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Ceumar Violonista e cantora fala sobre a carreira e a volta ao Brasil

VIOLAO
Badi
Ano 1 - Número 4 - Dezembro 2015
www.violaomais.com.br

Assad
Movida pela curiosidade

E mais: Exclu
Curso sivo!
Raissa Amaral: violão e canto lírico de vio
popu lão
A “Alzapúa” no flamenco com v lar
“Luar do Sertão” na viola caipira ídeoa
ulas
O encontro de Wagner e Villa-Lobos
Os detalhes da guitarra portuguesa

TESTE Yamaha C40MII Instrumento ideal para iniciantes


editorial
Edição de Natal
Olá, leitor de VIOLÃO+! É com prazer que anunciamos a chegada do número 4 de nossa
revista, desejando a todos, desde já, um ótimo 2016. Mas como 2015 ainda não acabou,
vamos encerrá-lo com chave de ouro? Nossa matéria de capa traz ninguém menos que
Badi Assad, violonista, cantora, percussionista, compositora, arranjadora... Não dá mesmo
para definir Badi. Em entrevista muito agradável e franca, ela fala sobre carreira, influência
da família, violão erudito, tudo ao mesmo tempo agora, problemas (sim, todos temos, ela
também, e não foram poucos!), sempre com uma palavra que, se não a define, a move: a
curiosidade. Também temos a honra de trazer às nossas páginas a cantora, compositora
e violonista mineira Ceumar: voz perfeita, violão muito bem tocado, repertório muito
bem escolhido, a experiência de anos fora do Brasil para voltar agora. Ela conta como
conseguiu tudo isso e o que está por vir. Badi e Ceumar mostram a preocupação com um
mundo melhor, não da boca para fora, mas com ativismo mesmo. São figuras presentes
nas causas de preservação do meio ambiente e respeito aos seres vivos. Muito legal
essa coincidência! Nossas colunas vêm cada vez melhores! O pessoal está caprichando!
Confira a seção Mundo, que traz a guitarra portuguesa ao nosso convívio. Na seção Onde
o meu violão toca, acompanhe a entrevista
com a jovem piracicabana Raíssa Amaral.
Violonista e cantora lírica, combinação rara,
ela cuida de um arquivo imenso de vídeos
que exibem apresentações de violonistas.
E Tom Jobim recebe a nossa homenagem
na seção Coda, sob uma ótica pouco
explorada. Ah, testamos um violão que é
ótimo para quem está começando a tocar
e para quem deseja um bom instrumento
sem gastar muito. Que a revista esteja
tão boa quanto você espera! Trabalhamos
muito para isso. E que venha 2016!

Luis Stelzer
Editor-técnico

VIOLAO Ano 1 - N° 04 - Dezembro 2015


+
Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus
autores. É permitida a reprodução dos conteúdos publicados aqui
Editor-técnico
Luis Stelzer
editor@violaomais.com.br

Colaboraram nesta edição


Breno Chaves, Cleber Assumpção, Fabio Miranda,
Flavio Rodrigues, Luisa Fernanda Hinojosa Streber,
Reinaldo Garrido Russo, Ricardo Luccas, Rosimary Parra,
desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado Valéria Diniz e Walter Nery
para nossos arquivos. A revista não se responsabiliza pelo conteúdo
dos anúncios publicados.
índice

4 18 37
Você na V+ Em mãos Classificados
6
Onde meu 20 38
violão toca Badi Assad Sete cordas

52
Viola caipira

54
Iniciantes

30 42 59
Mundo Flamenco Academia
44
34 Como 64
História estudar Coda

10 47
Retrato De ouvido

16 50
Vitrine Siderurgia

Publisher e jornalista responsável Foto de capa


Nilton Corazza (MTb 43.958) Alfredo Nagib Filho
publisher@violaomais.com.br
Publicidade/anúncios
Gerente Financeiro comercial@violaomais.com.br
Regina Sobral
financeiro@violaomais.com.br Contato
contato@violaomais.com.br Rua Nossa Senhora da Saúde, 287/34
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Sergio Coletti Sugestões de pauta CEP 04159-000
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você na violão+
Yamandu Costa
Fenômeno violonista do nosso país,
Yamandu. (Mariajose Vitor, em nossa
página no Facebook)

A revista está muito boa! Parabéns! (Inty


Oliveira Almeida, em nossa página no
Facebook)

Flamenco
Incrível, queria muito aprender essa
técnica, muito bem explicado! (Jose
Leandro Alves Santana, em nosso canal
no Youtube)

Violão+
Parabéns pela iniciativa! Excelente
trabalho! Muito obrigado! Vida longa a
Violão+! (Thiago Mariachi, em nossa
página no Facebook)

Mostre todo seu talento!


Os violonistas do Brasil têm espaço garantido em nossa revista.
Como participar:
1. Grave um vídeo de sua performance.
2. Faça o upload desse vídeo para um canal no Youtube ou para um servidor de
transferência de arquivos como Sendspace.com, WeTransfer.com ou WeSend.pt.
3. Envie o link, acompanhado de release e foto para o endereço editor@violaomais.com.br
4. A cada edição, escolheremos um artista para figurar nas páginas de Violão+, com
direito a entrevista e publicação de release e contato.

Violão+ quer conhecer melhor você, saber sua


opinião e manter comunicação constante, trocando
experiências e informações. E suas mensagens
podem ser publicadas aqui! Para isso, acesse,
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preferir, envie críticas, comentários e sugestões para o e-mail contato@violaomais.com.br

4 • VIOLÃO+
você na violão+

Jony Ken
por causa de arranjos lançados em seu
canal no YouTube como “Lugar ao Sol”
(CBJR) e “Here Comes the Sun” (The
Beatles). A exclusividade apresentada
e o fingerstyle em seus arranjos e em sua forma de
tocar proporciona não apenas fãs e
Graduado em Violão Erudito pela ULM seguidores, mas, também um grande
Tom Jobim e bacharel em Guitarra número de interessados em aprender e
pela Faculdade Santa Marcelina, desenvolver essa linguagem, levando
Jony Ken é um dos pioneiros do estilo Ken a inaugurar, juntamente com o
“fingerstyle” no Brasil. Ken apresenta violonista Jonathas Ferreira, o Espaço
trabalho de músicas autorais e Fingerstyle, primeiro local no Brasil
releituras de canções, explorando o dedicado exclusivamente ao ensino
instrumento de maneira exótica, seja do estilo. Entre seus mais recentes
criando novas sonoridades, utilizando trabalhos, destacam-se a participação
o corpo do violão como instrumento no Primeiro Encontro Nacional de
de percussão, ou deitando-o no colo Fingerstyle e o show de abertura a
e usando afinações alternativas. Tudo convite do violonista e cantor inglês Jon
isso a serviço da boa música. O músico Gomm, referência mundial no estilo,
vem ganhando destaque no cenário que esteve no Brasil em abril de 2014.
VIOLÃO+ • 5
onde meu violão toca Por Luis Stelzer

Vários talentos
Raíssa Amaral, além de todas as atividades como musicista, mantém
um canal no Youtube que é referência em pesquisa

A jovem piracicabana Raíssa Amaral chama Durante a infância, quando eu tinha


atenção pela quantidade de coisas que faz.
seis anos, comecei a aprender como
É violonista e cantora lírica, o que não é
acompanhar no violão para poder cantar.
comum no meio musical. Também é dona Aos 14 anos, iniciei meus estudos de violão
de um canal do Youtube, chamado Arquivo clássico com o professor Sergio Napoleão
Raíssa Amaral, que tem proporcionado a Belluco, que me ensinou teoria, leitura
todos acesso a vários vídeos que, não fosse
musical, técnica, história e repertório. Foi
pela sua paciência e dedicação, talvez até
uma época maravilhosa. Tudo aquilo me
estivessem perdidos. Batemos um papo fascinou. Durante os anos de estudo com
com essa musicista de vários talentos. ele, como método principal, estudamos os
álbuns La Escuela de la Guitarra, do Mario
VIOLÃO+: Você é muito jovem, mas vem Rodriguez Arenas. Também havia outros
se destacando entre os violonistas e os métodos e músicas e sempre precisava
cantores líricos. Como tudo começou? levar as lições decoradas. Foi aos 15 anos
Quem veio primeiro, o violão ou o canto? que comecei canto lírico na Escola de
Desde quando faz canto lírico? Música de Piracicaba Maestro Ernst Mahle
(EMPEM). Lá conheci o maestro Ernst
Mahle e Cidinha Mahle, que praticamente
me adotaram musicalmente, ensinando
tudo o que eu não sabia sobre música
erudita. Foi assim que comecei a cantar
para ele em suas apresentações e em seu
coro. Eu me via dividida entre o violão, que
não faz parte da formação usual de uma
orquestra, e o canto erudito. Cidinha Mahle
me incentivava para estudar canto, e o
Belluco dizia para dedicar-me ao violão.
Em 2010, comecei a fazer Licenciatura
em Música na Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp) e, ao mesmo
tempo, fazia aulas de canto em São Paulo.
Em 2011 prestei a prova de modalidade
combinada na Unicamp para poder iniciar
o curso de Violão Popular com o professor
6 • VIOLÃO+
onde meu violão toca
Ulisses Rocha. Diz ele que fui a primeira
mulher, e ainda única, no seu curso de
violão popular. Com ele aprendi novos
meios de interpretação, improvisação,
repertório contemporâneo e um pouco
sobre a realidade do mercado violonístico
atual. É um grande amigo e professor. Em
2012, após uma prova, transferi o curso
de Licenciatura para Canto Erudito na
Unicamp. E me formei em Violão Popular
em 2014. Com o diploma em mãos, decidi
prestar o mestrado na Unicamp. Comecei
em 2015 e ao final deste ano me formo em
Canto Erudito.

