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DA FUTILIDADE PARA A FELICIDADE

Sísifo como todos nós

A Prática do Um Curso em Milagres

Kenneth Wapnick, Ph.D.

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Prefácio

O título original do workshop de 2003 no qual esse livro foi baseado é: “Sísifo: O Herói do
Ego”. A história de Sísifo, incidental à mitologia grega, tem muito interesse para mim desde
meus tempos de estudante, quando li pela primeira vez o profundo ensaio de Albert Camus “O
Mito de Sísifo”, que vou discutir na Parte Dois. Como o leitor pode ver a partir do subtítulo do
livro, Sísifo é cada um de nós, pois sua vida de aparente futilidade fala diretamente a todos –
“Não há ninguém que não saiba do que estamos falando” (LE-pI.182.2:1). Na verdade, o tema
da futilidade da vida tem passado através de nossa história intelectual desde o início. Ele se
estende, por exemplo, desde os gregos e romanos, o Rubaiyat, e Shakespeare, até os
modernos existencialistas. A última sábia observação de Carl Sagan em uma entrevista não
publicada compreendia essa visão realística da vida humana. Ele afirmou que acreditava que o
homo sapiens, como qualquer outra espécie, seria extinto. Ele conclui dizendo que não havia
propósito último aqui. Essa perspectiva está também convincentemente resumida no seguinte
comentário incisivo do Um Curso em Milagres sobre o lar do nosso corpo: “... um mundo seco e
poeirento, aonde criaturas famintas e sedentas vêm para morrer” (LE-pII.13.5:1).
Apesar disso, Um Curso em Milagres nos oferece outra forma de olharmos para nossa
sina aparente, como fez Camus nesse ensaio. Portanto, através de uma mudança na mente,
atingida através de uma mudança de professor, nossas vidas de futilidade são transformadas
em oportunidade de des-aprendermos o sistema de pensamento do ego. Uma vida sem
propósito, de inerente falta de significado, se metamorfoseia em uma significativa sala de aula
que nos leva para casa. É minha esperança que esse livro, como os outros nessa série “A
Prática do Um Curso em Milagres”, seja útil na aplicação dos princípios do Curso de um perdão
mais significativo às nossas vidas diárias, para que elas se tornem cada vez mais felizes e
menos fúteis em nossa experiência.
A transcrição do workshop foi editada para facilitar a leitura, e algumas perguntas e
respostas foram omitidas quando não eram adequadas ao tema do livro, enquanto outras
foram editadas para manter o fluxo da palavra escrita. Entretanto, nos esforçamos para manter
a natureza informal da apresentação e discussão.

Agradecimentos

Como sempre, Rosemarie LoSasso, a Diretora de Publicações da Fundação, aplicou sua


incalculável habilidade editorial ao processo de adequação do workshop original para o livro
impresso, fato pelo qual sou muito grato. Minha esposa Gloria, além de ser a inspiração por
trás dessa série de “pequenos” livros, foi também inestimável em sua assistência editorial. Um
simples obrigado jamais englobaria a profundidade do meu amor e gratidão por seu apoio, e
por ser uma parceira tão inspiradora para mim nessa jornada.

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Introdução: O Mito de Sísifo

Nós começamos colocando a figura de Sísifo no contexto da mitologia grega. Embora não
esteja entre as figuras mais importantes na mitologia, ele certamente está entre as mais
interessantes. Ele é famoso principalmente pela eterna punição infligida a ele pelos deuses,
que é a base do tema desse livro.
Sísifo era rei da proeminente cidade grega Agyra, que agora é Corinto. Existem várias
histórias sobre ele espalhadas através de toda a mitologia grega, e ele também é mencionado
na Ilíada e na Odisséia, de Homero. Uma das lendas o retrata como sendo um homem viajante
que roubou e até matou. A maioria das outras histórias, no entanto, é centrada na sua maneira
de atormentar os deuses com sua inteligência. Em uma lenda, o deus do rio, Asopus,
suplicantemente busca a ajuda do rei Sísifo para encontrar sua linda filha Aegina, que foi
raptada. Na verdade, Sísifo realmente conhece a identidade do vilão e o paradeiro da sua filha,
mas quer algo em troca por sua ajuda. Ele, portanto, diz a Asopus: “Se você criar uma
nascente para mim, para que meu povo possa ter água, vou lhe dizer onde encontrar sua filha”.
Asopus concorda, e Sísifo revela que foi o próprio Zeus, o deus maior, que levou Aegina para
si mesmo, pois ele estava acostumado com jovens e belas donzelas que estavam prontas para
suas seduções. Esse rei malicioso leva o abatido pai até onde Zeus está ativamente gozando
de seus prazeres. Absorto, Zeus tinha deixado seus raios fora de alcance, ao lado de uma
árvore. Asopus agarra a oportunidade e ameaça o deus, que foge. No entanto, para não ser
destruído, Zeus se transforma em uma rocha, para que não possa ser visto, e transforma
Aegina em uma ilha, para que não possa ser encontrada. Zeus então volta para pegar seus
raios e os arremessa contra Asopus, que fica mutilado pelas explosões.
Zeus agora volta sua ira para Sísifo, e envia seu irmão Hades (senhor da morte) para
levar o malandro para o submundo, como punição. No entanto, quando Hades vem até Sísifo,
é saudado pela zombaria inteligente do rei: “Como Zeus pôde enviar você, o deus principal do
submundo, para uma tarefa tão servil? Ele deveria ter enviado Hermes (Mercúrio) ao invés de
você”. Conseguindo distrair Hades, Sísifo então diz ao rei: “A propósito, você já pensou como
vai me levar a Hades [também o nome do submundo]?”. Hades replica: “Eu tenho essas novas
algemas, das quais você não conseguirá escapar”. “Interessante”, diz Sísifo, “Como elas
funcionam?”. Hades, já desarmado pela inteligência de Sísifo, coloca as algemas para mostrar
ao seu prisioneiro, e, nesse ponto o malicioso rei as tranca e o coloca em um armário.
Agora capturado por Sísifo, Hades permanece seqüestrado por trinta dias, com
conseqüências desastrosas. Uma vez que o deus da morte está cativo, ninguém podia morrer.
As pessoas mortas em batalha retornavam no dia seguinte para lutar novamente, e isso
transtornou imensamente Ares (Marte), o deus da guerra, que foi até Sísifo e exigiu que Hades
fosse libertado. Sísifo não teve escolha a não ser libertar Hades, e foi assim que foi levado ao
submundo. Mas ele não tinha desistido de seus truques. Antes de embarcar no que parecia ser
sua jornada final, Sísifo implora à sua esposa para não lhe dar um enterro apropriado, o que
significa não colocar uma moeda sob sua língua, necessária para pagar o barqueiro Charon,
que exige pagamento por levar os mortos através do rio Styx até Hades.
Quando chega em Hades, Sísifo procura a filha de Zeus, Perséfone, que também é
esposa de Hades e deusa do submundo. O astuto Sísifo suplica a ela para corrigir o erro do
seu enterro impróprio: “Por favor, deixe-me voltar para a terra. Vou repreender severamente
minha esposa por sua má conduta em ter me feito essa coisa horrível, fazê-la corrigir o erro, e
então, voltar alegremente para o submundo”. Perséfone apiedou-se de Sísifo e o deixou voltar,
mas é claro que ele não tinha intenção de voltar a Hades. Ele então permaneceu em Corinto,
apreciando sua vida, até que os deuses que já tinham agüentado o suficiente das suas
trapaças, finalmente o pegaram. Ele agora está permanentemente confinado a Hades, e sua
punição é rolar uma grande pedra para cima da montanha, para tentar levá-la para o outro
lado, e, assim que atinge o topo, a imensa rocha rola novamente para a planície abaixo. E

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então, Sísifo começa de novo e de novo – sua sina eterna. Em Odisséia, de Homero, Odisseu
visita o submundo, onde vê Sísifo e o descreve dessa forma:

Vi Sísifo em sua tarefa interminável, erguendo sua prodigiosa pedra com ambas as
mãos. Com as mãos e os pés, ele tentou empurrá-la até o topo da colina, mas
sempre, pouco antes de conseguir rolá-la para o outro lado, seu peso fica demais
para ele, e a impiedosa pedra vem ribombando para baixo novamente, para a
planície. Então, ele começa a tentar empurrá-la para cima da colina novamente, e o
suor escorre dele e se evapora atrás dele.

Outra forma de irônica crueldade imposta a Sísifo pelo deus foi que a pedra tem o formato
da rocha na qual Zeus se transformou para escapar de Asopus. Portanto, Zeus esfrega sal nas
feridas, dizendo a Sísifo, em conseqüência: “Essa é sua punição por encarar os deuses de
forma leviana, e por ser mais inteligente do que nós”.
Em certo sentido, então, Sísifo é o perfeito representante do sistema de pensamento do
ego. Ele peca contra os deuses, e, embora não se sinta culpado – um aspecto do sistema do
ego que lhe falta -, ele é punido por seu pecado, uma punição que continua por toda a
eternidade, com ele vivendo para sempre uma vida na qual não há esperança de mudança.
Sísifo, portanto, se tornou um grande símbolo da futilidade da vida, que é por que no workshop
original eu me referi a ele como o herói do ego. Isso então, nos leva diretamente ao tema da
primeira parte do livro: a futilidade da vida. A segunda parte vai se focalizar na forma da mente
certa de olhar para nosso herói, a saída do seu e do nosso inferno pessoal.

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Parte Um

A Futilidade da Vida

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1. A Falta de Esperança da Vida do Corpo

Existem muitas passagens em Um Curso em Milagres que refletem para nós a


desesperança na vida no corpo; uma “vida” que nos condena à morte. Não importando o
quanto lutemos para encontrar significado e propósito, para fazermos algo de nós mesmos,
para encontrarmos uma migalha de alegria e paz, no final, não vale nada, porque vamos
morrer – assim como, não importando o quanto Sísifo trabalhe duro para empurrar a rocha até
o topo da montanha, ela sempre vai rolar de volta. Na verdade, em alguns dos registros, a
rocha rola sobre ele, conforme se arremessa montanha abaixo. No entanto, uma vez que ele já
está morto, não pode morrer novamente. Ele simplesmente repete sua tarefa interminável,
suando, com uma névoa subindo do seu difícil e fútil trabalho. Não existe esperança em lugar
algum em um mundo assim.
Começamos com uma passagem que expressa um aspecto da vida no mundo:

O mundo que vês é o sistema delusório daqueles a quem a culpa enlouqueceu. Olha
com cuidado para esse mundo e vais reconhecer que é assim. Pois esse mundo é o
símbolo da punição e todas as leis que parecem governá-lo são as leis da morte. As
crianças vêm ao mundo através da dor e na dor. Seu crescimento é acompanhado
de sofrimento e elas aprendem sobre o pesar, a separação e a morte. Suas mentes
parecem estar presas como numa armadilha em seus cérebros e seus poderes
parecem declinar se os seus corpos são feridos. Elas parecem amar, no entanto,
abandonam e são abandonadas. Parecem perder o que amam, talvez a crença mais
insana de todas. E seus corpos definham e exalam seu último suspiro e são
depositados na terra e já não são mais. Nenhuma delas tem outro pensamento a
não ser o de que Deus é cruel (T-13.in.2:2-16).

Somos todos como Sísifo na crença de que estamos sendo punidos. Enquanto Sísifo
pode não ter pensado dessa forma, nós certamente pensamos – embora inconscientemente –
que a punição é justificada, por causa do nosso pecado contra Deus. Esse mundo e nossa vida
física aprisionada em uma “prisão que está apodrecendo” (T-26.I.8:5) – “o sistema delusório
daqueles a quem a culpa enlouqueceu” – é o destino de todos que escolhem ouvir o conto de
separação do ego: a existência individual que se segue ao nosso aparente pecado contra
Deus.
Como Sísifo pecou contra Zeus e Hades, zombando deles, assim também o ego nos diz
que pecamos contra nosso Criador e zombamos Dele. Em essência, dissemos a Ele que Seu
amor não era suficiente para nós, Seu reino não era adequadamente satisfatório, e poderíamos
fazer um trabalho melhor com as coisas do que o que Ele fez. Não apenas poderíamos fazer
um trabalho melhor, mas realmente o fizemos. E então, aqui estamos, exceto que a culpa que
alimentamos em relação ao nosso pecado percebido nos leva a acreditar em nossa punição
justificada. Portanto, quando o ego escreve seu roteiro de separação, inerente a esse roteiro
está a punição de Deus por nossos pecados contra Ele. Quando esse sistema de pensamento
recebe forma no mundo e no corpo, nós vivemos uma vida como a que Jesus descreveu na
passagem acima, uma que começa em dor, continua com dor – tanto física quanto psicológica
-, e inevitavelmente termina em morte. Todos nós “definhamos e exalamos nosso último
suspiro, e somos depositados na terra e já não somos mais”. Portanto, essa é a prova de que
pecamos contra Deus, tirando Sua vida. No entanto, Deus saiu da tumba na qual O
depositamos, e está sedento para pegar de volta a vida que roubamos Dele. E assim nós
morremos.
Existe uma discussão similar no início de “O ‘Herói’ do sonho”, onde Jesus é um pouco
mais irônico, e obviamente ridiculariza nossas vidas corporais e a importância que damos a
elas – como se empurrar uma rocha até o topo da montanha de novo e de novo fosse algo
significativo.
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(T-27.VIII.1:1-2) O corpo é a figura central no sonhar do mundo. Não há sonho sem ele, e
nem ele existe sem o sonho no qual age como se fosse uma pessoa que se vê e na qual
se acredita.

Essa, é claro, foi nossa grande reclamação contra Deus. Ele não acredita que existimos e,
portanto, nossa identidade como um ser especial fica invalidada. Dizendo a Deus para onde
Ele poderia ir com Sua invalidação, fizemos um mundo e um corpo no qual somos válidos.
Todos nos validam, e então, somos importantes, fazendo coisas significativas que são vistas e
apreciadas, e, portanto, nossas vidas são significativas. A passagem continua:

(T-27.VIII.1:3-6) Ele [o corpo] ocupa o lugar central em todos os sonhos, que contam a
história de como ele foi feito por outros corpos, nasceu para o mundo do lado de fora,
vive um pouco e depois morre para ser unido, no pó, a outros corpos que morrem como
ele. No pequeno espaço de tempo que lhe é dado viver, ele busca outros corpos para
serem seus amigos e seus inimigos. A sua segurança é a sua preocupação principal. O
seu conforto é a regra que o guia.

É demais para a grande significância aparente de nossa existência. Jesus está


descrevendo o egoísmo e o auto-centramento que caracterizam nossas vidas no mundo,
expressos em nossos relacionamentos de amor e ódio especiais que espelham nossa “vida
original”, quando acreditamos ter nos separado de Deus. Naquele momento, nós nos
importamos somente conosco mesmos, e em preservar o ser que agora tínhamos
estabelecido. Como resultado disso, realmente não nos importamos com as outras pessoas
agora; somente em como elas podem atender às nossas necessidades – quer nossa
necessidade seja um bode expiatório (alguém que possamos justificadamente odiar), ou
alguém que atenda às nossas necessidades físicas e psicológicas, nos dando prazer e nos
ajudando a evitar a dor (alguém que justificadamente amamos).

(T-27.VIII.1:7-8) Ele procura buscar prazer e evitar as coisas que poderiam feri-lo. Acima
de tudo, procura ensinar a si mesmo que as suas dores e alegrias são diferentes e que
pode distinguir umas das outras.

A confusão entre dor e alegria é um tema importante em Um Curso em Milagres. Em “Os


obstáculos à paz”, Jesus nos diz que o prazer e a dor são realmente a mesma ilusão, porque
eles tornam o corpo real (T-19.IV-B.12). Quer experimentemos dor ou alegria, nosso ego os
experimenta como alegres, porque se o corpo é real, o pensamento que o fez surgir também
precisa ser real, o que significa que o ego está vivo e bem. Seguindo sua orientação, portanto,
nunca queremos olhar para a falta de significado essencial do que fazemos.

(T-27.VIII.2) O sonhar do mundo toma muitas formas porque o corpo busca de muitos
modos provar que é autônomo e real. Ele coloca sobre si mesmo coisas que comprou
com pequenos discos de metal e tiras de papel que o mundo proclama como valiosas e
reais. Trabalha para consegui-las, fazendo coisas sem sentido, e as joga fora em troca
de coisas sem sentido das quais ele não precisa e nem mesmo quer. Ele emprega outros
corpos de modo que eles o protejam e coleciona ainda mais coisas sem sentido que
possa chamar de suas. Ele olha em volta procurando corpos especiais que possam
compartilhar seu sonho. Às vezes, sonha que é um conquistador de corpos mais fracos
do que ele. Mas em algumas fases do sonho, ele é o escravo de outros corpos que
querem feri-lo e torturá-lo.

Essa é a nossa vida aqui: fútil e sem esperança, e, no entanto, uma vida que tentamos
transformar em algo. Podemos imaginar Sísifo, quando a rocha rola de novo para baixo,
esquecendo o que aconteceu, lutando inutilmente para levá-la ao topo, com a expectativa de
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que conseguirá, ponto a partir do qual a rocha vai rolar pelo outro lado e sua tarefa estará
terminada. Sem lembrança do passado, ele iria sentir que o que está fazendo é importante, que
existe algo gratificante em relação a sua tarefa. Essa é nossa situação como criaturas desse
mundo. De novo e de novo, nós acordamos a cada manhã para fazermos as mesmas coisas
sem sentido, como Jesus acabou de descrever, zombando de nosso relacionamento especial
com o dinheiro e uns com os outros. Ou, se você acreditar em vidas passadas, nós voltamos
vida após vida, tentando de alguma forma criar esse mundo, não tendo consciência da sua
inerente falta de significado. Para o ego, a natureza sem significado da vida é o seu significado,
e nossa inconsciência nos mantém aprisionados dentro da sua armadilha de inutilidade.
Em visto disso, podemos entender que um dos propósitos do Um Curso em Milagres –
deixado muito claro nas primeiras lições do livro de exercícios, por exemplo – é nos fazer
perceber o quão sem significado é tudo aqui, para que possamos deixar de lado nossas ilusões
de que existe significância em nossas vidas e no que fazemos, a tal ponto que, quando
morrermos, nossas conquistas permaneçam vivas além de nós. Vamos desesperadamente
tentar encontrar significado e propósito aqui, que é exatamente o que o ego quer que
acreditemos para nos manter motivados a empurrar a rocha montanha acima. Novamente,
nossa atividade cheia de esforço termina em lugar nenhum, mas não estamos conscientes da
sua futilidade.
Passagens como as que citei mostram o quanto nossas vidas são triviais e sem
significado. Na verdade, Jesus diz “sem propósito” três vezes em duas sentenças. E ele não
está se referindo apenas às coisas materiais pelas quais lutamos, mas de que não precisamos.
Ele está dizendo que tudo aqui é sem significado, porque o propósito do ego para tudo é nos
manter sem significado, entretanto, nos fazendo acreditar que tudo significa alguma coisa.
Duas linhas que vêm no final do Capítulo 26, falam da futilidade de nossas vidas. Jesus está
falando sobre um mundo de injustiça, onde alguém vence e outra pessoa perde:

O mundo torna-se obscuro e ameaçador e nenhum vestígio de todo o cintilar feliz


que a salvação traz para iluminar o teu caminho tu és capaz de perceber. E assim te
vês privado de luz, abandonado no escuro, largado injustamente sem nenhum
propósito em um mundo fútil (T-26.X.6:2-7).

Portanto, nossa vida – embora tentemos iluminá-la. Assim como em um quarto escuro,
nós apertamos um interruptor e a luz se espalha, da mesma forma estamos tentando encontrar
um propósito iluminado em uma vida que é inerentemente sem significado e escura. No final
das contas – e estou me adiantando aqui -, o único significado aqui é reconhecer que não
existe significado. A única esperança repousa em reconhecer que não existe esperança aqui.
No entanto, a cada vez que Sísifo empurra a rocha montanha acima, ele tem esperança,
porque não compreende o quadro inteiro, que é o que Jesus tenta nos ajudar a fazer em seu
curso: vermos que o herói do nosso sonho – o corpo -, em suas aventuras seriais, só vai e
vem: dia sim, dia não; ano sim, ano não; vida sim, vida não. Como Jesus diz perto do fim do
Capítulo 19, quando escolhemos não despertar para passarmos através do ultimo véu do ego,
nós “vamos por aí, apenas para voltarmos e fazermos a mesma escolha outra vez” (T-19.IV-
D.10:8). A cada vez que voltamos, tentamos fazer a vida aqui funcionar. As pessoas, incluindo
estudantes do Curso, sentem que o fato de existir algo aparentemente santo nesse mundo,
como o Um Curso em Milagres, dá significado à vida. Isso perde de vista todo o ponto principal,
que é nos ensinar que nada aqui é significativo. Esse é o significado do seguinte trecho da
Lição 189:

Esquece-te desse mundo, esquece-te deste curso e vem com as mãos totalmente
vazias ao teu Deus (LE-pI.189.7:5).

Nós precisamos nos lembrar de que nada aqui vale a pena, incluindo esse curso. O valor
de Um Curso em Milagres está apenas em nos ajudar a reconhecer que não existe nada que
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valha a pena aqui. De outra forma, estaremos condenando a nós mesmos a uma vida de
futilidade, lutando contra o impossível, de alguma forma acreditando que podemos conquistá-
lo, nunca percebendo que o mundo foi feito para ser impossível; um lugar onde as coisas não
vão funcionar para sempre. Além disso, o corpo foi feito como um instrumento que não
funciona perfeitamente; ele está sempre falhando, precisando de algo, com dor, buscando
prazer ou alívio da tensão. A falta de esperança da vida no corpo é aparente quando olhamos
para ele da perspectiva do Curso. A cada dia nos vestimos e penteamos, tomamos café da
manhã, e prosseguimos com nossas atividades diárias. O dia termina e nós vamos dormir,
apenas para acordarmos para a mesma rotina. Portanto, começamos tudo de novo, como a
sina de Sísifo. A inerente futilidade de uma vida dessas nos escapa. Por exemplo, o corpo
nunca tem comida, oxigênio ou água suficientes; psicologicamente, nunca temos dinheiro,
segurança, amor ou atenção suficientes. Na verdade, o corpo foi feito especificamente para
que nunca tivesse o suficiente, pois ele é um perpétuo estado de falta, sempre lutando para
empurrar a pedra da vida montanha acima. Para contrabalançar a monotonia dessa vida, nós
desenvolvemos um aparato sensório e um sistema de apetites que parece insaciável,
capacitando-nos a buscar sempre maiores estímulos, inovação e novidades em nossos
relacionamentos especiais.

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2. Morte

Voltemos agora para os dois parágrafos na Lição 163, “Não há morte. O Filho de Deus é
livre”. A morte, é claro, é a prova final da inerente falta de significado de tudo aqui, ainda que
desesperadamente tentemos fingir que é outra coisa. Em seu livro, A Negação da Morte”, pelo
qual ganhou o Prêmio Pulitzer, Ernest Becker descreve as muitas formas em que tentamos
psicologicamente negar a realidade da morte. No entanto, a morte, como é dito em muitos
trechos diferentes do Curso, é a crença fundamental do nosso mundo (vejam, por exemplo, “O
que é a morte” [MP-27], e essa lição [LE-pI.163]). Ela é a testemunha final que prova que tudo
que o ego nos ensina é uma mentira, pois lutou inutilmente para nos levar a fazermos algo
significativo no mundo – melhorar a ele e a nós mesmos -, mas, no final, tudo e todos vão
deixar de existir.

