarem preços bem mais elevados, normalmente, são vendidas para
pessoas de fora, como comerciantes e donos de embarcações que estão de passagem
sendo 42% destinado para as cidades, enquanto apenas 42% são comercializados na pró-
pria comunidade.
Na Floresta Tapauá, o quelônio preferido para consumo é o cabeçudo (90,9%), pelo
tamanho e sabor, seguido do tracajá (72,7%). Porém, não gostam tanto de ovos de cabe-
çudo (54,5%), preferindo os ovos de tracajás (68,2%). A captura destes animais para o
consumo é feita, principalmente, com jaticá (30%); malhadeira (20%), arrastão (10%), puçá
(10%) e outros métodos para captura, como mergulho, pegar na praia, espinhel e outras
tipos de armadilha. (30%). Os comunitários utilizam os cascos para pegar massa em casa
de farinha (58%) e como comedouro para animais (13%), sendo que 29% usam a banha
como remédio. Cerca de 80% dos entrevistados afirmaram que comercializam quelônios.
Os preços variaram de R$200,00 a tartaruga, R$50,60 o tracajá. R$29,70 o cabeçudo e
R$20,00 o iaçá. Dos quelônios comercializados na Floresta Tapauá, cerca de 88,9% são
vendidos nas próprias comunidades, 55,6% vão para as cidades mais próximas e 33,3 %
para regatão.
Na RDS Madeira aproximadamente 10 espécies de quelônios são consumidas na
alimentação pelos comunitários. O tracajá é a espécie mais consumida demonstrando um
percentual de consumo de 17,5% para os ovos e 14,17% para o bicho. A tartaruga é a
segunda espécie mais consumida, quando se leva em consideração o bicho (13,33%). Já o
iaçá é a segunda espécie que tem os ovos consumidos (8,33%). Lalá, jabuti amarelo,
aperema, cabeçudo e matámatá são as espécies menos consumidas. Verificou-se ainda
que Phrynops raniceps é consumido apenas através de seus ovos, e que muçuã somente a
carne.A figura 18 apresenta a preferência dos comunitários para consumo de quelônios.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 18:Espécies de quelônios consumidas pelos comunitários na RDS Madeira. (Fonte:


Andrade et al., 2015)

Na RDS Madeira a malhadeira é a forma de captura mais utilizada pelas comunida-


des (29,69%), seguida do arpão e espinhel (15,63%), as formas de capturas menos fre-
quente são por jaticá, caniço e flecha (ambos com 4,69%). Os cascos dos quelônios são
usados para fazer artesanato com a carapaça dos bichos (42%) e o uso da banha desses
animais como remédio é outra forma frequente de consumo (33%), as carapaças de
quelônios também pode ser utilizadas como pegador ou pá (17%) e como comedouro
para outros animais (8%). Dos entrevistados 81% disseram comercializar espécies de
quelônios na RDS Madeira, contra apenas 19% que não comercializam esses animais. En-
tre os quelônios comercializados, tartarugas, tracajás e iaçás, são as espécies de maior
interesse para a comercialização. A tartaruga é o quelônio que possui maior procura, por-
tanto o mais valorizado, de tal forma que o preço da unidade pode variar de 100 a 500
reais de acordo com o tamanho do bicho. Tracajá e iaçá, neste caso, são os quelônios
menos comercializados, o preço da unidade do tracajá varia de 25 a 50 reais, e do iaçá de
15 a 30 reais. Os quelônios são comercializados principalmente nas próprias comunida-
des, onde ocorrem 50% da comercialização, a segunda forma mais frequente de comerci-
alização de quelônios é através de regatão (25%) e ainda 18% dos animais são vendido nas
cidades e 7% nas balsas.
Na RDS Igapó Açu, os comunitários afirmaram que consomem ovos de duas espéci-
es de quelônios: tracajá e cabeçudo. Porem 71% de pessoas consomem principalmente
ovos de tracajá e 29% afirmam consumir ovos de cabeçudo. Entre os entrevistados, 58%
afirmam preferir comer o tracajá, 26% o cabeçudo, 11% o jabuti amarelo e apenas 5%
consomem a lalá. Observou-se que nesta UC 28,6% dos moradores utilizam malhadeiras
para capturar quelônios, 28,6% mergulham em locais onde estes animais normalmente
ficam, 14,3% preferem apanhar na praia no período noturno, pois os bichos colocam seus
ninhos e o caçador aproveita para também coletar os ovos dos ninhos, 14,3% utilizam um

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Manual para os gestores ambientais

petrecho de captura chamado espinhel, outros 7,1% para capturar quelônios colocam
uma linha com anzol e alguns moradores ainda preferem métodos tradicionais como o
arco e flecha 7,1%.

Figura 19: Formas de captura de quelônios na RDS Igapó Açu.


(Fonte: Andrade et al, 2015).

A carapaça do deste animais são usadas para artesanato 34%, e em locais que exis-
te a fabricação de farinha 33% das pessoas utiliza o casco como pegador ou pá e 33%
reaproveitam os cascos como uma espécie de cuia.Como o comercio de quelônio e proibi-
do, as pessoas entrevistadas preferiram não responder tal questão, ou mesmo fizeram
afirmação duvidosa, porém 50% das pessoas afirmaram não existir comércio destes bi-
chos no local, mas 36% indicaram que o comércio existe e 14% preferiram não responder
o questionamento. Daqueles que afirmaram haver comércio ilegal de quelônios verificou-
se que o valor médio para o tracajá foi de R$ 31,25 podendo ser maior, em caso de com-
pradores de fora da localidade e o cabeçudo obteve um preço médio de R$ 23,00. A co-
mercialização dos quelônios e também dos seus ovos e feita em 91% na própria comuni-
dade, e o restante para pessoas que estão passando na estrada. Entre os bichos que foram
consumidos na localidade 86% eram fêmeas e apenas 14% machos. Na comunidade Igapó
Açu, obteve-se um valor médio 3,6 ninhadas consumidas por cada família, o que seria o
equivalente a um valor de, aproximadamente, 78 ovos de tracajá consumidos no período
de um ano entre 2012 e 2013.
No Médio Amazonas, os quelônios mais consumidos são os tracajás (55%), jabutis
(21%) e cabeçudos (10%) (Oliveira et al., 2006). No Médio Juruá, as espécies preferidas
são o tracajá (31%), tartaruga (26%), jabuti (17%), iaçá (16%).
Andrade & Nascimento (2005) verificaram que os petrechos mais utilizados na “pes-
caria” de quelônios no Médio Juruá são a malhadeira, o arrastão, o arpão e o jaticá (40%).
Já no Médio Amazonas, com uma maior diversidade de ambientes de captura, principal-

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Manual para os gestores ambientais

mente, com captura em igapós, várzea baixa e capinzal, são utilizados a malhadeira (27%),
o espinhel (17%) e o arpão (16%) – Oliveira et al. (2006). No Baixo Juruá foi a malhadeira
(28,8%), arrastão (18,2%), o jaticá (15,1%) e o espinhel (9,1%) (Andrade et al., 2006).
Na Resex Baixo Juruá, 41,4% usam a banha de quelônios como remédio e 48,3%
usam o casco como pegador ou bacia para descansar a massa da farinha. Foi relatado que
o casco do jabuti torrado, diluído em água e tomado em jejum pela manhã, combate a
hemorroida. A banha da tartaruga é usada para bronquite. No Médio Amazonas, Oliveira
et al. (2006) também registraram que, além do consumo de carne, os quelônios são utili-
zados como remédio (banha, 36,99%) e artesanato (27,05%). No Médio Juruá, essa utili-
zação como remédio cai para apenas 28% (Andrade & Nascimento, 2005).
Andrade et al. (2006) mediram carapaças de quelônios utilizadas como utensílios
no Baixo e no Médio Juruá. Da biometria dos cascos de quelônios utilizados nas casas de
farinha ou como bacias, verificamos que a maioria são de iaçás (75%) que, de modo seme-
lhante a Resex Médio Juruá, são mais utilizados por serem mais abundantes, sendo que, a
preferência é pelo casco de tracajá por ser maior e comportar mais massa de farinha,
facilitando o preparo. Os cascos de iaçás medidos apresentaram comprimento de carapa-
ça médio em torno de 26,1±2,17 cm, os de tartaruga 31,1 cm e os de tracajá 33 cm, ou
seja, a maior parte da predação humana recai sobre animais adultos em fase reprodutiva,
o que amplia o impacto da extração de quelônios pelos comunitários sobre seus estoques
naturais.
No Baixo Juruá, Andrade et al. (2006) observaram que o preço de uma tartaruga
era de cerca de R$123,33±4,3/unidade, do tracajá era de R$34,1±8,4 e do iaçá era de
R$3,9±1,3, sendo que o cento do ovo de tracajá girava em torno de R$20,00 e os de iaçá
em R$15,00. No Médio Juruá, o tracajá custava R$18,12±5,9, a tartaruga R$90,0±40,8, o
iaçá R$3,75±2,6 e o jabuti R$10,87±5,3 (Andrade & Nascimento, 2005). No Médio Amazo-
nas, segundo Oliveira et al (2006), o preço médio era de R$20,17/tracajá e R$83,48/tarta-
ruga.
Os preços de quelônios no Baixo Juruá são relativamente mais caros quando com-
parado aos de outras regiões. Os elevados preços podem ser explicados por três fatores:
a) o isolamento da cidade do Juruá torna os gêneros alimentícios muito mais caros que
em Carauari, Parintins e Barreirinha, sendo que, esta elevação geral, acaba atingindo in-
clusive, os produtos da fauna silvestre que são caçados no local; b) assim como acontece
com o peixe, onde a maior parte do pescado e os espécimes de maior peso, são vendidos
para barcos recreio e enviados para grandes centros (Manaus e Tefé), também, acontece
com os quelônios, onde os animais capturados são guardados em currais e vendidos, sob
encomenda para barcos de outras regiões, principalmente, Manacapuru; c) redução nos
estoques das populações de tartarugas e tracajás, com redução da oferta frente uma de-
manda crescente.

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Manual para os gestores ambientais

No Baixo Juruá, cerca de 63,64% dos comunitários comercializavam quelônios, sen-


do que, 47% são vendidos para cidade, 35% para comunidade e 8% para os regatões.
Percentual inferior a Resex Medio Juruá, onde cerca de 100% dos comunitários informa-
ram haver comércio de quelônios na reserva (Andrade & Nascimento, 2005). No Médio
Amazonas, apenas 47,73% comercializavam (Oliveira et al, 2006).
Recomenda-se que seja incluído no Plano de Manejo e na Gestão das Unidades de
Conservação, o apoio e o monitoramento das áreas de reprodução de quelônios nela
existentes ou também no entorno da unidade. Recomenda-se que o monitoramento dos
trabalhos de conservação dos quelônios seja feito em parcerias com universidades e ins-
tituições de pesquisa para que realizem também o levantamento dos parâmetros de es-
trutura e dinâmica das populações locais de quelônios como medidas efetivas para avali-
ação da eficiência das ações de conservação e manejo de tartarugas, tracajás e iaçás.
Também, sugerimos que seja feito um diagnóstico junto com os comunitários sobre quais
espécies existentes, mapeamento participativo das principais áreas de vida dos quelônios
(praias e lagos de alimentação) e sobre a utilização dos quelônios pelas comunidades.

46 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Capítulo 2
Manejo ddo
os ttaabul
uleeiros
iro

Paulo Cesar Machado Andrade; João Alfredo Mota Duarte; Sandra Helena Azevedo;
Rafael Antônio Machado Balestra

Os quelônios são utilizados por populações ribeirinhas há centenas de anos. Ape-


sar do declínio populacional em localidades da Amazônia, eles têm grande importância
ecológica, além de cultural e alimentar nos modos de vida ribeirinhos, representando
importante alimento de subsistência, para as populações locais.
Tradicionalmente, utilizados como recurso alimentar pelos povos amazônicos (Cos-
ta, 1999; Andrade, 1988; Smith et al., 1979), tartarugas (Podocnemis expansa), tracajás
(Podocnemis unifilis), iaçás (P.sextuberculata) e suas praias de nidificação (tabuleiros) fo-
ram protegidas pelos antigos donos de seringais, principalmente, nos rios Purus e Juruá,
sendo posteriormente protegidas por comunidades de ribeirinhas. Onde o trabalho de
proteção de praia foi feito de forma participativa, envolvendo órgãos ambientais, prefei-
tura, comunidades e colaboradores, as atividades de conservação propiciaram a manu-
tenção de populações significativas destes quelônios aquáticos de extrema importância
ecológica e sócio-econômica (Andrade et al., 2008).
Para resgatarmos o histórico de luta para conservação de quelônios nas regiões dos
rios Purus (Lábrea, Canutama e Tapauá), Juruá (Juruá, Carauari, Eirunepé, Itamarati),
Madeira (Manicoré, Novo Aripuanã e Borba), Uatumã e Negro foram analisados relatóri-
os técnicos (1974-2014) do Projeto Quelônios da Amazônia/IBAMA (74) e analisadas au-
torizações de proteção de praia (138) concedidas pelos órgãos ambientais responsáveis
(entre 1964-2004). Essas informações serviram para caracterizar como eram feitas as ati-
vidades de proteção aos quelônios em grandes sítios de nidificação (tabuleiros), o que
passaremos a descrever neste capítulo, associando as novas diretrizes definidas pelo RAN
para o manejo conservacionista desses locais de reprodução.

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Manual para os gestores ambientais

Histórico do manejo realizado nos tabuleiros

Na segunda metade do século XIX, já era perceptível a redução das populações de


quelônios nos chamados tabuleiros (praias com grande quantidade de ninhos de tartaru-
gas, tracajás e iaçás) nas margens do rio Solimões/Amazonas e Negro, conforme registrou
Bates (1863) sobre a situação em Tefé. Apesar de as autoridades municipais elegerem
anualmente um responsável para supervisionar a coleta de ovos de tartarugas, chamado
de “comandante de praia real”, sua função era de contratar vigilantes para garantir a pro-
teção das fêmeas que desovavam e o registro dos principais dias de postura. Cabia, entre-
tanto, ao comandante de praia e seus vigias, a renda com a captura de tartarugas e tracajás
em lagos e poças próximos ao tabuleiro, bem como, arrecadar uma taxa das famílias que
vinham as praias nos dias por ele determinados para coletar os ovos e fabricar o óleo (o
valor dessas taxas custeava o serviço de vigilância).
Néri (1884) registrou que além de pegar de forma predatória os ovos para extração
do óleo ou manteiga, as pessoas também pegavam os filhotes para comer. Para coibir essa
prática, o Governo da Província do Amazonas criou em 1º de junho de 1882, uma lei que
proibia a captura e consumo dos filhotes de tartaruga e ordenava às municipalidades que
ocupassem as praias durante os quatro meses de seca, com um pequeno destacamento
de polícia, prevendo severas penas para as contravenções constatadas.
Durante o Ciclo da Borracha, a exploração organizada dos seringais nativos, princi-
palmente nos altos rios (Purus e Juruá), era comandada pelos donos dos seringais (serin-
galistas) que organizaram um sistema de exploração econômica, cujo alcance, atingia ou-
tras riquezas naturais além do látex extraído pelos seringueiros. Dessa forma, foi estabele-
cido por boa parte dos seringalistas, um sistema de exploração desse recurso que era, na
verdade, uma adaptação do sistema de exploração comandado pelos portugueses nos
tabuleiros e pesqueiros reais da Companhia de Pesca. Escolhia-se a praia mais produtiva,
ou parte dela, e ela era demarcada com bandeiras vermelhas, que indicavam que naquela
área não se poderiam retirar nem ovos e nem animais que estivessem desovando. Em
outras praias, ou parte delas, colocavam-se bandeiras brancas que indicavam que nestes
locais poderia ser feita a coleta de ovos e quelônios (Andrade, 2008; Derickx, 1994; Andrade,
1988).
O sistema de proteção dos tabuleiros e as técnicas de conservação e manejo de
quelônios desenvolvidas nos seringais seriam mais tarde utilizadas pelo Instituto Brasilei-
ro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) nos trabalhos iniciais de conservação da tartaruga
da Amazônia (Portal e Bezerra, 2013; Andrade, 2015, 2012 e 2008; Andrade, 1988).
Quem organizava e coordenava esse sistema de exploração dos tabuleiros era o
chamado “capitão” ou “comandante” de praia, que instalava as bandeiras e realizava os
serviços de vigilância da praia, conferência dos ninhos, retirada dos ovos e captura das

48 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

tartarugas e tracajás. Os registros dessa atividade, normalmente, eram feitos pelo gerente
ou capataz do seringal, sendo a contabilidade desse sistema, bem eficiente, apontando,
principalmente, a quantidade de ninhos de tartarugas e tracajás colocados em cada tabu-
leiro (Derickx, 1994; Benchimol, 1977).
De qualquer forma, há que se reconhecer que esse sistema de conservação/explo-
ração dos quelônios foi a única forma de controle presente nos rios do Amazonas até
1967, quando foi promulgada a Lei de Proteção à Fauna (Lei No.5.197/67), sendo todo o
sistema feito por proprietários/seringalistas e pelos comunitários ribeirinhos sob seu co-
mando, sem qualquer recurso ou apoio governamental, a não ser o simples papel de au-
torizações que eram concedidas. Foi graças a esse sistema que muitos tabuleiros com
grandes populações de quelônios foram mantidos principalmente nos rios Purus e Juruá.
O próprio IBDF passou a utilizar o sistema de sinalização com bandeiras e distribuía duas
bandeiras oficiais de demarcação de praias junto com a autorização para zelar por elas.
Apenas, em 1976, com recursos do POLAMAZÔNIA, é que o IBDF (Instituto Brasileiro de
Desenvolvimento Florestal) começou a não só emitir as autorizações, mas também a envi-
ar equipes para acompanhar e fiscalizar esses trabalhos de proteção, preferencialmente
para as áreas levantadas em 1974 por Alfinito (1978).
A partir desse levantamento que identificou mais de 500 sítios de desova de
Podocnemidideos na Amazônia, os chamados tabuleiros (praias de nidificação de
quelônios), o Governo Federal criou, em 1979, um programa de proteção, surgindo o Pro-
jeto de Proteção e Manejo dos Quelônios da Amazônia (PQA), coordenado pelo IBDF (Por-
tal e Bezerra, 2013; IBAMA, 1989).Além da sinalização com bandeiras, outras técnicas dos
capitães de praia foram utilizadas pelo IBDF como o uso de chamas1, a marcação de ninhos
e a retirada manual dos filhotes para contagem e posterior soltura em lagos, etc. É nesse
período que iniciou-se a fase ou sistema de proteção de quelônios realizada pelo Governo
Federal no Amazonas. Mas, apenas algumas áreas seriam protegidas somente pelo gover-
no, sendo que boa parte delas continuariam a ser protegidas pelos proprietários ou mora-
dores locais somente com o acompanhamento do governo, não perdendo, portanto, seu
caráter de gestão compartilhada na conservação de quelônios (Andrade, 2015).

Metodologia de trabalho de conservação nos tabuleiros de quelônios

Atividades preliminares ao período de nidificação


O trabalho de conservação de quelônios, na maioria dos locais de proteção no
Amazonas, é realizado de forma voluntária pelos ribeirinhos, moradores das comunida-

1
Chamas ou chamariz: machos de tartaruga e tracajás que eram colocados em gaiolas de ferro ou de madeira na margem do
tabuleiro para atraírem as fêmeas para desovar na praia.

Paulo Cesar Machado Andrade 49

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Manual para os gestores ambientais

des localizadas próximas aos tabuleiros de preservação. Nos rios Purus e Juruá, no final de
maio e começo de junho, no início da vazante, são realizadas viagens para monitorar a
saída dos quelônios adultos dos lagos de alimentação para a calha do rio. É importante
proteger os animais nessa fase de seu ciclo de vida pois, durante esse período de migra-
ção, os animais podem ser capturados em grande quantidade com o uso de redes de
emalhar, arrastões e capa-sacos nos canais estreitos (sacados, furos, paranás) por onde
passam dos lagos de alimentação para o rio principal. Em algumas áreas de proteção, são
instalados flutuantes nesses locais de passagem pelos gestores, a fim de que, seja realiza-
do um trabalho de vigilância e fiscalização nesses locais reduzindo a possibilidade de cap-
tura ilegal de quelônios.
Com o apoio de universidades ou instituições de pesquisa, neste período podem
ser realizados levantamentos dessas populações de quelônios, através da captura, marca-
ção e biometria dos animais nos locais próximos aos tabuleiros.
No final de junho, realizam-se reuniões nas comunidades onde se esclarece nova-
mente aos comunitários as razões para a preservação dos tabuleiros, verifica-se o interes-
se destas comunidades e se define quais comunitários que atuarão na proteção dos tabu-
leiros, os materiais necessários e sua forma de compensação.
Nestas reuniões é salientado que a ação de preservação é uma atividade de toda a
comunidade e não somente das pessoas encarregadas de realizar a vigilância dos tabulei-
ros, sendo acordado que os vigias ou monitores de praia terão o apoio de toda a comuni-
dade para a realização das atividades em que for necessária a mobilização de várias pes-
soas e no apoio nas suas atividades diárias na comunidade, devido a sua longa permanên-
cia no tabuleiro neste período.
O trabalho de vigilância dos tabuleiros é realizado pelos ribeirinhos, através da cons-
trução de uma base (normalmente uma casa de madeira coberta de palha) na margem
oposta do rio, onde está localizado o tabuleiro; desta forma os vigias possuem uma base
para que possam permanecer durante o dia e a noite. Também nesse período (julho-
agosto nos rio Purus e Juruá) devem ser sinalizadas as praias protegidas instalando-se
placas, faixas ou bandeiras.

Atividades durante o período de nidificação dos quelônios

O trabalho de preservação consiste na vigilância dos tabuleiros para: a) Evitar a


invasão por estranhos para a retirada de ovos e a coleta de animais desovando; b) Marca-
ção das covas dos animais para o controle do número de animais que desovam em cada
praia e o controle da data de eclosão dos filhotes. Sendo também realizado através de
fichas o controle do número de animais que desovaram nas praias, números de filhotes
que nasceram e que morreram e de ovos não eclodidos.

