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Márcia Wayna Kambeba

AY KAKYRI TAMA
(EU MORO NA CIDADE)
Poemas
Márcia Wayna Kambeba

AY KAKYRI TAMA
(EU MORO NA CIDADE)
Poemas

Manaus - 2013
Copyright © 2013 Márcia Wayna Kambeba
Essa obra foi editada conforme o acordo ortográfico de 2009.
Permitida a reprodução parcial desde que citada a fonte.

Márcia Wayna Kambeba | Autora


Márcia Wayna Kambeba | Fotos
Eduardo de Castro Lacerda | Capa e Projeto Gráfico
Márcia Wayna Kambeba | Imagens de Capa
Márcia Wayna Kambeba | Revisão
Grafisa Gráfica e Editora | Impressão e Acabamento

(Ficha catalográfica elaborada por Bibliotecária Zina Pinheiro CRB 11/611)

K15 Kambeba, Márcia Wayna

Poemas e crônicas: Ay Kakyri Tama = Eu moro na cidade / Márcia


Wayna Kambeba -- Manaus: Grafisa Gráfica e Editora, 2013.

x,76 p. il.

Título Equivalente : Ay Kakyri Tama = Eu moro na cidade

ISBN

Contatos
Fone: (92) 9220-9007
E-mails: marciacambeba@gmail.com
mvs.omagua@hotmail.com
Agradecimentos

A Tupã que nos deu o dom da vida, que nos sus-


tenta e nos governa, que nos presenteou com o
dom da inteligência e fortalece nossa caminhada.
Aos meus amores: Carlos Augusto, meu filho, e
José Carlos meu esposo, pelo companheirismo na
pesquisa, dedicação, paciência, pela alegria, pelo
incentivo em todos os meus projetos e o mais im-
portante, pelo pureza do seu amor.
A minha mãe-avó Assunta Vieira “in memória”,
dedico, de modo especial, toda minha conquista,
pela criação que me deu. A minha mãe Socorro
Vieira e a todos os meus familiares que comigo tra-
go na lembrança e no coração.
Agradeço o apoio e o incentivo do Museu Ama-
zônico na pessoa da profa. Dra. Maria Helena, a Uni-
versidade Federal do Amazonas na pessoa da profa.
Dra. Amélia Regina que me orientou no mestrado.

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Aos parentes indígenas da Aldeia Tururucari -
Uka por abrirem o baú de suas memórias e me per-
mitirem participar. Agradeço a confiança, o carinho
e a amizade. Aos parentes Omágua/Kambeba que
vivem na cidade pelo seu assumir e pelo compro-
metimento com nossa luta, e a todos os povos indí-
genas dessa Amazônia.
A todos os meus amigos que, de uma forma dire-
ta ou indireta me ajudaram a escrever esse livro de
poemas manifestado no incentivo, encorajamento
e na amizade. De modo particular, aos amigos: Cel-
do Braga (poeta e compositor), Eylan Lins (poeta e
historiador) Miguel de Souza (poeta), Adejana Mei-
reles (cantora e compositora) e ao poeta Leon Levi
pela participação nesse livro com poemas.

A autora

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Dedicatória

Esse livro é dedicado, a todos os povos indígenas


da Amazônia, que mantêm vivo em seu ser a chama
da ancestralidade dos valentes guerreiros. Ao povo
Omágua/Kambeba, por manter sempre a lógica de
serem sim, o povo Omágua, o povo das águas. Aos
Omágua/Kambeba da aldeia Tururuca-Uka e de São
Paulo de Olivença, pelo comprometimento, con-
fiança com a minha pesquisa e amizade que nutri-
mos mesmo a distância.
A autora

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Sumário

Apresentação…………………………………………………13 Os Filhos das Águas do Solimões………………………47


Introdução……………………………………………………17 Tana Kanata Ayetu (Nossa Luz Radiante)……………49
Poemas e Crônicas – Ay Kakyritama…………………21 São Paulo de Olivença – Presença Kambeba………51
Ay Kakyritama (Eu moro na cidade)……………………23 Belém Indígena – Belém Cabocla………………………53
Ser Indígena – Ser Omágua…………………………………25 O Mar de Ajuruteua…………………………………………55
Silêncio Guerreiro……………………………………………27 Natureza em Chama…………………………………………57
Árvore da Vida…………………………………………………29 A Sina do Pescador……………………………………………59
Ritual Indígena…………………………………………………31 Caboclo Ribeirinho……………………………………………61
Aldeia Tururucari-Uka (A Casa de Tururucari)……33 Participações Especiais……………………………………63
União dos povos………………………………………………35 Rosa Petany (Rosa Vermelha)……………………………65
Tana Kumuera Ymimiua (Nossa Língua Ancestral)…37 Kambeba…………………………………………………………67
Território Ancestral……………………………………………39 Nobreza……………………………………………………………69
Minha Memória – Meu Legado…………………………41 Vitória Tão Régia………………………………………………71
Tuxaua Kambeba………………………………………………43 Márcia Kambeba………………………………………………73
Minha Pena Vermelha………………………………………45 Glossário…………………………………………………………75