(LE-pI.163.2:1-3) Encarnação do medo, anfitrião do pecado, deus dos culpados e senhor


de todas as ilusões e enganos, de fato, o pensamento da morte parece poderoso.

A morte é a conseqüência inevitável da trindade profana de pecado, culpa e medo do ego,


“a ilusão central da qual todas as outras derivam” (MP-27.1:1). O pecado diz que existimos
porque matamos Deus, Que teve que ser sacrificado para que pudéssemos viver: Ele morre e
nós vivemos. Esse é o nosso pecado, que nos sobrecarrega com culpa. O ego então nos diz
que Deus vai se levantar do túmulo e nos perseguir até que Se vingue, tirando a vida que
pegamos Dele, levando-nos à morte. Agora, Ele tem a vida e nós não; Ele vive e nós
morremos. Esse é o sistema de pensamento que fez o mundo, e não é difícil ver o quanto o
mundo o incorpora perfeitamente. Todos aqui pecam porque todos aqui são egoístas,
interessados só em si mesmos, algo refletido em inúmeros atos de egoísmo. Estamos todos
sobrecarregados pela culpa, não apenas pelo que fazemos uns aos outros aqui, mas pelo que
acreditamos ter feito originalmente a Deus. Nós, portanto, andamos pela terra, aterrorizados de
sermos atacados e sofrer dor. Se isso é verdade ou não, é irrelevante, uma vez que vamos
acreditar nisso, porque a culpa em relação à nossa pecaminosidade percebida requer punição.
Ainda que alguém estiver agindo de forma benigna, facilmente vamos distorcer isso para
podermos perceber essa pessoa como zangada ou punitiva, dessa forma cumprindo o
pensamento fundamental do ego de estarmos sendo tratados injustamente. É por isso que
Jesus nos dá essa linha importante:

Que estejas atento para a tentação de perceberes a ti mesmo sendo tratado


injustamente (T-26.X.4:1-2).

Nós precisamos que os outros nos tratem injustamente, porque isso significa que eles são
os pecadores. Portanto, nos livramos com sucesso de nosso pecado, projetando-o em outras
pessoas, e aí, Deus vai puni-las ao invés de nós. Além disso, em outro nível, seu ataque a nós
prova que elas estão nos punindo pelo nosso pecado, o que demonstra que o pecado da
separação é uma realidade.

(LE-pI.163.2:3-8) Pois [a morte] parece manter todas as coisas vivas dentro de sua mão
ressequida, todas as esperanças e desejos no seu domínio maléfico, todas as metas
percebidas somente por seus olhos que não vêem. Os fracos, os impotentes e os
doentes curvam-se diante de sua imagem, acreditando que só ele é real, inevitável,
digno de sua confiança. Pois somente ele virá com certeza.

Jesus diz “parece manter todas as coisas vivas dentro de sua mão ressequida” porque o
que está verdadeiramente vivo não pode morrer. Deus não foi morto, e tudo o que morre aqui é
uma ilusão de vida. No entanto, dentro dessa ilusão, tudo morre, jazendo dentro da “mão
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ressequida” da morte. Jesus está nos dizendo que nada aqui funciona e nunca vai funcionar. A
única coisa que podemos ter como certa é a morte. Lembrem-se do famoso ditado: “As únicas
coisas certas nesse mundo são a morte e os impostos”. Além disso, nesse mundo, podemos
estar certos de que não podemos contar com nada nem com ninguém; nem mesmo com Deus,
porque os humores do Deus do ego são muito variáveis: se Ele gostar de você, vai salvá-lo; se
não gostar de você, vai destruí-lo. Seu destino realmente não depende de você, mas dos
caprichos de Deus. Na verdade, o livro do Genesis relata dois incidentes terríveis nos quais
Deus mata duas pessoas simplesmente por que foi “ofendido” por elas (Genesis 38:6-10).
Nada, portanto, é certo no mundo de Deus, mas só podemos estar certos de uma coisa – de
que vamos morrer.
Podemos depender da certeza da morte porque estamos certos que existimos. Quer
gostemos ou não de nós mesmos ou do mundo, quer gostemos ou não do corpo – do nosso e
dos outros -, nossa existência nunca está aberta ao questionamento. Por exemplo, vemos
nossa imagem a cada manhã no espelho; nossos corpos ficam com fome e nós os
alimentamos; nós sentimos, pensamos, agimos. Tudo isso é certo. No entanto, se nossos
corpos são reais, a incorporação do pecado também tem que ser real. É um fato dentro do
mundo insano do ego que nossos corpos vêm à existência porque nos separamos de Deus e
destruímos o Céu, e, pelo fato de termos feito isso, merecemos ser punidos com a morte – o
resultado inevitável da existência. Portanto, não podemos separar a morte das nossas vidas
aqui. No entanto, acreditar que a morte se segue à vida é ilógico. Mas nós realmente
acreditamos nisso, que é o motivo pelo qual Jesus nos diz “não há vida fora do Céu” (T-
23.II.19:1). Tudo no mundo é meramente uma ilusão, ou uma zombaria de vida, pois termina
na morte. No entanto, como a vida poderia terminar em morte se fosse verdadeiramente vida?
O que Deus criou é eterno como Ele. E isso é verdadeiramente certo.

(LE-pI.163.3:1) Todas as coisas, com exceção da morte, são vistas como incertas,
rapidamente perdidas por mais difícil que tenha sido obtê-las, inseguras em seus
resultados, aptas a falhar às esperanças que outrora geraram e a deixar um gosto de pó
e cinzas em seu rastro ao invés de aspirações e sonhos.

Jesus está nos dizendo que tudo aqui é dessa forma – já que nada funciona, nada pode
ser confiável. No entanto, o que é mais importante é que nós não queremos confiar em nada
aqui, porque não ser capaz de confiar em nada nem em ninguém é o que prova que somos as
vítimas inocentes das ilusões, crueldade e injustiças das outras pessoas. Se não podemos
confiar nos outros, isso significa que somos vitimados pelo que eles fizeram a nós. Isso os
estabelece como pecadores, e nós como inocentes. Portanto, sua culpa merece punição,
enquanto nossa inocência merece salvação.
Assim, ainda que nos sintamos profundamente desapontados, nunca ficaríamos se não
quiséssemos ficar. Afinal, uma pessoa não pode ser desiludida a menos que primeiro tenha
ilusões. É por isso que Jesus ensina que queremos ser desiludidos, traídos e enganados,
porque isso demonstra nossa inocência à custa de alguém: eles são os responsáveis pela
nossa infelicidade, e, no final das contas, pela própria separação.

(LE-pI.163.3:2-4) Mas, pode-se contar com a morte. Pois ela virá com passos certos
quando tiver vindo o momento da sua chegada. Nunca falhará em tomar toda a vida
como refém para si mesma.

A morte vem para todos e para tudo. Com objetos inanimados, com minerais, a
desintegração ou a decomposição pode levar eons, mas vai acontecer. Portanto, não faz
diferença se falamos de uma vida humana, que termina em 20, 50 ou 90 anos, ou de uma
rocha, que termina sua “vida” em 90 milhões de anos, tudo no tempo vai chegar a um final.
Alguns cientistas, de fato, nos dizem que em algum ponto, o universo vai implodir sobre si
mesmo e desaparecer. Tudo isso mostra a futilidade inerente à “vida” no mundo. Na verdade,
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nenhum argumento significativo pode ser alcançado dentro da perspectiva do mundo de que a
vida não é absolutamente fútil e sem esperança. Como vamos ver depois, Jesus diz:

Homens morreram ao ver isso, porque não viram outro caminho exceto as trilhas
oferecidas pelo mundo. E ao aprender que não levavam a lugar nenhum, perderam
sua esperança (T-31.IV.3:4-5).

No entanto, existe uma resposta, mas não dentro do sistema do ego. Qualquer argumento
significativo tem que vir de fora do ego e do seu mundo, e esse será o assunto da Parte Dois.

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3. Figuras Lamentáveis:
“Proscritas, Sem Lar e Cheias de Medo”

Vamos voltar agora para a Lição 166, onde encontramos uma descrição pungente do que
a vida realmente é nesse mundo. Muito poucas pessoas caminham pela terra com essa
consciência, e, no entanto, somos ensinados em Um Curso em Milagres, que se olharmos com
olhos abertos para a vida no corpo, é isso o que veremos:

(LE-pI.166.4:1-3) Aqui está o único lar que ele pensa que conhece. Aqui está a única
segurança que acredita poder achar. Sem o mundo que fez, ele é um proscrito, sem lar e
cheio de medo.

Jesus está falando a todos nós; se não estivéssemos no corpo, vivendo nesse mundo,
pensamos que estaríamos sem lar. Portanto, ficamos aterrorizados de partir, porque esse
mundo é nosso lar percebido, e esse corpo é o nosso ser.

(LE-pI.166.4:4) Não reconhece que é aqui que ele é, de fato, cheio de medo e também
sem lar; um pária vagando tão longe de casa, há tanto tempo fora que não reconhece
que esqueceu-se de onde veio, para onde vai e até mesmo quem realmente é.

No entanto, a verdade é que estarmos em corpos vivendo nesse mundo é o que nos faz
sentir proscritos, pois essa é a fonte das nossas experiências de medo e ausência de lar,
inconscientes de que estamos longe de casa, pois sua memória está oculta em nossas mentes.
Jesus é claro não está falando de distância geográfica, mas do ego usar seu sistema de
pensamento de separação e pecado para esconder o pensamento da Expiação que iria nos
lembrar do nosso verdadeiro lar e nos levar para lá. E os pensamentos de culpa, medo e ódio
do ego são defendidos pelo mundo de culpa, medo e ódio. Existe de fato um lar, mas nós nos
esquecemos dele e, portanto, tudo o que sabemos é onde nossa experiência falsa nos diz que
estamos.
Como vamos ver, somos “uma figura lamentável” na verdade, porque somos proscritos
aqui, e conhecemos apenas nossa falta de lar, sem esperança de voltarmos. A cada vez em
que pensamos que conseguimos levar a pedra da vida até o topo, ela rola de volta para baixo.
E então, nossas experiências são uma série de experiências fúteis. É imperativo que os
estudantes do Um Curso em Milagres entendam que um dos principais propósitos de Jesus
para nós é o de que reconheçamos que não estamos em casa aqui. Lutar por coisas nesse
mundo – materiais ou imateriais – não nos leva a lugar algum. Portanto, Jesus nos pede para
mudarmos a direção de nossa atenção de fora (o mundo) para dentro (a mente). Essa é nossa
única esperança, e será o foco da Parte Dois.

(LE-pI.166.5:1-3) Entretanto, nas suas divagações solitárias e sem sentido, as dádivas de


Deus vão com ele, desconhecidas para ele. Ele não pode perdê-las. Mas não olhará para
o que lhe é dado.

Aqui, nós vemos o que eu chamo de estratégia do ego. As dádivas de Deus são
guardadas para nós pelo Espírito Santo e por Seu princípio da Expiação; a memória de Quem
nós somos como o Filho de Deus, que nunca se separou do Seu Pai. No entanto, não
podemos olhar para a dádiva da Expiação porque ela está oculta por duas camadas, a concha
dupla de esquecimento de que uma lição anterior do livro de exercícios fala (LE-pI.136.4-5). A
primeira é o sistema de pensamento de pecado, culpa, medo, punição e morte da mente, em
que tudo fala pela realidade da separação, negando a realidade da Expiação, que diz que a
separação nunca aconteceu. Esse sistema de pensamento, então, é encoberto por uma
segunda concha, que é o mundo e o corpo. Portanto, nem mesmo sabemos onde procurar,
13
porque não sabemos que temos uma mente, tendo acabado como criaturas sem mente. Nós,
portanto, estamos inconscientes do que está realmente acontecendo – assim como Sísifo que
empurra sua pedra montanha acima, sem consciência de que já fez isso um número quase
infinito de vezes, e vai continuar ad infinitum sem memória de como é sua vida.
E então, nós mantemos em segredo os locais escuros da nossa culpa. O mundo –
pessoal e coletivo – é uma defesa massiva contra lidarmos com o que acreditamos ser o nosso
segredo de que destruímos o Céu. Nós naturalmente não percebemos que esse segredo é
uma mentira, porque não destruímos o Céu. Como um dos poemas de Helen Shucman,
“Canção para o Meu Ser”, conclui:

Eu nunca deixei a casa do meu Pai. Que necessidade tenho


de fazer a jornada de volta para Ele? (As Dádivas de Deus, p. 38)

O sistema de pensamento do ego – mente e mundo – foi todo inventado. Portanto, o


medo fundamental do ego não é da verdade e do amor de Deus, mas do poder da mente de
escolher se lembrar Dele. Deus não pode ser uma ameaça ao ego porque ele não conhece
nada sobre Ele. Mas ele realmente conhece a ameaça da mente tomadora de decisões que o
escolheu, e pode escolher novamente, enviando o ego de volta para “o nada do qual ele veio”
(MP-13.1:2). Como lemos, no texto:

Não tenhas medo do ego. Ele depende da tua mente e como tu o fizeste por
acreditares nele, da mesma forma podes dissipá-lo retirando a tua crença nele (T-
7.VIII.5:1-3).

Em resumo, o pensamento de que matamos Deus e merecemos ser punidos foi feito para
nos aterrorizar para que nos sentíssemos motivados a deixar a mente, projetando um corpo e
um mundo no qual pudéssemos nos esconder da ira de Deus, como Adão e Eva tentaram fazer
escondendo-se nos arbustos. No entanto, o medo subjacente permanece – de que se um dia
voltarmos à mente e olharmos para o pensamento da separação, vamos reconhecer sua
nulidade e escolher outra vez. Daí a concha dupla de esquecimento (Le-pI.136.5:2). Primeiro, a
história terrível do ego de pecado, culpa e medo, na qual somos os assassinos, os pecadores
destruidores do Céu, que estão aterrorizados da punição de Deus. Segundo, o mundo sem
mente do corpo que fizemos para nos proteger da sina inevitável da destruição da mente. E
agora, sem mente, nunca poderemos mudar nossas mentes da decisão original, que
permanece aparentemente para sempre. É essa motivação de permanecermos sem mente que
mantém no lugar a amnésia que nos impede de nos lembrarmos de como e por que fizemos o
mundo, e por que o fizemos como um lugar de futilidade perpétua: nascimento, vidas sem
significado e morte.
Nós, portanto, lutamos para vencer a futilidade da vida sem mente aqui,
desesperadamente tentando fazer o mundo funcionar, quando ele não pode. Como poderia o
nada funcionar? No entanto, o ego nos mantém tentando, direcionando nossa energia e
atenção para foram, para longe da mente. Nós lutamos para fazer o corpo se sentir melhor – o
nosso e os dos nossos amados -, e trabalhamos para aperfeiçoar o mundo e suas terríveis
condições de sofrimento. E, o tempo todo, o mundo interior, que é o problema, jaz enterrado
sob essa concha dupla de culpa – na mente e no mundo. Perpetuando essa insanidade, mais
uma vez, está nossa necessidade de mantermos enterrado nosso profundo e escuro segredo.
E então, nós caminhamos por essa terra – figuras lastimáveis realmente -, com esse
pensamento culpado de termos destruído o Céu. Enquanto temermos esse pensamento,
vamos ser impelidos a escaparmos para o mundo moribundo de corpos e permanecermos
aqui. Quando nós finalmente voltarmos para a mente e olharmos para o segredo do ego,
vamos perceber que não há nada lá: nunca pecamos, nunca fugimos para o mundo; não houve
abandono ou traição, nem perda ou vitimação. Apenas no pesadelo do mundo de ilusões, tudo
isso pareceu acontecer.
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No entanto, não vamos atingir esse ponto até que mergulhemos na escuridão,
caminhando com o Espírito Santo em “terror aparente” através do “anel de medo” (T-18.IX.3:7-
9), percebendo que o escuro e fútil mundo do ego não é nada, porque vem de um pensamento
de nulidade. Vamos retornar a isso depois: a saída do inferno. Mas primeiro, precisamos estar
conscientes do que estamos fazendo, que é o motivo pelo qual Jesus descreve nossa vida
nesse mundo. Embora seja evocativa em sua linguagem, a seguinte descrição não é nada
diferente do que já vimos em passagens anteriormente citadas:

(LE-pI.166.5:4) Continua a vagar, ciente da futilidade que vê em toda parte à sua volta,
percebendo o quanto a sua pouca sorte definha à medida que avança para ir a lugar
nenhum.

Todos sabem que a morte é o fim, no entanto, lutamos bravamente para negá-la. Nem
mesmo estamos conscientes de que o tempo linear é parte da sacola de truques do ego, e
pensamos que temos anos e décadas reais à nossa frente. O livro de exercícios, portanto,
descreve o tempo como:

O tempo é um truque, um passe de mágica, uma vasta ilusão em que figuras vem e
vão como por magia (LE-pI.158.4:1-2).

Uma vez que a futilidade não é algo que acontece no final – o inferno do ego é bem agora
-, somos levados a concluir que deveríamos comer, beber e comemorar, pois amanhã vamos
morrer (Eclesiastes 8:15). A cada vez em que escolhemos acreditar na realidade do corpo,
estaremos acreditando na morte. Um Curso em Milagres enfatiza que a morte não tem nada a
ver com o fim da existência física, mas é uma parte integrante do sistema de pensamento de
separação, culpa e punição do ego.

(LE-pI.166.5:5) Mesmo assim, continua a vagar na miséria e na pobreza, sozinho embora


Deus esteja com ele, com um tesouro tão grande que tudo o que o mundo contém é sem
valor diante da sua magnitude.

Uma vez que o tesouro de Deus está enterrado em nossas mentes certas, não temos
consciência dele. E, nos identificando com o sistema de pensamento do ego – na mente e no
corpo -, nunca podemos nos lembrar desse tesouro. Na verdade, o propósito do mundo é
encobrir o sistema de pensamento de culpa e medo da mente, o que, por seu lado, encobre o
tesouro da Expiação e o poder da mente de escolhê-lo. Em seu lugar, o ego nos oferece as
bugigangas inúteis do especialismo: o substituto para o amor.
A importante seção, “A realidade substituta” (T-18.I), discute o relacionamento especial
como nosso substituto para a realidade que Deus nos deu na nossa criação. Nós buscamos
substituir o Amor de Deus, que é perfeita Unicidade, pelo amor do indivíduo e o amor entre
indivíduos. Nosso relacionamento especial com o ego foi o primeiro substituto para nosso
relacionamento com Deus, e, quando isso se fragmentou, nós simplesmente continuamos a
substituir, pensando que dessa vez conseguiríamos o tesouro e finalmente conseguiríamos o
que queríamos: essas ações vão render, esse trabalho ou relacionamento vai funcionar, esse
médico vai me ajudar, esse novo regime vai me curar, ou essa vida vai funcionar. Não estamos
conscientes de que nada jamais vai funcionar, porque todas as coisas aqui são só substitutos
para o verdadeiro tesouro do nosso Ser e, portanto, simbolizam na forma o pensamento
original de que destruímos o Céu, assassinando Deus e crucificando Seu Filho.
Mais uma vez, acreditamos que tal insanidade é a realidade, e, portanto, fugimos para o
mundo da forma e para nossos vários papéis, na esperança mágica de que isso vai protelar a
ansiedade de sabermos que seremos punidos pelo nosso pecado, e então, em desespero,
continuamos a tentar fazer as coisas funcionarem aqui. No entanto, tudo o que fazemos é
simplesmente uma tentativa de sufocar esse senso inquietante de culpa e auto-ódio. Nós
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dizemos a nós mesmos que um dia algo aqui vai funcionar: vamos ter sucesso e ser felizes, e
vamos ser vistos como uma boa pessoa. Subjacente a isso, novamente, está o pensamento de
que nunca teremos que lidar novamente com a fossa de culpa, terror e ódio em nossas
mentes. Somos pegos em um círculo vicioso do qual parece não haver escapatória.

(LE-pI.166.6.1) Ele parece uma figura lamentável: exaurida, cansada, em farrapos, cujos
pés sangram um pouco devido à estrada pedregosa em que caminha.

Essa não é a imagem que geralmente temos de nós mesmos. Nós fazemos todos os tipos
de coisas para esconder a culpa das nossas mentes, o inquietante auto-ódio que todos nós
compartilhamos. Nós encobrimos sua presença esmagadora e tentamos tornar nossos corpos,
personalidades, e mundo agradáveis, tentando não vermos a nós mesmos como Sísifo,
empurrando uma pedra montanha acima de novo e de novo, em uma exibição desesperadora
de futilidade.

(LE-pI.166.6:2) Não há ninguém que não tenha se identificado com ele, pois todos
aqueles que aqui vêm perseguiram a rota que ele segue e sentiram a derrota e a
desesperança como ele as está sentindo.

Todos nós perseguimos esse caminho e sentimos a inevitável derrota e a inerente falta de
esperança da vida do corpo, aprisionados em um mundo ao qual não pertencemos. Jesus
também fala disso em uma lição posterior, que começa com ele dizendo o quanto nos sentimos
alienados nesse mundo que não é o nosso lar (LE-pI.182.1-3).
É, portanto, imperativo que reconheçamos como é a vida nesse mundo, de outra forma,
não teremos a motivação para buscar o outro caminho. Nós simplesmente iríamos tentar fazer
o melhor de uma situação que já é sem esperanças, e continuar a buscar e buscar e nunca
encontrar a resposta. A cada vez em que empurrarmos a pedra até o topo, ela vai rolar de volta
para baixo; nossa única esperança sendo que ela não role sobre nós. Novamente, nada aqui
funciona, e tudo foi feito especificamente para não funcionar. Apenas o amor “funciona”; no
entanto, ele não é do corpo nem do mundo. O amor pode ser experimentado apenas através
da escolha da mente de se lembrar dele. Todas as formas de especialismo do ego são apenas
substitutos desse pensamento perfeito, e Jesus quer que compreendamos o quão sem
esperança são todos os esforços do mundo.

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4. Buscar e Achar

Voltemos agora ao texto. E “Buscar e Achar” é uma seção que descreve como o ego nos
faz buscar continuamente o que vai nos tornar felizes, contentes e inteiros, dando significado
às nossas vidas. No entanto, nunca vamos encontrar isso, pois todos buscamos a salvação na
dor, quer acreditemos ou não em sistemas religiosos. Nunca poderemos ser verdadeiramente
liberados do nosso sofrimento, no entanto, até chegarmos à sua fonte na mente, e depois,
mudarmos nosso pensamento. Em outras palavras, nossa dor vem da decisão da mente pela
culpa. Portanto, precisamos voltar ao ponto da decisão (“o ponto no qual o equívoco foi
cometido” [T-5.VII.6:5]) e escolher outra vez. Só então poderemos ter esperança real,
acabando com a futilidade da vida, porque agora buscamos a reposta no único lugar em que
pode ser encontrada: na mente. Nossas vidas então assumem um propósito real, pois buscar
dentro significa que seguramente vamos achar o significado da vida. Foi para isso
precisamente, outra vez, que o ego fez o mundo: para que continuamente não buscássemos
na mente, e, portanto, nunca fôssemos capazes de escolher a Expiação – nossa única
necessidade.

(T-12.IV.2:1-4) A busca que o ego empreende está, portanto, condenada a fracassar. E


uma vez que ele também ensina que está identificado contigo, a sua orientação te
conduz a uma jornada que necessariamente terminará na percepção do teu próprio
fracasso.

