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Somos convidados a não apenas conhecer, mas, principalmente, a

acolher e assumir a proposta da CFE 2021, como um sinal de que, na


presença e na força do Espírito, diante de realidades complexas e
desafiadoras, sobretudo nesse tempo de pandemia(s), desejamos buscar
rumos novos e criativos para a vida de nossas comunidades de fé e de
nosso mundo tão ferido!
Só o Tema da CFE 2021: “Fraternidade e Diálogo” e o Lema: “Cristo é a
nossa Paz: do que era dividido, fez-se uma unidade” (Ef 2, 14a), unidos
ao Cartaz que expressa a comunhão dos diversos dons e carismas que se
movimentam por meio de uma ciranda onde não há primeiro nem último,
onde todos se unem e, entre sinfonias variadas, buscam o mesmo
compasso, a mesma sintonia, formando comunhão em movimento, já
nos inspiram, nos enchem de entusiasmo, compromisso e esperança!
Trazemos a certeza de que essa CFE é um presente de Deus para nós! É
claro que houve muitos esforços, muitos entendimentos de nossa parte
para que, por mais uma vez, realizássemos uma CF Ecumênica. Mas temos
a certeza de que, como no relato de Emaús, a iniciativa partiu de Jesus
para entrar no caminho dos discípulos, essa CFE é uma iniciativa também
Dele. Jesus mesmo toma a iniciativa e entra no nosso caminho para abrir
os nossos olhos, para nos ensinar o diálogo como compromisso de amor e
nos animar na missão!
A escolha da passagem bíblica dos discípulos de Emaús (Lc 24, 13-35)
como pano de fundo de toda construção e dinâmica do Texto Base da CFE
é muito significativa! Oferece-nos um novo impulso à caminhada
ecumênica em nossas comunidades. Cremos vivamente que o
ecumenismo é uma contribuição para a unidade de toda família humana!
O “processo” de Emaús, escolhido para a construção do Texto Base: 1.
rumo errado: projeto de vida desviado 2. voltar-se a Jesus Cristo: ouvir
sua Palavra, escutar, dialogar, partilhar 3. envolver-se na missão, com
palavras e ações concretas - visa abrir os nossos olhos ou ser como um
colírio para nos tirar de qualquer desvio ou desânimo, de qualquer
tentação de fechamento, de amargura, de busca de segurança dentro de
nossos muros, de distanciamentos, do perigo latente do
autocentramento. É um texto que nos traz uma dinâmica que nos
reencanta, libertando-nos da cegueira da frustração, derrota ou cansaço,
e devolvendo-nos de novo à dinâmica do Espírito de Deus que gera
diversidade reconciliada, alegria, amor e liberdade.
Discípulos de Emaús ... no caminho, a experiência do diálogo e da
fraternidade.
Somente o diálogo permite que se vá fundo nas questões da vida, com
suas sombras e luzes. O texto dos discípulos de Emaús é um texto de
referência para a vida cristã. Faz-nos mergulhar na pedagogia do diálogo
que gera esperanças e constrói pontes, sempre no caminho, pois o abrir-
se ao outro tem algo de artesanal! A vida em fraternidade é uma
construção artesanal... algo minucioso, miúdo, sem fim. O método de
Deus é o da proximidade que tem sede de diálogo com os seus, a partir
da realidade ouvida, iluminada e interpretada à luz da sua Palavra e da
partilha da vida e do pão! O método de Deus precisa ser o nosso!
O relato bíblico de Emaús é um ensinamento sobre a prática do diálogo:
remédio para nossos tempos tão marcados por rivalidades, competições e
polarizações. Como se diz na introdução do Texto base, é “um convite à
conversão ao diálogo e ao compromisso de amor”. Conversão que
devemos todos (também nós!) buscá-la e anunciá-la. Papa Francisco na
sua última Carta encíclica Fratelli Tutti afirma que “o diálogo entre
pessoas e diferentes comunidades cristãs e tradições religiosas não se
faz apenas por diplomacia, amabilidade ou tolerância. O objetivo do
diálogo é estabelecer amizade, paz, harmonia, partilhar valores e
experiências morais e espirituais em espírito de verdade e amor” (271),
sempre num serviço, lento, mas perseverante, de testemunhar a
Fraternidade que desconstrói muros e ergue pontes.
O diálogo precisa ser a chave de uma nova cultura – Uma nova cultura
não como um círculo fechado, mas como a imagem do poliedro (EG 236;
FT 145): nem pirâmide, nem esfera, mas multiplicidade facetada que
reverbera de forma diferente e originalmente a mesma luz. Nessa nova
cultura, ninguém é inútil, supérfluo. Cada um é respeitado no seu valor.
Minha visão é completada pela visão do outro. Isso só pode ser possível
numa atitude autêntica de diálogo. O importante é que o diálogo seja
transformado em um estilo de vida! Diálogo como estilo, à exemplo de
Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, Homem do Diálogo, tão vivamente
expresso no relato dos discípulos de Emaús e em tantos outros relatos
bíblicos.
“Redescobrindo Cristo no caminho: a paz do Ressuscitado que nos une”
Chamou-me atenção esse subtítulo encontrado na introdução do Texto
base da CFE.
Redescobrindo... Precisamos redescobrir Jesus Cristo! De fato, a crise que
levou os discípulos de Emaús a abandonarem a Comunidade e a Missão
estava principalmente na imagem de Messias que eles ainda tinham...
Provocados por Jesus, os discípulos começam a falar. E nesta fala revelam
o problema: “nós esperávamos...” O que eles esperavam? No fundo,
esperavam que as coisas de Deus acontecessem assim como estavam na
cabeça deles. A crise estava na imagem de Messias que tinham construído
em suas vidas. Aquela cruz erguida no Calvário era o sinal mais eloquente
de uma derrota que não tinham previsto. A paixão e a morte de cruz de
Jesus revelavam um Messias diferente daquilo que eles poderiam ter
imaginado: O Messias servo – servidor! Esperavam um Messias forte e
vitorioso, restaurador de um reino político independente, só para Israel.
Há ainda hoje o perigo da imagem de um Deus violento, exclusivista... um
Deus feito à nossa vontade. O caminhar com CFE, nos passos dos
discípulos de Emaús, é uma possibilidade e um convite concreto de
redescoberta de Jesus Cristo e de sua vontade. Apesar de se falar e de se
ouvir tanto o nome de Jesus, ele ainda é um ilustre desconhecido para
muita gente! E como ainda se deturpa a sua imagem! Em nome Dele se
prega divisão, distâncias, exclusões, intolerâncias e morte... se
constroem muros.
Redescobrir Cristo no caminho, “buscar a Deus com o coração sincero,
desde que não o ofusquemos com nossos interesses ideológicos ou
instrumentais, ajuda a reconhecer-nos como companheiros de estrada,
verdadeiramente irmãos” (FT 274).