11
Apresentação

A
presença dos Cambeba na Amazônia é re- forma particular de ver o mundo e aos interesses
sultado da grande migração Tupi rumo a de quem fez os relatos, mas também às diferentes
terra sem males, dois ou três séculos an- respostas que esses índios darem ao mundo colo-
tes da colonização europeia. Os primei- nial. Para Alexandre Rodrigues Ferreira, meado do
ros registros escritos sobre esses índios feitos entre século XVIII, eles teriam respondido que achatavam
séculos XVI e XVII são contraditórios, mas a maioria o crânio das crianças, hábito que lhes rendeu a de-
fala de grandes povoados Omága ou Cambeba, com nominação “cambeba” (cabeça chata) para se dife-
poder político centralizado em torno de um princi- renciarem dos índios antropófagos e se safarem da
pal cuja influência atingia áreas geográficas de até escravidão.
700 km. Enquanto para uns os Cambeba eram lide-
Reduzidos a pequenos grupos esses índios atra-
rados por grandes senhores, confeccionavam suas
vessaram o século XIX buscando diferentes formas
próprias roupas, tinham o corpo elegante e a pele
de responder aos novos desafios. Em muitos casos
clara sendo, por isso, vistos como “mais civilizados”
tiveram até que se aliar a seus antigos inimigos
que outros povos para outros, eles eram violentos,
como os Tikuna, por exemplo, e aos brancos. Em
sanguinários e antropófagos.
depoimento para a autora deste livro em 2012,
Controversas à parte, é importante destacar Valdomiro Cruz, o patriarca dos Cambeba no Brasil
que as diferentes imagens dos Cambeba na docu- relatou que por ocasião da Guerra do Paraguai, os
mentação colonial estão associadas não apenas à Cambeba foram “adotados” por um patrão branco

13
recebendo dele o sobrenome Cruz, provavelmente, uma outra área do saber. Entre a diversidade dos
para não irem à guerra, como índios errantes ou va- temas abordados, o livro tem uma linha mestra,
dios. Curiosamente, Cruz, também era o sobreno- uma identidade clara: é, antes de tudo, um teste-
me de Dionísio, o último Cambeba de cabeça acha- munho vivo e vivido, uma resposta serena e firme
tada encontrado por Alexandre Rodrigues Ferreira. de um espírito inquieto e livre a problemas e ques-
tões dos índios, dada por uma mulher que pesqui-
Deste modo, a palavra “cruz” para os Cambeba
sando e trabalhando com os Cambeba, identifi-
significa não apenas a imposição do cristianismo
cou-se neles e com eles, tronando-se uma de suas
católico e da política indigenista colonial, mas retra-
legítimas representantes.
ta também parte de sua história de contato com o
mundo ocidental, simbolizando também suas alian- Por isso, é também um livro documento. Docu-
ças e suas diversas estratégias de relações com o mento de vida, que reuni coragem denúncia e es-
mundo ocidental. perança. Coragem, porque traz à tona problemas
de identidade étnica do passado e do presente dos
Em sua memória coletiva os Cambeba guardam
índios que desafiam permanentemente as relações
ainda outras respostas dadas aos brancos. Relatam
interétnicas na Amazônia; denúncia, porque escan-
que durante parte do século XX se alguém parasse
cara o cinismo e o preconceito da sociedade bra-
no porto de suas aldeias e perguntasse se ali tinha
sileira contra os índios, especialmente, contra os
índios, a ordem era dizer que não. Somente na dé-
“índios citadinos”; esperança porque não se perde
cada de 1980, liderados pela família de Valdomiro
na lamentação das perdas e nem se contenta com
Cruz, os Cambeba reassumiram sua identidade ét-
a aclamação de um “passado heroico”, mas rima
nica no médio Solimões. De lá para cá, fizeram no-
agradável e sutilmente a dinâmica da vida indígena
vas alianças políticas, demarcaram parte de seus
e a realidade social na Amazônia. É numa lição de
territórios e reinventaram vários aspectos de sua
vida e de cidadania. Mais uma resposta inteligen-
cultura ancestral. Reaprenderam parte de sua lín-
te dos Cambeba ao mundo dos brancos. Enfim, é
gua tradicional, de suas danças e cantos e mantive-
uma flecha que rasga o tempo da história e quebra
ram viva a luta por seus direitos, reelaborando no-
o silêncio monstruoso que protege aqueles que se
vas respostas e novos instrumentos de resistência.
sentem vencedores.
Neste contexto, o livro “Ay Kakyri Tama” de
Márcia Wayna Kambeba não é apenas a reunião de
alguns poemas e crônicas sobre um grupo indígena Benedito Maciel1
da Amazônia. Nem é, tão pouco, uma simples Msc. e Doutorando em Sociedade e Cultura na Amazônia
aventura de uma “indígena da cidade” pelos difíceis Lago do Uarini, AM, 02 de junho de 2013.
labirintos da poesia e da literatura. Menos ainda 1
Graduado em História e Mestre em Sociedade e Cultura na Amazô-
uma mera “pulada de muro” de uma geógrafa para nia pela Universidade Federal do Amazonas - UFAM.

