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QUINTO CAPÍTULO

Temporalidade e historicidade

§ 74. A constituição-fundamental da

historicidade

Desiderato
A tarefa do presente parágrafo se perfaz na medida em que a pergunta
pela essência da historicidade [não como historiografia] como
ecoconsciência de um ente que se-faz histórico como ser-resoluto
antecipador constitui uma reapropriação de suas possibilidades sidas,
isto é seu passado existencial. O que Heidegger proporá é: uma
interpretação temporal do Dasein resoluto que diante da apropriação do
seu ser finito replica como retomada o que lhe foi herdado pela tradição.
Nesse sentido, o Dasein resoluto (Entschlossenheit) se apropria de sua
tradição, enquanto dejectado, e escolhe a escolha que já lhe foi escolhida
abrindo-se como possibilidades, como ser-histórico (acontecência
apropriativa).

PREÂMBULO

"(...) é preciso buscar no âmbito da temporalidade um acontecer que


determine a existência como histórica." Martin Heidegger
"A meta imediata é encontrar o lugar de onde fazer a pergunta
originária [acontecência da história] pela essência da história (...) Esse
lugar deve ser designado pelo que é originariamente histórico." (Ser e
Tempo, p. 1023) Grifo meu.

"Factualmente, o Dasein tem cada vez sua "história" e pode tê-la porque o
ser desse ente é constituído pela historicidade.

O Dasein enquanto cuidado (Sorge), temporaliza-se (Zeitlichkeit):


● Como já histórico [Já-sido constituído]
● Como historicidade esquecida [Sendo-em-junto-a]
● Como antecipação em sua historicidade [Vindo-a-si]

No entanto: "(...) é preciso buscar no âmbito da temporalidade um


acontecer que determine a existência como histórica." (Ser e Tempo, p.
1035)

Como o precursor ser-resoluto (Entschlossenheit) gesta-se propriamente


como esse ente histórico?

REMEMOREMOS O SER-RESOLUTO
O Dasein só "(...) conquista sua propriedade como precursor ser
-resoluto." (idem, p. 1037)

Como Ser-resoluto (Entschlossenheit) o Dasein:


● Se compreende como possibilidades finitas,
● Se põe diante da possibilidade insuperável,
● Se compreende em silenciosidade pronto para angústia,
● Se compreende em seu destinamento, reconquistando-se,
● Se conscientiza da sua dejecção,
● Se assume em sua entrega ao fato de não ser causa,
● Se assume em seu caráter historial

"A totalidade e a propriedade do ser-resoluto somente são garantidas


pelo precursor projetar-se sobre a possibilidade inultrapassável da
existência: a morte." (ibidem, p. 1037)

Como um ente finito incapaz de transcender a sua morte pode ser capaz
de se-fazer histórico? A resposta está na pergunta.

"O resoluto retorno à dejecção traz consigo uma entrega de


possibilidades sobrevindas por tradição, embora não necessariamente
como sobrevindas." (ibidem, p. 1039)

A ESCOLHA DE UMA ÚNICA POSSIBILIDADE JÁ ESCOLHIDA


"Somente o adiantar-se para a morte elimina toda possibilidade fortuita
e "provisória". Somente o ser-livre para a morte dá ao Dasein pura e
simplesmente seu alvo e empurra a existência em sua finitude. A
finitude apreendida [assumida propriamente] tira a existência da
interminável multiplicidade de possibilidades de bem-estar,
facilidade, irresponsabilidade que se oferecem de imediato e conduz o
Dasein à singeleza do seu destino (Schicksals). Designamos, assim, o
originário gestar-se do Dasein que reside no ser-resoluto próprio (...)
livre para a morte, se entrega a si mesmo [não como causa] por
tradição, numa possibilidade herdada e, no entanto, escolhida."
(ibidem, p. 1039)

O DESTINO COLOCA EM JOGO TODOS OS DESTINOS


"Mas, se o Dasein em seu destino existe essencialmente como ser-no-
mundo no ser-com com outros, seu gestar-se é um cogestar-se e é
determinado como destino comum. Designamos, assim, o gestar-se da
comunidade, do povo." (ibidem, p. 1041)

"Somente na comunicação e na luta a força do destino comum torna-se


livre pela primeira vez. O destino comum carregado de destino do
Dasein na sua "geração" e com a sua "geração" é o que constitui o pleno
e próprio gestar-se do Dasein." (ibidem, p. 1041)

"Somente se, no ser de um ente, morte, culpa, consciência, liberdade e


finitude coabitam, de uma forma igualmente originária, como ocorre na
preocupação, é que esse ente pode existir no modus do destino, isto é, ser
histórico no fundamento de sua existência." (ibidem, p. 1043)

TEMPORALIDADE E HISTORICIDADE
O Dasein "se-faz", acontecência historial apropriadora.