O Texto Base da CFE 2021 segue os passos dos caminhantes de Emaús


com Jesus! No fundo, são 3 “paradas” que compõem o caminho de
Emaús. Uma 4ª parada, acrescida no Texto Base, coroa todo processo – é
o cume; é a celebração da vida – celebração da caminhada!
Primeiro: A conversa: “conversavam sobre todos os acontecimentos...”
relacionados à missão, condenação e à morte de Jesus.
Primeira parada: Trocando impressões sobre os acontecimentos mais
recentes.
É o VER ... o olhar a realidade... Não desprezar a história – isso é uma
tentação, um perigo, hoje: perder a memória! ignorar a história nos
torna vazios, sem conteúdo, desenraizados, fáceis de manipulação. Na
Carta encíclica Fratelli Tutti há alguns números dedicados a esse perigo
que Papa Francisco chama de “o fim da consciência histórica” (Capitulo I).
Portanto, OLHOS e OUVIDOS abertos, atentos à vida real, com tudo -
luzes e sombras; pontes e muros; avanços e retrocessos; vitórias e
lamentos (“nós esperávamos, mas...” “não deu em nada...” “está
difícil...”). É muito importante não esconder nada; ao contrário, não ter
medo de mostrar e enfrentar as feridas para que possam ser curadas,
sanadas.
A primeira atitude de Jesus é de APROXIMAÇÃO; Jesus se incorpora a
nossa viagem; caminha ao lado; ESCUTA a conversa, e num segundo
momento, pergunta.
O valor da ESCUTA: escuta de si, escuta da realidade, escuta do outro. O
diálogo como escuta. Saber ouvir ... partir da escuta atenta, sincera...não
dos nossos julgamentos ou pré-conceitos. O diálogo (escuta e fala: mão
dupla) que impede fechamentos... rancores...desânimos...morte. Diálogo
que abre caminhos, possibilidades, esperança.
Importante é não esquecer que Jesus peregrina conosco. É o Espírito de
Deus que nos guia; Ele é o real protagonista. Deixar que Ele nos mova e
nos conduza. OUVÍ-LO! Responder à escuta com escuta!

Segundo - Jesus agora responde: Ele nos oferece a sua Palavra!


