Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Analise Da Obra Os Tres Porquinhos Segundo A Sociologia
Analise Da Obra Os Tres Porquinhos Segundo A Sociologia
Os Três Porquinhos:
Uma análise dos conceitos sociológicos presentes na história
Belo Horizonte
2010
Mateus Scofield Zola Santiago
Raoni Rogério Luna e Silva
Paulo Vitor Lara
Guilherme Loureiro
Anissa Antunes Farhat
Vítor José
Os Três Porquinhos:
Uma análise dos conceitos sociológicos presentes na história
Belo Horizonte
2010
1. Introdução
O objetivo deste trabalho é analisar a construção e constituição dos sujeitos sociais a partir
das histórias infantis, sendo a história neste caso Os Três Porquinhos. Buscaremos identificar
e analisar os conceitos sociológicos estabelecidos por autores importantes da sociologia no
texto do livro Os Três Porquinhos.
As histórias infantis são um meio de comunicação com a criança e refletem uma série de
valores da sociedade, de fato elas podem ser consideradas como fator de socialização da
criança, devido a linguagem acessível elas permitem a identificação da criança com as
situações e personagens e através da compreensão concretiza a função de socialização pois a
criança internaliza os conceitos presentes.
O texto utilizado não será o primeiro publicado pois entendemos que não é a versão mais
popular e portanto não seria o que mais reflete os conceitos da sociedade e portanto não é o
que contribui efetivamente para a constituição do sujeito social, a versão analisada será a
popularizada por Walt Disney e em alguns momentos compararemos esta versão popular com
a versão escrita por James Orchard Halliwell-Phillipps publicada no livro Nursery Rhymes
and Nursery Tales, Londres, 1843, por acreditar que as mudanças feitas são relevantes para os
objetivos propostos neste trabalho.
" Os Três Porquinhos é um filme de animação lançado em 27 de maio de 1933 por United
Artists, produzido por Walt Disney e dirigido por Burt Gillet. Baseado em um conto de fadas
de mesmo nome, Os Três Porquinhos ganhou o Academy Awards de 1934 para o melhor
curta de animação. Em 1994, foi votado em 11º dos 50 maiores desenhos animados de todos
os tempos por membros do campo de animação. Em 2007, os Três Porquinhos foi selecionado
para a preservação no United States National Film Registry pela Library of Congress como
sendo "culturalmente, historicamente, ou esteticamente significante."
2. Desenvolvimento
Um termo usado frequentemente no texto é versão popularizada e o motivo pelo qual este
termo é usado diz respeito à importância da versão de Walt Disney ter sido adotada como a
mais contada e recontada, não é um termo usado ao acaso mas um termo que reflete sua
recepção pela sociedade e se diferencia portanto da versão de 1843 que tinha características e
conceitos sociológicos fundamentalmente diferentes. Vale lembrar que este fato é comum em
muitas histórias infantis visto que suas versões originais são em geral consideradas muito
violentas para as crianças então a maioria passou por uma renovação com novas mensagens.
A história dos três porquinhos apresenta o início da vida adulta de três porquinhos, eles
deixam a casa de sua mãe (em algumas versões avó) e devem então construir a sua
independência. A história apresenta um conceito vivenciado pela criança e mais tarde pelo
adolescente que é a questão do enfrentamento do mundo com a distanciação dos pais.
O lobo em si é uma instituição social pelo seu papel coercitivo em relação às atitudes dos
porquinhos, é ele quem pune quando os porquinhos não tomam as atitudes corretas. O lobo
pode ser considerado uma instituição como a igreja, o estado ou mesmo a figura do ego.
Quando tomamos atitudes indesejadas socialmente não somente os outros nos punem como
nós mesmos sofremos uma auto-punição pelo ego, figurativamente poderíamos dizer que o
ego "nos devora", alternativamente a igreja e o estado punem os comportamentos indesejados.
O irmão mais velho pode também ser considerado uma instituição social, ele dita o modelo
de casa a ser construído, ele indica o caminho, faz a figura do modelo social a ser
incorporado, a ser seguido e embora a punição em geral fique à cargo do lobo o irmão mais
velho beneficia os irmãos mais novos quando eles tomam a atitude desejada de se submeter à
socialização que é representada por entrar na casa dele. Se você se socializa, não é devorado
pelo lobo.
Se pensarmos em uma analogia com a igreja ou o estado as funções são mais explícitas. Se
você se rende ao pecado da preguiça o lobo (diabo) te devora, se você é trabalhador, é
protegido pela instituição igreja (tem proteção divina, ou vai para os céus - casa do irmão
mais velho - Jesus). Se a analogia é com o estado podemos pensar que o bom trabalhador que
cumpre seu papel social garante sua casa própria e é protegido pela lei, mas aquele que não
trabalha não consegue moradia e fica vulnerável à violência.
