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zados de pouca idade. As imagens obtidas são Não diremos nada de novo sobre a figura
projetadas nas relações que mantemos com do menor transformado em alimo, pois, de u m
eles, na maneira de vê-los e de entendê-los, jeito ou de outro, tudo já foi dito; mas é preciso
no que esperamos de seu comportamento lembrar outra vez algo que já é sabido e com-
diante das indicações que lhes fazemos o u biná-lo de outra forma para que passe a ser
diante de determinadas situações, nos parâ- parte dos discursos de nosso presente domina-
metros que servem para estabelecer o que do por outros modismos. O sujeito deixou de
consideramos normal e o que fica fora do to- ser atual nas propostas que d o m i n a m os dis-
lerável. ^ cursos atuais. A o tentar devolver esse tema pa-
A o acreditamos que são "menores", sua, ra a atualidade, queremos enfrentar os proble-
voz não nos importa e não os consultamos \.. mas do presente considerando os receptores
para elaborar o u reconstruir a ideia que te- da educação, em nome de quem parece que
mos sobre quem eles são. Os adultos definem tudo é feito. Não fazemos isso pelo simples i n -
a si mesmos, e os menores são definidos pelos teresse académico. As ideias importantes de-
adultos. Se eles não falam, e nós adultos faze- vem ser constantemente rememoradas, embo-
mos isso por eles, é lógico que a explicação de ra contextualizando-as no panorama a partir
sua experiência esteja m u i t o intermediada do qual nós as ressuscitamos, simplesmente
pelas visões que temos deles. Não será estra- porque aqueles que as lêem e escutam são d i -
nho, então, em u m a situação como a atual, ferentes. U m a tradição de pensamento não se
em que o grupo de menores passa a ter u m a estabelece na cultura que serve de apoio a este
certa identidade e a se constituir em agente e às ações dos seres humanos, do mesmo m o -
social, que os desajustes em nossas percep- do que se estabiliza uma mutação genética que
ções adultas sobre os alunos comecem a se se reproduz nas gerações seguintes dos sujei-
tornar evidentes. tos que a herdam, mas por ser reiterada. O fa-
Por que discutir sobre a obviedade da exis- to de ficar acumulada na tradição do discurso
tência dos alunos como menores dentro das so- não significa que faz parte da consciência cole-
ciedades escolarizadas? U m tema não é i m - tiva, mas que está viva dentro de cada u m de
portante pelo fato de estar na moda, nem dei- nós. O que para alguns já é sabido é preciso ser
xa de ser porque não é mais atual. As oscila- í rememorado para que outros também possam
ções de nossa atenção por qualquer dos tópi- saber, mas isso precisa ser feito, sobretudo, pa-
cos nos quais colocamos nossas preferências ra que possa continuar sendo contado e para
intelectuais dizem m u i t o de nós, de nossa so- i revitalizar a tradição.
ciedade e da cultura em u m dado momento; E m muitos casos, a aparente falta de atua-
delatam nossas sensibilidades. Os temas e lidade de u m tema o u problema é explicada,
problemas aparecem e desaparecem como simplesmente, por essa sensação de naturali-
preocupações, não porque foram resolvidos e dade que as situações, as pessoas e as vivên-
não se possa dizer algo novo, mas porque, co- cias na v i d a cotidiana provocam em nós. A o
mo dizia Gordon AUport, eles se cansam de estarmos acostumados com sua presença, es-
nós (e nos cansam). Nossa atenção oscila, va- ta pode nos impedir de pensar que poderiam
mos e voltamos sobre o mesmo, embora a par- ter sido de outra maneira, que realmente fo-
tir de linguagens e perspectivas diferentes. r a m e terão outra aparência o u presença, que
Essa inconstância faz com que nossa atuação, poderiam ter outro significado para nós e que
em vez de se apoiar em u m a experiência con- deveríamos ter nos conduzido de outro m o d o
tinuada que acumula e revisa as tradições de em relação a elas. "Sabemos" que o ar e os ba-
pensamento, se apoie em uma mistura de timentos cardíacos estão aí, deles depende ca-
lembranças e de esquecimentos, conforme as- da segundo de nossas vidas, mas não nos i m -
sinala Bauman (2002), enterrando algumas portamos nem nos preocupamos com isso; e,
ideias vivas e retomando outras que foram assim, não percebemos o que sua existência e
deixadas de lado em outro momento. seu funcionamento têm de maravilhoso, a
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não ser quando sofrem alguma anomalia. soas que vemos é'ir às instituições escolares
Quase a mesma naturalidade outorgamos às todos os dias.
