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Ulmeiro
ALDA ESPíRITO SANTO

É NOSSO OSOLO SAGRADO DA TERRA


COLECÇAO VOZES DAS ILHAS
Independência total
Glorioso canto do povo
Independência total
Hino sagrado de combate
Dinamismo
Na luta nacional,
J'uramento eterno'
© ALDA ESPIRITO SANTO e ULMEIRO No país soberano de S. Tomé e Príncipe
1." Edição - Agosto / 78
Edição de José A. Ribeiro
I
Composto e impresso:
Tipografia Garcia & Carvalho, Lda.
Guerrilheiro da guerra sem armas na mão
Rua St.° António da Glória, 90 - Lisboa
Chama viva na alma do povo
Distribuição:
Congregando os filhos das ilhas
ULMEIRO
Av. do Uruguai, 13-A Em redor da Pátria Imortal
Lisboa - 4
Te!. 707544
II

Independência total, .tot8J e completa


Construindo no progresso e na paz
A nação mais ditosa da Terra
Com os braços heróicos do povo

5
Independência total
Glorioso canto do povo
Independência total
Hino sagrado de combate

li

Trabalhando, lutando, lutando e vencendo


Caminhamos a passos gigantes
Na cruzada dos povos africanos
Hasteando a bandeira nacional

IV PREFÃCIO
Voz do povo, presente, presente em conjunto
Vibra rijo '!lO coro da esperança
Ser herói na hora do perigo
Ser herói no ressurgir do Pais

v
Independência total
Glorioso canto do povo
Independência total
Hino sagrado de combate
:Dinamismo
Na luta nacional
Juramento eterno
N o país soberano de S. Tomé e Príncipe

HINO NACIONAL DA REPOBLICA DEMOCRÂTICA


DE S. TOMe E PRINCIPE

6
Um povo em marcha, que avança, no «8010 sagrado da
terra», realizou uma etapa vitoriosa da missão histórica,
que determinou o processo de desenvolvimento revolucio-
nário das forças produtivas que culminou com o . triunfo
da conquista da INDEPENDÊNCIA NACIONAL.
O contexto determinante da presença no mundo, em luta
contra o padrão colonial de exploração capitalista, feroz e
ultrapassado nos seus métodos, uniu os povos africanos
dominados pela potência colonial portuguesa, numa frente
de luta conjunta no eclodir das primeiras independências
dos povos africanos subjugados pelas outras potências do
Oéidente. Esse contexto determinou o compromisso dospo-
vos africanos dessa região do continente, que encetaram a
«Grande Marcha» liderada pelos movimentos nacionalistas
de· cada um desses países) decididos a varrerem o colonia-
lismo do solo pátrio e a abolirem duma vez para sempre a
exploração do homem pelo homem. Prestando homenagem
ao grande líder do PAIGC, Camarada Amílcar Cabral, não
resistimos a transcrever o significado dessa batalha dura
pela libertação do homem:. «4 luta. dosp(YVos ·pela libertação

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nacional e pela independência, contra a dominação imperia- o ciclo áureo da cana sacarina, que coincide com o
lista tornou-se uma força imensa do progresso da humani- período escravo nos engenhos das roças, declina em meados
dade) constituindo sem dúvida nenhuma) uma M.8 caracte- do século XVIII com a resistência persistente de trezentos
rísticas essenciais da história do nosso tempo.» 1 anos, (Guerra do Mato), forçando o colono a demandar nova
O Solo sagrado da Terra é uma contribuição da identi- via de exploração nos «museus diluídos na leva para o
dade socio-política e cultural do país insular «na encruzi- Brasil» (as ruínas dos antigos engenhos).
lhada das rotas atlânticas», ao processo imparável da huma- A fauna marítima ecoando no simbolismo da poesia,
nidade no sentido de romper as contradições que situam interpretando a exploração do homem pelo homem, em luta
os povos no combate sem tréguas para se situarem «no com as forças da natureza e contra a dominação, tem neces-
mesmo lado da canoa». sidade de recriar essa linguagem variada, nos anos duros
Identidade cultural, compromisso com a luta dos povos da repressão fascista:
oprimidos do mundo, testemU'Ilho e militância no continente
africano, luta e acção mobilizante na epopeia sangrenta de «Tubarões sugadores de negros escravos
cinco séculos de estagnação, esta colectânea de poemas surge ... Nos parões da morte dos donos do ocidente
das raízes da terra, identificada com o processo da luta . Navios negreiros) fantasmM da rota atlântica
... «Milhas marinhas ao longo do continente africano»
constitui o prólogo que se apresenta como a geografia A abolição da escravatura em 1853 abala a agricultura
humana que identifica o país de Amador, país insular, a colonial no seu auge e os escravos libertos, os forros, não
300 milhas do continente, entreposto de escravos no sé- correspondem à necessidade de lucros fabulosos e a emi-
culo XVI, os porões da morte gritam, no silêncio das águas gração clandestina de escravos do continente salva a econo-
marinhas, a história das galeras vomitando homens bestas, mia dos ocupantes da terra. Escravos ilhéus precisam de
nas ilhas confinadas, dnde o marulhar das águas era tes- poisio ... e a metrópole colonial é pródiga e magnânima,
temunha dramática dos negros empilhados em navios ne- na utilização de métodos distorcidos na continuação do pro-
greiros, fardos armazenados em demanda do porto, do mer- cesso da ignomínia.
cado - tráfico. Coincidente com a carta de alforria, a resistência con-
«Fantasmas da rota atlântica», símbolo, tradução do solida-se entre os santomenses contra o trabalho escravo
ignóbil comércio de escravos, que rumando às Américas da roça - «contrato».
escreveu a longa odisseia dos homens «que construíram No dealbar do século XX (1906), Henry Nevinson na
mundos maravilhosos do outro lado do COIJ1tinente» (Agos- obra Uma nova escravatura denuncia o ignóbil trabalho
tinho Neto, in Sagrada Esperança). escravo nas roças de S. Tomé e Príncipe, onde o cacau e
o café atingem cifras consideráveis. Os nossos irmãos de
1 Amílcar Cabral in  arma da teoria. Angola e Moçambique e mais tarde de Cabo Verde sofre-

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ram anos de aviltamento no inferno das roças das grandes S. Tomé e Príncipe, após um Congresso realizado em Santa
Companhias Coloniais, com sede nas suas metrópoles . . Isabel, em 1972, saía revigorado e com novas directrizes
As denúncias constantes apresentadas ao mundo por mais dinâmicas, transformando-se em Movi.m ento de Liber-
Basi! Davidson e outros jornalistas determinaram as san- tação de S. Tomé e Príncipe (MLSTP).
ções exigidas contra Portugal pela opinião pública inter- As condições geográficas das ilhas não permitiam o eclo-
nacional. Mas a escravatura 'n ão podia morrer: represen- dir de uma luta armada de libertação, mas a consciência
taria o desmoronar dO' feudo. Tornava-se necessário diminuir nacionalista uniu os Santomenses numa luta de resistência
e até extinguir a importação de mão-de-obra escrava e, clandestina que se generalizou com o 25 de Abril, em Por-
nesse sentido, as rusgas sistemáticas empreendidas contra tugal. Uma luta mobilizadora eclodiu vitoriosamente, alcan-
os Santomenses encontram resistência na ponta das cata- çando todos os pontos do país, reunindo os nacionalistas
nas, até que a consumação dos pérfidos planos coloniais em torno da vanguarda do povo. Os trâmites que iriam
se consubstancia no massacre de 1953. conduzir à independência foram assinados em Argel a 26
de Novembro de 1974 pelos representantes do MLSTP e
Resistência santomense tem um fim pelos representantes do governo português .
Não ceder ao cont1'ato eSGr(JJ1)O rWs roças do cacau A 12 de Julho de 1975 era proclamada a INDEPEN-
E um massacre é resposta à resistência ... DENCIA NACIONAL. Quinhentos e quatro anos de domi-
nação, dura e implacável, caía por terra. As vítimas da
Conscientes de que se impunha o ressurgimento duma dominação sacrificaram com o sangue das suas vidas o
luta organizada, a juventude dos anos 50 toma consciência preço da independência. Amador representa o marco da
de que as reivindicações por melhoria de condições de vida, luta do povo, iniciada em 1530, tendo a duração de quase
os clubes para uma pequena élite que presidiu à movimen- quatro séculos e meio. Mortes, exílio, prisões, sevícias cons-
tação dos Santomenses, que constituíam os intelectuais do tituíram uma sementeira trágica de sofrimentos e violações.
princípio do século, embora representassem um prenúncio Âs últimas balas coloniais crivaram o corpo de Giovani,
de tomada de consciência, não visavam ainda romper com 'a um militante atingido à hora do meio-dia na via pública a
potência dominadora. 6 de Setembro de 1974 - mais uma data histórica que de-
A partir precisamente de 1953, os estudantes das coló- terminou O' processo irreversível do nosso país.
nias sob dominação portuguesa preparam-se para a luta e
participam também em organizações estudantis antifascis- As últimas balas coloniais descarregaram toda 1tma
tas, cerrando fileiras na frente da luta clandestina. [epopeia sangrenta
Em 1960, surge o movimento de libertação nacional que No corpo de Giovani estirado na via pública
iria conduzir o povo de S. Tomé e Príncipe à autodetermi- As últimas balas à hora do meio-dia
nação e independência nacional. O Comité de Libertação de Badaladas decisivas no relógio da Revolução

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A dimensão do país constituía motivo de incredulidade A muralha colonial começou a desmoronar-se perante
na imprensa do grande mundo, mas o povo da República um povo desarmado que não temia a morte . «Independência
Democrática de S. Tomé e I'ríncipe, oitenta dias após a total», hino sagrado de combate, é o juramento eterno do
proclamação da Independência, nacionalizava em democra- país soberano de S. Tomé e Príncipe. Tinha de figurar no
cia directa todas as grandes companhias agrícolas coloniais. canto do povo, no poema da terra, banhada pelo verde mar,
Noventa por cento da terra foi nacionalizado no histó- o mar imenso que nos cerca e nos impele para o dinamismo
rico dia 30 de Setembro de 1975. Estava iniciada nova da luta e é o canto da nossa afirmação, no mundo dos
frente de luta: a Batalha pela Independência Económica. homens, na pátria africana, no universal paradoxo da sua
dimensão, presente na luta dos povos pela sua afirmação.
Regado pelo sangue dos nossos mártires «Ê NOSSO O
Ê a «voz do pavo presente em conjunto» que prefacia
SOLO SAGRADO DA TERRA».
a poesia que agora é apresentada, o povo insular que recebeu
a lira de Costa Alegre, poeta do fim do século, marcado
por um contexto de homem isolado num horizonte marginal
que lhe não permitia superar a sua limitação de colonizado,
condensada na problemática da sua cor. Seu drama psicoló-
No ardor da luta pela libertação nacional «Independên- gico não atingiu as profundas desigualdades das contradi-
cia total» (Independencha total'i,) era a palavra de ordem ções socio-económicas do sistema colonial implantado no seu
vibrante de boca em boca, nos lábios de homens, mulheres país de origem.
e crianças. Marcelo Veiga, Francisco José Tenreiro, Maria Manuela
«Independência total» mobilizou o povo de um extremo Margarido, Tomaz Medeiros, poetas do passado e do pre-
a outro do país. sente escreveram as páginas da literatura poética de S. Tomé
Independência total, braços erguidos, nos comícios, nas e Príncipe, processo histórico e cultural, contribuição ao
manifestações, nas greves, no impulso decisivo determinante património nacional.
que não admitia já o mínimo passo de recuo. «Independên- O Solo sagrado da terra, dignificado na pátria indepen-
cia total» tinha de ser o Hino Nacional, «glorioso canto do dente, testemu.nha esta jornada de luta, árdua e violenta,
povo» que sem armas, destemidamente, travou a grande mas incentivada por uma forte aurora de esperança. A jor-
batalha política de mobilização geral. «Independência total» nada avizinhava-se dura e sangrenta ... e a ditadura sala-
ergueu o povo num cordão imenso, num desafio sem tréguas zarista, fascista e implacável, era pesada bota de ferro da
às balas da Polícia Militar, nos primeiros dias de Setembro metrópole colonial.
de 1974, em denúncia aberta contra uma situação insusten- Os Poemas da Juventude situam-se no período dos anos
tável que tinha os seus dias contados. 1942-1952 no momento em que «um longo canto de punhos