Essa é outra visão da vida no corpo. A busca que o ego empreende nunca será bem
sucedida, porque está designada para nos direcionar a buscar no lugar errado. Nunca vamos
encontrar felicidade no mundo, e, se pensamos que vamos, estaremos muito enganados, pois
nenhuma felicidade no mundo pode durar. Na Lição 133, “Não vou dar valor ao que não tem
valor”, um dos critérios que Jesus cita para nos ensinar a diferença entre o que é valioso e o
que não é, é que apenas o eterno é verdadeiramente valioso. Quando pensamos que temos
algo de valor, ele quer que consideremos se isso vai durar ou não, como o amor e a paz.
Qualquer coisa mais é inerentemente sem valor, porque não é do Deus eterno. Por que, então,
deveríamos nos importar com isso? O ego nunca quer que compreendamos que o único
significado verdadeiro aqui está em despertarmos para o nosso Ser real através do perdão.
Tudo o mais é sem significado e sem valor.
Portanto, precisamos perguntar a nós mesmos: Quantos valores que perseguimos vão
nos ajudar a despertar do sonho da separação? Quase todos eles são designados para nos
impedir de voltarmos para a mente, o único lugar no qual podemos exercer uma escolha
significativa. As coisas aqui são programadas para nos manter adormecidos, não para
despertarmos. Até mesmo o mais nobre dos propósitos vai terminar tornando o mundo e os
corpos reais. Por exemplo, acabar com o sofrimento físico nesse mundo parece ser um objetivo
nobre e certamente cheio de significado, mas vai falhar. A fonte do sofrimento das pessoas, em
última instância, não é a doença ou a falta de água e comida, mas a culpa que vem de
escolhermos o professor errado – na mente, não no corpo.
Isso não significa que não deveríamos ajudar a aliviar o sofrimento em termos do mundo;
mas que precisamos entender que isso não vai funcionar de verdade nem nos trazer paz, se
acreditarmos na forma do que estivermos fazendo. Nossos corpos podem estar agindo para
aliviar o sofrimento físico das pessoas, mas, a menos que reconheçamos que a causa do
sofrimento que queremos desfazer é a separação, vamos simplesmente nos tornar uma parte
do problema. Apenas a decisão da mente pela separação é a causa do sofrimento. E então,
precisamos aprender que não somos separados das pessoas que estamos ajudando, ou
daqueles que podem estar atrapalhando essa ajuda. A menos que prossigamos com essa
compreensão, não importando quantas cestas de comida doemos, não importando quanto
dinheiro doemos, não vamos acabar com o sofrimento. Portanto, se não desfizermos a causa
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do sofrimento – a crença em interesses separados -, nada vai jamais mudar; ou, se o fizer,
algum outro problema inevitavelmente vai surgir para tomar o seu lugar. Uma vez que estamos
buscando a resposta no lugar errado, não importando o quanto nossa solução seja bem
intencionada, estaremos errados. É por isso que Jesus diz:

Não confie nas tuas boas intenções. Elas não são suficientes. (T-18.IV.2:1-2).

Vamos continuar com esse tema:

(T-12.IV.4:1) Reconheces que o ego precisa te induzir a uma jornada que não pode
conduzir senão a um sentimento de futilidade e depressão?

Nós somos todos como Sísifo, em uma jornada que leva a um sentido de futilidade e
depressão. Não importando quão bravamente lutemos para alcançarmos nossas metas, nunca
vamos levar a grande pedra ao topo da montanha. Nossa falha, assim, significa que nunca
vamos encontrar paz, salvação ou amor aqui; nunca vamos encontrar nosso lar. Tentar tornar o
lar do mundo melhor não pode fazê-lo funcionar para nós. Jesus quer que entendamos que a
jornada do ego é de futilidade e inevitavelmente vai levar à depressão: no fim, sempre vamos
perder.
Portanto, se não estivermos dolorosamente cientes disso – e essa certamente é uma
consciência dolorosa -, não vamos estar motivamos a buscar outro professor. Vamos pensar
que estamos pedindo ajuda a Jesus, mas tudo o que estaremos fazendo é pedir ao ego, que
inteligentemente se mascara de sábio professor, tendo enganado os cristão por dois mil anos.
Mais uma vez, não haverá motivação para pedirmos ajuda a Jesus - a verdadeira presença de
amor e sabedoria na mente – até que estejamos certos de que nada aqui funciona, pois
estivemos seguindo o professor errado.
Ao recontarmos a história de como o Um Curso em Milagres foi escrito, é importante que
nos lembremos de que Helen Schucman e William Thetford não conheciam o outro caminho,
mas sabiam que o que estavam seguindo – projeção e ataque – era de futilidade e depressão,
e não os estava fazendo felizes. Seu caminho era o equivalente a Sísifo empurrando sua pedra
para cima, apenas para vê-la caindo de volta. Helen e Bill estavam experienciando a constante
repetição de sentimentos competitivos: ódio, agressão e condenação – um verdadeiro buraco
sem fundo de julgamento, com as pessoas sempre propensas a criticarem e encontrarem
falhas. Mais uma vez, Jesus nos pede para entendermos que o ego tem que nos colocar em
uma jornada que nos leva apenas à futilidade e depressão.

(T-12.IV.4:2) Buscar e não achar dificilmente traz alegria.

Precisamos ficar cientes de que nossa falta de alegria não surge porque não fizemos um
trabalho bom o suficiente e podemos fazer melhor; nem por que as pessoas ruins nos
impediram de alcançar o que queremos. Nossa falta de alegria vem de termos olhado no lugar
errado ao procurarmos por ela – o corpo, e não a mente. A outra forma de olhar, de nos
relacionarmos com o mundo, não é encontrada no externo; apenas na mente pode ser
encontrada esperança real.

(T-12.IV.5:1-4) Tu irás empreender uma jornada, pois não estás em casa nesse mundo. E
irás buscar o teu lar, reconhecendo ou não onde ele está. Se acreditas que está fora de
ti, a busca será fútil, pois estarás buscando onde ele não está.

Esse, mais uma vez, é o problema. Nós buscamos respostas no lugar errado porque o
ego não quer que as encontremos, e então, não sabemos que existe outro lugar além do
mundo ou corpo no qual procurar. Tudo o que sabemos é que nós estamos no sopé da
montanha e temos que empurrar a rocha até o topo. E então nós empurramos, e, conforme o
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fazemos, inventamos histórias – filosofias, teologias, mitologias, psicologias, e outras “ogias” –
para explicarmos a significância, significado, beleza, maravilha e espiritualidade de
empurrarmos a rocha para cima da montanha. E, como sociedades, somos bem engenhosos e
inventivos em tecermos essas teias de especialismo espiritual, filosófico e teológico, para
tirarmos sentido de algo que é inerentemente sem sentido. Nós então passamos séculos
refinando-as e debatendo-as, prosseguindo para denunciarmos, isolarmos e até matarmos
aqueles que discordam de nós.
Esse é o ponto dessas passagens, onde Jesus nos diz, com efeito: “Não busque onde
você não vai encontrar. Não tente tirar sentido de algo que não faz sentido. Empurrar a pedra
da vida aparente para cima da montanha não vai lhe trazer salvação, nem vai levá-lo à verdade
ou a penetrar os mistérios da existência. A punição infligida pelos deuses a Sísifo é um sonho,
e você não precisa continuar sua existência ilusória”. Quem, então, são esses deuses além de
figuras inventadas do sonho de pecado do ego, a quem acreditamos ter ofendido? E que
melhor punição pode ser infligida além de um corpo que vai morrer? – um plano absolutamente
brilhante da parte do ego; no entanto, isso tudo não é nada além de um sonho ruim.
Qualquer um que pense que a deidade bíblica é o verdadeiro Deus não leu aquele livro
cuidadosamente. Ele é uma figura monstruosamente cruel, que ficou tão enfurecida pelo
pecado que criou o sofrimento e a morte do corpo como punição (Gênesis 3). A introdução ao
Capítulo 13 no texto descreve esse insano sistema de crenças, como vimos antes (veja p. 9-
10). Além disso, não é apenas com a nossa morte que temos que chegar a um acordo, mas
com a morte de todos os outros também. Esse mundo de dor e morte não é um bom lugar e,
apesar disso, continuamos tentando fazê-lo funcionar. O ponto de Jesus, no entanto, é que
isso é impossível.
Nós voltamos agora a “A alternativa real”, que enfatiza a única alternativa verdadeira para
nossa busca. O mundo oferece milhares e milhares de possibilidades diferentes de
encontrarmos paz e felicidade, no entanto, todas vão falhar:

(T-31.IV.2:3-5) Todas as suas [do mundo] estradas só levam ao desapontamento, ao nada


e à morte. Não existe nenhuma escolha entre as suas alternativas. Não busques escapar
dos problemas aqui.

Tudo aqui leva ao “desapontamento, ao nada e à morte”, e, portanto, não faz sentido
tentar tornar o mundo belo e santo. Uma vez que buscamos escapar dos problemas aqui,
podemos pensar que estamos fazendo algo significativo. Mas como isso pode ser assim se não
existem problemas aqui para início de conversa? O propósito do mundo é ocultar o verdadeiro
problema da escolha da mente pelo ego, uma escolha que antedata e transcende o mundo
tempo-espacial.

(2:6) O mundo foi feito para que não fosse possível escapar dos problemas.

Esta linha importante resume o propósito do mundo de assegurar que nunca escapemos
dos nossos problemas – sua fonte sendo o tomador de decisões na mente, cuja escolha
equivocada nunca pode ser desfeita pelo envolvimento com o externo. O problema da culpa
continuamente se regenera através da projeção, causando todos os tipos de miséria e dor aqui.
No entanto, não sabemos de onde ele realmente vem, que é o motivo pelo qual os problemas
terrenos jamais são resolvidos. Como o livro de exercícios explica em duas lições (LE-
pI.79,80), assim que resolvemos um problema, outro se levanta para tomar seu lugar; tão logo
resolvemos o problema da fome pela manhã, temos o problema do almoço com o qual lidar,
então o jantar, algumas vezes, lanches entre eles. Apenas para começar de novo no dia
seguinte. De forma similar, tão logo resolvemos o problema da falta de oxigênio nos pulmões
por tomarmos uma inspiração, logo temos que respirar novamente; quando encontramos
aqueles que nos amam e atendem às nossas necessidades, continuamente lutamos para

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impedi-los de jamais nos deixarem. Todos nós repetimos incessantemente esses ciclos, de tal
forma que o problema da culpa nunca é examinado e, portanto, nunca é liberado.

(2:7-11) Não sejas enganado por todos os nomes diferentes que são dados às estradas.
Elas só têm um fim. E cada uma não passa de um meio de adquirir aquele fim, pois é a a
isso que todas as suas estradas conduzirão, por mais que os seus inícios pareçam
diferentes; por mais que os seus percursos pareçam diferentes. O seu fim é certo, pois
não existe nenhuma escolha entre elas. Todas conduzirão à morte.

Não importando o que Sísifo pense sobre seu destino, não importando por quanto tempo
ele empurre, quer ele faça isso com a mão esquerda, direita ou com ambas; quer a rocha
esteja de frente ou de costas, no final, ela vai rolar para baixo e ele vai ter que começar tudo de
novo. Nossa assim chamada vida sempre termina na futilidade da morte.

(2:12-14) Em algumas, viajas contente por algum tempo, antes da desolação entrar. E em
outras, os espinhos são sentidos imediatamente. A escolha não está em qual será o
final, mas em quando ele virá.

O fim é inevitável. Tudo e todos morrem, quer seja uma morte no berço ou de “causas
naturais”, aos 98 anos de idade. Não importa se os nossos relacionamentos especiais
funcionam ou não. Uma vez que o tempo é uma ilusão, como o destino do corpo pode ser
importante? De fora do sonho, acima do campo de batalha do tempo e espaço, todas as
ilusões são a mesma, e tudo o que importa é que nós tornamos a vida e a morte reais, assim
tornando a esperança uma vã imaginação.

(3:1-2) Não existe nenhuma escolha possível ali onde não há dúvidas em relação ao final.
Talvez preferisses tentar todas até aprenderes que realmente são apenas uma só.

Como todas as estradas são a mesma, todas formas diferentes de especialismo


continuam sendo especialismo: um substituto sem significado para o amor e um símbolo de
pecado que exige punição através da morte.

(3:3-5) As estradas que esse mundo pode oferecer parecem ser muitas em número, mas
tem que vir o tempo em que todas as pessoas começarão a ver como são semelhantes
umas às outras. Homens morreram ao ver isso, porque não viram outro caminho exceto
as trilhas oferecidas pelo mundo. E ao aprender que não levavam a lugar nenhum,
perderam sua esperança.

Quando lutamos para encontrar significado aqui, quando fazemos tudo e nada funciona,
nós inevitavelmente concluímos que não existe mais um propósito em viver, restando o suicídio
como única solução significativa dentro desse insano sistema de pensamento. Alguns, no
entanto, como vimos, negam essa lógica e dizem: “Uma vez que nada aqui significa coisa
alguma, posso muito bem me divertir e não me preocupar com as conseqüências; realmente
não importa se alguém fica ferido, pois tudo é sem significado de qualquer jeito”. Outros ainda
podem dizer, de forma mais benevolente: “Ainda que não exista um propósito final aqui,
podemos pelo menos viver respeitando uns aos outros”. Apesar disso, a ausência de
significado da vida permanece o cerne da nossa experiência inconsciente. Incidentalmente, o
suicídio não é apenas atirar em si mesmo. Câncer, AIDS, e um ataque do coração são todos
suicídios; assim como caminhar “inadvertidamente” na frente de um carro que está vindo. Pelo
menos duas vezes, Jesus nos diz que ninguém morre sem seu próprio consentimento, porque
o corpo e todas as suas atividades apenas refletem uma decisão tomada pela mente (T-19.IV-
C.1:4; LE-pI.152.1:4).

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O ego, portanto, quer que nos sintamos sem esperança em um mundo fútil. E então, em
vez de dizer que tem que haver outro professor e mundo nos qual possamos viver, acreditamos
que esse mundo é tudo o que existe. Entretanto, não existe nada aqui. Agarrando-nos a esse
pensamento, a morte parece a única resposta, e não faz diferença se chegamos a essa
compreensão com a idade de 20, 40 ou 140 anos. Apenas a morte é certa, a prova final do ego
de que nós vivemos, mesmo que a vida tenha sido de absoluta futilidade e desespero. A partir
dessa desesperança, no entanto, podemos atingir uma conclusão diferente: “Tem que existir
um caminho melhor” (T-2.III.3:6). Mas, antes de discutirmos essa alternativa, precisamos
considerar ainda mais um aspecto da desesperança do ego.

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5. “Stabat Mater”

Para concluirmos nossa discussão sobre a fútil vida de Sísifo e a nossa própria, apresento
o poema de Helen, “Stabat Mater” (As Dádivas de Deus, p. 92). Stabat Mater em latim significa
“a mãe estava parada”, e pode ser traçado até um hino medieval sobre os pesares da Mãe de
Jesus, Maria, que ficou parada aos pés da cruz. A primeira linha do hino é Stabat Mater
dolorosa: a mãe estava em pé, cheia de pesar. É um hino altamente evocativo, que desperta
profundos sentimentos em seus ouvintes, e muitos compositores proveram lindos e
inspiradores arranjos para ele, como Pergolesi, Palestrina, Vivaldi, Rossini e Dvorak.

O poema de Helen descreve a cena na cruz, exceto que não é Maria que fica em pé, em
tristeza, mas todos nós. Dificilmente um poema feliz, ele resume poderosamente a futilidade de
vivermos em um mundo de crucificação, um lugar de morte, do qual não existe saída. Aqui está
a linha inicial:

Quem fica em pé, ao lado da cruz, está totalmente só.

A cruz é o mundo, que reflete o pensamento do ego de que nós crucificamos o Filho de
Deus por substituirmos Cristo – o Filho único de Deus - pelo nosso ser individual. Em Um
Curso em Milagres, o termo crucificação é um símbolo para o sistema de pensamento do ego:
inocência espancada, torturada e morta como sacrifício para nós, que somos os terríveis
pecadores. O ego nos diz que esse é o plano de Deus, levando Seu Filho inocente a sofrer
pela salvação do mundo. Todos os componentes do sistema de pensamento do ego estão
aqui: pecado, culpa, medo da punição, sacrifício, injustiça, sofrimento e morte.
Essa linha nos diz que nós ficamos em pé ao lado da cruz sozinhos, porque nós estamos
sozinhos. Nós desesperadamente tentamos forjar laços com os outros, mas não podemos
fazê-lo porque são nossos corpos, feitos para serem separados, tentando unir-se a outros
corpos, que também foram feitos para serem separados. Assim, ao mesmo tempo em que
nosso corpo separado tenta provar que o de outro é pecaminoso e o nosso é inocente, o corpo
de outro tenta fazer a mesma coisa conosco. Como, então, pode haver união? Nós, portanto,
estamos sozinhos nesse mundo, febrilmente tentando lidar com a dor e ansiedade da nossa
solidão. Mais uma vez, cada um de nós está sozinho por causa da crença compartilhada de
que destruímos o Céu; cuja dor tentamos ocultar por trás dos véus do especialismo e ataque.

Pois um pesar como esse não pode ser compartilhado.

Embora esse não seja o significado explícito do poema, subjacente a essas linhas está o
ensinamento do Curso de que queremos nosso pesar e assim, não queremos compartilhá-lo.
Nosso sofrimento significa que algo foi feito a nós, as vítimas inocentes dos pecados de outros.
E, se cada um de nós puder demonstrar isso ao mundo, para não mencionar ao Próprio Deus,
não seremos considerados os miseráveis pecadores que serão punidos. Alguém mais então
será julgado: o pecador mau que fez isso conosco. É por isso que todos nós nutrimos nossas
vidas de dor, mágoa e solidão: de outra forma, eles – os roteiros que nossas mentes
tomadoras de decisões escreveram – não seriam como são. Nossas vidas, portanto, são
propositais, pois elas nos permitem apontar um dedo acusador para outra pessoa, dizendo:
“Contempla-me, irmão, nas tuas mãos, eu morro” (T-27.I.4:6).

Um buraco é talhado na rocha sólida


Entre o mundo e ela. Nenhuma ponte, nenhuma mão
Pode alcançar a cruz para confortá-la.

Todos nós buscamos conforto, mas nosso único conforto real está em sabermos que
nossos pecados estão perdoados. Quando aceitamos esse fato feliz, toda dor se vai, porque
22
ela veio da crença em que destruímos o Céu e, portanto, merecemos ser destruídos do mesmo
jeito. Nós lidamos com esse pensamento aterrorizante fingindo que ele não está ali. Assim,
negando sua presença, nós o projetamos, tornando os outros maus. É por isso que malfeitores
é um termo tão popular nesses dias: ver o mal fora de nós prova nossa inocência – o princípio
do ego de um ou outro. No entanto, isso nos deixa sentindo-nos completamente sozinhos no
universo, separados por “um buraco... entre o mundo e [nós]”. Não podemos ser confortados,
mesmo quando conscientemente o desejamos, porque a fonte do nosso desconforto não está
no corpo ou no mundo, mas na mente. Nosso conforto, portanto, resulta de escolhermos de
forma diferente, reconhecendo que nossa culpa é injustificada porque nada nos separou da
nossa Fonte.
Emprestando a famosa frase do evangelho de João (14:18), Jesus encerra o livro de
exercícios dizendo: “Eu nunca te deixarei sem conforto” (LE-ep.6:8). O conforto que ele traz é o
de saber que estamos errados; não apenas sobre tudo aqui, mas sobre quem somos. Nós
somos crianças do Amor, não do pecado e culpa. Isso significa que nada aconteceu para
mudar aquele Pensamento, que permanece íntegro, não-fragmentado e não-dividido. A
Perfeita Unicidade ainda é perfeita.

Silentemente,
Ela permanece, sem a ajuda amarga das lágrimas,
Pois lágrimas foram feitas para os pesares comuns.
Que há muito vieram e foram superados.

Esse não é um pesar comum, mas o pesar ontológico que temos carregado conosco
através das eras. Enterrado nos recessos da mente de todos está o horrível pensamento de
que nós destruímos nosso lar e nunca poderemos voltar. Nós desesperadamente tentamos
acreditar que Deus o destruiu, ou outros o fizeram, mas o pensamento atormentador de que
nunca realmente podemos escapar é o de que nós fizemos isso. E então, nosso pesar se
estende muito além do que possa ser aliviado por sermos conduzidos e confortados, e
ouvirmos que tudo ficará bem. Não pode ficar tudo bem enquanto acreditarmos que estamos
aqui, enquanto abrirmos nossos olhos a cada manhã e contemplarmos um mundo separado,
que prova nosso pecado. O Céu se foi para sempre, e até mesmo se o Céu fosse retornar, não
existe forma de Deus nos receber de volta. Afinal, nosso Criador sabe que se permitisse nosso
retorno, nossos seres traidores iriam pecar novamente. E então, não existe esperança, algo
tocantemente expresso no poema de Helen.
Chegamos à segunda estrofe:

Aqui o tempo é calculado de forma diferente. Um mês


Passa em um instante, e os anos
Passam em uma rígida procissão no espaço
Que outros chamam de uma hora. No entanto, para ela
Eles alcançam a eternidade.

Todos nós estamos parados aos pés da cruz do ego: um mundo de absoluta
desesperança, que transcende as dores transitórias de qualquer momento, situação ou vida
específica. Isso é desespero cósmico, nascido da rígida procissão do tempo, da futilidade
eterna:

Ela fica parada,


Após eras, sem esperança.
Aqui é o para sempre. Aqui é a ausência de tempo.

Isso não é a ausência de tempo do Céu, no entanto, eclipsa as unidades específicas do


tempo. É a versão insana do ego para a eternidade, que nos mantém para sempre condenados
23
a rolarmos a pedra montanha acima, apenas para fazê-la descer outra vez. Nesse sonho
quase-eterno de futilidade, devemos sempre ficar parados aos pés da cruel e inexorável cruz.
E agora, a linha final do poema:

Quem poderia acreditar que o tempo da morte terminará?

Quem jamais poderia acreditar que haveria um fim para isso? Sísifo está sempre
empurrando a pedra em Hades, o submundo da morte; nós estamos sempre no processo de
morrer. Na verdade, como Freud observou, desde o nascimento, estamos nos preparando para
a morte. “Quem iria acreditar que o tempo da morte terminará?”. Esse pensamento,
encapsulado no poema de desespero de Helen, é o fato da vida que desesperadamente
tentamos negar. Nós, então, fazemos um mundo no qual acreditamos que as coisas de alguma
forma vão funcionar. Elas nunca o fazem, e profundamente dentro de nós, sabemos disso
porque em algum lugar dentro de nossas mentes, sabemos que estamos tentando encobrir
essa figura da stabat mater, a mãe dirigida pela culpa, que fica em pé aos pés da cruz da
morte.
O início de “O aprendiz feliz” (T-14.II.1) nos diz que o Espírito Santo quer que vejamos o
quanto somos miseráveis; de outra forma, Ele não será capaz de nos motivar a escolhermos
aprender Suas lições. Ele, portanto, quer que nos tornemos aprendizes felizes, o que acontece
quando primeiro reconhecemos nossa miséria e a contrastamos com a felicidade em cuja
direção nosso Professo nos conduz. É imperativo vermos o quanto nossa existência é
miserável, mesmo quando parece funcionar, o que freqüentemente parece acontecer. No final,
entretanto, todas as experiências no mundo vão se reduzir a zero, pois tudo aqui chega a um
fim. E então, todos nós ficamos aos pés da cruz do ego, sem esperança de que nossa situação
sisifoniana jamais possa mudar.