VIOLÃO+: Você é uma violonista de


formação clássica, cantora lírica, que
toca violão popular, que canta música
popular, que lida com arquivos de vídeos
de violão e de música. Como arranja
tempo para isso tudo?
Me dedico até onde consigo. Nos primeiros arquivo, pois dispunha de vasto material.
anos da faculdade, com as viagens diárias Foi então que tornei públicos os vídeos que
de ônibus de Piracicaba a Campinas, foi havia postado no Youtube para as pessoas
cansativo. As aulas muitas vezes não eram conhecerem. Hoje, com a correria do dia
sequenciais. Às vezes, perdia-se muito a dia, não estou conseguindo postar mais
tempo. Gastava muito tempo indo até lá vídeos, mas tenho inúmeros arquivos que
para ter apenas uma aula durante o dia gostaria de tornar públicos.
todo. O que me mantinha animada eram os
trabalhos que realizava com o maestro Mahle VIOLÃO+: De onde vem esse acervo
em minha cidade e as aulas de violão com todo? Você tem colaboradores ou faz
o Belluco. Preocupando-me com o tempo tudo sozinha?
vago e com o futuro, comecei a organizar Dos arquivos, muitos são de VHS, que tinha
arquivos de que gostava e que possuem em casa. Alguns são registros do Belluco
grande importância musical sobre violão, sobre as apresentações de seus conjuntos,
choro, intérpretes antigos, compositores. outros as pessoas me enviaram, e outros,
Muitos desconhecem a importância deles filmei. Colaboradores para esse trabalho
nos dias de hoje, e muito se perdeu não tenho, mas na carreira musical tenho
sobre a história dos instrumentistas, das apoio de pessoas queridas que sempre
orquestras. Quando comecei a juntar os me incentivam. Minha família sempre está
vídeos, minha intenção era antecipar algum do meu lado. Quando comecei a estudar
projeto para o futuro. Selecionei um grande violão clássico, estudava em um Tonante
VIOLÃO+ • 7
onde meu violão toca

“O Rei dos Violões” da década de 1970, da aulas de canto com o professor Angelo
minha mãe, considerado um instrumento Fernandes, na Unicamp, meu orientador
rudimentar, o mais simples que era de mestrado também. Ele é a pessoa
fabricado. Ao colocar meus vídeos tocando responsável pela minha evolução como
no Youtube, conheci o dr. Carlos Henrique cantora lírica, um exemplo de professor,
de Andrada Gomide, do Rio de Janeiro. Sem dedicando-se totalmente àquilo que faz.
nunca ter me conhecido pessoalmente, ele Devo muito a ele por toda ajuda, amparo
me presenteou com um violão de luthier, e ensinamento. Com ele, aprendemos
do Antônio de Pádua. Todo personalizado, a sonhar. São muitas as pessoas que
topo de linha do instrumento, pelo qual gostam, mandam mensagens e ajudam
fiquei apaixonada. Tenho grande carinho a divulgar o meu trabalho. São meus
por ele. Me motivou a estudar e aprender grandes incentivadores. Nada fazemos
muito mais. Ele sempre me manda arquivos sozinhos. É um conjunto de coisas.
com as novidades musicais do Rio de
Janeiro. Dona Cidinha Mahle também VIOLÃO+: E a carreira internacional?
sempre me apoiou. Preocupada com Gostaria que o Brasil pudesse oferecer
minha instrução, me convidou para ir à as mesmas oportunidades que os
sua casa, aprender piano e solfejo, sem músicos recebem em outros países, mais
me cobrar nada. Em 2013, comecei a ter desenvolvidos e que dão maior valor
8 • VIOLÃO+
onde meu violão toca
à cultura. Nesses anos, por conviver músicos, isso tudo torna a concorrência
entre o erudito e o popular, acabamos menor. O instrumentista, depois de fixado
percebendo que os violonistas possuem em uma orquestra, ganha estabilidade
poucas oportunidades em comparação a financeira. Muitos podem discordar, mas
outros instrumentos. Temos, atualmente, o violão é um instrumento completo, com
uma grande e nova geração de violonistas inúmeras possibilidades harmônicas e
eruditos, mas o mercado é bem reduzido melódicas. Exige muito estudo e é tão
e para se destacar é necessário ter algum mais complexo quanto outros, mas pouco
diferencial. Na arte não deveria existir valorizado. No canto erudito, sempre
concorrência. Todos fazem por amor e tenho convites e apresentações, é o meu
têm algo a mostrar. Uma grande maioria caminho por enquanto. A concorrência
de violonistas populares que são bons é grande também. O cantor atua como
acaba tocando em qualquer lugar, para se convidado, não é como o instrumentista
sustentar. Conheço muitos em condições estável de uma orquestra. No exterior. há
de vida difíceis. Os músicos de orquestra mais possibilidades de emprego, mesmo
acabam tendo mais garantias em com a ópera tendo crescido no Brasil nos
comparação aos violonistas. Existem várias últimos tempos. Se um dia aparecer uma
orquestras e dentro delas, nos naipes de boa oportunidade, melhor do que aqui,
instrumentos, formados por um grupo de eu irei.

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VIOLÃO+ • 9
RETRATO Por Luis Stelzer

Ceumar

10 • VIOLÃO+
RETRATO

Violão
e voz

“Sob o céu sobre o mar. Sobre um jeito muito


próprio de cantar. Silencia. E daí parte-se; em
meio ou inteiramente fora do lugar. Silencia.
Entre dois continentes e o contingente de
culturas aglomeradas. Das poucas ou muitas
casas aos aeroportos, trens e caminhadas.
Silencia. Um dedo de moça. Um tempero,
no prato requintado da mais fina flor do sal
e do melado. Silencia. Enquanto paisagens
passam, enquanto as estações morrem e
nascem”. (Gero Camilo, 2014)

VIOLÃO+ • 11
RETRATO

Ceumar e seu parceiro: o violão

Nascida em Itanhandu - na região e meio ambiente. A seguir, o resultado


da Serra da Mantiqueira, no sul de dessa conversa.
Minas Gerais - de uma família ligada à
música, aos 18 anos Ceumar foi para Violão+: Você nunca larga o violão, ou
Belo Horizonte estudar violão clássico raramente faz isso. Como começou
e canto na Fundação de Educação essa paixão?
Artística. Em 1995, transferiu-se para Começou aos quinze anos. Eu estudava e
São Paulo, onde permaneceu por 14 tocava piano, como as minhas irmãs, mas
anos. Lançou seus trabalhos, consolidou achava difícil. Meu pai tinha um violão em
sua carreira, mudou-se para a Holanda, casa. Pedi a ele uns primeiros acordes e
ficou seis anos por lá. E está voltando. passei um mês tocando “Marcha Soldado”.
Violão+ teve o prazer de entrevistar O violão é realmente um parceiro!
Ceumar, cantora de voz firme e doce,
ótima violonista, compositora sensível, Violão+: Você estudou violão clássico
pessoa preocupada com justiça social e isso sempre fica claro em seus
12 • VIOLÃO+
RETRATO
diversos shows. O que vê de bom na letra de Alice Ruiz, grande poeta de
técnica do violão clássico? Em que Curitiba. A música “Avesso” foi gravada
ela a ajuda? no meu segundo álbum. Fiz também
Fui para uma escola superbacana uma melodia para “Boca da Noite”, com
em Belo Horizonte, a Fundação de letra de Chico César e Tata Fernandes,
Educação Artística, logo que cheguei para esse mesmo disco. Daí, não
por lá para fazer cursinho, aos 17 anos. parei mais. Admiro muita gente. Seria
Podia optar por instrumento ou canto. difícil enumerar. O que aprecio em
Preferi violão, já que cantar me parecia uma música é o poder de síntese entre
mais fácil. O clássico passava por Leo palavra e som. Gosto de melodias fáceis
Brouwer, estudos de Villa-Lobos... A e acordes sonoros, mas fáceis de tocar.
técnica do meu professor foi criada e A canção popular é muito rica e aponta
desenvolvida por ele, muito inspirado para vários caminhos, mas acho que o
em Turíbio Santos, e acredito ter sido meu é o da simplicidade.
fundamental para que eu pudesse tocar
com desenvoltura para me acompanhar Violão+: Você também estudou canto.
cantando, mais tarde. Seu nome é Sua técnica é considerada perfeita por
Theodomiro Goulart. muitos. Muita gente diz que estudar
canto pode tirar a originalidade do
Violão+: Para chegar ao primeiro CD, intérprete. Qual sua opinião, já que
como foi a batalha? Qual o caminho sua voz e sua interpretação são
trilhado até aí? elogiadas pela crítica especializada
Ah... foram muitos anos. Só cheguei ao e pelo público?
CD aos 30. Já tinha filho e tudo! Cantei Intrigante essa colocação! Nunca me
muito em bares, festas, casamentos, imaginei uma cantora perfeita no sentido
festivais, e fazia alguns shows mais da técnica. Fiz aulas de canto lírico, e foi
profissionais. O primeiro CD, Dindinha, um bom caminho para conhecer minhas
de 1999, chegou porque tive o grande possibilidades. Mas o grande encontro
incentivo de dois amigos: Zeca Baleiro foi com o método O Desvendar da Voz,
e Tata Fernandes. Eles produziram e da sueca Valborg Werbeck-Svardstrom.
investiram mesmo, junto comigo.

Violão+: E seu trabalho como


compositora, quando começou? É
possível sentir uma grande liberdade
em suas composições, sempre
contando com referências ótimas. Quais
seus compositores preferidos e as
características deles que mais admira?
Faço músicas desde os 16 anos, mas
eram melodias tímidas. A primeira
parceria que me deu segurança foi com Depois de 6 anos, a volta ao Brasil

VIOLÃO+ • 13
RETRATO

Em shows, síntese de palavra e som


Estudei na ULM (Universidade Livre de soube amalgamar tudo em sons
Música de São Paulo) e minha mestra, universais, refletindo essa fase minha
Consiglia Latorre, aplicava seus fora do meu país. O texto tem muita
ensinamentos no canto. Gosto do canto importância, sempre. O que vou dizer,
natural, sem vibratos. Esses estudos e se aquilo poderá ser dito e sentido
foram perfeitos pra mim. por outras pessoas. Reflete sempre um
estado coletivo, acho. Algo que paira
Violão+: Como você escolhe seu no inconsciente de todos e que chega
repertório? Quais critérios você usa através das canções.
para montar um CD ou um show?
Geralmente, as canções chegam junto Violão+: Você está há alguns anos
com um momento de vida. No Dindinha, morando na Holanda. O seu trabalho
por exemplo, eu tinha acabado de já era conhecido por lá? Como foi
ter meu filho e, no disco, vejo muitas a receptividade dos holandeses em
figuras femininas. Algo maternal relação a ele?
envolve a textura sonora. Já no mais Passei seis anos na Holanda e agora
recente CD, Silencia, apesar de ser um estou voltando para o Brasil. Tive
disco bastante brasileiro, o produtor experiências ótimas e enriquecedoras.
(o violoncelista francês Vincent Ségal) Não era conhecida lá, mas fui fazendo
14 • VIOLÃO+
RETRATO
um público bom, entre brasileiros e som. Às vezes, fica difícil escolher entre
holandeses. Mas nunca deixei de vir ao tantos caminhos. Mas o meu acaba
Brasil, ao menos duas vezes por ano. sendo sempre o que bate no coração.
Isso me manteve ligada à cena musical Meu projeto agora é difundir minha
brasileira, de certa forma. música pelo Brasil, em locais onde nunca
estive, e participar de eventos que unam
Violão+: Você gosta de lançar novos música e meio ambiente.
talentos e misturar com obras suas
e de outros compositores mais Violão+: E os instrumentos? Quais
conhecidos, mas não tanto com violões você usa nos shows?
regravações. Como estão os novos Há períodos em que toco mais o violão de
trabalhos? Quais os novos projetos? aço, um Martin, com cordas de Phosphor
Tento ficar atenta a novos compositores Bronze, pois sou alérgica ao aço. Meu
que tenham algo em comum com meu nylon é um Prudencio Saez, espanhol.

Ceumar
VIOLÃO+ • 15
VITRINE

CD-140 SCE CUTAWAY


O violão Romeo, da linha profissional da Di Giorgio, é produzido
em Indian Rosewood com tampo em Spruce canadense maciço,
escala em ébano da índia 3 19 trastes em alpaca. A escala
é de 64 cm, com tensor bilateral, e a pestana de 51,5 mm. O
acabamento traz tarraxas personalizadas, e cor natural com
verniz brilhante. Acompanha case de luxo.

Di Giorgio
www.digiorgio.com.br

CD-140 SCE CUTAWAY


O violão eletroacústico Fender CD-140SCE Dreadnought
cutaway, de cordas de aço, traz tampo em Mahogany
maciço (com acabamento brilhante), e fundo e faixas
laterais em Mahogany laminado. O modelo traz ponte
e escala com 20 trastes em Rosewood e craço “C”
shape em Mahogany. A captação é ativa Fishman Isys
III, com controles de volume, grave, médio e agudo,
além de afinador embutido e luz indicadora de carga
de bateria. Tensor “dual-action” e tarraxas Die-Cast
cromadas, assim como todo o hardware, completam
as características.

