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A bagagem histórica de uma pessoa negra: como surgiu o

racismo?

Para melhor entendimento sobre o racismo, é preciso saber sua


principal origem.
A palavra racismo tem uma origem "recente". Ela apareceu em um
artigo publicado em uma revista francesa nomeada Revue Blanche,
em 1902. Nas décadas seguintes, a palavra começou a se
popularizar em línguas europeias (inglês, espanhol, português,
etc..), sendo usado para denominar as concepções sobre
superioridade e inferioridade racial que começaram a vigorar na
Europa a partir do século XIX e em pouco tempo, essas
concepções que tinham sido aprovadas por cientistas, passaram a
ser justificativa por ações políticas racistas, como por exemplo: a
política antissemita, (que remete ao povo judeu nomeado semita, na
Alemanha nazista, que deu origem ao holocausto;) o apartheid, na
África do Sul e as leis de segregação racial no sul dos Estados
Unidos da América.
Racismo, segundo o filósofo e professor Silvio de Almeida, “é uma
forma sistemática de discriminação que tem a raça como
fundamento e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou
inconscientes que culminam em desvantagens ou privilégios, a
depender do grupo racial ao qual pertençam”. A prática do racismo
tem origens profundas, revelando um problema sistêmico,
estabelecendo posições sociais onde envolvem preconceito com
cor da pele, elementos sociais, classe social e etnias.
Essa realidade se acentuou ainda mais durante a pandemia de
COVID-19, onde a população negra enfrenta o aumento de
desemprego, fome, menor acesso a saúde e assim,
consequentemente, maior exposição ao vírus.
Mas afinal, quais são as origens do racismo?
O racismo tem uma origem cientificista, ou seja, sua origem foi a
partir de determinadas teses de cientistas europeus do século XIX,
principalmente antropólogos e médicos, que usaram dos seus
conhecimentos adquiridos para elaborar doutrinas raciais e um dos
procedimentos consistia em medir o tamanho do crânio de pessoas
de "raças" dissemelhantes. Outro procedimento era analisar a
fisionomia humana, ou seja, os traços faciais, como o nariz, olhos,
boca, orelhas, cor dos olhos, para que assim, fosse determinado o
grau de "pureza racial". Muitos desses cientistas praticavam e se
baseavam na teoria darwinista da seleção natural e da evolução
das espécies, e acreditavam que a mesma lei em que era praticada
em animais, poderia separar homens negros de homens brancos,
mostrando a raça superior. Dois dos maiores representantes do
cientificismo racista foram o francês Arthur Gobineau e o inglês
Houston S. Chamberlain.
Na África do Sul, desde o início da formação desse país, os brancos
descendentes de holandeses, conhecidos como bôeres,
desenvolveram políticas racistas contra os negros que habitavam a
mesma região, tendo como fundamento também a tese da
superioridade racial branca. Essas políticas ganharam intensidade
com o
decorrer das décadas do século XX e acabaram de tornando parte
do cotidiano sul-africano, naquilo que foi denominado no idioma
local de apartheid, ou seja, “vidas separas". Ocorreu algo parecido
na região sul dos Estados Unidos, houve políticas em que tinham
como objetivo separar pessoas negras e brancas na ocupação de
espaços públicos, dando privilégios às pessoas brancas e deixando
de lado as pessoas negras, restringindo seus direitos e privilégios.
Essa política se pautava em teses de superioridade racial branca e
geraram muitos episódios violentos, como por exemplo, a seita Klu
Klux Klan, que foi fundada após o fim da Guerra Civil Americana,
em 1865, onde o objetivo era perseguir e matar negros do Sul dos
Estados Unidos.
Mas, aprofundando mais um pouco e entrando mais na história, não
podemos deixar de falar do Brasil, onde também há vários casos de
racismo. Mas afinal, o que é Racismo no Brasil?
"Para se falar sobre a cultura afro-brasileira não se poderia deixar
de mencionar o período escravo que se constitui numa mancha
difícil de apagar. É impossível se falar sobre a cultura dos negros,
sua passagem pelo Brasil e seus dias atuais se não for escrito
sobre a escravidão e suas conseqüências. Este estudo pretende
abranger, entre outros assuntos, a escravidão, seus conhecidos
males, sua travessia pelo Atlântico, O índio brasileiro era tão
desprezível na avaliação portuguesa que o preço de cada um não
ultrapassava a casa dos quatro mil-réis, enquanto o negro nunca
era vendido por menos de cem milréis, isto no inicio da escravidão.
Eram, pois, os africanos, mercadoria de alto valor na época. Para
isso concorria, de certo, sua fácil adaptação a faina agrícola, uma
vez que, acostumados a outras condições de vida, decorrentes de
civilização maias adiantada, seus hábitos e temperamento muito
diferiam do nomadismo indígena. [...] (LUNA, 1968, p. 16)"
Há 131 anos, o Brasil acabou sendo o último a abolir a escravidão