15
Introdução

S
ou indígena Omágua/Kambeba, e para mim, sentir, pensar, agir e de seguirem construindo sua
hoje, falar dos povos indígenas, é falar de história, lutando por seus direitos, tendo como um
minha própria história. Mas, para conhecer dos objetivos o ensino da língua materna. A língua
melhor sobre os povos indígenas, de modo Omágua/Kambeba durante anos, vem apresentando
particular o povo Omágua/Kambeba e manter uma sinais de declínio, mas se mantêm viva, através dos
aproximação, é preciso primeiro, começar tratan- ensinamentos às crianças e aos adultos.
do-os como de fato são: diferentes étnico, cultural
Mas, quem são os Omágua/Kambeba? Abro
e socialmente, respeitando a diversidade cultural.
aqui um parêntese para explicar que, Omágua
Chamando-os como se autodenominam, Omágua/
(nome original da etnia) significa pelo que se pôde
Kambeba, Guarani, Tembé, Tikuna, etc. Assim, a
colher nas pesquisas “cabeça de homem”, e Kam-
identidade de cada pessoa, estará vinculada a etnia
beba (apelido dado ao povo devido a prática da
a qual pertence, levando em conta suas peculiarida-
remodelação do crânio) significa “cabeça-chata”.
des manifestadas no modo de vida, na sua territo-
No entanto, fazemos uso dos dois termos para nos
rialidade que os torna diferentes dos não-indígenas.
referirmos a etnia. Ressalto ainda, que esse povo,
A luta do povo Omágua/Kambeba, e dos demais
sempre usou roupas, confeccionavam suas próprias
povos, não se resume apenas em defender seus li-
vestimentas desde o século XVIII, por este e outros
mites territoriais, lutam também por uma forma de
motivos foram tidos pelos viajantes da época, como
existência, presente no modo diferente de viver, ver,
povo de mais razão.

17
Ao contrário das teses que apontam um cami- bos, na busca de sabres na escola do “branco”, não
nho inexorável de perda cultural do povo Omágua/ com a intenção de apagar a nossa língua materna,
Kambeba, tem-se vários fatores para comprovar mas, de modo a contribuir com nossa luta em prol
que esse povo continua resistindo e mantendo sua da manutenção do nosso tesouro ancestral, uma
cultura, mesmo enfrentando dificuldades por par- vez que a flecha deu lugar a uma luta política, com
te de agentes não - indígenas. Para isso, usam de argumentos bem consistentes por nosos direitos a
estratégias, táticas e astúcias, que se manifestam conservação do nosso patrimônio material e imate-
em pequenos focos de resistências, bem como, no rial e a inteculturalidade respeitando nossa forma
modo de vida e na língua como elemento de trans- de ser. O mesmo se dá com a cidade, é comum en-
missão de saberes. Segundo Vilas Bôas (2000), “ain- contrar na casa do amazonense uma rede feita de
da há quem pense que os indígenas são criaturas tucum, um fogão a lenha, unido a culinária, maca-
destituídas de cultura. Aqueles que não os conhece xeira, banana, peixe assado, além de nomes de pes-
bem e que com eles não convivem tendem a ima- soas e cidades que representam a cultura e a língua
giná-los como seres que vivem na natureza isola- dos povos indígenas como Iracy (nome de pessoa)
dos, sem quaisquer perspectiva de vida e preceito Icoaracy (nome de cidade).
humanístico. Como ninguém, eles se consideram
Portanto, os povos indígenas, mesmo que de
parte da natureza, e tem por ela um respeito que a
formas diferentes, mantêm o mesmo ideal de con-
nossa sociedade perdeu há muito tempo”.
servar sua cultura como herença ancestral. Esse li-
É importante dizer, que os povos indígenas hoje, vro é um convite a um engajamento nessa luta pela
de modo particular o povo Omágua/Kambeba, manutenção da cultura dos que contribuiram para
mesmo aldeados, não deixam de ter uma relação a formação do estado brasileiro e hoje buscam seu
com a cidade, manifestada nas relações que são reconhecimento, seu respeito.
mantidas no cotidiano, na utilização de aparelhos
eletrônicos que facilitam a comunicação entre am- A Autora

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AY KAKYRI TAMA
(EU MORO NA CIDADE)
Poemas
AY KAKUYRI TAMA
(Eu Moro na Cidade)

Ay kakuyri tama. Meu canto era bem diferente,


Ynua tama verano y tana rytama. Cantava na língua Tupi,
Ruaia manuta tana cultura ymimiua, Hoje, meu canto guerreiro,
Sany may-tini, iapã iapuraxi tanu ritual. Se une aos Kambeba, aos Tembé, aos Guarani.