Pride Music
www.fender.com.br
16 • VIOLÃO+
VITRINE

EMA 663 NT
O violão eletro-acústico EMA 663 NT, da Eagle, tem tampo em
Cedro Maciço (Solid Red Cedar), laterais e fundo em Mogno
(Mahogany) e acabamento acetinado. A roseta é em Abalone
e o braço em Mogno Oriental (Nato). Escala e cavalete são
em Jacarandá (Rosewood). Os 20 trastes em alpaca e cordas
D´Addario fazem conjunto com as tarraxas die-cast cromadas
e o sistema de captação TruVibe com equalizador Promix.

Eagle Instrumentos Musicais


www.eagle.com.br

TU-10
O afinador de contato BOSS TU-10 apresenta design arrojado, construção robusta
e funções derivadas de outros afinadores BOSS, como Accu-Pitch, ‘Flat-Tuning’ de
cinco semitons e modo STREAM. A tela de LCD “True Color’ proporciona
experiência visual clara e multicolorida, com função antirreflexo
que melhora a visibilidade em locais com muita luz. Com
faixa de afinação de Dó-0 (16,35 Hz) a Dó-8 (4.186
Hz), com referência de afinação Lá-4 de 436 a 445
Hz, o TU-10 pesa apenas 45 gramas e funciona
continuamente por até 12 horas no modo colorido
ou 24 horas no modo monocromático.

Roland do Brasil
www.roland.com.br
VIOLÃO+ • 17
EM MÃOS Por Luis Stelzer

Ótimo para iniciar


Testamos um dos violões mais vendidos do País, o
popular Yamaha C40MII

Geralmente, os instrumentos apresen- pena. Seu acabamento é bonito.


tados em nossas páginas são cedidos Com verniz sem brilho, a primeira
pelos fabricantes e importadores, con- impressão leva à sensação de madeira
fiantes em seus produtos e cientes de crua. Mas o verniz está lá, protegendo
que nossas avaliações são idôneas, o instrumento. Tampo, laterais e fundo
levando em conta a faixa de preço em não são de madeira maciça, mas
que cada equipamento se situa e a que funcionam bem. O ajuste das cordas, às
público se destina. Desta vez, no en- vezes, vem um pouco alto, obrigando
tanto, testamos, de maneira sigilosa, o músico a levá-lo para regulagem,
um dos violões mais vendidos do País. o que algumas lojas oferecem. Esse
processo é aconselhado mesmo tiver
Modelo algum custo, pois é sempre melhor
O violão acústico Yamaha C40MII é tocar um instrumento bem regulado.
um ótimo instrumento para quem está Uma sugestão é, durante a regulagem,
iniciando. Com a subida do dólar, o pedir para trocar a pestana e o rastilho
preço de mercado pode parecer um por peças de osso. Os que vêm de
pouco alto, mas, ainda assim, vale a fábrica são de plástico bem firme,

Características
Comprimento de escala 650 mm (25 9/16”)
Comprimento do corpo 490 mm (19 5/16”)
Largura do corpo 370 mm (14 9/16”)
Profundidade do corpo 94-100 mm (3 11/16”)
Largura da pestana 52 mm (2 1/16”)
Tampo Spruce
Fundo Meranti
Lateral Meranti
Braço Nato
Escala Rosewood
Cavalete Rosewood
Acabamento (verniz) Matt

18 • VIOLÃO+
EM MÃOS
melhor do que a maioria dos instrumentos do mercado,
mas, se é possível aprimorar o instrumento, por que
não? E a melhora é grande, garantimos!
O Yamaha C40MII é um instrumento feito para usar
cordas de nylon, portanto nunca modifique isso. Se
cordas de aço foram colocadas em instrumentos
feitos para o uso de cordas de nylon, eles tendem a
empenar, pois a tensão é muito maior. Bem confortável,
o braço do C40MII não possui o tensor metálico de
regulagem, comum em muitos instrumentos. Embora
o tensor possa garantir fortalecimento ao braço do
violão, para que nunca empene, e certa regulagem
de altura das cordas, violões de nylon sem tensor
são preferívies. Por quê? O tensor diminui a vibração
geral do instrumento e aumenta seu peso.

Conclusão
A marca, tradicionalíssima, não pode se dar ao luxo de
colocar no mercado um instrumento que não funcione,
que não seja bom. E o violão responde, mostra a
que veio. Encontramos um ótimo instrumento
para quem está começando: design moderno,
dimensões muito boas, fácil de tocar. Não
possui a mesma qualidade de um violão de
concerto, nem a mesma projeção. Mas não
foi feito para isso: o Yamaha C40MII é um
instrumento recomendado, em especial,
para iniciantes.

Yamaha C-40MII
Importador: Yamaha Musical do Brasil
Preço sugerido: R$ 850,00
Aparência
Acabamento
Tocabilidade
Braço/escala
Sonoridade
Afinação
Captação Não possui
VIOLÃO+ • 19
matéria de capa

Badi Assad nasceu Mariângela, em


São João da Boa Vista, interior de
São Paulo. Mudou-se para o Rio
de Janeiro e voltou. A música e o
violão são questões, antes de tudo,
familiares. Depois que os irmãos mais
velhos estavam alçando voo em duo,
ela finalmente foi ao instrumento. Já
tinha 14 anos. De lá para cá, ganhou o
mundo: uma carreira se construiu, com
o violão, com a voz, com a percussão,
com a musicalidade familiar e também
longe da família. É uma biografia
e tanto! Mas, deixemos ela mesma
contar...

Movida pela
Por Luis Stelzer

© Fritz Nagib

curiosidade
badi assad
Violão+: Estou emocionado, pois sou tecladinho de piano desenhado numa
muito fã seu. página, imaginava que era um piano de
Pegue lá um copo d’água! (risos). verdade e ficava tocando. Ela me colocou
para tocar piano quando eu tinha oito
Violão+: Como começou, que influência anos, mas a gente também não tinha
recebeu da família? É verdade que dinheiro para comprar um instrumento.
demorou a se decidir pelo violão? Daí, não vingou. A pianista da família só
Tive esse privilégio de nascer numa foi vingar na outra geração, a filha do
família onde a música já era parte de um Sérgio (Assad) é pianista (Clarice Assad).
cotidiano, não somente a música, mas, Só fui pegar num instrumento mesmo
principalmente, o violão. Quando nasci, quando me ausentei da presença dos
meus irmãos já tocavam, e sempre, a vida meus irmãos, porque meu pai ficou sem
inteira, existia um violão no sofá da sala, ter com quem tocar o seu bandolim.
vinha gente tocar com meus irmãos. Meu Nessa época, eu tinha 14 anos, a gente
pai gostava de choro, minha mãe cantava saiu do Rio de Janeiro e voltou a morar
pra mim. A música fazia parte da minha no interior de São Paulo, em São João
realidade. Minha mãe, quando pequena, da Boa Vista, minha cidade natal. Foi
queria ter estudado música, mas era em São João que meu pai virou pra
de uma família sem poder aquisitivo. mim e disse: “filha, não quer aprender
Então, ela arrancou de uma revista um esse trem, não?”. Eu falei: “quero!”. Eu

22 • VIOLÃO+
badi assad
queria muito ficar próxima do meu pai.

© Fritz Nagib
Ele estava sempre tão ocupado com
meus irmãos [Sérgio e Odair Assad, o
Duo Assad], que não me dava muita
bola. Quando fez o convite, meu coração
rapidinho escolheu, até para ficar mais
do lado dele. Eu conquistei meu pai
pela música.

Violão+: Ser irmã de Sérgio e Odair é


muito legal. Mas traz também um certo
“peso” para seguir na carreira?
Nunca foi um peso. Sempre foi algo
que me impulsionou. O meu primeiro
público foi o deles. Eles sempre abriram
portas pra mim. Eu peguei o tapete
mágico e fui... Foi bem leve, até porque
nunca fiz exatamente o que eles fazem,
pelo contrário, é bem diferente. Não
sobra margem pra ficar comparando.
Felizmente, construí um trabalho autoral
de qualidade, muito bem aceito pelas
pessoas que estão interessadas em
algo que tenha conteúdo. Foi assim que
construí a minha carreira. Só tenho a
agradecer aos meus irmãos, e que eles Durante a vida inteira, tive fases com
continuem jogando o tapete vermelho curiosidades bem distintas. Comecei
pra mim! (risos) como violonista erudita. Fui percebendo
que a música erudita não era a minha
Violão+: Você apareceu para o mundo história, mas eu ainda estava dentro do
violonístico ganhando concursos de universo da música instrumental. Aos
violão solo e também em formações poucos, fui descobrindo que eu tinha
de duo, como o Duo Romântico. Aos uma voz, que começou timidamente. No
poucos, foi aparecendo no seu trabalho princípio, a voz entrou como mais um
uma veia popular muito forte, uso da voz, instrumento do que cantando canções.
percussão corporal, repertório autoral. Nesse processo, fui desenvolver a
De onde vem tudo isso? potencialidade vocal. Escutei muita
É muita coisa... A resposta vem da música étnica, do mundo todo, fiz
semente que trago de curiosidade, um cursos. O Barbatuques começava a se
pouco “Forrest Gump” (risos). Que pega formar naquela época, e a gente fazia
uma ideia e elabora, elabora... Daqui a experiências juntos de percussão com
pouco já estou curiosa por outra coisa. voz. Teve outra fase em que fiquei
VIOLÃO+ • 23
badi assad

© Fritz Nagib
interessada por percussão mesmo, fui 1994. Foi essa música, misturando isso
estudar com o Zé Eduardo Nazário e tudo, que me levou para o mundo. E
desenvolvi uma liberdade com polirritmia comecei a conquistar meu próprio espaço
muito forte. Quando senti que poderia depois. O tempo foi passando, passei
tocar um instrumento de percussão em por uma fase experimental, comecei a
cada mão com diferentes ritmos, falei descobrir o lado compositora, escrever
“por que não misturar isso com o violão?” muitas músicas e desenvolver um
Comecei a tocar violão com uma mão e, trabalho de intérprete dessas canções.
com a outra, o caxixi ou outra percussão. Virei uma intérprete do cancioneiro
Descobri que poderia pensar música do mundo, fazendo releituras para o
como uma baterista, só que, em vez de meu próprio universo musical. Hoje, a
usar todos esses instrumentos, comecei resposta mais automática que sai quando
a misturar os meus instrumentos, que me perguntam o que eu faço é que sou
eram o violão, a voz, de repente colocar cantora. Antes, eu falava violonista.
algo no pé, tocando “Joana Francesa” Quem não me vê há muito tempo não
(Chico Buarque) e cantando... Virou entende, mas foi um processo que levou
esse malabarismo acrobático (risos). O 25 anos, desde que comecei até agora.
resultado de tudo isso é a gravação do Não foi nada por acaso, sempre fazendo
meu primeiro disco, em Nova York, em algo que realmente me deixe curiosa,
24 • VIOLÃO+
badi assad
que me mantenha curiosa, interessada, o emocional, com o estresse, justamente
com a chama do novo acesa. É o novo o que eu estava vivendo. De repente,
que me instiga. comecei a perder os movimentos da
mão. Chegou ao ponto de eu cancelar
Violão+: Houve um período que deve ter uma turnê e falar “o que é que eu tenho?”
sido bem difícil, quando você teve que Depois de uns seis meses lutando,
deixar de tocar. Como foi isso? sem conseguir progresso, sem saber o
Fui diagnosticada com distonia focal. que era, caí num neurologista que me
Demorou para descobrir o que eu diagnosticou. Ele me deu a “linda” notícia
tinha. A princípio, tive um treco na mão, de que eu talvez nunca mais voltasse a
que interpretei como cansaço. Foi no tocar... Abandonei os palcos, fiquei dois
final da gravação de estúdio do disco anos me cuidando de todas as formas
Chameleon, quando tive que morar possíveis, corpo, mente e espírito. Foi
nos Estados Unidos para gravar. Uma um trabalho muito concentrado em mim
fase bem estressante, de tempo, de e na minha evolução como ser humano
pressão, porque eu tinha assinado um que me levou à cura. Eu me curei. Não
contrato, essas coisas. Comecei a ter recuperei todos os movimentos que eu
um probleminha na mão, achei que ia tinha antes, eu era uma virtuose no violão,
passar, que era por causa do cansaço, mas isso ainda me pertence de certa
do estresse. Não deixou de ser por causa forma, porque eu canto e toco violão, faço
dele, pois a distonia focal está ligada com um monte de coisas ao mesmo tempo.

