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Introdução
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misto de fenótipo e de origem para a caracterização racial da população (PIZA e
ROSEMBERG, 2003; OSÓRIO, 2004 e PETRUCCELLI, 2004).
Segundo Rosemberg (2003, p. 94), no entanto, nem sempre foi desse jeito, pois “o
critério de descendência vigorou no Brasil, em determinados momentos históricos
[século XVIII e século XIX] e circunstâncias”.
O segundo censo geral, o de 1890, também adotou o critério misto para compor as
categorias (preto, branco, caboclo e mestiço), de modo a referir-se, explicitamente, à
ancestralidade ou ascendência das pessoas. Nota-se que o termo mestiço substituiu o
termo pardo e deveria ser usado para se referir, exclusivamente, aos descendentes da
união de pretos e brancos (PIZA e ROSEMBERG, 2003). Os censos que se seguiram,
1900 e 1920, não coletaram cor da população.
Apesar de o Censo de 1920 não ter incluído a investigação sobre cor/raça da
população, Piza e Rosemberg (2002), citando Lamounier (1976), destacam a justificativa
oficial referente à exclusão do quesito, na qual se percebe, novamente, um modo de
classificação de cor/raça assentado na origem:
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inclusão merece um comentário mais pormenorizado. Quando a literatura sobre
classificação/denominação de cor/raça se refere ao sistema brasileiro como orientado
pela aparência, seu foco, sem explicitá-lo, são os segmentos branco e negro (pretos e
pardos), posto que, conforme discussão efetuada pelo antropólogo social o Dr. Antonio
Carlos de Souza Lima (2007), a autoidentificação entre os indígenas ocorre pela pertença
a uma etnia.
Uma outra referência sobre classificação com base na origem encontra-se no
artigo de Robin E. Sheriff (2002) “Como os senhores chamavam os escravos: discursos
sobre cor, raça e racismo um morro carioca”. Trata-se de artigo primoroso, que, a nossos
olhos, dentre outras qualidades, efetua uma distinção entre denominação e classificação
racial. No primeiro caso teríamos discursos descritivos: “Esses discursos não são,
propriamente falando, raciais, mas referem-se, antes, a conceitos de cor e aparência”
(SHERIFF, 2002, p. 226). Por outro lado, a autora identificou, também, “um discurso ou
identidade e classificação racial [...] que enfatiza tanto a raça como a noção de categorias
raciais distintas” (p. 226, 227). E é nesse padrão discursivo que a autora se defronta com
processos classificatórios que remetem à origem, o que, em seu texto foi analisado a
partir dos comentários de uma moradora da vizinhança pesquisada pela autora: “Eu sou
parda, mas sou da raça negra” (p. 230). Na discussão do comentário de Ana Lúcia,
Sheriff (2002, p. 231) pondera: “Ela [Ana Lúcia] refuta, ao menos parcialmente, a noção
de que, no Brasil, ao contrário dos Estados Unidos, a identidade racial é determinada não
pela família ou pelo parentesco, mas pela cor da pessoa”.
E, em nota refere-se a observação equivalente de Benjamin Zimmerman, em
artigo de 1952, publicado no famoso e histórico livro de Charles Wagley – “Race and
class in rural Brazil”: “Em numerosos casos, as pessoas entrevistadas disseram que não
podiam indicar a qualidade de algumas das pessoas da lista ‘porque não conheciam suas
famílias’ [...]” (Zimmerman, 1952, p. 103, apud SHERIFF, 2002, p. 240).
Por ocasião da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) de 1998, como ensaio para a
introdução do termo afrodescentente no Censo de 2000, conforme análise de
Schwartzman (1999, apud ROCHA, 2005), incluiu-se a pergunta sobre origem. A
maioria das pessoas respondeu à pergunta via origem nacional dos pais ou origem
regional brasileira, o que pode ter desqualificado investigações mais aprofundadas sobre
a referência à origem na classificação de cor/raça.
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Dada a diversidade de configurações societárias, nenhum organismo internacional
propôs uma classificação geral para raças ou etnias. “Assim, em pesquisas internacionais,
quando a ‘etnicidade’ é objeto de interesse, geralmente é captada segundo as categorias
locais empregadas pelo órgão oficial de estatística do país” (OSÓRIO, 2004, p. 106). São
variados os modelos adotados pelos censos, em função da história de cada sociedade: no
Brasil, pergunta-se sobre a cor ou raça das pessoas; na Índia, a orientação religiosa; na
Inglaterra, o grupo étnico; na França, a nacionalidade; nas Ilhas Maurício, os grupos
lingüísticos; nos EUA e Canadá, a raça (OSÓRIO, 2004; PETRUCCELLI, 2007).
Blumenbach, fisiologista e antropólogo alemão (1752-1840), foi quem introduziu
a cor da pele como critério básico para diferenciar as chamadas raças humanas no século
XVIII na Europa Ocidental. Sua classificação das raças humanas associava cor da pele e
região geográfica de origem em cinco tipos: branca ou caucasiana; negra ou etiópica;
amarela ou mongol; parda ou malaia e vermelha ou americana. Muito dessa terminologia
inspirou a forma de classificar em nosso país e no restante do mundo. O vocabulário
racial com base na “cor da pele” penetrou no Brasil no período colonial, sendo usado nos
inquéritos populacionais, de forma variada, desde o primeiro Censo Demográfico de
1872 até os dias de hoje. Há que se observar, de certo, que os sentidos dos termos
variaram ao longo do tempo e de acordo com contextos específicos (ROCHA e
ROSEMBERG, 2007), como veremos mais adiante, quando falarmos do uso da categoria
cor ou raça nos censos brasileiros.