Tradução: Hoje, no mundo em que vivo,


Eu moro na cidade Minha selva, em pedra se tornou,
Esta cidade também é nossa aldeia, Não tenho a calma de outrora,
Não apagamos nossa cultura ancestral, Minha rotina também já mudou.
Vem homem branco, vamos dançar nosso ritual.
Em convívio com a sociedade,
Nasci na Uka sagrada, Minha cara de “índia” não se transformou,
Na mata por tempos vivi, Posso ser quem tu és,
Na terra dos povos indígenas, Sem perder a essência que sou,
Sou Wayna, filha da mãe Aracy.
Mantenho meu ser indígena,
Minha casa era feita de palha, Na minha Identidade,
Simples, na aldeia cresci Falando da importância do meu povo,
Na lembrança que trago agora, Mesmo vivendo na cidade.
De um lugar que eu nunca esqueci.

23
SER INDÍGENA – SER OMÁGUA

Sou filha da selva, minha fala é Tupi. mas não tem fim!
Trago em meu peito, Foi a partir de uma gota d’água
as dores e as alegrias do povo Kambeba que o sopro da vida
e na alma, a força de reafirmar a gerou o povo Omágua.
nossa identidade, E na dança dos tempos
que há tempo fico esquecida, pajés e curacas
diluída na história. mantêm a palavra
Mas hoje, revivo e resgato a chama dos espíritos da mata,
ancestral de nossa memória. refúgio e morada
do povo cabeça-chata.
Sou Kambeba e existo sim:
No toque de todos tambores, Que o nosso canto ecoe pelos ares
na força de todos os arcos, como um grito de clamor a Tupã,
no sangue derramado que ainda colore em ritos sagrados,
essa terra que é nossa. em templos erguidos,
Nossa dança guerreira tem começo, em todas as manhãs!

25
SILÊNCIO GUERREIRO

No território indígena, O canto da mãe d’água


O silêncio é sabedoria milenar, Que na dança com o vento,
Aprendemos com os mais velhos Pede que a respeite,
A ouvir, mais que falar. Pois é fonte de sustento.

No silêncio da minha flecha, É preciso silenciar,


Resisti, não fui vencido, Para pensar na solução,
Fiz do silêncio a minha arma De frear o homem branco,
Pra lutar contra o inimigo. Defendendo nosso lar,
Fonte de vida e beleza,
Silenciar é preciso, Para nós, para a nação!
Para ouvir com o coração,
A voz da natureza,
O choro do nosso chão,

27
ÁRVORE DA VIDA

Sany uny yuçuca tana may-sangara Kambeba! Assim para o povo Omágua
A samaumeira tem a função,
Tradução: De mãe das grandes árvores,
Vem água, banha nossa alma Kambeba! De cura e proteção,
E pelo indígena é cultuada,
No despertar da aurora, Essa gigante, mãe amada,
No mito de criação, Na dança nativa, dos povos irmãos.
Na gota que traz a vida,
De um povo, de uma nação.

Batendo na samaumeira
Caindo feito algodão,
Pro colo do grande rio
Que num sopro de criação,
Dá vida ao “índio” guerreiro,
E a mulher, sua paixão.

29
Omágua cabeça – chata
Fonte: FERREIRA, Alexandre
(Iconografia V. I - 1971).
RITUAL INDÍGENA

Iapã iapuraxi o ritual! O que era um culto sagrado,


Vamos dançar o ritual! Guardado como ouro ancestral,
O branco achou que era pecado,
Em noite de yaci-tua, Ivadiu meu ser espiritual.
O pajé convoca a nação,
Tambores ecoam na aldeia, Deixei de ser filha de euaracy (sol),
Começa a celebração. A cruz se tornou meu sinal,
Proibiram minha dança dizendo:
Dentro da Uka sagrada, Não existe mais o teu RITUAL.
O pajé inala o tawari,
E no transe evoca os seres da mata,
Vem o mapyritua, a curupira e o mapinguari.

A metamofose anuncia,
A presença do sobrenatural,
Na sua forma se vê a magia,
Hora awa, hora animal.