VIOLÃO+ • 25
badi assad
Mas, enquanto violonista mesmo, parei que outra. Acho que foi a união de tudo
de tocar aquelas músicas complicadas o que fiz. Especificamente, exercícios
e virtuosísticas, porque não recuperei para a mão, várias coisas. Fiquei
a mão totalmente. Mas isso não me faz envolvida com doutores que, na época,
falta alguma. Acho que a grande lição faziam testes com macacos que tinham
foi aprender a se desprender daquilo em distonia focal. Fui cobaia de pessoas
que se acredita, se desprender daquele que estavam fazendo estudos. Isso foi
apego ao que você é ou que você há dezessete anos, muito no começo,
pensa que é. Tive que deixar tudo isso ninguém sabia o que era. Ainda é um
partir para poder me reencontrar. E me mistério hoje, imagina naquele tempo.
reencontrei com raízes fortes, bem mais Fui reeducando a minha mão, meus
livre nesse sentido. movimentos, mas não voltaram aos
poucos. Voltaram de repente, depois
Violão+: Você conseguiu localizar o de dois anos intensos de convivência
momento exato em que seus movimentos comigo e com meus pensamentos.
voltaram a ponto de poder tocar
novamente? Violão+: Uma época muito introspectiva...
Fiz muita coisa. Não há uma terapia que Ah, foi. Dois anos em recesso. Não tinha
eu possa dizer que despontou mais do como não ser assim.

26 • VIOLÃO+
badi assad
Violão+: Você gosta muito de parcerias,
muito variadas. De Bobby McFerrin até
Seu Jorge, por exemplo. Também tem
um trabalho muito forte, de uns tempos
para cá, com música para crianças. Seus
shows são de um refinamento instrumental
imenso. Como administrar tudo isso?
Coloquei na cabeça: eu sou um polvo,
mulher-polvo...(risos). Na verdade,
não tem muito como. Divido o meu
dia conforme a demanda. Se tem uma
semana sem shows e eu não estou
inspirada, nem pego no violão. Minha
criatividade é usada o tempo todo em
função da demanda. Acredito que a
criatividade é o que impulsiona a gente
para os dias renderem. Fico antenada
com essa demanda, com as coisas que
quero e estou a fim de fazer. Tem que ter
disciplina para compartimentar os dias,
compartimentar o tempo. É difícil você
me ver fazer alguma coisa para perder
tempo. Acho que tudo tem a sua intenção.
Hora de descansar é hora de descansar. o tapete de ninguém, aparecer mais que
Respeitar limites, administrar o tempo o outro, pelo contrário. Num mundo em
e ter disciplina, porque sem disciplina que se fala muito de amor, mas na prática
você se perde. ele fica perdido, o amor verdadeiro fica
perdido. Acho que a missão da família
Violão+: Há alguns anos, você e sua é fazer isso: amor através da música,
família rodaram o Brasil e o mundo com compartilhar esse amor com a plateia.
um show musical, o que deve ter sido uma Lembro quando meus pais entravam no
emoção e tanto. palco e era uma comoção. A gente via os
Nossa, eu acho que a coisa da família... casaizinhos que estavam assistindo se
Não é nem a música, sabe? A coisa mais aproximando. Foi uma vida construída
importante desse show era compartilhar. pelo amor aos filhos, muita união. Viajar
A gente se ama tanto, se respeita tanto, é com a família é um deleite puro. A gente se
bonito ver uma família assim. E fazendo divertia o tempo inteiro, muitas histórias
música! Tem uma hierarquia naturalmente de bastidores, muita risada e assim é em
respeitada. Os meus sobrinhos me qualquer formação da família. A gente
respeitam, eu respeito os meus irmãos, tem o Festival Assad (que acontece
todos respeitamos nossos pais. Quando anualmente em São João da Boa Vista,
estamos no palco, ninguém quer puxar no Estado de São Paulo), momento em
VIOLÃO+ • 27
badi assad
que conseguimos nos reunir, porque escolha do meu repertório. De acordo
cada um mora num canto do mundo. com ele tenho a possibilidade de falar
Quando estamos juntos, é muita alegria, sobre esses assuntos. Sempre falo um
risada, um clima confortável para todos. pouco e introduzo a música. Acho que,
assim, as pessoas têm a oportunidade
Violão+: Fugindo um pouco da música, de pensar no que estou compartilhando.
você tem um lado muito conhecido de De forma mais ampla, faço parte de uma
defensora dos direitos humanos e da organização nos Estados Unidos que
natureza. Publica a respeito no seu site, trabalha pela paz mundial através da
comenta em shows e entrevistas. Você música. Com eles, já fui para a Bósnia,
sente que consegue atingir as pessoas em locais de genocídio. A gente vai em
com suas posturas? grupo e faz música com a crença que
Pra você ter realmente uma eficácia podemos ajudar as pessoas que vivem
nisso, tem que participar de ações nesses espaços e sofrem, que elas
maiores. No plano individual, faço isso contem suas histórias. A música tem
no meu dia a dia. É o que ensino para esse poder curativo. A gente cria, nesses
a minha filha. Procuro conviver com as espaços, mesas redondas em que se
coisas em que acredito para legitimar procura abrir caminhos que possam
meus pensamentos. Em relação a como ser tomados. Essa associação tem a
mostro isso para o público, como passo perspectiva de abrir uma escola nos
isso para frente, acho que desde a Estados Unidos. Já fui convidada para
ser professora ligada a direitos humanos.
A ideia é que a música e a cultura sejam
peças-chave para que o mundo não
acabe em violência, porque violência
gera violência. Combater violência com
violência resolve o problema apenas
momentaneamente, mas ele explode
lá na frente. Encontrei esse projeto, fui
me aproximando e hoje faço parte dele.
Então, consigo dialogar de forma mais
ampla, ser participativa.

Violão+: Quais músicos você poderia


indicar para a gente ouvir mais
atentamente?
Veio uma pessoa de fora do Brasil, até
escrevi um artigo e estou procurando
uma editora para fazer uma “volta ao
mundo em oitenta artistas” (risos). É o
Jake Shimabukuro, um havaiano que
toca ukulele. O cara é um gênio!
28 • VIOLÃO+
badi assad

© Fritz Nagib

VIOLÃO+ • 29
mundo Por Luisa Fernanda Hinojosa Streber

Guitarra
Portuguesa
Síntese da sonoridade e da musicalidade do povo
português, o instrumento tem timbre característico
realçado pelas técnicas de execução

Ainda lembro uma tarde de outono, um informando que demoraria cinco horas
sábado frio e chuvoso, em que estava para fazer cálculos e concluir tudo.
no escritório. Bastou digitar Enter no Saí para a rua, pensando que tudo
computador para disparar um processo daria certo. Procurei o cinema mais
que resumia anos de estudo e trabalho. perto, para fantasiar, me distrair,
Na tela, uma mensagem surgiu e topei com o filme Lisbon Story,

30 • VIOLÃO+
mundo

Voluta na guitarra portuguesa de Lisboa (à esquerda) e lágrima na de Coimbra (à direita)

chamado também Viagem a Lisboa, mourisca (ou sarracena) difere da


de Win Wenders. Assistir a esse evolução da guitarra portuguesa.
filme foi uma de minhas experiências Foi o compositor Antônio Portugal quem
estéticas mais memoráveis, pois, concluiu, acertadamente, que ela se
além da história, fantástica, havia uma originou da fusão de dois instrumentos:
música bela e simples, mostrando a o cistre europeu (ou cítara) – introduzido
verdadeira essência do amor e do em Portugal no século XVI – e a guitarra
respeito pela guitarra: a primeira do inglesa, introduzida no século XVIII,
grupo Madredeus, que aparece no filme fabricada pelo artesão Luis Cardoso
com o próprio nome do instrumento. Soares Sevilhano.
Desde então, fiquei apaixonada por No final do século XIX, a guitarra
esse instrumento melancólico, que portuguesa suplantou as violas no
exige alto nível de virtuosismo para
ser executado.
Curiosamente, o processo que
disparei no computador naquela tarde
chuvosa valeu para anos mais tarde.
Quando a trabalho em Lisboa, tive
o prazer de desfrutar de mágicas
noites de fado, acompanhadas pela
guitarra portuguesa, em Barrio Alto,
ao compasso de caldo verde, queijo de
Cerro da Estrela e vinho.

Breve história
Há quem defenda que a guitarra
portuguesa possui origem mourisca,
especialmente pelo nome, remontando
sua origem ao instrumento medieval
construído pelo árabe Al-Guitar.
No entanto, a evolução da guitarra Guitarra portuguesa do Porto, com cabeça de animal

VIOLÃO+ • 31
Guitarra portuguesa de Coimbra, carregando uma lágrima

acompanhamento do fado, passando Porto, a escultura de uma flor ou de uma


de quatro a cinco cordas e, por fim, a cabeça de pessoa ou animal. A guitarra
seis cordas duplas. Madeiras nobres, portuguesa de Coimbra, o modelo mais
como pau santo e spruce (pinho distinto, tem a cabeça terminando como
nórdico), são utilizadas na fabricação uma lágrima e produz sons mais graves
do instrumento. (quem sabe, para acompanhar as
rondas das estudantinas nessa cidade
Afinação universitária).
As cordas da guitarra portuguesa,
suportadas por um cavalete móvel,
dividem-se em três primas duplas,
afinadas na mesma nota, e três bordões,
afinados em oitavas. BAEBAD é sua
afinação típica, desde a mais aguda.

Curiosidade
Existem três modelos de guitarras
portuguesas – a de Coimbra, a do
Porto e a de Lisboa – com pequenas
diferenças entre si. Na parte da
cabeça do instrumento, principalmente,
encontra-se a diferença entre eles.
A cabeça da guitarra de Lisboa exibe
uma voluta (ou caracol) talhada; a do Carlos Paredes, grande virtuose falecido em 2004

32 • VIOLÃO+
CD-60 CE
CLASSIC DESIGN SERIES

Mahogany Black Natural Brown Sunburst

Os violões eletroacústicos CD-60 CE oferecem sonoridade e visual


sofisticados. A combinação do tampo em Spruce laminado, com laterais
e fundo em Nato, captação Fishman Isys III (ativa), Tarrachas Die-Cast
cromadas, braço em Nato com escala em Sonokeling (Black, Natural e
Sunburst) e Mahogany (Mahogany) de 20 trastes garantem sons ricos e
encorpados.