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cerrados» 'era a resposta pertinente ao apelo da 'Grande sagem que havia de ultrapassar os anos da juventude, na
Marcha, qúe os estudantes das colónias portuguesas, ém realização concreta dos objectivos da luta.
diálogo com a identidade cultural africana, dimensionavam
os passos para as escaladas da tomada de consciência con- Criança do me·u país sem fronteiras
tra um processo de submissão dos povos africanos, . .. Ge?'ada de milhcLres de ventres
«0 canto angustiado do ossobó» é desesperança e incer- .. .Que esta, mensagem de vida,
t eza, mas prenúncio de uma longa senda de combate dos . .. A bra as lanternas
povos africanos que conheceram o sistema de exploração dos teus olhos apagados
escrava, amontoados nos por ões dos navios que das terras lVa projecção das nossas estradas
de Angola e Moçambique enriqueciam o cacau colono nos varridas das impttrezas dos dejectos inúteis.
feudos , de S. Tomé e Príncipe. Era a tortura dos homens
negros acorrentados uns aos outros que capinavam as cida-
des na dor e na passividade aparente. O longo canto , de Na luta da fome da gente pequena, a mamã africana
punhos cerrados era a promessa da juventude ao . povo ressalta na infância dos poetas que -atravessaram os íngre-
identificado que daria uma resposta exacta aos tubarões mes caminhos da meninice, testemunhando a dupla coloni-
dos mares, os donos do capital, toda uma corrente de domi- zação da mamã negra jungida à canga da desintegração
nação/ aniquilando homens, mulheres e crianças que desen- social
raizados das suas terras de origem eram fixados no chão
de uma roça, «Estado dentro doutro Estado», torturados Mamá tua menino
durante longos e penosos anos, não tendo o direito de pro- na luta da vida
curar outro domicílio. Os seus descendentes, pertença da Gamã pixi à cabeça
senzala colonial em reservas de extermínio, colocados em lVa faina do dia .. .
apartheid em relação às populações locais, o fermento da . .. Pela luta da, fome
divisão era instilado segundo os métodos dum hermetismo da gente pequena
sombrio e calculado.
As flor estas vi?'gens ' .. famintas de irradiação humana . , ,
desertos humanos ... nas ilhas perdidas ... na confuntura No litoral do país, mais precisamente as povoações na
dos séC'J,l,los, exigem o tombar do fardo da longa noite orla da praia foram desapossadas da terra e encurraladas
colonial. à limitação da cabana fronteiriça ao mar. Espoliados e
O mundo da criança africana, temática de asfixia 'cul- reprimidos, os angolares 'na faina do mar constituíram
tural no muro de pedras da alienação colonial expressa o parte da população mais terrivelmente marginalizada que
drama latente, traduzido no impasse-esperança duma mén- o colonialismo vinculou a uma barreira de separatismo em

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2
relação aos demais povoados, no propósito de dividir para POEMA MENSAGEM
reinar. Entretanto, procuravam ignorar que o proceseo de
libertação dos povos é irreversível e que as desigualdades
sociais tombariam progressivamente à medida qu e as con-
tradições fossem superadas

oanoa /1'ágil à beira da praia


o o o Na arla dos coqueiros
00 0 O mar é vida
• o Para além as terras do caca-u
o

Nada dizem ao angola,r


. .. a luta com o gandú
as canoas baloiçando no mar
oE a arla imensa da praia
o o

No terreno da luta, os companheiros da estrada agar-


raram em suas mãos os problemas sociais da dominação e
Os poemas da juventude correspondem ao momento da ganharam consciência de que um homem isolado, é um
reflexão, ao registo dos documentos de um sistema, que homem lançado ao mar. O primeiro grito de mobilização
teria de ser abalado nos seus alicerces, à revolta que se é uma mensagem, um reconhecimento de companheiros, que
foi acumulando para estuar em processo organizado, nos tomam consciência de que há uma batalha conjunta a tra-
longos anos em que se ia ganhando consciência de que a var. Ê o momento . de comunic~ção, de desmistificação por
nossa geração seria a geração dos sacrificados, para que entre os serralhos que os aprisionam. Os cânticos de revolta
os filhos do futuro entoassem o Hino Nacional na pátri a Í!tcarnam a linguagem ritual das tradições seculares e jor-
libertada. ram na mensagem da unidade identificada na causa comum

«Neste lado da canoa


Também estou contigo) irmão
o Encomendando preces) juras) maldições
o '

Mas nós queremos ainda uma coisa mais bela


.. o

Queremos unir as nossas mãos milenárias


o o o

Para nos situarmos todos do mesmo lado da


000

[canoa. »

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Situando-nos todos do mesmo lado da canoa, a mulher POR ENTRE OS MUROS DA REPRESSÃO
do mundo, a mulher africana, minha irmã, parte integrante
dum todo que é o ser social, uma longa marcha, mais longa A noite da ignorância e da insegurança definem uma
ainda pelas instituições que remontam às narrações bíbli- situação angustiante e de incertezas,
cas, tem de brandir a espada pela emancipação dos povos, A máquina repressiva colonial prepara todo , um apare-
e, portanto, pela sua afirmação na luta pelo progresso, lho para abater sobre uma população indefesa. Encerrado
pelo grande passo que romperá as barreiras de todas as o mercado da importação escrava por força de pressões
discriminações. A mulher africana duplamente colonizada, internacionais, a mão-de-obra para o cacau escravo tinha
escrava doméstica, serva da colonização, tem uma missão de ser recrutada ao preço de sangue. O povo resistia.
secular a desempenhar na etapa da libertação. As rusgas recrudesciam, as brigadas de trabalho for-
çado ganhavam mais ímpeto e o «Oentro Oolorvial»} que re-
Não gritaremos mais os 1WSSOS cânticos dolorosos presentava o colosso dos usurpadores da terra que, do Ter-
. .. Outro canto se elevará} Irmãs reiro do Paço, orquestravam e decidiam dos destinos da
Por cima da~ nossas cabeças Colónia Penal de S. Tomé e Príncipe, exigia que a autori-
Oonquistaremos para nós dade colonial garantisse a mão-de-obra autóctone. O muro
Para os filhos gerados no nosso ventre da repressão alastrava nos anos cinquenta e o boato, qual
A nossa bela terra lavas incendiárias, levantava-se à porta do tira'nizado, de-
.. , Na hora que se avizinha ." nunciado e atraiçoado, através de ameaças e promessas em
editais afixados nàs paredes ' e nas árvores das povoações.

Desbravando a terra africana, identificados com a luta, , " Boato é espada de dois gumes
a bandeira vitoriosa da libertaçãol é braseiro ardente de ,,' Boato é também complexo de C'ulpa.
rebelião, no espaço delimitado para a operação guerrilha,
luta clandestina, armas em riste, segu'n do as condições geo- Quando chegará a hora
gráficas, que esperam o grito de clarim para a acção orga- De vencer o medo da escravidão
nizada. E a escravidão do meclo?

«Tu} meu irmão identificado


. " Vais erguer em rebelião atrdente A hora da repressão avizinhava-se e o momento de
, ::, A tua bandeira vitoriosa romper o medo da escravidão come'ç ava a surgir desmas-
, " Na grande batucada carada, na sórdida figura do governador colonial, Gorgu-
Da pátria libertada. » lho, incumbido de jogar uma. cartada desesperada,

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A LEGíTIMA DEFESA Homens, mulheres e crianças, organizados, romperão
(Massacre de Fevereiro de 1953) para sempre as barreiras do medo da escravidão e da es-
cravidão do medo «gritando o fim da s.olidão da era do
silêncio».
Para vós ca?"rascos
O perdão não tem nome
A justiça vCllÍ soar .. . CELA NON VUGU
Num mundo sem peias
Onde a liberdade é a pátria dos homens.
Um povo em marcha que avança, despontando na manhã
radiosa de todos os campos floridos, despertou para a acção,
acção clandestina, organizada, até ao momento histórico
Desmistificado o carrasco, a poesia é cântico de acusa- em que
ção do povo violentado, mil vezes trucidado
Caminha na dianteira
E vós todos carrascos Para varrer o espectm colonial
Vós todos algozes Da era do crime
Sentados nos bancos dos réus De meio milha?' de séculos
Que fizestes do meu povo? .. .

AOS COMBATENTES DA LIBERDADE


o tribunal do povo, a história do povo é um cântico
de punhos cerrados contra a violência colonial. Os corpos «Onde quer q;ue me encontre a mm' te) bem-vinda seja
dos homens tombados nos matos da morte não admitirão eZa) se encontrar O'utros O'uvidos receptilvos) q.ue captem a
mais mártires indefesos. De pé, os heróis vivos não admi- minha vOZ e novOs cânticos de gZória se levantwrão. » Che
tirão jamais a eliminação dos seus filhos. Guevara.
Aos combatentes da liberdade, tombados pela justa luta
Nunca mais, nunca mais terra liberta dos povos, ou que se ergueram destemidamente como braço
Consentiremos o extermínio do povo soberano . armado do povo em todos. os continentes e particularmente
no continente africano, onde páginas da cor do sangue en-
«Non na cá pô chunchintxi 53 bilá bi fá » traram na história como documentos vivos.

22 23
Ao Camarada Amílcar Cabral, à Camarada Deolinda E as últimas balas coloniais
Rodrigues esta homenagem póstuma de solidariedade mili- Sepultaram o colonialismo
tante. No cadafalso do Povo
Herói é um povo em marcha pela liberdade.
Seis de Setembro de 1974 na nossa pátria heróica, mais Mas eterna na perenidade do tempo
um passo determinante na marcha do povo pela liberdade.
Ê a alavanca do reconstruir
A experiência dum massacre provou que a força do povo
Desmontando tronos seculares
é arma potente de combate.
Injustiças cavadas nas montanhaS
«A independência é a gW1·ia dos heróis Levantando das ruínas dos pântanos
No sacrifício diário do Homem vigilmnte Um povo em marcha que avança
Unido a setenta mil) massa do povo»

Um povo em marcha que avança na Reconstrução Nacio-


Mamã Catxina representa as centenas de mulheres, que nal construindo com as suas próprias mãos uma sociedade
exigiram do governo colonial o reconhecimento da van- nova, liberta da exploração do homem pelo homem .
guarda do povo, o MLSTP, como único interlocutor válido
do povo de S. Tomé e Príncipe a 19 de Setembro do ano
de 1974. o Autor
Mamã Catxina entrou na revoZ,ução
Viva dezanove de Setembro
Viva a marcha de protesto das mulheres
Sacudindo o papão colonial

Na hora do povo em marcha


Não desistÍ'r
Não recuar
Não recuar uma polegada
Ceder
"Ê a marte da vida
Em matrcha
Pela liberdade

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· S. TOMÉ E PRíNCIPE

Milhas marinhas ao longo da costa africana


Envolvendo palmares, obós, pães de açúcar
Acidentadas ilhas do Amador
ilhas acidentadas da Guerra do Mato
Terreiro da luta da resistência
Três séculos, guerrilhas de escravos
Resistentes da luta colonial
Etapa primeira da resistência nacional
Abalando os alicerces do feudo colono
O ciclo do AmadOr é o prelúdio da história do povo
[gigante
Gigante 'DO paradoxo dimensional da terra
Navios negreiros, fantasmas da rota atlântica
Tubarões sugadores de negros escravos empilhados
N os porões da morte dos donos do ocidente
Engenhos de açúcar, cana sacarina
Museus diluídos na leva para o Brasil .
A fonte tropical brota fértil
N o cacau colono do grande capital
A Ãfrica é fértil em mercado escravo

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E o negro slogan é sempre a grande criança Movimentação cultural nascente no país
Das lendas europeias Sinal seguro ligado ao exterior.
Alforria - a carta sensação - Caxias e pides encurralam resistentes
Liberta escravos Para sustar a chama em labaredas
Transporta escravos em mascarada confusão Ligada à luta aberta na tribuna internacional.
Escravos ilhéus precisam do poisio Luta surda, labareda extinta pela potência colonial
«E a metrópole colonial é pródiga e magnânima » Surge dinamizada para a independência nacional
Evolução do processo histórico MLSTP vanguarda do povo
Clama em revolta pelo fim da escravidão Lanterna dinâmica na hora da lu ta.
A revolta persistente faz história Batalha no acordo de Argel
E nas décadas do século finda o poisio Libertando a Pátria
Rusgas várias são tentadas contra o forro Na data histórica de doze de Julho
E o forro riposta contra as rusgas Ignorando a vanguarda do povo
Resistência Santomense tem um fim A imprensa lança vozes, lança vozes
~ão ceder ao contrato escravo das roças do cacau «Mini-estado» nadando em terras colonas
E um massacre é resposta à resistência O Capital é senhor potentado
Cinquenta e três é a resposta à resistência Oitenta dias passados
Mil homens tombados O povo inteiro da pátria soberana
A câmara de asfixia Em directa democracia.
As correntes e algemas ~acionaliza terras e o solo da nação
As casas queimadas Setembro 30 na História
Marcam início da fase nova da resistência É princípio soberano
~avios colonos rumando pelas TIhas Duma batalha económica
Levam jovens emigrando conscientes. Enterrando a exploração.
As lanternas dos jovens são estrelas Batalha da produção
Desembarcando na metrópole colonial. Consciência da nação
Um a um lentamente sem estrondo A luta da reconstrução
Caminhando vão para a senda do exílio Dura batalha, consciente,
Semeando a resistência organizada É luta armada do povo
Na célula do povo do interior. Contra o jogo da exploração.
A. vanguarda do povo destemida M~11? presente
Determina segunda fase da resistência nacional. Conduz a força do povo

28 29
POEMAS DA JUVENTUDE
N a dura, batalha dura
Afogando a exploração.
Da ponta norte TIhéu Bombom
à Ponta meridional
Da passagem do equador
Amador - MLSTP
Vitória da Resistência
Do heróico povo Santomense

A jornada avizinha-se dura e sangrenta


Um longo canto de punhos cerrados
Será a resposta do homem aos tubarões dos mares

(VOZES DAS ILHAS)

30
VOZES DAS · ILHAS

Sobre o mar das nossas terras, por sobre a tormenta


Paira o espectro da incerteza
Nas nossas mãos erguendo-se temerosas
à espera dum gesto, duma harmonia
A pautar os nossos longos passos
Através da jornada que se avizinha dura e sangrenta.
Ai, longos caminhos da minha terra, longos caminhos da
[terra amada.
A angústia reside permanente nos nossos olhos, à espera
[dos primeiros passos.
Nessa hora breve como aurora, rompendo por cima das
[nossas cabeças
Terra amada, a tua oferenda será um longo holocausto
[dos teus filhos
O mar dos tubarões vai rugir forte, terra amada.
Do teu ventre cm brasa a semente surgirá, Mãe terra.

