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Alessandra Novoa Siaci Augusto

DOENÇA RENAL CRÔNICA EM CÃES

SÃO PAULO
2009
2

FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS UNI - FMU


CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA

Alessandra Novoa Siaci Augusto

DOENÇA RENAL CRÔNICA EM CÃES

Trabalho de conclusão de curso apresentado


ao Programa de Graduação em Medicina
Veterinária do Centro Universitário das
Faculdades Metropolitanas Unidas, sob a
orientação da Prof. Dra. Ana Cláudia Balda.

SÃO PAULO
2009
3

Alessandra Novoa Siaci Augusto


Doença renal crônica em cães.
São Paulo: UNI-FMU, 2009.

Orientador: Ana Claudia Balda.

Trabalho de conclusão de curso (graduação) – Centro Universitário das


Faculdades Metropolitanas Unidas. Curso de Medicina Veterinária.

1. Cão 2. Doença 3. Renal 4. Crônica.


4

Alessandra Novoa Siaci Augusto

DOENÇA RENAL CRÔNICA EM CÃES

Trabalho de conclusão do curso de


Medicina Veterinária da Uni-FMU.
sob orientação da Prof. Dra. Ana
Cláudia Balda, e avaliado pela
banca examinadora constituída
pelos médicos veterinários:

_________________________________________
Prof. Dra. Ana Cláudia Balda
FMU - Orientadora

_________________________________________
Flávia Rettore
CRMV: 1.791

__________________________________________
Patrícia Guerra
CRMV: 9.258
5

DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia, aos meus pais Arnaldo e Terezinha, por terem me dado
a oportunidade de realizar o sonho de ser veterinária. Sempre me apoiaram nos momentos de
alegria e tristeza, no decorrer do curso. Sem esses pais maravilhosos que Deus me deu, não seria
o que sou hoje, por isso dedico esta monografia a eles.
Dedico também aos meus avós Osmar e Jandyra, que sempre sonharam em me
ver formada como médica veterinária.
O que despertou em mim a vontade de ser veterinária foi o primeiro contato
quando ainda criança, com a médica veterinária Flavia Rettore. Desde então tracei como meta em
minha vida, tornar-me igual a ela, uma médica veterinária eficiente dedicada e carinhosa para
com os animais.
6

AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente a Deus, por ter conseguido realizar um de meus maiores


sonhos, que é ser veterinária. Agradeço a todos os professores, por me transmitir o conhecimento
e a experiência que tiveram na vida profissional como veterinários.
Agradeço aos amigos: Caroline Masuda, Alexandre Fachete e Flávia Gusi, entre
outros, pelas horas de estudo, diversão, compreensão, conversas, amizade, e apoio.
Agradeço ao meu namorado Welington, que tanto amo, por sempre ter me
apoiado e acreditado em meu potencial. Agradeço aos médicos veterinários: Flavia Rettore,
Regiane Iwamoto, Alberto Paranhos, Arthur Inamassu, Ana Claudia Balda, Patrícia Guerra, Lília
Fragoso Barbosa e Caroline Teixeira por terem permitindo que eu participasse de sua rotina
profissional, transmitindo-me seus conhecimentos e experiências da profissão.
Sou também muito grata aos meus pais, que sempre acreditaram em mim, e nos
momentos de desespero e desanimo, sempre me puseram para cima.
E por fim, agradeço aos meus cães de estimação: Boli, Tuti, Laika, Hanna e
Luna e minha gatinha Lila.