Importantes upgrades incluem um novo projeto de ponte, friso do bocal


em madre-pérola e novo escudo.

Os primorosos acabamentos Mahogany, Black, Natural e Sunburst


oferecem classe e estilo aos instrumentos, que vêm acompanhados por
um exclusivo case “Hardshell” original Fender.

Case “Hardshell“ Captação Novo Projeto Friso em Tarrachas


Original Fender Fishman Isys III de Ponte Madre-pérola Die-Cast

/FenderBrasil www.fender.com.br
história Por Rosimary Parra

Interpretação
A vertente da música para vihuela, tratando da interpretação de seu
repertório para o violão, material, afinação do instrumento e condução de
voz, tendo como exemplo a “Pavana VI”, de Luys Milan

A transcrição de músicas em tablaturas para Afinação


edição em notação convencional – edições Pode-se afinar a 3ª corda do violão
modernas – é, por si só, uma interpretação em Fá Sustenido para obter a mesma
no que diz respeito, por exemplo, ao ritmo, relação de intervalos entre as cordas
à condução das linhas melódicas e à encontrada na vihuela. Essa afinação
escolha da afinação. É possível encontrar, permite seguir as movimentações da
portanto, diferentes transcrições de uma mão esquerda sugeridas na tablatura,
mesma música. Para quem tem domínio levando à escolha do dedilhado mais
da leitura em tablatura, o mais indicado é adequado. É possível tocar com a
tocar a partir dela ou comparar a partitura afinação tradicional do violão (3ª em
convencional com a tablatura para entender Sol) mas, às vezes, torna-se mais
os caminhos da transcrição escolhida. trabalhoso encontrar dedilhados para a

Edmund Blair Leighton - How Liza Loved the King (1890)

34 • VIOLÃO+
história
Fontes seguras
A música para vihuela pode ser encontrada nas
seguintes publicações:
MILAN, Luys. El maestro, 1536.
NARVAEZ, Luis de. Los seys libros del Delphín, 1538.
MUDARRA, Alonso. Tres libros de musica, 1546.
VALDERRÁBANO, Enríquez de. Silva de Sirenas, 1547.
PISADOR, Diego. Libro de musica de Vihuela, 1552.
FUENLLANA, Miguel de. Orphênica Lyra, 1554.
DAZA, Esteban de. El Parnasso, 1576.

mão esquerda que ressaltem todas as exemplo, entabulações de canções,


ideias musicais de forma fluente. vilancicos e partes de missa.
Na recriação de obras, muitas vezes
Uso do Capotasto acrescentavam-se novos elementos,
Para obter a mesma tessitura da vihuela, como preenchimentos melódicos em
além da modificação da afinação, é trechos com notas longas (diminuições)
possível usar o capotasto na 3ª casa do e variações melódicas ou rítmicas.
violão. Deve-se considerar que o uso Surgiram gêneros de criação livre, como
do capotasto compromete um pouco o a Fantasia, que embora não se aproprie
timbre e a afinação do instrumento. de modelos vocais conhecidos, segue a
técnica contrapontística ligada à música
Condução das linhas melódicas (vozes) polifônica. O violonista que queira tocar
O repertório vihuelístico foi elaborado esse repertório precisa ter a compreensão
a partir da música polifônica vocal do contrapontística das obras para chegar a
Renascimento. A construção da música interpretações mais apropriadas.
vocal dessa época tinha como base o
contraponto, com a sobreposição de Algumas perguntas que podem ser feitas
linhas melódicas – vozes – dialogando acerca da obra que se pretende tocar
umas com as outras, criando arquiteturas 1. Quantas linhas melódicas (ou vozes)
sonoras extremamente refinadas. estão acontecendo?
Os vihuelistas apropriavam-se de obras 2. Qual o caminho de cada uma das
vocais conhecidas e recriavam as vozes? Há interrupção na condução
mesmas para que pudessem ser tocadas de uma ou mais delas – pausas ou não
à vihuela. A música era, então, publicada continuidade no trecho que segue?
por meio das tablaturas – entabulações. 3. Há perguntas e respostas ou
Encontramos nos livros de vihuela, por imitações entre as vozes, ou em uma
VIOLÃO+ • 35
história
mesma voz, que poderiam
ser ressaltadas?
4. Há trechos em que a
condução da voz gera mais
do que uma possibilidade
de resolução?
Para abordar a questão
da condução de voz, será
utilizada como exemplo
a “Pavana VI”, de Luys
Milan, do livro El Maestro.
Essa peça tem três
partes distintas: A, B e C.
Trabalharemos apenas
a parte C, iniciando no
compasso 17.
A parte C da Pavana
apresenta uma textura
contrapontística que se
estabelece a duas ou três
vozes. Este trecho pode ser
separado em duas frases
e cada uma das vozes
tocada separadamente.
Figura 1Transcrição Orlando Fraga

1ª frase: Voz 1 Voz 2 Voz 3

2ª frase: Voz 1 Voz 2

Parte C completa (com todos os planos melódicos)

Pavana VI completa, com a 3ª corda afinada em Fá Sustenido,


tendo como referência a tablatura original.

Rosimary Parra
Violonista com mestrado em Música pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Professora de violão clássico na
Fundação das Artes de São Caetano do Sul (FASCS).

36 • VIOLÃO+
classif icados
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VIOLÃO+ • 37
sete cordas

Introdução à Cleber Assumpção

“baixaria”
cleberassumpcao@gmail.com

Dando continuidade a um assunto extremamente importante


para a formação do violonista 7 cordas, tratamos da
visualização das notas dos acordes nas cordas mais
graves do instrumento, para desenvolver a criação de
encadeamentos harmônicos por meio dos baixos dos
acordes de determinada progressão
Na edição anterior de Violão+, trabalhamos os acordes
maiores e maiores com sétima menor seguindo cinco
modelos básicos como referência: CAGED. Nesta, vamos
estudar os acordes menores e verificar exemplos de
aplicação do conteúdo estudado em trechos do repertório
tradicional do choro.
É importante chamar atenção para aspectos técnicos muito
importantes a serem observados:
I – O toque do polegar deve ser feito com apoio – não
importa se estamos ou não fazendo uso da dedeira –
buscando sonoridade vigorosa e projetada das notas, porém
respeitando os limites do instrumento a fim de não “sujar”
demais o som.
II – Observe as levadas rítmicas e as fórmulas de mão
direita que preenchem o acompanhamento entre os baixos.
Não devemos esquecer que a função principal do violão 7
cordas é fazer o acompanhamento de forma completa, e
não somente os baixos (afinal, não somos contrabaixistas!).
Para isso, devemos tocar os acordes sempre que possível.
Na lição anterior (número 3 de Violão+), todos os exemplos
foram apresentados com a mesma levada rítmica para que
você se concentrasse no trabalho da mão esquerda e na
memorização dos acordes com seus respectivos baixos.
Nesta, considerando que já estamos mais familiarizados
com o assunto, são apresentadas três fórmulas, que podem
e devem ser aplicadas em todos os exemplos. Após dominar
cada uma delas, experimente combinar duas ou mais em
um mesmo exercício!
38 • VIOLÃO+
sete cordas
Acorde com referência no modelo de Dó menor (Cm)

Acorde com referência no modelo de Lá menor (Am)

Acorde com referência no modelo de Sol menor (Gm)

VIOLÃO+ • 39
sete cordas
Acorde com referência no modelo de Mi menor (Em)

Acorde com referência no modelo de Ré menor (Dm)

Exemplos em trechos musicais

“Alvorada”
(Jacob do Bandolim)

40 • VIOLÃO+
sete cordas
“Brejeiro”
(Ernesto Nazareth)

Modulação para Ré Maior (D) em “Alvorada” e “Brejeiro”

“Odeon “
(Ernesto Nazareth)

VIOLÃO+ • 41
f lamenco

Alzapúa Flavio Rodrigues


www.flaviorodrigues-flamenco.eu

Olá, amigos leitores!


Neste quarto número, referente à técnica, falaremos da
alzapúa, dando continuidade à temática sobre o uso do
polegar aplicado para a guitarra flamenca.
Bastante característica e expressiva, a alzapúa é uma
técnica exclusiva da guitarra flamenca. Existem várias
possíveis abordagens e variações da mesma técnica, mas
a essência sempre prevalece.
A seguir, explicaremos uma das formas mais típicas e usuais
dessa técnica, que consiste em três movimentos básicos:
1º Polegar para baixo (giro de munheca) + “Golpe” no tampo
(dedo A ou M, ou ambos juntos).
2º Polegar para cima (giro de munheca) – tocando todas
as cordas
3º Polegar na 6ª corda (finaliza, preparando o reinício)

Exercício de Técnica - Acordes

Am G F E9b
(cadência árabe-andaluza)

Referente ao repertório, vamos aplicar a nova técnica


aprendida em uma pequena variação, que se somará ao
nosso toque por Tientos, finalizando o mesmo.

42 • VIOLÃO+
f lamenco

#FicaAdica
Jucal
(1994)
Gerardo Nuñez

Terceiro disco de um dos


grandes nomes da guitarra
flamenca da era pós-Paco
de Lucía.
Gerardo Nuñez é um
solista nato, que reúne
todas as características de um guitarrista flamenco
supervirtuoso em todos os sentidos (técnica, sonoridade,
amplo repertório, excelente compositor), sendo considerado
um “guitarrista infalível”. Músicos de outros gêneros também
o reconhecem por sua versatilidade. Nesta obra, podemos
desfrutar de sua guitarra solista nas peças “Hacía Mi” e
“Remache” e em temas como “Isa” e “Marqués de Porrina”,
com acompanhamento de percussão, voz, palmas e outros
instrumentos. Totalmente minimalista, trata-se de obra
fundamental da discografia antológica da guitarra flamenca.

Destaques: “Remache”, “Marques de Porrina”, “Trafalgar”.