50 Paulo Cesar Machado Andrade

MANUAL 2.pmd 50 15/12/2016, 16:40


Manual para os gestores ambientais

Para registrar os dados de postura durante o período de nidificação, diariamente,


pela manhã, de 5 às 9 horas, os monitores realizam a procura ativa dos ninhos de tartaru-
ga (P.expansa), tracajás (P.unifilis) e iaçás (P. sextuberculata), a partir dos rastros deixados
no local de nidificação. Todos os ninhos devem ser contados, registrados e, se possível,
preferencialmente marcados. Os ninhos devem ser marcados com piquetes de madeira
(25-40 cm) onde será registrado a sigla da espécie (por exemplo, TA=Tartaruga; TR=tracajá;
IA=iaçá), o número do ninho na ficha de controle da postura e a data da postura. Serão
conferidos também o número de ninhos predados.
Às vezes, são tantos ninhos que se torna impossível contar todos ao longo da praia,
como por exemplo, em subidas e desovas massivas (arrojo) de iaçás. Nestes casos delimi-
tam-se quadrados de 50 m X 50 m no meio e nas pontas das praias e, contam-se somente
os ninhos nesses quadrados. Com essa contagem podemos estimar a densidade média de
ninhos de iaçás por metro quadrado (ninhos/m2). Para estimar a produção total da praia,
basta multiplicar a densidade média de ninhos pela área total da praia (m2).
Para cada ninho serão registrados necessariamente os seguintes dados: data de
oviposição e a espécie. Caso seja possível relacionar às pegadas próximas ao ninho encon-
trado, será medida também, a largura do rastro (a distância interna entre as patas), para
correlação, posterior, com os dados do ninho e a estimativa do tamanho da fêmea.
Para obtermos dados das características dos ninhos e número médio de ovos por
ninho/espécie, sugere-se que sejam escolhidos, aleatoriamente 30 ninhos por espécie
(ou 10% do total de ninhos) como ninhos amostrais. Nesses ninhos, além do registro da
espécie e da data de postura, abre-se o ninho e registra-se também, o número de ovos, a
profundidade total do ninho e sua largura, a distância do ninho para água; distância do
ninho para a vegetação mais próxima; tipo de vegetação próxima ao ninho; tipo e textura
do substrato; a inclinação (declive) da superfície da praia ou a altura do ninho em relação
ao nível d’água do rio. A cada cinco ninhos registrados abertos para cada espécie, pode-
mos aproveitar para ao fazer a conferência do número de ovos, realizar a medição e pesa-
gem de pelo menos 15 ovos daquele ninho (ou o total de ovos do ninho quando a quanti-
dade for menor que 15).
Nem sempre é possível marcar os ninhos com piquetes, pois em alguns lugares
podem atrair a atenção e facilitar a ação de outras pessoas que queiram retirar os ovos.
Em outras áreas, torna-se impossível marcar os ninhos porque existem tantas tartarugas
desovando no local que elas desenterram os piquetes e ovos. Nesses casos, normalmente
se espera o fim da desova e se cerca os principais pontos de postura na praia (normalmen-
te as tartarugas concentram a maior parte dos ninhos em três ou quatro locais em uma
praia). Posteriormente, quando os filhotes nascem, realiza-se a contagem dos filhotes para
estimar depois, o número de ninhos colocados naquela praia.

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Manual para os gestores ambientais

Em áreas de manejo comunitário, onde se trabalha com transferência de ninhos,


eles serão levados para praias artificiais (as chamadas “chocadeiras”), que nada mais são
do que áreas de praia mais próximas às comunidades e que ficarão protegidas por um
cercado evitando a coleta clandestina dos ninhos pelo homem e os predadores naturais.
Neste caso, os ninhos que forem encontrados em praias naturais serão coletados pelos
comunitários em caixas de isopor de 24,5 litros, imediatamente após serem encontrados.
As diferentes praias ou locais de desova da P.expansa, P.unifilis e P.sextuberculata, serão
percorridas, diariamente, durante 30 dias no período de nidificação, sendo que os ninhos
serão coletados entre 5 e 10 horas da manhã. Para cada ninho que será translocado serão
feitos os mesmos registros dos ninhos naturais. Os procedimentos de transferência dos
ninhos desde a coleta dos ovos até o transplante para as “chocadeiras” são os mesmos
descritos por Andrade et al. (2005, 2004) e Andrade (2012). Em algumas praias de manejo
comunitário, com maior segurança, não serão transplantados pelo menos 30 ninhos, que
serão mantidos cercados individualmente, para comparação com os dados dos ninhos
transplantados.
Sugere-se que, durante todo período de postura e na eclosão sejam realizadas ainda
mais duas viagens de monitoramento populacional, uma no pico da desova (final de agosto,
começo de setembro) e outra durante a eclosão dos filhotes (início de novembro). Depen-
dendo dos acordos locais entre os gestores, as instituições colaboradoras e os monitores de
praia, normalmente, nessas viagens é que serão distribuídos os auxílios alimentação e veri-
ficados os dados relacionados às fichas de acompanhamento dos tabuleiros.

Atividades durante o período de eclosão ou nascimento dos filhotes

No período da eclosão dos filhotes, o trabalho dos vigias de praia é redobrado, pois
além de vigiar a praia para evitar possíveis saqueadores é necessária a contabilização dos
filhotes de tartarugas e tracajás recém eclodidos.
Nos locais onde é possível marcar todos os ninhos com piquetes, os monitores po-
dem através da data de postura colocada no piquete, verificar, após 50-60 dias se o ninho
já apresenta sinal de afunilamento. Com a saída dos filhotes dos ovos e sua movimenta-
ção, a areia do túnel da câmara do ninho começa a ceder e isso, fica visível externamente,
sendo um sinal de que naquele ninho, os filhotes já nasceram. Nestes casos, os monitores
abrem os ninhos e realizam a contagem dos filhotes vivos, filhotes mortos (natimortos),
ovos inviáveis (gorados e/ou fungados), ovos inférteis (são ovos sem desenvolvimento
embrionário aparente e que ao final da incubação, não estão podres, mas parecem que
são novinhos), ovos de gordura ou de óleo (ovos muito grandes ou avermelhado, peque-
nos e murchos, que só possuem a clara). Esses dados são registrados na ficha de eclosão.
O número total de filhotes vivos dividido pelo número total de ovos do ninho (somatória

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Manual para os gestores ambientais

de filhotes vivos + ovos gorados/fungados + natimortos + ovos inférteis e ovos de gordura)


vezes 100 nos dá a taxa de eclosão daquele ninho. Os filhotes vivos são soltos imediata-
mente após a contagem.
Em áreas com um número muito grande de ninhos, ou seja, os tabuleiros não se faz
mais a abertura manual de todos os ninhos, os filhotes nascem e saem naturalmente de
seus ninhos (o que normalmente ocorre de madrugada) e vão direto pra água (38,1% das
áreas no Amazonas). Para podermos estimar uma média da taxa de eclosão dos ninhos,
após o término do período de postura, devemos cercar, aleatoriamente, 30 ninhos de
cada espécie para que se possa fazer o registro dos dados de eclosão. Outra estratégia,
como já foi mencionado anteriormente, é fazer cercas nos locais de maior concentração
de ninhos para posterior, captura e contagem dos filhotes recém-eclodidos e, soltura ime-
diata na própria praia e margem do rio. As cercas serão feitas com tela plástica, tipo sombrite
e estacas de madeira, e terão cerca de um metro de altura, e terão por objetivo proteger
o ninho e os filhotes da predação e evitar que eles cheguem imediatamente na água antes
de serem contados. Quando nascem milhares de filhotes simultaneamente, torna-se difí-
cil, inclusive conta-los, sendo uma boa estratégia, colocá-los em caçapas plásticas e confe-
rir o número de caçapas para cada espécie. Uma caçapa plástica de 20 litros pega 200
filhotes de tartaruga e 300 filhotes de tracajás/iaçás.
Em alguns tabuleiros (25,1% no Amazonas), ao invés de deixar que os filhotes vão
direto para água, e sejam atacados pelos predadores que estão na margem da praia (aves
aquáticas, urubus, gaviões, garças, maguaris, jacarés e peixes como pirarara, surubim, aruanã,
piranha, tucunaré), os monitores conferem os filhotes, e os transportam para o outro lado
do rio ou lagos, em uma margem distante dos predadores, com bastantes macrófitas e vege-
tação aquática para os filhotes se esconderem. Às vezes, os monitores levam esses filhotes
diretamente para os lagos de alimentação, onde sabem que os quelônios adultos e juvenis
estarão durante o período da cheia. Carregam esses filhotes em sacos, sobem o barranco da
várzea, e vão colocar esses filhotes em lagos isolados com bastante vegetação aquática,
onde presumem que estes filhotes ficariam mais protegidos.
Anualmente, algumas comunidades realizam uma festa ou gincana de soltura dos
filhotes, atividade esta que é uma ferramenta de educação ambiental importante para
apresentar o trabalho dos agentes para sua comunidade. Nas comunidades onde vai ocor-
rer a gincana ecológica-cultural, alguns filhotes são transferidos para berçários que são
construídos pelos comunitários e colocados em locais, geralmente lagos, onde não há a
ação de predadores e é possível a vigilância dos mesmos.
Estes berçários são confeccionados em tela com armação em madeira medindo 1,5
m X 2 m X 1,4 m (volume de 4m3), o que possibilita abrigar cerca de 500 filhotes recém
eclodidos, sendo que estes filhotes permanecem nestes por um período que varia de uma
semana a dois meses; este é o período necessário para que os filhotes adquiram maior

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Manual para os gestores ambientais

resistência diminuindo a sua taxa de mortalidade por predação. Após permanecerem nos
berçários (o que ocorre em 36,7% das áreas no Amazonas) os filhotes são soltos em um
lago para que possam se desenvolver.
A maioria dos filhotes, contudo, sai naturalmente de seus ninhos, indo direto para
o rio. Nestes casos, é feita apenas a contagem dos filhotes vivos, natimortos, ovos gorados
e ovos estéreis, para o cálculo da taxa de eclosão média de cada espécie/praia. Durante
todo este período os vigias possuem um papel fundamental, garantindo a segurança dos
animais contra os predadores. Mesmo sem contar com as condições ideais de apoio, na
maioria das vezes, baseados nas experiências do conhecimento tradicional das popula-
ções locais, o trabalho desenvolvido pelos monitores de praia contribuiu para a proteção
e o crescimento das populações de quelônios da região, o que demonstra a capacidade e
o interesse dos comunitários por esta atividade.

PROTOCOLO SIMPLIFICADO DE MANEJO DE PRAIAS

O protocolo básico definido pelo RAN para as ações de manejo conservacionista de


sítios reprodutivos de quelônios (Balestra, 2014) é bem parecido com o roteiro de ativida-
des de proteção de tabuleiros que previamente descrevemos e que já ocorrem nos tabu-
leiros do Amazonas em unidades de conservação ou fora delas. Passaremos a seguir a
listar os principais pontos do protocolo do RAN a serem observados e, se possível, execu-
tados pelos gestores ambientais de áreas protegidas com sítios reprodutivos de quelônios
amazônicos:

TEMA 1- PROTEÇÃO

1. Diagnósticos das áreas e épocas que demandam ações de proteção (áreas de


ocorrência, vetores de pressão, comunidades e calendário de eventos)
– Justificativa: para embasar as ações de planejamento e operacionalização das
ações de fiscalização.
– Metodologia: levantamentos de informações diversas sobre a realidade das es-
pécies e das ameaças para a elaboração de mapas e calendários de ações. Integrar com
Mapeamento Participativo da identificação de áreas de desova. Considerar o ciclo
hidrológico, os movimentos sazonais e períodos críticos sobre as épocas de maior captura
ilegal de quelônios.
– Periodicidade: elaboração idealmente em um ano, revisão constante preferen-
cialmente.

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Manual para os gestores ambientais

2. Promover ações de fiscalização


- Justificativa: coibir ilícitos ambientais e perturbações das áreas de reprodução de
quelônios por meio de ações de rotina da UC e também mediante Operações de Fiscaliza-
ção conjunta com outros órgãos ambientais (IBAMA, secretarias estaduais e municipais
de meio ambiente; polícia federal ou polícia ambiental). Orientações à população através
de reuniões, palestras, distribuição de cartazes e folders.
- Metodologia: realização de fiscalização de rotina e incluir na elaboração do Plano
de Proteção Anual de ações relativas ao calendário construído no diagnóstico. Em conso-
nância com o Plano de Proteção devem-se elaborar os planejamentos das operações de
fiscalização contempladas. Nas operações de fiscalização, sempre que possível, orientar
os fiscais a registrar a quantidade de animais por espécie (não somente generalizar
“quelônios”) e identificar quantos machos e quantas fêmeas. Se possível fazer uma
amostragem de no mínimo 30 indivíduos por espécie, medindo o comprimento e largura
da carapaça e o peso desses animais apreendidos. Sugerimos que o gestor realize um
treinamento rápido dos agentes de fiscalização antes ou durante a operação de fiscaliza-
ção para que os fiscais saibam identificar as principais espécies, o sexo e saibam medi-los
e pesá-los.
- Periodicidade: ações contempladas no calendário e/ou aquelas que demandas
eventualmente, como denúncias, demandas do Ministério Público.

2.1 – Avaliar a possibilidade de colaboração de trabalho voluntário comunitário nas


atividades de proteção. Caso não seja possível, viabilizar uma forma de contratar agentes
de praias, utilizando, por exemplo, contratos temporários como por exemplo o modelo
aplicado aos brigadistas nas UC em que os agentes de praias podem resolver as situações.
2.2 – estabelecer um grupo de fiscalização itinerante, para atuar na proteção dos
tabuleiros, envolvendo fiscais de regiões onde a seca ocorre em diferentes épocas do ano.
Criar uma rede de contatos de gestores e agentes de fiscalização todos os estados ou da
região, e que tenham afinidade para o trabalho de fiscalização envolvendo quelônios.
Formar equipes mistas de fiscais e contratados.

3. Apoiar a vigilância comunitária voluntária


- Justificativa: importância do envolvimento dos comunitários no trabalho com
quelônios para a manutenção dos recursos
Metodologia: Realizar reuniões e palestras de sensibilização nas comunidades; tra-
balhar a organização comunitária; seguir as orientações base para o trabalho voluntariado;
capacitar os comunitários; acompanhar os trabalhos periodicamente; fornecer condições
logísticas para a execução das atividades de campo; realizar a avaliação participativa.

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Manual para os gestores ambientais

4. Integrar e fomentar ações de proteção dos quelônios, em níveis intra e


interinstitucionais
- Justificativa: Necessidade de coordenar as ações entre as Unidades, otimizando os
recursos financeiros e humanos. Sugerimos que sejam buscadas parcerias e recursos além
das competências somente dos órgãos ambientais (IBAMA, ICMBio, SEMAs) para conse-
guir uma conservação efetiva. Integrar ações de proteção entre unidades de conservação
federais, estaduais e municipais.
- Metodologia: Planejamento integrado entre as Unidades, prioritariamente na
mesma região, e entre os órgãos envolvidos. Nas operações de fiscalização das equipes
itinerantes de fiscalização promover a integração com as instituições parceiras. Estabele-
cer uma ação conjunta com o ICMBio Sede ou Secretaria Estadual de Meio Ambiente para
articulações interinstitucionais.
- Periodicidade do Planejamento: Anual

5. Propor normativa para subsidiar acordos junto às comunidades com vistas ao


uso de subsistência dos recursos
- Justificativa: ordenar o uso racional dos recursos ambientais e estabelecer critéri-
os para realizar a fiscalização, baseado nos dispositivos legais e nos acordos de pesca.
- Metodologia: criação de grupos de discussão, audiências públicas.

6. Propor normatização específica para proteção e manejo de quelônios, inclusive


fora de UC
- Justificativa: propor a criação de uma norma específica para quelônios, inclusive
englobando áreas de interdição na época reprodutiva, para orientar o uso da área.
- Metodologia: criação de grupo de trabalho para elaboração de minuta, subsidia-
da pelas Unidades, incluindo áreas, restrições e épocas.

7. Ordenamento das atividades impactantes pertinentes as Unidades


- Justificativa: Diversas atividades que ocorrem na Unidade causam impacto aos
quelônios e precisam ser avaliadas e ordenadas adequadamente, como exemplo a visitação
e turismo, ou mesmo, o plantio e a pesca próximo as áreas de desova.
- Metodologia: Elaboração e/ou revisão de Planos de Manejo e outros Instrumen-
tos legais pertinentes.

8. Acompanhamento dos empreendimentos que impactam a Unidade


- Justificativa: com a diminuição da zona de entorno e a flexibilização das regras de
licenciamento alguns empreendimentos impactantes ficam fora da atuação do ICMBio,
sendo necessário acompanhar para tentar minimizar possíveis impactos.

56 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

- Metodologia: consultar junto aos órgãos licenciadores os empreendimentos exis-


tentes que tenham relação com a Unidade.

9. Controle
Realizar ações de controle ambiental junto às comunidades circunvizinhas a Unida-
de visando à minimização dos impactos.
- Justificativa: orientar as comunidades quanto à utilização correta dos recursos
ambientais, à legislação pertinente e orientação quanto a gestão da UC.
- Metodologia: visitas periódicas às comunidades

10. Sinalização
Instalar placas indicativas nas áreas consideradas estratégicas para proteção e manejo
- Justificativa: necessidade de informação, estabelecimento de identidade visual da
Unidade/Projeto.
- Metodologia: elaborar projetos específicos para fazer as placas para cada Unidade.

TEMA 2- MONITORAMENTO E MANEJO

Escolha dos sítios (praias) de desova – FASE 1:


Os locais com muitos ninhos de quelônios são chamados tabuleiros. Além do nú-
mero de ninhos são importantes na escolha da praia o interesse das comunidades para
proteção e a facilidade de acesso.

Paulo Cesar Machado Andrade 57

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Manual para os gestores ambientais

Justificativa: estimar a riqueza de espécies para definir as espécies de interesse.


Metodologia: Método indireto de pesquisa - Questionário – seguindo roteiro da
ficha 1 para o Levantamento do Potencial dos Tabuleiros ou outros modelos para entrevistas
mais detalhadas sobre o uso e o etnoconhecimento sobre cada espécie.

1) Inventariamento das espécies de quelônios nas UC’s


-Dados de apreensão de animais e dados históricos de algum trabalho de proteção
ou levantamento que tenha sido realizado na região são importantes para fornecer
informações sobre as populações, consumo;
- Junto com o questionário e avistamento deve ser apresentado um guia das espécies
para confirmação;
- Sempre que possível deve haver coleta e tombamento das espécies estudadas,
especialmente nas UC´s. Para essas esse tipo de ação, é importante que haja parceria com
instituições ou grupos de pesquisa;
- Criar um glossário regionalizado para as expressões comuns referentes a quelônios.
Periodicidade: entrevistas a cada 2 anos e/ou sempre que houver oportunidade; o
inventariamento deve ser continuo.

1.1.Espécies prioritárias para o monitoramento


1.1.1- Priorizar as espécies de Podocnemididae para pesquisa e monitoramento
Justificativa: as espécies de Podocnemididae (tartarugas, tracajás, iaçás, irapucas e
cabeçudos) são relevantes para o monitoramento devido a sua bioecologia, ampla
distribuição geográfica, pressão antrópica e importância econômica e simbólica nas
comunidades.
Para as demais espécies são prioritárias aquelas definidas por cada UC.
1.1.2. Definição de outras espécies que serão pesquisadas e monitoradas além das
espécies de Podocnemididae.
Metodologia:
a- Identificar quais são as espécies prioritárias conforme as listas oficiais de espécies
ameaçadas e avaliação da IUCN;
b- Identificar as espécies que recebem pressões que afetam diretamente as espécies
e/ou os sítios de reprodução, ou aquelas deficientes de dados.
c- Identificação das áreas ou sítios reprodutivos, áreas de forrageamento e pontos
de maior captura, que serão pesquisados e monitorados por espécie. Elaboração de Mapa
participativo com imagens de satélite e mapeamento sobre folha de acetato (transparente)
com base em entrevistas com comunitários. Em seguida, confirmação e priorização de
locais – ferramentas de georreferenciamento. Será realizado uma única vez ou conforme
critério da UC.

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Manual para os gestores ambientais

Com as informações obtidas nos dados históricos e do diagnóstico, devem ser


mapeadas as principais áreas de conservação serão visitadas para o levantamento de
quelônios e o monitoramento das áreas de reprodução destes animais nas unidades de
conservação. Para implementação ou consolidação do manejo e monitoramento
conservacionista de sítios de nidificação de quelônios devem ser realizadas as seguintes
etapas nas UC:
1. Diagnóstico e sensibilização nas comunidades: Março- Maio
2.Mobilização e capacitação dos monitores: Maio-Julho.
3.Monitoramento das praias e postura dos quelônios: rios Purus, Juruá e Solimões
(Julho-setembro); rio Madeira (final de agosto-início de outubro); Médio-Baixo rio
Amazonas e rios Andirá, Marau, Uatumã, Nhamundá e Trombetas (setembro-novembro);
rio Branco/afluente do rio Negro (dezembro-janeiro).
4. Monitoramento da eclosão/nascimento dos filhotes: rios Purus, Juruá e Solimões
(outubro-novembro); rio Madeira, Médio-Baixo rio Amazonas e rios Andirá, Marau,
Uatumã, Nhamundá e Trombetas (novembro-dezembro); rio Branco/afluente do rio Negro
(fevereiro-março).
5. Acompanhamento da soltura dos filhotes

2. Sensibilização e Mobilização das comunidades

Antes de iniciarmos as atividades de proteção dos ninhos de quelônios nas praias


de desova, devemos realizar a sensibilização das comunidades próximas através de:

Paulo Cesar Machado Andrade 59

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Manual para os gestores ambientais

REUNIÕES: para conversar com os comunitários sobre o interesse deles em proteger


os quelônios de sua região e verificar como eles podem colaborar com as atividades de
conservação.
CURSOS E PALESTRAS: para capacitar os comunitários para realizarem as atividades
de monitor voluntário de praia.

Figura 3: Reuniões para sensibilização dos comunitários em áreas com conservação de quelônios.

Figura 4: Oficina de capacitação em manejo comunitário de quelônios para os monitores e entrega de


certificados na comunidade do Axioma e Santa Bárbara, Resex Canutama.

3. Sinalização das Praias

Para garantir que os tracajás, tartarugas, iaçás ou pitiús, gaivotas e corta-águas


continuem botando seus ovos em paz. Algumas praias são protegidas pelos órgãos
ambientais e pelas comunidades. Estas praias devem ser sinalizadas para tentar impedir
que o homem persiga estes animais ou perturbe seu local de reprodução!
Modelos de placas e faixas de sinalização: As placas devem ter tamanho suficiente
para serem visualizadas de longe, e conter informações sobre o trabalho de proteção e a
legislação que garante a proteção

60 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Figura 5: Diferentes modelos de placas de sinalização: a) Placa de autorização de proteção de praia


concedida pelo IBAMA para a proteção do tabuleiro do Curuzu, Canutama; b) Placa de sinalização do
tabuleiro do Espirito Santo na Resex Estadual de Canutama;c) Placa do tabuleiro de Santa Bárbara na
Resex Canutama.

SINALIZAÇÃO COM BANDEIRAS: Antigamente se fazia a sinalização com bandeiras., quando


era vermelha, a praia ou parte dela era protegida.

Figura 6: Bandeira vermelha sinalizando praia interditada ou protegida na Resex Baixo Juruá – Amazonas.

4. Construção do acampamento dos monitores

O trabalho de proteção das praias começa no início do período de desova que vai
de julho a outubro dependendo da região. É quando os agentes ambientais voluntários
ou monitores de praia começam a construir seus acampamentos para vigiar a praia.
A construção pode ser tipo Tapiri situado em local com boa visualização da praia ou
barracão construído no barranco na margem oposta a praia em local mais alto que permite
a visão de todo tabuleiro. Casas ou flutuantes construídos na outra margem da praia
protegida perturbam menos os quelônios e gaivotas na praia.