A casa é uma instituição social de duas maneiras. Uma das funções da casa é a função da
propriedade privada, a casa demonstra o valor da propriedade privada quando se observa que
a casa ideal, feita de tijolos, é inviolável, o porquinho que a construiu tem a paz de ter sua
integridade física garantida mas também o seu patrimônio e de fato é na própria propriedade
privada que ele encontrou refúgio contra o lobo.
Um bom exemplo seria o índio abandonar a floresta (oca, palha) e o camponês abandonar o
campo (casebres, madeira) e se juntarem à evolução e à civilidade da sociedade moderna
(casa, tijolos) para deixarem para trás a vulnerabilidade da condição humana.
A inteligência é uma instituição social visto que além do trabalho duro, o que garante o
trunfo ao porquinho que construiu a casa de cimento é a sua inteligência. O domínio da razão
sobre a vontade manifestado na inteligência. O porquinho além de construir uma casa forte
para resistir ao lobo sabe distinguir as enganações dele e por fim frustra seus planos de
invasão com um ato inteligente e bem planejado.
A família é uma instituição social e está em conjunto com a solidariedade, quando são
atacados, os porquinhos acolhem uns aos outros e por fim se unem contra um inimigo
comum. É ressaltada a importância da união de um grupo para a preservação dos indivíduos.
Conceito de socialização:
A socialização é a imposição de padrões sociais à conduta individual, esses padrões
chegam até mesmo a interferir nos processos fisiológicos do organismo. Constitui um fato que
se reveste de tanto poder de constrição e duma importância extraordinária.
O caráter absoluto com que os padrões sociais atingem a criança resulta do grande poder
que os adultos exercem numa situação como aquela em que se encontra a criança e a
ignorância desta sobre a existência de padrões alternativos.
O mecanismo fundamental de socialização consiste num processo de interação e
identificação com os outros.
A socialização se realiza numa contínua interação com os outros e culmina com a
interiorização do processo.
(Berger e Berger - 1975)
A função deste valor para as crianças é o de demonstrar que há tarefas que precisam ser
executadas ou elas sofrerão consequências, por mais que elas gostem de descansar e brincar
elas não podem escapar das obrigações delas. Assim sendo os irmãos preguiçosos e
desleixados são punidos na história e o irmão trabalhador é beneficiado.
A seguir com a introdução da figura do lobo vamos mais alguns contrastes de valores, o
lobo como figura antagonista é oposto aos porquinhos em alguns aspectos. O lobo é mau e os
porquinhos são bons. O lobo é forte, os porquinhos são frágeis. O lobo é agressivo e os
porquinhos são passivos. O lobo desafia e agride os porquinhos se submetem e fogem.
O lobo é agressivo, ele não respeita a integridade do outro enquanto os porquinhos não
pensam em violência, o lobo tem a violência expressa no violar da integridade física do outro
e da propriedade privada. O lobo não tem propriedade privada e não respeita a propriedade
privada, ele a viola enquanto os porquinhos tem suas propriedades e se acomodam nelas. O
lobo entra como figura de maldade pois não respeita o outro.
Aproximando-se do final da história podemos identificar mais alguns valores. O lobo não
pode vencer pela força a prudência do irmão mais velho, sua dedicação ao trabalho. O lobo
busca então vencer através da enganação e também não pode vencer sua esperteza e por fim
ele recorre mais uma vez à violência mas a inteligência do porquinho supera seu ato de
violação. Assim podemos ver de lados opostos a dissimulação em oposição à prudência e a
irracionalidade em oposição à inteligência representados respectivamente pelo lobo tomado
pela raiva e o porquinho que armou para pegá-lo.
No fim da história podemos ver uma questão de que os fins não justificam os meios e
novamente os valores são exaltados. O lobo que não consegue mais vencer pela força procura
enganar os porquinhos e o comportamento cauteloso do porquinho o vence e quando ele
recorre novamente à violência é vencido pela inteligência do porquinho. Assim a criança
aprende que deve ser prudente ao lidar os outros e que ao invés de recorrer ao confronto direto
deve buscar uma maneira racional de lidar com as situações porque o irracional é mau, foi
punido.
Id pode ser descrito como princípio do prazer, é o que a pessoa quer fazer. O superego é
aquilo que se acredita que é certo fazer. O ego seria então um mediador entre o que se acredita
ser certo fazer e o que se quer fazer e essa questão tem grande impacto no comportamento do
indivíduo perante a sociedade.