VIOLÃO+ • 43
como estudar

Considerações
sobre a mão
Breno Chaves
brechaves@gmail.com

esquerda
“... É uma impropriedade muito comum os dedos da mão esquerda apertarem
antecipadamente as notas a serem tocadas, para a pessoa ter certeza de que estarão lá
quando a mão direita for tocar as notas. Há muito mais eficiência quando as duas mãos
tocam exatamente ao mesmo tempo, o que se consegue pensando no ritmo com as
duas mãos – como acontece num teclado – e não apenas com a mão direita (observe-
se que, quando as duas mãos encostam na corda ao mesmo tempo, ainda assim a
pulsação propriamente dita ocorre uma fração mínima de segundo mais tarde).
Dessa maneira é possível reduzir muito a pressão a ser feita pelos dedos da mão
esquerda, já que uma leve martelada do dedo na corda (conseguida com a velocidade
do impulso e não com a força) produz uma pressão enorme momentaneamente, pressão
essa que é necessária apenas no momento da pulsação da corda pela mão direita. Após
essa ligeira martelada basta que o dedo da mão esquerda continue apenas levemente
encostado na corda, o suficiente para manter a sustentação do som pelo tempo que for
necessário.
Não é difícil perceber a economia de esforço que se consegue quando as duas mãos
tocam em sincronia absoluta, usando-se, em vez da pressão contínua dos dedos
da mão esquerda sobre as cordas, apenas uma decidida, porém leve martelada no
momento exato da nota ser tocada. Sem exagero algum, é a mesma diferença que há
entre bater um prego com o martelo da maneira que normalmente se usa a ferramenta
e tentar empurrar o prego com o martelo sem bater, aplicando a força bruta.
No entanto, essa técnica só funciona se o polegar da mão esquerda estiver completamente
solto, infelizmente é extremamente comum a mão esquerda agarrar o braço do violão
numa atitude semelhante à de uma pessoa agarrando o corrimão de uma escada quando
está com medo de cair. Na verdade, quanto menos o polegar da mão esquerda interferir,
melhor, já que tocar ele não toca nada, e não deve nunca trancar a mão, fazendo como
se essa fosse um alicate prendendo o braço do violão.
Aliás, isso vale também para pestanas (para as quais evidentemente a técnica do martelo
não funciona): o indicador consegue muito mais pressão quando se usa somente o
antebraço para puxar esse dedo, ficando assim o polegar, bem como o médio, anular e
mínimo, soltos e relaxados, e a mão como um todo igualmente solta quando for a hora
de largar a pestana para mudar rapidamente de posição...” (Sergio Abreu)
44 • VIOLÃO+
como estudar
Traslado longitudinal da mão esquerda
Este movimento é mais complexo que o da mão direita em
função da assimetria da escala do violão. À medida que a mão
esquerda “caminha” para a região aguda, as casas ficam cada
vez menores. Dessa forma, o ideal é trabalhar por posição. As
posições são determinadas pela localização do dedo indicador,
independentemente se o mesmo está sendo usado ou não.
Exemplo:

A escala acima começa com a nota Si (dedo 2), e a terceira


nota da escala, Ré Sustenido, é tocada na primeira casa (dedo
1) – ou seja, essa escala está em primeira posição.
Em princípio, pode-se memorizar algumas posições como a
primeira, a segunda, a terceira, a quinta e a sétima, sempre
tendo o dedo 1 como referência (dedo guia).

Movimento
Nesse traslado, o antebraço tem função motora. A mão
fica subordinada ao movimento do antebraço, salvo os
casos em que existirem acordes (transversais ou mistos)
em vez de escalas. Nessas situações, o braço pode e
deve movimentar-se também. Nos casos das escalas
propriamente ditas, o braço permanece relaxado, e o
antebraço faz o movimento.

Traslado transversal da mão esquerda


O traslado transversal da mão esquerda obedece a critérios
de movimentação diferentes em relação aos do traslado
longitudinal. O conjunto braço e antebraço funcionam
simultaneamente, formando uma unidade. No traslado
longitudinal, o movimento do braço é praticamente nulo,
salvo os casos de acordes transversais ou mistos. No
VIOLÃO+ • 45
como estudar
movimento transversal, esses dois elementos trabalham
em conjunto.
Em uma escala cromática descendente, iniciada na nota
Lá Bemol (1ª corda, dedo 4) até o Fá (sexta corda, dedo
1), a posição da mão esquerda deve permanecer a mesma
desde o início da escala até o final. Todo o movimento é
feito pelo conjunto braço e antebraço.

Considerações gerais
O método Escuela de la guitarra: exposición de la teoria
instrumental, de Abel Carlevaro, que acredito ser uma das
obras mais incríveis da literatura técnica violonística –
pelo seu conjunto, pelo rigor e pela profundidade com que
aborda os diversos aspectos da técnica e a enormidade
de exercícios que propõe – é, a meu ver, um dos métodos
mais mal interpretados.
Mesmo com registros fotográficos das posições, quem
estudou sabe que sua compreensão fica difícil. É um
método que aborda a técnica de forma muito particular, e,
ao mesmo tempo, academicamente falando, foi concebido
com a finalidade de formalizar a técnica do violonista
espanhol Andrés Segóvia, com quem Carlevaro estudou.
Para alguns, funciona maravilhosamente bem. Para
outros, o resultado é, no mínimo, equivocado.
Ultimamente, temos encontrado métodos interessantes,
que saem do lugar comum e tratam o assunto sob outro
olhar. Um deles, acompanhado de uma série de dicas
sobre a forma de tocar bem o violão, é o Pumping Nylon,
de Scott Tennant, que aborda o tema técnica como uma
“brincadeira séria”. O autor faz um apanhado técnico desde
Giuliani, passando por Tárrega, chegando a exemplos
próprios e dicas valiosas sobre o posicionamento das
mãos e do instrumento.
Outra proposta interessante é o método Técnica,
Mecanismo y Aprendizaje, do violonista uruguaio Eduardo
Fernández. Ele propõe uma abordagem sensorial da
técnica, muito coerente e precisa, com uma série de
exercícios, pasmem, sem o instrumento! Fernandéz chama
o leitor à sensibilização e conscientização neuromotora
fora do instrumento e, depois, gradativamente, passa a
aplicá-las no violão.

46 • VIOLÃO+
de ouvido

Tom versus nota Reinaldo Garrido Russo


Faremos aqui uma breve explanação a respeito da www.musikosofia.com.br
duemaestri@uol.com.br
terminologia que define o som de frequência constante. A
denominação para isso, “tom”, era usada no Brasil assim
como em outros países. O problema é que usamos a mesma
palavra para “tonalidade” e para designar a distância entre
duas notas, ou seja, para os intervalos. Que confusão!
Como é que pode existir um tom entre dois tons, como no
caso das notas Dó e Ré? Os tons Dó e Ré, que pertencem
ao tom de C (Dó Maior) são separados por uma unidade
musical de medida chamada “tom”. Pare esse trem, que
eu quero descer!
Para entender, vamos observar como os três conceitos
são usados no Brasil e na língua inglesa:

No Brasil Língua inglesa


TOM (distância entre Dó e Ré; tom inteiro) STEP
TOM (som de frequência constante e da gama musical) TOM
TOM (sinônimo de tonalidade) KEY
NOTA (nota musical e sinônimo de TOM) NOTE

Como é possível observar, a palavra inglesa “note” é


usada para o “tom” notado em pauta. No ensino de música
no Brasil, ainda existe a confusão gerada por palavras
homônimas com três significados diferentes. Não é à toa que
nos confundimos. Devemos estar bastante familiarizados
com os conceitos expostos, entendendo bem o significado
da palavra “tom” em seus diferentes contextos.
Como se pode ver, a palavra “nota” é usada como sinônimo
de “tom” (som definido – afinado na convenção ou não)
e, também, de “tom” quando escrito em pauta. Portanto,
é importante saber que a palavra “nota”, mesmo sendo
usada de maneira inadequada, com o significado de som
de frequência definida, é praxe no jargão musical brasileiro.

VIOLÃO+ • 47
de ouvido
Uníssono
Tendo feito o necessário e importante esclarecimento,
vamos fazer alguns exercícios, mas permitam-
me apresentar o intervalo de uníssono perfeito ou,
simplesmente, “uníssono”. Vá ao piano e toque o Dó central
(Dó3). Trata-se da nota Dó situada perto da fechadura
do instrumento. Cante esse som na mesma altura em
que você o ouve. Reconheço que não é tarefa fácil para
todos, pois grande parte dos alunos não tem referência
para saber se está cantando o mesmo som (significado
da palavra “uníssono”) ou cantando a nota Dó em outra
oitava (lembre-se de que intervalo de oitava é o intervalo
distante de oito tons ou notas na régua musical Dó, Ré,
Mi, Fá, Sol, Lá, Si, Dó).
Veja o esquema abaixo:
Dó3

OITAVA ABAIXO UNÍSSONO OITAVA ACIMA

... Dó1 Ré1 Mi1 Fá1 Sol1 Lá1 Si1 Dó2 Ré2 Mi2 Fá2 Sol2 Lá2 Si2 Dó3 Ré3 Mi3 Fá3 Sol3 Lá3 Si3 Dó4 ...

Se você tiver um amigo especialista em canto, peça auxílio


para que não haja confusão ao cantar o Dó3. Uma dica:
os homens que cantam naturalmente agudo cantarão o
Dó3 sem esforço na região média/aguda; os homens que
cantam naturalmente na região grave cantarão o Dó3 em
sua região mais aguda com algum esforço. As mulheres
que cantam naturalmente agudo terão o Dó3 como um dos
sons mais graves para o canto; as que cantam naturalmente
grave terão o Dó3 sem esforço vocal. Isso tudo está longe
da forma precisa que professores experimentados de canto
possuem para ensinar sobre o assunto.
Para extinguir dúvidas, apelaremos ao violão, nosso
precioso instrumento de referência. Nele teremos quatro
formas de obter o Dó3, ou Dó central. Vejamos:
• Na corda 2, casa 1 --- nota 21 (segundo a denominação
numérica usada para o violão).
• Na corda 3, casa 5 --- nota 3 5
• Na corda 4, casa 10 --- nota 4 10
• Na corda 5, casa 15 --- nota 5 15

48 • VIOLÃO+
de ouvido
Vamos comparar cada uma dessas notas com o Dó2 (oitava
abaixo).

• Toque o Dó3 na forma 2 1 e, depois, na forma 3 5.


• Toque o Dó2 situado na corda 5, casa 3 (5 3)
• Cante o Do3 e em seguida o Dó2.

O aluno pensante grita agudo e em ff:


– Pare esse trem! Espere um pouco. Eu aprendi que o
Dó central é o 5 3 e não o 2 1.
Eu respondo:
– Aprendeu, sim! Mas o professor se esqueceu de dizer
que o violão é um instrumento transpositor, ou seja, lê uma
nota (na partitura) e toca outra!
O aluno:
– O quê? Como assim?
Eu respondo:
– É, sim. O violonista lê na partitura o Dó3, o central, mas
soa o Dó2, ou seja, uma oitava abaixo. O problema é que
os professores se esquecem desse pequeno detalhe, ou
nunca pararam para pensar nisso. “Durma-se com um
barulho desses”, como diziam os antigos professores de
violão.

Vamos ouvir a gravação:


1) Dó3 na corda 2;
2) Dó3 na corda 3;
3) Dó2 na corda 5;
4) Dó2 na corda 6, situado na corda 6, casa 8 ... nota 6 8;
5) São tocados os Dós3, em seguida são tocados
simultaneamente;
6) São tocados os Dós2, em seguida são tocados
simultaneamente.

Toque esses sons e tente cantar na mesma altura que


soam. Tente, não desista. Os conceitos expostos deverão
ser trabalhados e questionados durante um bom tempo. O
leitor deve deixá-los bem familiares.
Bom trabalho e até a próxima edição, quando você estará
mais bem preparado para muitos exercícios gravados.

VIOLÃO+ • 49
siderurgia

Little Country
Walter Nery
www.walternery.com
Olá, amigos! Nesta edição vou apresentar a primeira
parte de uma composição autoral, chamada Little
Country. Compus essa música há algum tempo, como
um exercício de aplicação dos elementos que foram
apresentados nas edições anteriores: baixo alternado,
contratempo e síncope. A tonalidade de Ré Maior é
configurada pelo uso de um capotasto na segunda
casa do violão, o que infere maior brilho e vivacidade à
peça. A harmonia gira em cima dos três acordes pilares
dessa tonalidade: D (Ré Maior), G (Sol Maior) e A (Lá
Maior). Na próxima edição, vou apresentar a integral
dessa composição. Abraços musicais!