Paulo Cesar Machado Andrade 61

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Manual para os gestores ambientais

Figura 7: a) Tapiri no Tabuleiro Espirito Santo na Resex Canutama, rio Purus. B) Flutuante do
IBAMA/PQA no tabuleiro de Walter Buri, Eirunepé/Itamarati, rio Juruá.

FASE 2 – Fase de nidificação, postura ou desova - O trabalho dos monitores de praia

A) Vigiar as praias de desova: Vigiar as praias de dia e de noite para evitar que peguem os
quelônios nas praias, durante a noite, virando-os na areia, ou capturando-os com arpão
ou redes de pesca na frente da praia ! Isso faz diminuir os bichos naquele local e afugenta
os que sobraram. Mas não é só isso que espanta da praia os quelônios...

Figura 8: a) Evitar passar com canoa com motor de popa ou rabeta próximo a margem do tabuleiro; b)
Evitar que outras pessoas além dos monitores fiquem pescando, andando ou focando na praia durante a
noite.

62 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

B) Ajudar a limpar a praia e evitar que algumas atividades sejam realizadas:


As pessoas que moram próximo podem ajudar limpando as praias antes do período
de desova! Evitar poluir as praias, derramando óleo ou combustível, agrotóxicos, ou mesmo,
jogando sacolas plásticas e lixo. Tudo isso afugenta os quelônios destas praias ! Evitar que
as pessoas utilizem os tabuleiros como área de lazer para jogar bola, tomar banho ou,
como ocorre em alguns lugares, no verão, as pessoas acampam e fazem festas nas praias,
assustando os pobres tracajás e tartarugas ! Devemos evitar também que pessoas realizem
pesca nas margens próximas aos tabuleiros (preferencialmente, deve-se estabelecer uma
distância de no mínimo 1.000 metros da praia.

Figura 9: a) ajudar a limpar a praia para facilitar a subida e a nidificação dos quelônios e aves
aquáticas; b) Evitar derramar óleo diesel, gasolina ou outros poluentes nas praias e na margem
do rio.

Figura 10: a) Evitar realizar atividades de lazer no tabuleiro como jogar bola, nadar, acampar,
fazer festas ou ouvir música alta; b) Entrar em acordo com os comunitários vizinhos para que
não seja feito nenhum tipo de criação animal (bois, porcos) ou plantio na praia de nidificação
– Gado bovino no tabuleiro de Deus é Pai, Resex Médio Juruá causando pisoteio de ninhos
de tracajá e iaçá.

Paulo Cesar Machado Andrade 63

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Manual para os gestores ambientais

CONTROLE E REGISTRO DA POSTURA EM TABULEIROS

5. Registro dos Dados de reprodução

5.1 Dados de postura

Justificativa: Facilidade de obtenção de dados de estrutura populacional com base


na disponibilidade do sítio reprodutivo.
Metodologia: Contagem direta e marcação de ninhos. Quando não for possível
marcar todos os ninhos, a marcação será feita em intervalos de classe (10 em 10). Se não
for possível a contagem e marcação sistemática, recomenda-se a contagem e marcação e
monitoramento realizados dentro das possibilidades, anotando-se o esforço amostral, dado
pelo número de dias/número de pessoas/área amostrada e/ou localidades.
Caso não seja possível a contagem direta, será estimado o número de ninhos com
base no número de ovos ou filhotes. Para isso é necessário saber o número médio de ovos
ou filhotes por ninho.
Para o desenvolvimento da metodologia, recomenda-se uma parceria com
pesquisadores em quelônios e/ou analistas do RAN.
Sugere-se nessa contagem a proteção de pelo menos 30 ninhos amostrais por
espécie.
Periodicidade: anual (estação reprodutiva)

A) Procura dos rastros e dos ninhos:


As tartarugas, tracajás e iaçás fazem seus ninhos e botam os ovos de noite. Pela
manhã podemos ver os rastros dos quelônios que subiram na praia de noite. Os monitores
devem sair bem cedo para procurar os rastros e registrar os ninhos.

Figura 11: a) Rastros de tartaruga no tabuleiro do Jamanduá/Canutama.b) Tartaruga


deixando seus rastros no tabuleiro do Manarian/RDS Uacari-Resex Médio Juruá/
Carauari.

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Manual para os gestores ambientais

Entre os meses de julho e setembro (rio Juruá e Purus) e Setembro e outubro (Baixo-
Médio rio Amazonas) os tracajás, as tartarugas e os iaçás fazem seus ninhos. As fêmeas
fazem um ninho ou cova cavando com as patas traseiras, onde fazem uma câmara na qual
depositam os ovos. Na manhã seguinte a desova, podemos procurar os ninhos através
dos rastros que os quelônios deixaram na areia. A pegada do tracajá é parecida com a
marca de uma tampinha de refrigerante (pincha) na areia, daí o nome pé-de-pincha!

Figura 12: Tracajá (P.unifilis) fazendo seu ninho em área com pedregulho e capim na Aliança, lago do
Piraruacá, Terra Santa/PA.

Figura 13: Tracajá (P.unifilis) fechando seu ninho na areia, na praia da Aliança, Piraruacá.

Figura 14: Rastros de tartaruga (P.expansa) e de tracajás (P.unifilis) deixados na praia da Aliança.

Durante o período reprodutivo dos quelônios, todos os dias, os agentes de praia,


comunitários ou membros da equipe do Projeto Pé-de-pincha andam na praia para anotar
o número de ninhos de quelônios colocados diariamente. Acham os ninhos, seguindo as

Paulo Cesar Machado Andrade 65

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Manual para os gestores ambientais

pegadas que os tracajás, tartarugas e iaçás deixam na areia. Cada espécie deixa um tipo e
tamanho de rastro ou pegada diferentes.
Os ovos das diferentes espécies de quelônios também são diferentes. Os da tartaruga
são esféricos como uma bolinha de ping-pong, possuem a casca branca e flexível. Os de
tracajá parecem uma elipse, tem a casca grossa, dura e não são branquinhos, às vezes, são
amarronzados, rosáceos, beges ou brancos. Os de iaçá ou pitiú tem o mesmo formato do
ovo de tracajá, mas são menores, sua casca é branca e mole.

Após a identificação dos ninhos, o ideal é marcar todos os ninhos com o piquete
com as informações no mesmo dia. Nem sempre isso é possível, ou porque tem muitos
ninhos, e se torna impossível marcar todos, ou porque, às vezes, isso acaba facilitando a
visualização e o retirada e predação dos ovos por outras pessoas.

Figura 16: Monitor marcando os ninhos com piquetes no tabuleiro do Manarian/Carauari;


Ninhos marcados no tabuleiro do Jamanduá/Canutama.

Às vezes isso é impossível porque desovam tantas tartarugas, que elas acabam
arrancando os piquetes e desenterrando os ovos de outros ninhos.

66 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Figura 17: Grande quantidade de tartarugas (P.expansa) acabam desenterrando e jogando os


ovos e piquetes de outros ninhos impossibilitando a marcação.

Nos casos em que não podemos marcar todos os ninhos:


a) Quando não é possível marcar todos os ninhos, nós contamos, todo dia, o número
de ninhos por espécie e registramos na planilha de campo.
b) No caso das iaçás, as vezes não dá para contar tudo, então nós podemos delimitar
três quadrados de 50 m X 50 m nas pontas e no meio da praia para estimar o número de
ninhos de iaçá por metro quadrado de praia (densidade). Depois determinamos a área da
praia e estimamos o número total de ninhos de iaçás.

Figura 18: “Arrojo” de iaçás :subida de centenas de animais para desovar (tabuleiro do
Joanico), como é impossível contar todos os ninhos, faz-se o balizamento da praia com
quadrados de 50 m X 50 m onde contamos os ninhos.

C) Registro dos Dados de reprodução:


- A marcação dos ninhos e o registro do número de ovos pode ser feita em intervalos
de classe (por exemplo de 10 em 10 ninhos).
- Sugere-se também a abertura individual de ninhos amostrais, pelo menos 30 por
espécie (ou 10% do total de ninhos).
Obs.: Deve-se registrar o esforço amostral, dado pelo número de dias/número de
pessoas/número de áreas amostradas.

Paulo Cesar Machado Andrade 67

MANUAL 2.pmd 67 15/12/2016, 16:41


Manual para os gestores ambientais

Caso não seja possível a contagem direta, pode ser estimado o número de ninhos
com base no número de ovos ou filhotes cercando-se as áreas escolhidas pelas tartarugas
para desova. Para isso é necessário saber o número médio de ovos ou filhotes por ninho.

Figura 19: Contagem de filhotes para estimativa do número de ninhos de P.expansa, no Abufari.

5.3. Registro do Número de ovos por ninho

Para estimar o número médio de ovos por ninho para cada espécie de quelônio que
desova no tabuleiro recomenda-se:
a) Abrir uma amostra de 30 ninhos por espécie ou, se tiver poucos ninhos, 10% dos
ninhos, para fazer a CONTAGEM DOS OVOS e a BIOMETRIA (medir e pesar todos os ovos
nos ninhos de iaçá e irapuca ou pelo menos 15 ovos nos ninhos de tartaruga e tracajá). Os
ovos devem ser pesados em até dois dias após a desova.
b)Morfometria do ninho (da amostra de 10% dos ninhos ou no mínimo 30 ninhos):
- Medir a profundidade até o último ovo e largura da câmara de postura. Medir a distância
do ninho para água e a largura do rastro da fêmea que desovou.

Figura 20: Contagem dos ovos e medição da profundidade de ninho de tartaruga no tabuleiro
do Jamanduá/Canutama.

68 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

5.3.1.Dados de ninhos naturais

Observação: Para os itens a seguir coletar uma amostra de 30 ninhos, sorteada a


partir do número de ninhos marcados e protegidos.
Justificativa: Avaliar os fatores que interferem no sucesso reprodutivo e razão sexual.
- Profundidade do ninho:
Metodologia:
- Utilizar régua ou trena para medir a profundidade total do ninho, ou seja, da
superfície até o substrato abaixo dos ovos, tomando o cuidado de não aprofundar o ninho
ao retirar os ovos.
- Nº. total de ovos/ninho;
Metodologia: Podemos conferir diretamente nos 30 ninhos amostrais abertos,
conseguindo então estimar uma média de ovos/ninho/espécie. Ou fazer isso após eclosão,
contando e somando as cascas, ovos inviáveis e não fertilizados, e filhotes mortos. Neste
caso devemos fazer isso na primeira verificação com 45 dias de incubação.

- Predação do ninho (parcial ou total) e identificação do predador:


Metodologia: Verificação de rastros, cascas, entre outros indícios, e se possível,
fazer o registro fotográfico do ninho para identificar o vestígio. Contagem dos ninhos
predados com base nos ninhos marcados.

5.4. Abertura do ninho, contagem dos ovos, registro das características do ninho e
biometria de uma amostra dos ovos

Medir a Profundidade total e a largura da câmara do ninho com trena, régua ou fita
métrica (em centímetros).
Medir a largura do rastro (distância interna entre patas) da fêmea que fez o ninho e
botou os ovos (sempre que seja possível identificar).
Medir com trena a distância do ninho pra água (verificar na margem do rio ou lago
o local de onde saiu o rastro da fêmea que botou o ninho).

Figura 21: Tomando medidas da largura e profundidade do ninho e da largura do rastro da fêmea.

Paulo Cesar Machado Andrade 69

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Manual para os gestores ambientais

Figura 22: Biometria de uma amostra de 15 ovos de ninho de P.expansa.

5.5. Estimativa do número de ninhos e total de ovos por tabuleiro e por espécie

Número total de Média de ovos dos Total de ovos


ninhos registrados x ninhos abertos = estimados

5.6. Registro dos dados da fêmea após a nidificação

Às vezes é possível encontrarmos as fêmeas de tartaruga, tracajá e iaçá fazendo


seus ninhos. Nestes casos, recomenda-se aguardar, pacientemente, que ela termine de
colocar os ovos para então virá-la de peito pra cima (viração) ou capturá-la e, na manhã
seguinte, bem cedo, fazer sua biometria e marcação, para em seguida soltá-las. Recomenda-
se uma amostra de 40 animais/espécie/local.

Figura 23: Tartaruga (P.expansa) desovando no tabuleiro do Jamanduá/Canutama e animal


capturado após a nidificação no tabuleiro do Manarian/RDS Uacari.

Tirar as medidas do quelônio bem cedo ou em local sombreado. Tomar medidas


retilíneas usando um grande paquímetro. Caso não tenha tire pelo menos com uma fita
métrica e anote medida curva. Pesar o animal com balança de mola.

70 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

5.6.1.Dados da fêmea após a nidificação

- Biometria da fêmea:
Justificativa: Conhecer a estrutura populacional
Metodologia: Quando possível priorizar o aferimento do comprimento e largura
máximo retilíneo da carapaça, peso e largura interna do rastro. O comprimento curvilíneo
pode ser realizado desde que o método utilizado seja informado. Recomenda-se uma
amostragem de no mínimo de 40 indivíduos/espécie para coleta de dados alométricos.
Peridiocidade: Anual

Figura 24: Tomando medidas do comprimento e largura do plastrão e peso de tartaruga


(P.expansa) no tabuleiro do Manarian/RDS Uacari.

Com os tracajás e iaçás captura-se a fêmea após a postura, identifica-se o animal e


o ninho, e no dia seguinte se faz a biometria e a marcação do animal e do ninho. São feitas
as medidas de comprimento e largura de carapaça e plastrão, altura, peso e idade. Depois
de pesado o animal é marcado com furos no casco ou plaquetas metálicas com numeração
serial fixadas com arrebite.

Paulo Cesar Machado Andrade 71

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Manual para os gestores ambientais

Figura 25: Medindo o comprimento e a largura de carapaça de tracajá (P.unifilis) e marcando com siste-
ma de furos nos escudos laterais da carapaça.

6. TRANSFERÊNCIA DE NINHOS – FASE 3

Em lugares onde os quelönios foram extremamente predados e existem poucos


ninhos espalhados e isolados em diversas praias, muitas vezes, é muito difícil colocar um
monitor para vigiar cada praia. Para evitar a retirada dos ninhos e dos ovos por outras
pessoas, sugere-se realizar a transferência dos ninhos para um local mais próximo e
protegido pela comunidade.
Em casos de ameaça de alagamento dos ninhos dos quelônios que estejam muito
próximos a margem dos rios, ou pelo efeito de repiquetes (subida repentina do rio), ou
das marés, também poderia ser utilizada a translocação desses ninhos para partes mais
elevadas na mesma praia ou para outras áreas protegidas.

Figura 26: Transferência de ninhos de P.expansa sujeitos a inundação no tabuleiro do


Manarian e do Jamanduá.

72 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

6.1 Dados de ninhos transferidos

Justificativa: Os ninhos serão transferidos apenas em casos especiais, tais como:


alta probabilidade de alagamento e/ou predação natural ou antrópica.
Metodologia: Transferência imediata dos ninhos nos casos das espécies de iaçá e
tracajá. A transferência deverá ser realizada nas horas mais frias do dia. No caso de
Podocnemis expansa, a transferência deverá ocorrer o mais tardiamente possível, a partir
de 28-30 dias.
A transferência deverá ser realizada preferencialmente em caixa térmica, com areia
do próprio ninho, evitando choques mecânicos (ver maior detalhamento sobre a técnica
de transferência ou translocação de ninho no capítulo 3).
Registrar:
- Identificação do sitio de origem - Descrição qualitativa
- Identificar e caracterizar o sítio de transferência - Descrição qualitativa
- Identificação do ninho transferido (nº. do ninho)
- Data da postura no sítio de origem
- Data da transferência

FASE 4: ECLOSÃO OU NASCIMENTO

7. MONITORAMENTO DO NASCIMENTO DOS FILHOTES – A ECLOSÃO

Cerca de 60 dias depois da postura, os filhotinhos saem dos ninhos, e correm em


direção a água. Normalmente, fazem isso de madrugada para fugir dos predadores que
estão na praia (aves, lagartos, etc.).

Figura 27: Eclosão de filhotes de tracajás e iaçás no lago do Piraruacá.

Paulo Cesar Machado Andrade 73

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Manual para os gestores ambientais

- Data da eclosão: Metodologia: Verificação dos ninhos após 45 dias da data de


postura dos ninhos monitorados. Será considerado o período de incubação a partir do
primeiro filhote eclodido.
- Nº. de filhotes eclodidos/ninho: Metodologia: Contagem dos filhotes vivos

Nesta fase, os monitores de praia ou agentes ambientais voluntários voltam as praias


dos tabuleiros ou para as chocadeiras/praias artificiais para acompanhar a eclosão (saída
do filhote do ovo) ou nascimento dos filhotes (saída do filhote dos ninhos ou emergência).
No caso de tartarugas, tracajás e iaçás, a saída dos filhotes dos ninhos ocorre com cerca
de 60 dias (a eclosão ocorre entre 45-52 dias), dependendo da temperatura e da umidade
proporcionada pelo início do período de chuvas. Ovos de irapuca demoram mais, com 65-
75 dias para eclosão.
O Monitor deve realizar:
A) O registro da Data da eclosão (permite estimar o tempo de incubação);
B) A Contagem de filhotes vivos, ovos de óleo/gordura, ovos gorados ou estragados
(inviáveis), ovos inférteis (que após o período de incubação não estão estragados e nem
apresentam desenvolvimento do embrião aparente), filhotes mortos (natimortos) e ovos
predados. Conferir também o número de filhotes deformados. Permite calcular o sucesso
ou taxa de eclosão;
C) A Biometria e pesagem dos filhotes: pelo menos 10 filhotes por ninho amostral
(de no mínimo 10% dos ninhos ou 30 ninhos/espécie).

Figura 28: Abertura de ninhos marcados no tabuleiro do Manarian/RDS Uacari


para conferência dos filhotes eclodidos, ovos gorados e natimortos.

74 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Eclosão:
- Observar a data da provável eclosão, marcada no piquete;
- Verificar o afundamento da cova (areia);
- Em alguns tabuleiros onde todos os ninhos de tartaruga e tracajás são marcados
com piquete, realiza-se a abertura do ninho na data da prevista para eclosão e a contagem
dos filhotes vivos, ovos inviáveis, filhotes mortos e cascas. Mas podemos também, abrir
pelo menos uma amostra de 30 ninhos por espécie para efetuar essa contagem dos filhotes
e estimar a taxa média de eclosão/espécie em cada ano.
- NÃO retirar animais que ainda tenham o vitelo (umbigo);

Figura 29: Filhotes de tracajá (P.unifilis) ainda com vitelo exposto (“umbigo”).

- Filhotes gêmeos devem ser separados cortando-se a ligação pelo vitelo. Caso
contrário o mais fraco morrerá, ou os dois serão predados.
- ANOTAR: Ovos gorados, ovos inférteis, filhotes defeituosos e natimortos.

Figura 30: A) Filhotes gêmeos de tartarugas no Manarian; B) Filhotes gêmeos de


tracajás no Lago do Piraruacá; C) Ovo gorado (inviável, estragado) – acima – e
ovo infértil (sem desenvolvimento embrionário aparente); D) Filhote de tracajá
defeituoso com cinco patas.

Paulo Cesar Machado Andrade 75

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Manual para os gestores ambientais

- Fazer a biometria de pelo menos 10 filhotes de 30 ninhos por espécie

Figura 31: Biometria de filhote de iaçá (P.sextuberculata): Comprimento da carapaça, largura de plastrão
e peso.

8.MÉTODOS PARA CONTAGEM DE FILHOTES

8.1. Estimativa com amostras de ninhos

• Abertura de 30 ninhos por espécie;


• Conta os filhotes vivos e ovos que estragaram;
• Calcula a Taxa de eclosão dos ninhos abertos;
• TAXA DE ECLOSÃO= (Número de filhotes vivos/Número de ovos do ninho) X 100
• Multiplica a taxa de eclosão pela quantidade total ovos estimados para saber o
total de filhotes.
Podemos colocar o total de ninhos contados e o número médio de ovos por ninho.
Com isso podemos calcular o total estimado de ovos. Depois colocamos o total de filhotes
contados nos ninhos e podemos estimar o total de filhotes da praia e, posteriormente, a
taxa de eclosão = (total de filhotes/total de ovos) X100.

Figura 32: Abertura manual e contagem de filhotes em ninhos marcados no Manarian.

76 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

8.2. Somatório total de filhotes

Em algumas praias de desova de quelônios ou tabuleiros, tem tantos ninhos que é


impossível contar ou marcar com piquetes. Para estimar o número de filhotes produzidos,
cerca-se a área da praia com o maior número de ninhos e 60 dias depois espera-se que os
filhotes saiam e fiquem retidos na tela da cerca. Deve-se conferir diariamente os filhotes
e soltá-los imediatamente.
Às vezes são tantos filhotes que se torna difícil contar um por um. Podemos estimar
o total colocando-os em caçapas plásticas e contando-os. Cada caçapa tem capacidade
para 200 filhotes de tartaruga e 300 de tracajá e iaçá.
Soma-se a quantidade de filhotes por espécie retida na tela (soma do número de
caçapas cheias).
Para saber a taxa de eclosão média devemos abrir alguns ninhos isolados que tenha
sido possível marcar. Com essa média, nós fazemos o processo inverso e dividimos o número
total de filhotes por essa taxa de eclosão. Então encontramos o número total de ovos
estimados da praia. Se dividirmos esse total de ovos pelo número médio de ovos por
ninho, teremos o número total de ninhos estimado por espécie.

8.3.Contagem de filhotes em cada ninho marcado ou transferido

Quando temos todos os ninhos marcados em uma praia (em geral com menos de
150 ninhos/espécie) pode-se observar cada ninho individualmente quando estiver próximo
a data estimada para eclosão (60 dias após a postura), verificar se já apresenta sinais
como o afunilamento, e então realizar a abertura manual do ninho e contar os filhotes.
Quando cada ninho é marcado podemos monitorar ninho a ninho, isto permite
integrarmos a ficha de postura com a de eclosão e calcularmos a taxa média de eclosão.
Com os ninhos transferidos para chocadeira, também, observamos e abrimos cada ninho
na data estimada para eclosão. Caso ainda não tenham nascido ou os filhotes ainda estejam
com vitelo fecha-se novamente o ninho.

9. SOLTURA – FASE 5

Nos tabuleiros a soltura é imediata. OS filhotes saem naturalmente de seus ninhos


e vão para o rio ou são conferidos pelos monitores e depois soltos na margem para que
caminhem até a água.Nesta fase é importante registrar o local da soltura, o tempo entre a
eclosão e a soltura e o número de filhotes soltos.

Paulo Cesar Machado Andrade 77

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Manual para os gestores ambientais

Figura 33: Soltura imediata de filhotes após contagem.

Em alguns tabuleiros, os monitores levam os filhotes que saíram dos ninhos para o
outro lado do rio, e os soltam longe da margem da praia que nasceram, no meio da
vegetação aquática. Fazem isso para diminuir a chance de serem predados pelos jacarés e
peixes que os esperam na margem da praia. Em outras praias, os monitores carregam os
filhotes em sacos, sobem os barrancos da várzea e soltam os filhotes em lagos isolados e
com muita vegetação para os filhotes se abrigarem.
Como atividade de educação ambiental para sensibilizar mais comunitários e
moradores de outras localidades para a proteção dos quelônios, sugerimos que seja feito
um evento de confraternização onde uma amostra simbólica dos filhotes protegidos pelos
monitores deverá ser solta na praia para que todos vejam.