31
Desenho: Uruma
ALDEIA TURURUCARI-UKA
(A Casa de Tururucari)

Euaracy quando desperta, A noite yaci (lua) se aproxima,


Seus raios vem nos saudar, Chamando o povo para ensinar,
Mostrando que o dia começa, O que os mais velhos deixaram,
É hora de trabalhar. Manifestado na forma de cantar,
Nas danças que representam,
A aldeia do povo Kambeba, A cultura imaterial, nossa herança milenar.
Não é cosntruída em qualquer lugar,
O rio é um fator determinate, O som do maraká anuncia,
Para se poder habitar, A dança vai começar,
Imprimindo nesse espaço, No sopro do meu cariçu,
Nossa cara, nosso olhar. O som começo a tirar,
Do canto que vem trazer,
Diz o tuxaua maior, O curupira para dançar.
O Kambeba é povo agricultor,
Não se pode deixar de plantar, Contam os mais velhos com sabedoria,
Escolheu São Tomé como protetor, Que o Kambeba tem um exemplo a seguir,
Para que tivesse boa colheita, De um líder que lutou pelo povo,
Nesse santo se apegou. Para não os ver sucumbir,
Pelas armas dos may-tini,
Na aldeia Tururucari-Uka, Tururucari, não deixou a etnia se extinguir.
As casas representam união,
Ordenanadas em forma de círculo, Hoje, Tururucari representa,
Facilitam a comunicação, União, força, luta e coragem ,
Feitas de madeira e palha, Não se sabe como ele era,
Mantendo a antiga tradição. Mas se faz uma ideia de sua imagem,
Retratado no desenho do indígena Uruma,
Marcando essa nova linhagem.

33
UNIÃO DOS POVOS

Nós, povos indígenas, Pela defesa do que é nosso,


Habitantes do solo sagrado, Todos os povos devem se unir,
Mesmo sem nossa aldeia, Relembrando a bravura,
Somos herdeiros de um passado. Dos Kambeba, dos Macuxi,
Dos Tembé e dos Kocama,
Buscamos manter a cultura, Dos valentes Tupi Guarani.
Vivendo com dignidade,
Exigimos nosso respeito, Assim, os povos da Amazônia,
Mesmo vivendo na cidade. Em uma grande celebração,
Dançam o orgulho de serem,
Somos parte de uma história, Representantes de uma nação,
Temos uma missão a cumprir, Com seu canto vem dizer:
De garantir aos tanu muariry, Formamos uma aldeia de irmãos.
Sua memória, seu porvir.

Vivendo na rytama do branco,


Minha uka se modificou,
Mas, a nossa luta pelo respeito,
Essa ainda não terminou.

35
TANA KUMUERA YMIMIUA
(Nossa Língua Ancestral)

Não se pode dizer que os Kambeba, Mas os Kambeba com esperteza,


Esqueceram a língua Tupi, Ensinavam em segredo,
Ainda existem alguns falantes, Superando o que seria,
Que não deixam o dialeto sumir, o fastama do seu medo.
No ensinamento dos que sabem,
Memorizo o que aprendi. Mas a língua, não é fator determinante,
Para se poder dizer,
Kumiça yuria! kumiça ypaçu! Que um indígena não é Kambeba,
Tradução: Fala mata! Fala lago! Por não saber escrever,
Na língua do seu povo,
May-tini na sua grandeza, Pois a afirmação está no seu ser.
Por não conseguir entender,
Viu nossa fala com estranheza,
Português fez o povo aprender,

37
TERRITÓRIO ANCESTRAL

Maá munhã ira apigá upé rikué Antes a terra era nossa casa,
Waá perewa, waá yuká Hoje, se vive oprimido.
Waá munhã maá putari. Antes era só chegar e morar,
Hoje, nosso território está dividido.
Tradução:
O que fazer com o homem na vida, Antes para celebrar uma graça,
Que fere, que mata, Fazia um grande ritual.
Que faz o que quer. Hoje, expulso da minha aldeia,
Não consigo entender tanto mal.
Do encontro entre o “índio” e o “branco”,
Uma coisa não se pode esquecer, Como estratégia de sobrevivência,
Das lutas e grandes batalhas, Em silêncio decidimos ficar.
Para terra o direito defender. Hoje nos vem a força,
De nosso direito reclamar.
A arma de fogo superou minha flecha, Assegurando aos tanu tyura,
Minha nudez se tornou escandalização, A herança do conhecimento milenar.
Minha língua foi mantida no anonimato,
Mudaram minha vida, destruiram o meu chão. Mesmo vivendo na cidade,
Nos unimos por um único ideal,
Antes todos viviam unidos, Na busca pelo direito,
Hoje, se vive separado. De ter o nosso território ancestral.
Antes se fazia o Ajuri,
Hoje, é cada um para o seu lado. O que fazer com homem na vida
Que fere, que mata,
Que faz o que quer.