50 • VIOLÃO+
siderurgia

“Little Country”

Walter Nery

VIOLÃO+ • 51
VIOLA caipira

Luar do Sertão
“Não há, oh gente, oh não, luar como este do sertão.” Fábio Miranda
Assim começa uma das toadas mais conhecidas do nosso www.fabiomirandavioleiro.com

cancioneiro, “Luar do Sertão”, que exalta as belezas


naturais dos rincões brasileiros, das serras e furnas
dos fundos de sertão. Longe da alumiação nervosa das
cidades, os sertões são esses lugares ermos e cheios
de vida, onde nada impede o brilho da lua quando ela
resolve brilhar.
Esses lugares duros e encantados ainda fervilham na
imaginação de cantadores, escritores, violeiros e poetas.
Um deles foi o maranhense Catulo da Paixão Cearense
(1863-1946), que compôs, em 1914, os versos dessa
toada tão cantarolada no campo e na cidade. Por muitos
anos, Catulo dizia que tinha composto a letra e a melodia
da toada, mas hoje em dia se dá o crédito da melodia
a outro grande músico e compositor, João Pernambuco
(1883-1947).
Intrigas poeteiras à parte: vão-se os anéis, ficam-se os
dedos. A conhecida toada Luar do Sertão tem estrofes
que narram as belezas sertanejas, intercaladas por um
refrão simples e contagiante, cuja melodia pode ser
escrita por meio de graus da escala maior, da seguinte
forma:

ÓIA BEM: Em geral, esse verso é repetido. Na segunda


vez, costuma ser finalizado de modo diferente, na palavra
“sertão”. Tente fazer!
52 • VIOLÃO+
VIOLA caipira
Para conseguir tocar esses
graus na viola caipira, podemos
começar na tonalidade do cebolão
que estiver afinada a sua viola.
Vamos pontear a melodia de forma
duetada, utilizando a sequência de
duetos no 2º e 3º pares (requintas
e turinas). Olha só como ficam as
posições no braço do pinho.

ÓIA BEM: reparem que, seguindo


a sequência de uma escala maior
com sete notas, após o sétimo
grau a escala se inicia novamente,
começando do primeiro grau
(tônica) – só que, dessa vez,
em uma outra oitava. Por isso
assinalei com um traço abaixo
(sublinhado), para que fique mais
fácil diferenciar em qual oitava está o grau indicado.
A primeira frase do refrão começa com um salto do 5º
para o 1º grau, num movimento
ascendente, que em musiquês
significa o movimento do grave
para o agudo. São as duas
primeiras notas dessa parte.
Olha aí do lado!
Agora é só pontear com os
dedos nas posições, seguindo a
letra da toada. Quando estiver
começando a entender e ouvir
o refrão na viola, tente tirar a
melodia da estrofe, que segue
o mesmo caminho de graus,
mas tem outra divisão rítmica,
baseada nas sílabas da letra:

“Oh, que sau - da - de do lu - ar da mi - nha ter - ra...”

Se nada disso ajudar, visite o sertão e conheça o seu


luar, que pode estar fora ou dentro da gente... talvez, ali
esteja a inspiração pra pontear a viola! Ser tão!
VIOLÃO+ • 53
iniciantes

Novos acordes Ricardo Luccas


rnluccas@gmail.com
É com alegria que chegamos à terceira edição desta coluna,
fase em que estamos ainda iniciando no instrumento, com
muitas novas informações e desafios para enriquecer nossa
prática. Agradeço aos leitores que entraram em contato,
trazendo ideias, dúvidas e sugestões e enfatizo que estamos
à disposição, pois esse contato faz toda a diferença. Se
você, que está começando a conhecer o instrumento, tiver
alguma dúvida ou algum pedido especial, compartilhe-os
com a gente!

Exercícios
Vamos dar sequência aos exercícios que vínhamos
executando, lembrando que é importante, para a evolução
no aprendizado, o estudo vinculado a uma rotina. Temos
dividido esta rotina entre técnica da mão direita (arpejos e
batidas), técnica da mão esquerda (posição frontal ao braço
do instrumento), sequências harmônicas e leitura musical.
Nesta edição não trarei novos arpejos para a mão direita
e nem técnica para a mão esquerda, que serão retomados
posteriormente. Peço que executem, como combinado,
os exercícios de técnica para mão esquerda e os arpejos
já conhecidos sobre as novas sequências de acordes,
procurando sempre som alto e claro. Toque lentamente, até
ganhar fluência. Depois, gradativamente, vá aumentando a
velocidade. Qual a novidade desta edição? Pois é, que tal
aprendermos a pestana?

Pestana
A pestana – peça que fica no início do braço do violão, com
pequenos sulcos por onde as cordas passam a caminho
das tarraxas e da afinação – representa a casa 0 (zero) do
violão e é o nome do movimento que vamos aprender em
novos acordes.
Quando apertarmos as seis cordas do violão com um
único dedo, estaremos fazendo a pestana. Se estivermos
apertando três ou quatro cordas com esse único dedo,
chamaremos de 1/2 (meia) pestana.
54 • VIOLÃO+
iniciantes
Seguem alguns novos acordes. Vejam as instruções e
lembrem-se: caso fique confuso entender as descrições,
olhem os desenhos (diagramas) do braço do violão e
assistam ao vídeo demonstrativo.

• F#m (Fá sustenido menor): coloque o dedo 1 pressionando


as seis cordas da casa 2 (pestana); o dedo 3, na corda 5 da
casa 4; o dedo 4, na corda 4 da casa 4.

• Bm (Si menor): coloque o dedo 1 pressionando as seis cordas


da casa 2 (pestana); o dedo 2, na corda 2 da casa 3; o dedo 3,
na corda 4 da casa 4; o dedo 4, na corda 3 da casa 4.

• C (Dó Maior): coloque o dedo 1 na corda 2 da casa 1; o


dedo 2, na corda 4 da casa 2; o dedo 3, na corda 5 da casa 3.

• F (Fá Maior): coloque o dedo 1 pressionando as seis cordas


da casa 1 (pestana); o dedo 2, na corda 3 da casa 2; o dedo
3, na corda 5 da casa 3; o dedo 4 na corda 4 da casa 3.

• G (Sol Maior): coloque o dedo 1 pressionando as seis


cordas da casa 3 (pestana); o dedo 2, na corda 3 da casa
4; o dedo 3 na corda 5 da casa 5; o dedo 4 na corda 4 da
casa 5. Lembre-se de que já aprendemos uma outra versão
desse mesmo acorde sem pestana.

Dica: para executar as pestanas, procure colocar o dedo 1 da


mão esquerda em cima do traste, e o cotovelo para dentro,
na direção do corpo. Tenha paciência! Se estiver doendo,
solte a mão e relaxe um pouco antes de tentar novamente.

VIOLÃO+ • 55
iniciantes
Sequências harmônicas
Seguem duas novas sequências harmônicas, nas quais
misturaremos acordes novos e antigos. Consulte os novos
na página anterior.

Batida
Nesta edição aprenderemos uma batida nova para a mão
direita, muito parecida com a que já dominamos, apenas com
a mudança de uma flecha do sentido de um toque. Aplique
essa batida nas sequências de acordes que já aprendeu.

Na edição anterior explicamos o funcionamento da


partitura. Vocês conseguiram descobrir e tocar a música
ali apresentada? É legal tentar memorizar. Para isso, toque
a escala da primeira posição (apresentada na edição 3)
falando o nome das notas.
56 • VIOLÃO+
iniciantes
Vamos a uma nova canção?
Primeiramente, vamos tocar a melodia. Depois, a melodia
acompanhada pelos baixos. Aqui vai uma novidade: a
melodia deve ser tocada com os dedos I e M (indicador e
médio) da mão direita, enquanto os baixos serão tocados
pelo P (polegar).

Aproveitando a época do ano, segue a primeira parte de um


tema natalino cuja letra canta uma mensagem de Feliz Ano
Novo! O que precisamos saber para tocar essa partitura?
Para achar as notas, devemos olhar a escala da primeira
posição do braço do violão, que se encontra na edição 3
de Violão+. Agora, veremos um pouco sobre fórmula de
compasso e divisão rítmica.

VIOLÃO+ • 57
iniciantes

“We Wish You A Merry Christmas”


Anônimo - Aprox. Século 18
A partitura:

A partitura com os baixos:

58 • VIOLÃO+
academia Por Paulo de Tarso Salles

O acorde de Tristão
em Villa-Lobos
Escrito em 2004, esse artigo aborda a presença do “acorde de
Tristão”, nome dado ao acorde meio-diminuto que aparece no
Prelúdio da ópera Tristão e Isolda (1859), de Richard Wagner,
uma das obras musicais que mais influenciaram a música do
final do século 19 até o início do século 20. Villa-Lobos menciona
Tristão e Isolda, explicitamente, no poema sinfônico Uirapuru
(1917). Na sua obra para violão, o tratamento dado ao acorde
sugere a mesma referência a Wagner, encontrada, por exemplo,
no Prelúdio nº 3 (1940).

Esta comunicação pretende apresentar o tratamento dado por Heitor Villa-Lobos


em algumas de suas obras ao arquétipo harmônico conhecido como “acorde de
Tristão”. Considerado como um compositor pouco sistemático, Villa-Lobos raramente
é lembrado como um modelo composicional da primeira metade do século 20. No
entanto, nossa pesquisa tem revelado aspectos de sua poética que o colocam em
contato com a obra de Debussy, Bartók, Stravinsky, Varèse, Schoenberg, Berg e
Webern, obviamente dentro das várias abordagens individuais que caracterizaram
a música do Modernismo.
A referência ao acorde de Tristão, por exemplo, é um desses aspectos que liga
Villa-Lobos a vários compositores de sua geração e será analisado em obras como
Uirapuru, Choros nº 8 e Prelúdio nº 3 (para violão) entre outras.

Introdução
A música do final do século 19 sofreu profunda
influência de Richard Wagner. Não foi diferente com
relação às gerações de compositores do início do
século 20, cujos anos de formação se deram sob
essa mesma influência. No Brasil, essa influência
wagneriana passou pelo filtro da música francesa,
através da orientação de músicos como César Franck,
Vincent d’Indy e Camille Saint-Säens, reconhecidos
cultores do compositor alemão 1. Até mesmo Debussy
manifesta essa influência, embora sua música seja
considerada até mesmo oposta à de Wagner 2.
Tomando como base a música desses franceses, a
VIOLÃO+ • 59
academia
geração de compositores brasileiros da era reverenciada. Sabe-se que estudou o
virada do século encontrou meios de Cours de Composition Musicale de d’Indy,
iniciar um projeto de renovação artística, obra onde há várias referências a Tristan
que viria se concretizar com a eclosão do und Isolde e outras realizações de Wagner.
movimento modernista, que sedimentou Assim como os outros compositores de
o movimento nacionalista. Alguns deles, sua geração, ele também não foi imune às
como Alberto Nepomuceno, Leopoldo várias análises e discussões em torno das
Miguéz e Francisco Braga, chegaram inovações harmônicas do Prelúdio dessa
a passar algum tempo estudando na ópera, cujos acordes iniciais tornaram-se
Alemanha, frequentando o famoso festival uma espécie de arquétipo harmônico (fig.
de Bayreuth, enquanto Henrique Oswald 1), frequentemente revistos por vários
teve contatos frequentes com Saint-Säens compositores ao longo do século 203.
(MARTINS, 1995, pp. 59-66). Assim, encontramos várias alusões a
Villa-Lobos, portanto, formou-se num esses acordes em algumas de suas obras,
ambiente musical onde a obra de Wagner como mostraremos a seguir.