do país. Isso ocorreu diante da pressão internacional e da força dos
quilombos e movimentos abolicionistas, onde em 13 de maio de
1888 foi assinada a Lei Áurea, mas acabou não sendo o suficiente e
ainda sim, havia violência e violações aos direitos humanos
começaram a ser normalizadas, incluindo humilhações, abuso
policial, discriminação em lojas e departamentos, em entrevistas de
emprego, englobando um sistema enorme no país.
Desde a abolição da escravidão, muitos movimentos foram
organizados. Como por exemplo, em 1931, foi fundada a primeira
organização ativista pelos direitos civis de pessoas negras,
nomeada a Frente Negra Brasileira.
Muitos autores da virada do século XIX para o século XX
acreditavam que os vários surtos de doenças que haviam no interior
do Brasil eram resultado da contaminação da raça negra sobre a
branca, que resultara na figura do mestiço, anêmico e doente.
Monteiro Lobato, quando elaborou pela primeira vez seu
personagem “Jeca Tatu”, tinha isso em mente. Logo após, com o
início das pesquisas sanitaristas (pesquisas médicas que tinham a
missão de esclarecer os agentes de transmissão de doenças, como
mosquitos, ratos etc.), Monteiro Lobato e vários outros escritores e
intelectuais abandonaram as antigas concepções racistas.
Em 1937, as perseguições do Estado à população negra fizeram
com que ações antirracistas tomassem força novamente apenas na
década de 1970, com a criação do Movimento Negro Unificado
(MNU) e em 1978, a MNU foi responsável pela organização de um
protesto de rua em frente ao Teatro Municipal de São Paulo.
Ainda podemos falar sobre a consciência negra, um movimento
muito importante para o movimento contra o racismo.
Para começar, podemos falar do fundador e um dos mais
importantes para essa história, Zumbi dos Palmares, um dos
principais líderes do quilombo dos Palmares, foi assassinado pela
coroa portuguesa.
A história conta sobre quilombo dos Palmares, onde os
escravizados fugidos ergueram um espaço de resistência, tornando-
se um dos maiores símbolos da luta constante antiracista no Brasil.
O Dia da Consciência Negra é renovado todos os anos, para se
lembrar de uma constante luta em que carregamos, uma bagagem
com brutalidade, cultura, ancestralidade, resistência e força, onde a
história nunca deve ser esquecida.
Não bastando, o preconceito também afeta bastante o povo
indígena, onde sofrem constantemente violações e ataques desde
que os colonizadores europeus chegaram ao Brasil. O povo
indígena nos mostra exemplos notórios de racismo institucional,
sofrendo agressões sistemáticas por parte do Estado, onde é
estabelecido uma relação histórica de extermínio, genocídio e
segregação.
E claro, podemos também incluir a mulher negra nessa luta
constante. Para as mulheres negras, essa luta acaba sendo
constante e mais sobrecarregada, pois estão destinadas a salários
pequenos, postos de trabalhos precarizados e por muito tempo,
sem liberdade de expressão. Em uma pesquisa feita pelo IPEA em
2020, mostra que as mulheres negras estão em desvantagem social
não só para mulheres brancas, mas em relação a homens negros,
apresentando índice mais alto de desemprego e analfabetismo e
também estão no grupo de menor renda média, atrás de homens
negros, homens brancos e mulheres brancas. Também temos que
enfatizar o fato de como o racismo afeta na autoestima de mulheres
negras desde menores. Trata-se dos efeitos do racismo na
autoestima da mulher negra em que se recusa a usar o seu cabelo
natural por exemplo, para se enquadrar em um padrão estético
racista. Esse trauma é colocado na cabeça das mulheres desde
pequenas.
Podemos pautar também o quão importante é falar sobre o racismo
nas escolas, onde não é um assunto muito discutido. Quando se é
analisado a escolaridade da população negra, os dados do IBGE
(Instituto Brasileiro Geografia e Estatística), mostram uma grande
desvantagem.
Quando falamos sobre práticas racistas, queremos nos referir a
práticas discriminatórias, preconceituosas, envolvendo um grande
grupo de pessoas, incluindo estudantes, direção da escola,
professores, sem contar em materiais escolares como os livros
didáticos e até mesmo paradidáticos.
Em nossa sociedade, o potencial de pessoas negras é muito
subestimado devido ao tanto que sofremos com o preconceito
racial, refletindo também em sala de aula, onde até mesmo
professores incapacitam muito alunos negros.
As origens desse fato podem estar enraizadas na representação
negativa de uma pessoa negra nos meios de comunicação e
centros pedagógicos, ou seja, um tipo de esteriótipo para mostrar
que até nos dias atuais, a exclusão e a dor ainda é grande, desde o
período pós-escravidão.
Querendo ou não, isso influência muito no comportamento de
crianças negras, trazendo um trauma desde pequeno. É ensinado
que a criança branca é melhor do que a negra, ou seja, a criança
reproduz o que é passado, incluindo xingamentos, ataques físicos e
verbais.

