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— Hermes é o traidor. — Zeus afirma encarando o rapaz nos olhos, com uma
fúria inominável.
Nenhum dos deuses ali presentes pareciam dispostos a romper aquela atmosfera
tensa.
— Você! — Ele exclamou enquanto apontava para o rapaz com uma expressão
feroz. — Achou engraçado enganar a todos aqui todo esse tempo?
Ele parou a três metros de distância do filho, o encarando por cima. Nesse
momento, se tornou possível ver a diferença de tamanho entre os dois.
Zeus encarava seu filho como uma criança. Mas uma criança que o havia
enfurecido, e muito.
Entretanto, mesmo com toda a sua pose superior e intimidante, não parecia ter
conseguido amedrontar o 'pequeno' Hermes, que o encarava com um rosto agora
sereno. Já não ria mais, apesar de não parecer com medo.
— Você tinha essa obrigação para com os seus iguais. Era o seu dever se livrar
de Pandora por nós! — Zeus continuou.
— Pai- Por favor, seja razoável, Hermes nunca- — Apolo se aproximou do pai,
gesticulando com um rosto preocupado.
Sem nuvens, sem tempestade, sem chuva. Um trovão debanda dos céus,
provocando um enorme barulho e fazendo Apolo estremecer num susto.
Zeus fitou furiosamente de canto de olho, o que o fez se calar desviando o olhar
com medo.
Todos, assim, perceberam que não deveriam se intrometer ali.
— HERMES, VOCÊ TRAIU O SEU- — Zeus quase cuspia cada palavra para
seu filho, apontando tão ferozmente quanto falava.
— Como- —
— Essa irritação toda é por que não pode mais sair engravidando qualquer mortal
que encontrar? — Hermes pergunta para seu pai com um rosto bravo.
Era de conhecimento geral entre os deuses que ela não gostava que expusessem a
infidelidade do marido. Se sentia humilhada por isso.
Hermes não pareceu se afetar pois seguiu encarando sem vacilar o olhar
mortalmente branco de seu pai.
Zeus não se virou. Parecia petrificado com a ousadia do rapaz. Ele simplesmente
encarou sua frente com os olhos arregalados em raiva e veias furiosas saltando
em todos os pontos visíveis de seu corpo.
— Se sentem traídos? — Hermes ergueu a sobrancelha, falando com um ar
cômico enquanto se virava para encarar o pai. — Traídos por que eu não sujei
minhas malditas mãos pra favorecer os interesses de vocês? — Ele pergunta
adotando um tom mais irritado.
Este era o que, dentre os deuses, não poupava esforços para se meter em brigas.
Ainda mais quando era seu pai o alvo da confusão. Ares se comportava como o
verdadeiro braço direito de Zeus...
*Ziip* *Pump*
Hermes desaparece da frente de Ares com uma espécie de zumbido deixado para
trás. Sem que o irmão tenha tempo de se preparar, ele reaparece em uma
investida no ar acertando-lhe com um chute voleio direto no nariz.
Ares voa com o golpe, se chocando e atravessando três das pilastras do coliseu. O
corpo do deus cai no chão, enquanto ele, ainda em choque, tenta se levantar.
Falha, e então cai no chão inconsciente.
Quase ninguém ali naquele lugar poderia mandar Ares voando com aquela
facilidade.
Hera estava furiosa. "Como um maldito bastardo ousa encostar um dedo em meu
filho?"
Um trovão é escutado.
Isto se segue por algum tempo, com todos encarando sem acreditar.
Zeus assumiu uma postura mais presunçosa, percebendo que ele estava recuando
com os golpes. E então, o corpo de Hermes começou a vibrar e se transformar
num borrão. Ele estava desviando em uma velocidade muito maior que qualquer
respingo de energia pudesse alcança-lo.
Zeus rangeu os dentes, e seguiu aumentando cada vez mais a velocidade e força
de seus golpes. A mancha branca de seus braços se expandindo e tomando cada
vez mais conta de seu corpo.
Zeus realiza seu movimento como um martelo, dispersando o ar à sua volta como
se estivesse amassando a própria realidade. Acertando assim, o nada, já que
Hermes já não se encontrava mais à sua frente.
Os pés de Zeus afundam no chão, e ele é empurrado pelo impacto alguns metros
para o lado, rasgando o chão com seus pés presos.
O rapaz avança sem pestanejar e aparece imediatamente na frente do pai. Uma
chuva de socos em super velocidade são desferidos contra seu abdômen o que faz
Zeus ceder. Ele é pego de surpresa e tenta desferir contragolpes.