33
Teus filhos, gerados na dor · e na passividade, saberão LÃ NO ÁGUA GRANDE
[por fim o seu destino
Mas até o acertar dos passos, Mãe, um rio de loucura
[há-de estuar.
Praias da minha terra, grotas perdidas nos obós distantes
Já ouço o canto angustiado do ossobô a semear a
[tormenta
E o misterioso grito da conóbia em seus 1011gos agouros.
Mas o homem dos trópicos de mãos levantadas vai
[redimir a gleba.
O canto do silêncio, um longo canto de punhos cerrados
Será a resposta do homem aos tubarões dos mares.

Lá no «Água Grande» a caminho da roça


negritas batem que batem co'a roupa na pedra.
Batem e cantam modinhas da terra.

Cantam e riem em riso de mofa


histórias contadas, arrastadas pelo vento.

Riem alto de rijo, com a roupa na pedra


e põem de branco a roupa lavada.

As éríanças brincam e a água canta.


Brincam na água felizes .. .
Velam no capim um negrito pequenino.

E os gemidos cantados das negritas lá do rio


ficam mudos lá na hora do regresso ...
Jazem quedos no regresso para a roça.
34 35
ILHA NUA

Coqueiros e palmares da Terra Natal


Mar azul das ilhas perdidas na conjuntura dos séculos
Vegetação densa no horizonte imenso dos nossos sonhos.
_. : .
Verdura, oceano, calor tropical
Gritando a sede imensa do salgado mar
. " .. ,...
No deserto paradoxal das praias humanas
Sedentas de espaço e de vida
Nos cantos amargos do ossobô
Anunciando o cair das chuvas
Varrendo de rijo a terra calcinada
Saturada do calor ardente
Mas faminta da irradiação humana
TIhas paradoxais do Sul do Sará
Os desertos humanos clamam
N a floresta virgem
Dos teus destinos sem planuras

'37
EM TORNO DA MINHA BAíA

Aqui, na areia,
sentada à beira do cais da minha baía
... ..~ - do cais simbólico, dos fardos,
das malas, da chuva
caindo em torrente
"
sobre o cais desmantelado,
caindo em ruInas
eu queria ver à volta de mim,
nesta hora morna do entardecer
no mornaço tropical
desta terra de África
à beira do cais a desfazer-se em ruínas,
abrigados por um toldo movediço
. ... .. . . uma legião de cabecinhas pequenas,

",' 30'
à roda de mim, o MUNDO DA CRIANÇA
num voo magistral em torno do mundo
desenhando na areia
a senda de todos os destinos
pintando na grande tela da vida
uma história bela
para os homens de todas as terras
ciciando em coro, canções melodiosas Criança do meu país
numa toada universal sem fronteiras
num cortejo gigante de humana poesia Dentro de mim
na mais bela de todas as lições: Na minha mente
Eu alimento um sonho
Um sonho cheta de luz
HUMANIDADE de flores e de alegria.

Eu quisera poder
lançar o meu sonho
[inteirinho
no papel.
Eu quisera saber
escrever para ti
Numa linguagem .
que batesse directamente
De encontro ao teu '
[entender.

Que o meu sonho


fosse para ti
A compreensão plena
Duma mensagem de vida
Que abrisse as lanternas
Dos teus olhos apagados.

40 41
Criança minha
PARA A TÂNIA
Gerada de milhares
de ventres
Das raízes do mundo
Eu queria escrever
para ii.

Eu jUl'O à vida
Que enquanto
Um sopro de vida consciente
Palpitar dentro de ' mim
Eu prosseguirei
No meu sonho
De t entar
Con struir para ti
Uma história bela.

Mas eu desejaria
Que essa história
Se concretizasse
No tempo e n~ espaço: Nesta noite morna de luar africano
Espalhar ventura Salpicando de sombras as estradas
Ás mãos cheias Eu estendo os meus braços sedentos
Pelas cri~nças Para a nossa mãe África, gigante
,.
Seria um g;~1Já~: " " E ergo para ti meu ca'n to sem palavras
passo em frente, Suplicando bênção da terra
Duma existência Para as vias dos teus caminhos
Válida e constr~tiva" Para a rota do destino imenso
Traçado na inteireza ~ todo o teu ser
Para ti, a projecção das nossas estradas
Varridas da impureza dos dejectos inúteis
Para ti, o canto de glória
Da nossa Mãe África dignificada.
42"
'43
HUMANIDADE

Quando o homem ele todos os planetas


For capaz de se revelar
à altura do outro ser humano

N o ciclo da existência
E compreender,
Compreender
Que todos os seres vivos
São iguais
No nascimento na morte
E nas estruturas físicas
Que compõem a humanidade

45
,

Nesse dia, será uma festa eterna PARA LÃ D..APRAIA ·


E o sol
Rodará finalmente
 volta de todos os continentes.

Compreender será então:


Dar vida real
A todos os seres dos planetas viventes

Planetas chamo eu
Às esferas huma11as .,
Sem corredores estanques

Baíii morel1ada iléissa tert~a ·


vem beijai- os pezinhos agrestes
das nossas praias sedentas, · · .
e canta, baía minha,
os ventres inchados
da minha infância,
sonhos meus ardentes
da minha gente pequeila
lançada na areia
da praia morena
gemendo na areia
da Praia Gamboa.

Canta criança minha


teu sonho gritantc
na areia distante
da praia morena.

46 47
Teu tecto de andala ANGOLARES
à berma da praia
teu ninho deserto
em dias de feira,
mamã tua, menino,
na luta da vida.

Gamã pixi à cabeça


na faina do dia
maninho pequeno, no dorso ambulante
e tu, sonho meu, na areia morena
camisa rasgada,
no lote da vida,
na longa espera, duma p€rna inchada

Mamã caminhando p'ra venda do peixe Canoa frágil, à beira da praia,


E tu, na canoa das águas marinhas panos presos na cintura,
- Ai peixe, à tardinha uma vela a flutuar ...
na minha baía Caleima, mar em fora
mamã minha serena Canoa flutuando sobre as procelas das águas,
na venda do peixe lá vai o barquinho da fome.
pela luta da fome Rostos duros de angolares
da gente pequena. na luta com o gandú
por sobre a procela das ondas
remando l remando
no mar dos tubarões
p'la fome de cada dia.
Lá longe, na praia,
na orla dos coqueiros
quissandas em fila ,
abrigando cubatas, izaquente cozido
izaquente cozido
em panelas de barro.
48 49
Hoje, amanhã e todos os dias AVõ MARIANA
espreita a canoa andante
por sobre a procela das águas.
A canoa é vida
a praia é extensa
areal, areal sem fim,
Nas canoas amarradas
aos coqueiros da praia
O mar é vida.
p'ra além as terras do cacau
nada dizem ao angolar
«Terra tem seu dono» Avó Mariana, lavadeira
dos brancos lá da Fazenda
E o angolar na faina do mar, chegou um dia de terras distantes
Tem a orla da praia com seu pedaço de pano na cintura e ficou.
as cubatas de quissandas Ficou a Avó Mariana
as gibas pestilentas lavando, lavando, lá na roça
mas não tem terra. pitando seu jessu
à porta da sanzala
P'ra ele, a luta das ondas, lembrando a viagem dos seus campos de sisaI,
a luta com o gandú
p'ra ele, a luta das ondas, num dia sinistro
a luta com o gandú p'ra ilha distante
as canoas balouçando no mar onde a faina de trabalho
e a orla imensa da praia. apagou a lembrança
dos bois, nos óbitos
lá no CubaI distante.

Avó Mariana chegou


e sentou-se à porta da sanzala
e pitou seu jessu
lavando, lavando
numa barreira de silêncio.

50 51
- Os anos escoaram CACAU COLONO
lá na terra calcinante
- «Avó Mariana, Avó Mariana
é a hora de partir.
Vai rever teus campos extensos
de plantações sem fim ».

- «Onde é terra di gente?


Velha vem, não volta mais
Cheguei de muito longe l
anos e mais anos aqui no terreiro .. .
Velha tonta, já não tem terra
Vou ficar aqui, mini no tonto». Nossos irmãos de Angola
De Angola e Moçambique
Avó Mariana pitando seu jessu Penaram 30 anos de ' vida
!la soleira do seu beco escuro, Nas roças de cacau
conta Avó Velhinha Dos feudos de S. Tomé.
teu fado inglório.
Viver, vegetar Cacau
à sombra dum terreiro Cacau
tu mesmo Avó minha Café
não contarás a tua história. Para os donos de S. romé
Avó Mariana, velhinha minha, Cacau
pitando teu jessu Cacau
na soleira da sanzala Café
nada dirás do teu destino Inferno de S. Tomé
Porque cruzaste mares, avó velhinha,
e te quedaste sozinha. Cacau
Cacau
Café
Inferno de S. Tomé

52 53
Pelo cacau colono PAGINA DO LIVRO DO CURSO
Mão de obra em S. Tomé de
Na morte de S. Tomé Amílcar Lopes Cabral

Rusga pelo cacau


Nos anos 30
Massacre pelo cacau
Cinquenta e três

Cacau
Fechou as ilhas
Encurralou
Enquistou

Não abrir o quisto!


Não abrir o quisto!

Se eu fosse Pitoniza
Terrível deusa da Sina
Tangeria p'ra você
Um conto que eu vou narrar

N as asas do seu sonho de poeta


N o devaneio de toda a gente
No canto-esperança
Da moça gente
Vibra o hino do ' porvir
Preso à lira da vitória

A lira é fonte de esperança


É devaneio em sonho
Nas asas do pensamento

54 55
o sonho é futuro Vejo a Ãfrica
Futuro é o ideal Em busca de seus filhos
N a alma dÇL gente moça Vejo-a a pedir vida
A chorar longe ...
o ideal é sorriso de vida
Ê:rasgar de sonhos p'ra você eu deixo o canto da Terra
E é viver Esse cantar de esperança
Deixo-o em busca
Da mensagem da Raça
P'ra você Amílcar
N a senda do seu viver
N o final do curso
Continuo tangendo
A lira de profetiza

Nas plagas sem nome


Das terras do Mar de Além
No canto tropical
D'águas marinhas
De terras de Ãfrica
Eu transmito em conto
A mensagem de choro
Da terra quente

Na música longe do poente


Sinto chamar na voz do vento
Sinto o soluço da terra
Chamando gente p'ra acalentar

Na voz longínqua
Vejo a prece do Mar
A chamar, a gemer

56 57
LUAR AFRICANO

O luar, o imenso luar das nossas terras dos trópicos


Batendo em cheio nas nossas praias
Lançando as sombras dos sensuais coqueiros altaneiros
N as estradas claras das nossas llhas de sonho
Segue nos caminhos o viandante de bordão na mão
Caminhando à luz plena das lanternas mágicas dessas
[noites de feitiço
Estende o manto prateado por sobre os bananais
[balouçantes
E penetra nas frinchas dos nossos casinhotos, mofando
das candeias dispersas
Enchendo de sombras as esteiras esparsas das nossas
[noites sem sonhos
Bafeja ainda o nosso irmão pequeno fazendo contas à
[luz do azeite

59
E desce até à fruteira onde o pai sentado, medita em CHIQUITO
[silêncio
Nas pinhas de andim deitadas na canoa
Salsadas na manhã nascente pela mãe do grupo
Desce ainda, luar da minha terra, sobre o Marinho
Pensando na Rita da Sam Bonita
E nas fainas a vencer para amigar
Penetra mais fundo luar nas nossas vidas
E fala de todos os nossos sonhos
Alertando o conflito da nossa inquieta esperança.