O PERCURSO HISTÓRICO DO RACISMO

A ideia de racismo surge realmente nos séculos XVI e XVII,


sobretudo neste último. Sabemos que nesses tempos a escravidão
era comum e algo praticado pelos europeus. A história do racismo
no mundo ocidental é diretamente associada à relação entre
escravidão e colonialismo. E é justamente no contexto da
colonização que algo chamado raça é criado, o que significa
basicamente que os “não europeus”, ou até mesmo os “não
brancos”, são inferiores aos europeus. Mas o fato é que não se trata
de pessoas criando racismo no laboratório; de certo modo, os
brancos, os negros e os índios estabeleceram suas ideias de raça
através do contato que tinham com o mundo e com as “outras
raças”. Os colonizadores não se tornaram traficantes de escravo
por serem racistas, mas sim tornaram-se racistas porque utilizavam
de outras raças como escravos para obter grande lucro nas
Américas e associaram uma série de atitudes aos negros para
justificar o que faziam. O fato é, a força motriz por trás da origem de
uma relação de racismo era a economia.
Os africanos eram nada mais do que produtos, tratados como
objetos para serem adquiridos ou até mesmo herdados. Eram como

os outros objetos negociáveis.

Nesta imagem é possível inferir algumas relações de colonizador x


colono, como por exemplo os escravos amontoados ou recebendo
ordens do europeu com a luminária.

Estima-se que mais de 11 milhões de africanos foram transportados


através do Atlântico. Acorrentados e amontoados como animais, ao
menos 2 milhões morreram durante a viagem conhecida como
“Passagem Atlântica”. Os escravos eram vistos como pessoas sem
direitos, pessoas sem terra. Então, por assim dizer, estavam
socialmente mortos. Eram vistos como pessoas sem honra, o que é
uma condição degradante. Para o senhor de escravos, isso
significava um poder absoluto sobre o escravo; independente do
que diziam as leis, tinham soberania sobre as outras raças.
Chegou-se a uma situação em que milhares de pessoas de pele
escura eram mantidas sem qualquer direito e obrigadas a trabalhar
dia e noite sujeitas a chicotadas e surras. Deve-se lembrar que
qualquer branco era visto como um inimigo em potencial pelos
negros, e havia o receio de que eles tentassem se rebelar,
tentassem fugir, e, quando isso acontecia, matavam os senhores e
os capatazes.
Dessa forma, há um medo mútuo entre os dois grupos e isso tendia
a consolidar o sentimento racial.

Dados retirados do documentário: “a historia do racismo” do


núcleo de estudos afro-brasileiros e indígenas.

O RACISMO NA ATUALIDADE

Talvez sejamos, negros, brancos e amarelos, iguais na hora de


torcer pela seleção brasileira de futebol. Nos demais aspectos da
vida, as relações são bem desiguais. As vantagens e os privilégios
das pessoas brancas ficam claras ao analisarmos sua participação
nos ambientes de nossa vida: são maioria nas melhores escolas e
universidades, nos melhores hospitais, nas melhores casas. Maioria
nos aeroportos, nos restaurantes chiques, nos Três Poderes da
República...