P: Estou certo em dizer que nada no mundo jamais mudou?

R: Como veremos depois em nossa discussão, existe uma mudança significativa, mas não é
no nível do mundo. A verdadeira mudança não consiste de fazermos mudanças dentro do
sistema de ego, o qual, para usarmos uma analogia popular, seria o equivalente a
rearranjarmos as cadeiras no Titanic. Por que se importar em mudar algo que está condenado,
sem falar que nem mesmo está lá? E então, não trocamos necessariamente de parceiros de
amor ou ódio especial, mas realmente buscamos e mudamos o sistema de pensamento que
fez surgir esse especialismo – a cruz da morte -, e, por seu lado, fez surgir a futilidade da
montanha e pedra de Sísifo. Podemos realmente tentar tornar nossas vidas melhores, como
todos nós fazemos de vez em quando, mas em última instância, nossas tentativas vão falhar,
que é o motivo pelo qual existe um senso inerente de desapontamento, desespero e
desesperança aqui. Tentar tornar o sonho mais feliz, mais saudável, mais próspero e menos
solitário nunca vai funcionar, pois nada no mundo pode nos trazer felicidade verdadeira, a
menos que seja usado para erradicar o pensamento original que fez surgir o sonho.
Embora isso soe simples, e sua lógica não possa realmente ser refutada, o problema em
aplicar esse princípio é que nosso ser físico-psicológico é o produto desse pensamento de
separação. Bem dentro de nós, entendemos que se mudarmos o pensamento, nosso ser
especial vai desaparecer. Portanto, não é que o ego não queira que voltemos às nossas
mentes. Nós somos o ego, e somos nós que não queremos voltar à mente. E então,
escolhemos um sistema de pensamento que nos mantém em um estado perpétuo de ausência
de mente, parados aos pés da cruz do ego, onde adoramos os ídolos de mal, injustiça e morte
– o triunfo do mal sobre o bem, que é o significado da crucificação. Nós então estabelecemos
um mito teológico em que meramente parece que o mal está triunfando, pois na verdade, o
bem venceu o mal. No entanto, tudo isso é feito dentro do sistema do ego, no qual é irrelevante
se o mal do ego triunfa sobre o bem do ego, ou se o bem do ego triunfa sobre o mal do ego. O
tempo todo, o Deus não-dualista permanece fora do sonho; o Bem do qual estamos tão
24
aterrorizados de escolher, porque dentro de sua oni-benevolência, não existe bem, nem mal,
nem ego, e nem um eu.
Além disso, triunfo de qualquer tipo expressa o mundo de dualidade do ego, no qual não
faz diferença quem vence. Quer Deus triunfe ou o diabo, é o mesmo, porque enquanto existir
um vencedor e um perdedor, todos nós perderemos, e é o sistema de pensamento do ego que
triunfa. Nós pegamos o pensamento ontológico de vencedor-perdedor, bem-mal, vitimador-
vítima, negamos sua presença na mente e o projetamos. E então, vivemos em um mundo
conflitado, no qual a tensão é a única realidade. Em qualquer batalha ou guerra, portanto,
todos perdem – indivíduos, grupos, nações. A única maneira de vencer é se elevar acima do
campo de batalha. Olhando para baixo, então, nós entendemos que o que acontece do lado de
baixo não é importante, pois os lados aparentemente diferentes são um só: ambos acreditam
na separação. Assim, todos nós continuamente ficamos aos pés da cruz, totalmente sozinhos,
cheios de lágrimas pesarosas que estão além de todas as lágrimas; um mundo sem tempo, do
qual não existe saída, pois nenhuma mudança significativa é possível em um estado sem
mente.

P: Isso significa que como um “bom” estudante do Um Curso em Milagres, eu me torno um


com meu irmão por reconhecer que estamos sendo lentamente cozidos em banho-maria da
mesma forma?

R: Sim. Ao começarmos a nos tornar mais dirigidos pela mente certa, entendemos que não
estamos sozinhos aos pés da cruz. Todos estão lá conosco, pois todos adoram o mesmo
salvador assassino do ego, acreditando que o bem foi derrotado pelo mal. O começo da
reversão desse sonho insano, terminando com o dilema de Sísifo, está em entender que existe
outra forma de olhar para isso. O que nos ajuda a aprender é reconhecer que não estamos
sozinhos. Corrigindo o protagonista do poema, não estamos em pé totalmente sozinhos. A
verdade é que todos nós compartilhamos o mesmo pesar, que o ego não quer que vejamos.
Somos todos Sísifo, empurrando a pedra montanha acima, em um exercício interminável de
futilidade, acreditando que cometemos o mesmo pecado. Todos nós fizemos isso, porque o
Filho de Deus é um. Como, então, poderíamos estar sozinhos, uma vez que todos nós
compartilhamos o mesmo ego? Não importando nossa postura – boa ou má -, todos nós somos
o mesmo e, portanto, não somos separados. Isso reflete a verdade de que a separação não é
real e nunca aconteceu verdadeiramente – nós permanecemos como Deus nos criou, e nesse
instante santo de reconhecimento, a cruz desaparece. Outro dos poemas de Helen, “A forma
da estrela”, termina com as linhas:

Havia uma cruz, mas ela desapareceu.


Havia um mundo, mas existe apenas Deus.

(As Dádivas de Deus, p. 67)

Nosso problema, mais uma vez, é que como seres separados, nós somos parte do mundo
crucificado e crucificador, pregados à sua cruz. Se isso desaparecer, nós vamos desaparecer.
Esse é nosso medo, que é o motivo pelo qual Jesus torna claro que esse processo de desfazer
não acontece da noite para o dia. Uma vez que acreditamos ser criaturas do tempo,
experienciamos o perdão dentro da ilusão do tempo; nosso medo nasce do tempo, assim como
o tempo nasce no medo. E então, o processo de transformar e em última instância perder
nosso ser é lento, firme e gentil, no qual não precisamos aceitar que não somos separados de
Deus, pois esse pensamento é aterrorizante demais. Em vez disso, aprendemos a identificar a
cruz em nossas vidas, sem necessariamente a experienciarmos como ilusória. Precisamos
apenas abrir nossos olhos para a visão de que todos – sem exceção – estão em pé conosco.
Podemos realmente começar a aprender que somos o mesmo, pois todos nós compartilhamos
os mesmos interesses e necessidades: a mesma insanidade e condição desesperadora de
25
viver em um mundo e corpo nos quais a esperança está ausente, e o mesmo sistema de
pensamento de correção que podemos escolher – o outro caminho.

26
6. Tem que existir outro caminho

Como uma transição para nossa discussão sobre a outra forma de olharmos para Sísifo,
vamos nos focalizar na grande questão de existir outro caminho. Podemos ainda não conhecer
o outro caminho, mas ficando parado aos pés da cruz, continuando a empurrar a pedra
montanha acima, existe um reconhecimento crescente de que algo não está certo – tem que
existir algo mais na vida. A dor eclipsou nossa tolerância, e realmente se tornou tão excruciante
que pedimos ajuda. Existem algumas passagens no texto que se dirigem a essa questão. Nós
começamos com o parágrafo inicial em “A bifurcação da estrada” (T-22.IV). Incidentalmente, os
dois primeiros parágrafos dessa seção não estavam originalmente destinados ao Curso, mas
eram parte de uma mensagem pessoal a Helen e Bill, na qual Jesus pediu que seus dois
primeiros estudantes fizessem outra escolha, como pede a nós. Isso se encaixou perfeitamente
ao ditado, e então, foi dito a eles que o mantivessem.

(T-22.IV.1:1-3) Quando chegas ao local onde a bifurcação na estrada é bem evidente, não
podes ir adiante. Tens que ir por um caminho ou por outro. Pois agora se fores em frente
pelo caminho que seguias antes de chegar à bifurcação, não irás à parte alguma.

Pense sobre a letra Y: uma linha vertical, com um V em seu topo. A direção pela qual
viemos – a vertical – é nossa vida. Nós estamos parados agora, no ponto de escolha, onde
entendemos que algo está errado, e entendemos que existem duas formas de olhar para essa
situação: a forma de separação da mente errada do ego, ou a forma de interesses
compartilhados da mente certa do Espírito Santo. Como veremos depois, a escolha que
confronta Sísifo, e todos nós, não é o que fazemos com a pedra, mas como olhamos para a
situação. Essa é a bifurcação da estrada.

(1:4-6) Todo o propósito de vires até aqui era decidir qual o rumo que tomarás agora. O
caminho por onde vieste já não importa mais. Não pode mais servir.

As formas da nossa vida não importam, pois seu conteúdo compartilhado – empurrar as
pedras da vida para cima da montanha da futilidade – importa. De forma similar, a cor e
formato da rocha não são importantes; nem as características da montanha. O que é essencial,
no entanto, é termos chegado a um ponto no qual podemos tomar uma decisão se vamos
continuar com o ego, olhando através dos seus olhos de julgamento, ou com Jesus e sua
visão. As estradas do especialismo que pegamos para chegar a esse ponto agora são
irrelevantes. Portanto, apesar das nossas circunstâncias diferentes, todos nós compartilhamos
os mesmos sistemas de pensamento de crucificação e ressurreição, e o poder da mente de
escolher entre eles. Tudo o mais não tem conseqüências porque a forma não faz diferença
para o conteúdo do perdão.

(1:7) Ninguém que tenha chegado até esse ponto pode tomar a decisão errada, embora
ele possa adiar.

No final, todos vão escolher Deus, pois o resultado é tão certo quanto Ele (T-2.III.3:10). O
ponto de Jesus a nós aqui, como em muitos outros trechos, é: por que retardar? “Por que
esperar pelo Céu?” (LE-pI.131.6:1; LE-pI.188.1:1). Por que escolher permanecer no inferno
quando poderíamos ir para casa; especialmente quando já estamos lá, nunca tendo partido.

(1:8) E não há trecho da jornada que pareça mais sem esperança e fútil do que estar
onde a estrada se bifurca sem decidir que caminho tomar.

Jesus estava dizendo a Helen e Bill, e a todos nós, que nós realmente temos uma
escolha. No entanto, essa escolha não é o que faremos com a rocha, mas com quem a
27
empurraremos até o topo da montanha; com quais olhos vamos olhar para nossa situação. Não
tomar uma decisão, que, com efeito, é tomar uma decisão pelo ego, sustenta a futilidade e
desesperança de nossas vidas.
Essa idéia vem claramente nas passagens para as quais vamos nos voltar agora,
revisitando o Capítulo 8 no texto. Nos parágrafos que examinamos na primeira seção, “A
direção do currículo”, Jesus nos instrui de que temos dois professores que ensinam currículos
opostos um ao outro: crucificação e ressurreição, dor e sua liberação, ataque e perdão,
separação e unicidade.

(T-8.I.4:1) O teu aprendizado passado não pode deixar de ter te ensinado coisas erradas
simplesmente porque não te fez feliz.

Se Sísifo não está feliz – e no mito grego ele decididamente não está feliz – não é por
causa da sua punição, mas por causa das decisões que levaram a ela: trapaças, engano e
zombaria em relação aos deuses. Sua infelicidade não é uma conseqüência do que ele
realmente está fazendo, mas do significado por trás disso: sua punição eterna pelo pecado. E
então, estamos equivocados se pensarmos que nossa infelicidade e senso de futilidade vêm
das circunstâncias da vida, pois sua fonte reside apenas no sistema de pensamento que diz
que merecemos nossa sina miserável porque somos pecadores.

(4:2-3) Com base nisso apenas, o seu valor deve ser questionado. Se o aprendizado
almeja a mudança e é sempre esse o seu propósito, estás satisfeito com as mudanças
que teu aprendizado te trouxe?

Nosso aprendizado nos trouxe a prova de que o ego está certo: o mal triunfa, os bons
sofrem; a injustiça é vitoriosa e a morte vence tudo. Mudança, para o ego, sempre encerra
punição pelo pecado.

(4:4) A insatisfação com os resultados do aprendizado é um sinal do fracasso do dito


aprendizado, pois significa que não conseguiste o que querias.

Exceto que o que quisemos é o que conseguimos; o que pensamos que não queremos é
o que realmente queremos. Nós, como egos, queremos aprender o fracasso, dor, futilidade e
desespero – o que nós acreditamos merecer. Se isso vier até nós, nós o merecemos por causa
do nosso pecado; e se nós pecamos, nós vencemos. Nesse mundo, portanto, quando
perdemos, nossos egos vencem. Se Deus nos punir, ainda vamos vencer, porque Sua punição
significa que nós de fato pecamos contra Ele: a separação é realidade.
Nosso pensamento se torna ainda mais desvirtuado tão logo ficamos enredados nessa
insanidade: nós vencemos por causa do que fizemos a Deus, fazendo nosso Criador cair de
joelhos e tornando-O tão insano quanto nós – as já mencionadas segunda e terceira leis do
caos. Nós transformamos Deus em um inimigo Que acredita que nossa insanidade é
verdadeira: pecaminosidade e separação são realidade, assim como punição e vingança.
Nosso destino de sofrimento, futilidade e morte – um oximoro em que a vida é feita de morte –
assim, prova que nós derrotamos Deus. Jesus está nos pedindo para ficarmos cientes da
nossa dor, a insanidade que é sua fonte, e para finalmente questionarmos se é isso o que
realmente queremos.
Nós examinaremos brevemente agora algumas outras declarações nesse capítulo que
expandem essa idéia do fracasso do aprendizado:

(T-8.VII.8:1) Não há nada tão frustrante para um aprendiz do que um currículo que ele
não pode aprender.

28
É realmente frustrante estar em uma situação na qual não podemos aprender o que
queremos aprender. Isso é particularmente assim se estiver à nossa frente alguém que seja
impaciente e crítico. Crianças com déficits de aprendizado sofrem essa frustração diariamente,
e, se sua condição não for apropriadamente diagnosticada, vai piorar por causa do senso do
impedimento do fracasso. Jesus está nos dizendo que todos nós somos suscetíveis a tal
frustração porque somos deficientes; não que tenhamos um cérebro danificado, mas uma
mente danificada. O currículo que queremos aprender é a mentira de sermos felizes e
pacíficos. No entanto, tudo o que nos é ensinado é destinado a não nos tornar felizes e
pacíficos e, portanto, nós inevitavelmente fracassamos em nosso aprendizado.

(8:2) O seu sentimento de adequação sofre e ele não pode deixar de ficar deprimido.

Nós ficamos deprimidos, embora não necessariamente clinicamente deprimidos, porque


esse mundo não é nosso lar. Nós vagamos por aí sem destino, continuamente empurrando a
rocha das nossas cargas para cima da montanha da vida, e depois morremos.

(8:3-4) Confrontar-se com uma situação de aprendizado impossível é a coisa mais


deprimente do mundo.

Como Sísifo, nós tentamos ser bem sucedidos em nossas tarefas, lutando para fazer o
mundo funcionar, mas falhamos. O ego nos ensina a manipular, seduzir e controlar as outras
pessoas para que atendam às nossas necessidades e sejamos felizes. À nossa própria
maneira, todos nós nos tornamos muito bons nisso. No entanto, estamos miseráveis. Existem
momentos fugazes, nos quais a dor do especialismo do ego parece funcionar, mas eles nunca
duram. E então, novamente, nosso mundo foi estabelecido pelo ego – o tomador de decisões
da mente errada – para produzir falha no aprendizado, um profundo senso de perda,
desesperança e desespero que não podem deixar de ser o resultado final.
Por outro lado:

(8:5-6) O currículo do Espírito Santo nunca é deprimente porque é um currículo de


alegria. Sempre que a reação ao aprendizado é a depressão, isso acontece porque se
perdeu de vista a verdadeira meta do currículo.

A verdadeira meta do currículo não é termos um sonho feliz no sentido do mundo, mas
termos um sonho feliz de perdão da mente certa. O currículo do Espírito Santo, portanto, não é
mudar o mundo – não é mudar a rocha ou um apelo aos deuses por uma sentença mais leve -,
mas mudarmos nossas mentes:

Portanto, não busques mudar o mundo, mas escolhe mudar atua mente sobre o
mundo (T-21.in.1:7).

Seu currículo, portanto, é alegre, porque nos ensina que temos controle sobre nossas
mentes. Isso corrige o currículo de depressão do ego, que futilmente buscou fazer o mundo
funcionar.
Voltamos agora ao ponto de onde iniciamos em “A direção do currículo”:

(T-8.I.5:1-2) O currículo da Expiação é o oposto do currículo que estabeleceste para ti


mesmo, mas assim também é o seu resultado. Se o resultado do teu te tem feito infeliz e
se queres outro diferente, obviamente é necessário uma mudança de currículo.

Mudar o currículo significa mudar de professores. O currículo do ego se focaliza em


consertar as coisas e o corpo no mundo, tornando o sonho do mundo melhor: mais feliz, mais
seguro, mais bem sucedido – um lugar onde não existe sofrimento, e os corpos são curados. O
29
currículo do Espírito Santo, por outro lado, nos ajuda a despertar do sonho, em vez de lutar
para melhorá-lo. Nenhuma alegria é possível se a meta for melhorar o mundo. De fato, o
mundo foi feito para não ser melhorado. Tão logo Sísifo chega ao topo da montanha, uma força
empurra a pedra de volta para baixo, impedindo-a de ultrapassar o topo de rolar pelo outro
lado. Assim é a natureza do mundo. Tudo é empurrado de volta, pois nada realmente funciona
aqui: carros, casas, corpos, negócios e famílias, tudo acaba fracassando no final, pois a
existência de tudo – vida e não-vida – em última instância chega ao fim. Nós
desesperadamente – em futilidade, desesperança e desespero – tentamos fazer isso de outro
jeito, apenas para termos as rochas de nossas vidas rolando de volta até solo inicial de
devastação e morte do ego.

(5:3) A primeira mudança a ser introduzida é uma mudança de direção.

Jesus realmente está falando de uma mudança de professores. A orientação do ego nos
leva em direção ao corpo, maximizando seu prazer e minimizando sua dor, mesmo quando o
usa para acusar outros de pecado. Jesus, no entanto, usa o corpo como meio de voltar nossa
atenção para a mente, o lar da decisão real e mudança significativa.

(5:4-8) Um currículo significativo não pode ser inconsistente. Se é planejado por dois
professores, cada um acreditando em idéias diametralmente opostas, não pode ser
integrado. Se é desenvolvido por esses dois professores simultaneamente, cada um
apenas interfere com o outro. Isso conduz à flutuação, mas não à mudança. Os voláteis
não têm direção.

Um exemplo dessa tentativa da mente errada de fazer transigências entre realidade e


ilusão é pedir ajuda a Jesus para tornar o sonho melhor. Se a direção do currículo é nos levar
de volta para a mente, e nós escolhemos o foco do nosso professor espiritual em corpos –
pessoal ou coletivamente -, ou em relacionamentos entre eles, estamos demonstrando o
equívoco que Jesus está descrevendo: ficar com dois professores que estão ensinando coisas
contraditórias, e tentando forjar uma aliança que faça parecer que eles dizem a mesma coisa.
Claramente nesse ponto, cada um interfere com o outro, e apenas o currículo do ego
sobrevive. Jesus nos diz antes no texto:

A forma de sair do conflito entre dois sistemas de pensamento opostos é claramente


escolher um e renunciar ao outro (T-6.V-B.5:1).

O ego, mais uma vez, tenta nos fazer escolher os dois sistemas, tentando fundi-los, no
estranho esforço de reconciliar a irreconciliável divisão entre forma (corpo) e conteúdo
(espírito) que nós encontramos nas religiões formais. Assim, Jesus nos previne:

A religião formal não tem lugar na psicoterapia, mas também não tem realmente
lugar na religião. Nesse mundo, há uma tendência surpreendente de juntar palavras
contraditórias em um termo sem que se perceba a contradição de forma alguma. A
tentativa de dar uma forma à religião é tão obviamente uma tentativa do ego para
reconciliar o irreconciliável que dificilmente seria necessário elaborar sobre esse
ponto (P-2.II.2:1-3).

Isso significa que uma vez que formalizamos a autêntica experiência religiosa ou
ensinamento espiritual, perdemos sua essência. Falando do especialismo do ego, Jesus nos
diz que o relacionamento especial é um triunfo da forma sobre o conteúdo (T-16.V.12-13). Se
nós formos sob a superfície do significado das palavras, podemos ver que naquela seção, “A
escolha pela Completude”, Jesus está falando do cristianismo, que tentou formalizar o amor em
rituais e dogmas, dessa forma triunfando sobre seu conteúdo.
30
Portanto, podemos entender, do ponto de vista do Um Curso em Milagres, como as
religiões do mundo pegaram a mensagem original do “fundador” e a distorceram a serviço do
ego. Isso é inevitável. O ego está aterrorizado do amor e da verdade, e, na extensão em que
nos identificarmos com seu sistema de pensamento de culpa e medo, o que fazemos quase o
tempo todo, a verdade e Amor de Deus serão percebidos como ameaçadores e
amedrontadores. O ego, portanto, inteligentemente planeja a estratégia de se não pode vencê-
los, una-se a eles: ele se une à verdade, mas a modifica. O amor que inspirou os iluminados
que eram a fonte da religião é confrontado com o medo daqueles que o seguem. Eles não
podem deixar de projetar seus egos no ensinamento sem ego, dessa forma tornando a forma e
o ritual fins em si mesmos, em vez de meios para atingir o Fim. O que então se torna
importante não é a verdade inspiradora, mas a preservação dessa verdade na forma.
Codificações do ensinamento, que são realmente ofuscações, têm que se seguir e, antes que
possamos perceber, teremos os ídolos do especialismo, adorados na forma de pessoas,
rituais, objetos, lugares especiais, e assim por diante. Isso é inevitável com o Um Curso em
Milagres também, como já podemos ver acontecendo.

(5:9) Não podem escolher uma direção porque não podem abandonar a outra, mesmo
que essa não exista.

Ainda que o ego não exista, não podemos liberá-lo porque fazer isso significa liberarmos
a nós mesmos – o maior medo do ser individual, especial.

(5:10) Seu currículo conflitado lhes ensina que todas as direções existem e não lhes dá
uma referência racional para a escolha.

Essa é a situação em um sistema dualista. Deus está presente no mundo e então, todas
as direções parecem existir – para a mente, e para longe dela, no corpo. No entanto, não
podem ser ambas verdadeiras: não podemos ter um pouco de Céu no inferno, ou de inferno no
Céu (MP-13.7:1-5). Ou a verdade ou a ilusão é verdadeira, mas não ambas – amor e ódio,
unicidade e separação, luz e escuridão não coexistem. É um ou outro, e, no final, temos que
escolher a verdade e liberar a ilusão.
Um dos propósitos do Um Curso em Milagres é corrigir os registros, com Jesus dizendo,
com efeito: “O que tem sido ensinado a vocês por dois mil anos não é o que eu disse. Mesmo
que você tenha as palavras certas, o que em si mesmo é duvidoso, o significado certamente
estava errado. Não me confunda com o ego, pois eu não estou pedindo que você viva um
sonho mais feliz”. Como ele disse a Helen no poema, “As Dádivas de Deus”: “Eu não sou um
sonho que vem em zombaria” (As Dádivas de Deus, p. 121). Jesus não é parte do nosso sonho
que zomba de Deus, pois ele não é um corpo, mas um pensamento – assim como nós. Ele nos
diz no texto:

O pensamento não pode se tornar carne... (T-8.VII.7:4).