Osório (2004) e Petruccelli (2007) lembram que classificar é um ato básico do
processo cognitivo, permitindo o conhecimento e o reconhecimento, bem como a vida
societária. “Classificações são o tijolo do simbólico”, afirma Osório. Por sua vez,
Petruccelli (2007) ressalva que o processo de classificar ocorre em contextos
estruturados, ou seja, a operação de classificar é acompanhada por uma dissimetria entre
quem se vê no direito de classificar e quem é alvo da classificação. Como bem lembram
Piza e Rosemberg (2003, p 107), “As palavras para nomear a cor das pessoas não são
meros veículos neutros enunciadores de matizes, mas carregam índices de
preconceito/discriminação, de seu distanciamento e de sua superação”.
Osório (2004, p. 92-93) aponta que, mesmo considerando a raça como uma
“realidade sociocultural”, há que se reconhecer um embasamento biológico, porém
adverte que as diferenças visíveis daí resultantes, quando ocorrem, não produzem por si
mesmas as desigualdades, uma vez que essas são socialmente construídas. No entanto,
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deve-se levar em conta os aspectos biológicos e sociais na conceituação de cor.
Conforme Soares (2008, p. 103), cor é
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O termo mestiço, definido como “nascido de pais de raças diferentes” (Cunha,
1982, apud PETRUCCELLI, 2007, p. 19), nome ibérico, do espanhol mestizo, usado
como adjetivo ou substantivo, aparece no português no século XIV. Etimologicamente
proveniente do “latim tardio mixticus, de mixtus, particípio passivo [sic] do verbo
miscère, misturar” (PETRUCCELLI, 2007, p. 20). Foi usado, inicialmente, nas Índias
Ocidentais para designar somente a ascendência de europeus com ameríndios.
De acordo com Petruccelli (2007) o termo preto carece ainda de precisão quanto à
sua exata origem, tanto no espanhol, quanto no português. Em relação ao termo branco
esse autor cita a contribuição de Said-Ali (1931 apud PETRUCCELLI, 2007, p. 21),
segundo o qual o branco
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ações afirmativas, bem como em diversos programas de ação afirmativa implantados no
país. Fazendo uma crítica ao estudo de Yvone Maggie para o catálogo das comemorações
do Centenário da Abolição, Piza e Rosemberg (2003, p. 109) identificaram que, naquele
estudo, o termo negro foi usado de modo isomorfo ao termo branco, já que não se levou
em consideração os aspectos de hierarquização social. Para as autoras, o trabalho de
Maggie mostra que
em contextos puramente culturais [...] o termo negro parece adquirir um certo
isoformismo com o termo branco. A cultura negra e a cultura branca
aparentemente se equivaleriam enquanto produtos culturais cuja diferença não
implicaria subordinação e de seus efeitos.
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Na primeira metade do século XIX, na Bahia, o termo “preto”1 designava os
africanos e o termo “crioulo” os negros nascidos no Brasil. Na outra metade, também na
Bahia, o termo “preto” passou a abarcar africanos e seus descendentes e “negro” deixou
de designar a “cor” e foi lentamente passando a ter um significado racial e pejorativo. Em
São Paulo, nos anos anteriores à Abolição da Escravatura, ao termo “negro” foi atribuído
uma conotação muito pejorativa e “preto” um significado neutro. No anos de 1920, os
militantes do movimento negro se chamavam de “homens de cor” e “homens pretos” e
chamavam o coletivo de “classe”, um vocabulário legado do passado. As palavras “raça”
e “negro”, que também eram usadas por eles, tinham o sentido distinto dos dias atuais. A
partir da década de 1920, no entanto, começou a haver mudança na concepção de “raça”
e “negro”. “O que existia de negativo, inferior e insultuoso nessas palavras passa para um
segundo plano para dar lugar à reivindicação de um sentido positivo e arregimentador”
(GUIMARÃES, 2003b, p. 255). Nesse momento, já se sentia a influência do historiador,
sociólogo e líder político norte-americano, W. E. B. Du Bois, que foi o primeiro a
teorizar sobre “raça negra”, em 1897, atribuindo-lhe um significado que não era
totalmente biológico. A partir de 1924, os termos “negros” e “raça” começaram a
denominar o coletivo, que outrora era chamado por “homens de cor” e de “classe”. Mas
com o decorrer do tempo, os termos “homens de cor” e “classe” começaram a cair em
desuso, tanto na imprensa quanto nos movimentos. O autor faz uma ressalva para a
permanência do termo “classe” até o século XX, mas com “outro significado, para
designar a ausência da idéia de ‘raça’ no tratamento dado aos negros no Brasil”
(GUIMARÃES, 2003b, p. 256).