pessoas e às relações que mantemos com elas. U m a olhada nos números sobre a escolari-
Estamos tão presos às realidades cotidianas e zação de crianças e jovens nos mostra que a
aos semelhantes que nos rodeiam e ao que fa- condição de serem escolarizados desde os 3
zem e são para nós que, quase com toda cer- até os 15 anos é uma forma estatisticamente
teza, não nos sentimos estimulados a i m a g i - normal de estar em nossa sociedade, como se
nar outro m u n d o possível. Aceitamos como pode ver na Figura 1.1, tanto para as m u l h e -
natural e como certo o que acontece e v e m res como para os homens; embora sçja certo
dado, quando tudo é produto de uma trajetó- que, por trás desses dados estatísticos, se es-
ria que poderia ter tomado outro r u m o e che- condem realidades desiguais para diferentes
gado a ser de outra maneira. A mesma natu- grupos que não foram e ainda continuam
ralidade estendemos ao futuro (ao menos ao sem ser escolarizados nas mesmas condições.
imediato) e damos como certo que assim con- O aluno, como a criança, o menor o u a in-\
tinuará sendo. fância, em geral, são invenções dos adultos,
Com a figura do aluno acontece o mesmo:^ categorias que construímos com discursos
é tão natural ser aluno e vê-lo em nossa expe- que se relacionam com as práticas de estar e
riência cotidiana (tem sido assim em nossa de trabalhar com eles. São elaborações atri-
própria vida), que não questionamos o que buídas aos sujeitos que pensamos ter algu-
significa ter essa condição social que é contin- mas dessas condições. A peculiaridade socio-
gente e transitória. Damos como certo que, lógica e antropológica que supõe esse fato
em uma etapa de suas vidas, o papel das pes- geralmente passa despercebida, de tão natu-
T 1 1 1 1 1 1 1 1 r—y—I 1 r
4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19
% de população de menores escolarizados por idades
Figura 1.1 Porcentagem de população que tem a condição de ser aluno em diferentes idades.^
ral que nos parece, sem que paremos para Nossa ideia de aluno - com todas as varia-
pensar se isso foi sempre assim, se ocorre ções, incoerências e contradições que possa-
universalmente, se será u m estado do qual mos encontrar nos significados que tal cate-
necessariamente surgem consequências sem- goria representa - é devedora e se alimenta
pre positivas para eles o u não, como v i v e m da longa experiência de compreender e tratar
essa tarefa, com quais dificuldades e preocu- os menores em geral, da herança de usos das
pações vão às aulas, o que encontrarão a l i , instituições que os acolheram, daquilo que
que desejos deixam ao sair de suas casas e diferentes agentes esperam que essas institui-
quais deixam nas portas da escola, que histó- ções façam com eles e das condições sociais,
ria têm ou que futuro os espera, por que car- políticas, económicas e culturais nas quais t u -
regam nas costas o peso do que devem assi- do isso está inserido. A infância construiu em
milar e esquecer depois, o que realmente parte o aluno, e este construiu parcialmente a
infância. As duas categorias pertencem e alu-
aprenderão e o que se verão obrigados a es-
dem a mundos nos quais se separam os me-
quecer, por que na rua são de u m jeito e nas
nores dos adultos (a infância da maturidade e
salas de aula de outro, por que em sua casa
o aluno da pessoa emancipada); isso constitui
podem beber água quando querem e na sala
uma característica das sociedades modernas:
de aula não, por que têm de i r ali todos os
ser escolarizado é a forma natural de conce-
dias e na mesma hora, por que v i v e m as se-
ber aqueles que têm a condição infantil. Essa
gundas-feiras de maneira diferente das sex-
estreita relação se projeta tanto no pensamen-
tas, por que em alguns casos vão vestidos de
to c o m u m como na psicologia científica.
uniforme e em outros não...