Zeus sente seus joelhos falharem e começa a cair movimentando as mãos para o
abdômen. Incredulidade, mais que tudo, aparente em seu rosto. Mas, antes de cair
de joelhos, é acertado por um golpe ultra veloz no queixo, que o manda voando
para fora do coliseu, demolindo tudo que há pela frente.
— Você passou dos limites, rapaz. — Poseidon fala, mantendo uma aura
imponente enquanto aponta seu tridente na direção de Hermes.
O que pode parecer uma frase sem sentido, fora entendido facilmente por todos
naquele recinto. Hermes quis dizer. "Se nem Zeus foi capaz de me parar, quem é
você para pensar que pode?".
Todos entenderam, e até certo ponto chegavam a pensar o mesmo. Exceto por
Poseidon. O orgulhoso Rei dos mares não deixaria esta afronta barato.
Hermes arregalou os olhos. "Desde quando este velho é tão rápido?" Pensou
encarando o corte superficial em seu ombro.
Ele ergueu seus olhos para o tio, e novamente foi surpreendido. Poseidon estava
carregando mais dez daqueles mísseis d'água ao seu redor. Seu rosto parecia
presunçoso. Provavelmente queria se mostrar mais poderoso que Zeus e
demonstrar como poderia vencer facilmente aquele que o superou.
Hermes, entretanto, não tinha planos de permitir que isso acontecesse. Ele sabia
que, por mais que sua provocação tenha dito o contrário, Poseidon era muito
poderoso.
Ele certamente não tomaria esse golpe facilmente se estivesse preparado. Mas
para ele, Hermes ainda se encontrava um degrau abaixo dele. Se sentia muito
seguro vendo como foi capaz de o acertar facilmente com um dos mísseis,
diferente de Zeus, que custou a ferir superficialmente o rapaz.
Ares, que estava sendo socorrido por Hera, sua mãe, se levantou com uma mão
no rosto, tapando o nariz quebrado, ainda atordoado.
A mulher vendo situação de seu filho se virou para Hermes com ódio e fúria.
"Como um maldito bastardo ousa tocar meu filho?"
E então, sentiu uma certa confusão tomar conta de seus sentidos. Uma neblina
roxa e fina passou a se espalhar dentro do coliseu.
— Acho que você precisa se acalmar um pouco, meu irmão. — Disse Dioniso
com um sorriso bêbado enquanto bebia vinho direto de um barril, emanando
aquela neblina de sua pele.
Ele começou a olhar em volta, procurando por sinais de qualquer um que fosse e
que ele pudesse golpear.
Uma silhueta apareceu em meio à névoa. Hermes saltou em sua direção em alta
velocidade. E então, socou o vento.
Isso se repetiu por algumas vezes, até que Hermes perdesse a paciência.
Quando se deu por conta, seu braço estava rasgado. Do vão entre os dedos médio
e anelar, até o cotovelo.
A coruja havia se transformado numa lança. A lança de Atena para ser mais
exato.
Ele retira a lança do braço, a jogando no chão, e, para sua infelicidade, percebe
seu sangue fluindo em um tom roxo.
*Fwishh*
Ela era uma que normalmente não tomava parte nessas intrigas. Mas, por algum
motivo, do modo como ela errou a flecha mesmo com o alvo estando atordoado,
acabou chamando a atenção de Hermes.
Por outro lado, ao ver a flecha abrindo espaço no gás, ele teve uma nova ideia.
Hermes sabia que não seria capaz de vencer a todos ali. Os poderes de Dioniso o
atordoaram, e a flecha envenenada de Ártemis estava dificultando sua cura, de
modo que ele ainda não sentia seu braço recém curado.
Seus pés então afundam o piso, enquanto ele pega impulso para correr dali.
Mas então, não consegue sair do lugar. Ele olha para baixo e percebe seus pés
envoltos de vinhas espinhosas que emanam uma aura púrpura.
Hermes arregala os olhos e olha em volta, encontrando Hera, que o encarava com
olhos famintos e uma energia ainda mais furiosa ruindo de seu corpo, causando a
quebra do chão abaixo dela com a pressão de seus poderes.
— Um bastardo ousou levantar a mão contra seu pai, e muito pior, contra MEU
filho! — Ela ruge com a testa franzida e os olhos completamente tomados por um
brilho púrpura.
As vinhas cobrem a parte inferior do corpo de Hermes por completo quando Hera
para poucos metros em sua frente em uma pose orgulhosa. Uma energia
condensada começa a sair do caos provindo pela aura de Hera.
— Você será amaldiçoado pela desgraça, e independente de para onde vá, tua
vida e morte será repleta de sofrimento e dor. — Hera começa a entoar o que
parece ser uma maldição. — Que sua estadia no tártaro seja ainda pior que
inexistência!