Fig. 1: Redução para piano dos compassos iniciais do Prelúdio de Tristão e Isolda de Wagner

Referências ao acorde Tristão em obras de Villa-Lobos


Em Uirapuru (1917) Villa-Lobos fez várias citações ao prelúdio de Tristão e Isolda.
Logo no início (fig. 2) o acorde aparece em posição cerrada (KIEFER, 1986).

Fig. 2: aparição inicial do acorde de Tristão em Uirapuru.

60 • VIOLÃO+
academia
Mais adiante, a citação se confirma de modo mais evidente quando a flauta evoca
a progressão melódica da linha superior de Tristão (fig. 3), enquanto o acorde
wagneriano permanece soando nas clarinetas e fagotes.

Fig. 3: solo de flauta semelhante à linha superior da sequência harmônica de Tristão e Isolda.
Na coda de Uirapuru, Villa-Lobos realizou permutações sobre a sequência final de
Tristan, submetendo o material a um processo de subtração/adição de semitons.
Essa distorção é ainda completada por uma abrupta mudança de registro e timbre,
que Villa-Lobos realiza com um salto de três oitavas, despencando no SOL oitavado
grave, transferindo a citação da harpa para os naipes de cellos e baixos. Em Wagner
há uma resolução frígia (Ab – G), além do registro fixo na região grave (fig. 4).

Fig. 4: comparação entre os finais de Uirapuru e do Prelúdio de Tristão e Isolda.

Desse modo, descontando a nota Sol, Villa-Lobos expande a gama de sons para uma
escala de tons inteiros: C-D-E-F#-Ab-Bb, enquanto em Wagner os cellos ressoam o
acorde de Tristão, em posição cerrada e em movimento melódico.

Prelúdio nº 3 para violão: a multiplicação de Tristão


Em várias de suas composições para violão, Villa-Lobos faz uso da combinação de
dedos no formato do acorde Tristão. Diga-se de passagem que o início do Prelúdio
wagneriano pode ser perfeitamente reduzido também para violão (fig. 5).

Fig. 5: redução para violão do início de Tristão e Isolda.

VIOLÃO+ • 61
academia
Fazendo uso recorrente de posições fixas de dedos ao longo da escala do violão,
Villa-Lobos emprega formatos imutáveis de acorde em vários dos 12 Estudos
(1929), como por exemplo os de nº 1, 4, 6 e 12. Mas será no Prelúdio nº 3 (1940)
que a referência a Wagner é mais direta (fig. 6).

Fig. 6: sequência de acordes-Tristão no Prelúdio nº 3 de Villa-Lobos.

Um pouco mais adiante (fig. 7) a referência se torna ainda mais completa, pois
Villa-Lobos chega à Dominante com sétima de lá menor, também empregada por
Wagner em conjunto com o “acorde Tristão”. Observe-se a sutilíssima pausa no
final do compasso 17, eliminando os transientes harmônicos do MI bordão que
ressoava solto:

Fig. 7: chegada ao acorde de MI Maior com sétima (no destaque),


completando a referência a Tristão no Prelúdio nº 3.

Choros nº 8: o acorde de Tristão como elemento polarizador


Em uma de suas mais ambiciosas e bem-sucedidas obras, o Choros nº 8, para
orquestra (1925), Villa-Lobos parece ter concebido o material harmônico a partir do
acorde de Tristão, gerando do centro para as extremidades por meio de polarizações
sucessivas das notas constituintes do acorde (fig. 8).

Fig. 8: esquema de polarizações do Choros nº 8

62 • VIOLÃO+
academia
Podemos ver a partir do esquema analítico acima que Villa-Lobos polariza
sucessivamente as notas Mi, Dó# e Sib, chegando ao acorde Tristão transposto uma
quarta Justa acima (Sib) e em disposição mais afastada; após essa manifestação
integral do acorde, o trecho seguinte polariza a nota que faltava, o Sol#.

Conclusão
Vimos como Villa-Lobos empregou o acorde de Tristão de maneiras diferentes
em pelo menos três obras de caráter distinto, nos gêneros poema-sinfônico, solo
instrumental e música orquestral. Na mais antiga dessas obras, Uirapuru , o acorde
de Tristão desencadeia um comentário musical, um processo elaborado de paródia
ou mesmo pastiche, onde o acorde não é tratado como matéria harmônica, mas
como “objeto-sonoro”.
No Choros nº 8 o acorde de Tristão atua como desencadeador de todo o processo
harmônico da primeira seção, estabelecendo seu peso gravitacional ao redor do
qual circulam seus “satélites” harmônicos, atuando como índices de direcionalidade.
No Prelúdio nº 3 a condição de objeto sonoro fica ainda mais evidente, especialmente
nos vários compassos em que o material se reduz ao acorde de Tristão e suas
transposições, usando como único fator modulatório o choque ou somatória de
harmônicos com a nota-pedal Lá, no registro grave.
Desses usos variados depreende-se que Villa-Lobos elaborou seus próprios
planos composicionais a partir de um arquétipo harmônico empregado também
pelos músicos mais importantes de sua época, como Debussy, Schoenberg, Berg e
Webern, em um momento em que as convenções harmônicas ou eram rediscutidas
mediante os processos cromáticos da Segunda Escola Vienense ou levadas para
o território da livre especulação frente às sonoridades resultantes, como o fizeram
Debussy e Stravinsky. Villa-Lobos, principalmente em suas obras escritas na década
de 1920, pertenceu a essa segunda vertente que em muitos momentos antecipou o
uso das combinações harmônicas como objetos sonoros autônomos, conceito que
seria mais bem estudado na década de 50 após Pierre Schaeffer.
1
Ainda assim, a recepção em torno de Wagner sofreu divisões entre os grupos liderados por Saint-Säens e d’Indy (MASSIN, 1997, pp. 810-811; 918-919).
2
Debussy cita o acorde Tristão numa paródia feita em Golliwogg’s Cake Walk da suíte Children’s Corner (1908), compassos 56 a 64.
3
Ver MENEZES (2002).
4
Sabe-se que a verdadeira data de composição de Uirapuru dificilmente corresponde ao ano de 1917, fornecido por Villa-Lobos. No entanto, restam esboços
de uma obra anterior que lhe serviu de base, Tédio de Alvorada, em que já estão presentes muitas das passagens com o acorde de Tristão e cuja data, 1916,
dificilmente pode ser contestada, já que foi comprovadamente estreada em 1918.

Referências bibliográficas
D´INDY, Vincent. Cours de composition musicale. 2v., 6ª ed. Paris: Durand, 1912.
KIEFER, Bruno. Villa-Lobos e o modernismo. Porto Alegre: Movimento, 1986.
MARIZ, Vasco. História da Música no Brasil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1994.
MARTINS, José Eduardo. Henrique Oswald: músico de uma saga romântica. São Paulo: EDUSP, 1995.
MASSIN, Jean & Brigitte. História da Música Universal. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
MENEZES, Flo. Apoteose de Schoenberg. 2ª ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002

Paulo de Tarso Salles


Professor de Teoria e Análise Musical no Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes
da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Autor de “Aberturas e impasses: a música no pós-modernismo
e seus reflexos no Brasil” (Unesp, 2005) e “Villa-Lobos: processos composicionais” (Unicamp, 2009).
Compositor e violonista, integrou a primeira formação do “Violão Câmara Trio”, ao lado de Henrique Pinto
e Giacomo Bartoloni.

VIOLÃO+ • 63
coda

Homenagem ao
violonista (?) Tom Jobim
Luis Stelzer

Não costumo comemorar aniversário de morte. Não me soa


muito bem. Mas as lembranças de alguém que morreu surgem
em minha mente, aguçadas pela mídia, quando é alguém
famoso. Às vezes, aguçadas, também, pela falta de mídia.

Não costumo comemorar aniversário de música e estuda um pouco, sabe do que


morte. Não me soa muito bem. Mas as estou falando. Muito menos falar sobre
lembranças de alguém que morreu surgem em que Jobim influenciou minha vida
em minha mente, aguçadas pela mídia, como músico, no meu gosto por estudar
quando é famoso. Às vezes, aguçadas, harmonia, na vontade de fazer arranjos
também, pela falta de mídia. das suas obras. Tudo isso, também, fica
Neste dezembro, completaram-se 21 anos evidente em segundos. Então, do que vou
sem Tom Jobim. Pouco, muito pouco, se falar? Do Tom Jobim violonista.
falou, em minha opinião. Não vou aqui fazer Como assim? Qualquer um sabe que
um copy/paste da sua biografia, disponível Jobim se dedicava ao piano. E que suas
em dezenas de sites e línguas. Nem falar referências harmônicas, como Chopin,
sobre sua importância para a música Debussy e Ravel, eram compostas,
popular brasileira. Quem gosta mesmo de em sua maioria, por compositores que
dominavam o piano! Ah, mas tem Villa-
Lobos muito presente! E Villa dominava
o violão! Sim, mas dominava a música,
não era preso ao violão. Como, então,
justificar estas linhas, sobre um Tom
violonista que nem existia?
Na segunda metade dos anos 1960, um
telefone toca num bar de uma praia do Rio
de Janeiro. Era Frank Sinatra, procurando
por um incrédulo Tom Jobim. Pouco
tempo depois, acontece o show que me
inspira a escrever agora. Frank Sinatra,
“A Voz”, chama um violonista, cujo rosto
não aparece, para tocar várias músicas
de bossa nova. É o autor delas. Depois
de alguns segundos de mistério, surge o
rosto do músico. É Tom. Por algum motivo,
64 • VIOLÃO+
coda
talvez para dar uma televisão, com
“impetuosidade latina” “...tinha que ser Tom Jobim. Frank Sinatra
à sua figura, pelo que E seu violão. Incrível, mas (fumando um
pude apurar, nosso cigarro atrás do
maestro soberano
verdadeiro....” outro, enquanto
(adoro roubar frases do Chico Buarque!) cantava!), tinha que ser Tom Jobim. E
não está ao piano e sim ao violão. Um seu violão. Incrível, mas verdadeiro.
violão bem esperto, diga-se de passagem, Me sinto na obrigação de homenagear
com a harmonia já conhecida desse Tom Jobim, que viveu muito bem e
craque, somada a um ritmo insinuante intensamente, mas que poderia ter ficado
e intervenções de quem conhece muito neste mundo mais um pouco, enchendo
bem o instrumento. Depois desse show, nossos ouvidos de beleza. Um arranjo,
lá se vão montes e montes de americanos maravilhosamente bem feito pelo Paulo de
para as escolas de música, tentando Tarso Salles, cruza o Brasil e o mundo em
aprender a tocar esse violão brasileiro, versões solo, duo, quarteto... É, quando o
cheio de ritmo e boa harmonia. arranjo é bom, a gente faz isso mesmo! A
Já tínhamos, lá nos Estados Unidos, música é “Águas de Março”. A execução,
grandes representantes do violão da Orquestra de Violões, com solo meu.
brasileiro, como Luiz Bonfá e Laurindo Espero que gostem. E feliz do povo que
de Almeida. Mas, em rede nacional de teve Tom Jobim entre os seus.

VIOLÃO+ • 65

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