O tratamento que se deu ao aluno como
E possível intuir que, em torno da catego-
"objeto" do pensamento científico está longe
ria aluno, formou-se toda u m a ordem social
de poder nos oferecer u m a imagem completa
na qual se desempenham determinados pa-
e coerente, pois o estudo do sujeito-aluno f o i
péis e se configura u m m o d o de vida que nos
d i v i d i d o entre diversas disciplinas científicas
parece muito familiar porque estamos acostu-
(antropologia, psicologia, sociologia, medici-
mados a ele. Essa ordem propicia e " o b r i g a "
na, etc.) incapazes de relacionar seus respecti-
os sujeitos nela envolvidos a serem de u m a
vos discursos e contribuições. A primeira ten-
determinada maneira. Eles pensam, sentem, dência da psicologia f o i descrevê-lo, normali-
se entusiasmam, se inibem e se relacionam, zá-lo, caracterizando-o; depois f o i regulá-lo,
têm uma vida pessoal e familiar, u m a histó- desmembrando-o de sua condição social e
ria, u m contexto de vida e u m futuro. Quais cultural (e também escolar), dando, ao que
aspectos de toda essa complexidade da pes- mostrava a realidade, o valor de natureza
soa entram como significados nas representa- constituída e estável. De alguma forma, o dis-
ções que elaboramos do aluno e quais são des- curso pedagógico baseado no conhecimento
considerados? Isto é, do que é composta a científico fez com que realmente se mascaras-
imagem que temos da infância o u dos adoles- \ se a influência das condições sociais no de-
centes escolarizados? Como foram sendo , senvolvimento dos menores e no tipo de res-
configuradas toda essa ordem cultural e so- * •- posta que dão às exigências escolares. A ten-
cial e essas representações em torno do aluno, dência será atribuir as diferenças entre indiví-
com que lembranças e com que esquecimen- duos a características pessoais, tirando a res-
tos? A evolução da infância como u m a cate- ponsabilidade do ambiente educacional.
goria social foi delineada, primeiro, com o re- A pesquisa educacional, nas últimas déca-
conhecimento, a definição, o desenvolvimen- das, optou por tomar como objeto preferido o
to e a avaliação da criança e, subsequente- professor, dando atualidade a u m discurso
mente, de acordo com as intervenções dos que também d i v i d i u e parcelou o objeto de
adultos para facilitar seu desenvolvimento estudo. Curiosamente, em nosso contexto, o
(Austin, Dwyer e Freebody, 2003). sujeito professor está m u i t o mais presente no
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sores, etc, do que na qualidade da aprendiza-
discurso dos especialistas do que o aluno. gem. Pergunta-se pouco pelas mudanças que
Chama nossa atenção a ausência de simpó- deveriam ocorrer a partir das condições dos
sios, de congressos, de publicações o u de con- sujeitos receptores. Quando se d i z que uma
ferências sobre este; isto é, sua falta de noto- inovação fracassa o u tem êxito, poucas vezes
riedade. Essa desproporção o u esse esqueci- se apela para o que representa u m a o u outra
mento se inverte quando o objeto de estudo é para o aluno, no que melhora sua qualidade
a criança em relação aos adultos. A criança es- de vida./O fracasso dos estudantes diante do
tá muito mais presente do que seu homólogo, que se exige deles e de como se exige equiva-
o mais velho. O que querem dizer essas des- le à deterioração do sistema, isso sem se deter
proporções? Entre outras coisas, que discuti- na análise do que essas exigências significam
mos menos a categoria de ser aluno, que não para eles, que é em quem realmente t r i u n f a m
vemos em sua definição nada o u quase nada o u fracassam as reformas.
