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Turma de Composição da Professora Doutora Claudia Caldeira Simões

2020.2 – IVL / UNIRIO

❖ Revisão da escrita para violino da composição “La Califórnia” de Andrey Cruz,


por Matheus Souza, no ano de 2021.

Primeiramente é necessário parabenizar o Andrey pelo trabalho e a Profa. Dra. Claudia


Caldeira pela orientação. Será, de maneira enumerada, indicado não somente os lugares
onde se apresentam escritas que violinistas terão problemas em entender mas também vou
indicar a maneira comum e mais correta de escrevê-los. O que não houver comentários,
está correto.

• Composição “La Califórnia”

▪ Primeiro movimento “Dança das Cores”:

No quarto tempo do compasso 4 são apresentados dois harmônicos sobre a


nota lá em duas oitavas diferentes. Os harmônicos solicitados, pelo caráter da peça,
devem tocados como harmônicos naturais e a escrita apresentada neste compasso de
certo modo está correta porque as resultantes sonoras estão indicadas na pauta
musical e sobre elas foi colocado um sinal indicativo de harmônico.
Apesar de a escrita estar correta, não é sempre que em harmônicos naturais se
utiliza esse sinal, ou até mesmo a indicação de harmônico com o dedilhado. Em alguns
casos, a maneira como foi escrito facilita a leitura e a tocabilidade do instrumentista
de cordas friccionadas e a noção de que tipo de sonoridade se deseja extrair dos
harmônicos. Em outros casos, como o caso do lá mais agudo, essa escrita demandará
do músico não só alguma investigação mas que faça anotações na partitura sobre
coisas que o compositor poderia ter indicado de outra maneira, evitando uma poluição
visual desnecessária.
Uma maneira mais cristalina de notar o harmônico mais agudo é utilizando
uma cabeça de nota que é um losango vazado (que também é chamada de diamond
notehead) sobre a nota real que o violinista, ao posicionar o dedo sobre a corda sem
pressioná-la contra o espelho, produzirá a nota e o timbre para ela desejados pelo
compositor.
Há dois tipos de harmônicos (naturais e artificiais) e há diversos timbres que
se pode extrair deles, é interessante o diálogo com instrumentistas e a investigação
sobre que tipo de sonoridade o compositor deseja obter para não haver dubiedade
sobre o resultado sonoro a ser obtido. Por exemplo: harmônicos artificiais e alguns
lugares onde podem ser realizados produzem um som brilhante, penetrante e que tem
muita ressonância. É um longo e delicado assunto.
No compasso 10, o compositor indica o símbolo de harmônico de uma maneira
que é similar visualmente à anterior mas que tecnicamente é diferente. Nesse caso
todos os harmônicos são artificiais e demandam uma escrita com indicação mais
direta da técnica solicitada (será demonstrada a seguir). Há também o fato de
apresentar uma extensão maior que o violino poderia realizar pedindo um fá# 2
quando o instrumento tem como nota mais grave a nota sol 2. É compreensível a
vontade do compositor com esse equívoco por conta da ideia de o harmônico soar
duas oitavas acima mas é impossível realizá-lo com a afinação tradicional. A
possibilidade de scordatura existe mas ela seria incompatível com as ideias e as
técnicas gerais desse movimento. Por que se alteraria a afinação do violino só para
tocar essa nota e somente nesse trecho do movimento? É desnecessário.
Uma sugestão, e ao meu ver é a melhor, é a de escrever a resultante sonora
que deseja obter (o trecho em duas oitavas acima) com uma indicação de “flautado”,
“dolce” e, talvez, “senza vibrato” sobre o trecho musical e nos objetos sonoros a
seguir indicar “normal” ou “normale” ou “ordinário”. Essas indicações permitirão o
violinista entender que se quer um som cristalino e artificial típico dessa técnica de
harmônicos. Outra sugestão é a de passar esse gesto musical para o violoncelo, na
mesma oitava e escrito da maneira correta (que será exposta abaixo), e a linha do
violoncelo mudar para o violino, na oitava correspondente ao instrumento com
possíveis mudanças de dinâmica para se ouvir melhor o violoncelo, que apesar de
estar numa boa região, tocará harmônicos que resultam, a depender do que está
escrito, em uma diminuição do volume sonoro.
No compasso 33, a escala descendente em tercinas é bastante rápida e chegou-
se à conclusão de que a melhor maneira de realizá-la, depois de algumas tentativas, é
escrevendo uma ligadura da nota si bemol 3 ao lá bemol 2. Retornando aos
harmônicos, o compasso seguinte também apresenta questões na escrita que permitem
muitas dúvidas e além disso, sugere um harmônico artificial (pautado no que vem
antes e na colocação do sinal de harmônico) que será tocado com o dedilhado pelo
dedo 1 com a sobreposição superficial do dedo 4 uma quarta justa acima, na primeira
posição na corda ré. A melhor maneira é indicando um harmônico natural de quinta
justa realizado sobre a corda lá na primeira posição, cujo dedilhado seria 0 e um 4
sobre ele (como é possível observar na obra abaixo de Wieniawski), e também na
primeira nota mi bequadro da segunda obra de Matheus Souza, podendo ser escrito
(ou não, como no caso da obra do revisor) uma nota lá abaixo da nota mi, de maneira
similar ao exemplo do sistema de escalas de Carl Flesch.