39
MINHA MEMÓRIA – MEU LEGADO
(Homenagem ao Tuxaua Valdomiro Cruz)

Sou Tuxaua Kambeba e quero falar, Filhos da água, somos os Omágua


Antes que a idade não me permita mais lembrar. Temos sabedoria milenar,
Da vivência de minha infância, Valentes guerreiros,
Das lembranças do meu povo, estamos firmes na marcha
Servindo de alguma forma, Aprendemos com os pajés,
Para o recomeçar de um tempo novo. Os saberes da natureza,
Extraindo da seringueira
Da vida que tive, lembro como agora, O leite que virou borracha.
Das lutas pela terra, pela vida que foi embora,
Para muitos de meus parentes, Vi os mais velhos prepararem o látex,
Que morreram na batalha, E com eles a bota vi nascer,
Por um lugar pra viver Na dor dos meus irmãos que nos pés iam fazer,
E pela continuidade de um legado, O molde dessa peça que usavam pra calçar,
de uma história. Na busca de uma caça para a fome saciar.

As terras que foram de meus ancestrais, Hoje, para nova geração, deixo uma mensagem,
Hoje, não as tenho mais Que mantenham essa cultura com fé e a coragem,
Na luta para recuperá-las, De serem bravos guerreiros,
Esperamos dos governantes divulgando a memória,
A iniciativa para demarcá-las, Do povo cabeça-chata que fez parte da história,
E continuarmos a vida, Desse Brasil miscigenado, povo de fé,
Em convívio com a natureza e os animais. de muitas vitórias.

41
TUXAUA KAMBEBA
(Homenagem ao Tuxaua Valdomiro Cruz)

Na minha caminhada, muitas coisas eu vi. Antes de chegar a velhice, muitas coisas ensinei
O choro triste e o lamento de dor, Cantos, danças, lendas, tudo isso repassei,
Ainda permanecem em minha memória, Para que quando já cansado e
De um povo com o qual fiz a minha história, não poder mais andar,
Para que hoje possam escutar seu grito, Possam contar minha história, o meu legado,
seu clamor. o que deixei,
Lembrando-se de que TUXAUA KAMBEBA,
Quando jovem, muitas lutas travei, para sempre serei.
Valente guerreiro me tornei,
Na defesa do meu povo, me dediquei,
Para alcançar grandes conquistas,
o título de TUXAUA conquistei.

Hoje, mesmo com a idade avançada,


Trago vivo na lembrança,
As lutas pela terra, pela vida dos que restaram
Seguindo com fé, força e esperança
De manter a nossa cultura, ensinando as crianças.

43
MINHA PENA VERMELHA

Nas cores das minhas plumas, Pelo preconceito que impede


Minha identidade encena, Nosso povo de crescer,
A sutileza do meu caminhar, No olhar de estranheza não posso permitir,
Da minha pele morena, Que may-tini venha, minha alma ferir.
Pintada de jenipapo,
Contrastando com a minha pena.

No brilho dos meus olhos negros,


De formato amendoado,
Sai um olhar penetrante,
Feito bicho acuado,
Quando se sente ferido,
Quando se sente afetado,

45
OS FILHOS DAS ÁGUAS DO SOLIMÕES

A água é a mãe que sustenta, Mas em um contato fatal,


A vida que nasce como flor Com um povo mais socializado,
Alimenta a planta e o ser vivente, Fez dos herdeiros das águas,
É estrada por onde anda o pescador. Um povo desaldeado,

Na enchente, vem veloz e furiosa, Tomando seu solo sagrado,


Derrubando ribanceiras, destruindo a plantação, Sem dor, piedade ou compaixão,
Afeta a vida do indígena e ribeirinho, Os Kambeba foram escravizados,
é um ciclo, que se renova a cada estação. Apresentados a “civilização”.
Exploraram a sua força,
Na vazante o rio quase some. Forjando uma falsa proteção.
A praia começa a surgir,
A água, agora bem calminha,
Não tem forças para a roça destruir.

Nas margens de um rio em formação,


Vive um povo que a água fez nascer,
Em um parto de dor e emoção,
A VÁRZEA, o Kambeba escolheu pra viver.

47
TANA KANATA AYETU
(Nossa Luz Radiante)

Tuyuca com sua magia, E diante de tanta beleza,


Um canto se faz ecoar, Deste solo verde e marrom,
Com a orquestra dos passarinhos Convivem os povos indígenas
A música paira no ar, Dividindo os bens em comum,
Mas, é preciso sensibilidade, E com a força da natureza,
Para a melodia escutar. Deus mostra sua realeza,
Na presença de Tana Kanata Ayetu.
Nas escala musical
O roxinol vem nos mostrar,
Sua voz graciosa,
Que unida ao sabiá,
Formam uma dupla harmoniosa,
E com suavidade, nossa vida vem alegrar.