de controvertido, que a consideramos natural Consideramos que o receptor, beneficiário
tal como a percebemos, que não somos tão da educação, deixou de ser atualmente o pó- ^
sensíveis ao que ocorre com as crianças. Acre- lo de atração do pensamento educacional,
Q ditamos que o m o d o de ser aluno é a maneira tendo ficado diluído entre uma série de supo-
natural de ser criança; representamos os dois sições implícitas que, em muitos casos, per-
conceitos como se fossem, de alguma forma, deram a força de seus significados originais, e
equivalentes. E m compensação, não identifi- nos tratamentos pretensamente científicos
camos qualquer adulto como se fosse u m das disciplinas psicopedagógicas. O discurso
professor, porque sabemos que nem todos os dominante em educação nas últimas décadas
adultos o são. Polemizamos bastante sobre esteve m u i t o mais centrado na instituição es-
como entender as funções dos professores, colar, em sua eficácia, no currículo, no êxito
sobre os efeitos de seu desempenho; analisa- ou fracasso escolar, na acomodação da educa-
mos os paradigmas científicos dentro dos ção ào sistema p r o d u t i v o o u nas reformas
quais alcançar melhor uma adequada com- educacionais. O fracasso escolar preocupa,
preensão de seu ser e de seu ofício, mas não mas "os fracassados" n e m tanto. Natural-
temos a mesma sensibilidade em relação mente que no discurso estão m u i t o mais pre-
àqueles que recebem sua influência. Falamos sentes os professores do que os "clientes" que
muito sobre o ensino nas situações escolares dão sentido ao seu ofício. Estão fora dessa
ou sobre o currículo, nos mostramos mais tendência geral as preocupações sobre o gê-
, preocupados em como planejar e transmitir nero o u sobre a cultura étnica como motivos
y ú o que em como os alunos recebem esse ensi- de desigualdades entre os alunos. Geralmen-
no. As reformas educacionais costumam se te, qualquer problema o u tema de discussão
deter m u i t o mais na busca da melhoria da em educação tem seus receptores como u m
qualidade do ensino, na atualização dos con- referente implícito; em poucas ocasiões o su- ^
teúdos, na mudança das estruturas organiza- jeito escolarizado aparece no centro das con-
cionais e da gestão, dos interesses dos profes-
' Como abordagem empírica e como fato curioso, consultamos a base de dados do ISBN (registro de livros publica-
dos na Espanha desde 1972) para ver o número de vezes em que as publicações registradas nela contêm em seu tí-
tulo u m a série de termos-chave. N o m o m e n t o e m que escrevemos, f o i possível obter os seguintes resultados:
trovérsias. Aqueles que têm mais presença no Sendo o aluno destinatário da educação,
sistema escolar podem ficar dessa forma d i - parece que sua presença ficou m u i t o obscure-
luídos no discurso, ausentes em nossas cons- cida no atual discurso dominante sobre o en-
ciências e relegados a u m segundo plano em sino e a educação em geral. Nós acreditamos
nossas preocupações. Tudo é para o aluno, que a corrente sensibilizadora para as neces-
claro. Mas, apesar de sabermos que a política sidades do aluno, para seu m u n d o , difundida
educacional, as instituições, o currículo, as re- ao longo de todo o século XX, não está exata-
formas, os professores, etc, são para os sujei- mente em seu momento mais culminante, em
tos-alunos, o ponto de vista a partir do qual que a educação passou a ter u m papel rele-
os problemas são propostos mostra outras vante na produtividade económica e é m o t i -
prioridades, tanto no discurso como nas prá- vo de esperança de inserção na vida ativa, já
ticas. Falar de neoliberalismo, de compreen- que não é somente de mobilidade social. O
são ou de qualidade do sistema educacional é destinatário fundamental da educação não é
fazê-lo a partir de orientações, de preocupa- moda na agenda dos debates. As prioridades
ções ou de propostas que afetam os estudan- estabelecidas pela ordem ideológica e econó-
tes, mas é frequente não encontrá-los nessas mica dominantes nas últimas décadas obscu-
discussões.^ receram, quando não apagaram, os sujeitos.*'
A pedagogia contestadora e crítica quis , Também não é alheia a essa tendência a reti-
salvar o aluno do sistema educacional, da rada o u a queda da pressão reivindicatória do
autoridade familiar, da repressão e da m a n i - m o v i m e n t o estudantil, tão ausente nas últi-
pulação de sua consciência; a ciência o cien- mas décadas, a favor de u m a educação mais
tifizou, reduzindo-o a dimensões geralmen- de acordo com suas necessidades; u m a pres-
te discretas, justapostas umas em relação a são que os adultos ajudaram a desmontar, b u -
outras. A pedagogia o entendeu como maté- rocratizando a participação dos alunos nos
ria moldável. Nosso olhar, apesar de o sécu- órgãos de participação nas escolas.