A mudança que ocorreu da autodesignação dos negros, no período de 1916 a
1970, Guimarães (2003b, p. 257) atribui a uma revolução identitária que ocorreu em
nível mundial entre o final do século XIX a meados do século XX2. Foram fundamentais
para essa revolução a reapropriação e aproximação de dois termos “raça”, conceito da
biologia, que foi re-significado com o sentido de comunidade histórica e espiritual
transnacional e o termo “cultura”, para denominar o grupo de manifestações artísticas e
materiais desse povo transnacional (GUIMARÃES, 2003b, p. 257).
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Utilizaremos os termos relacionados a denominação de cor/raça entre aspas, do mesmo modo que Guimarães (2003b,
p. 247-269) usou em seu texto. São termos extraídos de jornais publicados por associações, clubes e pessoas pioneiras
do movimento negro brasileiro, no período de 1925 a 1950, estudados pelo autor.
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Aqui o autor faz referência indireta ao Movimento de Negritude.
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Essa mudança na forma pela qual os negros vinham se nomeando, tem sido
examinada e constatada em diversos estudos: Telles (2003), Osório (2004) e Soares
(2008). Nas análise que fez, relativa ao período de 1940 a 1991, Telles verificou um
“empardecimento” da população, apontando para o fato de que, no período, a população
de pardos fora a única que apresentava crescimento: de 21%, em 1940 passaram para
43%, em 1991, o que ele atribuiu à miscigenação. Quanto ao Censo de 2000, Telles
encontrou resultado inverso, ou seja, crescimento para as categorias preto e branco e
decréscimo para a categoria pardo. Sua suposição é que se não ocorreu mudanças em
fatores demográficos, tal variação seria atribuída às mudanças na autoclassificação racial,
indicando uma bipolarização preto e branco, identificada por ele. A substituição de “cor”
por “cor e raça”, na maneira de perguntar do censo, também teria influenciado nessa
escolha, segundo Telles (2003, p. 61-62).
Já Osório (2004, p. 122) levanta a hipótese de valorização de negritude. Segundo
o autor, “O aumento da declaração da cor negra e da previsibilidade do enquadramento
induzido dos que espontaneamente se declararam pretos e pardos podem ser indícios de
que essa valorização está em curso”. Tendência, que segundo esse autor, já teria sido
indicada por Petruccelli (2002), quando esse comparou o aumento da proporção de pretos
no Censo de 2000 em relação ao de 1991.
Para Soares (2008, p. 99), o “enegrecimento do Brasil” está em curso desde 1940,
apresentando acentuado aumento no período de 2001 a 2007. Em 1890, a população
negra era de 56%. Em 1940, essa população apresentou seu ponto demográfico mais
baixo, 35,8%, como resultado da intensa imigração européia que se seguiu entre 1890 a
1930, quando mais de três milhões de europeus vieram para o Brasil. A partir de 1940, a
população conjunta de pretos e partos não parou mais de crescer: no Censo de 1960,
38%; no Censo de 1980, 44%; na Pesquina Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)
2002, 46% e por último, na PNAD 2007, 49,8% da população brasileira se identificaram
como preta ou parda. Soares propõe três hipóteses explicativas para analisar esse
fenômeno: 1) haveria uma taxa de fecundidade maior para um dos grupos; 2) o processo
de miscigenação e 3) “mudanças de cor/raça idiossincráticas” ou “mudança na
identificação racial”. Após examinar empiricamente todas as três hipóteses, Soares, em
concordância com Petruccelli (2002), Telles (2003) e Osório (2004), chega à conclusão
de que vem ocorrendo, de maneira crescente, uma mudança da identificação racial
favorável à identificação preta, sentida pelos indivíduos como negra, no país.
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A história até aqui é mais ou menos clara e coerente: a despeito da existência
indubitável de efeitos da taxa de fecundidade e da identificação racial ao
nascer [efeito da miscigenação], há uma avalanche de mudanças da
identificação racial. Essa avalanche vem em detrimento da identidade branca e,
principalmente, a favor da identidade coletada pelo IBGE como preta, mas
muito possivelmente sentida pelos indivíduos como negra. Finalmente, essa
avalanche começa com pouca força a partir de meados da década de noventa,
mas adquire muito mais movimento a partir da mudança do milênio
(SOARES, 2008, p. 111).
Soares (2008, p. 116) situa entre 1996 e 2001 o início do processo de mudança na
autoidentificação das pessoas negras. Salienta que tal identificação ocorreu mais
fortemente na categoria preto, do que na categoria pardo, indicando, segundo o autor, que
as pessoas estariam perdendo o medo de assumir a sua identidade negra, deixando de ter
vergonha de se dizerem negras, recusando o branqueamento como forma de legitimarem-
se. Para o autor a mudança na maneira como as pessoas se vêem, seria a causa principal
do “escurecimento da população brasileira” e não fatores exclusivamente demográficos.
Afirma ainda que tal explicação estaria evidente, como poucas vezes aconteceu na
história das Ciências Sociais brasileiras nos últimos dez anos.