.
7

RESUMO

AUGUSTO, A N. S. Doença renal crônica em cães. n 59, 2009

A doença renal crônica é bastante freqüente na rotina da clínica médica de pequenos animais,
podendo acometer cães e gatos, porém o presente estudo dará ênfase somente aos cães. Essa
enfermidade pode ser definida como uma síndrome clínica onde existe uma perda irreversível das
funções reguladoras, excretoras e endócrinas dos rins. Dependendo do tempo da lesão, sua
severidade, e quantidade de néfrons perdidos, o animal pode chegar à falência renal terminal em
curto ou longo período de tempo. Os rins por terem uma alta capacidade de reserva funcional,
tornam possível que a doença tenha uma evolução progressiva e lenta, permitindo que o animal
mesmo com alterações estruturais e funcionais, permaneça bem e sem qualquer manifestação
clínica aparente. Quando as manifestações clínicas começam a surgir, a doença na maioria das
vezes, está em estágio avançado. Em decorrência disso, é importante obter um diagnóstico
precoce, promovendo assim a reversão dessas manifestações clínicas, e o prolongamento da vida
do animal. O principal objetivo desta monografia é realizar um levantamento bibliográfico, da
doença em questão em cães, abordando sua etiologia, patogenia, manifestações clínicas, medidas
terapêuticas, diagnóstico e prognóstico.

Palavras-chave: Cães. Doença Renal. Crônica. Rim


8

ABSTRACT

AUGUSTO, A. N.S. [Chronic renal disease in dogs] n 59, 2009

The chronic renal disease is often in the small animal medical clinic routine, being able to nest
dogs and cats. This disease can be defined as clinical syndrome where exists a regulatory
irreversible loss function, kidney excretory and endocrine, where depending on the lesion and its
importance and amount of neufrons lost, the animal may reach the end renal death either in a
short or in a long period of time. The kidney having a high functional reserve capability, make
possible a progress functional changes to keep itself fine. Whenever the clinical acts start
appearing, most of time the disease is an advanced stage. Then, it is important to abtain the
diagnostic soon, promoting the clinical acts balance and extending the animal life endurance. The
paper main goal is to broadcast a bibliographic informatio on the disease mentioned and clinical
manifestations, therapeutics acts, diagnostics and prognostics. Basic know how on renal
physiology will also be metioned.

Key words: Dogs. Chronic Renal Disease. Kidney.


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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Topografia renal e estruturas........................................................................................ 16


Figura 2 Unidade funcional do rim............................................................................................. 17
Figura 3 Néfron e suas estruturas............................................................................................... 19
10

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Sistema de classificação da doença renal crônica em cães...................................... 21


Quadro 2 Possíveis causas da doença renal crônica em cães.................................................. 23
Quadro 3 Fármacos utilizados na terapêutica das alterações gastrointestinais....................... 40
Quadro 4 Fármacos utilizados na terapeutica da acidose metabólica..................................... 41
Quadro 5 Dietas comerciais e exemplo de dietas caseiras...................................................... 49
11

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

g- grama
g/dia - grama por dia
g/ kg - grama por quilograma
IM- intramuscular
IECA – Inibidores da enzima conversora de angiotensina
IRIS –International Renal Interest Society
IV – intravenoso
Kg – quilograma
mEq/kg – miliequivalente por quilograma
mEq/L – miliequivalente por litro
mg/dl – miligrama por decilitro
mg/kg – miligrama por quilograma
ml/kg/h – mililitro por quilograma por hora
mmHg – milímetro de mercúrio
Nacl - solução de cloreto de sódio
TFG- taxa de filtração glomerular
UI/kg – unidade internacional por quilograma
VO- via oral
x/ dia – vezes ao dia
µl/dl- microlitros por decilitro
µmol/dl – micromol por decilitro
12

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 13
2 ANATOMIA E FUNÇÃO RENAL.................................................................................. 15
3 MACROESTRUTURAS E MICROESTRUTURAS..................................................... 16
3.1 Macroestruturas................................................................................................................... 16
3.2 Microestruturas.................................................................................................................... 17
4 DOENÇA RENAL CRÔNICA......................................................................................... 20
4.1 Faixa etária dos cães acometidos......................................................................................... 22
4.2 Etiologia............................................................................................................................... 22
4.3 Fisiopatogenia...................................................................................................................... 24
5 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E CONSEQUENCIAS DA DOENÇA..................... 25
5.1 Azotemia e uremia............................................................................................................... 25
5.2 Alterações físicas................................................................................................................. 26
5.3 Poliúria e polidipsia............................................................................................................. 26
5.4 Alterações gastrointestinais................................................................................................. 27
5.5 Alterações metabólicas...................................................................................................... 28
5.5.1 Acidose metabólica............................................................................................................ 28
5.5.2 Hiperfosfatemia.................................................................................................................. 28
5.5.3 Hipocalemia........................................................................................................................ 29
5.5.4 Hipercalemia...................................................................................................................... 29
5.6 Proteinúria............................................................................................................................ 29
5.7 Hipertensão arterial.............................................................................................................. 30
5.8 Anemia................................................................................................................................. 30
5.9 Hiperparatireoidismo secundário renal................................................................................ 31
13