Figura 34: a) Soltura no tabuleiro do Manarian/RDS Uacari; b) Soltura no tabuleiro Santa Bárbara,
Resex Canutama.

10. INFLUÊNCIA DOS FATORES AMBIENTAIS E CLIMÁTICOS

Nos últimos anos, alguns eventos climáticos extremos (grandes cheias e grandes se-
cas) tem sido registrados na Amazônia, em função das mudanças climáticas globais. Com o
aquecimento do planeta, o equilíbrio no ciclo da vida dos quelônios pode estar sendo com-
prometido, pois esses animais poderão perder por algamento suas praias de desova ou com
temperaturas mais altas correrem o risco de nascerem mais fêmeas do que machos.

78 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Implantar PEQUENAS ESTAÇÕES METEOROLÓGICAS para medir dados climáticos


básicos de temperatura, umidade, pluviosidade e o nível da água podem ajudar no enten-
dimento dos efeitos dessas mudanças sobre os quelônios.
A estação pode ser bem simples com uma cerca de tela de 1,5 m de altura de uma
área quadrada de 1,5 a 2 m de lado. Nesta área devem ser instalados um pluviômetro
para medir a quantidade de chuvas, e um termohigrômetro (mecânico ou digital) que nos
dá a temperatura e a umidade (os digitais podem fornecer inclusive cabos para medir a
temperatura e a umidade dentro do solo e dos ninhos). Diariamente, o monitor faz o
registro desses dados em uma planilha. É recomendável que faça o registro às 6, 12 e 18
horas, caso não seja possível, que faça pelo menos uma vez.

Justificativa: Avaliar como e quanto as variáveis climáticas e ambientais influenci-


am o ciclo de vida dos quelônios.

10.1 Dados locais do ambiente

• Índice fluviométrico
Metodologia: Caso não haja régua da ANA para medir inundação, instalar de régua
d’água o mais próximo possível de casas de comunitários (para o devido registro diário),
em locais próximos às áreas de desova e em rios de ordens diferentes quando possível, é
importante que o local represente o nível de inundação regional. Recomenda-se a instala-
ção em áreas mais altas, com fixação permanente, definitiva e que a leitura seja feita com
periodicidade quinzenal. Sendo que no período de desova deve-se proceder diariamente

• Índice pluviométrico
Metodologia: Instalação e acompanhamento de pluviômetro ou obtenção dos da-
dos gerados em estações climatológicas mais próximas da UC.

• Temperatura e umidade relativas do ambiente


Metodologia: Quando possível fazer a instalação de datalogger. Caso não seja, co-
letar os dados fornecidos pelas estações climatológicas mais próximas da UC e instalar e
um termômetro de máxima e mínima em um local de fácil leitura.

10.2. Características do sítio reprodutivo e área de ocupação

• Caracterização qualitativa do substrato do ninho:


Justificativa: Pode influenciar no sucesso de eclosão dos ovos, na escolha das áreas
de nidificação, razão sexual, período de incubação, etc.

Paulo Cesar Machado Andrade 79

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Manual para os gestores ambientais

Metodologia: descrição do sítio quanto a substrato e formação geomorfológica (cor,


areia, argila, folhiço, praia, barranco)
Periodicidade: Anual

80 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Capítulo 3
S i s te m a ti z a ç ã o d os m
do méétodos uuttili
ilizz ados p
peelo Pro j e to
Pro
Pé-d e-p
é-de-p
e-pin in
inccha p paara ccoonser vação ccoomun
muniitária ddee qquu el ô n i o s
-TTrransf sfeerência ddee ninh
ninhos e bbeerçários
inho

Paulo Cesar Machado Andrade; José Ribamar da Silva Pinto; Paulo Henrique de Oliveira
Guimarães; Janderson Rocha Garcez;João Alfredo da Mota Duarte; Sandra Helena Azevedo

O projeto Pé-de-pincha começou seu trabalho de conservação de quelônios em


áreas onde as populações de tracajás (Podocnemis unifilis) e outros quelônios sofreram
predação intensa, tendo seus estoques naturais saqueados pela captura e comércio clan-
destino de adultos e de ovos. Apesar de todo processo de sensibilização para a defesa dos
quelônios, era praticamente impossível, em muitos lugares, deixar os poucos ninhos que
restavam em cada praia, sem que os mesmos fossem retirados. Também, não era possível
colocar agentes ambientais ou monitores de campo para vigiar cada praia, pois eram muitas
praias com poucos ninhos.
Dessa forma, procurou-se adotar uma técnica que permitisse salvar da predação
humana, a maior quantidade possível de ninhos de quelônios, transferindo-os para uma
área cercada protegida diariamente pelas comunidades.

2.1. Sistematização da metodologia do Projeto Pé-de-pincha

Como o manejo de recursos naturais envolve uma gama muito grande de visões e
saberes, desde o início, optamos, por um processo participativo de tomada de decisões,
onde o plano inicial de ação seria construído com a informação e a discussão de todos os
parceiros (UFAM, IBAMA, prefeituras locais e comunitários). Em maio de 1999, foi realiza-
do um grande seminário em Terra Santa, onde 255 pessoas relataram, opinaram e esco-
lheram sobre três grandes temas propostos por um coordenador que conduziu o evento
utilizando uma metodologia similar ao ZOP. Os temas abordados foram: Áreas ameaçadas,
áreas protegidas e educação ambiental. Ao final deste evento, estava concluído o plano
de ação anual para que se implantasse o projeto Pé-de-pincha.

Paulo Cesar Machado Andrade 81

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Manual para os gestores ambientais

Esse plano envolvia um processo de avaliação sistemático, em cada etapa anual de


atividades, sendo que os resultados dessas reuniões periódicas com as comunidades cons-
tituem o prumo para as tomadas de decisão e execução de cada atividade. Esse processo
é utilizado até hoje. Contemplava a capacitação de professores em educação ambiental e
sua reciclagem anual, estimulando-os a integrar na sua rotina escolar à transversalidade e
multidisciplinaridade das questões ambientais. Direcionava, também, para a capacitação
e o treinamento dos comunitários para ações práticas de conservação e manejo de
quelônios.
Apesar de ter nascido como um projeto de extensão, sempre houve, desde o início,
a preocupação na obtenção e sistematização dos dados biológicos e sócio-econômicos,
respectivamente, das espécies de quelônios e das comunidades trabalhadas, visando ge-
rar informação científica para embasar futuros planos de conservação dos recursos e
nortear políticas públicas. Estávamos fazendo pesquisa, dentro de um projeto dinâmico
com envolvimento comunitário. Somente no ano 2.000, quando fomos escrever nosso
primeiro artigo sobre o projeto, e que tivemos que definir a metodologia que havíamos
empregado, é que entendemos que tínhamos utilizado ferramentas da pesquisa-ação ou
de pesquisa participativa, a partir do que, passamos a buscar referencial teórico para ori-
entar e sistematizar as informações geradas (Morin, 2004; Latorre, 2004;Thiollent, 1992;
Barbier, 1985).
Para introduzir e trabalhar as práticas de manejo participativo de quelônios com as
comunidades, normalmente, foram feitas reuniões ou seminários, onde foram avaliadas a
situação das populações de quelônios em cada local, suas principais ameaças e as possí-
veis estratégias para proteger seus ninhos e adultos. Feito isso foi iniciado o processo de
capacitação e treinamento dos comunitários. Anualmente, realizamos, em cada comuni-
dade o treinamento de novos agentes de praia e a reciclagem daqueles que já foram trei-
nados em técnicas de manejo de quelônios. Esse treinamento envolve, no mínimo 4 horas
de aulas teóricas e 4 horas de aula prática, com simulação de transplante de ninhos, cons-
trução de chocadeiras, marcação de covas e biometria de animais. Além de material
audiovisual (apresentações em datashow, álbum seriado, vídeodocumentários), distribu-
ímos cartilhas com a metodologia passo-a-passo do projeto que serve como material de
demonstrativo/multiplicador. A partir daí, iniciamos o processo de proteção dos ninhos e
filhotes, propriamente, dito.

2.2. Procedimentos para conservação comunitária de quelônios

2.2.1. Sinalização das praias protegidas para reprodução de quelônios


Dependendo do período de nidificação dos quelônios em cada região, é importan-
te que assim que comece a vazante (julho ou agosto) e apareçam as praias que serão

82 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

protegidas, que se coloque uma placa ou sinalização que servirá de alerta para que as
pessoas que passem no local não se aventurem para coletar ovos e adultos dos bichos de
casco (figura 1 e 2).

Figura 1: Sinalização das praias de proteção dos quelônios com bandeiras ou placas.

Figura 2: Placa de sinalização do lago de conservação comunitária do Piraruacá,


Terra Santa.

Paulo Cesar Machado Andrade 83

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Manual para os gestores ambientais

2.2.2.Passos para a conservação comunitária de quelônios

A metodologia de conservação de quelônios utilizada pelo projeto Pé-de-pincha


para proteção de ninhos naturais e transplante de ninhos ou covas descrita a seguir, foi
baseada, desde o seu início, nos métodos descritos há muito tempo pelo Centro Nacional
de Quelônios da Amazônia (CENAQUA, 1994 e 1989) e Projeto Tamar para o trabalho dos
monitores de praia:

I - LOCALIZAÇÃO DAS COVAS:


Há quatro maneiras diferentes de se identificar uma cova de quelônio no campo:
1) Através das marcas das patas (rastros) na areia e , após a desova da fêmea, marca
da cauda em forma de “V” invertido e cova no vértice (isso para pequenos grupos) –
figura 3 e 4;
2) Através da identificação de areia molhada na área da cova (isso para grandes
grupos);
3) Através da observação da areia menos compactada na superfície das covas, ou
no caso de tracajás, que desovam no barro e no capim, observar terra, capim e folhas
removidas;
4) Através do uso de bastão de 0,5 a 1,20 m para auxiliar na localização da cova.
Enfiar na areia com cuidado até uns 15 cm, para tracajás e iaçás e até 50-80 cm para
tartarugas, no sentido vertical para não danificar os ovos.

Figura 3: Identificação dos rastros de quelônios.

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Figura 4: Pegadas de quelônios com a marca da cauda no meio (cauda arrastando) indicando
provável desova, no Lago do Piraruacá, 2011.

II – COMO IDENTIFICAR A ESPÉCIE QUE DESOVOU ?


1. Através dos rastros e da distância entre as patas do animal adulto (figura 5):
• Até 13 cm: pitiú ou iaçá;
• De 14 a 25 cm: tracajá;
• De 33 a 48 cm: tartarugas.
OBS: Valores baseados na largura média de pegadas medidas nas praias pelo projeto
Pé-de-pincha, para as diferentes espécies.

2. Pelo tamanho das patas:


• Pequena: pitiú ou iaçá;
• Média: tracajá; Além disso, tracajás deixam a marca como se pisassem na ponta
dos dedos, e não como se estivessem arrastando as patas, como são as pegadas de iaçás e
tartarugas.
• Grande: tartaruga

3. Através da disposição e situação das covas:


• Pitiú: desova na areia da praia em grupos de 2 a 4 indivíduos;
• Tracajá: desova em qualquer local: barro, areia, folhas, mato, capim, pedregulhos,
de maneira isolada e o mais escondido possível;
• Tartaruga: São mais exigentes, desovam somente na areia de textura média ou
grossa e de forma sociável (em grupos).

4. Pela profundidade das covas e quantidades de ovos:


• Pitiú: 16 a 20 cm e 16,9±3,5 ovos no Médio-Baixo Amazonas e no rio Juruá, a
média é de 9,2±2 ovos e 13 cm de profundidade;

Paulo Cesar Machado Andrade 85

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Manual para os gestores ambientais

• Tracajá: 30 cm e aproximadamente 22,3± 4,9 ovos; No Baixo Amazonas, fazem


covas de 17,2±2,7 cm na areia e 13,2±2,1 cm no barro.
• Tartaruga: 55 a 80 cm e 90 a 145 ovos.

5. Pela observação dos ovos (figura 6):


• Pitiú: forma ovóide (elipsoidal), casca cor de branca e mais mole;
• Tracajá: forma ovóide (elipsoidal), casca branca, rosada ou amarelada e mais dura;
• Tartaruga: forma arredondada (esférica), casca branca e dura.

Figura 5: Tamanho dos rastros deixados por tracajás, iaçás e tartarugas.

Figura 5.1.: Esquerda pegada de tracajá (P.unifilis) com marcas bem definidas das unhas
(“como se pisasse na ponta dos dedos”). Direita: Pegada de pitiú ou iaçá (P.sextuberculata),
unhas não definidas como se arrastasse as patas.

86 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Figura 6: Esquerda: Ovo esférico (tipo bolinha de ping-pong) de tartaruga (P.expansa).


Direita: Ovo formato elíptico de tracajá (P.unifilis).

III - COMO MARCAR AS COVAS NAS PRAIAS: A marcação com piquetes

Deve-se ir para praia bem cedo, antes de clarear o dia e se começar a procurar os
rastros e os ninhos, iniciando pela margem e indo, progressivamente caminhando para o
meio da praia. Se estiver em equipe e a praia for grande poderá dividir o trabalho em
setores: Margem, meio e próximo a vegetação.
Faz-se necessário quando há um grande número de tartarugas, tracajás e pitiús
para desovar num tabuleiro. Usam-se estes piquetes para marcar as covas (figura 7 e 8).
Tamanho: 50 cm x 4 cm, entalhe de 10 cm para descrição da marca podendo-se usar
opcionalmente placas de alumínio, tinta à óleo, caneta à prova d’água, etiquetas plásticas,
etc. Enterrar cada piquete 20 cm de profundidade de maneira que este fique a um palmo
atrás da cova com identificação voltada para a cova e para o rio. A cova deve ficar
posicionada entre o rio e o piquete. Este último deverá ficar pelo menos 30 cm fora da
terra. Cada piquete deve conter as iniciais da espécie, a data da desova e o número da
cova.
Paralelo a estes materiais deve-se usar também uma ficha de controle para anota-
ções das seguintes informações: Data da postura, Número da cova, espécie que desovou,
número de ovos, abertura da cova (data de eclosão), número de filhotes vivos, natimortos,
contagem dos ovos não eclodidos e outras observações como freqüência de postura, hora
de maior freqüência, condições atmosféricas, desova, eclosão e outros dados julgados
pertinentes.
Se possível fazer um croqui da praia.
Para registrar os dados de postura em praias com muitos ninhos (tabuleiros) devem
ser definidos transectos amostrais nos locais de nidificação. No período de nidificação,
diariamente, pela manhã, de 5 às 9 horas, deve ser feita a procura ativa dos ninhos de

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Manual para os gestores ambientais

P.expansa, P.unifilis e P. sextuberculata, a partir dos rastros deixados no local de nidificação.


Todos os ninhos devem ser contados, registrados, vistoriados e marcados. Os ninhos nor-
malmente são marcados com piquetes de madeira onde é registrada a espécie, o número
do ninho na ficha de controle da postura e a data da postura. Devem ser conferidos tam-
bém o número de ninhos predados.
Para cada ninho são registrados os seguintes dados: data de oviposição; espécie;
profundidade e largura da cova, distância e altura do ninho em relação a água; distância
da vegetação e do ninho mais próximo; tipo de vegetação próxima ao ninho; tipo e textu-
ra do substrato; e inclinação da superfície de postura. A cada cinco ninhos registrados
para cada espécie, um deveria ser aberto para conferência do número de ovos e a medi-
ção e pesagem de cinco ovos. Caso seja possível relacionar às pegadas próximas ao ninho
encontrado, mede-se também, a largura da pegada e a distância entre as patas, para cor-
relação, posterior, com os dados do ninho e a estimativa do tamanho da fêmea.
Em áreas com um número muito grande de ninhos (tabuleiros) deve-se abrir, alea-
toriamente, pelo menos 30 ninhos de cada espécie para contar os ovos e fazer sua
biometria, essa amostra nos dará uma idéia do número médio de ovos por ninhos. Nos
tabuleiros, após o término do período de postura, deve-se cercar, aleatoriamente, 15-30
ninhos naturais de cada espécie para que se possa fazer o registro dos dados de eclosão
(figura 9), e colocar cercas nos locais de maior concentração de ninhos para posterior,
captura dos filhotes recém-eclodidos para sua contagem, biometria, marcação e soltura.
As cercas normalmente são feitas com tela plástica, tipo sombrite e estacas de madeira, e
tem cerca de um metro de altura, e têm por objetivo proteger o ninho e os filhotes da
predação e evitar que eles cheguem imediatamente na água.
Nos tabuleiros onde se consegue marcar os ninhos com piquetes, podemos realizar
a abertura da cova e a contagem dos filhotes vivos, ovos inviáveis (gorados), ovos inférteis
e natimortos para estimar a taxa de eclosão.

Figura 7. Piquetes de marcação de ninhos transferidos registra-se o número da cova, a


suposta data de eclosão, a sigla da praia de origem e da espécie.

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Figura 8: A) Monitores de praia fazendo marcação de ninhos de tracajá (P.unifilis) na Praia do


Nazaré em Manicoré/AM.B) Ninhos marcados no Manarian/RDS Uacari.

Figura 9:Ninhos naturais protegidos no Lago Piraruacá, 1999.

IV – TRANSFERÊNCIA OU TRANSLOCAÇÃO DE NINHOS DE QUELÔNIOS

A transferência de ninhos de quelônios, de áreas onde sofrem ameaças para áreas


protegidas, tem sido uma estratégia de conservação amplamente utilizada por diversos
programas de proteção destes animais em todo o mundo (Townsend, 2008; Bonach et al.,
2003; Soini, 1999; Hernandez, Narbaiza & Espin, 1999;TCA, 1997; Thompson, 1979). No
Brasil, este sistema foi adotado pelo Projeto TAMAR na proteção de ninhos de tartarugas
marinhas desde 1982 (Fundação Pró-Tamar, 2000). Também vem sendo utilizado pelo
Projeto Quelônios da Amazônia, IBAMA, desde 1979 até hoje, com a finalidade de prote-
ger, principalmente, ninhos de tartarugas (Podocnemis expansa) e tracajás (P.unifilis) da
predação humana e também de fenômenos naturais como os repiquetes que provocam o
alagamento dos ninhos (Cantarelli et al., 2008; Portal et al., 2005; CENAQUA, 2000; Bataus,
1994; IBAMA, 1989). Diniz & Santos (1997) propuseram através de um modelo de avalia-
ção do crescimento populacional de tartaruga da Amazônia (Podocnemis expansa) que,
se os ninhos e os filhotes fossem protegidos e pelo menos 20% dos filhotes completassem

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Manual para os gestores ambientais

o primeiro ano de vida, a população poderia ser preservada. A maioria dos programas de
conservação de P.expansa e P.unifilis na Amazônia procurou proteger as fêmeas em repro-
dução, os ninhos e os filhotes, o que parece ter contribuído, significativamente, fazendo
com que essas espécies tenham saído do risco de extinção (Alho, 1985). Alguns progra-
mas de manejo comunitário de quelônios, de longo prazo, na Amazônia adotaram a trans-
ferência de ninhos como metodologia para proteger os ovos e garantir o nascimento dos
filhotes em áreas com redução significativa das populações e de retirada elevada dos ovos
para venda ou consumo pelo homem (Cantarelli et al. 2008; Andrade, 2008; Costa, 2008;
AMPA, 2006; Oliveira, 2006; SOINI, 1999 e 1997;Alho, 1985). Apesar de controversa, esta
técnica tem gerado resultados bastante significativos, para serem ignorados, garantindo o
aumento dos estoques populacionais em vários locais onde foi adotada.

IV.1. Por que transferir?


Um dos principais motivos para a adoção da técnica de transferência é a retirada
feita pelo homem, para o consumo ou comércio ilegal, dos ovos de ninhos de tartarugas,
tracajás e iaçás (P.sextuberculata) em áreas onde as populações de quelônios já estão
seriamente comprometidas. Aonde ainda existem grandes populações de tartarugas,
tracajás e iaçás desovando em uma única praia (os conhecidos tabuleiros de desova) tor-
na-se mais fácil realizar o trabalho de vigilância da praia e impedir a coleta dos ovos.
Contudo, em áreas alteradas, normalmente, temos desovas isoladas, em diferentes prai-
as, tornando-se extremamente complicado colocar um agente ou monitor de praia em
cada local. Nestes casos, torna-se mais eficiente, logisticamente, transferir os ninhos para
uma única área protegida, normalmente, próxima a comunidade. Esse sistema, adotado
em áreas comprovadamente alteradas, permite a proteção dos ninhos da predação hu-
mana e dos eventuais predadores naturais, aumentando a taxa de eclosão dos filhotes.
Em algumas destas áreas, se nada é feito, a predação pode variar de 87,7 a 100% dos
ninhos (Batistela & Vogt, 2009; Cantarelli et al. 2008; Andrade, 2008; Soini, 1997).
Outro motivo para transferir os ninhos é tentar reduzir os efeitos de inundações
repentinas (repiquetes) ou em locais onde ocorre alagamento dos ninhos pela influência
das marés. No Amapá, quase 100% dos ninhos de P.expansa são perdidos pela ação das
marés, sendo que, neste caso a única estratégia possível é a transferência dos ovos para
locais altos e secos, neste caso, a taxa de eclosão dos ninhos transplantados é de cerca de
65,3% para P.expansa e 72,1% para P.unifilis (Portal et al., 2005). Stancyk (1995) afirma
que o uso da translocação de ovos de quelônios de ninhos ameaçados pela erosão para
lugares mais altos na praia pode reduzir a chance de uma mortalidade massiva pela inun-
dação ou pela concentração de predadores, sendo que os valores de taxa de eclosão para
ninhos de tartarugas marinhas transplantados seriam da ordem de 60 a 81%.