Hera aponta para Hermes, e uma enxurrada violenta de poder segue em sua
direção. Adentrando o corpo do rapaz. Hermes sente sua força se esvair, e seu
corpo ser marcado, uma marca direta na alma.
Hermes estende o braço numa investida desesperada para tentar atacar Hera.
Porém, o tridente de Poseidon corta o ar, perfurando seu braço e o prendendo no
chão.
Ele se vira e encara o tio que se aproxima vindo das ruínas do destruído coliseu
contra o qual ele havia sido arremessado. Suas roupas sujas e uma marca gravada
de um punho no centro de seu abdômen. Seu rosto numa mistura, tanto de raiva
quanto de exaustão.
Ártemis arma seu arco. Ares aponta sua espada. Afrodite libera uma aura rosa em
formato de espiral de seu corpo. Atena aponta sua lança. Hera fortalece suas
vinhas no chão.
E Apolo, que até agora estava paralisado com a situação, apertava fortemente sua
lira na mão com um rosto abatido. Se perguntava, ele, se Hermes dizia aquilo
para ele também. Se seu ódio era direcionado a verdadeiramente todos os Deuses
ali.
Suas vestes surradas caem aos rasgos pelo chão. Sua aura se fortifica mais a cada
instante, estando inclusive mais poderosa que anteriormente.
Hera começa a andar para o lado, abrindo caminho para o marido. Sua missão já
estava completa.
O corpo de Zeus começou a reluzir. Aquele brilho que antes possuía suas mãos,
agora possui todo o seu braço e tronco.
Aquela lança elétrica desceu dos céus, cravando diretamente o peito de Hermes
que bramiu em dor. Sentiu ele toda a sua energia se esvair. Seus cabelos foram
perdendo o brilho dourado e divino aos poucos, até ficarem totalmente brancos.
O que quer que Hera tivesse feito, pareceu se intensificar naquele momento, com
a descarga de energia divina provinda do raio de Zeus.
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A investida do raio continuou até que as vinhas queimassem e chão de mármore
abaixo dele cedesse, levando o rapaz no formato a cruzar o céu da Grécia, como
uma gigante serpente de raios.
E então, no meio do nada. O raio atinge com tudo o chão, abrindo uma enorme
cratera e mandando pedras ao redor voando para todo o lado.
*KABOOOM*
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Uma caravana segue um caminho desértico. Cerca de cem carroças e apenas uma
carruagem mais à frente da linha de carroças.
No meio da estrada, uma enorme cratera e árvores caídas para todos os lados.
Uma cena bem caótica, e que ele julgava como sendo algo estranho mesmo para
bandidos.
O homem para a carruagem, fazendo sinal para que os outros façam o mesmo.
Um senhor de idade com um quitón chique de cor amarela desce dessa carroça
mais bem arrumada, localizada à frente da caravana. Ele parece zangado.
O nobre estremece com a ideia de ladrões estarem por trás disto tudo, e então,
começa a olhar para todos os lados, buscando por algum sinal destes arruaceiros.
O homem revira os olhos, e então faz sinal para que os guardas fiquem mais
atrás, cuidando da segurança das carroças. Ele, por sua vez, acena para que o
nobre o siga.
Ao chegar na borda da cratera, o guarda é empurrado pelo senhor, que age com
curiosidade e pouca cautela. Eles veem, no centro da cratera, o que parece ser um
cadáver.
O guarda suspira e depois de alguns segundos resolve obedecer, apesar de não ser
seu trabalho fazer isso. A escolta de caravanas de escravos sempre era bem
recompensada, e como ele queria garantir que receberia seu pagamento, sabia
que não devia contrariar o senhor esnobe à sua frente.
Ele coloca no chão, ao lado do nobre, o corpo do rapaz de bruços, que logo cospe
uma quantidade grande de sangue. Ele veste o que parece ser parte de um quitón
muito rasgado e sujo. Seu peitoral exposto pela roupa rasgada.
O velho apenas encara o corpo com desdém entre os detritos. E então sorri,
encarando algo no corpo.
— Não. — Ele responde enquanto sorri. — Não quero ser tão insultuoso aos céus
recusando tamanha regalia. — O nobre fala dando as costas. — Faças o favor de
jogar este ladrão numa das carroças. Ele agora é minha propriedade.
— Ladrão? — O soldado pergunta, erguendo uma das sobrancelhas.
É então que se avista, no peito do rapaz, o que parece ser uma cicatriz no formato
de um caduceu. Um desenho muito bem feito, como uma tatuagem que foi
talhada diretamente na pele com uma faca.
— Quem é esse?
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