Esta desigualdade não depende de um ponto de vista, ou de uma


interpretação. Ela vem expressa em estatísticas. Os indicadores
sociais mostram que os brasileiros negros, 48% da nossa
população, estão na base da pirâmide socioeconômica: piores
empregos, piores índices de saúde, ausência no poder político,
entre outras desvantagens. Já passa da hora a necessidade de
agirmos contra a desigualdade no Brasil. Esta que se disfarça entre
os números e as oportunidades. O racismo que enaltece a
negritude no musica ou no futebol, mas trata os negros nos cargos
de mando e ocupando altos postos como exceção . Há mais de um
século da Abolição da Escravatura, chegou a hora de inverter os
discursos militantes por ações concretas. As chamadas Políticas
Públicas têm como ideal dar tratamento diferente para grupos
historicamente discriminados. Essas Políticas significam, também, a
intervenção do Estado para minimizar e diminuir as desvantagens
que a sociedade civil, por iniciativa própria, não foi capaz de
extinguir ou erradicar. A ideia defendida, pelo Movimento Negro e
por uma parcela expressiva da população, é de que o acesso dos
negros e indígenas ao ensino superior pode funcionar como uma
alavanca para tirá-los dos tradicionais papéis secundários.

A ideia de implementar cotas e políticas públicas direcionadas as


minorias, também tem opositores. Há quem diga que falar de raças
acabaria criando ou reforçando o racismo na sociedade brasileira.
Mas como pode ser criado ou reforçado o que já existe? Nenhum
brasileiro, em sã consciência, pode afirmar que as oportunidades
desde a abolição se dividiram igualmente entre a população negra e
branca. Também sabemos que não existe a raça no sentido estrito
da palavra. Quando pensamos em pessoas, a única raça que existe
é a humana. Quem criou o conceito de raça foi o racismo, sempre
com superioridade de um grupo sobre o outro.
A existência de racistas em nossa sociedade é uma constante
negação em nosso país. Felizmente, esse tabu começa a ser
quebrado. “Melhor viver com uma realidade amarga e buscar
caminhos para transformá-la, do que conviver com uma fantasia de
igualdade que nos condena à injustiça sem fim.”

Por isso vamos entender um pouco mais sobre as manifestações do


racismo.
 Quando há crime de ódio ou discriminação racial
direta: essa forma de manifestação do racismo é mais
evidente. Trata-se de situações em que pessoas são
difamadas, violentadas ou têm o acesso a algum tipo de
serviço ou lugar negado por conta de sua cor ou origem
étnica.
 Quando há o racismo institucional: menos direta e
evidente, essa forma de discriminação racial ocorre por
meios institucionais, mas não explicitamente, contra
indivíduos devido a sua cor. São exemplos dessa prática
racista as abordagens mais violentas da polícia contra
pessoas negras e a desconfiança de agentes de segurança
e de empresas contra pessoas negras, sem justificativas
coerentes. Um bom exemplo da luta do racismo
institucional são os protestos de Charlottesville, nos
Estados Unidos, em 2017, devido à conduta criminosa de
policiais que mataram negros desarmados e rendidos em
abordagens, além de agirem com violência desnecessária.
 Quando há o racismo estrutural: menos perceptível
ainda, o racismo estrutural está cristalizado na cultura de
um povo, de um modo que, muitas vezes, nem parece
racismo. A presença do racismo estrutural pode ser
percebida na constatação de que poucas pessoas negras
ou de origem indígena ocupam cargos de chefia em
grandes empresas; de que, nos cursos das melhores
universidades, a maioria esmagadora — quando não a
totalidade — de estudantes é branca; ou quando há a
utilização de expressões linguísticas e piadas racistas. A
situação fica ainda pior quando as ações ou constatações
descritas são tratadas com normalidade.
RECENTES CASOS DE RACISMO