O espírito não pode vir para um corpo, e nós temos que escolher qual será nossa
realidade.

(6:1) A total falta de sentido de tal currículo tem que ser inteiramente reconhecida antes
que uma mudança real de direção venha a ser possível.

Nós precisamos reconhecer a futilidade de empurrarmos a rocha do especialismo


montanha acima, tentando fazer nosso mundo funcionar e encontrar a felicidade aqui. Tais
metas vão falhar, pois a única felicidade possível no mundo é aprender que não somos do
mundo. Assim, se não entendermos a nulidade inerente do ego, nunca poderemos escolher
contra ele. Sem reconhecermos a desesperança do seu sistema de pensamento, o ego vai
31
permanecer. É aí que nós trazemos Deus para o mundo, pedindo ajuda a Jesus para voltarmos
para casa , Nele, enquanto tudo o que realmente fazemos é pedir a “Deus” para nos ajudar a
construir um reino mais feliz aqui, longe Dele.

(6:2-4) Não podes aprender simultaneamente de dois professores que estão em total
discordância a respeito de tudo. O currículo conjunto dos dois apresenta uma tarefa de
aprendizado impossível. Eles estão te ensinando coisas inteiramente diferentes, de
formas inteiramente diferentes, o que poderia ser possível, exceto que ambos estão te
ensinando sobre ti mesmo.

Não podemos aprender a voltar ao Céu enquanto construirmos um lar aqui. Não podemos
aprender que nossa identidade é espírito quando somos ensinados que nossa identidade é
física. Um Curso em Milagres é um sistema não-dualista, e sistemas dualistas ensinam coisas
contraditórias: a coexistência entre espírito e carne, bem e mal, Céu e inferno. O currículo com
esse Professor é diferente, pois estamos aprendendo que não pode haver transigência entre
verdade e ilusão. Isso significa que não podemos ser um filho do ego e um Filho de Deus, um
filho da separação e um Filho da perfeita Unicidade.

(6:5) A tua realidade não é afetada por nenhum dos dois, mas se escutares os dois, a tua
mente ficará dividida em relação ao que é a tua realidade.

Esse, é claro, é o problema, pois pensamos que somos carne e espírito. A integração
entre mente, corpo e espírito é impossível de acordo com o Um Curso em Milagres. A mente
não está no corpo, que é apenas uma projeção da mente, e idéias não deixam sua fonte: a
idéia da separação nunca deixou a mente que é sua fonte. Alem disso, o espírito esta além da
mente e do corpo, e não tem nada a ver com nenhum dos dois. Assim, ele não pode ser
integrado: o pensamento não pode se tornar carne, e o espírito não pode encarnar. Mais uma
vez, não podemos voltar para casa e despertar do sonho enquanto tentarmos construir um lar
melhor no sonho. Como poderemos aprender sobre os sonhos felizes do Espírito Santo, que
vão nos levar para fora do mundo, quando nossos olhos estão fixos nos sonhos felizes do ego
no mundo? Realmente precisamos escolher um ou outro.
O foco da Parte Dois está no que acontece quando fazemos a escolha certa e
escolhemos o professor certo. Vamos retornar a Sísifo, entendendo que existe outra forma de
abordagem ao seu – e ao nosso – dilema existencial.

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Parte Dois

Um Sísifo da mente certa

33
7. Introdução:
“É preciso imaginar Sísifo feliz”

Nós agora nos dirigimos a Sísifo e seu destino de um ponto de vista da mente certa. A
inspiração para essa forma diferente de olhar vem de Albert Camus (1913-1960), o famoso
filósofo e escritor francês (ele era na realidade algeriano). Em acréscimo a ser um profundo
pensador, Camus era um maravilhoso escritor e ganhou o prêmio Nobel da literatura, tendo
escrito três romances – O Estrangeiro, A Peste, e A Queda (todos apresentações metafóricas
do seu pensamento) – e uma série de peças, histórias curtas e ensaios.
Embora Camus fosse um ateísta confesso, existe uma espiritualidade que flui através de
todo seu trabalho, que ficará clara pelas minhas observações abaixo. De forma discutível, seu
ensaio mais importante é “O mito de Sísifo”, que, embora ele inclua um apêndice sobre o mito
grego, não é realmente sobre Sísifo de forma alguma. O ensaio inicia com Camus afirmando
que o único problema filosófico sério é o do suicídio. Ao falar sobre o estado do mundo, ele
freqüentemente usou a palavra absurdo, que denota a ausência de significado e de sentido
essenciais da vida. Essa resposta filosófica ao absurdo era a de que o suicídio não era a
resposta. Na verdade, existe significado na vida se a pessoa for consciente da absurdidade da
vida, pois é a luta da pessoa contra essa condição humana que torna a vida significativa. O que
interessava Camus no mito era o período durante o qual Sísifo descia a montanha, depois de
trabalhar duramente para levar a pedra ao topo, apenas para vê-la rolando de novo para baixo.
O herói de Camus era capaz de ficar totalmente consciente da futilidade do que estava
fazendo, e da natureza absurda do mundo, dessa forma transcendendo seu destino. Ele,
portanto, tornou-se livre, levando Camus a encerrar seu ensaio por escrever: “É preciso
imaginar Sísifo feliz”.
Do ponto de vista do Um Curso em Milagres, Sísifo é feliz porque é capaz de olhar para a
absurda futilidade da sua vida sem depressão ou desespero. Esse olhar da mente certa abre a
mente, capacitando a pessoa a entender que tudo isso é um sonho. E então, não lutamos
contra o sonho, sem vociferar e praguejar sobre sua injustiça, ou tentar mudá-lo ou negá-lo.
Nós simplesmente aceitamos a natureza intrínseca do sonho, embora sabendo que continua
sendo um sonho. Portanto, ele não é nem bom nem mau – um sonho é um sonho, uma ilusão
é uma ilusão –, e isso nos capacita finalmente a transcendê-lo e voltarmos para a mente. Esse
é o outro caminho que Jesus sustenta para nós. Para citar a linha importante mais uma vez:

Portanto, não busques mudar o mundo, mas escolhe mudar a tua mente sobre o
mundo (T-21.in.1:7).

Nós não tentamos alterar nosso destino de viver em um mundo fútil, no qual não existe
esperança e nada jamais pode mudar. Em vez disso, trabalhos para mudarmos nossas mentes
sobre ele. Em outras palavras, não damos ao mundo o poder de tirar o amor e paz que estão
em nossas mentes certas.
O Sísifo de Camus era feliz porque não deu ao seu destino poder sobre ele, e, assim, era
capaz de se elevar acima dele. Embora Camus nunca tenha dito isso especificamente,
podemos inferir da sua declaração que os poderes do mundo (de Deus ou outros) poderiam
fazer o que quisessem a seu corpo, mas não poderiam afetar sua mente. Essa atitude não é
diferente, por exemplo, daquela de Victor Frankl, o psiquiatra que resistiu ao campo de
concentração na Segunda Guerra Mundial, perdeu sua família e trabalho – eles queimaram
seus manuscritos -, mas emergiu uma pessoa muito mais forte, porque entendeu que não
importando o que os nazistas fizessem, eles nunca poderiam mudar a ele. Eles poderiam afetar
seu corpo, e os corpos dos seus seres amados, mas não sua mente. Assim, a percepção dos
seus “inimigos” inevitavelmente mudou. Quando permitimos a nós mesmos nos elevarmos
acima do campo de batalha, para onde Jesus está, e então olhamos para baixo com ele,
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vemos o campo de batalha: corpos espalhados por todos os lugares, algumas vezes vencendo,
outras perdendo; mas no final, todos morrem, o que significa que todos perdem. Mais uma vez,
não há esperança, pois a finidade da vida é sua futilidade. No entanto, acima do campo de
batalha, somos os mestres do nosso destino. Talvez não sejamos mestres das “leis naturais”
do corpo, ou em relação ao que outros corpos fazem, mas nós estamos no controle de nossas
mentes. Aí reside nosso poder, liberdade e alegria. O que nos torna sonhadores felizes é que
nós reconhecemos que o mundo é um sonho.
Repetindo o ponto principal, ninguém pode realmente ser feliz nesse mundo porque ele
não é o nosso lar. Todos os que vêm são forasteiros e proscritos, figuras pesarosas vestindo
farrapos (LE-pI.166.6:1), desesperadamente tentando tirar sentido de um mundo que é
inerentemente sem sentido, lutando para encontrar significado em empurrar uma pedra
montanha acima, apenas para vê-la cair de volta para baixo. Não importando o quanto nós
inteligentemente tentemos tirar sentido disso – teologicamente ou de outra forma -, no final, a
vida permanece inerentemente sem significado. No entanto, o que realmente dá significado a
ela é ver que ela nos oferece a oportunidade de aprendermos que esse é um sonho do qual
podemos despertar. Esse poder é a natureza da verdadeira liberdade – não liberdade do corpo,
ou liberdade dentro do mundo, mas liberdade para se elevar acima dele. Nada aqui tem poder
sobre a mente, nem pode nos impedir de voltar – ao que o Um Curso em Milagres se refere
como o instante santo – ao tomador de decisões que pode escolher Jesus como seu professor
em vez do ego.
É por isso que Sísifo pode ser feliz. Ele pode mudar a atenção para sua mente e descer a
montanha, reconhecendo que não pode mudar seu destino. Os juízes em Hades falaram, mas
ele terminou rindo por último. Ele passou a perna neles enquanto estava vivo, e passa a perna
neles em sua morte, porque eles não têm mais poder sobre ele. Seu verdadeiro
aprisionamento reside em pensar que eles o fizeram, por causa da punição que infligiram a ele.
No entanto, elevando-se acima do campo de batalha deles, e não o deixando afetá-lo –
entendendo que ele não é o corpo que empurra a rocha para cima -, ele se torna livre. Com
efeito, essa é a mensagem sisifoniana de Jesus a nós em seu curso, para que viremos a mesa
sobre as forças do ego no mundo; quer sejam suas incorporações físicas ou o próprio sistema
de pensamento. Nenhum deles tem poder sobre nós, a menos que o dermos a eles. Em outras
palavras, o ego não tem poder, a menos que enchamos seu balão de ar e façamos parecer que
ele é algo que não é. Esse é o segredo da salvação, como Jesus nos diz no texto:

O segredo da salvação é apenas esse: tu estás fazendo isso a ti mesmo. Seja qual
for a forma do ataque, isso ainda é verdadeiro. Seja quem for que se coloque no
papel do inimigo e do agressor, isso ainda é a verdade. Seja o que for que pareça
ser a causa de qualquer dor ou sofrimento que sintas, isso ainda é verdadeiro. Pois
não reagirias de forma alguma a figuras de um sonho que soubesses que estavas
sonhando. Que elas sejam tão odientas e más quanto puderem, não poderiam ter
nenhum efeito sobre ti, a não ser que tenhas fracassado em reconhecer que esse é
o teu sonho (T-27.VIII.10).

Em meados de 1960, eu estava em uma marcha pelos direitos civis no Mississipi, liderada
por Martin Luther King Jr. Ela aconteceu em resposta ao fato de James Meredith ter sido
baleado, e o Dr. King sabiamente transformou isso em uma marcha pró-registro para poderem
votar. Ele falou uma noite em uma igreja, a um grupo de negros do Mississipi, e sua mensagem
foi clara: “Eles (os brancos) não podem quebrar suas costas a menos que estejam curvadas.
Não importando o que seus opressores tenham feito ou continuem a fazer, eles não pode
realmente perseguir ou vitimar vocês a menos que vocês permitam. Somente se vocês
curvarem as costas, eles poderão quebrá-las”. Especificamente, Dr. King estava falando a seus
seguidores que eles deveriam se registrar e votar, dessa forma ganhando poder no estado. E,
com certeza, muitos legisladores negros receberam votos. Sua mensagem é familiar. Mais uma
vez, não importando o que as pessoas façam com nossos corpos, isso não pode ter efeitos
35
sobre nossa paz, a menos que nossas mentes tomadoras de decisões tenham dado esse
poder a outros. Nossa única esperança de sermos felizes nesse mundo é entendermos que ele
não tem poder de nos dar paz nem de tirá-la de nós. Nós não precisamos necessariamente
aceitar o ensinamento metafísico do Curso de que o mundo nem mesmo está aqui. É suficiente
dizer que nada no mundo pode nos tornar felizes ou infelizes. Só nossas mentes são o poder
por trás dos tronos de especialismo do mundo. Lembre-se dessas linhas do livro de exercícios:

O custo aparente de aceitar a idéia de hoje [“A minha salvação vem de mim!] é o
seguinte: significa que nada fora de ti pode salvar-te, nada fora de ti pode dar-te paz.
Mas também significa que nada fora de ti pode ferir-te, perturbar a tua paz, ou
transtorna-te de modo algum. A idéia de hoje te [a mente tomadora de decisões]
coloca em controle do universo, onde é o teu lugar devido ao que tu és (LE-
pI.70.2:1-3).

Passamos agora a uma discussão mais completa de voltamos ao poder de decisão que
está presente na mente; a meta de Jesus para nós no Um Curso em Milagres.

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8. “Escolhe outra vez”

A seguinte passagem do poema de Helen, “As Dádivas de Deus” (As Dádivas de Deus, p.
117-118), originalmente uma mensagem de Jesus a Helen, vai servir como uma introdução a
essa seção:

“Escolhe outra vez” é ainda sua única esperança. A escuridão não pode ocultar as
dádivas de Deus a menos que você queira que assim seja.

Não existe esperança no mundo, uma vez que ele é um lugar de medo, dor e morte. A
esperança reside apenas no ato da mente escolher de forma diferente. A escuridão do sistema
de pensamento do ego, assim como sua incorporação no mundo, não pode encobrir as dádivas
de Deus em nossas mentes, a menos que desejemos que a escuridão as encubra. Apenas nós
temos o poder de encobri-las, não o mundo. Nós simplesmente convidamos o mundo a nos
dirigir – protegendo-nos das dádivas de Deus – e ele fica mais do que feliz de obedecer. A
“dádiva” do nosso Criador é a Expiação, a Presença do Espírito Santo que diz que a separação
nunca aconteceu. O Amor de Deus está tão plenamente presente para nós quanto esteve
antes da separação, porque não houve separação – nós ainda permanecemos em unidade
com Seu Amor. Assim, a Expiação poderia ser vista, metaforicamente, como a dádiva final de
Deus, sobre a qual a escuridão não tem poder, a menos que, mais uma vez, nossas mentes
escolham dar a ela o poder de ocultar Seu Amor.

Em paz eu venho, e incito você agora a fazer um fim para o tempo e dar um passo
para a eternidade comigo. Não haverá uma mudança que olhos possam ver, nem você
vai desaparecer para as coisas do tempo.

Sísifo ainda pode estar rolando sua pedra para cima da montanha – “Não haverá uma
mudança que os olhos possam ver, nem você [seu corpo] vai desaparecer para as coisas do
tempo” -, mas ele olha para sua vida através dos olhos da visão e então, sua atitude muda,
demonstrando o poder que ele tem sobre sua mente. Na verdade, Um Curso em Milagres é
somente sobre voltarmos para nossa consciência em relação ao poder de escolha de nossas
mentes. Tanto do nosso tempo é gasto tentando consertar as nossas vidas ou as de outras
pessoas, que nos esquecemos de que tudo o que jamais temos que consertar é nosso
pensamento distorcido, e tudo o que precisamos mudar é nosso professor – o significado de
“escolhe outra vez”. Jesus, portanto, nos pede para escolhermos se queremos ter a ele como
nosso mentor ou ao ego. Uma vez que primeiro escolhemos o ego, precisamos escolher de
forma diferente.
Isso nos alivia de uma carga tremenda, pois não precisamos mais lutar contra o mundo.
Nós simplesmente continuamos como estivemos fazendo, sem oposição – sem raiva, ódio ou
críticas aos outros ou a nós mesmos. Nós precisamos entender que não podemos ser
expressões de amor nesse mundo se acreditarmos que estamos fazendo algo santo, espiritual
ou significativo. A única coisa significativa que podemos fazer é escolher outra vez, pois então,
o amor que escolhemos flui através de nossas mentes, direcionando o corpo. Dessa forma,
podemos nos comportar como os “benfeitores”, mas com a consciência de que não somos nós
que estamos fazendo o bem – ele vem através de nós – então, não existe investimento no
resultado, em que as pessoas aceitem nossas dádivas, amor ou generosidade. Nós
entendemos que tudo aqui é uma ilusão; embora o amor, que pode ser expresso no sonho, não
seja uma ilusão, e assuma qualquer forma que for mais útil no mundo da forma que,
novamente, não é nossa preocupação.
Portanto não faz diferença se nós empurramos futilmente uma pedra montanha acima, ou
nos sentamos em um palácio aos pés da montanha. Não existe hierarquia de ilusões – toda
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ilusão é uma ilusão, é uma ilusão. Repetidamente lutando com a pedra, ou gozando da fortuna
em um palácio, ainda acreditaremos ser corpos. É a maneira com que vivemos no corpo que é
importante, o que realmente significa com quem nossas mentes vivem. Nós, então, podemos
ser miseráveis no palácio e felizes empurrando a pedra, ou miseráveis empurrando a rocha e
felizes no palácio. Nossa felicidade não tem nada a ver com as circunstâncias. Para repetir,
não podemos ser úteis se for o ego que estiver ajudando. Isso significa que nosso único foco
deveria estar não no que está acontecendo ao nosso redor, mas apenas em tirarmos nosso
ego do caminho. E então, permanecemos vigilantes por seu sistema de pensamento, levando-o
ao Espírito Santo em nossas mentes. Em outras palavras, nós “escolhemos outra vez”. Isso,
nosso único interesse, permite que a visão de Jesus seja os olhos através dos quais
percebemos todas as nossas situações; o significado do que ele diz a seguir:

Mas você vai segurar minha mão enquanto retorna, porque nós vamos juntos.

Se Sísifo estiver ciente de que Jesus está empurrando a pedra montanha acima com ele,
ele não vai se importar com o que vai acontecer a ela: quer ela ultrapasse o topo ou role de
volta para baixo. Que diferença poderia fazer se o seu foco estiver apenas no amor em sua
mente, não na atividade do corpo? O que torna isso difícil é que nós subestimamos a extensão
da nossa identificação corporal, o quanto estamos intrinsecamente ligados a esse ser físico,
psicológico, que acreditamos ser nossa identidade. Portanto, quando pensamos em Jesus, é
tentador pensarmos nele empurrando a pedra conosco – literalmente -, em vez de estando em
nossas mentes, conforme empurramos a pedra. Essa é uma diferença enorme. Nós realmente
pensaríamos que poderíamos estar melhor não empurrando a pedra para cima, acreditando
que é tolo e sem sentido fazer isso, quando poderíamos, por exemplo, estar ajudando pessoas
em vez disso. No entanto, como saberíamos? Como qualquer pessoa poderia verdadeiramente
conhecer o benefício do que está sendo feito? Embora eu não esteja encorajando as pessoas
a encontrarem montanhas e empurrarem uma pedra sem significado até seu topo, se esse for
o currículo do nosso sonho, deveríamos fazê-lo; a coisa crucial sendo que nós seguramos a
mão de Jesus enquanto o fazemos.

Agora os anfitriões do Céu vêm conosco, para limparem todos os vestígios dos sonhos
e cada pensamento que repousa na nulidade.

“Anfitriões do Céu” refere-se ao Amor de Deus em nossas mentes e “cada pensamento


repousa na nulidade” significa cada pensamento do ego que encontra expressão nesse mundo.

Como você é caro para Deus, Que pede apenas que você caminhe comigo e leve Sua luz
a um mundo doente, que o medo drenou de amor, vida e esperança.

Jesus não está falando sobre fazer coisas em um mundo inexistente. Em vez disso. Ele
leva luz a um mundo doente, porque o mundo está em nossas mentes. Escolhendo ser da
mente certa, a luz da Expiação flui através de nossas mentes curadas, para o mundo
projetado, iluminando tudo o que parece externo. Uma vez que isso não tem nada a ver com
nosso ser especial, que tenta fazer coisas especiais, nossa única necessidade é tirarmos o ego
do caminho. Nosso amigo lúcido, Sísifo, portanto, não iria lamentar seu destino cruel – afinal,
ele poderia ter dito aos deuses: “Eu só estava brincando. Vocês não têm que criar um grande
caso por causa de uma brincadeira tola, fácil” -, mas simplesmente mudar sua mente.

Certamente, você não vai deixar de ouvir meu chamado, pois eu nunca deixei de ouvir
seus lamentos de dor e pesar...

Jesus ouve nossos lamentos de dor e pesar, e nos ajuda a reconhecer que eles não são
resultado de condições externas. Se fossem, ele não poderia nos ajudar. O sofrimento não vem
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de situações nas quais nos encontramos – as “pessoas terríveis” com quem estamos
envolvidos, ou as pessoas “maravilhosas” que acabam sendo terríveis -, mas surge apenas
quando excluímos Jesus. Portanto, incluí-lo desfaz a nossa dor. E então, o que precisamos
fazer, dia a dia, é estarmos cientes da rapidez com que damos nosso poder a circunstâncias e
relacionamentos que acreditamos poderem nos privar da paz e alegria, ou provê-las; com que
rapidez colocamos nossas dores e alegrias fora de nós, e as tornamos específicas. Tal
projeção é a causa real do nosso desconforto e desesperança, e não o que parece ser externo.
Tudo o que fazemos aqui é fútil, porque, como vimos, tudo morre; não podemos depender de
nada no mundo, apesar do que parece ser o caso. Ao lermos no texto:

Nada cega tanto quanto a percepção da forma (T-22.III.6:7).

A percepção mente. O mundo da forma engana, pois ele nos mantém estupidamente
inconscientes do conteúdo da nossa mente: o amor de Jesus que reflete a verdade do Céu, ou
o medo ilusório do ego.

... Eu vim para salvar e redimir o mundo do medo finalmente. Ele nunca foi, não é, nem
será o que você imagina.

Jesus redime o mundo do medo porque o medo está na mente, e, quando levamos esse
medo ao seu amor, o medo se vai. Assim, o medo nunca foi, não é e nunca será o que
pensamos. A experiência nos diz que temos medo de algo externo: ficarmos doentes,
morrermos, perdemos um ser amado, guerra, levar um tiro, ou do clima. No entanto, o medo
nunca é dessas coisas; como uma ilusão poderia ser amedrontadora? Lembre-se da linha: “eu
não sou um sonho que vem em zombaria” (As Dádivas de Deus, p. 121). O Jesus do mundo é
alguém que veio em zombaria, pois ele tornou o mundo e o corpo reais, dessa forma,
zombando de Deus e de Seu Filho perfeito. Jesus, portanto, não remove nossos problemas;
ele não assegura a Sísifo que vai cuidar das coisas. Em vez disso, ele ajuda seu irmão a
entender que suas circunstâncias não são nada. “Que diferença faz realmente se você ficar
interminavelmente empurrando uma pedra para cima e para baixo, ou se você voltar para
Corinto como um rei? Tudo o que importa é que você deixe que meu amor seja seu
companheiro”. Essa é a única lição que precisamos aprender. Em vez de lutarmos tenazmente
para consertarmos nosso mundo, trazendo Jesus a ele para nos ajudar, nós levamos o mundo
até Jesus. O que precisa de conserto é simplesmente o fato de termos afastado o mundo dele,
e levar nosso mundo a ele para que nossas mentes possam olhar para tudo juntos é a
resposta. Ele então nos diz:

Deixe-me ver por você, e julgar por você para o que você deveria olhar. Quando você
tiver visto comigo apenas uma vez, não mais irá valorizar qualquer coisa amedrontadora
à custa da glória e paz de Deus.