Segunda parada: “Carta para pessoas de boa vontade em um mundo
cheio de barreiras e divisões” (Efésios – Palavra de Deus – texto
inspirador da CFE)
Julgar (iluminar) - é o momento de voltar-se à Palavra; dar espaço à
Palavra de Deus. Deixar ela falar! Não pôr obstáculos ou ruídos que
impeçam ouvi-la bem! Iluminar a realidade com a Palavra de Deus. É ela
que faz arder o coração!
Jesus não nos deixa sozinhos! – Papa Francisco, março 2020, na oração
Urbi et Orbi, Praça São Pedro: Mc 4, 35 (tempestade acalmada): “Demo-
nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados mas
ao mesmo tempo importantes e necessários: todos chamados a remar
juntos, todos carecidos de mútuo encorajamento”. “Por que são tão
medrosos?” Estou aqui! Abraçar o Senhor para abraçar a esperança. A
força da fé alimentada pela Palavra, que arde o coração, liberta do medo
e dá esperança!
O convite é acolhê-lo, reconhecê-lo e anunciá-lo: “Os dois insistiam com
ele...Fica conosco...” – Precisa convidá-lo. Acolhê-lo. Colocá-lo ao centro!
“Muitos muros têm sido derrubados a partir da fé em Jesus Cristo e
pontes de diálogo e aproximação têm sido construídas” (Texto base 142).
Só reconheceremos o verdadeiro Jesus se abrirmos nossas casas e
partilharmos o que somos e temos! Se eles não tivessem convidado o
desconhecido a entrar na casa deles? Nada teria mudado na vida deles!
A força e a graça da acolhida, das portas abertas, das janelas abertas...
pois é daí que se entra o Espírito! Naquele momento em que se
partilhou a casa, a vida, a oração em volta do pão, os olhos se abriram. É
a partilha que abre os olhos! A vida nova, trazida por Jesus Ressuscitado,
vem da partilha da vida! É a prática que abre os olhos.... a leitura, a
interpretação, o falar e ouvir....esquentam... mas é a prática que abre os
olhos de verdade! A Bíblia não abre os olhos. Faz arder o coração. O que
faz enxergar mesmo é a fração do pão, o gesto da hospitalidade, da
gentileza, da oração em comum, da partilha do pão, da solidariedade.

Por fim... A retomada do Caminho


Terceira Parada: “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma
unidade” (Ef 2, 14a)
AGIR : Decisão de voltar à Comunidade, à missão – voltam diferentes (do
medo à coragem; da tristeza à alegria; do fechamento à missão) .
Nós somos os discípulos de Emaús: Jesus anda conosco sem a gente se
dar conta! O texto no final diz que Jesus após abrir os olhos dos
discípulos, na partilha do pão, desapareceu da frente deles. Para onde
foi Jesus? podemos nos perguntar... Foi para dentro dos discípulos. Eles
ressuscitaram! Recuperaram a fé, a bondade, a esperança, o sentido da
vida, a coragem, a alegria, a missão.

Na missão, como discípulos e discípulas do Mestre, precisamos mais e


mais fazer a experiência de caminhar juntos - não só falar ou desejar- mas
verdadeiramente caminhar juntos (com identidades definidas e abertas
ao outro). Se falamos tanto de encontros, unidade e pontes, não somos
ingênuos: há, hoje, também tantos sinais fortes de divisão, há ainda
incompreensões sobre o que é ecumenismo, diálogo inter-religioso;
infelizmente, enxergamos até mesmo retrocessos em nossas Igrejas sobre
essas questões. Nosso caminho é ainda longo... Nossa missão comum, na
fonte do olhar amoroso de Deus que é o mesmo, sem distinção, para cada
pessoa, seja qual for a religião, é o de testemunhar e construir
Fraternidade. É redescobrir a GENTILEZA (tema SOUC 2020) nas relações.
Como pessoas de fé podemos e precisamos oferecer uma preciosa
contribuição para a construção da paz e fraternidade no mundo.

Sem esquecer: CELEBRAR : Fonte e ápice


A CFE é um dos modos de viver a espiritualidade quaresmal (“Eis o tempo
de conversão”...”É agora o momento inteiramente favorável” 2Cor6,2 )–
É oportunidade para realizar o caminho de Emaús, detendo-nos em cada
uma de suas paradas. É um EXERCÍCIO ESPIRITUAL QUARESMAL –
Exercício de conversão! Pessoal, comunitário e social. Exercício à
Fraternidade e ao Diálogo.
A Quarta parada – a força da dimensão espiritual do ecumenismo...
Fonte de tudo é a certeza de que Deus que é Pai – Daí, se desconstrói
verdadeiramente muros ... A Fraternidade tem em Deus seu
fundamento; essa é sua verdade transcendente; seu alicerce que não
pode ser esquecido, descartado, ultrapassável. “Estamos convencidos de
que só com esta consciência de filhos que não são órfãos, podemos viver
em paz entre nós. Com efeito a razão por si só, é capaz de ver a
igualdade entre os homens e estabelecer uma convivência cívica entre
eles, mas não consegue fundar a fraternidade” (272).
Nos sentirmos irmãos uns dos outros: essa é nossa alegria e mais
profunda identidade! Em nome de Deus só podemos construir pontes, a
paz e a fraternidade. Há violência religiosa, desaquecimento de vida
comunitária e missionária, abandono dos pobres, vulneráveis e
marginalizados, quando há deformação da concepção de religião e da
imagem de Deus. As religiões estão a serviço da fraternidade no mundo.
Os verdadeiros ensinamentos das religiões convidam a permanecer
ancorados nos valores do diálogo e missão em conjunto a serviço da
humanidade. Os ensinamentos do texto bíblico dos discípulos de Emaús
convidam justamente a isso!

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