✓ Harmônico sendo indicado pelo dedilhado:

(Quarteto de cordas – Matheus Souza)


✓ Harmônico indicado pela cabeça de diamante (ou losango vazado) sem
indicação da corda solta:

(Recitatív - Matheus Souza)

✓ Harmônicos naturais (vermelho / indicação de 0 e mais um número


para o dedilhado) e artificiais (azul sempre com a indicação de 1 e 4
no dedilhado, quando se quer a oitava harmônica):

(Sistema de Escalas de Carl Flesch)

▪ Segundo movimento “Sentido Tardio”

No compasso 6 acontece um glissando em cordas duplas que funciona mas não


permite um glissando muito longo: a nota dó sustenido, por conta da fôrma da mão para
realizar as duplas, permitiria um glissando até si natural e o ré sustenido até a corda ré
solta (ré natural). Isso porque só é possível realizar esse gesto na primeira posição do
instrumento. Caso o compositor queira o resultado de um glissando curto, a maneira como
está escrito o gesto musical está correta. Caso contrário, é possível suprimir o dó sustenido
do violino e passá-lo para o violoncelo realizar as duplas. A mesma situação não acontece
no compasso 42 porque o mib não precisa ser realizado na primeira posição com dedo 1
na corda ré e tampouco o dó na corda lá com dedo 2, mas podem ser realizados na quarta
posição na corda sol o mi com o dedo 2 e o dó com dedo 3, permitindo um glissando que
percorra uma distância maior até a primeira posição onde se pode realizar o jeté com o
dedilhado indicado anteriormente pelo revisor.

▪ Terceiro movimento “À Vallauris”:

Sobre o jeté, é interessante que se repita o sentido do arco em cada nota a ser
realizada com o arco jeté, isto é, jogado. É possível mudar o sentido do arco na nota
seguinte, como será apresentado no trecho do concertino para violino e orquestra de César
Guerra-Peixe.
Sobre os glissandi é interessante também que se repita a linha de glissando na nota
inferior, coisa que pode ser realizada com mais facilidade em softwares livres de edição
ao mudar a nota inferior para segunda voz.

✓ Possibilidades de sentido do arco com o Jeté:

(Concertino para violino e orquestra de câmara, de César Guerra-Peixe)

Mais uma vez é preciso parabenizar o compositor pela composição e a professora doutora
Claudia Caldeira Simões pela orientação. A peça é de bom gosto e o último movimento
é muito agradável e animador.

Matheus Souza
Compositor e violinista
Bacharelado em música – Instituto Villa-Lobos / UNIRIO

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