lo XX ter sido qualificado como o "século da A essas alturas, não é nada original o que
criança", continua sendo mais magistrocên- podemos dizer do aluno, mas consideramos
trico (visto a partir dos professores), logo- que u m discurso que o enfoque e o situe no
cêntrico (dependente dos conteúdos míni- centro da cena pode ajudar a combinarmos as
mos) o u sociocêntrico (olhando as necessi- peças e observarmos, em u m quebra-cabeça
dades sociais) do que alunocêntrico (centra- mais significativo, como é o arquétipo que o
do no aluno). Esse desequilíbrio é a manifes- representa o u , melhor dizendo, como nós o
tação de uma longa história de desigualdade
de poder refletido na desigual presença dos
D e v i d o aos debates e m t o r n o da d e n o m i n a d a Lei de
discursos sobre professores e alunos. A l -
Qualidade, que f o i apresentada como corretora das
guém disse que quanto menor o status edu- disfuncionalidades da LOGSE, p u d e m o s c o m p r o v a r
cacional de u m a pessoa maior a probabilida- como os argumentos manejados e publicados se refe-
de de ela se tornar objeto de pesquisa. O pe- r i a m basicamente ao fracasso dos alunos, nunca ao
so corporativo dos professores é, simples- papel dos professores e de outros condicionantes. Os
alunos - certo setor dos mesmos - f o r a m apresenta-
mente, maior.
dos como culpados. Eles eram " i n a d e q u a d o s " para o
sistema, não este para eles. O determinismo sociológi-
co (a defesa de que o meio social é intocável e p o r isso
^ N o momento em que escrevemos este texto se coloca não conta), a crença na inexorável continuidade do ní-
em dúvida a eficácia d o modelo da compreensibilida- vel de r e n d i m e n t o académico (não há lugar para a
de para o ensino médio. Os argumentos que surgem compensação), o inatismo psicológico que subjaz aos
se referem a dificuldades dos professores para contro- argumentos que dão p o r fixadas as capacidades de
lar estudantes que não toleram esse sistema, que não cada u m às quais se lhes outorga u m destino e os ar-
são controláveis o u que estão desmotivados. Raras gumentos sobre o esforço como variável essencial para
vezes se diz que os professores o u as instituições inca- melhorar a educação exigem trazer para o p l a n o do
pazes de entender as necessidades desses alunos t a m - consciente as ideias e proposições essenciais que
bém são incontroláveis. mantemos sobre q u e m e como são os alunos.
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representamos. Nas salas de aula repletas, en- diana até as que nos proporcionam as disci-
contramos seres reais com u m status em pro- plinas científicas sobre as crianças e os jo-
cesso de mudança, que estão enraizados em vens), analisando os modelos que, como re-
contextos concretos, que têm suas próprias presentações ideais, existem na sociedade e
aspirações e que, em muitos casos, não se que cada u m de nós tem sobre o que acredita-
acomodam à ideia que os adultos haviam fei- mos que são e desejamos que sejam os sujei-
to deles. tos nessas etapas da vida. Discursos que, por
Por isso é preciso, a partir da perspectiva sua vez, se relacionam com outros mais glo-
mais complexa de que dispomos agora, reu- bais sobre a condição humana e seu destino,
nir os elementos dispersos que nos propor- sobre sua natureza política e social, sobre os
cionem uma imagem u m pouco mais unifica- direitos universais, o estado de bem-estar, etc/^
da e coerente do sujeito da educação. O m u n - O m u n d o da infância se constrói, necessaria-
do m u d o u , os alunos também. Teremos de al- mente, em contraposição ao do adulto. A m -
terar nossas representações do m u n d o e dos bos estão constituídos por práticas nas quais
alunos. participam, discursos que procuram com-
Em outra oportunidade, argumentamos preendê-los e modelos utópicos de referência;
(Gimeno, 2001a) que o sujeito da educação f o i elementos que se entrelaçam gerando inter-
uma referência fundamental no pensamento dependências entre eles, tal como se pretende
moderno e nas políticas de progresso, assim refletir na Figura 1.2.