Jesus nos pede para pensarmos no custo de excluirmos a ele, tornando o mundo de
sofrimento real, quer seja o nosso próprio ou o de outra pessoa. Isso custa para nós a glória e
a paz de Deus. “É isso o que você quer?”, ele pergunta. “Você pensa que está sendo amoroso,
benigno e útil, mas, quando me empurra para longe, esses traços são impossíveis para que
você experiencie, e então, como você poderia ser amoroso, benigno e útil para os outros?
Focalize-se apenas no amor dentro de você, deixando-me ser seus olhos, para que você possa
julgar comigo o aquilo para o que olha”. Nós julgamos por avaliarmos o mundo como bom ou
mau. Por exemplo, continuar sendo o rei de Corinto é bom; empurrar a rocha montanha acima
é ruim. No entanto, na verdade, nenhum dos dois é bom ou mau, pois são apenas
oportunidades de aprendermos o que é realmente bom e mau: escolher Jesus como nosso
professor é bom, porque isso traz felicidade a nós e aos outros; escolher o ego é mau, porque

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nos causa dor. Tal compreensão é a visão que ele nos pede para escolhermos, até que toda
escolha termina na radiante luz da Expiação.
Assim, nossa primeira resposta é quase sempre mudarmos a situação em vez do nosso
estado interno. Embora isso não signifique que não devemos agir no mundo, ou mesmo tentar
mudar as coisas aqui – nosso mundo pessoal ou no mundo mais amplo -, realmente significa
que se não formos primeiro para dentro, serão nossos egos tentando efetuar a mudança, e
então, o problema nunca será resolvido.
Nós agora nos voltamos para a Lição 191, “Eu sou o próprio Filho Santo de Deus”. Os
três parágrafos no final da lição falam diretamente a essa discussão. Pense outra vez em
Sísifo, e em nós mesmos como exemplos da sua situação de futilidade e desespero.

(LE-pI.191.9:1) Tu, que te percebes fraco e frágil, com esperanças inúteis e sonhos
devastados; tu, que nasceste apenas para morrer, chorar e sofrer dor...

Essa idéia de a que se resumem nossas vidas é mais do que familiar para nós a essa
altura. Nós somos “fracos e frágeis, com esperanças fúteis, e sonhos devastados, nascidos
apenas para morrermos, chorarmos e sofrer dor...”. Nada aqui funciona. Lembre-se da
declaração com que Camus iniciou seu ensaio: “O único problema filosófico sério é o suicídio”.
Essa parece ser uma resposta legítima a tudo o que Jesus descreveu, se nos esquecermos de
que isso é um sonho. Jesus continua:

(9:1-2) ... ouve isso: a ti todo o poder é dado na terra e no Céu. Nada é impossível para ti.

Isso é uma referência à conhecida linha bíblica “Todo o poder é dado a mim [Jesus] no
céu e na terra” (Mateus 28:18), que, aqui, se refere à habilidade da mente de escolher a terra
ou o Céu. Quando escolhemos a primeira, o que fazemos quando decidimos nascer, nossas
mentes também retém o poder de escolher como vamos vê-la: através dos olhos do ego ou do
Espírito Santo. Portanto, não há nada que não possamos fazer, porque é nosso sonho. Isso
não é um chamado para fazermos coisas maravilhosas e curativas; Jesus não está dizendo a
Sísifo para mover a montanha com o poder da sua mente; o que poderia ser um truque
psíquico barato. A única coisa que iria nos trazer a paz do Céu é escolhê-la.

(9:3) Jogas o jogo da morte, como se fosses impotente, miseravelmente atado à


dissolução em um mundo que não te demonstra nenhuma misericórdia.

Precisamos prestar atenção a essas palavras: “Jogas o jogo da morte”. A vida é o nosso
jogo. Nós jogamos com ela e ela é a nossa escolha. No entanto, nós certamente não
experienciamos a nós mesmos como jogando um jogo, mas nos experienciamos como
desamparados, presos à dissolução em um mundo sem misericórdia. Como, então, poderia
haver esperança? Se for verdade que nós jogamos o jogo da morte, quem é o você que está
jogando? Como Hamlet disse: “Oh, aí está a dificuldade”. O você que joga o jogo é nosso
tomador de decisões, o assento de todo poder. O você que empurra a rocha montanha acima
não tem poder. Nós poderíamos ter o poder físico de fazê-lo, mas não temos nenhum poder na
situação, que foi decretada pelos deuses como punição pelo pecado; nossa sina irrevogável.
No entanto, Jesus não está nos incitando a nos rebelarmos, nem a apelarmos aos juízes em
Hades que fizeram a lei. Em vez disso, ele diz: “Deixe-me ajudá-lo a escolher outra vez. Deixe-
me ser seus olhos para julgar a situação corretamente; que esse é seu sonho de pecado, culpa
e punição, e um para o qual você agora pode olhar de forma diferente”.
Portanto, antes de despertarmos do sonho – o que seria ameaçador para todos nós -, nós
mudamos os sonhos e nossa experiência de pesadelos para sonhos felizes. Ainda podemos
estar de forma desesperançada empurrando a pedra, porque não podemos ir contra os deuses,
mas não estamos desamparados; o poder de nossas mentes pode escolher olhar para a
situação de outra forma; não como uma crucificação, um destino injusto de punição humilhante
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e devastadora, mas como uma oportunidade de entendermos que podemos transcender a
desesperança da situação por voltarmos à fonte do verdadeiro poder: a mente do sonhador –
nós.

(9:4) Mas, quando fores misericordioso para com ele, a sua misericórdia brilhará sobre
ti.

Quando temos pensamentos misericordiosos, a falta de misericórdia do mundo se torna


misericordiosa, porque não é nada mais nem menos do que uma projeção do conteúdo da
mente. Se nós mudarmos o pensamento, o mundo vai mudar de acordo – mas não
necessariamente em forma. Como Jesus disse a Helen:

Não será uma mudança que os olhos possam ver (As Dádivas de Deus, p. 117).

O que muda é o olho interno com o qual vemos; o que agora é afirmado ainda mais
claramente:

(10:1) Então, deixa o Filho de Deus despertar do seu sono e abrindo os seus olhos
santos, voltar mais uma vez para abençoar o mundo que fez.

Sísifo apenas sonha. As brincadeiras que ele fez enquanto era rei, eram simplesmente
sonhos, assim como a palhaçada dos deuses. Jesus, assim, nos impele: “Não tente mudar o
sonho, consertar o mundo. Abra seus olhos para a verdade e gentilmente desperte”. E agora
que nosso Sísifo da mente certa abre seus olhos e vê que tudo isso é um sonho, e agora que
ele tem um companheiro em sua mente, com quem ele empurra a pedra para cima, ele está
feliz, como Camus observou no final do seu ensaio. Todos os que o visitam em Hades, assim,
verão sua alegria. Seu corpo ainda pode suar com a umidade que brota do seu esforço, mas
haverá uma paz em relação a ele. Ele vai parecer com qualquer outro que esteja perseguindo
uma tarefa fútil, mas vai “sorrir mais freqüentemente”; sua “fronte [será] serena e os [seus]
olhos... quietos” (LE-pI.155.1:2-3). Assim, portanto, é como nós abençoamos o mundo. Nada
muda externamente – nós ainda nos comportamos normalmente -, mas agora temos um quieto
sorriso interior e a fronte relaxada. Não somos mesquinhos nem críticos, jogando nosso destino
cruel sobre os outros ao nosso redor. Sabendo que em última instância não faz diferença o que
fazemos com nossas vidas, somos gentis, benignos e pacíficos. Nada mudou, mas apenas
com quem nossas mentes estão unidas.
Certamente todos iriam apoiar da boca para fora esse princípio. O problema é que nós
não entendemos que deixar o amor de Jesus fluir através de nós significa que precisamos tirar
a nós mesmos do caminho: nossas noções pré-concebidas de como as coisas deveriam ser;
tudo o que estabelecemos como exigências de como nós e os outros teríamos que nos
comportar. Com isso em mente, revisamos um parágrafo da Lição 189, agora citado
inteiramente:

Faze simplesmente isso: aquieta-te e deixa de lado todos os pensamentos sobre o


que és e o que Deus é; todos os conceitos que aprendeste sobre o mundo; todas as
imagens que tens de ti mesmo. Esvazia a tua mente de tudo o que ela pensa ser
verdadeiro ou falso, bom ou mau, de todo pensamento que julga digno e de todas as
idéias das quais se envergonha. Não retenhas nada. Não tragas contigo nenhum
pensamento que o passado tenha te ensinado e nenhuma crença que tenhas
aprendido com qualquer coisa anteriormente. Esquece-te desse mundo, esquece-te
deste curso e vem com as mãos totalmente vazias ao teu Deus (LE-pI.189.7).

Em outras palavras, nós não vivemos no passado, nem tememos o futuro. Nós, portanto,
esquecemos o destino injusto de empurrarmos a pedra montanha acima, em um estado
41
perpétuo de futilidade e desesperança; nem fazemos julgamentos sobre nossas vidas: estar
em Hades é ruim; viver em Corinto é bom. Nós vivemos no presente, sem pensamentos do
passado ou futuro antecipado para interferirem com nossa gentil quietude.
Do próximo parágrafo na mesma lição:

Não é Ele Aquele Que conhece o caminho que leva a ti? Não precisas conhecer o
caminho para Ele. A tua parte consiste apenas em permitires que todos os
obstáculos que interpuseste entre o Filho e Deus Pai sejam quietamente removidos
para sempre. Deus fará a Sua parte te respondendo imediatamente com alegria.
Pede e recebe. Mas não faças exigências, nem indiques a Deus a estrada pela qual
Ele deveria aparecer a ti. O modo de alcançá-Lo é simplesmente deixá-Lo ser (LE-
pI.189.8:1-7).

Jesus, assim, pede para não fazermos exigências para escaparmos da nossa situação
desagradável – Livre-me dessa montanha! Tire-me desse emprego! Liberte-me desse
relacionamento! – pois isso iria torná-lo real, obscurecendo o verdadeiro problema da decisão
da nossa mente pela culpa. De forma similar, não deveríamos pedir ajuda a Jesus para salvar
o mundo. Como poderíamos salvar um mundo que não existe? Além disso, como teríamos a
possibilidade de saber o que é necessário, ainda que o mundo fosse real? No minuto em que
pensamos que existe um mundo a ser salvo, nos tornamos aquele que precisa ser salvo. Nós,
portanto, salvamos a nós mesmos dessa crença por irmos até Aquele Que nos ajuda a curar a
mente e escolher outra vez.
Voltando à Lição 191:

(10:2-8) O mundo começou no erro, mas terminará no reflexo da sua própria santidade. E
ele não mais dormirá e nem sonhará com a morte. Então, une-te a mim hoje. A tua glória
é a luz que salva o mundo. Não detenhas a salvação por mais tempo. Olha o mundo à tua
volta e vê o sofrimento que está lá. O teu coração não está disposto a trazer o descanso
aos teus irmãos fatigados?

Quando Jesus diz para olharmos o mundo à nossa volta e vermos seu sofrimento, ele não
está falando do Oriente Médio, África, ou da cidade intra-terrena, mas da dor que está em
todos – todos nós somos como Sísifo, para sempre empurrando a rocha da nossa sina pela
montanha da vida acima, apenas para falharmos no final, “vagando por aí apenas para
retornar” (T-19.IV-D.10:8). Em outras palavras, Jesus não está falando sobre a forma do
sofrimento, mas de seu conteúdo universal; o sofrimento que nós compartilhamos como
estranhos em um mundo que sabemos não ser o nosso lar, no entanto, não sabendo onde o lar
está; e, mesmo que o soubéssemos, nosso pecado percebido exige a crença de que sua porta
jamais poderia estar aberta em boas-vindas.
Apesar disso, não importando o que façamos, o quanto nossas vidas possam ser
insignificantes, degradantes ou transtornadoras, elas permanecem maravilhosas oportunidades
para aprendermos que apesar disso podemos ser felizes, como o Sísifo de Camus. Mais uma
vez, precisamos apenas estar cientes do que está realmente acontecendo; olhar com Jesus
para o sonho nos dá a visão para entendermos que é um sonho. Além disso, os sonhos
perturbados do mundo são o efeito de uma mente perturbada, que escolheu o pensamento de
perturbação em vez da paz. E então, ela pode escolher outra vez e trazer descanso ao Filho
exausto de Deus.

(11:1-5) Eles terão que esperar pela tua própria liberação. Ficam acorrentados até que
sejas livre. Não conseguirão ver a misericórdia do mundo enquanto tu não a achares em
ti mesmo. Eles sofrerão dor até que negues o seu domínio sobre ti. Morrerão até que
aceites a tua própria vida eterna.

42
Isso certamente não está destinado a nos levar a viagens de culpa – que outros sofrem
por nossa causa. Em vez disso, reflete o fato de que o Filho de Deus é um; seus fragmentos
aparentes unidos em uma única mente, como a próxima linha reflete:

(11:6-8) Tu és o próprio Filho santo de Deus. Lembra-te disso e o mundo inteiro será
livre. Lembra-te disso e a terra e o Céu serão um só.

A Filiação de Deus é uma. Se nós estivermos no inferno do julgamento, manteremos


todos lá; de forma similar, se perdoarmos, refletindo a paz do Céu, nossas mentes curadas se
estenderão para darem boas-vindas ao mundo. Como Jesus diz no final do texto:

Escolhe outra vez se queres tomar teu lugar entre os salvadores do mundo, ou
permanecer no inferno, e lá manter todos os teus irmãos (T-31.VIII.1:5).

A escolha é nossa – curar ou condenar, ver através dos olhos da visão ou do julgamento
– e o que escolhermos afetará a Filiação como uma, porque existe apenas uma mente, não
separada ou fragmentada. O fato de Sísifo aprender a ser feliz liberta o mundo do
aprisionamento; não dos deuses, mas dos pensamentos de pecado, culpa e medo na mente.
É isso o que Jesus quer dizer quando fala que “a salvação do mundo depende de mim”
(LE-pI.186). Se essas linhas forem compreendidas da perspectiva do mundo, será difícil evitar
uma viagem de especialismo. Quando nos é dito que a luz do mundo está em nós e que o
mundo precisa de nós (i.e., LE-pI.61-63), não é à função externa ou específica que isso está
destinado – não somos sonhos que vêm em zombaria (As Dádivas de Deus, p. 121). Uma vez
que o mundo emana da mente escurecida do Filho único de Deus, todos nós precisamos
escolher o sistema de pensamento repleto de luz do Espírito Santo, que realmente salva o
mundo porque cura a mente.
No texto, nos é dito que o corpo e o ego são paródias e travestis da perfeita criação de
Deus, que é espírito (T-24.VII.1:11; 10:9). Se Jesus estivesse realmente aqui em um corpo,
Deus e Seu Filho seriam alvo de zombaria. Nossa realidade, como a de Jesus, está fora do
sonho. Portanto, seu amor se manifestou no sonho em uma forma que chamamos de Jesus.
Então, o mundo o tornou parte do seu sonho. Nós, assim, precisamos estar vigilantes contra
fazermos isso com seu curso. Nosso professor não está falando conosco como um corpo ou
personalidade, mas apenas como uma mente, pedindo que nos unamos a ele por segurarmos
sua mão e olharmos através dos seus olhos, de cima do campo de batalha. Em sua visão, o
mundo é percebido de forma diferente. Não importando onde estivermos na vida, seremos
pacíficos. Não importando que coisa catastrófica tenha acabado de acontecer conosco ou com
nossas famílias, seremos felizes porque sabemos que isso é um sonho. O amor de Jesus,
então, vai fluir através de nossas mentes, direcionando o que nossos corpos dizem e fazem.
Isso significa que mesmo que, aos olhos do mundo, possamos ser ocupados e úteis,
permaneceremos no centro quieto da mente (T-18.VII.8), e literalmente não teremos
preocupações com o mundo, sabendo que ele existe apenas dentro da mente.
Para repetir esse ponto importante, isso não está dizendo que não deveríamos fazer
coisas no mundo. Está simplesmente dizendo que o que fazemos é o efeito, e nosso foco
deveria estar apenas na causa – a mente. Assim, Jesus diz:

Esse é um curso em causa, não em efeito (T-21.VII.7:8).

Esse é um curso em mudarmos nossas mentes sobre o mundo, não o mundo em si.
Nossa falha em reconhecer que é esse o motivo pelo qual tudo está sempre tão errado aqui, e
por que mesmo as pessoas mais bem-intencionadas, em última instância, não são úteis. Isso
também explica por que as visões utópicas falham – porque as pessoas ficam presas à forma,
ao efeito. Karl Marx obviamente estava certo em apontar a ganância e desigualdade como o
problema do mundo. No entanto, ele perdeu de vista o ponto central que não tinha nada a ver
43
com economia, mas com a ganância e desigualdade – a crença em interesses separados –
que está na mente de todos, não importando seus pontos de vista políticos. Além disso,
sabemos que todos têm esse problema porque todos nós acreditamos estar aqui, e, até que
esse pensamento seja examinado e desfeito na mente, o sofrimento do mundo vai continuar.
E então, quando Jesus fala de estabelecer a meta (T-17.VI), ou nos pede para decidirmos
que dia queremos ter (T-30.I), ele não está se referindo a ganhar na loteria ou sair de um
quarto de hospital sentindo-se bem. Seu ponto é apenas em termos paz interior: Nós queremos
um dia no qual realmente seremos pacíficos, ou um de estresse e conflito? É por isso que seu
curso é um curso em causa (a mente), e não em efeito (comportamento), e o motivo pelo qual
seu foco está no milagre, que restaura “à causa (a mente), a função da causalidade, não de
efeito” (T-28.II.9:3). O milagre devolve à nossa consciência o fato de que é a mente que causa
o mundo - que é meramente um efeito. Daí o título, Um Curso em Milagres – um curso que não
tem nada a ver com comportamento, que é o motivo pelo qual ele deveria ser escolhido como
um guia para decisões aqui. O propósito do Curso, mais uma vez, está apenas em nos ajudar a
nos tornarmos pacíficos, a partir do que, nosso comportamento vai fluir amorosamente.

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9. “A alternativa real”

O restante da nossa discussão estará centralizado na seção “A alternativa real”, do último


capítulo do texto (T-31.IV). Nós citamos dessa seção antes (veja p. 41-45), e continuaremos de
onde paramos:

(T-31.IV.3:4-7) Homens morreram ao ver isso [a futilidade das estradas da vida], porque não
viram outro caminho exceto as trilhas oferecidas pelo mundo. E ao aprender que não
levavam a lugar nenhum, perderam sua esperança. E apesar disso, era esse o momento
em que eles poderiam ter aprendido sua maior lição. Todos necessariamente atingem
esse ponto e vão além.

Pense de novo na bifurcação na estrada (veja p. 59). Nós subimos pela linha vertical até a
divisão do Y, e então fazemos nossa escolha: continuarmos com o ego ou com Jesus – uma
vida de futilidade e morte, ou uma de felicidade, que reflete a vida eterna.

(3:8-10) É verdade, de fato, que não existe escolha alguma dentro do mundo. Mas essa
não é a lição em si mesma. A lição tem um propósito e nele vens a compreender para
quê ela serve.

Propósito é um dos temas centrais no Um Curso em Milagres. Qual é o propósito de


Sísifo empurrando a pedra montanha acima, esperando levá-la ao outro lado, apenas para que
ela atinja o topo e role de volta, para começar tudo de novo? Qual é o propósito das nossas
vidas individuais? Nós nascemos apenas para morrer; nós comemos apenas para comermos
outra vez; nós tomamos um banho apenas para tomarmos outro; nós ficamos cansados no final
do dia e vamos para a cama, apenas para despertarmos na manhã seguinte para continuarmos
no mesmo ciclo. Para que serve tudo isso?
Se nós pensarmos que existe um propósito inerente ao mundo, estaremos acabados. Que
esperança pode haver se viemos para esse mundo apenas para deixá-lo? Qual é o propósito
de empurrar uma rocha montanha acima apenas para tê-la rolando de novo para baixo? Por
que viver uma existência de futilidade e desesperança? No entanto, existe um propósito aqui,
mas não o que o mundo vê. O propósito dessa discussão, por exemplo, não é falar sobre Sísifo
como tal, mas vê-lo como um propósito para a vida no mundo. Assim, aprendemos que o único
propósito do mundo é aprendermos que ele não tem nenhum. Isso nos devolve à mente, pois a
menos que entendamos que somos mentes, o suicídio é a única resposta legítima para
estarmos aqui, como Camus apontou.
O mundo, portanto, tem valor porque ele pode revelar a nós a futilidade de tentarmos
encontrar esperança aqui. Atingindo esse ponto, podemos dizer, como fizeram Helen e Bill em
1965: “Tem que existir outro caminho”. Esse então é o valor de toda dor, luta e tormento:
ajudar-nos a entender que é isso o que a vida no corpo é, quer alguém nasça em berço de
ouro ou não. Para o Espírito Santo, portanto, o mundo é uma sala de aula na qual nossos
pensamentos, sentimentos e comportamento servem para nos ensinar que o único trabalho
bom, nobre e útil é curarmos nossas mentes através do perdão. E então, existe propósito até
mesmo aqui, e, com um resultado diferente daquele do ego:

A tolerância à dor pode ser alta, mas não é sem limites. Eventualmente, todos
começam a reconhecer, embora de forma tênue, que tem que existir um caminho
melhor. Na medida em que esse reconhecimento vem a ser estabelecido de forma
mais firme vem a ser um ponto de mutação. Isso, em última instância, desperta outra
vez a visão espiritual, enfraquecendo simultaneamente o investimento na vista física.
O investimento alternado nos dois níveis de percepção é usualmente experimentado

45
como um conflito que pode vir a ser muito agudo. Mas o resultado é tão certo quanto
Deus (T-2.III.3:5-10).

(4:1) Por que deverias buscar outra estrada, outra pessoa ou outro lugar quando
aprendeste como a lição começa, mas ainda não percebeste para que ela serve?

A lição começa quando experienciamos a futilidade de nossas vidas. Nós somos Sísifo,
lutando tenazmente e ainda assim não chegando a lugar algum. De início, durante a subida,
nós conjuramos explicações fantasiosas para o que estamos fazendo e por que é tão
importante ou terrível, percebendo as pessoas maravilhosas ou prejudiciais que são parte das
nossas situações de vida. É assim que a lição começa, mas não é para isso que ela serve.

(4:2-5) Seu propósito é a resposta à busca que todos têm que empreender quando ainda
acreditam que existe uma outra resposta a ser achada. Aprende agora, sem desespero,
que não existe nenhuma esperança de resposta no mundo. Mas não julgues a lição que
apenas se inicia com isso. Não busques no mundo um outro sinal que pareça indicar
ainda uma outra estrada.

O destino de Sísifo é o destino de todos. Enquanto tentarmos encontrar ainda outra


montanha, outra rocha, outro relacionamento especial, outro brinquedo ou troféu, nada disso
vai importar. Podemos mudar a forma, mas o conteúdo de futilidade permanece o mesmo. O
livro de exercícios diz, “Outro pode ser encontrado” (LE-pI.170.8:7), e o texto fala de
embarcarmos em “em uma cadeia interminável, sem recompensa, de relacionamentos
especiais” (T-15.VII.4:6). Nós continuamente buscamos algo que vá funcionar – outro
relacionamento, emprego, local, seja o que for – mas tudo por nada, pois as estradas do
mundo não levam a lugar algum, exceto aquela que leva para dentro: o caminho do milagre.