49
SÃO PAULO DE OLIVENÇA – PRESENÇA KAMBEBA
(Homenagem ao povo de São Paulo de Olivença e a todos os indígenas Omágua/Kambeba)

São Paulo cidade pacata As lendas e mitos Kambeba,


Que vem do rio, que vem da mata Em ti venho buscar,
De pele morena, de alma serena Me apresentas teu baú,
No sangue a nobreza, minha bela pequena. Tuas memórias, vens me contar,
Mostrando que és importante,
Guardas os segredos de bravos guerreiros, Por ser de fato, meu lugar.
As histórias dos que por ti passaram,
As lutas que em teu solo travaram, São Paulo minha terra Kambeba,
O sangue, que teus filhos derramaram. Me sinto feliz por em teu solo estar,
Me encantas com tua beleza,
Enterradas em teu rico solo, Me transmites calma e firmeza,
Estão as urnas de nossos ancestrais, E nesse chão que me criei,
Daí a importância de nossos sítios arqueológicos, Hoje, volto a pisar.
Neles encontramos vestígios de cerimoniais,

Dos Kambeba, e de tantos povos,


Que de braços abertos recebestes para morar,
Trazidos de outras aldeias,
Pelas mãos dos que buscavam “catequizar”.

51
BELÉM INDÍGENA – BELÉM CABOCLA
(Homenagem aos povos indígenas de Belém do Pará)

Belém chuvosa, Na alma a esperança


Mas carinhosa. De ver florescer,
Menina manhosa, A união dos povos
Um pouco dengosa, Que lutam pra ver,
Na dança gingosa, Sua cultura, sua crença
Das ondas do mar. O respeito merecer.

Belém minha cabocla Belém minha cabocla,


Menina cheirosa, Menina formosa,
És Deusa da mata, Um pouco dengosa,
És “índia”, és mulata, Na dança gingosa,
Nessa cor mestiça Do rio Guamá.
Desse povo miscigenado

Belém dos Tembé,


Dos Mundurucu,
Dos Amanayé,
Dos Kaxuyana
Dos Araweté
Dos TUPI guarani
Dos Sateré-Maué.

53
O MAR DE AJURUTEUA
(Homenagem a beleza do mar)

O dia desponta brilhante Plantando uma fruta interessante,


Saudando a mãe Iemanjá, Vermelha e gostosa de comer,
Sua magia se vê florescer Ajuru é o nome dessa fruta,
Nas ondas que vem me abraçar, Que os indígenas batizaram e veio ser,
AJURUTEUA terra do Ajuru,
Em um clima bem envolvente, Linda praia que alegra meu viver.
O sol vem iluminar,
Essa dança linda e marcante, No murmúrio do vento escuto,
Do vento com as ondas do mar. A mensagem do Deus criador,
Me dizendo que o dom mais profundo,
Nessa praia de sol escaldante, É a vida que nos deu por amor.
Uma coisa não se pode esquecer,
De um povo valente e importante,
Que nessa terra a história fez nascer,

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NATUREZA EM CHAMA

Na terra sagrada Dos gritos agudos


Que TUPÃ criou, Se ouve o clamor,
Do seio materno Do fruto ardendo
Se ouve o clamor, Na chama, no calor,
Da mãe natureza Ceifado, perdido,
Sofrendo de dor. O fogo o calou.

O fogo ardente, Dos olhos tristes,


Ao longe se vê, Uma lágrima cai,
Queimando a mata O lamento de dor
Sem Q, nem porquê, Com o vento se vai,
As folhas se torcem Varrendo o chão,
Querendo viver. Varrendo o chão!

No solo desnudo,
Os restos mortais,
Do verde da vida
E dos animais,
Queimados, sofridos
Em cinzas reais.

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A SINA DO PESCADOR

Ei Pescador, jogue a rede para Pescar! Lá vem chegando o pescador,


Ei Pescador, tua sina é Pescar! Prepara o fogo dona Maria,
Põe café no passador,
No banzeiro do rio, Amola a faca e o terçado,
Enfrenta a chuva e o frio, Que o homem está apressado
Sob a noite serena, Pra falar da pescaria.
É tempo de piracema.
Ei pescador, jogue a rede para pescar!
Nessa estrada feita de água, Ei pescador, tua sina é pescar!
O pescador navega sozinho,
Tendo por companhia a mata,
E o canto do passarinho.

No decorrer de sua caminhada


Não tem medo de mais nada,
Sua fama de pescador
Fez dele um grande historiador,
Já viu desde alma penada
Até disco voador.

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CABOCLO RIBEIRINHO

Ao som do banzeiro do rio Em meio ao verde e à margem do rio,


As canoas vem, as canoas vão. Cultiva a vida, sem muita preocupação.

É o caboclo ribeirinho, Seu convívio em meio a natureza,


Que luta pelo seu sustento, pelo seu pão Fez dele um grande conhecedor,
Ele rema, joga a sua malhadeira Sabe os segredos da fauna e da flora,
Esperando pegar um bom pirarucu Dom de Deus, o nosso criador,
Ou um grande pirabutão. Que se revela no entardecer da aurora.