Lembramos que foi uma década de muitas mudanças políticas e sociais, com
acontecimentos marcantes para a sociedade, dentre eles, a participação do Brasil na
Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo, Discriminação Racial,
Xenofobia e Intolerância Correlata (CMR), em Durban e o fato de o Estado brasileiro ter
passado a introduzir “a noção de ‘ação afirmativa’ como um dos princípios organizadores
de algumas de suas políticas sociais” (ZONINSEIN, 2004, p 107-108). Assim, podemos
considerar que a disseminação dos programas de ação afirmativa possa ser também uma
hipótese explicativa para o “enegrecimento” que está em curso no país, uma vez que são
programas que têm colocado, no debate público, o tema da classificação racial, e da
identificação de quem é branco, quem é negro para as experiências de ação afirmativa.
Soares (2008) considera outras explicações possíveis ao “enegrecimento” da
população. Sem pautar-se em evidência, o autor reconhece a importância que o
movimento negro também teve nesse processo, bem como o novo papel social alcançado
pelo negro na mídia, na política, no Supremo Tribunal Federal e em telenovelas. “Pode-
se dizer que o que está acontecendo não é que o Brasil esteja tornando-se uma nação de
negros, mas, sim, que está se assumindo como tal” (SOARES, 2008, p. 116).
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O que a categoria cor significa no Brasil? Guimarães (1999) apresenta um breve
trajeto de ampliação dessa categoria, no campo teórico, desde o estudo pioneiro de
Donald Pierson, em Salvador, nos anos 1930. Se nesse primeiro trabalho de pesquisa,
Pierson deu indicações de que a “cor” era mais do que pigmentação, incluindo outras
características físicas, Harris e Kottak (1963, apud GUIMARÃES, 1999) conseguiram
comprovar como eram importantes e em qual ordem vinham os seguintes elementos, na
definição de cor: tipo de cabelo, formato do nariz e formato dos lábios. Afastando-se dos
pressupostos racialistas da época e adentrando nos estudos de relações raciais, a
Antropologia Social permitiu uma ampliação ainda maior do significado da “cor”. Os
estudos que se seguiram de 1940 a 1960 possibilitaram identificar a associação do
sistema de classificação brasileiro com hierarquização social. De acordo com Nogueira
(1998, p. 244), além dos traços físicos, a “identificação da cor de um indivíduo é
influenciada pela associação a outros característicos de status, como o grau de instrução,
a ocupação e os hábitos pessoais [...]”.
Segundo Guimarães (1999, p 43), diversos autores consideravam que, tanto no
Brasil quanto na América Latina, não haveria preconceito racial, mas apenas
“preconceito de cor”. Aqueles que estudaram o Brasil alegavam que não se poderia falar
em grupos raciais no país, mas apenas em “grupos de cor”. Isto devido à particularidade
da forma de classificação racial de diversos países, baseada na aparência e não na
origem. Neste mesmo sentido, Nogueira (19983, p. 239), ao fazer um exame das relações
raciais nos EUA e no Brasil, apontou que, em nosso país, ocorre o “preconceito de cor ou
de marca racial”, ao passo que os norte-americanos nutririam um “preconceito de
origem”. Florestan Fernandes (1965, apud GUIMARÃES, 1999, p. 46) apontou para o
fato “de que o ‘preconceito de cor’ deveria ser usado como noção nativa –
conceitualizado, no início, pela Frente Negra Brasileira, em 1930 – para se referir à
forma particular de discriminação racial que oprime os negros brasileiros”. Mas, ao
problematizar essa idéia nativa de “cor”, Guimarães alerta que a atribuição de “cor” a
alguém não está isenta dos valores que orientam a nossa percepção. “É desse modo que a
‘cor’, no Brasil, funciona como uma imagem figurada de “raça” (GUIMARÃES, 1999, p.
46), um “tropo4 para raça” (GUIMARÃES, 2002, p. 54). Isto é, “a classificação das
3
O relatório que originou o livro, foi publicado parceladamente na revista Anhembi nos anos de 1954 e 1955,
conforme nos informa Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, na introdução dessa edição do livro.
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No Dicionário Houaiss, tropo é o emprego figurado de palavra ou locução, figura. Estas observações não se aplicam
ao contexto de classificação indígena-não indígena, como nos lembra Rocha (2005).
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pessoas por cor é orientada por um discurso sobre qualidades, atitudes e essências
transmitidas por sangue, que remontam a uma origem ancestral comum numa das
‘subespécies humanas’” (GUIMARÃES, 2003a, p. 103). Para esse autor, um discurso
classificatório que se pauta em cores, como um tropo para raça, é um discurso
naturalizado, uma vez que estamos no campo das construções discursivas, não diante de
dados de uma realidade concreta.
Outros pontos do debate são muito importantes, referem-se aos modos brasileiros
de operar as classificações (se é bipolar ou múltiplo), quais são os sistemas de
classificação adotados no país (oficial ou oficiais, popular e outros) e o sistema de coleta
de dados (se por autodenominação ou hetero-denominação) (Rocha,2005). Quanto aos
modos de operar a classificação racial, Peter Fry (1995/1996 apud ROCHA, 2005, p. 60)
identifica três modos diferenciados: um para as classes médias intelectualizadas do meio
urbano, que utilizariam um modo binário de classificação (branco x negro); outro para as
camadas populares, um modelo múltiplo, variando contingencialmente; finalmente um
modelo que combinaria uma forma reduzida do modo múltiplo ou ampliada do bipolar,
que resultaria no uso de três categorias - negro, branco e “mulato” -, que seria, para Fry,
o mesmo modelo utilizado oficialmente no censo brasileiro.