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Manual para os gestores ambientais

Segundo Limpus & Miller (1980) existem três problemas que podem afetar a trans-
ferência de ovos de tartarugas: 1) a morte do embrião pelos movimentos de rotação dos
ovos; 2) a influência da temperatura do local de transplante sobre o sexo dos filhotes; 3)
os filhotes aprendem por imprinting a retornar a seus locais de nascimento.
Apesar de ser realizada e praticada em diversos projetos de conservação de
quelônios, a transferência de ovos de quelônios requer uma série de cuidados, a fim de
garantir um maior sucesso no nascimento dos filhotes e uma menor influência sobre o
sexo dos filhotes. Muitas vezes, esses cuidados não são adotados, o que resulta em uma
menor taxa de sucesso com o método. Sabe-se, sobretudo que para ovos com cascas
flexíveis, como os de tartarugas (P. expansa), é comum que haja uma influência negativa
da transferência no sucesso de eclosão dos filhotes, devido a um aumento na mortalidade
embrionária (Limpus et al. 1979; Haller e Rodrigues, 2006). Entretanto, vários estudos de
longo prazo com transferência de ninhos, e a utilização de cuidados básicos na transferên-
cia, tem demonstrado que, esse processo pode proporcionar taxas de eclosão superiores
ou similares às encontradas na natureza, entre 70 e 90% (Andrade, 2008; Andrade et al.,
2005, 2004 e 2001; Townsend, 2008; Costa, 2008; CENAQUA, 2000; SOINI, 1999;TCA, 1997;
Nascimento & Armond, 1991; IBAMA, 1989; Correa & Soini, 1988; Alho, Carvalho & Pádua,
1984). Valores inferiores a 50% na taxa de eclosão de ninhos transplantados, normalmen-
te indicam a falta dos cuidados básicos para o transplante, imperícia da equipe de campo
ou alguma grande variação edafo-climática nas condições dos ninhos artificiais.
Outro aspecto, que é sempre abordado, quando se fala em transferência de ni-
nhos, é a possibilidade de estarmos afetando a determinação do sexo nos filhotes, ao
alterarmos as condições naturais de temperatura e umidade nos ninhos artificiais. Vogt &
Bull (1982) estabeleceram que em algumas espécies de quelônios aquáticos a temperatu-
ra de incubação era que determinava o sexo dos filhotes que iriam nascer (animais com a
determinação de sexo ambiental ou pela temperatura, ESD ou TSD). Vogt (1994) sugeriu
ainda que esta poderia ser uma ferramenta importante para gerar mais fêmeas em pro-
gramas de conservação, considerando-se que estas seriam mais importantes que os ma-
chos já que estes podem copular várias fêmeas (poliginia). Para Lovich (1996), entretanto,
incrementar o nascimento de fêmeas através da manipulação da temperatura de ninhos e
ovos, era uma estratégia que deveria ter uma abordagem mais cuidadosa como ferra-
menta de conservação.
Os relatos de que no início, os projetos de conservação de Podocnemis expansa,
sombreavam os ninhos transferidos para protegê-los do calor excessivo, gerando com isso
apenas filhotes machos, constituem uma memória negativa do processo. Danni & Alho
(1985) verificaram na REBIO Trombetas que em ninhos de Podocnemis expansa em locais
ensolarados nasciam mais fêmeas, enquanto que nos ninhos sombreados, nasciam mais
machos.

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Manual para os gestores ambientais

Valenzuela et al. (1997) também estudaram a determinação sexual em Podocnemis


expansa no Rio Caquetá, na Amazônia Colombiana. Alguns ovos foram levados a incuba-
doras artificiais, com umidade controlada e diferentes temperaturas, e outros permane-
ceram em ninhos naturais ou seminaturais, preparados nas praias. Nas incubadoras, nas-
ceram 100,0% de machos a 30,5oC e 69,7% de machos a 32,5oC. Nos ninhos naturais e
seminaturais, nasceram de 73,3% a 100,0% de fêmeas. Os principais fatores que influenci-
aram a determinação sexual foram a temperatura e a duração da temperatura mais eleva-
da nos dias críticos (29-30 dias). Souza (1992) determinou que a temperatura de incuba-
ção de ovos de P.unifilis afeta a razão sexual dos filhotes, sendo que, ninhos com tempera-
turas acima de 32º.C e variâncias mais altas produzem mais fêmeas.
Contudo, sabe-se que, em quelônios, diversas características do microhabitat do
ninho podem afetar características dos filhotes, como sexo, tamanho, mobilização de nu-
trientes, capacidade natatória, entre outros (Packard et al. 1982; Gutzke et al. 1987; Alho
et al. 1985; Souza e Vogt 1994; Spotila et al. 1994; Pezzuti e Vogt 1999; Ferreira-Junior et
al. 2007). Portanto, a transferência poderia afetar outros processos do desenvolvimento
embrionário (Jaffé et al. 2008).
A influência da transferência em certas características, como mortalidade embrio-
nária e tamanho dos filhotes, pode ser visualizada no momento da eclosão e as
metodologias de transferência, como cuidados no manuseio dos ovos e características do
local para onde os ovos serão transferidos, podem ser ajustadas para garantir condições e
resultados semelhantes ou superiores ao natural. No entanto, a transferência poderia afetar
características não detectáveis nos primeiros meses de vida após a eclosão. Nesses casos,
as conseqüências da transferência poderiam afetar a sobrevivência a longo prazo dos fi-
lhotes (Jaffé et al., 2008).
Pesquisas analisando a taxa de sobrevivência de filhotes oriundos de programas de
conservação de longo prazo que adotam transferência de ninhos, tem demonstrado que
além de garantir a proteção dos ninhos, ocorre um aumento na taxa de sobrevivência dos
filhotes. Na região do Médio Amazonas, o programa “Pé-de-pincha” da Universidade Fe-
deral do Amazonas, vem há 12 anos estimulando a conservação de tracajás (P.unifilis),
iaçás (P.sextuberculata), tartarugas (P.expansa) e irapucas (P.erytrocephala) através de seu
manejo participativo em 88 comunidades de Parintins, Barreirinha, Nhamundá, Itacoatiara,
Terra Santa, Juruti e Oriximiná. De 1999 a 2009, foram devolvidos à natureza 808.673
filhotes de quelônios, provenientes de ninhos manejados, com taxa de eclosão média de
82% em ninhos transferidos contra 54,5% dos ninhos naturais. A sobrevivência média dos
filhotes de tracajás manejados e soltos em vida livre foi estimada em 17,8±10,2%. Na
natureza, sem manejo, apenas 5,7% dos filhotes sobrevive (Andrade, 2008; Ohana, 2008;
Andrade et al. 2008; Oliveira et al., 2006; Andrade et al.,2005).

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Manual para os gestores ambientais

Por fim, devemos considerar a questão de como se desenvolve o processo de


imprinting nos filhotes para que retornem a praia que nasceram. Segundo Donnelly (1994)
não existiriam provas de que isso ocorra, estando os mecanismos de reconhecimento das
praias de nascença ligados a sinais químicos, olfativos ou a proximidade do lago de ali-
mentação da praia. Estudos recentes de Ferrara (2012) parecem demonstrar que, efetiva-
mente, assim como era relatado há muito tempo pelos ribeirinhos, que as fêmeas espe-
ram os filhotes saírem dos ninhos e mantém contato sonoro com eles, sendo que, os
filhotes por sua vez, seguiriam as fêmeas adultas para os lagos de alimentação. Estas des-
cobertas que lançam novas luzes sobre o ciclo natural de P.expansa, enfatizam a necessi-
dade de maiores cuidados na adoção da técnica de transferência de ninhos de tartarugas,
tracajás e iaçás como uma efetiva ferramenta de conservação, sem que contudo, possa-
mos desconsiderar sua significativa eficácia na recuperação dos estoques populacionais
de quelônios em diversos programas no Brasil e no mundo.
Portanto, sugere-se que a transferência de ninhos seja utilizada como estratégia de
conservação somente quando a manutenção dos ninhos in situ não for possível. Identifi-
caram-se dois casos em que a transferência de ninhos é a estratégia recomendada:
1. Facilitação da logística de proteção dos ninhos
Nos casos em que o local de desova original é de difícil acesso ou vigilância, sendo
susceptível à predação humana ou por animais silvestres ou domésticos.
2. Risco de alagamento
Situações em que os ninhos estão localizados em áreas mais baixas, havendo a pos-
sibilidade de serem alagados pela subida do nível da água, antes da eclosão dos filhotes.

A metodologia de transferência de ovos de tartaruga (Podocnemis expansa), tracajás


(P.unifilis) e iaçás (P.sextuberculata) foi descrita, inicialmente, no 1º. Encontro Técnico-
Administrativo sobre Preservação de Quelônios, realizado em 1987, na cidade de Manaus
(IBDF, 1987) e foi, posteriormente, divulgada pelo Projeto Quelônios da Amazônia
(IBAMA,1989) e Programa Pé-de-pincha (Andrade et al., 2005).

IV.2. Quando transferir?


Pelo senso comum, os ovos de ninhos de quelônios não poderiam ser manipulados
ou transferidos de lugar, pois estragariam (Alho, Carvalho & Pádua, 1984; Ferrarini, 1980).
Ferrarini (1980) relatava que não se deveria interferir na postura de P.expansa nos primei-
ros dias, sob o risco dos ovos gorarem, sugerindo que a transferência deveria ser feita
após 20 dias da postura. Alho, Carvalho & Pádua (1984) relatam que cerca de 24 horas
após a postura, a casca dos ovos fica mais esbranquiçada, seca e rígida, caracterizando a
nidação do embrião em relação a câmara de ar do ovo, então, sugerem que os ovos de
P.expansa sejam transplantados logo após a postura.

Paulo Cesar Machado Andrade 93

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Manual para os gestores ambientais

Segundo o Manual Técnico do Projeto Quelônios da Amazônia (IBAMA, 1989), a


transferência de ovos de P.expansa dever ser efetuada preferencialmente do 1º. ao 3º dia
da postura ou a partir de 29 dias, evitando a perda pela predação ou repiquete, tendo
também, por finalidade, agrupar as covas em uma única área, permitindo melhor contro-
le da eclosão e dos inimigos naturais dos ovos e dos filhotes recém-nascidos. Sendo tam-
bém sugerido que a transferência seja feita de preferência às 6:00 h ou 18:00 h, quando a
temperatura está mais amena. Soini (1999) e Andrade et al. (2005) também recomendam
que os ovos de tracajás (P.unifilis) e iaçás (P.sextuberculata) sejam transferidos no 1º. dia
após a postura, sempre nas horas mais frias do dia (5 a 9:00 h da manhã).
Bonach et al. (2003) realizaram experimento com transferência de ovos de tartaru-
ga de ninhos de diferentes idades (1, 14, 28 e 42 dias) verificando uma fragilidade embri-
onária nos períodos extremos (1 e 42º. Dia) após a postura, observando que a translocação
no 1º. dia de incubação resulta numa mais alta taxa de mortalidade do embrião do que
nos dias 14, 28 e 42. Diferentemente de Malvásio (2001) que verificou um menor número
de filhotes vivos para ovos manuseados entre o 4º. e o 28º. dias de incubação, ou seja, os
ovos teriam maior chance de sucesso se translocados no 1º. dia, exatamente como suge-
rido por Alho, Carvalho & Pádua (1984), IBAMA (1989), Soini (1999) e Andrade et al. (2005).
Towsend (2008) recomenda que os ovos de P.unifilis sejam coletados depois de 15 dias no
Equador. Para Bonach et al. (2003) e Hildebrand et al. (1988), a idade de translocação do
ovo não é o grande fator limitante no sucesso da eclosão de P.expansa.
A fim de evitar a mortalidade embrionária induzida pela movimentação dos ovos, a
transferência deve ser realizada nas primeiras 24 horas após a postura. Nas situações em
que não foi realizada a transferência neste período, mas existe a possibilidade de alaga-
mento dos ninhos antes da eclosão dos filhotes, deve-se optar por acompanhar a subida
do nível da água, deixando o ninho intacto o máximo de dias possível, até que passe o
período crítico de 28-29 dias.
Os ovos de quelônios são susceptíveis a desidratação, sobretudo ovos de P. expansa
e P. sextuberculata, que possuem cascas flexíveis. Portanto, a transferência deve ser reali-
zada nas horas mais frias do dia. Preferencialmente, a coleta e transferência dos ovos
devem ser realizadas seqüencialmente no período mais curto possível. No entanto, em
casos em que não é possível transferir os ovos logo após a coleta, devido a temperaturas
do ar e da areia muito altas, os ovos devem ser deixados guardados em uma caixa de
isopor, colocada em um local fresco e a transferência deve ser realizada em um momento
de temperatura mais amena, o mais breve possível. Normalmente, se coleta os ovos entre
5 e 9 horas da manhã, e se realiza o transplante no final da tarde, entre 17 e 18 horas
(Costa, 2008; Portal et al., 2005; Andrade et al. 2005; IBAMA, 1989).

94 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

IV.3. Justificativas para a transferência:


A transferência de ovos de ninhos de quelônios é feita para:
a) Tentativa de evitar as perdas de posturas por inundações repentinas (causadas
pelo repiquete) e por predação.
b) Para impedir a ação dos predadores na região dos tabuleiros durante a fase de
eclosão.

IV. 4. Como transferir os ovos de ninhos de quelônios?


Em áreas de manejo comunitário, onde se trabalha com transferência de ninhos,
eles são levados para praias artificiais (as chamadas “chocadeiras”), que nada mais são do
que áreas de praia mais próximas às comunidades (figura 10) e que ficam protegidas por
um cercado evitando a coleta clandestina dos ninhos pelo homem e os predadores natu-
rais. Neste caso, os ninhos que são encontrados em praias naturais são coletados pelos
comunitários em caixas de isopor de 24,5 litros, imediatamente após serem encontrados.

Figura 10: “Chocadeiras” locais perto das comunidades para onde são transferidos os ninhos
de quelônios.

As diferentes praias ou locais de desova da P.expansa, P.unifilis e P.sextuberculata,


são percorridas, diariamente, durante 20 a 30 dias no período de nidificação, sendo que
os ninhos devem ser coletados entre 5 e 9 horas da manhã. Para cada ninho que é
translocado são feitos os mesmos registros dos ninhos naturais.
Os procedimentos de transferência dos ninhos desde a coleta dos ovos até o
transplante para as “chocadeiras” já foram descritos por Andrade et al. (2005, 2004 e
2001), mas repetiremos os procedimentos passo-a-passo.

IV.4.1. Como coletar/transferir os ninhos?


a) Identificar as covas sujeitas a inundação e predação para o transplante.
Normalmente, como os comunitários têm maior experiência eles vão na frente marcando
com pequenos galhos os ninhos que serão transferidos (figura 11);

Paulo Cesar Machado Andrade 95

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Manual para os gestores ambientais

Figura 11: Comunitários marcando os ninhos para transferência pelos técnicos voluntários.

b) Os ninhos de tracajás podem ser encontrados na areia, no barro, no capim, no


barranco. Já os ninhos de tartarugas e iaçás só vão ser encontrados na areia (figuras 12,13,
14, 15);
c) Transportá-los, preferencialmente, em caixas de isopor nas primeiras horas da
manhã, ou seja até 9 horas, para evitar um choque térmico muito grande entre as
temperaturas elevadas na praia e a temperatura mais fria do interior do ninho. Cada caixa
de 24,5 litros comporta cerca de 4-5 ninhadas de tracajá. Para a transferência, os ovos
devem ser colocados, preferencialmente, em uma caixa isotérmica.
O tamanho da caixa varia de acordo com o número de ninhos a serem transferidos
e a espécie a que pertencem: por exemplo, uma caixa de 24,5L comporta quatro ninhos
de P. unifilis, com um número médio de 22 a 30 ovos por ninho. A caixa deve ser forrada
com areia do próprio ninho, sobretudo do fundo. Essa areia será utilizada para forrar o
fundo do ninho artificial e para preenchê-lo. As ninhadas depositadas em uma mesma
caixa devem ser diferenciadas, a fim de que a mesma ninhada seja mantida no ninho
artificial. Recomenda-se não misturar ninhos diferentes pois se obtém melhores resultados
na incubação (Towsend, 2008; Costa, 2008; Soini, 1999; IBAMA, 1989). A divisão das
ninhadas de P. expansa (tartaruga) em 2 ou 3 ninhos diferentes é sugerida por Andrade et
al. (2005), Soini (1995) e Correa & Soini (1988) como uma forma de melhorar a taxa de
eclosão, entretanto, isso fica a critério dos responsáveis pela transferência. Sugere-se que
sejam comparados ninhos não divididos e divididos, para verificar qual a melhor estratégia
para as grandes ninhadas desta espécie.

d) Abrir com cuidado a cova a ser transplantada (figura 16), retirando a areia que
cobre o ninho para forrar o fundo da caixa de isopor (figura 17). Isto é feito com o objetivo
de impedir que os ovos rolem dentro da caixa durante o transporte. Quando coletamos
ninhos no barro ou outros substratos mais duros, podemos forrar o fundo da caixa com

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Manual para os gestores ambientais

capim seco. Para evitar, que os ovos balancem podem ser colocadas além de camadas de
areia e capim seco, formas de ovos de galinha ou espuma;
e) Os ovos devem ser retirados cuidadosamente mantendo-os na mesma posição
de origem (figuras 18 e 19). Não importa muito a ordem da retirada dos ovos, deve-se
apenas tomar cuidado para não girá-lo bruscamente, ou seja, não sacudí-los (Towsend,
2008; IBAMA, 1989).
f) Os ovos devem ser arrumados no interior da caixa (figura 20) e depois contados
(figura 21). Separar com uma folha de papel um ninho do outro (figura 22), escrevendo na
folha a data, espécie , número de ovos e a praia da coleta para não misturar os ovos de
diferentes ninhos. Colocamos a folha de papel com a identificação e os dados do ninho, e
passamos a cobrir o ninho com outra camada de areia ou capim. Feito esse “sanduiche”
de duas camadas protetoras com os ovos no meio, só então poderemos colocar outro
ninho na caixa.
g) Após a coleta dos ovos, aproveita-se para se registrar os dados do ninho: distância
para água (figura 24); profundidade (figura 25) e largura dos ninho (figura 26); largura do
rastro (figura 27) e da pata da fêmea de quelônio que desovou. Essas informações devem
ser registradas em uma ficha de transferência dos ovos com informações sobre o local da
desova, a data da postura, a espécie que desovou, o número de ovos, a largura e a
profundidade do ninho, a distância da água e, se possível, a largura do rastro da fêmea
que desovou (para posterior inferência sobre o tamanho das fêmeas, pois a largura do
rastro da fêmea na areia é positivamente correlacionado a largura do plastrão, ao tamanho
da ninhada e ao tamanho do câmara do ninho – Bonach et al. 2003). Essas informações
permitirão um maior controle sobre o processo de transferência e, posteriormente, a
identificação da origem de cada ninho com o registro da informação em piquetes no local
de transplante.
h) Deve-se encerrar o período de coleta ainda pela manhã, preferencialmente, até
9:00 horas, a fim de evitar, temperaturas muito elevadas nas praias. Carrega-se
cuidadosamente a caixa de isopor (importante que tenha alças para facilitar o trabalho)
até a canoa ou bote com motor de popa, e então retorna-se para a comunidade base
também com o máximo de cuidado para evitar a trepidação excessiva durante o transporte
fluvial. O mesmo cuidado deve se ter quando o transporte for terrestre ( a pé, a cavalo, de
carro).
i) Normalmente, não se realiza o “plantio”dos ninhos translocados logo que se chega
na chocadeira da comunidade pois a areia da chocadeira deverá estar quente ( a não ser
nos casos em que se termina o trabalho de coleta ainda muito cedo). Sugere-se deixar as
caixas de isopor com os ninhos que serão transferidos, em um local na sombra, ventilado
e longe de possíveis predadores. Deve-se tranplantar no mesmo dia, depois das 16:00 h
da tarde, quando as temperaturas na praia onde fica a chocadeira forem mais amenas.

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Manual para os gestores ambientais

IV.5. Como devem ser escolhidos e preparados os locais protegidos para os ninhos
transplantados:

a) Escolha do local:
Quando a transferência do ninho é feita apenas para salvar o ninho de um local
com possibilidade de inundação para outro local na mesma praia, deve-se escolher um
local alto na praia para fazer a cova artificial, livre de inudações, com a areia com
granulometria e temperatura semelhantes ao da cova original ou a média dos ninhos para
aquela espécie na região (IBAMA, 1989). Também recomenda-se que o local seja plano,
suavemente inclinado (para permitir o escoamento das águas pluviais), que não empoce,
sem a presença de cobertura vegetal arbustiva ou rasteira, cujo sombreamento poderia
afetar a razão sexual dos filhotes, ou as raízes e o excesso de matéria orgânica proveniente
das folhas poderiam reduzir a taxa de eclosão ou aumentar o número de filhotes defeituosos
(Andrade et al., 2005; Janzen, 1994). Deve-se evitar locais com pedregulhos, troncos, ou
qualquer obstáculo que possa prejudicar o desenvolvimento do embrião nos ovos
transplantados.

Fig.12, 13 e 14: Ninho tracajá na areia, no barro e no pasto.


Fig.15: Ninho de Pitiú com arranhado na areia.

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Manual para os gestores ambientais

Fig. 16: Abrindo Ninho;Fig.17:Forrando a caixa;Fig.18:Caixa forrada com capim seco: Fig.19:
Retirando os ovos com cuidado.

Fig.20: Ovos arrumados na caixa; Fig.21: Contando os ovos; Fig.22:Papel separando dois
ninhos; Fig.23: Agente ambiental arruma e confere os ovos de quelônios para transferência
no Lago Piraruacá (2010).

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Manual para os gestores ambientais

Fig.24: Medindo a distância do ninho para a água em Oriximiná.Fig.25: Profundidade do


Ninho;Fig.26: Largura do Ninho; Fig.27: Largura do rastro (distância interna entre patas).