6 DIAGNÓSTICO............................................................................................................... 32
6.1 Histórico e exame físico..................................................................................................... 32
6.2 Avaliação laboratorial........................................................................................................ 33
6.3 Exame radiográfico e urografia excretora.......................................................................... 34
6.4 Exame ultrassonográfico.................................................................................................... 34
6.5 Pressão sanguínea sistólica................................................................................................ 35
6.6 Biopsia renal...................................................................................................................... 35
7 TRATAMENTO............................................................................................................... 36
7.1 Fluidoterapia...................................................................................................................... 36
7.2 Alterações gastrointestinais................................................................................................ 39
7.3 Alterações metabólicas.................................................................................................... 40
7.3.1 Acidose metabólica........................................................................................................... 40
7.3.2 Hiperfosfatemia................................................................................................................ 42
7.3.3 Hipocalemia...................................................................................................................... 42
7.4 Hiperparatireoidismo secundário renal.............................................................................. 43
7.5 Hipertensão arterial............................................................................................................ 44
7.6 Anemia............................................................................................................................... 45
7.7 Antibioticoterapia............................................................................................................... 48
7.8 Manejo nutricional........................................................................................................... 48
7.8.1 Restrição protéica............................................................................................................ 49
7.8.2 Cetoanálogos..................................................................................................................... 50
7.8.3 Restrição de fósforo......................................................................................................... 51
7.8.4 Restrição de sódio............................................................................................................. 51
7.9 Hemodiálise....................................................................................................................... 52
7.10 Transplante renal................................................................................................................ 53
7.11 Monitoração do paciente.................................................................................................... 53
8 PROGNÓSTICO.............................................................................................................. 54
9 CONCLUSÃO.................................................................................................................. 55
REFERÊNCIAS............................................................................................................... 57
14

1 INTRODUÇÃO

As funções renais são extremamente importantes para a manutenção da


homeostase do organismo. Os rins eliminam produtos indesejáveis do metabolismo através da
função excretora, são capazes de controlar o volume e a composição dos fluidos corporais pela
função reguladora e graças à função endócrina, produzem determinados hormônios como
eritropoetina, renina e prostaglandinas além de serem sítio de atuação de outros hormônios como,
por exemplo, o paratormônio (CASTRO, 2005).
O termo doença renal crônica, não deve ser confundido com insuficiência renal
crônica, pois a insuficiência renal crônica nada mais é do que a evolução da doença. O que
determina a progressão da doença renal crônica, é o tempo de evolução das lesões, sua
severidade, e principalmente a quantidade de parênquima renal afetado. O rim começa a se tornar
insuficiente quando cerca de 75% dos néfrons perdem sua capacidade funcional, tendo como
conseqüência futura à inabilidade do rim em exercer suas funções (CASTRO, 2005).
Os rins possuem uma reserva funcional extremamente útil para o organismo
quando em situações de desequilíbrio orgânico. Essa reserva funcional promove a manutenção da
função renal, até certo ponto. A reserva funcional é composta pelos néfrons remanescentes que se
hipertrofiam e trabalham dobrado multiplicando a taxa de filtração glomerular por néfrons, na
tentativa de compensar os néfrons mortos. Devido a esse mecanismo, a homeostase, se mantém
até que os néfrons hipertrofiados não conseguem mais manter uma função renal adequada
(COUTO, C.G; NELSON, R. W, 2005).
A causa primária da doença renal crônica é muitas vezes difícil de ser
diagnosticada, embora ocorra mais em cães idosos com idade média de sete anos, que vão
perdendo a capacidade funcional do rim em decorrência da idade. Existem também algumas raças
predispostas a desenvolver a doença renal crônica, secundária a lesões congênitas e familiares.
Sua etiologia pode ser adquirida, congênita ou familiar, sendo possível ocorrer em cães de todas
as idades. O prognóstico da doença renal crônica é de reservado a mau, porém é importante
lembrar que um diagnóstico precoce, pode aumentar o tempo de sobrevida do animal, mantendo
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uma vida saudável e de boa qualidade, apesar de se tratar de uma doença de caráter grave
(CASTRO, 2005).
Em relação ao tratamento, pode-se dizer que é conservativo e de suporte e tendo
como principal objetivo amenizar as manifestações clínicas geradas pela evolução da doença
proporcionando para o animal mais tempo de vida e principalmente com boa qualidade
(CASTRO, 2005).
16