(4:6-7) Não procures mais esperança onde não existe nenhuma. Apressa agora o teu
aprendizado e compreende que apenas perdes tempo, a não ser que vás além do que
aprendeste para o que ainda está por ser aprendido.

Nós aprendemos que o mundo é cruel, injusto e sem esperanças. No entanto, podemos
aprender algo mais. Se ficarmos obsessivos com a posição onde estamos e com o que está
errado, ou exultantes com o que temos, nunca vamos nos mover além dessas lições para a
única real, nunca nos moveremos além da forma para o conteúdo. Esse, então é o propósito do
Um Curso em Milagres: nos levar do mundo de corpos para a mente, para que possamos
escolher outra vez. Dentro da mente existem apenas duas escolhas: ou olhamos através dos
olhos da separação, especialismo e culpa, ou através dos olhos do perdão, cura e paz. Não
existe nada mais; o que significa que não faz diferença o que fazemos; tudo o que importa,
mais uma vez, é com quem o fazemos. Para repetir, isso não significa que não façamos as
coisas bem, de forma eficiente, e com o melhor da nossa habilidade. Por que não iríamos
querer fazê-lo? Sem culpa em nossas mentes, tal comportamento útil vai automaticamente
acontecer, pois seríamos responsáveis apenas por amar. Qualquer forma que isso assuma,
qualquer que seja nossa especialidade, treinamento e papel – ele será cumprido com o amor
que flui através de nós. Não importando quantos milhares de vezes empurremos a rocha
montanha acima, estaremos em paz.

(4:8) Pois deste ponto mais baixo o aprendizado conduzirá aos píncaros da felicidade,
onde vês o propósito da lição brilhando clara e perfeitamente dentro da tua capacidade
de aprender.

Jesus está nos dizendo que podemos ficar livres de toda dor e desespero. O processo
pode ser assemelhado a decolar com um avião quando o tempo está tempestuoso. Conforme
46
subimos através das nuvens escuras e além, o sol subitamente aparece. Jesus, portanto, está
nos incitando a não permanecermos nos níveis mais baixos do mundo do ego, onde existe
apenas sofrimento e desapontamento. Elevando-nos com ele acima do campo de batalha,
passamos através das nuvens de culpa, como ele diz no livro de exercícios:

Tenta ultrapassar as nuvens por quaisquer meios que te agradem. Se isso puder
ajudar-te, pensa em mim segurando a tua mão e conduzindo-te. E eu te asseguro
que essa não será nenhuma fantasia vã (LE-pI.70.9:2-4).

Jesus nos pede para deixarmos que ele nos guie através das nuvens de culpa,
especialismo e futilidade, pois assim, ele nos eleva para a visão da luz do sol. Nossas lições de
perdão vão brilhar claras, levando-nos às alturas da felicidade.
O problema, no entanto, é que nós não acreditamos em Jesus. E assim, nós
exigentemente temos nossos ataques de nervos: “Eu quero você aqui embaixo comigo. Eu
quero que você traga o sol para onde eu estou. Eu não quero ir até você”. Nós batemos o pé e
gritamos, vociferamos e temos ataques de raiva, furiosos porque ele não faz o que queremos.
Além disso, em algum nível, sabemos que Jesus não pode vir para o mundo, pois ele não é
desse mundo – ele não pode vir aonde não existe nada. Ele não pode entrar em nossos
sonhos, fantasias ou psicoses, pois eles foram feitos especificamente para excluir a ele e a seu
amor.
No entanto, Jesus continua acessível para nós, pedindo que seguremos sua mão para
que ele nos leve através das nuvens, para a luz. No texto, ele nos diz que as nuvens não têm
poder, elas não podem nem mesmo impedir um botão de cair através delas (T-18.IX.6). E
então, com efeito, ele diz: “Eu vou levá-lo através da sua culpa, que é nada – suas nuvens não
são sólidas paredes de granito. Você poderia ser mais feliz mesmo empurrando a pedra, dia
após dia, não chegando a lugar algum. Pois, se você aprender a fazer isso comigo, será feliz e
pacífico, tendo aprendido que não existe hierarquia de ilusões (T-23.II.2:3)”. Portanto, nós
podemos estar vivendo o que parecem ser vidas sem significado, ou vidas que podemos julgar
como sem significado, como ensina o Um Curso em Milagres, e não fará diferença para nós.
Nós vamos reconhecer que tudo é o mesmo, pois ilusões são apenas ilusões. É por isso que
milagres não têm ordem de dificuldade (T-1.I.1:1). A única coisa que é diferente agora, para
repetir, é com quem pensamos e agimos. Esta é a lição que esse curso iria ensinar.

(5:1) Quem estaria disposto a ser afastado de todas as estradas do mundo, a não ser que
compreendesse a sua real futilidade?

Jesus quer que entendamos a futilidade da nossa vida sisifoniana. Sempre que
pensarmos em nossas vidas diárias, deveríamos pensar sobre o nosso herói grego e a
inutilidade e falta de significado da sua sina. No entanto, ainda podemos ser felizes. Nós então
precisamos ver o quanto somos resistentes à felicidade. Com certeza, queremos ser felizes em
nossos termos, tal como fazendo Jesus vir ao nosso sonho e atender às nossas necessidades
auto-definidas. Lembre-se da nossa linha já citada:

O pensamento [ou Verbo] não pode se tornar carne... (T-8.VII.7:4).

O espírito não entra e não pode entrar no mundo porque não existe mundo; e, se
pudesse, ele seria tão insano quanto nós – indo a um lugar que não está em lugar algum, no
qual não existe nada.
Uma vez que Jesus não está em nosso sonho, embora ele nos chame de fora dele, os
estudantes do seu curso são altamente tentados a trazê-lo para seu mundo e, assim, fazer o
Um Curso em Milagres dizer coisas que não diz. Jesus não tenta tornar nossos apuros
externos melhores, mas em vez disso, quer que entendamos que não existe maneira de torná-
los melhores porque eles foram feito precisamente para não serem melhores. Esse propósito é
47
sua causa. Idéias não deixam sua fonte: a fonte de tudo o que está errado no mundo é o
desejo de que nada funcione aqui. No entanto, podemos deixar a fonte do ego na mente e
escolher outra, como lemos:

(5:2) Não é necessário que ele comece com isso para buscar um outro caminho em lugar
delas?

Nós começamos reconhecendo a futilidade de nossas vidas aqui. O mundo pode chamar
isso de pessimismo, no entanto, é qualquer coisa menos isso. É a verdade. Como poderia ser
pessimista dizer que nada funciona aqui, uma vez que nada o faz? Na verdade, é psicótico
pensar que esse mundo funciona. E então, Jesus está nos pedindo para sermos realistas,
conforme ele chama as coisas pelos seus nomes reais: “Olhe para o mundo pelo que ele é.
Você pode escapar, mas não por correr dele. Em vez disso, una-se a mim, elevando-se até a
mente, vendo sua insanidade e escolhendo a resposta sã da Expiação”. Aqui reside nossa
esperança, como a Lição 226 nos lembra:

Se eu assim escolher, posso deixar esse mundo inteiramente. Não é a morte que
torna isso possível, mas a mudança da mente em relação ao propósito do mundo.
Se eu acreditar que ele tem valor, tal como o vejo agora, ele permanecerá assim
para mim. Mas se, ao contemplá-lo, eu não vir nenhum valor no mundo, nada que eu
queira guardar para mim ou almeje como uma meta, ele me deixará. Pois não terei
buscado ilusões para substituir a verdade.

Pai, o meu lar aguarda o meu retorno alegre. Os Teus Braços estão abertos e eu
ouço a Tua Voz. Que necessidade tenho eu de ficar num lugar de desejos vãos e de
sonhos despedaçados, se o Céu pode ser meu com tanta facilidade? (LE-pII.226).

(5:3) Pois enquanto vê uma escolha onde não existe nenhuma, que poder de decisão
pode ele usar?

Aqui está a primeira menção nessa seção sobre o “poder de decisão”, um tema
extremamente importante: “enquanto ele vê uma escolha onde não existe nenhuma, que poder
de decisão pode ele usar?”. Nossa lição é o poder da mente de escolher estar dentro ou fora
do sonho – não de escolher qualquer um em particular. Não existe poder em escolher entre
dois sonhos, pois essa é a escolha entre ilusões. Nosso verdadeiro poder repousa em
escolhermos entre verdade e ilusão: permanecer adormecidos ou despertar; retornar à mente
ou permanecer no corpo.

(5:4-5) A grande liberação do poder tem que começar com o aprendizado do lugar aonde
ele tem realmente utilidade. E que decisão tem poder se é aplicada à situações sem
escolha?

“Situações sem escolha” refere-se a qualquer coisa no mundo. Escolher entre assassinar
e ser assassinado, nossa dor e o sofrimento de outra pessoa, o ódio e o amor especial não é
uma escolha verdadeira. No entanto, escolher entre especialismo e perdão é. O ego nega o
poder da mente por dar poder à ilusão da escolha onde não existe nenhuma – i.e., o corpo.
Mais uma vez, viver em um palácio aos pés da montanha ou empurrar a pedra montanha
acima não é uma escolha de forma alguma. O prazer e a dor podem parecer e ser
experienciados de forma diferente, mas isso não os torna reais. De fato, sua força pode nos
ajudar a reconhecer que eles não são do corpo, mas da mente. Poderíamos até mesmo dizer
que quanto mais fortes forem os nossos sentimentos, mais poderemos ver que eles são parte
da estratégia do ego para nos confundir, tornando-nos sem mente.
Assim, Jesus ensina no manual, no contexto da doença e da cura:
48
A cura necessariamente ocorre na exata proporção em que se reconhece que a
doença não tem valor. Basta ele dizer: “Eu não ganho absolutamente nada com
isso” e está curado. Mas para dizer isso, ele primeiro tem que reconhecer certos
fatos. Em primeiro lugar, é óbvio que as decisões são da mente não do corpo. Se a
doença não é senão um enfoque falho de como solucionar problemas, ela é uma
decisão. E se é uma decisão, é a mente e não o corpo, que a toma. A resistência a
reconhecer isso é enorme, posto que a existência do mundo tal como tu o percebes
depende do corpo como aquele que toma as decisões. Termos como “instintos”,
“reflexos” e outros semelhantes representam tentativas de dotar o corpo com
motivos não-mentais. De fato, tais termos meramente declaram ou descrevem o
problema. Não lhe dão uma resposta (MP-5.II.1).

Portanto, sempre que sentirmos algo intensamente, saberemos que existe um


pensamento na mente para o qual deveríamos olhar. A percepção tem que mentir, porque ela
nos diz que existe um mundo a ser percebido e sentido, o corpo sendo seu instrumento de
fraude. E, uma vez que sentimentos parecem vir do corpo, nós sabemos que eles mentem.
Isso não significa que não deveríamos prestar atenção a eles. Bem ao contrário; deveríamos.
Assim, embora não precisemos aceitar os sentimentos como a verdade, eles ainda podem nos
apontar a verdade do poder do tomador de decisões da mente de escolher entre o ego e o
Espírito Santo, Que nos diz que não se pode confiar no corpo: ele vê, ouve, cheira, prova e
toca o que não está lá. Então, por que ir até ele em busca de ajuda? Antes, de fato, Jesus nos
diz para não perguntarmos à única coisa em todo o universo – o ego, e, portanto, o corpo – que
não conhece, para nos dizer o que a realidade é (T-20.III.7).
Nós, portanto, precisamos nos lembrar do papel do corpo para iludir, e então, aplicar esse
propósito a quaisquer situações nas quais estejamos, entendendo o quanto nossas vidas são
auto-derrotadoras, para não mencionar auto-destrutivas. Nós temos que ver que nenhuma
escolha significativa é possível aqui. Fazer A ou B não é significativo, mas fazer A ou B com
Jesus é. Essa é a lição de Sísifo: reconhecer que escolher a partir da raiva, depressão ou
medo não é uma escolha real. No entanto, escolher a partir da raiva ou da paz é uma escolha
significativa. Tentar mudar nossa situação externa por algo melhor não faz sentido, pois o
corpo não pode ser tornado melhor ou pior: uma ilusão é uma ilusão, é uma ilusão.

(6:1) O aprendizado de que o mundo só pode oferecer uma escolha, não importa qual
seja a sua forma, é o inicio da aceitação de que existe, em vez disso, uma alternativa
real.

A alternativa real está entre escolher o ego ou o Espírito Santo – escolhendo permanecer
no sonho e agir dentro dele, ou escolhendo dar um passo atrás e observarmos a nós mesmos
como figuras no sonho. Só isso é uma escolha significativa.

(6:2) Lutar contra esse estádio é derrotar o teu propósito aqui.

Nosso propósito aqui é aprendermos que existe uma alternativa real: existe uma mente
que escolhe, e nós somos o sonhador do sonho e não a figura no sonho. Dadas as
desastrosas conseqüências, lutar contra esse aprendizado é simplesmente tolo.

(6:3-5) Não vieste para aprender a achar uma estrada que o mundo não contém. A busca
de diferentes atalhos no mundo não é senão a busca de diferentes formas de verdade. E
isso impediria a verdade de ser alcançada.

Nós encontramos nessas declarações ecos da primeira lei do caos, que afirma que não
apenas existe uma hierarquia de ilusões, mas também que a verdade é relativa (T-23.II.2-32).
No entanto, como isso poderia ser assim? Nós podemos conhecer a verdade de formas
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diferentes, mas existe apenas a unicidade da verdade, como na famosa declaração hindu: “A
verdade é uma. Os sábios a conhecem por muitos nomes”. Não existem muitas verdades,
porque não existe verdade no mundo da ilusão. Essa, então, é a única declaração verdadeira
que podemos fazer sobre o mundo: não existe verdade aqui, pois uma ilusão não pode
expressar a realidade.

(7:1-2) Não penses que a felicidade é jamais achada seguindo uma estrada que se
distancia dela. Isso não faz sentido, não pode ser esse o caminho.

A felicidade pode ser achada apenas em seu lar na mente certa. Portanto, enquanto
devotarmos nossa atenção a situações externas, na extensão em que perdermos nossa paz
em relação a isso, saberemos que algo está errado. Quando estamos na mente certa,
nenhuma energia é investida no mundo. O amor que é estendido através de nós não requer
esforço da nossa parte. É apenas quando resistimos a esse amor que confiamos em nosso
próprio poder, e isso é penoso. Assim, se lutarmos, se houver tensão ou ansiedade – não
importando o que fazemos -, saberemos que estivemos ouvindo o ego. Se Sísifo agora está
feliz, é porque está empurrando a pedra sem esforço. Não importando o peso da pedra e sua
fraqueza em comparação, ele não estaria experienciando o verdadeiro esforço. Ele estaria em
paz no início, no caminho para cima, e enquanto observa a rocha descendo pela montanha.
Ele terá entendido que o que faz diferença é com quem está empurrando.
Como Jesus nos diz repetidamente, sempre escolhemos entre nossa fraqueza e a força
de Cristo em nós (i.e., T-31.VIII.2:3). O mundo chama a fraqueza do ego de força: “Olhe para
as coisas poderosas que eu alcancei, as coisas maravilhosas que eu faço, o quanto eu
trabalho duro, as pessoas que eu ajudo, as coisas sábias que eu digo e escrevo”. O eu é a
pista de que existe um problema, pois significa que é apenas o ego quem fala.

(7:3) Para ti, que pareces achar esse curso muito difícil de aprender, deixa-me repetir
que para conseguires uma meta tens que avançar na sua direção, não no sentido
contrário.

Se nossa meta é a paz, só podemos encontrá-la por irmos em direção a ela, o que
significa voltarmos à mente. Se, por outro lado, a meta for nos defendermos contra a paz,
resistindo a ela por fazermos transigências ao nosso especialismo e reforçarmos nossas
identidades separadas, vamos prosseguir na direção do mundo e do corpo. Nós primeiro
decidimos nossa meta, e então escolhemos o professor que vai nos levar até ela. Se, portanto,
nossa meta for a paz, e os “juízes em Hades” nos condenarem a uma sina sisifoneana como
uma punição justificada por nossos maus atos, nós apesar disso vamos ver essa situação
como um meio de alcançarmos nosso fim. Não importando o que façamos, a visão vê a
situação como a forma de lembrar de que o poder de decisão repousa em nossa mente, e nós
não interpretamos o externo como punição pelo pecado. Como o livro de exercícios diz: “Eu
poderia ver a paz em vez disso” (LE-pI.34); nós podemos estar pacíficos em vez de ressentidos
e desesperados. A escolha é nossa, e essa é a lição.
De forma importante, essa abordagem não nos torna passivos no mundo, nem significa
que não fazemos nada aqui. Significa apenas que nós somos passivos diante do ego e ativos
diante do Espírito Santo. Nós realmente podemos se bem ativos de forma comportamental, se
o amor nos guiar a fazê-lo, mas não vamos mais experienciar a nós mesmos como os atores,
sendo apenas os veículos através dos quais o amor flui. Portanto, não somos nós que
fazemos. Assim, novamente, não haverá esforço, fadiga ou investimento no resultado; nem
alto, quando algo que julgamos como bom acontece, nem baixo, se algo que julgamos como
ruim acontece – tudo vai ser percebido como o mesmo. Lembre-se da oração de Ano Novo do
texto:

Faça desse ano algo diferente, por torná-lo o mesmo (T-15.XI.10:11).


50
Nós tornamos cada relacionamento, situação e evento no mundo o mesmo em termos da
nossa resposta: uma calma quieta. Se não existe hierarquia de ilusões, não pode haver
hierarquia de respostas. Se ouvirmos o Espírito Santo, vamos nos sentir apenas felizes e em
paz. Se ouvirmos o ego, vamos nos sentir miseráveis também, tornando-os responsáveis pela
nossa infelicidade. Isso poderia incluir o próprio Um Curso em Milagres, o qual seríamos
tentados a culpar pela nossa inabilidade de aprendê-lo.

(7:4) E toda estrada que conduz ao sentido contrário não avançará na direção do
propósito a ser achado.

Se nós dissermos que queremos ser pacíficos, e, no entanto continuarmos pedindo a


Jesus para consertar nosso mundo e corpos, estaremos continuamente nos sentindo
frustrados, pois estaremos escolhendo um meio que não pode nos levar ao final. Duas seções
paralelas no texto, “A consistência entre meios e fim” (T-20.VII) e “Estabelecendo a meta” (T-
17.VI) nos ajudam a ver que se nós realmente quisermos a paz, precisaremos ver tudo o que
acontece – não importando como o mundo o julga – como um meio de nos ajudar a alcançar
nossa meta. Nós teremos aprendido que nem a salvação nem a aflição vêm de fora – apenas
da decisão da mente por Jesus ou pelo ego.

(7:5-7) Se isso for difícil de entender, então é impossível aprender esse curso. Mas
somente nesse caso. Pois de outro modo, é um ensino simples do óbvio.

Essa é a forma de Jesus nos dizer: “Por favor, não me diga que esse é um curso difícil.
Em vez disso, é um curso ao qual você tem muita resistência, que é o motivo pelo qual parece
difícil. Portanto, não é o Um Curso em Milagres que é o problema, mas o que você está
fazendo com ele. Resistência à verdade é difícil, assim como lutar contra ela”.
E então, as palavras de Jesus não vão significar nada se não as aplicarmos às nossas
situações atuais para que possamos ver como a forma com que vivemos assegura que não
vamos aceitar os meios que ele oferece para atingirmos o fim, o que só pode ser devido ao
nosso medo desse fim. Tendo medo da paz, nós não escolhemos a estrada que vai nos levar
até lá. Como resultado, nós nos ressentimos do nosso destino, como pode-se imaginar Sísifo
fazendo; apontando para a futilidade e desesperança de uma vida que não é ele quem está
fazendo. Quando, no entanto, nos elevamos acima do julgamento, para o nível da visão,
abraçamos essa vida como uma sala de aulas, reconhecendo que é assim que aprendemos
nossas lições. Portanto, o meio do perdão se torna banhado em luz, assim como nossa meta
da verdade. No panfleto Psicoterapia, Jesus impele os terapeutas a fazerem a mesma coisa –
desistirem do julgamento (P-3.II.6:1; 7:1) -, em cujo ponto “o quarto se torna um templo, e a rua
um córrego de estrelas...” (P-2.VII.8:4).
Tudo então muda, Sísifo empurra sua pedra montanha acima rodeado de estrelas e de
uma luz radiante. Sua face está alegre, não porque a situação mudou, mas porque ele mudou.
Ele não tentou mudar sua situação por, por exemplo, abordar os habitantes de Hades para
promover uma insurreição contra os deuses, em protesto por sua crueldade. Se a revolta de
Sísifo fosse bem sucedida, é certo que os novos governantes seriam tão cruelmente
egocêntricos quanto aqueles que ele venceu, porque ele e seu bando de seguidores não teriam
ensinado a única lição que realmente queriam aprender: nada no mundo tem o poder de torná-
los felizes ou infelizes.

(8:1-2) Existe uma escolha que tens o poder de fazer quando tiveres visto as alternativas
reais. Até que esse ponto seja alcançado, não tens escolha e não podes fazer nada além
de decidir como farás a melhor escolha para enganar a ti mesmo outra vez.

51
Isso descreve nossas vidas. Nós continuamos tentando fazer as coisas funcionarem, ou
funcionarem melhor, em vez de primeiro aceitarmos onde estamos, e também tentando tornar
nosso sistema de pensamento melhor. Quando nos tornarmos da mente certa, não veremos as
situações como capazes de nos tornar felizes ou tristes. No entanto, as mudanças são as de
que, se não existir raiva ou culpa, nossa situação provavelmente mudará para melhor, e
certamente mudará em nossa experiência, pois ela não mais será motivada pelo auto-ódio ou
ressentimento. Quando o ódio se vai, tudo o que resta é o amor, e apenas então, qualquer
intervenção comportamental pode realmente ser cuidadosa e sem egoísmo. No entanto,
quando nos focalizamos em querer mudar o externo em vez de simplesmente aceitar onde nós
e os outros estamos, nada realmente muda, porque acabamos meramente manipulando a
forma, enquanto os pensamentos subjacentes de separação permanecem. Nós, portanto,
precisamos nos focalizar continuamente no poder de nossas mentes de escolherem, não entre
ilusões, mas entre ilusões e verdade. Esse é nosso único propósito aqui, resumido nessa
próxima linha:

(8:3) Esse curso não tenta ensinar mais do que o fato de que o poder de decisão não
pode estar na escolha de diferentes formas daquilo que ainda é a mesma ilusão e o
mesmo equívoco.

Essa é a mensagem de Jesus em seu curso, dita no início do texto, o tempo todo através
dele, e mais uma vez no final, para não mencionar o livro de exercícios e o manual: o poder da
nossa decisão não repousa em escolhermos entre ilusões diferentes, mas em escolhermos
entre elas e a verdade. Isso é feito por trazermos a escuridão do nosso ódio à luz do seu amor;
nós levamos nossas preocupações e sentimentos de angústia, desespero e desesperança à
fonte de esperança na mente. É por isso, para repetir ainda mais uma vez, que pedir ajuda a
Jesus no mundo nega o ensinamento central no Um Curso em Milagres. Se nós persistirmos
em abordar nosso mundo dessa forma, nunca vamos aprender suas simples lições – sermos
ensinados pela mente sobre onde o poder de decisão repousa. Nós não aprendemos no
mundo ou no corpo, nem na montanha de Sísifo, sobre os quais Jesus e o Espírito Santo não
sabem nada. Eles conhecem apenas a culpa, ressentimento e senso de futilidade na mente, e
sua correção através do perdão.