- O lobo: O lobo é uma figura que surge repentinamente na história sem uma introdução
prévia. Sem adentrar em outros conceitos mas citando rapidamente, o lobo serve de clássica
figura do antagonista, ele é mau simplesmente por ser mau. A maldade do lobo pode ser
claramente analisada sobre a questão de sobreposição do id sobre o ego.
O lobo tem uma vontade clara, devorar os porquinhos, para isso ele viola a integridade dos
porquinhos e suas propriedades sem qualquer tipo de barreira, inconsequentemente. Nessa
atitude podemos ver claramente a sobreposição do id, para o lobo o princípio do prazer
governa as ações, não há uma internalização das normas sociais, o meio e o fim são guiados
pelo prazer, o ego, que serviria como regra para o id não o impede de cometer atos de
violência que vão contra os valores sociais. O lobo apresente o comportamento que é
socialmente reprimido e portanto no fim da história ele é o derrotado, ele se queima em um
caldeirão e deixa de lado sua caça aos porquinhos.
Esse conceito que a história traz tem uma clara função no desenvolvimento social da
criança, é esperado que a criança tenha domínio sobre sua necessidade de prazer, no processo
de amadurecimento a criança deve deixar de lado sua instinto primal, devorador,
descontrolado, representado pelo lobo e internalizar os valores sociais, da mesma forma
mesmo que o id não seja selvagem como a figura do lobo, ainda há de se domar a preguiça e a
busca pelo prazer de modo que possam internalizar a realidade exterior e enxergar com
clareza as situações para que possam planejar o futuro e enfrentar com estabilidade os
problemas da vida. Em termos gerais trata da domesticação do id pelo ego, base necessária
para o convívio em sociedade visto que o ego é justamente a interiorização das instituições
sociais.
O primeiro conflito que surge na história não é com relação ao lobo, mas entre os irmãos
porquinhos. Eles tem opiniões divergentes a respeito de como se deve construir uma casa e
porque, e eles não chegam a um acordo assim cada um vai para uma região e contrói lá sua
casa, resultando assim na separação deles.
A análise de como a questão do conflito com o lobo é levada às crianças fica explicitada na
diferença do texto original em comparação à versão popularizada por Walt Disney. Quando
pensamos na constituição do sujeito social na sociedade atual o extermínio não é aceito como
uma forma padrão de resolução de conflito visto que é reprimido como valor e como lei,
assim sendo, a versão de 1843 não seria satisfatória no processo de socialização da criança.
A versão popularizada mostra que primariamente há uma fuga pela sobrevivência e mesmo
diante do conflito não há um enfrentamento, os porquinhos buscam a ajuda de um conhecido
mais bem preparado e socializado para lidar com o conflito. O conflito final também não
envolve o extermínio mas a simples defesa da propriedade particular e o lobo então se
conforma com essa instituição.
2.5 - Solidariedade
Há em primeiro plano a questão da família, mas de certa forma vemos que o que garantiu a
sobrevivência dos três porquinhos foi a solidariedade de um para com o outro e portanto a
solidariedade foi fundamental como método de coesão social. Se um dos porquinhos se
negasse ao ato solidário, pelo menos dois dos três estariam mortos.
Nas duas versões da história as crianças podem aprender a importância do ato solidário, de
fato em nenhuma das versões a solidariedade seria dispensável no processo de preservação
dos indivíduos e de coesão social, pelo contrário, se houve o contato social e uma certa
integração entre os indivíduos foi através do ato solidário.
Logo no começo da história vemos que os porquinhos saíram juntos de casa mas de
imediato se separaram por divergência de idéias. Podemos ver claramente a idéia do
individualismo, os porquinhos não eram três os porquinhos como o título diz, mas três
indivíduos que não constituíam um grupo. De fato não há o respeito entre eles e a necessidade
faz com que a resolução do conflito entre eles se dê pela submissão.
Se há a submissão não há o reconhecimento do outro. O porquinho que construiu a casa de
tijolos poderia ajudar de alguma forma os outros porquinhos respeitando a individualidade
deles, porém eles tornaram-se como o modelo, como a norma. Pode-se dizer que houve uma
identificação de um com o outro, o "eu" se identificou o "tu" e se transformou em "nós", ou
seja, o "tu" não foi reconhecido em sua integridade mas foi incorporado ao "eu" criando o
"nós". O "nós" é então constituído em função de um "eu" que serviu de regra e modelo para a
identificação do "tu", sendo então o "nós" uma projeção do "eu" em um outro não
reconhecido.