Chiquito rebelde da beira da praia


Chiquito rebelde lançando o anzol
N a água do rio
Não tem escola.
Chi quito rebelde não tem escola
A ponte do cais
Nas horas soturnas
É escola do Chico
Com o bando rebelde
Sem escola
Nem casa
No frio do cais,
60 61
Chiquito rebelde DESCENDO O MEU BAIRRO
Sacola na mão
Arame pescando
A isca do carro.
Nem mar
Nem rio
Chi quito furtando
Chiquito mentindo
Chiquito
Ê um grito
Vibrando na noite
Eu vou trazer para o palco da vida
Chamando o adulto
pedaços da minha gente,
Chamando chamando
a fluência quente da minha terra dos trópicos
Chiquito ... Chiquito .. .
batida pela nortada do vendaval de Abril.

Eu vou descer à Chácara


Subir depois pelos coqueiros do pântano
ao coração do Riboque,
onde o Zé Tintche, tange sua viola
neste findar dum dia de cais
com gentes de longe
na Ponte Velhinha
num dia de passageiros.

E vou subir dum lado ao outro da estrada barrenta


com gentes sentadas nos caminhos
vendendo cana, jaca e maguita tuatuá
com uma candeia acesa em cada porta
aproveitando o lucro, na gente que desce,
que sobe e desce
com policiais parados,
à espreita da briga certa

62 63
neste bairro populoso, onde há-de chover em caudal
onde nos juntamos à porta a água estuante do nosso bairro Riboquense,
no findar de cada dia. filho da população heterogénea
brotada pela conjuntura
Vou recordar ... duma miscelânea curiosa
As farras onde se bebe e dança, de gentes das áfricas mais dispares,
da África una dos nossos sonhos
os ritmos estuantes da nossa gente,
de meninos já crescidos.
cabeças juntinhas num ritmo maluco
e a festa linda do Carnaval passado
com «Rosa Branca» tangendo viola
seguido de povo, rindo e cantando
como só a gente topa
no burburinho
do nosso bairro antigo,
onde a gente de carro passa a ver
o formigar do nosso ritmo estuante,
até no futebol
do grupo bulhento
juntinho ao domingo
na folga da tarde,
juntando gente como milho
a mirar a nossa vida e a ver,
num vaso oco de barro
escoar o nosso bairro
onde bem lá juntinho ao mato,
passa o sopro dum socopé de gozo
e os ritmos arrepiantes
dum batuque de encomendação
p'lo Mé Zinco
que a vida não ajuda
a descer a ladeira
rumo ao chafariz novo

64 65

"
ESTRELA DE ÁFRICA

1]m dia já, lá vão muitos anos


Eu no balbuciar da vida o • •

Tu , mais adulto, Luís


Mas desconhecedor das riquezas do nosso continente
Pois os horizontes eram densos c obscuros
Nada conhecíamos sobre a África milenária o • •

Tu sonhavas um porvir para o teu povo


Mas partias do zero, da incógnita do futuro o • •

Tu disseste eu lembro bem o • •

«Somos um povo sem história,


Sem filosofia própria ...
Tudo temos de construir . .. »
Anos volvidos, tu já não estavas presente junto de nós
A tua vitalidade, o amor imenso pela tua Terra
A mensagem a transmitir pela tua vontade criadora
Tinha sido vencida pela morte cruel
No silêncio imenso da vida tombada o • •

E paradoxalmente descortinava-se diante de nós


A possibilidade de conhecermos as nossas lendas
A filosofia do nosso povo

67
o seu passado, uma civilização Nas plagas onde afirma
Sustada pela ambição do invasor A sua presença real
Os nossos provérbios, as vozes Na estrada da vitória plena
De Guillen, de Césaire, Diop Ou na arena onde o sangue irmão
A luta pelo lugar ao sol Rega a terra com o sangue
De Jean Jacques Roumain dos seus filhos mártires ..
o

O alvorecer de países novos Repara irmão o o o

de Ãfrica. «Ao longo do caminho da vitória


A luta heróica dos Argelinos Tombaram já num silêncio de arrepios
Até à vitória final Muitos nomes a juntar a milhões
Sékou TOUl'é, Ben BeBa, N'Krumah Tombados desde a era das galeras
Patrice Lumumba E dos grilhões da escravidão
Nomes gigantes da história do nosso povo Aos mortos tombando dia a dia
As lutas sangrentas do Congo Ao longo do continente em chamas
E a tragédia da Nigéria dividida o o o
Teu nome eu o escrevo ao lado desses mártires
Vitórias e desacertos, irmãos
Ao longo da história do nosso povo
Após as horas da escravidão
Seria belo o coro das mãos unidas
Mas o joio espalha-se sempre por entre a Seara
Ao longo da história de todos os povos.
E os nossos desacertos são semelhantes
Às tragédias de todos os povos do mundo na fase da
[ construção
Entretanto, irmão, uma estrela desponta
lá longe o ••

A nós irmãos, resta-nos sermos os sacrificados


Um futuro rasga-se.
Que esse futuro seja a história
dos nossos filhos dignificados.
A tua vontade imensa de engrandecer o continente
Está patente no homem africano

68 69
NATAL NA ILHA

Ao cair da tarde, pelas estradas da TIha


Cabaninhas de andala
Tecidas por dedinhos de garotos,
Ê a nota tocante do N ataI.
Uma tocha de mamão
Ê o luzeiro no caminho
A alumiar o «passo».

II

Mas o exotismo dos trópicos


Descendo sobre o calendário dos festejos
Faz do «Djá Chinja» a festa da família.
Quarta-feira de cinzas,
Ê cara ao coração da nossa gente,
Onde se sente a ausência dos finados.
Na hora do «angú»
Do clássico calulu de peixe
Todos se juntam,
Nas roças, nas gratas, nos ermos mais perdidos
Em redor da mãe velhinha,
Da avó de carapinha branqueada
Na tradição festiva do «BOCADO»

71
III SE ESTA ESTRADA FALASSE

P'las mãos dessa velhinha solene


Todos, todos, recebem p'la mesma colher
Numa união feliz e africana
A primeira colherada
Do menu familiar.
E só então, a refeição começa.
A toda hora, pelo dia fora
Vem chegando gente
P'ro sagrado «BõCADO» do «Djá Chinja»
E a noite desce nas roças mais longínquas.
E no calor da tarde finda
Fica por terra o «BõCADO »
Noite quieta na Chácara ...
Do avô extinto no ano que passou
Um imenso luar neste remanso
E da filha arrancada à vida
Motorizadas deslizam de longe em longe pela estrada
Em plena mocidade.
O posto emissor local lança no ar uma música do
Cinzas ... Natal ... exotismo dos trópicos? .. ,
[folclore da ilha
- Uma pergunta e uma resposta pairam nos ares.
O cerrado das palmeiras da Vila Louro imprime a nota
[tipica da floresta tropical
Nos quintais já se não ouve as risadas sãs dos viveiros
[de crianças
Sós todo o dia brincando com o barro
No~ densos casarios cozidos com o mato, a população já
[dorme
O silêncio da noite empresta aos rumores dispersos a
[sua verdadeira significação
Madrugada alta passarão na estrada a pé em
[camionetes das obras
Trabalhadores das estradas, marçanos, palaiês
Todo um povo madrugando para as lides do dia que
[desponta

72 73
A canzoada ladra em coro nos quintais POEMA MENSAGEM
N a quietude da estrada
Um ou outro par arrula nos caminhos
Olvidando a hora do repouso
E a estrada coleante vai tragando os passos dos
I caminhantes
E desfazendo os sulcos dos veículos ...
Ai, se a estrada 'não desfizesse os sulcos
Quanta coisa contaria essa estrada de sete milhas
Ligando a cidade à Trindade ...
Quanta coisa não contaria o papa-léguas da estrada
Mas a estrada emudece e guarda tudo consigo
Pois se até o alcatrão veio tirar o pó dos caminhos de
[outrora '"
Ai se esta estrada falasse
Se esta estrada falasse .. ,

Não gritaremos mais


Os nossos cânticos dolorosos
Prenhes de eterna resignação
Outro canto se elevará, Irmãs
Por cima das nossas cabeças

74 75
NO MESMO LADO DA CANOA

As palavras do nosso dia


são palavras simples
claras como a água do r egato,
jorrando das encostas ferruginosas
na manhã clara do dia a dia.

É assim que eu te falo,


meu irmão contratado numa roça de café
meu irmão que deixas teu sangue numa ponte
ou navegas no mar, num pedaço de ti mesmo em luta
[com o gandú
Minha irmã, lavando, lavando
p'lo pão dos seus filhos,
minha irmã vendendo caroço
na loja mais próxima
p'lo luto dos seus mortos,
minha irmã conformada
vendendo-se por uma vida mais serena,
aumentando afinal as suas penas .. .
Ê para vós, irmãos, companheiros da esLrada
o meu grito de esperança

77
requebrando loucamente suas cadeiras
convosco eu me sinto dançando
soltando gritos desgarrados,
nas noites de tuna
palavras, gestos,
em qualquer fundão, onde a gente se junta,
na loucura dum rito secular.
convosco, irmãos, na safra do cacau,
convosco ainda na feira,
Neste lado da canoa, eu também estou irmão,
onde o izaquente e a galinha vão render dinheiro.
na tua voz agonizante, encomendando preces, juras,
Convosco, impelindo a canoa p'la praia
juntando-me convosco
rmaldições.
Estou aqui, sim, irmão
em redor do voador panhá
nos nozados sem tréguas
juntando-me na gamela
onde a gente joga
vadô tlebessá
a vida dos nossos filhos.
a dez tostões.
Estou aqui , sim, meu irmão
no mesmo lado da canoa.
Mas as nossas mãos milenárias
separam-se na areia imensa
Mas nós queremos ainda uma coisa mais bela .
desta praia de S. João Queremos unir as nossas mãos milenárias,
porque eu sei, irmão meu, tisnado como eu p'la vida, das docas dos guindastes
tu pensas irmão da canoa das roças, das praias
que nós os dois, carne da mesma carne numa liga grande, comprida
batidos p'los vendavais do tornado dum pólo a outro da terra
não estamos do mesmo lado da canoa. p'Ios sonhos dos nossos filhos
para nos situarmos todos do mesmo lado da canoa
Escureceu de repente.
Lá longe no outro lado da Praia E a tarde desce . __
na ponta de S. Marçal A canoa desliza serena,
há luzes, muitas luzes rumo à Praia Maravilhosa
nos quixipás sombrios . __ onde se juntam os nossos braços
O pito dóxi arrepiante, em sinais -misteriosos e nos sentamos todos, lQ,do a lado
convida à unção desta noite feiticeira __ _ na canoa das nossas praias.
Aqui só os iniciados
no ritmo frenético dum batuque de encomendação
aqui os irmãos do Santu
79
«ÀS MULHERES DA MINHA TERRA»

Irmãs, do meu torrão pequeno


Que passais pela estrada do meu país de África
É para vós, irmãs, a minha alma toda inteira
- Há em mim uma lacuna amarga -
Eu queria falar convosco no nosso crioulo cantante
Queria levar até vós, a mensagem das nossas vidas
Na língua ma~ernal, bebida com o leite dos' nossos
[primeiros dias
Mas irmãs, vou buscar um idioma emprestado
Para mostrar-vos a nossa terra
O nosso grande continente,
Duma ponta a outra. '
Queria descer convosco às nossas praias
Onde arrastais as gibas da beira-mar
Sentar-me, na esteira das nossas casas,
Contar convosco os dez mil réis
Do caroço vendido
Na loja mais próxima,
Do vinho de palma
Regateado pelos caminhos,
Do andim vendido à pinha,
Às primeiras horas do dia.