2 ANATOMIA E FUNÇÃO RENAL

Os rins têm como principal função, promover a manutenção da constância do


meio interno, o que é extremamente necessário para o funcionamento normal das células do
organismo (FERREIRA, et al, 2005).
A regulação do pH do plasma ocorre em decorrência da eliminação de volumes
adequados de água, produtos orgânicos e inorgânicos, através da produção de urina pelos rins
(FERREIRA, et al, 2005).
As principais funções dos rins podem ser resumidas em: eliminação dos
produtos do catabolismo de substancias tóxicas ou estranhas ao organismo; regulação do
equilíbrio hídrico eletrolítico e da pressão osmótica dos líquidos corporais; produção de
determinados hormônios que influenciam na hematopoiese, no metabolismo de cálcio, fósforo e
proliferação de tecido ósseo (FERREIRA, et al, 2005).
Em decorrência da variedade de funções que os rins exercem, as manifestações
clínicas apresentadas no decorrer da doença, se tornam bastante complexos (REECE, 1996;
RANDALL, et al, 2000; REECE, 2006).
Os mamíferos possuem dois rins, localizados na parede abdominal dorsal,
envolvidos pela dobra peritonial e pelos vasos sanguíneos que o irrigam (Figura 1). Em
decorrência de serem órgãos separados da cavidade abdominal, através do peritônio, são
denominados de estruturas retroperitoniais (REECE, 1996; RANDALL, et al, 2000; REECE,
2006).
A irrigação sanguínea para ambos os rins, é feita pela artéria renal e veia renal,
sendo que a artéria renal possui origem na aorta, e a veia renal desemboca na veia cava caudal
(Figura 1) (REECE, 1996; RANDALL, et al, 2000; REECE, 2006).
17

Figura 1 Topografia renal e estruturas


Fonte: (REECE, 1996).

3 MACROESTRUTURAS E MICROESTRUTURAS

3.1 Macroestruturas

Ao realizar uma corte sagital mediano ao longo dos rins, é possível visualizar
algumas estruturas, extremante importantes, para o funcionamento dos mesmos. As duas
estruturas mais evidentes, são denominadas de córtex externo e medula interna. O córtex externo,
que nada mais é do que a camada funcional externa é recoberta por uma cápsula extremante
resistente, constituída por tecido conjuntivo. A medula interna é composta por papilas que se
projetam na pelve (Figura 2) (REECE, W. O,1996).
O hilo renal é uma estrutura, localizada na borda côncava do rim, que tem como
função dar origem aos ureteres, vasos sanguíneos, linfáticos e nervos. A pelve renal trata-se de
uma dilatação do ureter, no interior do rim. Toda urina produzida é recebida pela pelve renal, e
posteriormente é direcionada para os ureteres, que são estruturas tubulares, compostas por tecido
18

muscular liso, sendo responsáveis em transportar a urina proveniente da pelve renal para a bexiga
urinária (Figura 2). A bexiga urinária é também um órgão composto por tecido muscular liso, que
é responsável em armazenar a urina proveniente dos ureteres, podendo variar seu tamanho, em
função da quantidade de urina armazenada em seu interior (REECE, W. O, 1996).

Figura 2 Unidade funcional do rim


Fonte (RANDALL, et al, 2000).