Na interpretação de Telles (2003, p. 105), são três os modos para classificar a
população brasileira, dentro “de um continuum de cores do branco ao negro”, cada qual
apresentando uma variedade de categorias. De acordo com o autor, teríamos então: 1) o
modelo oficial dos censos do IBGE (cor/raça), utilizando cinco categorias (branco, pardo,
preto, amarelo e indígena); 2) “o discurso popular”, que, à primeira vista, indicaria o uso
de uma profusão de termos para descrever raças e cores, e 3) o sistema bipolar (branco,
negro), utilizado pelo movimento negro. Telles (2003), como outros pesquisadores,
sustenta sua caracterização do modelo múltiplo na variada terminologia utilizada pelos
brasileiros para descrever as gradações de cor.
Já D’Adesky (2001, p. 135) indica o uso de cinco modos de classificação racial:
1) o uso das cinco categorias oficiais do IBGE; 2) “o sistema branco, negro e índio,
referente ao mito fundador da civilização brasileira”; 3) o sistema classificatório popular
de 135 cores, segundo apurado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD, 1976); 4) o modo binário branco e não-branco usado por inúmeros
pesquisadores nas Ciências Humanas e 5) o modelo binário branco e negro, dos grupos e
organizações do movimento negro.
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Para Rosemberg (2005), seria um equívoco associar linearmente vocabulário
racial e classificação ou identidade racial, bem como afirmar que o vocabulário utilizado
pelo IBGE, nos Censos Demográficos e nas PNADs, seja o vocabulário oficial do país.
Analisando diversos documentos oficiais, a autora identificou uma diversidade de termos
utilizados para se referir a cor/raça, além daqueles usados pelo IBGE. Segundo a autora,
o vocabulário para denominação varia de acordo com o contexto social em que é
utilizado. Por exemplo, o termo “afro-brasileiro” é mais empregado quando o tema está
relacionado ao contexto cultural e religioso; já o termo negro, aos contextos relacionados
à explicitação de discriminação e preconceito. Um exemplo que vem do interior de um
órgão de governo, o Ministério da Educação, assinala esta diversidade de denominação
racial: nas provas elaboradas, em 2003, para o Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), tanto para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), quanto para o Exame
Nacional de Cursos (ENC), as alternativas para o campo de pertença étnico-racial eram
branco, negro (e não preto), mulato (e não pardo), amarelo e indígena.
Rosemberg (2005) identificou que em variados contextos institucionais podem ser
utilizados repertórios linguísticos diferentes, estando relacionados ou não a uma forma
bipolar ou múltipla de classificação racial. A autora também destaca que o próprio IBGE
pode recorrer ao uso de vocábulos diversificados em vários instrumentos criados pelo
Estado brasileiro.
Assim, a denominação/classificação racial usada em documentos do Estado não
se assemelha a um sistema monolítico. Deste modo, os termos preto e pardo, apesar de
fazerem parte do vocabulário do IBGE para classificação racial, por diferentes razões,
não foram utilizados em leis e decretos contemporâneos, nas provas do MEC até 2003.
Em outro documento governamental, o Relatório Preparatório para a Conferência de
Durban, que também foi assinado por representantes da sociedade civil, comissões do
legislativo, representante do Ministério Público Federal e militantes do movimento
negro, Rosemberg (2005) constatou o uso de uma nomenclatura tendente a “um modelo
bipolar ‘negro/afrodescendente-branco’ e restrita a dois vocábulos ‘negro’ e ‘afro-
descendente ou afro-brasileiro’, muito distante do vocabulário usado nas pesquisas do
IBGE”.
Muitos são os autores que defendem que no Brasil adotaríamos um modo
múltiplo de classificação racial, em função do nosso extenso e variado vocabulário racial
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para nomear nossa cor/raça. São diversos os estudos5, conforme Rocha e Rosemberg
(2007, p. 768), que “identificaram inúmeros termos, em diferentes regiões do país, para
denominar ou classificar a si mesmo no espectro de cor ou em categorias de raça”. Para
alguns estudiosos, essa profusão de termos é que singulariza o sistema de classificação
brasileiro (TELLES, 2003). Já outros vêem nesse fenômeno um indicador de que o
procedimento adotado pelo IBGE, nos censos demográficos e nas PNADs, é inadequado.
Rocha (2005) e Rocha e Rosemberg (2007) discutiram esses posicionamentos a partir da
análise de dois inquéritos realizados pelo IBGE - a PNAD 1976 e a Pesquisa Mensal de
Empregos (PME) 1998 - e também da pesquisa DataFolha 1995, os quais também foram
objeto de estudo de diversos pesquisadores (TELLES, 2003; OSÓRIO, 2004;
PETRUCELLI, 2004).