81
G
Queria também N a nossa cozinha
Conversar com as lavadeiras dos nossos rios De «vá plegá» ...
Sobre a roupa de 'c ada dia
Sobre a saúde dos nossos filhos A nossa terra é linda, amigas
Roídos pela febre E nós queremos
Calcurreando léguas a caminho da escola. Que ela seja grande ...
Ao longo dos tempos! .. .
Irmã, a nossa conversa é longa. Mas é preciso, Irmãs
E longa a nossa conversa. Conquistar as llhas inteiras
Através destes séculos De lés a lés.
De servidão e miséria ...
Amigas, as nossas mãos juntas,
E longa a estrada do nosso penar.
As nossas mãos negras
Nossos pés descalços
Prendendo os nossos sonhos estéreis
Estão cansados de tanta labuta
Varrendo com fúria
O dinheiro não chega
Com a fúria das nossas «palayês»
Para vencer a nossa fome
Das nossas feiras,
Dos nossos filhos
As coisas más da nossa vida.
Sem trabalho
Engolindo a banana sem peixe Mas é preciso conversar
De muitos dias de penúria. Ao longo dos caminhos.
Tu e eu minha irmã.
Não vamos mais fazer «nozados» longos Ê preciso entender o nosso falar
N em lançar ao mar Juntas de mãos dadas,
Nas festas de Santos sem nome Vamos fazer a nossa festa
A saúde das nossas belas crianças,
A esperança da nossa terra. A festa descerá
Ao longo de todas as vilas,
Uma conversa longa, irmãs. Agitará as palmeiras mais gigantes
Vamos juntar as nossas mãos E terá uma força grande
Calosas de partir caroço Pois estaremos juntas irmãs
Sujas de banana Juntas na vida
«Fermentada» no «macucu » Da nossa terra

82 83
Mas é preciso conhecer Vamos vencer nosso medo
A razão das nossas secretas angústias. De sermos sós na terra imt:nsa.
Procurar vencer Irmãs J amais estaremos solitárias ...
A fúria do rio Porque a nossa força há-de crescer.
Em dias de tornado E então conquistaremos
Saber a razão para nós
Encontrar a razão de tudo para os filhos gerados no nosso ventre,
«Os nossos filhos N as nossas horas de Angústia
O nosso filho morreu - Para nós -
Roído pela febre » A nossa bela terra
Muitos pequeninos No dia que se avizinha
Morrem todos os dias Saindo das nossas bocas,
Vencidos pela febre Urna palavra bela
Vencidos pela vida ... Bela e silenciosa
A palavra mais bela
Não gritaremos mais Ciciada no nosso crioulo,
os nossos cânticos dolorosos A palavra sem nome
Prenhes de eterna resignação ... Entoada no silêncio
Outro canto se elevará Irmãs, Num coro gigante
Por cima das nossas cabeças. Correndo ao longo das nossas cascatas,
Vamos procurar a razão. Das cachoeiras mais distantes,
A hora das nossas razões vencidas O canto do silêncio, Irmãs
Se avizinha. Há-de soar
A hora da nossa conversa Quando chegar a Gravana.
Vai ser longa. E por hoje, Irmãs
De roda do caroço Aguardemos a gravana
De roda das cartas Ao longo das nossas conversas
escritas por outrém, No serão das nossas casas
Porque a fome é grande sem nome.
E nós não sabemos ler.
Não sabemos ler, irmãs
Mas vamos vencer o medo.

84 85
o CANTICO DO NOVO DIA

Juntos cantaremos
O cântico dum novo dia,
A tua voz, bem pertinho
à minha,
Iremos desbravar a terra calcinada
Levando às braçadas
O barro dos nossos morros,
A verdura dos nossos campos densos,
A água corrente das nossas ribeiras,
Para as canoas de andim
Os braços ritmados
Das lavadeiras dos nossos rios,
Na esfrega pelo pão de cada dia
As vozes dos nossos irmãos
Das praias do «gandu »
Lutando com a caleima
Em dias de tornado,
Os coros dos meninos
Das escolas de mato
As vozes ritmadas do trabalho

87
Nos dias calcinantes TRINTA E UM DE JULHO
Para erguer do nada
«DIA DA MULHER AFRICANA»
A vida plena
Entoando a melodia
Dum mundo sem barreiras
Tangendo marimbas
N os rifles acossados
Desfazendo miragens.

Tu, meu irmão identificado


N a luta pelo pão de teus filhos
Vais erguer em rebelião ardente
A tua bandeira vitoriosa
Ao longo dos anos da escravidão
Exigindo ao homem
Na história das plantações
Do outro lado da linha
Das sevícias dos donos da terra
O pão, o amor e a liberdade
Mãe preta curvada ao jugo do senhor
Para todos os caminhos.
Nas galeras sulcando os continentes
Pilando milho num silêncio de séculos.
Nessa hora, meu irmão
Mãe negra arrastando os grilhões
Iremos cimentar os alicerces
Dum servilismo atávico
Das nossas vidas
N a história dos homens
E erguer do braseiro, o nosso país
De África
Mãe negra eterna
Num ritmo de tam tans e quissanges
Dos teus filhos morrendo
A vida, a paz e a liberdade
Morrendo todos os dias
N a grande batucada
Para erguer os padrões de civilização milenares
Da pátria libertada.
Mãe negra emparedada
Ao longo das correntes
De um patrão, seu senhor
Mãe negra, sentada à porta da tua cu batn
Contemplando os filhos do teu ventre

88 89
Vitimados todos os dias nas minas do Rand
N as areias movediças de todos os desertos
Criados pelas forças do Ocidente
No velho continente.

Todos os dias, todos os dias


Teus filhos tombam
Empapando de rubro o duro barro africano
Mãe negra, sentada num banco tosco
Da tua cozinha de andala POR ENTRE OS MUROS DA REPRESSÁO
Onde não chegam as notícias do mundo
De filhos teus lutando pelo Sol
Pelo sol ideal da liberdade
Em terras de África

Mãe negra, vendida, encurralada


Sofismada nas velhas cidades coloniais
Desperta, mãe africana
E transforma em antenas
Teus ouvidos.

Hoje, trinta e um de Julho


É o dia da mulher africana

Juntemo-nos todas, minha irmã, num só elo A PALAVRA ~ ARMA DE RESPONSABllÃDADE


Duma ponta a outra da terra africana
E varramos em catadupas as injustiças das nossas terras
E façamos do nosso dia
A aurora da liberdade
Da terra africana.

,90
BOATO

A noite da ignorância e da insegurança


Gera as ondas do boato.
Boato é lenda terrível
A entravar o progresso
Boato é também complexo de culpa
Boato é espada de dois gumes
Boato é arma reaccionária
Denunciar o boato
é combater
De armas na mão.
A palavra
é arma de responsabilidade
Fomentar a ignorância
é
Crime contra o povo.
Valorizar é esclarecer
O trabalho com o povo
E pelo povo
É certeza na vitória

93
SENHOR BARÃO

Senhor Barão
Chegou na ilha
Saquitel "de três vinténs
Enterrando na terra barrenta
A bengala histórica
Donde surgiria
A árvore das Patacas
- Lenda do cacau
Escrevendo a história

O cacau subiu
Encheu bolsas
O Senhor Barão
Vem descendo a Casa Grande
Enxotando os moleques do terreiro
Montando cavalo alazão
N o giro das dependências
Descendo à cidade
Recebendo vénias
Mais vénias
«Senhor Barão . ""»
«Senhor Barão»

95
Pudera Senhor Barão RESPOSTA
Carros da roça
Descendo à cidade
Pousando «quales»
E mais «quales »
Nas Casas dos Grandes.
Pudera Senhor Barão
Criando praias
Para deleite
da Alta
Na banda dos coqueiros
Afogando no mar dos tubarões
Os suadores do cacau.
Em ti vibra o nosso
Pudera Senhor Barão! .. .
querer conjunto
E as nossas mãos juntas
Mas cuidado gentinha .. .
afinal mãos milenares
Senhor Barão tem imitador
Dão força ardente ao nosso coro
na terra.
Do progresso do carro
Nós vivemos os mesmos anseios
Do bikini da praia
Olhamos para a nossa Mãe Terra
Contemplando patrício atrasado
E na força do seu olhar
Sem ter carro
volvido para a fome
Nem bikini
Dos séculos que lateja ...
Nem disciplinar em Luanda
Que lateja dentro de nós
Cuidado gentinha
Sentimos mais força
Aí vem Senhor Barão ...
para gritar
Para clamar
• por um mundo
Onde todos nós
agarremos às mãos cheias
As promessas ri dentes
Da luta dum futuro

96 97
7
Tornado presente Perante a nossa inércia.
Pela nossa afirmação constante. Nós levantamo-nos
Do poço da escravidão
Pelas tuas mãos E gritamos fremente s de angústia
eu escrevo nesta noite quente Nós queremos a nossa hora.
Aquecida pela ardência A hora dos nossos passos
da nossa terra tropical A hora das realizações
«A Terra está farta de suportar a
O direito de afirmarmos
injustiça e a dor ... »
o nosso querer
De alargarmos as fronteiras
A terra está farta de injustiça
Das ambições justas
A dor avassala o mundo.
Mas no nosso século levantam-se . Estamos saturados
do húmus da terra Queremos viver
As revoltas imersas no marasmo dos séculos. Sem recalcar as profundas amarguras
Por mais exíguo que seja
O homem luta de pé O pedaço de terra
pela vitória final. Onde jazemos confinados
Mas para muitos a luta não começou ainda Nós queremos lançar ao mundo
As cabeças afocinhadas no fundo A afirmação do nosso querer
dos seus tugúrios E construir um universo
Sem poderem avançar sequer um passo onde tenha lugar o homem africano
Dormem passivos Um mundo
Na passividade morta do desespero. Onde todos os homens
Possam gritar
Quando chegará a hora? Pelo seu pedaço de humanidade.
«Quando chegará a hora
De vencer o medo da escravidão Mas descansa, companheiro
E a escravidão do medo? » As barreiras serão vencidas
Gerações presentes e do futuro As barricadas tombarão por terra.
Dai-nos a resposta dos nossos anseios Embora estejamos cansados
Estamos satu rados de cruzar os braços Da longa espera
98 99
Pelas tuas mãos «DIREITO Ã VIDA»
Eu continuarei clamando
Nesta noite cálida
Deste nosso torrão
Pela noite fora
Até vencermos as trevas
longas
Que ensombram
O nosso querer
Amanhã venceremos
Companheiro! .. . Homem, mensagem da vida
Homem negro, marginal nas páginas da história do Mundo
A verdade é um cruzado votado à margem
Cada homem que se afirma
É homem lançado ao mar ...
N a história do nosso povo
Narrada dia após dia
Há dramas de vida humana
Escritas da cor do tempo
Todos os dias, a toda a hora
Matraqueando, matraqueando se faz História
A máquina da repressão, batendo lenta, batendo forte
Dentro de nós, à nossa volta
A máscara contínua do paternalismo
Cerrando forte as nossas bocas
Nos slogans contínuos da eterna amizade
Vão adulterando, macaqueando as faces dos homens.

N o nosso continente disperso, dividido e enfeudado


Muitos de nós, já caminham ao longo do carnaval da vida
Na procissão fantasma desta hora
Sentindo embora o vulcão queimando os pés.

100 101
Caim e Abel de cada lado ESCOLA DE MENTIRAS
Até quando?
Quando haverá no planeta dos Homens um só sistema? .. .
Nossas mãos lassas estendidas,
Buscam à deriva,
A hora integral dos luares humanos
Para todos, para cada um de nós .
Nossa Ãfrica em chamas
Anseia a paz, a harmonia
o direito à vida.
E nós não estamos
a pedir demais
Caminhar direito nos carris
das linhas tortuosas Crianças das ilhas
Das veredas à beira dos nossos Disseminadas pelas praias
caminhos Através da paisagem humana
Ê uma dura batalha
da realidade
Diária, inevitável nas praias Ê um documento duro e cruel
do continente sem dimensões Atirado sem palavras
à nossa presença humana
De seres adultos.
Mestre-escolas, caducos ou jovens,
Somos todos seres em embrião
Nossa presença é um logro
Lançado nos ilhéus
Das cavernas obscuras,
Onde a carência é real.
Lutamos por números
Pelo ministério de noções,
Tentando preencher as lacunas vazias
dos nossos insucessos.
O insucesso escolar
Ê uma verdade,

102 103
Real como um vulcão Urge aterrar em definitivo
em efervescência. Os pântanos lodosos
O' erro campeia, Onde jazem sufocadas
Perante nossas consciências. As crianças das nossas Ilhas,
Só do zero Para que a escola real
Para a realidade, Não seja uma Escola de M el/f 'i,t as
Matando a fome
Mental e física
Irradia'ndo de luz
A escola inteira, /
Será possível
Remover o caminho da infância.
Desde o berço
Campeia a ignorância mais elementar
Só começando do zero
Poderemos lançar uma afirmação concreta
Está tudo errado
A nossa escola
é o centro da ignorância
Só há tempo de ministrar conhecimentos
Lançando o ópio
A doses aceleradas,
Porque não ensinamos
Não formamos.
Nem sequer há tempo para construir.
Enchemos de vento
Os cérebros da infância
Lançamos
Por cima dos pântanos
Uma camada de areia fina.
E o lodo alaga
A baía das nossas praias.