Nos últimos anos, casos de racismo ganharam notoriedade nacional


por envolverem pessoas famosas ou terem viralizado nas redes
sociais. Alguns casos que tomaram grande proporção no Brasil
estão relatados em matéria de 2015, da revista Exame, intitulada 5
casos de racismo que chocaram o Brasil. Levantamos três casos,
sendo dois da matéria mencionada acima:
 Ofensas ao goleiro Aranha, do Santos, em partida contra o
grêmio. Torcedores do Grêmio chamaram o jogador de
“macaco”.
 Filha do casal de atores Giovanna Ewbank e de Bruno
Gagliasso, nascida no Malawi, sofreu com comentários
racistas nas redes sociais. O pai e a mãe da menina
tomaram medidas legais contra o caso.
 Garoto negro e filho adotivo de um norte-americano que
vive no Brasil foi proibido de ficar na calçada de uma loja
de grife onde o pai estaria fazendo compras. Sem saber
que se tratava do filho de cliente, uma funcionária da loja
disse ao menino que ele não poderia ficar lá.
Infelizmente, ainda existe racismo. Casos que ganham notoriedade
estão tornando-se comuns, mas são inúmeros os casos que
continuam anônimos. É preciso lutar para colocar um fim definitivo
nessa prática criminosa que vitima muitas pessoas no Brasil e no
mundo todos os dias.

HERANÇA ESCRAVISTA NO TRABALHO

Um dos temas mais recorrentes quando se fala de racismo


estrutural é a transição da escravidão para o trabalho assalariado.
Que destino tiveram os ex-escravos? Que novas relações de
trabalho lhes foi oferecida? Que profissões exerceram? Onde
habitavam e em que condições?

Os textos a seguir são da matéria de título: “trabalhador” de autoria


do portal ‘leiaja’ e foram publicados no dia 28/05/2018.
“A poeira alaranjada do chão de barro começa a subir, as moscas
se agitam no entorno e a correria inicia. Com sacos de plástico em
mãos, todos os trabalhadores se preparam para correr ao encontro
do lixo. Alguns não esperam e já se penduram na parte traseira dos
caminhões, enquanto trafegam pela estrada que dá acesso à parte
central do lixão. A disputa por cada metro quadrado é agitada, a
ansiedade dos trabalhadores é resultado do desespero sem
precedentes. Todos aguardam o momento mais esperado com
olhos atentos à traseira do veículo. O caminhão se posiciona de ré,
a trava é liberada por funcionários de uma prefeitura e aos poucos
as sacolas de lixo vão caindo lentamente da caçamba ao chão,
saco por saco, um por cima do outro. Na disputa pelo melhor
material, eles mergulham literalmente no mar de resíduos.

‘A gente trabalha tanto dentro do lixão, dia e noite, a gente constrói


casas e mora aqui escondido porque nem todo mundo teve
oportunidade. Parece até que somos lixo descartado, também’. A
fala do catador não só narra a dura realidade enfrentada por essa
categoria de trabalhadores, mas expõe também a sensação de
estar à margem da sociedade brasileira.

Retrato da exclusão social e da falta de oportunidades no sistema


de emprego formalizado, o catador do lixão se isolou em grandes
terrenos descampados para se esconder, muitas vezes, da dor e
opressão psicológica ou física que sofre fruto da desigualdade
social no Brasil. Dados de 2015 do Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH), revelado pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), destacam que o Brasil aparece entre os
dez países mais desiguais do mundo.

Com uma rotina extenuante de trabalho braçal, em algumas


situações de domingo a domingo, e muitas vezes sem momentos
de descanso, homens, crianças, mulheres, idosos e diferentes
perfis de pessoas catam os materiais recicláveis. Eles dividem o
espaço de trabalho com muitas aves, principalmente urubus, que
sobrevoam em círculos a todo instante em busca de alimento.
Porcos, cavalos e cachorros também permanecem no entorno do
lixão por causa da comida. A maioria dos bichos pertence a alguns
trabalhadores que utilizam os animais como outra forma de renda
ou locomoção. Outros animais soltos aparecem por causa do cheiro
forte do chorume e pela quantidade de lavagem despejada nos
sacos de lixo que são trazidos das residências.
Insalubre, inóspito, perigoso, penoso e outros tantos adjetivos são
utilizados pela literatura para descrever o ambiente do lixão e a
rotina dos trabalhadores que lá habitam e dele sobrevivem. Tentar
uma primeira aproximação com esses catadores não é uma tarefa
fácil, visto que o ambiente é de desconfiança e medo. Eles dizem
temer o fechamento do local, que oficialmente não deveria existir. A
Lei nº 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos
Sólidos (PNRS), visa extinguir os lixões em todos os municípios do
Brasil e viabilizar a criação de aterros sanitários, para a destinação
final ambientalmente adequada dos rejeitos.”
“Segundo a mestre em extensão rural Maria Augusta Amaral, que já
realizou vários trabalhos de pesquisa com catadores de materiais
recicláveis em Pernambuco, a problemática dos lixões no Brasil é
complexa porque não envolve só o meio ambiente, mas também a
questão social dos catadores. ‘Um dos motivos que eles não
concordam com o fechamento do lixão, além do desemprego, é que
muitos têm vergonha de realizar os trabalhos expostos nas ruas, de
casa em casa, porque no lixão eles estão escondidos. As
prefeituras não podem agir de forma irresponsável. É preciso
educar esses trabalhadores no intuito de quebrar paradigmas e
inseri-los em um contexto de trabalho em grupo, em locais mais
propícios à catação. Não adianta o poder público tentar obrigar essa
categoria a entrar em cooperativas de um dia para o outro. Existe
uma série de trabalhos sociais que precisam ser tomados com
cautelas’, detalha Maria Augusta, que aposta em uma solução
equilibrada.