(8:4) Todas as escolhas no mundo dependem disso: tu escolhes entre tu e o teu irmão e
ganharás tanto quanto ele perderá, e o que perdes é o que é dado a ele.

Isso reflete o princípio reinante do sistema de pensamento do ego – um ou outro: você


vence, eu perco; você morre, eu vivo; você tem algo, eu o tiro de você. Essa é a lei do mundo,
porque sua é a lei da mente do ego que o fez surgir: Deus ou o ego. Assim, nós escolhemos
entre nosso Pai e nosso ser, e vamos ganhar na medida em que Ele perder. Nós acreditamos
que Ele perdeu Seu poder criativo porque nós o usurpamos – nós vivemos porque Ele morreu
no instante do sacrifício final.
Assim, tudo no mundo, desde o início dos tempos até sua dissolução, é uma sombra
fragmentária do pensamento ontológico do que nós pensamos ter feito ao nosso Criador. Nós,
portanto, não amamos os outros pelo Cristo neles, mas pelo que eles podem fazer por nós.
Nós precisamos que os outros percam algo de si mesmos para que possamos tê-lo. Nós
fingimos amá-los, mas realmente os odiamos pelo pecado que não queremos ver em nós
mesmos. Nós, portanto, roubamos sua inocência, capacitando-nos a tê-la à sua custa, pois
eles agora possuem nosso pecado projetado, o que nos deixa inocentes e felizes.
Desnecessário dizer, os outros acreditam ter feito a mesma coisa conosco. Nós, então,
encenamos uns com os outros o que acreditamos ter acontecido no momento original de
separação, revivido de novo e de novo, infinitas vezes.

52
(8:5) Como isso é totalmente oposto à verdade, quando todo o propósito da lição é
ensinar que o que o teu irmão perde tu perdeste e o que ele ganha é o que é dado a ti.

O propósito da lição é que nós somos um, uma unicidade que existe na mente, não no
corpo:

As mentes estão unidas, os corpos não (T-18.VI.3:1).

Corpos podem parecer se unir em ódio, mas cada um deles é separado e não pode
verdadeiramente se unir. De fato, nós odiamos os outros para mantermos a ilusão da
separação viva e bem. A verdade do Espírito Santo, no entanto, não é um ou outro, mas juntos,
ou não de forma alguma (T-19.IV-D.12:8): você o tem, eu também tenho que tê-lo – se eu o
tornar culpado, serei culpado também; se eu tiver visto a face de Cristo em você, compartilho
Sua inocência. Não pode acontecer de nós sermos diferentes. O ego, por outro lado, acredita
em diferenças e hierarquias de ilusões. Ele sustenta que existem funções que valem a pena no
mundo, tais como salvar vidas, e algumas sem valor, tais como empurrar
desesperançadamente uma pedra montanha acima. No entanto, Jesus ensina que uma ilusão
permanece uma ilusão: uma é a mesma que mil; multiplicar zero por um ou por mil ainda
resulta em zero. No Céu, somos Um como Cristo; na terra, somos um como ego, assim como
na correção da mente certa.
A noção de um ou outro surgiu da crença em que nos separamos de Deus. Nós fizemos o
mundo para esconder esse fato, e então acreditamos que Deus ia se separar de nós porque
Ele estava zangado. Nós então projetamos a responsabilidade pela separação, proclamando:
“Não fui eu que traí Deus por deixá-Lo; Ele traiu Seu Filho, deixando-me”. Nós, portanto,
escrevemos nossos roteiros individuais para que nascêssemos como bebês inocentes, para
que qualquer coisa que aconteça não seja nossa culpa – isso foi feito a nós. E assim, nossos
pais nos abandonaram e abusaram de nós, foram cruéis, insensíveis e não-benignos; nós não
éramos assim em relação a eles. Afinal, quem poderia culpar um bebê de cinco dias de idade?
O problema, no entanto, é que nós continuamos sendo aquele bebê, sempre negando nossa
culpa, protestando nossa inocência, e tornando todos os outros culpados – tudo porque
acreditamos que fizemos isso com Deus.
E agora a correção:

(9:1-2) Ele não deixou os Seus Pensamentos! Mas tu esqueceste a Sua Presença e não
recordaste o Seu Amor.

Uma forma de definirmos nossa verdadeira Identidade é dizermos que somos um


Pensamento na Mente de Deus, Que não nos deixou; nem nós O deixamos. Em nosso sonho,
no entanto, nós nos esquecemos da Sua Presença quando parecemos escolher contra Seu
Amor.

(9:3) Nenhum atalho no mundo pode conduzir a Ele e nenhuma meta mundana pode ser
una com a Sua.

No entanto, é isso o que a maioria das religiões e caminhos espirituais tenta fazer,
estabelecer caminhos no mundo para elaborarem formas e rituais que vão levar de volta a
Deus, quando de fato, a estrada para o Céu é simples: deixamos o mundo ilusório e vamos
para dentro. Nós podemos fazer coisas aqui – por exemplo, estudarmos esse curso e fazermos
seu livro de exercícios – mas esses são simplesmente uma ajuda. Qualquer caminho espiritual
verdadeiro nos leva além das formas para o conteúdo de amor na mente.

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(9:4) Que estrada em todo o mundo conduzirá para o que está dentro, quando todas as
estradas foram feitas para separar a jornada do propósito que ela não pode deixar de ter,
a não ser que não passe de um fútil vagar?

Nosso propósito da mente certa em estarmos aqui é voltarmos à mente – acima do


campo de batalha – para que possamos mudá-la, em vez de tentarmos mudar o mundo: suas
situações, relacionamentos e corpos. Nós reconhecemos o professor que escolhemos – o ego
ou Jesus – por honestamente observarmos nossas reações. Nós estamos tensos, zangados,
ressentidos, esperando por certo resultado; ou estamos pacíficos, contentes e benignamente
indiferentes? Estamos agindo a partir de uma crença em interesses separados? Uma vez que
acreditemos que podemos atacar outros e não atacarmos a nós mesmos, nós negamos a
própria causa da paz que defendemos. Todas as rebeliões e revoluções terminam plantando as
sementes da próxima revolta porque a causa oculta da guerra nunca é examinada: a decisão
da mente de ser separada; a crença em um sistema de pensamento de um ou outro, no qual as
pessoas têm que ser sacrificadas. A secretária da defesa afirmou, no início de uma guerra
recente, que as pessoas apenas são mortas, e é assim que é. Seu comentário reflete a noção
de que alguns são julgados como não sendo tão importantes quanto outros, e, portanto, podem
ser sacrificados pelo bem maior da paz. Esse pensamento é baseado na idéia de interesses
separados – uma hierarquia de vida -, nos quais um grupo se beneficia à custa de outro.

(9:5) Todas as estradas que conduzem para longe do que tu realmente és te conduzirão
à confusão e ao desespero.

Nós somos crianças da perfeita Unicidade, na qual é encontrada a Unicidade da Filiação.


Qualquer coisa que leve para longe do nosso Ser – em direção ao princípio de um ou outro –
tem que nos levar à confusão e desespero, futilidade e desesperança. Se Sísifo empurrar a
pedra montanha acima com ressentimento em relação aos deuses, seu ego triunfou. Se, no
entanto, ele empurrar a pedra em perfeita paz, entendendo que não está separado daqueles
que ele enganou, ou daqueles que agora o estão punindo, não haverá perda de paz nele. Tudo
depende do professor que é escolhido; na percepção dos interesses separados versus
interesses compartilhados.
O propósito da mente certa para o mundo, uma vez que nós o fizemos, é nos levar a
reconhecer que existe apenas um Filho que fez o mundo, e um Filho que vai salvá-lo. Isso
significa que todos têm que ser percebidos como o mesmo, partes da mesma Filiação. Esse
princípio prático precisa ser aplicado constantemente em nossas vidas diárias. Sempre que
ficarmos aborrecidos e sentirmos que nossa paz foi tirada de nós, podemos reconhecer que
escolhemos o professor errado e, portanto, não vemos mais a Filiação como uma. Isso torna o
resultado de confusão e desespero inevitável.

(9:6) Entretanto, Ele jamais deixou os Seus Pensamentos para que morressem, sem que
a sua Fonte estivesse para sempre neles mesmos.

Deus e Cristo permanecem fora do sonho, perfeitamente unidos. E então, nossa Fonte
não nos deixou para morrermos na ilusão. Uma vez que os sonhos não são Sua Vontade, eles
nunca aconteceram. Entretanto, dentro deles, eles parecem ser bem reais. Como eles são
governados pelo pensamento de um ou outro - nosso nascedouro-, é isso o que vivenciamos,
justificando nossa ida para a guerra tanto como indivíduos quanto como governos. Ter um
pensamento zangado, mesmo um pensamento leve de aborrecimento, é o mesmo que declarar
guerra contra um país estrangeiro, pois, não importando a intensidade da nossa resposta,
estamos acreditando que outros têm poder de tirar nossa paz de nós; uma percepção que
direciona toda raiva e ataque.

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(10:1-2) Ele não deixou os Seus Pensamentos! Ele não poderia separar-Se deles, assim
como eles não poderiam mantê-Lo de fora.

Deus não poderia nos deixar, mais do que nós poderíamos deixá-Lo. A Perfeita Unicidade
permanece perfeitamente uma. Esse é o princípio de Expiação: nada aconteceu para nos
separar da nossa Fonte; nada mudou o perfeito Amor. Portanto, não existe necessidade de nos
defendermos contra a culpa de termos efetuado uma mudança que nunca aconteceu;
conseqüentemente, não existe necessidade de um mundo.

(10:3-4) Em unidade com Ele todos vivem, e na sua unicidade Ambos se mantêm
completos. Não existe estrada que conduza para longe Dele.

Apenas em sonhos existem estradas que levam para longe de Deus e Cristo (a escada
que a separação nos levou a descer): as estradas de pecado e culpa, medo e ódio, sacrifício e
morte – todas levam ao inferno, mas apenas em sonho.

(10:5-8) Uma jornada para fora de ti não existe. Como é tolo e insano pensar que poderia
existir uma estrada com tal objetivo! Aonde poderia ela ir? E como seria possível fazer
com que tu viajasses por ela, andando por lá sem a tua própria realidade em unidade
contigo?

Como nós poderíamos caminhar em uma estrada ilusória – é por isso que Jesus nos leva
a “uma jornada sem distância” (T-8.VI.9:7) -, quando nossa realidade permanece em casa com
Deus? A montanha de Sísifo não existe; que é o motivo pelo qual ele poderia ser feliz. Sua
estrada não leva para longe de Deus, pois ele pode trazer a memória do Seu Amor com ele,
enquanto trabalha montanha acima. Todos nós trazemos essa memória conosco enquanto
vivemos nossos diversos papéis, e escolhermos nos lembrar assegura que nós os cumpramos
de forma amorosa e benigna. Qualquer que seja a forma – ajudando um membro da família,
amigo ou o mundo – isso não faz diferença, porque estaremos envolvidos apenas com o amor
em nossas mentes certas. Nossa esfera de atenção terá mudado do mundo – a fútil montanha
da nossa experiência – para o amor e paz na mente. Alcançar essa mudança é o significado do
nosso relacionamento com Jesus ou o Espírito Santo. Isso muda tudo. Não muda
necessariamente as coisas externas de nossas vidas, mas realmente muda como as
percebemos. Em outras palavras, essa mudança do corpo para a mente muda a forma como
nos sentimos interiormente. E então, vamos sorrir mais freqüentemente e nosso semblante
será sereno (LE-pI.155.1:2-3), pois teremos aceitado a paz que sempre esteve ali.

(11:1-4) Perdoa a ti mesmo a tua loucura, e esquece todas as jornadas sem sentido e
todos os objetivos sem meta. Eles não têm nenhum significado. Não podes escapar do
que tu és. Pois Deus é misericordioso e não deixou que o Seu Filho O abandonasse.

Essas sentenças podem ser lidas em dois níveis. Não podemos escapar do que o ego
nos diz, simplesmente porque não estamos aqui. No entanto, também não podemos escapar
do que somos como Cristo. Assim, conforme nós atravessamos nossas vidas sisifonianas
diárias, aprendemos a perdoar a nós mesmos por termos acreditado que éramos como Sísifo,
justificados em ficar zangados e ressentidos por causa de nossas vidas fúteis e sem
esperança, que nos mantiveram fazendo coisas irrelevantes e sem significado, não alcançando
nada. No entanto, podemos alcançar verdadeiramente tudo e ser felizes se aprendermos as
lições de Jesus. Não importa o motivo pelo qual nós acabamos na montanha, empurrando a
pedra de forma sem sentido. Tudo o que importa é que nós fazemos isso de forma diferente
agora: com Jesus e sua paz. Essa compreensão é notavelmente libertadora, pois não temos
mais que lutar contra o mundo e seus malfeitores. O perdão, assim, tira uma carga tremenda

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de nossos ombros exaustos, e nós cessamos as jornadas inúteis que levam apenas à morte.
Como lemos no texto:

A jornada à a cruz deve ser a última “jornada inútil” (T-4.in.3:1).

Assim, nossa loucura era apenas um sonho ruim, um pesadelo febril de desespero e
perda, que estava cheio da futilidade da nulidade. No entanto, ele continua sendo o sonho que
sempre foi.

(11:5) Sê grato pelo que Ele é, pois nisso está o teu escape da loucura e da morte.

A perfeita e amorosa Unicidade de Deus significa que Ele não deixou Seus Pensamentos,
e Eles não O deixaram. Nada mudou. No entanto, nossos “gritos estridentes” (LE-pI.49.4:3) -,
nossa ansiedade, depressão e auto-ódio – proclamam em voz alta: “Eu deixei Deus”. E então,
através da projeção: “Não, Ele me deixou!”. A cada vez em que fazemos beicinho ou gritamos,
levantando nosso queixo em desafio ou contra a raiva de alguém, afirmamos: “Eu existo. Eu
consegui o impossível. E você não pode me dizer que estou enganado”. No entanto, existe
uma linha maravilhosamente simples, enfurecedora para o ego, que vem depois de Jesus
descrever um aspecto do sistema do ego:

E Deus pensa de outra forma (T-23.I.2:7).

É por isso que nós odiamos Deus. Ele pensa de outra forma sobre nós, pois Sua
unicidade significa que nós não existimos. Acreditar que Ele nos deixou iria justificar nossas
vidas individuais, protegendo a crença secreta de que nós O deixamos. Nós, portanto, nos
deleitamos com Sua punição a nós através de uma vida sem significado, porque isso significa
que nós realmente pecamos. Nossa rebelião mudou Deus, o que significa que temos poder
sobre Ele, assim como Sísifo com Deus e Hades (vencendo os deuses através da esperteza,
ele os forçou a se vingarem), e então, nosso sofrimento prova que realmente nos separamos e
nosso sistema de pensamento é real. Assim, nós nutrimos problemas de autoridade – ou
desafiando as figuras de autoridade ou sucumbindo a elas. Sua presença separativa, senão
abusiva, em nossas vidas fortalece nosso argumento de que a separação e o pecado são
reais, e exigem punição. No entanto, reconhecer a insanidade dessa percepção é o que efetua
nosso escape das nossas vidas de futilidade e desesperança, que não resultam em nada.
Um truque do ego para estabelecer a “verdade” da nossa situação é nos comparar a
outros: eles fazem um trabalho maravilhoso, e veja o que eu faço. É o máximo da arrogância e
loucura pensar que o que qualquer um faz aqui significa alguma coisa. Sonhos não podem ser
significativos e o “amor não faz comparações” (T-24.II.1:2; LE-pI.195.4:2). O propósito desse
curso, portanto, é nos ajudar a despertar do sonho e retornar à realidade da Unicidade do Céu.

(11:6) Em lugar nenhum, a não ser onde Ele está, podes tu ser encontrado. Não existe
nenhum atalho que não conduza a Ele.

Deus está em nossas mentes porque a memória do Céu está lá, não no mundo de
corpos. Se a pedra rolasse pelo outro lado da montanha em vez de rolar de volta para baixo,
nada iria mudar – isso não é o Céu. Não importa o que acontece no mundo, uma vez que seus
problemas não são o problema, que está apenas na decisão da mente pelo pecado, culpa, ódio
e morte. Se nós realmente quisermos acabar com suas manifestações dolorosas, temos que
acabar com sua fonte na mente tomadora de decisões. As conseqüências amorosas da nossa
decisão da mente certa vão fluir através de nós, mas isso não é preocupação nossa. Nós não
iríamos colocar o carro na frente dos bois, o efeito antes da sua causa.

(11:7) Não existe nenhum atalho que não conduza a Ele.


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Mesmo se empurrarmos a rocha montanha acima para sempre, ela ainda vai nos levar a
Deus se trouxermos a memória do Seu Amor conosco. Nenhum caminho do mundo em e por si
mesmo vai levar até Ele. Nós transcendemos os caminhos múltiplos do mundo por levarmos
Jesus conosco conforme caminhamos. A forma do caminho não importa – aonde ele parece ir,
ou o quão fútil parece ser – se escolhermos o conteúdo de perdão como nosso guia; a
mensagem final do Um Curso em Milagres. O perdão muda tudo, não porque o externo
necessariamente mude, mas porque nossas mentes mudaram da futilidade para a felicidade,
do ego para Deus.

P: Alguma coisa no mundo influencia minha mente? Por exemplo, aprender o Curso afeta
minha mente?

R: Não. Como qualquer coisa no mundo poderia influenciar sua mente se não existe mundo? O
mundo não pode ter efeitos sobre você, uma vez que ele nunca deixou sua fonte na sua mente.
E então, o fato de você aprender o Curso é o efeito de uma decisão que sua mente tomou,
escolhendo Jesus como seu professor em vez do ego. A forma que essa escolha tomou foi
você estudar o Um Curso em Milagres. Portanto, nada que você faça como uma pessoa
aparente significa coisa alguma de maneira nenhuma. Afinal, uma marionete pode mudar o
titereiro? O títere ou marionete é meramente uma peça de madeira sem vida, pintada e vestida
com roupas, com cordões presos a ela. Lembre-se dessa linha em “As leis do caos”:

Podes pintar lábios cor-de-rosa em um esqueleto, vesti-lo com o que é belo, agradá-
lo e mimá-lo e fazê-lo viver? (T-23.II.18:8).

Qualquer coisa que o titereiro queira que a marionete faça, ela fará. A menos que você
esteja vivendo no Crepúsculo, a marionete não tem efeito sobre o titereiro. No entanto, o que
realmente afeta a marionete é o titereiro. Não existe ninguém mais. Se você estiver em um
cinema, e em um estado insano, for até a tela e enfiar uma faca através dela, não terá efeito
sobre o filme que estava passando através do projetor. No entanto, se você for até a cabine do
projetor e enfiar uma faca no filme, definitivamente verá uma mudança na tela. É a mesma
coisa com a mente e corpo. O que torna essa idéia difícil de aceitar é que nossa experiência
nos diz que nós – as pessoas que pensamos ser – estamos estudando o Um Curso em
Milagres. Nós sabemos que realmente fizemos progresso com esse curso quando começamos
a experienciar o fato de que Jesus não está se dirigindo ao ser que acreditamos que somos,
mas à mente tomadora de decisões que escolheu expressar-se na forma que chamamos de
nós mesmos, com a qual nos identificamos tão fortemente.
Mais uma vez, é difícil não pensar que Jesus está falando conosco nesse livro. É
interessante ver como respondemos a essas passagens – e existem muitas – que dizem que
nossos olhos não vêem e nossos cérebros não pensam. Afinal, nossa experiência certamente
é a de que nossos olhos estão lendo as palavras que nos dizem que não estamos vendo, e
nossos cérebros estão pensando nas próprias palavras que dizem que eles não podem pensar.
Isso é um maravilhoso koan Zen, pois estabelece um paradoxo lógico que não podemos
transcender, exceto por nos tornamos ilógicos; i.e., voltando à mente pré-lógica que escolheu
ser um corpo, governado por um cérebro lógico que pensamos que pode pensar. Um Curso em
Milagres, então, no ajuda a romper nossa identificação com o ser egóico para que possamos
retornar à mente tomadora de decisões, olharmos para o sistema de pensamento de
separação e especialismo da mente errada do ego, e escolhermos de outra forma. Nós
começamos entendendo isso intelectualmente e, com o tempo, somos cada vez mais capazes
de dar um passo atrás – como uma mente –, e observarmos a nós mesmos escolhendo ficar
transtornados ou doentes. Aquelas experiências nos permitem lembrar de rir diante da tolice da
diminuta e louca idéia da separação como é expressa em nossas vidas. E, portanto, como
nosso amigo Sísifo, podemos nos tornar realmente felizes.
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Encerramento

Termino com um adorável poema de Helen, que reflete o tema do nosso livro. Ele é
chamado de “Transformação”, transcrito por Helen depois de uma experiência como está
descrito no próprio poema1. Seu tema da Páscoa é visto nas linhas finais do poema: “Ao lado
da tumba/ os anjos ficam parados, em brilhante esperança/ para darem a mensagem da
salvação: “Liberte-se,/ E não fique mais aqui. Vá para Galiléia”. Esse símbolo de ressurreição
ou renascimento é a resposta à “Stabat Mater” – a desolação de ficar parado aos pés da cruz.
Segurando a mão amorosa de Jesus, nós vamos além da cruz até a ressurreição, despertando
finalmente do sonho de desespero e morte. Essa transformação, mais uma vez, não tem nada
a ver com qualquer coisa externa, mas com nossa mudança interna, que nos permite perceber
o mundo através dos olhos repletos de luz da visão santa de Cristo, nossa jornada da futilidade
para a felicidade está completa, e nós estamos finalmente em casa.
Aqui agora está o poema de Helen (As dádivas de Deus, p. 64):

Transformação

Aconteceu subitamente. Existe uma Voz


Que fala um Verbo, e tudo se modifica.

Você entende uma parábola antiga


Que parecia estar obscura. E, no entanto, significou
Exatamente o que disse. O trivial
Se amplia em magnitude, enquanto o que parecia grande
Reassume a pequenez que lhe é devida.
O sombrio se torna iluminado, e o que antes era brilhante
Se esmaece e desvanece e finalmente se vai.
Todas as coisas assumem o papel que foi designado
Antes do tempo ser, em antiga harmonia
Que canta sobre o Céu em tons impulsionantes
Que arrancam a dúvida e cuidado
Que todos os outros papéis convocam. Pois certamente
Têm que ser de Deus.
Acontece subitamente,
E todas as coisas mudam. O ritmo do mundo
Muda para um concerto. O que era áspero antes
E parecia falar de morte, agora canta sobre a vida,
E une o coro até a eternidade.
Os olhos que eram cegos começam a ver, e ouvidos
Há muito tempo surdos à melodia, começam a ouvir.
Na súbita quietude, renasce
A música antiga da canção da criação,
Há muito tempo silenciada, mas agora relembrada. Ao lado da tumba,
Os anjos permanecem em brilhante esperança
1
Para uma história completa do poema, por favor, veja meu livro Ausência de Felicidade: A história de Helen
Schucman e sua transcrição do “Um Curso em Milagres”, p. 392-393.
58
Para dar a mensagem da salvação: “Liberte-se,
E não fique mais aqui. Vá para a Galiléia”.

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