Um aspecto que foi abordado em uma versão alternativa dessa história é a questão do lobo,
mas esse aspecto não é considerado nem na versão de 1843 e nem na versão popularizada. A
maioria das versões da história deixa claro o papel antagonista do lobo, o lobo é o desvio, o
lobo é a minoria, o lobo é o diferente.
Os Três Porquinhos não apresenta nenhum tipo de valor para o diferente, sendo assim
potencializa o caráter punitivo da sociedade, o desviante não tem espaço. Em um aspecto
positivo podemos dizer que exalta a união da sociedade e acentua a questão da proteção da
cultura, porém pode-se dizer ressaltando o aspecto negativo que tem caráter racista e
xenofóbico.
Assim sendo enquanto a criança pode aprender a se unir para se preservar ela também pode
aprender o poder de coerção do grupo sobre o indivíduo e o desrespeito ao desviante, além de
se sentir ameaçada enquanto desviante por identificação com o comportamento e a figura do
lobo, ser diferente passa a significar ser excluído e vítima de violência.
2.7 - Violência
A violência na história de Os Três Porquinhos tem uma face explícita na questão do lobo e
outras implícitas. Primeiramente a única violência concebida na história em termos de senso
comum é a violência do lobo que quer devorar os porquinhos destruindo as suas casas. Mas se
ampliamos a nossa visão de violência para o conceito de que qualquer situação em que se
viola os direitos há uma violência então podemos ter outra compreensão do tema na história.
Primeiramente vemos que é uma história em que a situação social retrata um autoritarismo,
não há a concepção de democracia. Secundariamente podemos perceber a anomia, uma vez
que não há um estabelecimento nominal de regras ou leis, ou seja não a anomia como falta de
internalização do social mas anomia como termo referente a ausência de normas. E por fim há
uma competição onde o mais capaz em termos gerais se sobressai.
O lobo tem poder e coage porque é forte, o porquinho resistiu ao lobo porque foi
trabalhador e esperto, ou seja, cada um vence ou perde de acordo com as suas habilidades, não
existe um direito que se estende a todos ou uma proteção inata a qualquer uma das figuras. O
ambiente não apresenta nenhum tipo de nivelamento, de igualdade de condições, a
competição não tem parâmetros sendo puramente voltada a sobrevivência.
Assim o lobo usa de violência contra os porquinhos, os porquinhos usam de violência
contra o lobo e entre si os porquinhos violentam uns aos outros no sentido de desrespeito à
figura do outro. A história não conta com respeito mútuo e portanto retrata em sua integridade
violência. De fato é uma força violentando a outra e no fim uma força subjuga todas as outras,
no caso, a força de coerção da maioria social, do modelo, da norma.
Podemos considerar então que passa para a criança um modelo de violência que não
favorece o confronto físico, mas favorece o confronto de capacidade, o mais adaptado, ou
seja, o mais forte socialmente, no que diz respeito aos valores sociais vence e subjuga as
minorias, os desviantes. Se você não se junta à norma é violentado e se você se junta, se
submete e está protegido da violência, porém isso não deixa também de ser uma violência.
Assim, qual o conceito de democracia que a criança vai constituir? E o conceito de
cidadania? Não há ao que recorrer senão às suas próprias habilidades, o conceito é o de
competir com suas forças.
3 - Conclusão
Realizando este trabalho chegamos à conclusão que Os Três Porquinhos tem função
fundamental ao transmitir conceitos constituintes do sujeito social. Conceitos que estão na
base da sociedade que mantém a força da sociedade, a coesão, o processo da soberania do
todo sobre o indivíduo estão presentes na história, assim como diversos valores protagonistas
e antagonistas. Há a presença de instituições sociais que definem o sujeito social. Há um
destaque especial por parte do grupo para o caráter de incentivo ao trabalho e à punição do
desviante que aparentemente são os destaques da história.
4 - Referência bibliográfica
HORTON, Paul e HORTON, Robert. Controle e desvio social. IN. HORTON, Paul e
HORTON, Robert. Introdução à sociologia. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1975. p. 34 - 38
HORTON, Paul e HORTON, Robert. Papéis e status. IN. HORTON, Paul e HORTON,
Robert. Introdução à sociologia. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1975. p. 29 - 33
HORTON, Paul e HORTON, Robert. Processos sociais. IN. HORTON, Paul e HORTON,
Robert. Introdução à sociologia. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1975. p. 75 - 80
TAVOLA, Artur da. Do eu e do outro. IN. TAVOLA, Artur da. Do amor, ensaio de
enigma. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983. p. 19 – 28.