104 105
AOS COMBATENTES
.'
DA
LIBERDADE

Irmãos do mundo, nós somos guerrilheiros


Das ilhas do mar sem fim
A força da unidade é nossa metralhadora

107
HERóI NACIONAL

Herói não é um homem isolado


Herói é um povo em marcha pela liberdade
A força do herói é a determinação do povo decidido
Saibamos povo irmão
Seguir a trajectória do militante
tombado na hora da repressão
Pela vitória da liberdade
Seis de Setembro não é um dia de tristeza
Ê o triunfo da luta do povo
Os heróis do povo exigem a continuação
da luta pela reconstrução nacional
A independência é a glória dos heróis
N o sacrifício diário do Homem vigilante
Unido a setenta mil, massa do povo
Olvidando o eu zero à esquerda isolado
Pela ambição pessoal.
Povo de S. Tomé e Príncipe
Esta data nacional
Ê o juramento do povo
Respeitando o sangue dos mártires
Palmilhando o trilho da liberdade,
Pela República Democrática de S. Tomé e Príncipe
Verdadeiramente livre e independente.
S. Tomé, 6 de Setembro de 1975

J 09
«VOZ NEGRA DAS AlvlÉRICA8»

Ângela Davis

Ângela, teu braço erguido


Na trajectória histórica
Abalou conceitos distorcidos.
Fren te à arena
Tua voz erguida
Não sucumbiu
Ecoando perante a força
Das barreiras
Vencidas, pela vida traçada
No esplendor da tua mocidade.
A força da tua vitória
Electrizou o mundo
Duminou as cavernas
Onde irmãs tuas
Doutros continentes
J'azem mergulhadas
Na era da criação

Gritar é a força de um desespero humano,


Ou a certeza duma afirmação
Pela conquista dum direito

111
Gritar é também «DEOLINDA RODRIGUES »
Ver a grilheta férrea
Afogar um ideal
Sem força
P'ra romper o grilhão
Mas gritar
Tem de ser
Uma afirmação
Rompendo as montanhas
da Terra inteira
Pela ressonnâcia
elo grito conscicnte Encruzilhada dos caminhos
Que abala e reforma N a vegetação frondosa da Terra Mãe
Um impasse permanente
N a saga cerrada
dos nossos destinos.
Limitação de fronteiras
Do pensamento
Limitação da varanda
cerrada sobre o mar tropical

Amiga irmã
Pequenina na estreiteza
Dos meus horizontes
Para ti, o meu canto de saudade
Trilhando as arenas
ardentes dum ideal
Caminhaste em frente do futuro
Para vencer a bruma
Que abafava a Terra
Teu corpo caiu na
arena
Da morte

112 113
Mas não foste vencida. REQUIEM PARA AMíLCAR CABRAL
Tuas irmãs de mãos cerradas
Entoam o hino
Que o exemplo da vida viva
Representou tua existência

De pé, Deolinda, eu te saúdo


E sinto-me orgulhosa
De te haver conhecido.
Irmã, a terra mártir
Embebeu teu sangue
Alastrando sobre o continente Inteiro
Como Uma sementeira
Chora terra bem amada
florescente de glória.
O teu filho bem amado
Morto fisicamente
Por balas assassinas
Guevara de África
te batizaram
Dias antes
Da cilada trágica
N a história da terra africana
Teu nome ímpar
apontará aos filhos
do país natal
a dignidade da tua vida
Cimentada com teu sangue
Cimentando com
o sacrifício da existência inteira
a esperança do futuro
Duma terra sem madrasta
As páginas do porvir
Contarão ao mundo

114 115
S. TOMÉ E PRíNCIPE
a força da tua personalidade dinâmica
ao serviço da tua inteligência «6 de Setembro de 1974»
Canalizada
Para os arrozais
da parcela
do golfo enquistado
onde mãe Iva
te doou à terra
Não chores mãe Iva
A terra de África inteira
De pé
A teu lado
Saúda a figura gigante Irmãos de S. Tomé e Príncipe
do Grande Líder As datas são marcos da nossa história
Da África Ocidental Setembro de setenta e quatro
Terra bem amada Ê uma fase nova e decisiva da nossa luta.
O sangue do herói Um passo em frente é pontaria certeira
Será transfusão Atenção, irmãos do arquipélago isolado .. .
N os anais da tua história Cada hora é uma afirmação
20/ 1/73 Duma viragem sem precedentes
N ossos passos certos nas minas lançadas
Nos trilhos das nossas caminhadas,
São granadas de alcance longo.
li: preciso saltar as minas
Nas emboscadas dos muros coloniais
Nossa guerrilha é unidade na luta
Nosso fusil é palavra de ordem
Pronta a disparar no momento exacto.
Irmãos do mundo, nós somos guerrilheiros
Das ilhas do mar sem fim.
A muralha colol)ial é nosso campo de batalha
Rastilho engatilhado aponta contra 'nós

117
116
Perspicácia do ilhéu é coluna na nossa luta A LEGíTIMA DEFESA
Manobras multiplicadas avançam hora após hora
Condicionalismo geográfico
Nega eco à voz do ilhéu
Rádio e imprensa estão distantes do processo irreversível
Das ilhas do fim do mundo
Mas o mar da separação não afoga nossa luta
Nós somos guerrilheiros
Com armas de alto calibre
O mar da divisão
Dá força ao fusil do ilhéu
A força da unidade é nossa metralhadora
Set. j 974

Para vós carrascos


O perdão não tem nome.
A justiça vai soar
O sangue das vidas caídas
N os matos da morte
Clamando justiça
:m a chama da humanidade
Cantando a esperança
Num mundo sem peias
Onde a liberdade
Ê a pátria dos homens

118 119
ONDE ESTÃO OS HOMENS CAÇADOS
NESTE VENTO DE LOUCURA

O sangue caindo em gotas na terra


homens morrendo no mato
e o sangue caindo, caindo . ..
nas gentes lançadas no mar ...
Fernão Dias para sempre na história
da TIha Verde, rubra de sangue,
dos homens tombados
na arena imensa do cais.
Ai o cais, o sangue, os homens,
os grilhões, os golpes das pancadas
a soarem, a soarem, a soarem
caindo no silêncio das vidas tombadas
dos gritos, dos uivos de dor
dos homens que não são homens,
na mão dos verdugos sem nome.
Zé Mulato, na história do cais
baleando homens no silêncio
do tombar dos corpos.
Ai Zé Mulato, Zé Mulato
as vítimas clamam vingança

121
o mar, o mar de Fernão Dias Para vós, carrascos,
engolindo vidas humanas o perdão não tem nome.
está rubro de sangue. A justiça vai soar.
- Nós estamos de pé - E o sangue das vidas caídas
nossos olhos se viram para Li. nos matos da morte,
Nossas vidas enterradas o sangue inocente
nos campos da morte, ensopando a terra,
os homens do cinco de Fevereiro clamando justiça.
Os homens caídos na estufa da morte Ê a chama da humanidade
clamando piedade cantando a esperança
gritando pela vida l num mundo sem peias
mortos sem ar e sem água onde a liberdade
levantam-se todos da vala comum é a pátria dos homens
e de pé no coro da justiça
clamam vingança .. .
Os corpos tombados no mato,
as casas, as casas dos homens
destruídas na voragem
do fogo incendiário,
as vidas queimadas,
erguem o coro insólito da justiça
clamando vingança.
ln vós todos carrascos
e vós todos algozes
sentados nos bancos dos réus:
- Que fizestes do meu povo?
- Que respondeis? .. .
- Onde está o meu povo?
E eu respondo no silêncio
das vozes erguidas
clamando justiça .. .
Um a um, todos em fila

122 123
REPRESSÃO

Os abutres varrem a face da Terra.


Jamais, jamais enquanto vida eu tiver
Poderei esquecer o horrendo dia
que esta data simboliza.
Marcada a ferrete dentro de mim
Eu solidarizo-me com todas as vítimas
,I
Que sofreram o mesmo suplício.
Que todas as vítimas imoladas
Possam soltar o canto da libertação.

Caxias, Dezembro de 1965

125
«TÉLA ÇA DJI NON»

Poema escondido na hora da repressão


Poema mensagem de alento
Grito vibrante na escuridão da noite
Na Noite calada o poema panfletário
Penetra nos tugúrios em ondas de esperança
Abre o rádio «Zosé Veado» e escuta calado
«Tem gente lutando p'ra fome acabar
Tem gente lutando p'ra colono sair
Tem gente falando p'ra gente no mato
Companheiro, Compá Malé
Um dia Rio Douro vai ser do povo
Fonseca malandro vai p'ra a terra dele
E sino da roça vai ser de festa
Combate da gente varrendo o carrasco »

Dlin dlin don


Dlin dlin don
Compá Malé
« Téla ça dji non »

127
VULCÃO SETENTA E TRÊS

Cratera em ebulição
Lavas de destruição
Sinos ecoando longe
Mesquitas avassalando
Torres milenárias
Dos profetas dos templos.
Sinais de novos tempos
Na aurora do futuro.
Atabaques ressoando
A sementeira fertilizada
N a ara do sacrifício cruento.
A grandeza dos heróis
Sepultados na cratera
setenta e três
São os bastiões dos filhos da fome
Gritando o fim da solidão
Da era do silêncio.

129
TRINDADE

Está aqui, um homem negro de pé,


estendendo os braços lassos cansa-
dos, tonto de bater em vão a todas
as portas e ter de estender os bra-
ços com os olhos injectados de san-
gue e angústia.
A sua história é real. Saiu duma câ-
mara da morte. Escapou com vida,
enquanto trinta dos seus companhei-
ros morreram asfixiados, pedindo ar
e água.
E isto passou-se. Foi a 5 de- Fe-
vereiro que eles morreram. E o ne-
gro, tonto de tanta ruína humana
caindo desmaiado sobre os cadáveres
dos companheiros mortos, despertou
atordoado, 'c orrendo como ébrio para
o pátio da prisão, gritando com fome
e sede.

131
Eu chamo-me Cravid
e tenho um crime ... Os gritos cresciam
- N asei na Trindade - Água, água, água
A vila condenada. Ar, ar! ...
Num coro de morte
Pintava casas gritando p'la vida.
nas empreitadas da cidade. E a tarde caía
Fui levado manhã cedo a noite chegava,
e eles prenderam-me A gente morria ...
Meia-noite, hora da morte ...
Fecharam meu corpo Os coros subiam
fechado de raiva na noite sinistra
numa casa sem ar.
e corpos humanos tombavam por terra.
Camaradas de cela se cruzaram - 6 velho, motorista Alfredo,
camaradas de cela se juntaram tu tombaste já ...
Teu corpo inerte está livre
E a porta de zinco ia abrindo evadiu-se.
e sempre nascia uma esp'rança
de volver p'rá liberdade, E tu, Lima,
para o ar livre das ruas junto ao postigo
tu pediste ar
E a esperança saía pediste vida
na porta fechada, cerrada e o destino escarninho
recebendo mais gente. tombou contigo no chão.
Aos vinte ... trinta .. . quarenta E o ar já não virá ' ..

Aos vinte, trinta, quarenta, Um a um camaradas


os gritos cresciam um a um
as bocas secavam ... no coro de angústia
E a sede, a sede aumentava se finaram, companheiros
e a gente morria sem ar · . .. no escuro de túmulos
E os tiranos zombavam no pálio. na eterna escuridão
da esperança morta
132
133
E na manhã sinistra. A rebelião crescia
de sexta-feira 6 e os carrascos sem nome
nesse mês de Fevereiro atiraram contra mim.
fatídico e cruel
eu ainda tinha vida .. . E os tiros vieram
e eu resisti.
Dezasseis, dezasseis homens Eu não morri.
saíram tombando, erguendo a carcaça
E eu fiquei. Juntos em redor de mim
Fiquei deitado. cobriram de andalas meu corpo
Meu corpo caiu sobre os mortos e eu não morri.
na primeira revolta.
E levantei-me. Cresço em ondas de revolta
e estou ficando louco.
De mim, saiu outro honleni.
Eu levantei maluco Deportaram-me
e corri à porta. mas eu já voltei
Eu gritei Meus olhos não param
p'la água que não vinha. e eu estou de pé.
p'la fome que tinha.

E escarrei ao carrasco
todo o fel, todo o fel
da revolta nascente.

E eles, eles, os tiranos


só ligaram meus membros
quando o corpo cansado o consentiu.

A revolta cresceu ...


As lavas sufocaram os algozes
e as forças dos meus nervos
desataram as cordas.

134: 135
TRi!;S DE FEVEREIRO DE 1976

Massacre . de 53 em S. Tomé
nunca 'mais, nunca mais, terra liberta,
Consentiremos o extermínio do povo soberano
Non na cá pô chunchitxi 53 bilá bi fá,
53 ca quêcê non pá non pô lemblé

Na madrugada sangrenta de 3 de Fevereiro


Pontes, trabalhador rural
Foi colhido à entrada da vila da Trindade
De costas, camaradas
«De costas, camaradas»,
Na linguagem covarde
dos poltrões e traidores.
N on na cá pô chunchitxi 53 bilá bi fá.
Camarada Pontes, tombando à entrada da Vila .
Teu sangue regou a terra mártir
E os frutos brotaram fecundos
N o sacrifício dos verdadeiros heróis de 53

137
A resposta do massacre N a praça da Independência,
soltou da catana Na manhã de 12 de Julho de 1975
de Mé Chinja morto, 53 na cá bilá bi fá
soltou da catana 53 é a certeza da Vigilância Generalizada.
de Cangolo vivo
Destruído fisicamente Sem exploração
Pela prisão colonial Em luta
Mas vivo, testemunha Contra
na catana atirada a fome,
ao esbirro da morte. a miséria
a doença
Irmão Cangolo, de pé a ignorância
Nós teus irmãos do mesmo sangue o analfabetismo
Saudamos o herói vivo
Do massacre de Batepá Nós, as mulheres de S. Tomé e Príncipe
Cangolo, non na cá pô chunchintxi 53 bilá bi fá. Em redor do nosso glorioso
Movimento de Libertação
Vinte e três anos são contados Juramos, que a unidade do nosso Povo
N a década do tempo Na reconstrução e na conquista
Vinte e três anos Duma sociedade de homens
De luta de resistência Seremos a força do poder popular.
Resistência passiva Nós organizados e conscientes
Resistência clandestina Gritaremos sempre presente ,
Eclodindo decisiva
Com o tombar do fascismo Nós, Comités do Comissariado Político
N o parque das reservas coloniais. Nós JMLSTP
Non na cá pô chunchintxi 53 bilá bi fá. Nós OPSTEP
Nós OMSTEP
Homens, mulheres, jovens, crianças em bloco Nós, povo unido
Mulheres, jovens, homens e crianças
Abalaram a fortaleza colonial Nós todos juntos, clamaremos
E a independência chegou 53 na cá bilá bi fá.