Ao som da melodia dos pássaros, Ao som do banzeiro do rio


Que voam em sua direção, As canoas vem, as canoas vão!
Ele segue o seu caminho,
Observando o horizonte,
que está além do alcance de sua mão.

Ao som do banzeiro do rio


As canoas vem, as canoas vão.

É o caboclo ribeirinho,
Que vive a vida com emoção,

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PARTICIPAÇÕES
ESPECIAIS
ROSA PETANY
(Rosa Vermelha)

Oh! Flor-Kambeba, pintada de urucum, Es tua sina, flor-vermelha majestosa,


Teu coração doce e tua alma valente Ter nascida perfumada e destemida,
Germinam na chama ancestral, a semente Esbanjando corola de flores ruborosas
Da Rosa Vermelha de beleza incomum!
Para semear estrelas de pétalas, esculpida
Nela reluz a bravura da flor-guerreira, Sob o voar das borboletas graciosas,
O lendário arco-íris do fogo sagrado, Evocando a liberdade da voz esquecida!
As tramas grafadas ao sol da fronteira
Do território de teus raios dourados! Eylan Lins

Teus clamores − tambores de sapopema –


Voam como sementes de samaumeiras
E ao tocar o chão, semeiam os poemas
Da vida, que a vil ignorância queima!

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KAMBEBA

Da flecha ancestral, eu guardo a memória. No jeito menina, com ar de inocente


Paisagens da história que o tempo apagou Um “Q” de mistério que encanta e seduz
No sangue Kambeba, a saga e a gloria, E a flor do sorriso dizendo que a vida
De um povo guerreiro que sempre lutou. A cada momento, é um feixe de luz.

Na pele encauxada de sol e mormaço, Eu sonho, que um dia,


Grafismos antigos de guerra e de paz A cultra do branco,
E manchas do sangue que foi derramado Entenda que em Deus, nossa pele é irmã
Dizendo pro branco, escravo, jamais! Não nego Javé porque sempre soube
Que em minha maloca
No olho espichado, que lembra uma onça, Seu nome, é Tupã!
Lampejo de astúcia, firmeza no olhar
E um leve molejo, suave e silente Celdo Braga
Na força contida, no jeito de andar

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NOBREZA

Ao longo do tempo, de espargir as vibrações,


no aço-reflexo do nosso espelho; de emoldurar as retinas,
permanecerá fedelho, por ser, talvez, tua sina,
como um quentíssimo abraço, cingir nossos corações!

o meu sentimento lato! Manaus ficará mais pobre,


Por essa voz maviosa, sem tua presença nobre!
pela presença gostosa,
porque tens o jeito exato Miguel de Souza

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VITÓRIA TÃO RÉGIA

Vitória tão régia no verde da folha Que funde peças tão raras
Em berço tão pleno no leito das águas Mosaico de folhas
Do igarapé, floresta de pé Moldando, tecendo, criando um ecossistema
Corrente leva a semente Que sofre e é devastado por ações humanas,
E o destino da gente Mas luta, resiste, ressurge e, as duras penas, vai.
Espera brotar.
Aonde ninguém duvida que possa chegar
Meu rosto está nessas águas O homem em sua corrida se presta a matar
Meu corpo na mata Não olha pro futuro, não quer nem saber
Eu canto, Se há lugar seguro pra onde correr.
Eu chamo essa chuva que molha o meu chão
Rega as flores do norte, Vitória que mergulhou nos encantos da lua
O meu violão... Não deixe que negociem a terra que é sua
Vem pulsando bem forte Emerge e traz em suas mãos um alento pra nós
A vida no chão... Protege das vendas e trocas a floresta!

Adejana Meireles

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MÁRCIA KAMBEBA

Missionária que perambula pelas Kambeba...


Arcádias pré-colombianas, sempre Amiga, em sua maior magnitude
Ricas em elevados valores humanos, Morena, como tuas irmãs
Carismática, Bem humorada e porque não falar da tua
Inquieta diante da Elegância e singeleza
Ampulheta que inexorável a tudo registra e em Benevolência, sintetizando sempre na
seu registro és, Amplitude do verbo maior.
O Amor.
Leon Levi

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GLOSSÁRIO DE PALAVRAS OMÁGUA/KAMBEBA USADAS NO LIVRO

Aracy – Luz da manhã


Awa – Homem
Euaracy – Sol
Iapuraxi – Dançar
Iapã – Vamos
Mapiritua – Bicho preguiça
May-tini – Homem branco
Rytama – Aldeia
Tanu-tyura – Nossos pequenos
Tanu muariry – Nossos netos
Tuyuca – Terra
Uka – Casa
Yaci – Lua
Yaci-tua – Lua cheia

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