Na PNAD 1976, foram arrolados 135 termos diferentes e 143 na PME 1998, a
partir do procedimento de efetuar uma pergunta aberta aos respondentes: (“qual a sua
cor” em 1976 e “qual a sua cor ou raça” em 1998 (ROCHA e ROSEMBERG, 2007, p.
768). Essa multiplicidade de termos ensejaria uma “idéia da suposta enorme
complexidade do sistema classificatório brasileiro” (PETRUCCELLI, 2004, p. 18). Tal
idéia, porém, estaria sendo sustentada pela desatenção ao uso muito reduzido de vários
termos de acordo com Telles (2003) e Rocha (2005), isto é, muitos termos foram usados
por poucas pessoas que responderam aos inquéritos. Complementarmente, os
pesquisadores notaram uma forte concentração de respostas em poucos termos,
particularmente naqueles usados pelo IBGE.
[...] o fato de que 95% dos entrevistados usaram apenas seis termos é
frequentemente ignorado. Em nova análise dos dados de 1976, encontrou-se
que 135 termos foram usados na amostra de 82.577 brasileiros, mas 45 desses
termos foram utilizados por apenas uma ou duas pessoas. Oitenta e seis (86),
ou aproximadamente dois terços (64%) desses termos foram utilizados por
apenas 279 dos 82.577 entrevistados, correspondendo a 0,3% da população.
Logo, os brasileiros utilizaram uma vasta gama de termos raciais, mas a grande
maioria utiliza os mesmos termos (TELLES, 2003, p.107).
5
Rocha e Rosemberg (2007, p. 767) apresentam um rol de pesquisas sobre vocabulário racial brasileiro. Apresentam
um quadro por autor, ano, local da pesquisa e os termos de cor e/ou raça encontrados.
15
indígena. A partir desses achados, pesquisadores defendem os procedimentos do IBGE
(OSÓRIO, 2004, p. 85; PETRUCELLI, 2004, p. 20; TELLES, 2003, p. 107).
Rocha (2005) considera não apropriada a interpretação de que os resultados dos
inquéritos dão suporte à idéia de que teríamos um sistema classificatório múltiplo.
Reportando-se a estudos que utilizaram diversas fontes de dados, Petruccelli (2004, p.
21) chega mesmo a indicar um crescimento da tendência para um sistema bipolar, no
sentido de que nota “uma instabilidade das categorias intermediárias de cor frente à
fixidez da dicotomia branco/negro ou branco/não-branco”.
Encontramos uma problematização interessante sobre o caráter múltiplo das
categorias de classificação racial em D’Adesky (2003) e Petruccelli (2004). Ambos
autores apontam para o caráter hierarquizador implícito nessa variedade cromática. Ou
seja, haveria uma subordinação dos diversos termos da escala cromática ou do continum
de cor, a cor branca, tomada como “norma referencial positiva” (D’ADESKY, 2003, p.
136). Dito de outro modo, o ideal de branqueamento, imporia a cor branca como padrão
estético superior a ser alcançado, o que implicaria numa hierarquização.
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autoatribuição de pertença, no qual o próprio respondente “escolhe o grupo do qual se
considera membro”; 2) por hetero-atribuição de pertença, no qual outra pessoa define a
que grupo a pessoa pertence e 3) por identificação biológica, através de análise do DNA6.
Os dois primeiros são respectivamente chamados de processo de autoidentificação e
processo de heteroidentificação, por Piza e Rosemberg (2003, p. 91).
A opção de usar um modelo ou outro, ou mesmo ambos, tem variado de acordo
com a situação/instrumento em que está sendo usado. Osório (2004, p. 94) assinala a
convivência das três formas no Brasil. Em registros administrativos, no entanto, há casos
onde só é possível uso da heteroatribuição, como em registro de nascimento ou de morte.
E outros, nos quais o próprio respondente é o interessado, a informação de cor/raça é
definida por autoatribuição. O autor ainda afirma que, nas pesquisas domiciliares, do tipo
surveys, realizadas pelo IBGE, é usado um método misto de auto e de heteroatribuição de
cor/raça, pois os questionários são aplicados no responsável pela residência ou seu
substituto no momento da aplicação, que dá informação sobre sua cor e também sobre a
cor dos demais residentes, principalmente de crianças ou de outra pessoa que esteja
impossibilitada de fazer isto.
A controvérsia de estudiosos quanto ao uso da autoatribuição em pesquisas
brasileiras, acontece em função da categoria pardo. Para alguns pesquisadores, a
autoatribuição poderia facilitar o “embranquecimento” àqueles que se encontram numa
faixa intermediária do chamado continuum de cor e/ou com melhores condições
socioeconômicas. Para investigar a polêmica sobre a conveniência de se usar ou não o
método de autodeclaração, Osório (2004) comparou três estudos, nos quais os
pesquisadores confrontavam os dois métodos: as eleições 1986 em São Paulo, a pesquisa
DataFolha 1995 e a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) 1996. Analisando
os resultados desses estudos, o autor encontrou um alto grau de concordância entre os
dois métodos: 76%, 72% e 89% respectivamente. Em uma pesquisa realizada nos EUA,
também citada por Osório (2004), foi detectada uma concordância de 94% entre a
classificação do entrevistado e a do entrevistador. O que os estudos mostram é que
ocorreria uma mesma percepção de raça entre entrevistadores e entrevistados. Isto quer
dizer, no contexto brasileiro, que a heteroabribuição não está isenta da influência da idéia
de embranquecimento, o que indica que esse não é um método mais objetivo do que o
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Este método não será apreciado neste trabalho. Para maiores considerações consultar Osório (2004, p.87 a 94).