Às vezes, a transferência dos ninhos é feita para outros locais, longe da praia original,
onde possam ser protegidos. Nestes casos, além de escolhermos bem a área, devemos
prepará-la para receber os ninhos, construindo uma espécie de praia artificial protegida
que chamamos de “chocadeira” (vide figuras 28,29,30). O local mais adequado para uma
praia artificial de incubação ou chocadeira é um local alto, plano, aberto, livre de árvores
ou construções próximas, permitindo que a chocadeira esteja exposta a luz do sol durante
todo dia. Este local deve ter uma boa drenagem (para escoamento das águas pluviais) e
dele devemos retirar toda cobertura vegetal, deixando o solo totalmente nu e sem raízes,
deve-se retirar, inclusive, qualquer ninho de formigas que esteja por perto. Tem de ser um
local fácil de vigiar, podendo ser em um campo aberto ou praia próximo da comunidade
(Andrade et al., 2005; Soini, 1999).

a) As chocadeiras e o transplante dos ninhos para áreas protegidas:


O que chamamos de “chocadeiras” no projeto Pé-de-pincha são na verdade áreas
delimitadas e cercadas, próximas as comunidades, que podem ser praias ou áreas de barro
ou terra (desde que devidamente retirada toda camada superior de vegetação) para onde

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Manual para os gestores ambientais

são transferidos os ninhos coletados. As chocadeiras podem ser cercadas com pau-a-pique,
tábuas ou, o que é mais comum, madeira e tela plástica ou de arame (figuras 28, 29 e 30).
O substrato para onde serão transplantados os ninhos pode ser areia ou argila
(barro). Entretanto, melhores taxas de eclosão são obtidas na areia (Andrade et al., 2005;
Soini, 1999). Ninhos de tracajás (Podocnemis unifilis) transplantados para areia sofrem
maior variação de temperaturas (32,6±1,9º.C) do que ninhos no barro, onde a temperatura
é mais constante (30,8±0,8º.C), o que influenciou significativamente no tempo de
nascimento dos filhotes, que é menor na areia (57,9±2,7 dias) do que no barro (63,8±2,3
dias), e na taxa de eclosão (areia=85,6±18,2%; barro=53,7±13,7%) (Andrade et al., 2001).
Towsend (2008) e Soini (1999) recomendam que se façam caixas ou cercados de areia
para a incubação dos ovos transplantados em áreas onde não tem praias. Andrade (2008)
adotou essa técnica obtendo maiores taxas de eclosão nas caixas de areia onde antes os
ninhos eram transplantados para covas de barro.
Preferencialmente, a transferência deve ser realizada para locais naturais (praias).
No entanto, nos casos em que não é possível, pode-se optar por construir praias artificiais
na comunidade. A construção dessas praias é a estratégia menos recomendada e só deve
ser utilizada em último caso. As praias artificiais ou chocadeiras devem ficar longe de
lixeiras, esgotos ou qualquer lugar que possa atrair moscas, pois dípteros da família
Ephydridae e Sarcophagidae, são insetos oportunistas que depositam suas larvas sobre os
ninhos e estas predam os ovos e filhotes de quelônios dentro dos ninhos (Garcez, 2009;
Andrade, 2008).
As praias artificiais são construídas com cercas de madeira, tipo canteiros, em
tamanhos variáveis, dependendo do número de ninhos que se pretende transferir. A
influência da praia artificial na mortalidade embrionária, temperatura, infestação por
fungos e ataque por formigas deve ser avaliada, para que as técnicas de construção
dessas praias possam ser adaptadas a partir desses resultados. Por exemplo, pode-se
construir uma praia suspensa para evitar o ataque de formigas. No entanto, é possível
que isto gere condições de temperatura e umidade adversas. Pode-se ainda, colocar
seixos no fundo da caixa, a fim de possibilitar maior percolação da água e evitar o acúmulo
de água no fundo da caixa. A necessidade de aplicar essas estratégias depende das
condições do local onde será construída a praia artificial (Andrade, 2008; Andrade et al.,
2005, 2004 e 2001; IBAMA, 1989).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 28: Construção da primeira chocadeira do projeto na praia da Aliança, lago do Piraruacá
em 1999.

a) Construção da Chocadeira:
Primeiramente, deve-se delimitar a área para onde serão transplantados os ninhos.
A área pode ser um quadrado ou retângulo, se possível, com uma cerca de 1,2 a 1,5 metros
de altura, feita com tela plástica tipo sombrite, tela metálica de galinheiro, estacas de
madeira, malhadeiras velhas, enfim, o que tiver disponível (Andrade et al., 2005). Se houver
necessidade da caixa de madeira para conter a areia (em áreas onde só haja terrenos de
barro), ela deve ser feita como um baldrame ou mureta de tábuas (figura 29), com a altura
entre 30-50 cm, para transplante de ninhos de tracajá, e 100 cm para transplante de ninhos
de tartaruga (Towsend, 2008; Soini, 1999). Em locais onde existem predadores naturais de
ninhos como algumas aves, gambá (Didelphis marsupialis), jaguatirica (Leopardus pardalis),
teiú (Tupinambis teguxin) e gatos ou cães domésticos, recomenda-se ainda que a chocadeira
seja coberta com fios de nylon bem finos ou malhadeiras de mica para proteger as ninhadas
sem fazer sombra.
Verificar se o local possui, pelo menos, uma altura de 1 m de areia acima do nível
do rio, reduzindo com isso, o excesso de umidade nos ninhos e aumentando a taxa de
eclosão. Catique (2011), Garcez (2009) e Sá (2009) verificaram que praias artificiais para
reprodução de P.expansa em cativeiro que são mais altas (entre 1,5 e 4 m) possuem menor
teor de umidade (6-14%) nas camadas de 0 a 80 cm de profundidade do que praias mais
baixas (0,1 a 1,4 m) que tem maior teor de umidade (19 a 43%), verificaram, sobretudo
que, em praias mais altas a taxa de eclosão é significativamente maior do que em praias
baixas.
O cercado deverá ter as dimensões necessárias para receber um número estimado
de ninhos por espécie, e ainda permitir o deslocamento do pessoal que faz o transplante.
Normalmente, adota-se a distância de 50 cm entre um ninho transplantado e outro de
tracajás ou iaçás (entre linhas), sendo que, entre cada fileira (coluna) de ninhos adota-se
também 50 cm. Para ninhos de tartarugas, a distância entre ninhos e entre fileiras deve

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Manual para os gestores ambientais

ser de um metro (Portal et al. 2005; Andrade et al. 2005; IBAMA, 1989). Soini (1999)
recomenda para ninhos transplantados de tracajás uma distância entre ninhos de 20 cm e
uma distância entre fileiras de 30 cm. Devemos manter uma distância mínima de 50 cm
também entre os ninhos e as paredes laterais do cercado para permitir a movimentação
das pessoas e reduzir o efeito de borda. Então, para transplantarmos 100 ninhos de tracajás
ou iaçás (sendo 10 ninhos/fileira X 10 fileiras) precisaremos de um quadrado de 6 m X 6 m
(5 m X 5 m para os ninhos mais 0,5 m de cada lado para os corredores laterais), conforme
apresentado na figura 31. Para alinhar corretamente a posição dos ninhos, recomenda-se
utilizar um fio guia como referência ou gabarito (figuras 33).

Figura 29: Chocadeira na várzea, substrato barro e terra preta, processo de retirada da
camada superficial de matéria orgânica, raízes e pedregulhos, cercada de tábuas. Igarapé
dos currais, Lago do Pintado, Terra Santa, 1999.

Figura 30: Construção de chocadeiras em Terra Santa e Oriximiná.

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Manual para os gestores ambientais

Na chocadeira fazer da seguinte forma:


- Se possível, fazer o cercamento de toda área das covas mudadas (cerca com 1, 2 a
1,80 m de altura) e cobrir com tela, malhadeira, cordão, etc, a fim de protegê-las da
predação (figuras 28 e 30);
- Fazer as chocadeiras em áreas que atendam as seguintes exigências: áreas planas
e ligeiro declive, sem buracos onde a água das chuvas fique empoçada; área completamente
exposta ao sol sem sombreamento da vegetação (temperatura média de 32,5º ±3,2 º C
para tracajá e 34,5ºC para tartaruga); área livre de pedras, pedregulhos, raízes, troncos de
árvores, e no caso de chocadeiras em área de terra ou barro, remover a camada superficial
de matéria orgânica, liteira, folhiço ou capim (figura 29); área próxima a comunidade mas,
preferencialmente, longe dos locais de lixeira, fossas e esgotos.
- Que tenha pouca umidade e possibilidade de manter profundidade de
aproximadamente 1m de areia acima do relação ao nível do rio;
- Arredar a areia quente e solta da área a ser escavada. Se estiver a areia estiver
muito quente e seca, recomenda-se molhá-la um pouco com regador antes de começar a
abrir o ninho;
- Fazer as covas (ninhos) com espaçamentos em todos os sentidos com 50 cm de
distância uma das outras para tracajás e iaçás e 1 m entre linhas e covas para tartaruga
(figuras 31, 32 e 33);
- Covas ou ninhos artificiais não são simples buracos. Eles simulam os ninhos naturais
(figuras 34 e 35), tendo o formato de uma “bota” com uma câmara onde depositam os ovos
(figura 35). A profundidade média da câmara deve ser de 25- 30 cm na areia e de 15 cm no
barro para ninhos de tracajás e, 60 a 80 cm de profundidade para tartaruga (figura 34);
- Iniciar a cova com ferro-de-cova ou pazinha de jardinagem e terminar com a mão
dando-lhe a forma de uma bota, com 20 a 25 cm de profundidade e uma câmara no final
da cova que comporte os ovos da ninhada (figuras 36 e 37). A câmara deverá sempre ficar
do lado oposto ao rio.

Figura 31: Desenho esquemático de chocadeira para ninhos de


tracajás (P.unifilis). Fonte: Adaptado de Soini (1999).

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Manual para os gestores ambientais

Fig. 32: Linha ou fio auxiliando na marcação da distância correta entre os ninhos transferidos;
Fig. 33: Medindo a distância entre ninhos de tracajás na chocadeira que deve ser 50 cm

Figuras 34 e 35: Desenhos mostrando, esquematicamente, o formato de “bota” e


a câmara de postura em ninhos naturais e a profundidade e formato que devem
ter os ninhos artificiais de iaçás, tracajás e tartarugas.

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Manual para os gestores ambientais

Fig.36: Abertura inicial de ninhos com ferro de cova ou “boca de lobo”;


Fig.37: Abertura de ninhos com as mãos, observar que a frente das covas
é voltada para o lago.

Durante a transferência deve-se ter o cuidado de não rotacionar os ovos, mantendo


sua posição original, tanto no momento da coleta e posicionamento na caixa, quanto no
momento da transferência e posicionamento no ninho artificial. Os ninhos artificiais devem
ser construídos na profundidade média e no formato da espécie (esquema, com
profundidades médias: iaçá 20cm, tracajá:25cm, tartaruga:80cm- Figura 37). A
profundidade do ninho varia de acordo com o tamanho da fêmea e diferenças
morfométricas dos indivíduos são relatadas em diferentes populações (Vanzolini 2003).
Portanto, sugere-se que sejam coletadas informações acerca da profundidade dos ninhos
na região e as profundidades médias encontradas sejam utilizadas para a construção dos
ninhos artificiais.

- Abrir com muito cuidado a caixa de isopor contendo os ovos a serem transplantados
e retirá-los cuidadosamente, colocando-os nas covas transplantes, na ordem inversa de
quando forem retirados da cova original (mantê-los limpos de quaisquer impurezas);
- Não misturar ovos de um ninho com ovos de outros ninhos;
- Tampe o ninho colocando primeiro a areia úmida trazida do ninho original cobrindo-
a totalmente a câmara e os ovos sem nenhuma pressão;
- Depois de colocado o restante da areia, compactar a areia colocada sobre o ninho
com batidas leves com a palma das mãos;
- Fazer o transplante por cova, uma por vez. Esse trabalho deverá ser feito enquanto
a areia estiver úmida e antes que o sol incida sobre os ovos, ou ao final da tarde (16 ou
17h) quando a temperatura estiver mais amena;

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Manual para os gestores ambientais

- Marque com um piquete numerado com o número da cova, o local da coleta e a


possível data de eclosão (60 dias após a data da coleta) e a espécie, guardando as
precauções necessárias a marcação de uma cova normal (figuras 38 e 39). Todas
informações do transplante deverão ser registradas em uma ficha de coleta (data, nome
da praia, espécie que desovou, número de ovos, profundidade e largura da cova, substrato
da cova, distância da água) – figura 40.

Fig.38: Pintando as informações de cada ninho transferido nos piquetes.


Fig.39: Transplante dos ovos e marcação com os piquetes no Piraruacá.

Figura 40: Registro dos dados dos ninhos transferidos em planilha.

- Durante o transplante dos ovos dos ninhos transferidos, recomenda-se fazer a


biometria de cinco ovos a cada cinco ninhos por espécie (figura 41 e 42). Esses dados
permitirão caracterizar melhor as populações de quelônios que estão sendo manejadas e
ajudarão nas avaliações futuras do processo de manejo. Deve-se fazer a biometria dos
ovos de pelo menos 30 ninhos por espécie.

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Manual para os gestores ambientais

Fig.41: Voluntária de biologia/UFAM realizando a biometria dos ovos de ninhos transferidos


na chocadeira do Lago Piraruacá (2015); Fig.42: Medindo o comprimento de um ovo de
tracajá (P.unifilis).

Recomenda-se também, providenciar instrumentos para monitorar a temperatura


média de alguns ninhos transferidos. Podem ser termômetros de solo, termohigrômetros
(mede temperatura e umidade) digitais e, preferencialmente, dataloggers (aparelhos
remotos de registros de dados que registram automaticamente a temperatura do ninho
de hora em hora) – Figura 43. A temperatura de incubação determina o sexo dos filhotes
que irão nascer, sendo importante para o monitoramento do que se está produzindo nos
ninhos transferidos.

Figura 43: Aparelhos usados para medir a temperatura nos ninhos transferidos: Em
cima: Termômetro de solo e termohigrômetro digital; Embaixo: Datalogger individual
e de quatro canais na Fazenda Aliança/Terra Santa e Piraí/Barreirinha.

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Manual para os gestores ambientais

O local para onde os ovos serão transferidos deve conter o mínimo de vegetação
possível, capim e raízes, não deve ter pedras, nem matéria orgânica e nem desníveis no
terreno, a fim de evitar ataques por formigas, infestação por fungos e acúmulo de água. As
pedras e raízes podem se constituir em obstáculo para expansão natural dos ovos durante o
crescimento do embrião, causando o nascimento de filhotes tortos ou defeituosos.
O espaçamento entre os ninhos deve ser o maior possível, sugerindo-se um míni-
mo de 50cm para tracajás e iaçás e de 1m para tartarugas. Este local deve ser alternado de
um ano para outro, sempre que possível, a fim de reduzir a infestação por fungos e o
ataque por formigas. Em casos em que não é possível alternar o local, sugere-se que as
cascas, ovos não eclodidos e filhotes mortos sejam retirados após a contagem e descarta-
dos em outro local.

IV.6. Vale lembrar:


Ressalta-se que a estratégia de conservação ideal de proteção de ninhos de quelônios
é a sua manutenção nos locais originais. Quando não é possível adotar essa estratégia,
deve-se optar pela transferência para áreas naturais. Somente nos casos em que nenhu-
ma das opções anteriores é possível, deve-se optar pela transferência para praias artifici-
ais. É importante lembrar também que a disponibilidade de tempo e interesse das comu-
nidades devem ser considerados no momento de decidir qual estratégia será utilizada,
sendo que esta decisão deve ser tomada em conjunto com os agentes de praia e comuni-
tários interessados.

V. ECLOSÃO

No período de nascimento dos filhotes ou eclosão, os ninhos marcados devem ser


vistoriados diariamente pela manhã. Após a eclosão, são contados o número de filhotes
vivos, de embriões mortos e de ovos sem desenvolvimento. Após a absorção total do
vitelo, alguns filhotes devem ser medidos, pesados, marcados e, posteriormente, liberta-
dos na praia.

V.1. Monitoramento da eclosão:


- Após a desova, deve-se fixar um período de 45-60 dias para iniciar o trabalho de
monitoramento da eclosão dos ovos ou nascimento dos filhotes (figuras 44 e 45) após
percepção do afunilamento dos ninhos;
- O afunilamento da cova acontece entre 45 e 60 dias após a postura dos ovos o que
indica que os mesmos eclodiram e os primeiros grupos de tracajazinhos estão prestes a
sair dos ninhos. Tal processo de afunilamento, só ocorre quando estes animais migram
(sobem) da câmara de postura para a camada mais superficial da cova por provocar afas-

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Manual para os gestores ambientais

tamento da areia na sua superfície o que torna fácil sua identificação. Isso de dá dentro de
um espaço de até cinco (5) dias após o nascimento do primeiro animal que espera o mo-
mento adequado para sair em busca das águas.
- A eclosão de todos os ovos não se processa ao mesmo tempo, pode variar por um
período de até cinco dias após a saída dos primeiros filhotes. Devido a isso, deve-se deixar
que a saída dos filhotes da cova se processe naturalmente até o 3° dia após a saída dos
primeiros animais. Somente depois disso, é que devemos fazer a intervenção, fazendo a
abertura da cova para ajudar sair os que não conseguiram por si só.
- A retirada dos filhotes da cova deve ser feito com as mãos afastando a areia seca
da superfície, escavando a areia úmida e alargando-a cuidadosamente para a completa
retirada dos filhotes que não conseguiram sair por si só (figuras 46, 47, 48);
- Cercar as covas com utilização de tela, cestos de cipó ou vime, caixas de madeira,
etc, isso ajuda, na posterior conferência dos filhotes durante seu nascimento/eclosão.
Caso não seja possível o uso desses materiais por se tratar de uma área com muitos ni-
nhos e nascimentos; deve-se proceder a retirada da cova antes deles emergirem natural-
mente e liberá-los nas águas ou, se for o caso, transportá-los para viveiros ou berçários
nos quais os animais poderão passar alguns dias (30-60 dias) e/ou até o amadurecimento
e absorção da gema umbilical (figuras 49 e 50);
- Lembrar de conferir também, além dos filhotes vivos, o número de ovos não viá-
veis (gorados ou estragados, fungados, ovos não fertilizados) e o número de filhotes mor-
tos para o cálculo da taxa de eclosão de cada ninho.

Figura 44: Eclosão e nascimento de filhote de iaçá ou pitiú (Podocnemis sextuberculata)


no Lago Piraruacá.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 45: Eclosão e nascimento de filhotes de tracajás (P.unifilis).

Figuras 46, 47 e 48: Abertura manual dos ninhos transferidos; conferência de filhotes, ovos gorados e
ovos inférteis; separação dos filhotes vivos para levar ao berçário na Aliança, Lago Piraruacá, Terra Santa
(2010).

Figura 49: Filhote recém-eclodido de tracajá (P.unifilis) com vitelo ou gema umbilical ainda
presente, Terra Santa/PA (2010).Figura 50: Filhote de tartaruga récem-eclodido no Manarian.

1.3. MANUTENÇÃO EM BERÇÁRIOS

No final de novembro de cada ano, quando começam a nascer os filhotes, equipes


de técnicos e voluntários do projeto visitam as áreas para coletar dados sobre a eclosão
em cada chocadeira e fazer a biometria dos filhotes. Os filhotes são identificados com
marcas de tinta à prova d’água (figura 51), pequenos cortes (piques) nas escamas da

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Manual para os gestores ambientais

carapaça (seguindo um código de identificação pelo ano e pela área, figura 52) ou recebem
microchips.
Em áreas de manejo comunitário, os filhotes são mantidos em “berçários” (tanques-
rede, de fibra ou alvenaria, dependendo da comunidade) por um período de 60 dias antes
da soltura. No berçário, esses filhotes recebem alimentos que encontrarão na natureza,
suplementado com ração peletizada com 42% de proteína bruta até serem soltos em lagos
de alimentação próximos ao mesmo local de onde foram retirados os ovos (Andrade et al.
2005) onde provavelmente se encontram os animais adultos da população.

Figura 51: Filhotes de tracajás (P.unifilis) com marcação temporária feita com pincel à prova
d’água ou esmalte.

Figura 51: Filhotes de tracajás (P.unifilis) com marcação temporária feita com pincel à prova
d’água ou esmalte.

A justificativa para deixarmos os filhotes por um período no berçário é para que os


filhotes cresçam mais, endureçam suas carapaças, percam o “cheiro característico de ovo”
que tem em função do vitelo, evitando com isso alguns predadores naturais como a formiga
(figura 53) que os atacam ainda nos ninhos. Ou ainda dificultar a predação por aves, peixes
(figura 54), jacarés e outros animais e, com isso, aumentar a taxa de sobrevivência dos
filhotes no primeiro ano de vida.

112 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Figura 53: Filhote de tracajá (P.unifilis) atacado por formigas no momento da eclosão em
ninho natural na Aliança, Lago do Piraruacá (2010).Figura 54: Filhote de tracajá atacado por
piranha em Barreirinha.

Os berçários são instalações onde os filhotes ficam antes de serem soltos na natureza.
Podem ser gaiolas com tela e madeira, colocadas nos lagos e rios. Podem ser tanques de
alvenaria ou simples recipientes como bacias, caixas de água ou tanques de fibrocimento.
Isso varia em função da quantidade de animais, das caracteristicas da área e da
disponibilidade de recursos. Os comunitários recebem orientação para a construção dos
berçários e o manejo dos filhotes (tipo, quantidade e horário de alimentação; cuidados
com predadores; cuidados com filhotes prematuros ou doentes, etc.).
Os filhotes são mantidos nos berçários até completarem 2 (dois) meses de idade,
período em que já possuem um casco mais resistente e sabem procurar alimentos,
tornando-se menos susceptíveis à predação. Cada berçário de alvenaria tem cerca de
100 m2 (figura 55), já os berçários tipo gaiola (madeira e tela) são feitos de peças de
madeira e tela tipo galinheiro, tendo em torno de 5-10 m2. A escolha do tipo de berçário
depende do local onde ele é implantado e do número de filhotes. Cada berçário, também
é recoberto de fios de nylon trançados ou malhadeiras velhas para evitar a predação
dos filhotes por aves e possui pequenas balsas flutuantes de madeira que servem como
solário, além disso são colocados aguapés e murerus que servem de abrigo e alimentação
para os filhotes (figura 56).

Paulo Cesar Machado Andrade 113

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Manual para os gestores ambientais

Figura 55: Berçário tipo tanque circular de alvenaria com 6 m de raio e paredes
laterais com 60 cm de altura, Aliança, Lago do Piraruacá. Observar detalhe da
malhadeira velha que cobre o tanque protegendo os filhotes de predadores.

Figura 56: Sr.Manoelino Bentes colocando os primeiros filhotes de tracajás no berçário da


Aliança em 1999. Ao lado vemos a colocação de macrófitas no berçário para servir de
abrigo e proteção para os filhotes e simular o ambiente natural onde eles serão soltos.

Os berçários devem ser construídos com antecedência ao nascimento dos animais,


devendo serem providenciados no final de outubro, início de novembro.
Há vários modelos de berçários:
1 - Gaiola telada: feitos de madeira e tela metálica ou plástica e colocado às margens
dos rios de maneira que exista possibilidades de renovação constante da água (figuras 57
e 58);
2 - Caixa de madeira: caixas feitas de tábua e pernamanca colocadas na margem do
rio. São mais resistentes ao ataque de jacarés e peixes mas tem menor circulação de água
(figuras 59 e 60);

114 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

3 - Caixas teladas flutuantes: são caixas de madeira, com as laterais teladas (tela
plástica) mas que estão presas a flutuadores como garrafas pet, tambores plásticos de 50
e 200 litros ou toras de madeira flutuante (assacu). Funcionam como tanques-rede (figuras
61 e 62);
4 - Depressões naturais nas praias: Procura-se áreas mais baixas, vãos entre as
dunas de areia na praia, onde a haja água represada, formando pequenos lagos. Cerca-se
esses lagos com tábuas e troncos.
5 - Tanques de alvenaria: Devem ser preferencialmente de forma arredondada ou
ter os cantos arredondados para evitar o acúmulo de animais nos cantos. Podem ser
totalmente de cimento e tijolo (figura 63) ou terem a base de alvenaria e as laterais de
material impermeável como esteiras de borracha (figura 64).
6 - Tanques ou caixas de água: Podem ser utilizadas caixas d’água de fibrocimento
(figura 65) ou fibra plástica (figura 66). Caixas de 500 litros comportam bem 500 filhotes.
7 - Camburões de metal: Podem ser partidos camburões de metal ou plástico de
200 litros utilizando-se cada metade para fazer um berçário. O tanque de metal tem a
desvantagem de aquecer rapidamente. Devem ser usados apenas para poucos filhotes
(figura 67) e serem colocados na sombra!
8 - Piscinas plásticas: Piscinas plásticas de 1.000 e 3.000 litros constituem excelentes
berçários, sendo práticas e fáceis de transportar. Sua desvantagem é que assim como os
outros tanques fixos, temos de trocar a água constantemente e, além disso, temos de
tomar cuidado para não furarem (figura 68).
9 - Tanques-rede: Existem modelos de tanques-rede industriais feitos com canos de
ferro galvanizado, pintura anti-oxidante, flutuadores plásticos e telas de alambrado com
arame galvanizado recoberto de plástico. Nesses tanques os filhotes apresentaram maior
crescimento do que em todas as outras instalações anteriores, pois ficam no próprio rio, a
renovação da água é constante e podem ser colocados em ambientes mais fundos, evitando
assim o ataque de sanguessugas aos filhotes, o que normalmente ocorre em águas rasas
(figura 69).