como na maneira de conceber o ensino e a es- A d u l t o s e jovens têm algumas determina-
colarização. Agora cabe a nós lembrar como das condições de vida interdependentes. Os
se constrói nas relações com os adultos. menores reais (b) são definidos pelas circuns- /
tãncias concretas do m o d o de v i d a que le-j
v a m . Não existem infâncias prototípicas u n i - i
COMO SÍNTESE PRÉVIA: UM ESQUEMA formes o u ideais, mas modos de viver essa;
PARA A PESQUISA DAS etapa da vida. A infância e os menores reais
DETERMINAÇÕES DO SUJEITO INFANTIL v i v e m em circunstâncias familiares - seu
meio social por antonomásia - peculiares (hl)>p
Para responder as perguntas sobre o que é ser que os condicionam como seres vindos ao
menor^ou aluno, é necessária uma tripla atitu- m u n d o em espaços sociais singulares nos
de inquisitiva que se interesse, por u m lado, quais serão cuidados e estimulados, segundo
{• pelas condições em que v i v e m os sujeitos, as possibilidades próprias do meio ao qual
rastreando as origens dos modos de tratar os pertencem (b2), pois também não existe uma
menores (isto é, descobrir a origem das práti- família-modelo n e m u m a única forma de v i -
cas de se relacionar com eles na vida cotidiana da familiar. Os adultos têm sistemas de vida
e nas instituições que frequentaram e conti- (b3) nos quais cabem o u não os menores. Nas
nuam freqiientando). Por outro lado, é preci- sociedades com u m certo nível de complexi-
so considerar que essas práticas sociais e edu- dade, essas formas de viver requerem a sepa- 'V.
cacionais estão ligadas a outras mais globais, ração dos menores em outros espaços e m o -
relacionadas com o funcionamento da socie- dos de vida (b4), como é o caso da escolariza-
dade em geral: o governo dos indivíduos, as ção. Dessa forma, o menor filho se separa do
formas de produção e a evolução do trabalho, menor aluno. A relação entre a situação socio-
a distribuição da riqueza, as tecnologias de familiar ( b l ) e a escolar (b4) estabelece uma l i - ^
comunicação dominantes, as práticas do d i - gação essencial para definir e compreender o ^
reito, a evolução da família, o papel da escola- menor nas sociedades com a escolaridade
ridade em cada momento histórico e nas cir- universalizada. Enquanto as condições do su- c/"
cunstâncias sociais, etc. Finalmente, é preciso jeito menor dependem das dos adultos mais ^
uma análise do discurso (desde as crenças do imediatos que são os familiares (b2), o jogo
senso comum quç governam nossa vida coti- entre a vida dos adultos em família e o espa- ^
18 O ALUNO COMO INVENÇÃO
0
dessas condições humano
a) Visões
b) Infâncias da infância (cientificas
reais e não-científ icas)
essa realidade adquire para nós na hora de dade que encerram e como condicionam nos-
pensar e de agir nela ou em relação a ela. As- sa percepção e nossas atitudes sobre a realida-
sim, em educação utilizamos tópicos como de que as pessoas representam e para as quais
aprendizagem, ensino, disciplina, inteligência, in- essas categorias são aplicadas./Não notamos
teresse ou motivação, fracasso, qualidade do ensi- como as utilizamos para entender o que consi-
no, nível escolar, classe social, cidadania, cultura, deramos n o r m a l o u anormal, aceitável o u re-
meio ambiente, docente, educação pública, currícu- cusável, digno o u indigno, valioso o u insigni-
lo, criança, jovem, construtivismo, etc, como ter- ficante nelas. O significado intelectual e mo-
mos que aglutinam em torno de cada u m de- ral, que damos como certo e convencionado a
les significados delimitados. Algumas dessas todas essas categorias, situa diante de nós as
categorias da linguagem prolongam antigas pessoas e nos inclina a vê-las, a valorizá-las e
histórias que foram moldadas por longas tra- a nos comportarmos em relação a elas com
dições de pensamento e de prática. E m alguns uma determinada predisposição.