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método da autoatribuição. Senão vejamos: pelo critério da heteroatribuição, foram
encontrados mais brancos, do que pelo critério de autoatribuição nas três pesquisas
consideradas. Além do mais,
Da sua discussão com Valle Silva a respeito da pesquisa das eleições de 1986,
Osório termina por apontar o método da autoatribuição de cor como sendo o método
mais acurado, por produzir uma composição racial brasileira com menos brancos e
também por reafirmar a eficiência do sistema de classificação do IBGE, não deixando, no
entanto, de indicar um cuidado para a “sua aplicação em contextos onde o
enquadramento em determinadas categorias possa alavancar vantagens pessoais [...]”
(OSÓRIO, 2004, p. 133), como no caso de experiências de ação afirmativa com recorte
racial. Esse cuidado pudemos identificar no Programa IFP, no qual desenvolvemos uma
pesquisa de doutorado, que teve como objetivo descrever e propor interpretações a
discursos étnico-raciais proferidos por ocasião do preenchimento do formulário de
candidatura, cujos resultados apresentamos a seguir.
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autodeclaração e a percepção que estariam tendo de pertença étnico-racial do candidato.
Como a literatura tem mencionado (NOGUEIRA, 1998), dispomos, no Brasil, de uma
etiqueta no trato de temas raciais, que orientam o que e como devemos nos comportar na
questão. Por isto, dispor de uma justificativa escrita pelo candidato no Formulário podia
constituir uma estratégia para o entrevistador iniciar uma conversa.
Ao qualificarmos a questão como inédita, nos apoiamos nas pesquisas e nos
estados das artes, nos quais não localizamos inquéritos sobre as justificativas que
sustentam as opções das pessoas pelas alternativas postas pelo IBGE. De fato, há um
consenso na literatura nacional, de que o modo brasileiro de efetuar a declaração de
cor/raça se assenta na aparência (FERNANDES, 1965; NOGUEIRA, 1998;
GUIMARÃES, 1999). Daí a nomeação, por Oracy Nogueira (1998) de “preconceito de
marca”, em contraposição ao “preconceito de origem”. Porém, alguns autores já vinham
assinalando um modo “misto” (PIZA e ROSEMBERG, 2002; SHERIFF, 2002) de
classificação de cor/raça.
Ao analisarmos as respostas de nossa amostra de candidatos ao Programa IFP
referentes a esta questão, encontramos uma pluralidade de justificativas, sendo que a
aparência não foi aquela predominante.
Antes de trazermos as respostas, convém um esclarecimento para facilitar
o entendimento do que segue. Ao final dos excertos transcritos, incluímos uma fórmula
de identificação dos autores: sexo (M ou F), idade (numeral), cor autodeclarada (preta,
parda ou branca) e declaração de pertença do campo M (Negro ou −, esta última quando
não há indicação de resposta). Por exemplo, a fórmula F/26/preta/negra indica que se
trata de mulher, tendo 26 anos, que indicou a cor preta no quesito sobre sua cor/raça
(IBGE) e declarou-se negra no campo M referente à declaração de identificação/pertença.
Observamos nas respostas dos candidatos a questão, justificativa à declaração de
cor/raça, aspectos notáveis: a quase totalidade (97,0%) dos candidatos respondeu à
questão; a justificativa mais presente se baseia na origem, e não na aparência. De fato, o
percentual de justificativas na origem (35,4%) é quase o dobro do percentual obtido pela
justificativa aparência (19,8% das justificativas). Vejamos alguns exemplos de
justificativas com base na aparência e na origem.
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“Por causa dos traços que carrego” (F/29/parda/negro).
“Por ser filho e neto de casais negros” (M/29/preta/negro).
“Porque os avós eram brasileiros (afrodescendentes) e italiano” (F/24/parda/-).
“Porque meus pais são brancos” (F/29/branca/-).
“Devido às origens e miscigenações de meus ancestrais” (F/30/parda/negro).
“Descendência paterna” (F/25/parda/-).
“Herança genética, mãe morena, pai mulato” (F/28/preta/negro).
Tais resultados apelam por mais estudos: por exemplo, que documentos, de onde,
e de que modo “declaram” a cor/raça das pessoas. Além disso, tais resultados
intensificam os qualificativos “complexo e sofisticado” associados ao modo brasileiro de
classificação racial, sobretudo quando atentamos aos dados transcritos na Tabela 1. Com
exceção das respostas dos autodeclarados brancos e dos que se situam na faixa etária
acima de 50 anos, as justificativas apoiadas na origem são predominantes em todos os
demais subconjuntos de candidatos.