Paulo Cesar Machado Andrade 115

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Manual para os gestores ambientais

Fig.57. Gaiola tipo caixa de madeira com tela plástica;Fig.58: Gaiola com tela metálica; Fig.59. Caixa de
madeira com proteção e aguapé;Fig.60: Berçário caixa de madeira em Carauari; Fig.61: Gaiola flutuante
com garrafa pet; Fig.62: Gaiola flutuante com tambor de 200 litros.

Fig.63.Berçário de alvenaria com cantos arredondados;Fig.64: Berçário com a base de alvenaria e lateral
de esteira de borracha; Fig.65: Berçário tipo caixa d’água de fibrocimento;Fig.66: Berçário caixa d’água
fibra plástica;Fig.67: Berçário de banda de camburão de ferro de 200 litros; Fig.68: Berçário com piscinas
plásticas.

116 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Figura 69: Tanques-rede para berçário e criação de quelônios em Terra Santa e Parintins.

1.3.1. Manejo dos filhotes no berçário

a) Durante os dois meses que os filhotes ficam nos berçários deve-se fornecer cerca
de 500 a 800 g de alimento por dia para cada 1.000 filhotes. Preferencialmente, fornecer
alimentos que eles encontrarão na natureza como plantas aquáticas (mureru, capim
canarana, arroz de várzea) ou cultivadas (beldroega, erva-de-jabuti, cariru) e enriquecer
com peixe cru ou assado cortado em pedaços bem pequenos ou moído. Poderá ser
fornecida ração balanceada para peixes em alevinagem (com 36-42 % de proteína) com
pellets bem pequenos (parecidos com grãos de pimenta do reino).
b) As vezes os filhotes recém-eclodidos apresentam ferimentos na região do vitelo ou
gema umbilical que podem ser porta de entrada para infecções bacterianas (figura 70).
Devemos limpar a região do vitelo com algodão embebido em soro fisiológico e pingar uma
gota de iodo. O filhote com vitelo (umbigo grande) não deve ser colocado no berçário junto
com os outros ou mesmo em bacias com água. Ele deve ser mantido em uma caixa de isopor,
com um pouco de areia no fundo, parcialmente tampada, em local fresco e na sombra.

Figura 70: Filhote de tracajá (P.unifilis) com vitelo (umbigo) infeccionado.

Paulo Cesar Machado Andrade 117

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Manual para os gestores ambientais

c) Os filhotes com ferimentos ou problemas com fungos devem ser isolados e


medicados antes de serem colocados nos berçários. Algumas gotas de iodo ou violeta nos
ferimentos e imersão de 1 a 2 dias em banhos de água iodada (10 gotas para 100 litros)
costumam resolver a grande maioria dos problemas com fungos e bactérias nos ferimentos.
d) Manter os ninhos transplantados longe de locais com lixo. Existem moscas que
colocam ovos ou larvas nos ninhos de quelônios (Família Ephidridae e Sarcophagidae).
Depois saem larvas que parasitam os ovos e filhotes dos tracajás, comendo-os vivos (figura
71). Se houver incidência desse tipo de larvas, procurar retirar os filhotes com “míiase” ou
“bicheira”, eliminando as larvas dos ferimentos e tratando os filhotes.

Figura 71: Filhote de iaçá (P.sextuberculata) atacado por larvas de mosca no lago Piraruacá (2011).

1.3. Soltura dos filhotes

A soltura dos filhotes é realizada nos mesmos locais de onde foram coletados os
ovos. Neste momento, com os dados do período de transferência, se pode calcular
quantidade de filhotes que cada praia ou cada comunitário terá direito, com base no
percentual de ovos cedidos por cada local e pelos dados de eclosão conferidos com a
numeração das covas ou ninhos.
Esta atividade ocorre no início de cada ano. Muitas comunidades celebram este
evento, com missas ou cultos, palestras, festas, etc (figura 72). A equipe do projeto, também,
auxilia na organização e nas apresentações durante esses eventos, que já recebem o nome
de “Festa da Soltura”. Esta é uma ocasião onde a comunidade têm a oportunidade de
mostrar para a população do município o fruto de seu trabalho e, também, de se
confraternizarem pelo árduo trabalho desenvolvido.
Antes de liberar os filhotes na natureza deve-se:
- Fazer a biometria de pelos menos 10% dos filhotes (no mínimo 30 animais de cada
espécie);

118 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

- Fazer as anotações necessárias na ficha de controle;


- Fazer a marcação dos filhotes usados para a biometria e, se possível, de todos os
outros filhotes ou caso sejam muitos filhotes pelo menos 30% destes.
Deve-se separar apenas uma pequena parte dos filhotes para serem soltos nas festas
de soltura, na praia em frente aos comunitários e seus convidados. A grande maioria dos
filhotes deverá ser liberada em locais do lago ou rio próximo à margem 2 a 3m ou mais, e
em áreas com abrigos naturais como bancos de plantas aquáticas flutuantes ou macrófitas,
troncos, aningais, capins flutuantes, etc (figuras 73 e 74). Preferencialmente, deve-se
sempre soltá-los em áreas ou locais onde normalmente se visualizam adultos e filhotes no
período da cheia, ou seja, nos lagos de alimentação para onde migram os quelônios após
o período de reprodução (seca).
Com as informações do rastreamento de fêmeas adultas de tracajás e tartarugas
com radiotransmissores via satélite, hoje, já sabemos quais as principais áreas de
alimentação para onde os animais migram em Terra Santa, Barreirinha e Carauari. Além
disso, já identificamos os principais lagos, onde são avistados filhotes, sendo as solturas
direcionadas então para esses lugares. Recomenda-se, caso possível. colocar uma fêmea
adulta junto com os filhotes em berçários grandes, para soltar junto com eles por ocasião
da soltura, a fim de que a mesma funcione como guia para as áreas de alimentação.

Figura 72: Solturas de quelônios na comunidade do Piraí, Barreirinha em 2011.

Paulo Cesar Machado Andrade 119

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Manual para os gestores ambientais

Fig. 73 e 74: Soltura de filhotes em lago de alimentação no Piraruacá.

120 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

Capítulo 4
Técnicas ddee monitoramento e lleevantamento p
mo poopul
ulaacional

Paulo Cesar Machado Andrade; João Alfredo da Mota Duarte

O manejo para conservação da fauna consiste no uso adequado de técnicas com


bases ecológicas e que sejam capazes de modificar as características dos habitats e das
populações, considerando-se todas as interrelações entre os mesmos, para que o recurso
possa se multiplicar e se autossustentar, tornado seu uso sustentável (Bailey, 1984;
Eltringham, 1984; Peek, 1986; Robinson e Bolen, 1989). A exploração de forma sustentá-
vel e racional dos animais da fauna nativa é pouco desenvolvida na América do Sul
(Magnusson e Mariano, 1986; Robson e Redford, 1991; Silvius, Bodmer e Fragoso, 2004).
Todas tartarugas são vulneráveis a sobrecaptura devido a sua peculiar história na-
tural nas quais as fêmeas voltam para a praia onde nasceram para reproduzir, as vezes,
todas as fêmeas de uma espécie retornam para uma única área. A desova é sazonal e atrai
moradores locais que sabem onde as fêmeas enterram seus ovos na areia. Muitos desses
ovos servem de alimento e, mesmo quando a ninhada não é retirada, os filhotes sofrem
alta taxa de mortalidade durante sua caminhada para areia ou nadando nas águas. Com
uma baixa percentagem de recrutamento, todo cuidado deve ser tomado com a captura
de adultos (Eltringham, 1984; Zimmer-Shaffer et al., 2014).
As populações animais tem várias características do grupo que se podem medir
estatísticamente e que não podem ser aplicadas aos indivíduos. Estas características ou
parâmetros populacionais são de três tipos: a) parâmetros de tamanho (abundância e
densidade); b) parâmetros que afetam o tamanho das populações (taxas de natalidade,
mortalidade, imigração, emigração e potencial biótico); parâmetros secundários (distri-
buição etária, razão sexual e distribuição espacial) (Bailey, 1984; Krebs, 1986; Odum, 1988;
Robinson e Bolen, 1989). São parâmetros de estrutura de uma população, aqueles de
obtenção instantânea tais como abundância (N), densidade (D), composição ou distribui-
ção em classes de idade, razão sexual e padrões de distribuição espacial (Krebs, 1986;
Schemnitz, 1987).

Paulo Cesar Machado Andrade 121

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Manual para os gestores ambientais

Populações animais são unidades biológicas que podem crescer, estabilizar ou en-
trar em declínio em função do tempo dependendo da combinação dos efeitos das taxas
de natalidade, mortalidade, imigração e emigração. Essas taxas compõem o que chama-
mos de parâmetros de dinâmica das populações e, estão diretamente relacionados a esti-
mativa da taxa de crescimento intríseca da população ou potencial biótico, r (Eltringham,
1984; Bailey, 1984; Peek, 1986; Schemnitz, 1987; Robinson e Bolen, 1989; Brower, Zar e
Ende, 1989).
O termo dinâmica de populações se aplica ao estudo das variações no número de
indivíduos da população e dos fatores que influenciam essas variações; igualmente inclui
a investigação das taxas em que se verificam as perdas e reposições de indivíduos e de
qualquer processo regulador que tenda a manter o tamanho da população em equilíbrio
(Bailey, 1984; Odum, 1988; Krebs, 1989; Rau, 1993; Gotelli, 2007). Os parâmetros de dinâ-
mica – natalidade, mortalidade, imigração e emigração – são os principais parâmetros de
uma população (Bailey, 1984; Krebs, 1986; Robinson e Bolen, 1989).
Tamanho populacional e taxa de crescimento ou declínio dependem, entretanto,
de vários fatores: 1) o número de indivíduos a ingressar na população (nascimentos e
migração), 2) o número de indivíduos deixando a população (mortes e emigrações) e 3) a
rapidez com que os indivíduos amadurecem e se reproduzem. Um modelo de população
organiza essas informações de uma forma que permite ao modelador prever as mudanças
no tamanho da população e a taxa de crescimento devido a mudanças específicas nas
taxas vitais ou valores de entrada, como um aumento na produção de filhotes devido a
proteção do ninho. (Crouse, 1999).
A maioria dos animais tem reproduções sazonais, produzindo suporte anual de
nascimentos. Apenas se nós analisarmos um longo período de tempo (50 a 100 anos),
esses arrancos de crescimento (pulsos) tornam-se menos visíveis, permitindo compara-
ções através de curvas logísticas (Robinson e Bolen, 1989; Gotelli, 2007).
As tartarugas são animais de longa vida e modelos que requerem estimativas
demográficas de idade, crescimento, fecundidade e sobrevivência são fundamentais para
o seu manejo. A maioria dos estudos que estimam a idade e o crescimento de tartarugas
de água doce, utilizam os anéis como um índice de idade, sem estimar o seu erro e, pou-
cos estudos que usam modelos de crescimento, incluem muitos juvenis, onde o cresci-
mento é geralmente grande e variável (Spencer, 2002). A relação entre a idade e o tama-
nho é importante para o desenvolvimento de modelos demográficos e a identificação de
fases da vida onde os quelônios estejam mais susceptíveis (Benhard e Vogt, 2010; Gotelli,
2007; Krebs, 1989).
Estudar o crescimento de quelônios pode ajudar a tomar melhores decisões em
nível de manejo. Muitos fatores demográficos da história natural dos animais são media-
dos ao menos em parte pelo tamanho corpóreo. Por exemplo, deseja-se saber quão rápi-

122 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

do uma população de animais pode crescer (ou sob que nível uma população pode ser
explorada em termos biologicamente sustentáveis), será preciso ter em mente quão rápi-
do os animais alcançam a maturidade sexual (que é uma das variáveis demográficas mais
importantes) - (Abercrombie e Verdade, 2000).
A proteção dos ovos e ninhos sozinha não foi suficiente para repor estoques esgo-
tados de tartarugas marinhas (Bjorndal, Bolten e Martins, 2000; Crouse, 1999). Os mode-
los mostraram que pequenas reduções na sobrevivência anual de juvenis e de adultos
podem ter efeito profundo sobre a dinâmica da população reduzindo o crescimento
populacional. A redução das taxas de mortalidade de juvenis e adultos são essenciais para
a recuperação das populações de tartarugas marinhas. Assim, os modelos mais completos
construídos para a população de tartarugas marinhas, bem como modelos para as outras
espécies de quelônios, apontam para a necessidade de manter a sobrevivência anual ele-
vada de todas as fases da vida para sustentar populações em declínio (Crouse, 1999).
A superexploração, como recurso alimentar, para as populações humanas resultou
também na queda drástica ou extinção de populações de tartarugas marinhas (Zimmer-
Schaffer et al., 2014). Tentativas de controlar o restante das populações de forma susten-
tável são dificultadas pelo conhecimento insuficiente dos parâmetros demográficos. Em
particular, as respostas compensatórias resultantes de efeitos dependentes de densidade
não eram avaliadas para uma população de tartarugas marinhas e, portanto, não eram
explicitamente incluídas em qualquer modelo populacional (Bjorndal, Bolten e Chaloupka,
2000).
Para Podocnemis expansa, existem poucos estudos visando estimar modelos de
crescimento populacional e de biomassa (Diniz e Santos, 1997, e Bataus, 1998, Andrade,
2015).
Um desafio importante para o estudo da demografia e padrões da história de vida
de quelônios aquáticos é a fase juvenil, onde esses indivíduos dificilmente são captura-
dos, talvez por habitarem ambientes pelágicos ou de difícil acesso, sendo que, informa-
ções importantíssimas, deste estágio de vida imaturo, como a taxa de crescimento e a
mortalidade, em geral são extrapolados nos modelos populacionais (Bjordal, Bolten e
Chaloupka, 2000).
Outra forma de se modelar os dados de estrutura e dinâmica de populações
são as tabelas de vida. Tabelas de vida sumarizam informações importantes como sobre-
vivência, fecundidade e idade de maturação de uma população, permitindo, a partir de
uma estrutura de idades inferir sobre a dinâmica e a evolução de uma população. Tabelas
de vida também podem auxiliar na construção de modelos hipotéticos sobre crescimento
populacional e sobrevivência (Robinson e Bolen, 1984; Peek, 1986; Schemnitz, 1987).
Os atributos necessários para compilar uma tabela de vida para tartarugas são: 1)
Idade média na maturidade; 2) Fecundidade per capita de fêmeas, incorporando tama-

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Manual para os gestores ambientais

nho e frequência da ninhada e ajuste para frequência reprodutiva intersazonal ou propor-


ção média de fêmeas adultas que não estão reprodutivas cada ano; 3) sobrevivência em
todas as classes de idade desde ovo até adulto (Frazer, Gibbons e Greene,1990).
Diniz e Santos (1997) propuseram um primeiro modelo de avaliação do crescimen-
to populacional de tartaruga da Amazônia (Podocnemis expansa) utilizando como modelo
matemático a matriz de Leslie. Adotando alguns valores como média dos ovos, razão se-
xual, taxa de sobrevivência dos filhotes até um ano, idade da maturidade sexual, eles
chegaram à conclusão de que, tendo em vista, o estudo qualitativo do sistema e o valor
obtido da cota de Kojima para os parâmetros bióticos considerados (β< 0,7< 1), as popula-
ções de Podocnemis expansa estavam caminhando para a extinção. Contudo, se os filho-
tes fossem protegidos e pelo menos 20% deles completassem o primeiro ano de vida e,
desses, outros 20%, chegassem a atingir a idade reprodutiva, o valor de â subiria para 1,05
(ou seja, maior que 1), o que levaria a população ser preservada.
A maioria dos programas de proteção de P.expansa e P.unifilis na Amazônia, procu-
raram proteger as fêmeas em reprodução, os ninhos e filhotes, o que parece ter contribu-
ído significativamente, fazendo com que essas espécies saíssem do risco de extinção
(IBAMA, 1989; Cantarelli, 1997; Cantarelli et al., 2014).

A) Uma abordagem preliminar para uma análise das séries temporais de registros
da produção de ninhos e filhotes em áreas protegidas de nidificação de quelônios:

Na grande maioria das áreas onde realiza-se o trabalho de proteção aos sítios de
desova de tartarugas, tracajás e iaçás, os principais dados registrados são o número de
ninhos, estimativa do número total de ovos e a produção de filhotes. Em alguns desses
tabuleiros existem longas séries históricas dessas informações coletadas regularmente
anualmente e com anotações sistematizadas e eficientes, padronizadas através dos pro-
tocolos estabelecidos anteriormente pelo Projeto Quelônios da Amazônia (como visto no
capítulo 2). Essas séries de dados históricos, que em algumas Unidades de conservação
(como por exemplo a Resex do Médio Juruá) ou tabuleiros protegidos (como Walter Buri)
chegam a mais de 40 anos de registros (Andrade, 2015). Essas informações, se bem anali-
sadas, podem nos fornecer uma razoável idéia sobre as tendências do crescimento
populacional dos estoques de quelônios aquáticos nestas regiões.
Propomos aos gestores uma abordagem simplificada, que nos permite ajustar as
séries históricas de dados de produção anual de ninhos e filhotes em cada tabuleiro a um
modelo logístico de crescimento populacional.
Os dados de produção de ninhos e filhotes devem ser registrados em cada área de
nidificação anualmente e, em seguida tabulados. Esses dados de produção de ninhos e
filhotes por espécie em cada praia devem ser relacionados ao tempo de proteção de cada

124 Paulo Cesar Machado Andrade

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Manual para os gestores ambientais

área ou seja, podemos montar histogramas (gráficos) relacionando a produção de ninhos


ou filhotes em cada ano de proteção (Série Temporal). Na própria planilha eletrônica de
tabulação (Excell) podemos fazer uma análise de tendências e verificar qual delas (linear,
quadrática, exponencial, etc.) apresenta melhor ajuste (melhor valor de R).
Caso a regressão seja significativa, deve-se verificar através da estimativa da curva
qual o modelo que melhor descreverá a relação para a construção da curva de crescimen-
to populacional, sendo utilizados na avaliação as curvas logísticas e de Gompertz (Gotelli,
2007; Barry, 1995). As estimativas de curvas podem ser feitas através de programas esta-
tísticos bem simples (PAST 2.08, MINITAB, Statistica, etc.), sendo, posteriormente, defini-
do como modelo geral de análise a curva logística:

- Logística: Nt= K ,
1 + [(K-No)/No].e-rt

onde Nt= número total de ninhos/fêmeas desovando ou filhotes produzidos no


tempo t; No= Número de ninhos, fêmeas desovando ou filhotes produzidos no primeiro
ano do trabalho de proteção; r = taxa de crescimento intrínseca da população; e=constante
neperiana=2,717; K= capacidade suporte do meio (Gotelli, 2007).
Com os modelos de curvas sendo estabelecidos para cada sítio de reprodução/
espécie podemos obter os valores dos coeficientes r (taxa de crescimento intrínseco) e K
(capacidade suporte) dos modelos de crescimento do número de ninhos e de filhotes. Os
valores de K também podem ser determinados através da densidade máxima de uma
população. Os valores de r e K podem ser obtidos diretamente dos modelos de curva
estimados pelo programa estatístico (Brower, Zar & Ende, 1989; Krebs, 1986).
Se a taxa de crescimento intrínseco (r) for maior do que zero significará que a popu-
lação apresenta tendência de crescimento; se for igual a zero, significará que estabilizou;
e se for menor que zero, significará que apresenta uma tendência ao declínio (Krebs, 1986).

Paulo Cesar Machado Andrade 125

MANUAL 2.pmd 125 15/12/2016, 16:43


Manual para os gestores ambientais

Figura 1: Histogramas de produção de ninhos e filhotes de tartaruga (P.expansa) em sítios de reprodução


do rio Juruá: a) Ninhos no Walter Bury; b) Filhotes no Pupunha; c) Ninhos no Manariã; d) Filhotes no
Manarian (Fonte: Andrade, 2015)

Figura2: Curvas logísticas de ninhos de tartaruga (P.expansa) em diferentes sítios de nidificação: A) Abufari,
rio Purus; B) Manarian, rio Juruá (Fonte: Andrade, 2015).

126 Paulo Cesar Machado Andrade

MANUAL 2.pmd 126 15/12/2016, 16:43


Manual para os gestores ambientais

A tabulação da série histórica de dados dos trabalhos de proteção de tartarugas


(P.expansa), tracajás (P.unifilis) e iaçás (P.sextuberculata) realizados em cada tabuleiro
permitirá que possa ser realizada a análise da variação do número de fêmeas desovando
em cada tabuleiro e do número de filhotes produzidos ao longo dos anos.
Apesar do número de ninhos não necessariamente indicarem o número de fêmeas
reprodutivas na praia (em especial no caso das espécies com desova múltipla como P.unifilis
e P.sextuberculata), e também não constituírem o número total de indivíduos de uma
população de determinada espécie de quelônios associada a um sítio de nidificação, pois
faltariam os machos adultos, as fêmeas que não reproduziram, os jovens e filhotes, deve-
se considerar que, sua variação ao longo do tempo, poderia ser o único indicador consis-
tente da variação populacional naqueles sítios de reprodução protegidos.
Deve-se levar em conta que, em pouquíssimos locais de proteção de quelônios já
foram realizados levantamentos mais amplos e de longa duração com captura de animais,
marcação, biometria, que possibilitassem o registro de informações básicas sobre a estru-
tura da população (razão sexual, classes de tamanho, abundância). O mesmo se pode
considerar com relação ao número de filhotes produzidos, diretamente relacionados ao
número de ninhos colocados em cada praia.
Entendendo-se que para Podocnemis expansa existem poucos estudos visando es-
timar modelos de crescimento populacional (Diniz & Santos, 1997; Correa, 1978) e que,
mesmos nestes casos, na verdade consistiam apenas em modelos de projeção de descen-
dência por fêmeas, seria mais robusto utilizar os dados reais de variação de ninhos/fême-
as reprodutivas e filhotes, como indicadores de variação populacional.
Desta forma, optou-se por utilizar um modelo mais simples de crescimento
populacional para verificar se os dados de ninhos e filhotes se ajustavam aos modelos
de curva de crescimento testados (logístico, conforme sugerido por Hailey & Lambert,
2002). Consideramos um modelo de crescimento contínuo ao invés de discreto e com
retardo na resposta denso-dependente, pois quando as taxas de crescimento intrínseco
(r) são inferiores a 1,0 (como mostrou ser o caso das espécies de quelônios
Podocnemidideos), o comportamento do modelo discreto é semelhante ao contínuo
(Gotelli, 2007; Andrade, 2015).
A velocidade de crescimento do número de ninhos/fêmeas reprodutivas por unida-
de de tempo (r t) é específica para cada espécie no sítio de nidificação analisado em um
dado período de tempo de proteção da área, não fazendo sentido, portanto, obter-se os
valores médios de r para cada sistema de proteção utilizado.
O mesmo raciocínio é válido para a capacidade suporte (K) de cada praia de
nidificação ou tabuleiro quanto ao número de fêmeas de determinada espécie que supor-
tará nidificando em sua área. A competição por espaço para os ninhos na areia do sítio de
postura, poderá chegar a um nível tal, em que haverá superposição de ninhos e as fêmeas

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Manual para os gestores ambientais

acabarão desenterrando e jogando os ovos das outras, o que implicaria diretamente na


quantidade de filhotes gerados. Ou então, algumas fêmeas acabariam buscando outros
locais para nidificar. Ou seja, cada sítio de reprodução tem sua capacidade suporte (K)
para ninhos e filhotes produzidos sendo limitada principalmente pelo fator espaço, por-
tanto, essa constante também é específica para cada espécie e sítio de postura, não fazen-
do sentido, utilizar-se o valor médio de K para gerar um modelo único de curva de cresci-
mento populacional.
Entretanto, os parâmetros populacionais r e K são valores que possuem unidades
que permitem a comparação entre uma área de conservação e outra. As unidades de r
significam indivíduo por indivíduo e unidade de tempo (Gotelli, 2007). Dessa forma, será
possível comparar as taxas de crescimento instantâneo entre os diferentes sistemas de
proteção utilizados ao longo do tempo nas áreas de reprodução de quelônios do Amazo-
nas.

