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Depois que sua família foi acolhida por Manoel, a vida de Jéferson parecia finalmente

ter voltado a tomar o rumo que deveria. Nada nunca seria o mesmo, mas agora, pelo menos,
ele podia se atrever a ter esperanças e sonhar com o futuro. Manoel não vivia com eles. Ele
providenciou a reforma de sua antiga casa, contratou empregados e devolveu a vida à fazenda
de seus pais. Como Manoel explicou, ele tinha sua própria vida e não podia ficar com eles o
tempo todo, mas faria o que estivesse ao alcance dele para que nada de ruim voltasse a
acontecer.

Apesar de ainda não ser um adulto propriamente dito, Jéferson não era mais criança.
Sua emancipação o permitiu tornar-se o responsável legal de suas irmãs e assumir a
administração da fazenda. A benzedeira não quis ir morar com eles, mas mesmo assim
Jéferson resolveu que continuaria a dar suporte para ela, assim como ela os havia dado.

Os dias passaram e então semanas, depois meses. A vida quase tinha se tornado digna
de ser vivida novamente. Seu sobrinho nasceu sem problemas. Havia até um pretendente para
sua irmã mais velha a essa altura. No entanto Jéferson não conseguia se adaptar. Aquela fase,
depois de todos aqueles eventos, parecia boa demais para ser verdade. Todas as vezes que
Manoel vinha visita-los, todas as vezes que conversava com ele, a forma como os tratava...
Jéferson queria ser grato, mas havia uma voz no fundo de sua mente dizendo que toda a ajuda
que ele lhes deu não sairia barata. Também havia aquela ansiedade remoendo seu peito, como
se esperasse que de repente alguém fosse aparecer para lhe cobrar por todas as coisas ruins
que ele fizera. Mesmo que dissesse a si mesmo que tudo foi pela família, ele sentia medo. Um
medo que às vezes o paralisava e impedia que aproveitasse plenamente o momento.

Para Jéferson se tornou muito difícil confiar nos outros. Parecia que ninguém
realmente dizia o que queria dizer. Estavam sempre pisando em ovos perto dele. Cochichando
e falando pelas suas costas. Apesar de voltar a ser o dono da fazenda, alguns empregados que
continuavam os mesmos da época de seus pais não o tratavam com o respeito que tratavam
Manoel ou qualquer um dos outros nobres. Era como se sua breve estadia na casa de seu tio o
tivesse manchado para os outros e ele não sabia se era porque sabiam que ele havia sido um
deles durante esse tempo, se eles não aceitavam sua autoridade por ser muito jovem ou
simplesmente porque o viam agora como um assassino. Jéferson nem sabia se era realidade
ou paranoia, já que suas irmãs frequentemente chamavam sua atenção a respeito de seu tom
e palavras ríspidas. Mas do que elas sabiam? Ele era o herdeiro daquelas terras.
Independentemente do que tenha acontecido, de sua idade ou mesmo classe social, Jéferson
merecia e exigia respeito. Algumas vezes, beirava a crueldade para manter seus subordinados
na linha.

Manoel tinha umas manias peculiares que o deixava desconfiado. Quando voltaram,
Manoel insistiu em vesti-los, calçá-los e dar tratamento tanto para suas irmãs quanto para ele.
Durante o período em que fora obrigado a trabalhar na fazenda como um empregado comum,
suas mãos se encheram de calos, suas unhas foram praticamente destruídas e as solas de seus
pés ficaram endurecidas e escuras. Manoel dizia que eles não podiam ter mãos e pés de
escravos e os submeteu a sessões com cremes e raspagens com pedras ásperas. Suas irmãs
adoravam, mas Jéferson se sentia como se estivesse sendo tratado como uma moça. De vez
em quando percebia Manoel olhando para ele de uma forma que o deixava muito
desconfortável, principalmente quando perguntava o por quê e ele respondia que Jéferson se
tornou a imagem de sua mãe. Jéferson não via isso como elogio. Não era a primeira vez que
lhe diziam isso e geralmente esse comentário vinha seguido de algum tipo de assédio. Não era
o caso com Manoel. Ele parecia nostálgico, mas ao contrário de algumas pessoas que
encontrou, ele não parecia ter esse tipo de interesse nele ou em suas irmãs.

, e levava

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