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Tabela 1: Justificativas dadas à opçãocor/raça por sexo, idade, cor/raça e declaração
de pertença
Declaração
Sexo Idade Cor/raça
Total Geral
Categoria
Não consta
Masculino
Feminino
51 acima
Negro1
Negro2
21 a 30
31 a 40
41 a 50
Branca
Parda
Preta
Aparência 18,1 22,0 20,9 18,8 18,2 14,3 0,0 27,3 18,9 16,2 17,7 19,3 16,5
Origem 36,2 30,5 37,4 31,3 36,4 14,3 50,0 21,2 28,9 47,3 37,2 34,5 33,1
Documento 13,0 16,9 6,6 28,1 6,1 14,3 50,0 33,3 1,1 21,6 10,4 14,2 8,7
Cultura 5,1 3,4 5,5 3,1 6,1 0,0 0,0 3,0 7,8 1,4 4,9 4,6 6,3
Reafirmação 7,2 11,9 11,0 3,1 12,1 14,3 0,0 3,0 15,6 2,7 9,8 8,6 12,6
Postura política 11,6 8,5 14,3 4,7 9,1 28,6 0,0 0,0 22,2 1,4 12,8 10,7 15,7
Outros conteúdos 5,8 5,1 2,2 7,8 9,1 14,3 0,0 9,1 3,3 6,8 4,9 5,6 3,9
Sub-total 97,1 98,3 97,8 96,9 97,0 #### #### 97,0 97,8 97,3 97,6 97,5 96,9
Não consta 2,9 1,7 2,2 3,1 3,0 0,0 0,0 3,0 2,2 2,7 2,4 2,5 3,1
Total #### #### #### #### #### #### #### #### #### #### #### #### ####
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É necessário destacar, ainda, que os subconjuntos de candidatos autodeclarados
pretos e que se identificaram como negros (Negro 2) foram os que apresentaram os mais
altos percentuais de justificativas políticas e de reafirmação: “sou negro”
(M/26/preto/negro; “sou afrodescendente” (M/47/preta/negro); “porque me considero um
cidadão negro brasileiro” (M/27/preta/negro). Além disso, foram também os
subconjuntos de candidatos que menos se apoiaram em documentos para justificar sua
autodeclaração de cor/raça.
Sugerimos, aqui, uma distinção (que não nos parece efetuada pela literatura),
entre modo de classificar a si mesmo e modo de classificar o outro: sugerimos que a
classificação pela aparência seja o predominante quando atribuímos categoria de cor/raça
aos outros, posto que não temos, enquanto observadores dos outros, nada além de sua
aparência, a não ser nos casos em que conhecemos outros detalhes desses outros (sua
família, por exemplo). Porém, no caso de autodeclaração, os modos que nos levam à
opção por uma das alternativas na terminologia racial, parecem se originar de múltiplas
raízes. Lembramos, aqui, a pesquisa de Sheriff (2002) em “morro carioca”, mencionada
acima, quando interpreta a fala de Ana Lúcia, uma das moradoras locais (“Quando a
gente se reúne e você olha bem, tem mistura do negro no meio. Sabe que tem negro na
família”):
Nesses comentários Ana Lúcia refere-se a si mesma como de raça negra. Ela
refuta, ao menos parcialmente, a noção de que, no Brasil, ao contrário dos
Estados Unidos, a identidade racial é determinada não pela família ou pelo
parentesco, mas pela cor da pessoa (SHERIFF, 2002, p. 231).
Em suma, nossos resultados também apontam nesta direção, apelando por novos
estudos no campo da classificação por cor/raça.
Perguntamo-nos, durante as análises, em que medida tais justificativas baseadas
na origem, como também nos documentos, não teriam sido evocadas exatamente porque
foram efetuadas em contexto de experiência de ação afirmativa com viés étnico-racial em
meio ao debate midiatizado. Tal reinterpretação parece consistente com o fato de que os
candidatos pardos foram os que apresentaram os mais altos percentuais de justificativas
referentes à autodeclaração de cor/raça assentada na origem (47,3% das justificativas),
um percentual que foi muito pouco evocada (1,1%) por candidatos pretos.
Por outro lado, esta reinterpretação não parece se manter para as diferentes
categorias de autodeclaração, posto que os candidatos brancos também usaram-na com
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frequência (21,2%). Notar, porém, que a frequência desta justificativa entre os pardos os
situam entre brancos e pretos.
Tais suposições merecem, a nosso ver, aprofundar na pesquisa. Replicar a
pergunta entre pessoas do mesmo nível educacional, porém fora do contexto de ação
afirmativa, poderá contribuir para sustentá-las, aperfeiçoá-las ou descartá-las.
REFERÊNCIAS
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Rio de Janeiro, 1925-1950. Afro-Ásia, n. 29/30, p. 247-269, 2003b.
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Psicologia social do racismo – estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil.
Petrópolis, RJ:Vozes, 2003.
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escolares paulistanos(as). Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 132, p. 752-799, set./dez.
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ROCHA, Edmar José da. Autodeclaração de cor e/ou raça entre alunos (as)
paulistanos (as) do ensino fundamental e médio: um estudo exploratório. São
Paulo:PUC-SP (dissertação de mestrado), 2005.
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racismo num morro carioca. In: MAGGIE, Y.; REZENDE, C. B. (orgs). Raça como
retórica: a construção da diferença. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002, cap.6,
p. 213-244.
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