B) Metodologia para o levantamento dos parâmetros de estrutura e dinâmica de


uma população de quelônios:
Para estimar o tamanho e a estrutura das populações de quelônios das áreas a
serem estudadas e as taxas de crescimento médio de seus indivíduos, deve ser utilizada a
metodologia de captura-marcação-recaptura (CMR). Este método permite obter não ape-
nas uma estimativa da densidade, mas também, a taxa de sobrevivência e de mortalidade
das populações estudadas (Rau, 1993; Krebs, 1986; Dajoz, 1983).

Captura, Marcação e Recaptura (CMR) de Quelônios:

Deveremos realizar a captura de adultos, subadultos, jovens e filhotes de Podocnemis


expansa, P. unifilis e P. sextuberculata nas áreas de proteção e manejo. Recomenda-se
que sejam feitas excursões de levantamento e monitoramento em diferentes períodos do
ano (pelo menos seca e cheia), sendo montadas estações de captura em diferentes ambi-
entes (rios, lagos, florestas inundadas, margem das praias). As técnicas de captura e mar-
cação serão diferenciadas de acordo com a categoria ou classe de idade e o local e perío-
do de captura, objetivando marcar o maior número possível de indivíduos.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 3: Sistema de captura, marcação, biometria e soltura de quelônios como método de


levantamento populacional.

Para captura de quelônios aquáticos normalmente se utilizam redes (malhadeiras,


transmalhas, arrastão, tarrafa), captura manual na praia durante a desova (viração), puçás,
anzóis com isca (camurim, espinhel, muito arriscado pois machuca o animal e, se não for
retirado adequadamente pode matá-lo) entre outros (jaticá, curral, mergulho, etc.). Os
ribeirinhos de cada local sabem qual o melhor petrecho de captura para cada época do
ano e tipo de ambiente. Nós podemos aproveitar esses equipamentos e conhecimento
local para aumentar o máximo possível o número de animais capturados, o que é bom
para o método CMR (quanto mais indivíduos capturados e marcados, maior a chance de
recaptura). Entretanto, como queremos padronizar os métodos de levantamento para
que possamos comparar as capturas na mesma área ao longo do tempo e até com outras
áreas, é importante que tenhamos pelo menos um equipamento padrão, que servirá como
testemunha ou controle, e usar os outros equipamentos, sempre tendo o cuidado de
registrar o esforço de captura ou unidade por esforço de captura (CPUE).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 4: Diferentes petrechos e formas de captura de quelônios: Arrastão; Malhadeira; Capa-


saco e viração.

Para captura de adultos, subadultos e jovens sugerimos que sejam utilizadas baterias
de pelo menos três redes do tipo transmalhas (trammel-net) ou feiticeiras com 100-150
metros de comprimento por 2,5 - 4 metros de profundidade (malhas variando de 70 a 240
mm), três malhadeiras de monofilamento de nylon com 60 metros de largura por 2 metros
de profundidade (malhas de 70, 100 e 140 mm) e duas malhadeiras de fio de algodão com
100 metros de comprimento e 4 metros de profundidade (malhas de 90 e 100 mm)
colocadas em diferentes microambientes dentro de rios, lagos, igarapés, sacados, furos,
igapós e florestas inundadas para descobrir onde cada classe de tamanho de cada espécie
ocorre em diferentes épocas do ano e próximo às áreas de nidificação. Essa bateria de
redes ficará na água em um esforço contínuo de captura com períodos de 24 a 48 horas,
durante os quais, os apetrechos serão revisados de duas em duas horas, para se evitar o
afogamento ou a predação dos animais (Andrade, 2015). Se não for possível revisar as
malhadeiras durante a noite, recomenda-se que sejam retiradas ao final da tarde (18h) e
instaladas novamente no início da manhã (6h).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 5: Utilização de malhadeiras tipo transmalhas (trammel-net) como equipamento padrão


em levantamento e monitoramento de populações de quelônios em Barreirinha, Floresta Tapauá
e Resex Médio Juruá.

Complementarmente podemos utilizar um petrecho conhecido como arrastão que,


dependendo da época do ano, e poderá ser utilizado para o arraste nos remansos em
frente às praias de reprodução (normalmente locais chamados boiadouros e onde se
concentram os quelônios antes da postura) no período da seca. Ou poderá ser utilizado
como rede de espera, quando parte dele é costurada para formar um grande funil, e
colocado fechando os canais de rios, furos e sacados, por onde esses animais migram no
início da vazante e na enchente. Os arrastões em geral medem de 150-200 metros de
comprimento por 5-8 metros de altura e malha de 60 mm.

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Manual para os gestores ambientais

Além dos plotes de redes de emalhar e do uso do arrastão, deve ser feita a captura
da forma artesanal com apoio de pescadores locais, nos canais dos lagos, ressacas, paranás
e nos remansos dos rios perto das praias. Neste processo serão utilizadas malhadeiras de
40-100 m de comprimento, profundidade de 2-3 m e com uma linha de flutuadores na
parte superior, sem chumbo na parte inferior, com malhas de diâmetro 90, 100 e 190 mm.
Eventualmente, em locais propícios como igapós e floresta inundada, será realizada
também a captura com mergulho e procura ativa.

Figura 6: Captura de filhotes e juvenis de P.unifilis através da técnica de mergulho no rio Andirá, em
Barreirinha.

Dependendo do ambiente para captura existem outros tipos de petrechos utilizados


nos estudos de monitoramento de quelônios que podem ser utilizados. Para ambientes
com pouca correnteza (lênticos) e pouco profundos, como lagos rasos, remansos, poças,
igarapés, podemos utilizar um tipo de rede-armadilha chamada “fyke-net”, que é uma
espécie de rede que serve para afunilar, conduzir o quelônio que a encontra (como se
fosse uma seringa ou brete de um curral), levando o animal até uma espécie de bambolê
(aro) metálico ou de madeira, com um funil de rede, no qual o animal entra e não consegue
mais sair. Sua variante sem a rede de afunilamento é a chamada “funnel-trap”. Estas
armadilhas funcionam melhor quando colocamos iscas dentro delas. Em geral, coloca-se
a isca dentro de latas de alumínio de qualquer bebida para peixes como a piranha não
comerem a isca. Faz-se vários furos na lata, e colocamos pedaços de peixes, pescoço de
frango, vísceras, de forma que o odor e os líquidos exudantes da carne em decomposição
atraiam os quelônios para a armadilha. Ter muito cuidado pois, eventualmente, atraem
também outros animais, como o jacaré. Pode capturar tartarugas e tracajás, mas é muito
mais utilizada para captura de outras espécies de quelônios aquáticos como mata-matá,
cabeçudo, lálás e cágados.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 7: Redes-armadilha tipo Fyke-Net e Funnel-trap e sua utilização para


levantamento de quelônios em ambientes lênticos como lagos e barragens.

Para filhotes e juvenis de quelônios que, às vezes, se escondem em poças, lagos ou


chavascais, onde a vegetação da margem, ou excesso de troncos e jacarés, dificultam a
instalação de redes ou mesmo a procura ativa através do mergulho, uma armadilha que
pode ser usada é a chamada basking-trap. Ela consiste numa espécie de quadrado com
flutuadores que servem de rampa para os quelônios subirem para pegar sol. Quando se
assustam ou mergulham, normalmente eles se movem para frente, e acabam caindo dentro
de uma rede da qual não conseguem sair. Este tipo de equipamento serve, especialmente,
para filhotes e juvenis de tracajás (P.unifilis) que normalmente sobem em troncos e galhos
de pau nas margens dos lagos e rios para tomar sol.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 8: Utilização de basking-trap para captura de filhotes de tracajás no lago Piraruacá, em Terra
Santa.

Os plotes deverão ser repetidos nos mesmos locais em quatro (4) épocas distintas
do regime hídrico para comparar os efeitos da sazonalidade na abundância das espécies
(Podocenemis expansa, P. unifilis e P. sextuberculata) em diferentes habitats. Podem ser
realizadas capturas na cheia (janeiro), no início da vazante (maio-junho), na seca (agosto-
setembro) e no início da enchente (novembro-dezembro). Cada animal deverá ser marcado,
identificado, sexado, medido e pesado, sendo que, todos os animais capturados em cada
local, só serão soltos após o término do esforço de pesca naquele local (Bernhard & Vogt,
2010; Fachín-Terán, 2000; Pezzuti, 1997).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 9: Captura de quelônios em diferentes períodos (cheia, vazante, seca) e diferentes ambientes.

Durante o período de nidificação, para capturar as fêmeas adultas de P.expansa,


P.unifilis e P.sextuberculata que desovam nas praias, podemos utilizar a técnica que os
ribeirinhos chamam de viração. As praias serão percorridas durante a noite, em dois turnos
de 19 às 23 horas e de 24 às 5 horas, quando será feita a procura ativa por quelônios na
praia. Quando as fêmeas forem encontradas desovando, se aguardará o término da postura
e, só então, o animal será virado com o plastrão para cima, onde receberá uma numeração
provisória com pincel de marcação permanente. Recomenda-se que, em seguida, seja
feita a inspeção do ninho, sendo medida a profundidade até o início da câmara de postura
e a distância do ninho para água. Também sugerimos que se aproveite e se faça a biometria
de quinze ovos de cada ninho, que serão medidos, pesados e devolvidos para a cova.
Então, o animal que foi virado será colocado em um saco de fibra ou algodão e conduzido
para uma base (de preferência na sombra, na praia ou em outro local) a fim de que receba
a marcação definitiva, seja medido e pesado, e posteriormente, solto. O período máximo
de retenção do animal deverá ser 12 horas (Soares, 2000).

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Manual para os gestores ambientais

Figura 10: Viração de tartarugas (P. expansa) no tabuleiro do Manrian, RDS Uacari.

Dos animais capturados deverá ser tomadas medidas retilíneas do comprimento


máximo da carapaça (CMRC), largura da carapaça (LMC), comprimento e largura do plastrão
(CP e LP) e altura da carapaça (AC) medidos em animais adultos, subadultos e jovens com
paquímetro de madeira de 100 cm (± 1 mm) e, em filhotes, com paquímetro plástico ou
de metal de 180 mm (± 0,05 mm). Animais acima de 15 kg serão pesados em balanças de
mola com capacidade de 25 e 100 kg (graduação de 100 g), animais entre 5 e 15 kg serão
pesados em balança digital com capacidade de 15 kg (graduação de 5 g) e animais menores
que 5 kg serão pesados em balanças digitais com capacidade para 5 kg (graduação de 1 g).
Na sexagem, os machos serão identificados através do dimorfismo sexual da cauda maior
e, no caso, do P.unifilis das manchas amarelos presentes na cabeça.

Figura 11: Biometria de tracajá em Barreirinha: Comprimento e largura da carapaça.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 12: Medidas de comprimento e largura de carapaça e comprimento e largura de


plastrão. (Fonte: Luz, 2005).

Para estimar a idade dos animais podem ser contados os anéis de crescimento do
primeiro escudo costal da carapaça ou dos escudos peitoral ou humeral do plastrão,
considerando sempre aqueles cujos anéis de crescimento dos escudos estiverem mais
evidentes. O número de anéis de crescimento formado entre a primeira e a segunda captura
será comparado com o tempo decorrido entre as capturas. Desta forma, os animais poderão
ser agrupados nas seguintes classes de idade: a) Filhotes: do nascimento aos 2 anos de
idade; b) Jovens: de 2 a 4 anos de idade; c) Subadultos: de 4 a 7 anos de idade; d) Adultos:
acima de 7 anos. A classificação adotada foi baseada nos estudos sobre tamanho e idade
à primeira postura em cativeiro para P.expansa e P.unifilis realizados por Garcez (2009) e
pela análise das gônadas de P.expansa e P.unifilis de cativeiro e vida livre feitos por Silveira
et al. (2009), e que estimaram a idade à maturidade entre 7 a 8 anos para as duas espécies.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 13: Biometria e estimativa de idade de cabeçudo (Peltocephalus dumerilianus).

Os quelônios adultos, subadultos e jovens serão marcados com um código individual


através de furos nos escudos laterais da carapaça (adaptado de Cagle, 1939). Adultos e
subadultos podem receber, também, placas de alumínio de 45 mm X 15 mm, com o número
de serial e o local de captura. As placas serão fixadas nos escudos marginais supra-caudais
da carapaça, através de rebites metálicos.

Figura 14: Sistema de marcação com furos na carapaça e fixação de plaquetas metálicas com numeração
serial. Figura 15: Abaixo sistema de códigos – permite numerar até 9.999 animais.

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Manual para os gestores ambientais

Os filhotes podem ser marcados com sistema codificado de furos ou picos/cortes


nas escamas marginais da carapaça, sendo que, neste caso a identificação trará apenas o
ano de nascimento e o local de soltura (Plummer, 1989). Outra forma de marcação
individualizada e definitiva nos filhotes é através da inserção de microchips (transponders
ISSO FDX-B 12mmX2mm) ou pit-tags.
Antes de serem soltos, deve ser feita a marcação dos filhotes e sua biometria. Se
forem poucos filhotes (menos de 1000) marcamos todos os filhotes, se não podem ser
marcados 30% dos filhotes. A marcação pode ser feita com picos na carapaça feitos com
alicate de unha. Utilizar um código para o ano e outro para o local. Este tipo de marcação
pode ser visualizada até 2-3 anos de vida

Figura 16: Marcação de filhotes com picos nas escamas laterais da carapaça feitos com alicate de unha.
Estes cortes regeneram, mas se bem feitos, são visíveis até 3 anos de idade, o que permite estimar a
sobrevivência e o crescimento dos filhotes recapturados neste estágio de vida.

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Manual para os gestores ambientais

MARCAÇÃO COM MICROCHIPS: Microchips , transponders ou pit-tags são


dispositivos utilizados para marcação de quelônios que possuem uma espécie de código
de barras que permitem identificar o filhote definitivamente. São do tamanho de um grão
de arroz e são injetados no espaço entre a cauda e a pata traseira esquerda. Depois de
aplicado, precisamos de um leitor para captar o sinal e dizer o número de série do filhote.
São equipamentos caros (além dos chips, tem de comprar aplicadores e leitor), mas os
monitores podem ser facilmente treinados para fazer a marcação e ler os chips.

Figura 17: Aplicação de microchip no lado esquerdo da cauda. Leitura do microchip.

Figura 18: Aplicando microchips em filhotes de tartarugas na RDS Uacari.

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Manual para os gestores ambientais

C) Técnica para análise da alimentação dos quelônios:


As atividades conservacionistas de quelônios na Amazônia encontram-se fortemente
focadas na proteção de praias de reprodução e fêmeas no período de desova para o
aumento do número de filhotes (IBAMA, 1989). Entretanto, existe necessidade de estudar
a alimentação desses animais nas diversas fases do seu ciclo de vida, pois pouco se conhece
sobre suas reais exigências nutricionais dos quelônios em vida livre e que os quelônios
estão se alimentando, permitindo analisar a disponibilidade de alimento nos locais de
proteção e também a manutenção dessas espécies na natureza em áreas não desmatadas
e deixando-as como ambientes de recria, proteção contra predadores e alimentação para
os quelônios.
Para a coleta do conteúdo estomacal devemos utilizar Técnica de Flushing de Legler
(1977) que consiste na lavagem estomacal do quelônio através da introdução de uma
sonda pela boca, passando pelo esôfago até chegar ao estômago. À medida que a sonda
for introduzida no animal, adiciona-se água através de seringa de 60 mL até que complete
a boca do animal. Durante todo esse procedimento o animal deve ficar mantido na posição
vertical. Em seguida o animal deve ser virado de cabeça para baixo, forçando a regurgitar.
Estes procedimentos devem ser realizados imediatamente após as capturas, sendo aplicado
até o aparecimento de uma camada de muco esbranquiçado, que indica a total lavagem
do estômago (Legler, 1977). Para confirmação de ausência de conteúdo estomacal no
estomago (se houver), a lavagem deve ser repetida. Os conteúdos estomacais são filtrados
em um coador e transferido para a placa de Petri onde serão identificados por data, local
e numeração dos quelônios, em seguida deve ser condicionado em caixa de isopor em
resfriamento e posteriormente congelado para identificação dos itens alimentares.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 19: Aplicação da técnica de flushing para lavagem estomacal de quelônios.

A determinação da dieta e dos hábitos alimentares dos quelônios deve ser realizada
preferencialmente para indivíduos jovens e adultos, sendo utilizada uma lupa esteroscópia
para examinar e identificar os itens alimentares. As fontes alimentares potenciais para os
quelônios podem ser divididas em: 1) itens de origem animal como peixes (PXS), insetos
(INS), crustáceos (CRU) e moluscos (MOL). 2) itens de material vegetal como frutos (FRU),
sementes (SEM), flores (FLOR), caule e talos (CAU), raízes (RAIZ), folhas (FOL), algas e/ou
perifítons (AL+PER) e material vegetal não identificado (MV); o restante foi classificado
como sedimentos e/ou detritos (SED+DE) e outros.
Podemos usar o método de frequência de ocorrência registrando o número de
estômagos que contém um determinado item alimentar em relação ao total de estômagos
com alimento (Hyslop, 1980). Segundo Hahn e Delariva (2003), a frequência de ocorrência
fornece informações sobre a seletividade ou a preferência do alimento ingerido.
A frequência de ocorrência é calculada conforme a fórmula:

F.O = Σi.100/ N
Onde:
F.O= Frequência de ocorrência;
i = Número de estômagos em que cada item alimentar foi identificado;
N = Número de estômagos analisados com alimento.

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Manual para os gestores ambientais

O volume relativo é a estimativa visual do volume de cada item alimentar em relação


ao volume total do alimento em cada estômago, em percentagem (Hyslop, 1980).

Figura 20: Lavagem estomacal (flushing) em tartaruga na Resex Médio Juruá para obtenção
de conteúdo estomacal e determinação dos itens alimentares da dieta do animal.

Os resultados individuais de ambos os métodos podem ser combinados no índice


alimentar (IAi), que avalia o grau de importância que cada alimento possuiu na dieta dos
peixes. O IA será expresso em percentagem e calculado segundo Kawakami e Vazzoler
(1980) para cada item, adotando a expressão:

IAi =Fi * V / Σ (Fi*V), onde:


n=1

Onde:
i= item alimentar;
F= frequência de ocorrência (%) do determinado item;
V= volume (%) de determinado item.

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Manual para os gestores ambientais

A partir dos valores do Índice Alimentar calculados podem ser determinadas as


categorias tróficas para cada período por espécie. Itens que apresentaram IAi superior a
50% serão considerados dominantes e determinarão a categoria trófica das espécies.
Quando um item não atingir os 50%, os itens mais abundantes serão somados para
determinar a categoria trófica.

D) Estudos de movimentação e migração: Radiotelemetria em quelônios:

A radiotelemetria ou o estudo da movimentação de animais através do uso de


radiotransmissores pode nos fornecer respostas muitomais rápidas sobre o padrão de
movimentação/migração e autilização de ambientes pelos animais do que o método de
captura-marcação-recaptura tradicional.
Para analisar o padrão de movimentação de P.expansa e P.unifilis e estimar a área de
vida nas áreas manejadas podemos instalar rádiotransmissores via satélite (como por exemplo
os da marca Sir Track) ou radiotransmissores VHF (como os AVM). No caso de transmissores
VHF, após a instalação dos rádios, os animais devem ser monitorados, diariamente, por
técnicos de campo munidos de antenas receptoras VHF e aparelhos de GPS para
georreferenciamento dos pontos de localização dos animais. Além disso, eles devem registrar
dados do ambiente como profundidade, transparência e temperatura da água e o tipo de
vegetação próximo ao corpo de água que o quelônio se encontra. Através, de sistemas via
satélite com transmissores Sir Track PTT (Platform Transmitter terminals) com sinais via
sistema ARGOS, o pesquisador ou gestor, paga por um pacote de recepção de sinais e recebe
via internet, as informações sobre as coordenadas em que seu animal com rádio se encontra,
todas as vezes que ele boiar ou, no mínimo, uma vez ao dia. Não há necessidade de gastos
operacionais com as atividades de rastreamento em campo, contudo, envolve a necessidade
de recursos para aquisição do radiotransmissor e pagamento do pacote de serviços da ARGOS.
Podemos estimar o índice de Schoener e a área de vida dos quelônios com radiotransmissores
a partir da análise dos dados (Cullen Jr. et. al., 2003).
Para analisar o padrão de movimentação dos filhotes de P.expansa e P.unifilis
marcados e soltos, podem ser utilizados os dados de georreferenciamento dos locais de
soltura, captura e recaptura. As coordenadas destes pontos podem ser plotadas para
registro dos deslocamentos lineares sucessivos, da distância máxima percorrida (linear
home range) e para definição do Mínimo Polígono Convexo (MPC) e para as estimativas
de área de uso pelo método Kernel Fixo 95% (Kenward et al., 2001; Souza, 2012).
Nas áreas de várzea de rios como o Purus, Juruá e Médio-Amazonas, com baixíssima
recaptura de filhotes, outra opção é o rastreamento acústico ativo (receptor acústico VR100
Vemco) já que os radiotransmissores VHF e via satélite convencionais são muito pesados
para os filhotes (principalmente por causa do peso da bateria). Podemos utilizar 30

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Manual para os gestores ambientais

transmissores acústicos codificados (coded transmitters V4-180 kHz Vemco) em filhotes


de P.unifilis e de P.expansa que poderão ser rastreados após a soltura por até 90 dias nos
lagos e ambientes aquáticos marginais a calha do rio principal. Os pontos de localização
dos filhotes e suas coordenadas devem ser registrados, diariamente, através de busca/
rastreamento ativo em um bote com motor 15 HP.

Figura 21: Tracajá e tartaruga com radiotransmissores via satélite; Rastreamento de


tartaruga com radiotransmissor VHF.

Figura 22: Instalação/aplicação de radiotransmissor na carapaça de um quelônio.

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Manual para os gestores ambientais

Figura 23: Movimentação e área de uso de tartaruga no rio Andirá durante 12 meses.

Figura 24: Rádiotransmissores VHF e via satélite instalados em tracajás em Terra Santa/PA.

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Manual para os gestores ambientais

Referências

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