138 139
PELA VEZ PRIMEIRA

Em frente da Câmara o colorido lenço das sanguês


Cestas à cabeça, vozear sem fim .. .
Uma voz se levanta.
Vão falar pela vez primeira.
- O vendaval de Fevereiro desceu à llha.
Os filhos não têm pai.
Eles dormem no mar de Fernão Dias
Nas brigadas de trabalho
Na hora trágica da morte cruel.
As mães vêm à cidade vender
Mas o caroço não tem venda.
As lojas não compram
Assim reza a lei.
E elas levantam o estandarte da fome
Naquela quente manhã dum mês qualquer.
Um grupo sobe ao palácio
E elas pedem o direito de vender
A voz da fome não tem lei.
Pela vez primeira as sanguês vão falar .
Suas vozes sobem na onda da fome
E o caroço já tem venda.

141
FEVEREIRO

Silêncio na rua, silêncio nas almas


Um minuto de silêncio angustiado
Repicar de sinos na aurora doe tempos
Um silêncio reverente
Para a página do futuro

4/ 2/ 70

143
«ODISSEIA DO NEGRO RUIVO »

Latente na alma do povo


O sentido da justiça.
Salário da escravidão
Embora escravo
E negado.
Negro Ruivo escravo
Na empresa da escravidão
Vozes suas de justiça
Alertaram seus irmãos
N o rumo da justiça
Demandando seu salário.
Escravo nada exigiu
Calou sempre toda a afronta
Toca a calar sua boca
Boca de rebelião
Negro escravo Ruivo
Viu fugir sua soldada
E logo pronto reclamou
Seu salário de trabalho

145
10
Em escrava escravidão Juntos vão na mesma rota
Capital em sobressalto Conquistando igual salário
Chama a força que o sustenta Para o povo caminhar
P'ra calar a ruim força Negro escravo Ruivo
Do escravo infiel. Negro escravo Justino
Chegam forças de esbirros Esta é a balada cativa
A acorrentar sua voz No tempo da escravidão
E logo o negro Justino
Seu irmão em desventura
N essa hora da injustiça
Quer subir o mesmo carro
Onde Ruivo cativo
Vai partir para o desterro
«Irmão em desventura
Também sou negro Justino
Venha a bala
Chegue o canhão
Também sou seu companheiro
E juntos caminhamos
Para a morte
Ou desventura
Irmãos somos na injustiça. »
A força do Camarada
Vai vencer a sua luta
Dando exemplo aos companheiros
Que negaram caminhar.
Negro escravo Ruivo
Negro escravo Justino
Irmanados na desgraça
Trilharam caminho igual.
Venha canhão
Venha fogo

146
147
CELA NON VUGU

Eterna na perenidade do tempo


Ê a alavanca do reconstruir
Levantando das ruínas dos pântanos
Um povo em marcha que avança

149
INCONFORMISMO

Contemplando a criançada atirada aos caminhos


Encostadas aos burgos onde moram
Acenando aos carros circulando pelas estradas poeirentas
Ouvindo as notícias chegadas pela rádio
Doutros mundos distantes
De pugnas, lutas, invenções
Do progresso da vida, no mundo da ciência
Das artes, das letras , da conquista do cosmos
Da ânsia do homem de desvendar novas esferas
Em lugar de resolver os problemas do planeta
Sentimos a inutilidade das mesquinhices do dia a dia
Dos complexos criados pelas nossas futilidades
E analisando a nossa vida vazia
Um clima de angústia se levanta sobre as nossas cabeças
Gritando a nossa inércia permanente
Condensada em lugares comuns latentes
E não levantamos palha do nosso conforto
Para nos debruçarmos sobre o homem da rua
Número zero nas nossas realidades
É mais cómoda a esmola atirada ao palheiro

151
E mais fácil olhar de cima Tudo virá a seu tempo
Não interessa descer as escadas da casa grande «A natureza não procede por saltos»
Para não sentirmos a sensibilidade retalhada pela Mas os cataclismos surgiram por sobre a poeira dos
[incompreensão [séculos
Pois o cruzar das mãos é um gesto E os tições atiraram lavas de todas as crateras
E um gesto é acção Donde um vulcão extinto ressurgiu
Não interessa criar atritos E a revoada das mãos surgiu
Tomar posições, pedir Não, não, nós não cerramos os olhos
Pedir é humano, é mostrar as agruras dum grupo Nossas mãos ensanguentadas pelos escolhos
E estragar a verdura das nossas belas matas Florirão a terra inteira
Enfeitadas pelo esplendor da natureza E o nosso velho continente
Tirar a harmonia dum oásis Levará ao mundo dos homens de anClas tradições
Obrigar a meia dúzia de respeitáveis A melodia dos seus crioulos e línguas «nacionais»
A erguerem de bem alto seu olhar cansado Despontando na manhã radiosa de todos os nossos
Sobre os escolhos onde existem ilhas escondidas [campos floridos
Não, não levantemos a máscara
Ê tudo cinemascope
Construir pousadas humanas nos nossos morros
E romper o muro
E romper o muro é destruir
Destruir as belas telas dum éden
Ê um crime sem perdão
Ê um crime impune
E alguém terá de aguentar o Atlas
Alguém terá de pagar
O concerto desarticulado
«Fome houve sempre à face da terra»
E o mundo não deixa de ser mundo
Vamos resolver em congressos
Em parangonas de estilo as tiradas do vulgo
E sentemo-nos nas nossas estâncias burguesas
O mundo há-de caminhar

152 153
o JOGRAL DAS ILHAS

Imenso mar das ilhas de S. Tomé e Príncipe


O grito da Terra abafa o marulhar das ondas atlânticas
Vegetação densa clama contra a penúria do Povo
O canto de acusação é um vulcão de cinco séculos ...

As lavas afogaram a linha do progresso


N o cancro da colonização
Obstáculo do progresso

Não mais lamúrias, não mais histórias cansadas


O canto da afirmação
Levanta os coros do Povo ...

Bairro da Armação
No Príncipe
Quer erguer o facho da libertação
Por cima do farol de Ponta Mina

Espalmadouro na cidade de S. Tomé


- Anseia um cais largo e acostável
Onde os estivadores na terra conquistada
Farão a descarga no porto nacional

155
À beira do Rio Papagaio
Ribeira Formiga,
Ribeira Volta,
ilhéu Bombom
o Povo das TIhas quer ouvir o vosso coro
Falai:
- Nossas casas de pau a pique
Vão despenhar Esbulhadas da terra vasta
N o Pico Maria Correia Nossas canoas frágeis sem segurança
As torturas da escravidão Nossa pesca ousada
Da Donatária cruel Sem seguro marítimo
Nossos filhos com fome
Trindade, zona de repressão do ano 53 De pão e justiça
Repudia o massacre eterno Exigem a terra liberta
Extermínio do seu povo Para os filhos famintos do seu povo.
E caminha na dianteira
Pela libertação total o coro de Santo Amaro
Responde à chamada:
De cada palmo da sua terra - Cento e onze filhos do meu Povo
Para varrer o espectro colonial Transportados em camionetas
Da era do crime Vítimas da mais vil crueldade
De meio milhar de séculos Desceram à cidade pedindo Paz
Trindade tem de arvorar E receberam a assassina Paz
A Bandeira da Independência Da prisão Gorguliana.
N a Praia da Morte de Fernão Dias, Essa paz colonial tem de morrer.
Desagravando a memória dos seus filhos Juntos todos trabalharemos
Engolidos pelo tu barão colonial. Para içar a verdadeira Bandeira
Da Independência Total das ilhas de S. Tomé e Príncipe.
Vila de Santana, desde Zandrigo
São João dos Angolares,
Marchando até Baixo de Ocá
Praia Gamboa,
Rumo ao caminho certo da libertação
Praia Melão,
Guiando o povo trabalhador
Pantufo,
Para a conquista das palmas da vitória
Bairro dos Pescadores

156 157
Baptizadas com o suor da terra
MAMÃ CATXINA
No sacrifício das lágrimas de sangue do seu Povo.
Mateus Angolares,
Água Clara,
Água Telha,
Potó Varão.

- Onde está o cacau


Da nossa rica Vila da Madalena '?

- Eu, a vila da Madalena


Respondo em grito de acusação:
- A Reforma Agrária da Independência Total
Será o fruto da terra na repartição justa Mamã Catxina,
Das riquezas do meu povo. lavadeira das casas da cidade
Teu filho está no Liceu
o fruto da terra Com a força
Não jorra no silêncio. Da espuma
O fruto da terra do teu sabão,
Não é linguagem de braços caídos. Na roupa dos estranhos
O fru to da terra há-de brotar fecundo Nos bairros da cidade.
Do Picão à zona da Calcetada Dá também Mamã Catxina
Caminhando para o circuito do porto aéreo do Príncipe. A força da tua cabeça
Do Budo-Budo ao Riboque, Para empurrar o inimigo da tua terra.
Quando nossas mãos unidas Vem à reunião do Riboque
Tecendo o «guinhão» forte da palmeira ao lado do teu filho,
Empurrarem até à Praia Traz contigo a Avó Ana
O Padrão da exploração Traz também Mana Maria
Entoando num coro gigante E tia Chica do mercado
O Hino glorioso do País de S. Tomé e Príncipe. Mamã querida, é bela a nossa luta ,
Vamos juntos
Fazer o exame mais lindo do Liceu
Vamos conquistar
158 159
A independência Total GRITO DE ALERTA
E cobrir com o zinco mais seguro
A nossa terra inteira.
Amanhã teu filho vai cantar
à porta do Liceu
A canção mais maravilhosa da vida
«Mamã Catxina entrou
na revolução
«Viva dezanove de Setembro »
Viva a marcha de protesto das mulheres
Sacudinho o papão colonial.

Setembro de 1974
Na grande praça do povo
Clarins em regozijo
Ressoam soltando amarras.
Õ povo do meu país
O hino da independência
Cala fundo " ,
Cala fundo ,,'
P'ra durar a independência
Um só grito vai soltar
Resistência
Vigilância.
Resistênda, vigilância
Um combate a batalhar
Povo alerta
No trabalho
Povo alerta em disciplina
Fortaleza da nação.
Cada passo mal trilhado
Abre a porta à reacção,
Povo alerta na escola
160 161
• I 11
Alertando a Produção, LIBERTAÇAO
União numa só força
Povo ilhéu do equador.
A tormenta da rapina
Um lugar quer ocupar
Num espaço, onde numa coluna
Colónia deixou de ser.
Povo alerta! ...
Sentinela vigilante
Nas ilhas do mar sem fim.

llhas ao Sul do Sará


- llhas ao Sul do Sará
Vegetação densa
em S. Tomé ...
Mais densa ainda na vizinha ilha
Cacau
Cacau
Praga de mosquitos
e parasitas
Praga de endemias
congénitas
na noite dos séculos.
Praga mais densa
de endemias
nos espíritos ...
llhas ao Sul do Sará
llhas ao Sul do Sará
na encruzilhada
das rotas atlânticas.
Em tráfego deserto
nas rotas atlânticas

162 163
Rotas aéreas e nova etapa .
ponte aérea Vai surgir
na distância. nas fronteiras
Companheiro amigo da tua vida
menino das escolas consciente
calcurreando ontem N as fronteiras
as estradas soalhentas da tua vida
queimando consciente.
as solas dos nossos pés Ponte aérea
no trilho lançada por cima
das escolas da vida. dos túneis das ilhas
- Tornado nas ilhas do Sul do Sará
ao Sul do Sará Ponte aérea
Tornado constante Tra vessia longa
no escalão Na etapa necessária
da longa aventura Para a realização
pela vida Realização
pela vida Projecção
pelo Direito à Vida Evolução.
Piriquito ~as o povo parado
debicando o cacau: na ilha morta
Piriquito debicando Sem comboio
o cacau Sem metropolitano,
TUbarão devorando Sem cinemas
as gentes Sem pastelarias
Canoas deslizando Sem o tráfego das
no mar, grandes cidades
Deslizando no mar Sem livrarias
Companheiro amigo. Sem supermercados
Tua canoa Sem televisão
galgou os anos Ficava sentado
da fome nas praias de gibas