Na avaliação da estudiosa, quando o fechamento dos lixões é feito


de forma arbitrária, o ciclo de migrações em torno do lixo cresce.
‘Os catadores saem de um e vão para outro ou continuam
escondidos’, afirma. Maria Augusta também alerta para uma série
de riscos à saúde por causa dos ambientes onde os trabalhadores
estão inseridos. Contato com ratos e moscas, mau cheiro, fumaça e
levantamento de peso, risco de quedas, exposição ao calor, cortes,
mordidas de animais, contaminações e outros. A atividade é
considerada insalubre em grau máximo, de acordo com a Norma
Regulamentadora do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE),
exigindo maiores cuidados em termos de equipamento de proteção
e disponibilidade de locais adequados para o trabalho.”

O MOVIMENTO DO BLACK LIVES MATTER

Os negros lutam pelo fim da segregação racial há quase dois


séculos nos Estados Unidos. E apesar das manifestações do
movimento Black Lives Matter serem recentes, ele não está
desvinculado do passado.
Black Lives Matter (BLM) que em tradução livre significa “Vidas
Negras Importam” é um movimento ativista iniciado nos Estados
Unidos e de proporções internacionais. Segundo os membros do
movimento, existe um ataque intencional às vidas dos negros. A
principal bandeira deste movimento social é a luta contra a
brutalidade policial e as maiores ondas de protestos atuais
envolvem mortes de negros causadas injustamente por policiais
brancos.

- MOVIMENTOS QUE INFLUENCIARAM O BLM

O primeiro e original foi o movimento pelos direitos civis. Ele


alcançou o fim das leis raciais na década de 60. Depois surgiram
grupos como MLK e Malcom X.

Eles aceitavam quaisquer meios na luta pela igualdade, incluindo a


violência e obviamente nem todos concordavam com isso. O maior
exemplo foi Martin Luther King, que pregava a desobediência civil e
nunca a violência.
Outro grupo que se destacou foi o Black Panthers, criado por
universitários marxistas. Uma das exigências do movimento incluía
a libertação de toda a população carcerária negra.

- HISTÓRIA DO MOVIMENTO

No dia 13 de julho de 2013, o movimento Cteve início com uma


simples hashtag “#BlackLivesMatter”. Isso aconteceu por conta da
morte de um jovem negro.

Trayvon Martin de 17 anos, morreu após ser baleado por George


Zimmerman, um policial branco. A polêmica nas redes sociais teve
início porque o policial foi absolvido pela justiça.

A co-fundação do movimento Black Lives Matter está relacionada a


três mulheres influentes nas causas da comunidade negra:

 Alicia Garza, diretora da National Domestic Workers Alliance


(Aliança Nacional de Trabalhadoras Domésticas);
 Patrisse Cullors, diretora da Coalition to End Sheriff Violence
in Los Angeles (Coligação contra a violência policial em Los
Angeles);
 Opal Tometi, ativista pelos direitos dos imigrantes.

Elas se conheceram na Organização Negra para Liderança e


Dignidade (BOLD), organização que treina organizadores
comunitários. Com um viés marxista, o foco é transformar causas
sociais em fontes de modificações políticas.

A BOLD foi fundada para oferecer programas de treinamento,


coaching e assistência técnica para conquistar mudanças
progressistas.

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