"Somente um ente essencialmente adveniente (Zukünftig) em seu ser (...),


sendo livre para sua morte e nela se despedaçando, pode deixar-se delatar em seu
"aí" factual, isto é, só o ente que, como adveniente, é-sido (Gewesend),
pode, ao se entregar a si mesmo a possibilidade herdada, assumir a
própria dejecção e ser instantâneo (Augenblickche) para "seu tempo". Só
a temporalidade própria, que é ao mesmo tempo finita, torna possível
algo assim como destino, isto é, uma historicidade própria. (ibidem, p.
1043)

Nesse sentido "O ser-resoluto que retorna a si [por-vindouramente] e a


si se entrega torna-se [se-faz], então, repetição (Wiederholung) [de uma
[possibilidade-existencial-própria] (...) tradicionalmente herdada
[assumir possibilidades sidas]." (ibidem, p. 1043) Grifos meus.

"A repetição é a tradição expressa, isto é, o retorno às possibilidades do


Dasein sido-"aí". A repetição própria de uma possibilidade-da-existência
que é algo sido — o Dasein escolhe seus heróis — se funda
existenciáriamente no precursor ser-resoluto, pois nele se escolhe pela
primeira vez o que torna livre para o combate subsequente (combate
com a história da ontologia) e para a fidelidade ao repetível (retomada
da questão)". (ibidem, p. 1043)

A MOBILIDADE DO PENSAMENTO GREGO


"A repetição do possível não é uma restauração do "passado"
(Vergangenen), nem uma vinculação retroativa do "presente" (Gegenwart)
com "o que foi superado" (über-holte). A repetição, que surge de um
projetar-se resolutivo, não é persuadida por algo "que passou" [Fatos da
história] fazendo-o voltar como o efetivamente real de outrora. Ao
contrário, a repetição é uma réplica à possibilidade na resolução e ao
mesmo tempo, como algo instantâneo (Augenblickche), um repúdio que
atua ainda hoje como "passado". A repetição não se abandona ao
passado, nem almeja um progresso. Coisas ambas que são indiferentes
para a existência própria no instante [acontecimento apropriador]."
(ibidem, p. 1043)

A retomada visa [salto


salto de olhar
olhar] a brecha entre
ambas.

Die Wiederholung erwidert vielmehr die Möglichkeit der dagewesenen.


Pelo contrário, a repetição retribui a possibilidade do que estava lá.

A réplica diz propriamente a repetição da pergunta sobre o sentido de ser


em geral. Questão que se manteve esquecida em sua diferença
ontológica, e que retomada desde as fontes primárias [primeiros
pensadores - nossos heróis] pode agora ser abrir a região do pensamento
que abriga possibilidades sidas propondo um retorno ao âmago da
questão ontológica, questão própria da filosofia ocidental. Kadu Santos.

O Dasein está destinado, enquanto ser-destrancado para tomar posse do


seu passado existencial, passado herdado e entregue a esse ente por si
mesmo, e enquanto tal, esse ente deve retomá-lo, repetindo-o naquilo
que se lhe vela. Kadu Santos.

"(...) o peso essencial da história não reside no passado, nem no hoje em


sua "conexão" com o passado, mas no gestar-se próprio da existência que
surge do futuro do Dasein. A história, como modo-de-ser do Dasein, tem
sua raíz tão essencialmente no futuro que a morte, como essa
possibilidade do Dasein antes caracterizada, rejeita a existência
precursora em sua dejecção factual e, somente assim, empresta ao ser-
do-sido sua peculiar precedência no histórico." (ibidem, p. 1045)

O Dasein n
não
o " "1 hist
"é" histórico,
rico, ele se-faz hist
histórico
rico
porque em seu ser ele se-faz temporalizando-se.
Kadu Santos

"O ser-para-morte próprio, isto é, a finitude da temporalidade, é o fundamento


oculto da historicidade do Dasein. Este não se torna histórico pela repetição,
mas, por ser temporal, é histórico, podendo assumir-se em sua história
se repetindo [sendo em cada caso propriamente]." (ibidem, p. 1045)

POR FIM…
"Se a historicidade pertence ao ser do Dasein, então o existir impróprio
deve ser também histórico. E, se a historicidade imprópria do Dasein
determinasse a direção da pergunta pelo "encadeamento-da-vida"
impedisse o acesso à historicidade própria e ao seu peculiar
"encadeamento? De qualquer modo, se a exposição do problema
ontológico da história deve ser suficientemente completa, então de modo
algum se pode prescindir da consideração da historicidade imprópria do
Dasein." (ibidem, p. 1045)

O modo impróprio de ser da história perfaz o esquecimento próprio da


história da ontologia.

Kadu Santos

1 Nesse sentido o "é" deve ser pensado como subsistência na história.

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