164 165
Nas estradas sem asfalto Para que o vento
mas empaludadas da esperança
à espera do teu A Revoada
grito Da Juventude
à espera da hora abale os espíritos das águas
da tua revelação abale o obscurantismo
à espera da Destrua as pragas
revelação dos Rios
à espera Destrua as pragas
da tua mensagem. das endemias
Jangada de responsabilidade Destrua as
Chegou contigo irmão endemias
Queremos navegar da mistificação.
na jangada nova Jangada
Gritam as forças da Responsabilidade
do futuro Chegou contigo irmão
do Riboque, E contigo vai ficar
ao Riba Mato nas ilhas da
Da Desejada Ãfrica ao Sul
Esperança do Sará
Da tua afirmação. Para atolar
Companheiro amigo, os pântanos
na Hora da Partida, lodosos
N a Hora da Partida Pântanos lodosos
li: forçoso repetir Dos caminhos
li: necessário partir ... da nossa infância
li: necessário partir Casa::!
Transportando na jangada e espíritos
as ilhas ao Sul do Sará sem portas
~ransportando na jangada nem janelas
as ilhas ao Crianças negras
Sul do Sará de cabelos ruivos

166 167
e grávidas CAMARADA ~IUTANTE

de subalimentação
Terrenos expropriados
Sem esperança de indemnização
~amãs escravas
de trabalho sem
recompensa
Homens dos cais
das roças
homens sem rumo
Todos
Todos os homens
mulheres
e crianças,
Do nosso africano Torrão
Erguendo os cartazes
da esperança
Da terra torturada Nada fizeste ainda camarada
Na certeza da vitória Enquanto um sopro de vida te animar.
Pelo direito ~ais ainda, é a temática da luta
à vida, Sempre mais e melhor camarada.
Nas ilhas Teus passos trilhados são contados
batidas Em ritmo negativo se parares.
pelo verde mar
da nossa Baía, Nada és sozinho no combate
Conduzindo Tu és tudo no processo positivo
A bagagem do Anónimo na unidade duma frente.
Direito à vida Apupado, criticado, ovacionado
na Jangada Justamente, injustamente
da Esperança Sempre em luta.
Da luta de libertação. Ponta de lança em riste
N a esteira dos teus passos.

168 169
Ponta de lança és tu ACORDO DE ARGEL
Povo identificado
Violentado
Insultado
Mas firme na luta.
Implacável, persistente
Mais forte e dura
N o ardor permanente
Na edificação da sociedade nova.

Povo em armas
Sem fusis, nem granadas
Realiza a grande batalha da Resistência,
Contra o colosso armado com explosivos,
Capital forte, cinco vezes secular.
Camaradas anti-imperialistas
Na luta contra o opressor
N em uma seta, uma espada
Nem uma bazuca, uma granada
Nos braços do povo
Em luta contra a agressão colonial.
Cinco séculos enfeudado
Cinco séculos emparedado
Despontou país inteiro
Contra a dura exploração.
Pequeno País
Com fronteiras para o mar
Sem a força da imprensa
Como espólio milenar.

170 171
Descrença completa, plena PRIMEIRO DE 11AIO
Do mundo da informação
Por país tão pequenino
Sem contar milhão de habitantes.
Camaradas do grande mundo,
A Guerra da Resistência
Deu nome ao secular país:
S. Tomé e Príncipe,
Congelado no passado
nas ilhas do Equador,
Brandiu cacau por arma
Riqueza do grã colono.
E o capital vacilou.
Camaradas do país de S. Tomé e Príncipe
Cacau entrou na guerra
O estandarte do povo trabalhador
Do povo trabalhador
Levanta o coro de guerra contra a exploração
Na resistência passiva
Agita bandeira eterna hostil ao imperialismo
Do povo das plantações
Camaradas, a luta do trabalhador é a luta de uma nação
A guerra é guerra, colono
A luta do trabalhador é vitória internacional
Cessar-fogo
Conquista da humanidade
É condição
Primeiro de Maio de 1886
Ligada ao direito justo
Marco heróico da jornada dos trabalhadores
Dum acordo para o pais.
Marco heróico contra a exploração capitalista
Bandeira branca brilhou
O pendão dos oprimidos foi erguido em Chicago
Em Novembro, vinte e seis
Exigindo o horário de trabalho de 8 horas diárias
Registando eternamente
Mulheres, crianças e homens trabalhavam de sol a sol
Início da descolonização
Dezasseis horas do relógio do tempo
N a histórica Argélia
Engordando os donos do capital
da Libertação.
Os trabalhadores organizados criaram o Sindicato
E levantaram em massa o grito do povo
_Na respota de 5000 greves contra o imperialismo
As balas das hordas imperialistas
Afogaram em sangue os operários de Chicago

172 173
Em covarde tirania contra a força do povo «HORIZONTE COLONIAL»
Primeiro de Maio ficou na História
Sustentando a luta justa do povo trabalhador
Camaradas de S. Tomé e Príncipe
O povo unido da nossa pátria imortal
Varreu de rijo o explorador colonial
Conduzido pela vanguarda do povo
MLSTP é a força do povo! ...
Marcos heróicos do povo traablhador!
12 de Julho de 1975
30 de Setembro de 1975
A independência chegou
O solo sagrado da pátria pertence ao povo trabalhador
A aurora de esperança sagrou a nossa terra
Povo trabalhador, o triunfo contra o opressor
O caminho da responsabilidade e do Compromisso
Está nas mãos da pátria imortal!
li: um longe caminhar
Nossa luta, no cultivo das glebas
Do lado de fora da barricada
De cada palmo do torrão natal
Escutar os cantos de glória
Nossa luta, nas repartições, nas oficinas, nas escolas
Dos falsos cantores
nos hospitais, nas empresas agríoclas
Com um pé no baloiço
No trabalho certo, na hora exacta
E outro no chão
Cimentarão a vitória do povo
li: uma arrancada de Quixote,
Contra o imperialismo internacional.
Nos trilhos normais
Nossa vitória é a vitória do povo trabalhador.
da era presente.
Ficar sentada à porta da sanzala
A ver resvalar na arena
O irmão trucidado
Cerrando os olhos à tormenta
J!l ignorar o presente
li: esquecer os filhos válidos,
tombados
Pela vida do Homem.

174 175
COMPROMISSO

Irmão, o compromisso da vida


Pela luta do povo pelo povo
É aurora de responsabilidade
Contra o universo colonial em pânico,
Traçando todas as manobras
Pela perenidade estável da dominação.
A certeza da luta do povo
É a força dos Resistentes
No mundo subdesenvolvido.
A história segue o seu curso irreversível
E a repressão colonialista
Instala todos os focos da máquina repressiva
A deter o povo determinado,
Pela eliminação sistemática
Dos elementos válidos.
A intimidação surge desmascarada
Utilizando os alibis das forças capitalistas
Do feudalismo
Em pleno século Vinte,

177
12
No coraç.ão da Africa trucidada GIOVANI
«Não desistir»
«Não recuar»
Pala vra de ordem
Na hora do povo em marcha
Não consentir
A dominação do homem
Pelo homem
Não consentir
A vaga da intimidação
Não recuar uma polegada
CEDER
:Ê a morte da vida As últimas balas coloniais
Em marcha Descarregaram toda uma epopeia sangrenta
Pela liberdade. N o corpo de Giovani estirado na via pública.
As últimas balas à hora do meio-dia
Badaladas decisivas
do Relógio da Revolução
Sepultaram o colonialismo
N o cadafalso do Povo.
Giovani caído na praça
Ê o corpo do povo mil vezes assassinado.
As últimas balas coloniais
N o corpo de Giovani
À hora do meio-dia
Marcam a presença de Giovani
Presente na Revolução.
A morte, um incidente colonial.
Os tiros, a Hora do povo.
- O sangue de Giovani -
Sua contribuição
À Independência Total.

178 179
«CELA NON VUGU»

Cinco séculos estrangeiros no solo pátrio


Regressamos do exílio da exploração
Expulsando com a força do povo
O colosso colonial e seus sequazes.
A máquina orquestrada do colono
Sequelas legou no palco montado
Instalado para eternizar.
Mas eterna na perenidade do tempo
É a alavanca do reconstruir
Desmontando tronos seculares
Injustiças cavadas nas montanhas
Levantando das ruínas dos pântanos
Um povo em marcha que avança

181
GLOSSARIO

Andala = Folha de palmeira


Andim = Fruto da palmeira donde se extrai o óleo de palma.
Angu = Banana cozida e amassada no pilão
Bõcado = A primeira colherada dos pratos regionais que se mete à
boca na 4." feira de Cinzas, distribuição essa feita pelo membro
feminino mais idoso da familla
Calulú = Prato típico confeccionado com óleo de palma, galinha ou
peixe
Caroço = Coco note
Compá Malé = Compadre Manuel
Cela non vugll = Temos que avançaI'
Conóbia = Pássaro considerado anunciador de maus presságios
Djá Chinja = Quarta-feira de cinzas
Fundão = Terraço onde se dança ao ritmo de música de corda
Gamá p1xi = Gamela onde as peixeiras transportam I() peixe
Gandu = Tubarão
Giba = Elefantíase
Gravana = Estação fresca
JesSll = Cachimbo de barro
Fermen tada = Cozida
Maguita tuá-tuá = Malagueta pequena e demasiado picante
Macucu = Fogão rudimental' constituído por três pedras de caracte-
rlsticas especiais assentes no chão

183
Mamã Catxina = Mamã Catarina ÍNDICE
Nozados = Cerimónia ritual em memória dos mortos
Non na cá pô chunchintxi 53 bilá bi fá cá quêcê non pa non pô
lemblé = Jamais consentiremos novo 53 e por isso não o esque-
ceremos
Obós = Floresta densa
Ossobó = Pássaro dos bosqu es de cores garridas que anuncia as
grandes chuvadas
Palaiês = Revendedeiras de peixe ou produtos alimentícios locais
Passu = Cabanas de andala construídas à beb'a dos caminhos, nos
meios rurais, na quadra do Natal
Pito doxi = Flauta
Rio D'ouro = Rio do Ouro (Exploração Agrícola Nacionalizada, que
fazia parte da Companhia Agrícola Vale Flor)
Socopé = Canto e dança de S. Tomé e Príncipe
Quissanda = Fibras de palmeiras entrelaçadas
«Tela ça dji non » = A terra é nossa
JMLSTP = Juventude do Movimento de Libertação de S. Tomé e
Príncipe
OPSTEP = Organização dos Pioneir'os de S . Tomé e Príncipe
OMSTEP = Organização da Mulher dc S. Tomé e Príncipe
HJ de Setembro de 1974 = Man1festação de cerca de 3000 mulheres
exigindo ao governo colorual o reconhecimento do MLSTP, como
ún1co e legítimo interlocutor válido do povo de S. Tomé e Principe.
(Essa data foi consagrada como Dia das Mulheres de S. Tomé
e Príncipe).

184
.)

Hino Nacional da República Democrática de S. Tomé e Prlnclpe 5


Prefácio 7

POEMAS DA JUVENTUDE

VOzes das Ilhas 33


Lá no Agua Gt'ande 35
Ilha Nua 37
Em torno da minha baía . 39
O mundo da criança 41
Para a Tânia . 43
Humanldade 45
Para lá da praia . 47
Angolares 49
Avó Mariana . 51
Cacau colono 53
, ~

Página do livro de curso . 55


Luar africano . 59
Chiqulto . 61
Descendo o meu bairro 63
Estrela de Africa 67
Natal na Ilha . 71
Se esta estrada falasse 73
«CELA NON VUGU »
POEMA MENSAGEM
Inconformismo 151
No mesmo lado da canoa . 77 O Jogral das Dhas 155
As mulheres da minha terra 81 Mamã Catxina 159
Cântico do novo dia 87 Grito de Alerta . 161
TI'inta e um de Julho . 89 Li bertação . 163
Camarada Militante 169
Acordo de Argel . 171
POR ENTRE OS MUROS DA REPRESSAO Primeiro de Maio 173
HOl'izonte colonial 175
Boato . 93 Compromisso . 177
Senhor Barão 95 Glovani 179
Resposta 97 Cela non vugu 181
Direito à vida 101 Glossário 183
Escola de mentiras 103

AOS COMBATENTES DA LIBERDADE

Herói Nacional . 109


Voz negra das Américas - Angela Davis . 111
Deolinda Rodrigues . 113
Requiem para Amílcar Cabral 115
S. Tomé e Príncipe (6 de Setembro de 1974) 117

A LEGíTIMA DEFESA

Onde estão os homens caçados neste vento de loucura 121


Repressão 125
«Téla çá dji non» . 127
Vulcão setenta e tI'ês 129
Trindade 131
Três de Fevereiro de 1976 137
Pela vez primeira . 141
Fevereiro 143
Odisseia do negro ruivo 145

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