casos, permaneceram estáveis; em outros, seu A categoria aluno é u m a forma social por
significado experimentou mudanças e muta- antonomásia de ser menor o u de v i v e r a in-
ções notáveis. Algumas categorias são utiliza- fância e a adolescência. Não é de todo univer-
das especificamente no campo particular da sal, mas é dominante para todos os indiví-
educação, outras são tiradas de áreas diferen- duos que, por sua idade, reconhecemos co-
tes da educacional. Algumas são descritivas m o menores. A escolaridade cria toda uma
(indicam como vemos a realiáade-aprendiza- cultura em torno de como vemos e nos com-
gem, por exemplo), outras têm mais u m cará- portamos com os menores (as maneiras de
ter valorativo {qualidade, fracasso, etc). A l g u - vê-los, de pensá-los e de amá-los). Ser aluno
mas despertam significados unívocos naque- supõe acumular a d u p l a carga semântica de
les que as utilizam, outras são mais equívocas ser menor mais a de ser escolarizado, exis-
e imprecisas. O uso dessas categorias e sua t i n d o variações culturais tanto nas formas
particular articulação f o r m a m o discurso por de conceber os menores como nas formas de
meio do qual compreendemos e valorizamos ser aluno.
a realidade. Toda essa bagagem de conceitos A carga de significação que tem o conceito
que dá sentido à realidade constitui, como aluno é o resultado da acumulação de manei-
afirma Popkewitz (1998), as fronteiras para as ras de entender os menores estando escolari-
formas de ver, de desejar, de falar, de pensar, zados. Dado que todos temos experiência
de sentir e de agir. Os discursos pedagógicos pessoal no desempenho dessa função duran-
que elaboramos com a rede de significados de te a l g u m tempo de nossas vidas nas socieda-
todos esses conceitos configuram o espaço em des escolarizadas, estaremos propensos a dar
que consideramos e pretendemos que trans- ao conceito de aluno o mesmo significado que
corram as ações dos agentes educacionais e do teve para nós o fato de termos desempenha-
comportamento das instituições. do esse papel. Ninguém nos ensina, nos nar-
Conceitos como aluno'' o u estudante se refe- ra o u nos teoriza o que é ser um aluno. Não e
rem a realidades tão imediatas em nossa expe- preciso. Sabemos de antemão graças às v i -
riência cotidiana e tão determinantes de nossa vências que tivemos como tais.
visão do presente que os manejamos sem que Como é a cultura específica - no grau que
nossa atenção os focalize de forma particulari- for - que fomos elaborando e aprendendo so-
zada. Não costumamos reparar na complexi- bre os "menores" e os "escolares" que nos le-
(?)
; va a percebê-los, a senti-los, a tratá-los e a nos
relacionarmos com eles de forma singular?
^ Sabemos que o termo, em sua f o r m a masculina, não Como aprendemos a nos comportar, sentir e
pode ocultar que hoje as mulheres têrh essa mesma
amar os menores? Que sentidos carrega e tem
condição e que sua presença representa u m m o t i v o de
diversificação do significado e do valor que o concei-
hoje a categoria aluno, que tipo de identidade
to representa. define para aqueles que têm essa condição e
-- - - -- ^— >.
GIMENO SACRISTÁN 21
CDU 37.011.32