3.2 Microestruturas

O rim possui uma unidade funcional extremante importante para seu


funcionamento, denominada de néfron. A quantidade de néfrons presentes no tecido renal varia
de acordo com as espécies. Em relação aos cães, o número aproximado de néfrons por rim, é de
415.000. Levando em consideração as diferenças entre o tamanho das variadas raças caninas,
19

subentende-se que cães de raças maiores, teoricamente teriam uma quantidade maior de néfrons,
em comparação com cães de raças relativamente pequenas. Porém, essa linha de pensamento não
é correta, pois a realidade é que cães de raças maiores possuem a mesma quantidade de néfrons
que cães de raças pequenas, porém com tamanho maior. (REECE, W. O, 2006).
Existem dois tipos principais de néfrons nos rins dos mamíferos. Esses néfrons
são identificados de acordo com a localização de seus glomérulos e com a profundidade de
penetração das alças de Henle no interior da medula (REECE, W. O,1996; RADALL, et al,
2000).
Os néfrons que possuem glomérulos localizados na região do córtex externo e
médio são denominados de néfrons corticais ou corticomedulares. Esses glomérulos possuem a
alça de Henle penetrada na junção do córtex com a medula. Já os néfrons que possuem
glomérulos localizados na região do córtex próximo à medula, são denominados de néfrons
justamedulares (Figura 3). Os glomérulos dos néfrons justamedulares possuem a alça de Henle
penetrada mais profundamente para o interior da medula, podendo até se aproximar da pelve
renal (REECE, W. O, 1996; RANDALL, et al, 2000).
Os glomérulos são tufos capilares, que são responsáveis pela filtração. A
arteríola aferente transporta o sangue para o glomérulo e a arteríola eferente retira o sangue do
glomérulo. Todo o filtrado glomerular é recolhido pela cápsula de Bowman, e posteriormente
transportado para túbulo proximal alça de Henle e túbulo distal. O túbulo distal possui terminação
na região interior do túbulo coletor cortical. Quando o túbulo coletor passa da região cortical
para a região medular, é denominado de duto coletor. A partir daí o fluido tubular é descarregado
pelos dutos coletores em direção ao interior da pelve renal, para então ser conduzido pelos
ureteres para o interior da bexiga urinária (REECE, W. O, 1996; RANDALL, et al, 2000).
Em relação a alça de Henle, pode-se dizer que ela possui três segmentos
denominados de ramo descendente delgado, ramo ascendente delgado e ramo ascendente espesso.
(REECE, 1996).
20

Figura 3 Néfron e suas estruturas


Fonte (RANDALL, et al, 2000).
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4 DOENÇA RENAL CRÔNICA

A doença renal crônica é caracterizada por uma perda progressiva e irreversível


da função renal, tendo como conseqüência no estágio final da doença, uma subseqüente falência
renal terminal. Diversos fatores podem desencadear a doença (CASTRO, 2005).
As lesões iniciais, associadas com a perda de massa de néfrons, fazem com que
os néfrons ainda íntegros, se hipertrofiem, na tentativa de compensar os néfrons que foram
lesionados e perdidos. A taxa de filtração glomerular (TFG) dos néfrons hipertrofiados se eleva
acima do normal, gerando uma certa sobrecarga. Esse mecanismo de compensação é eficiente até
certo ponto. Em decorrência da eficiência da reserva funcional, mesmo os rins tendo uma perda
de até 50% de sua função, não existem distúrbios clinicamente significativos. Porém quando a
função renal continua decaindo com o passar do tempo, até ter uma perda maior que 50% de sua
função, os néfrons compensatórios são forçados ao limite de sua capacidade compensatória e
também perdem sua capacidade funcional, tendo como resultado a perda total da filtração
glomerular. A partir daí o animal inicia o estágio moderado a severo da doença (G. ZAKAR,
2008).
Existe um sistema de classificação gerado pela Sociedade Internacional de
Interesse Renal (IRIS - International Renal Interest Society). Esse sistema classifica a doença
renal em quatro estágios, de acordo com as concentrações séricas de creatinina, nível de função
renal e manifestações clínicas (Quadro 1) (HEINE, 2009).
22

Quadro 1 Sistema de classificação da doença renal crônica em cães


Creatinina
Etapas plasmática Características
mg/dl
- Não azotemico
- Alterações renais funcionais podem estar presentes.
<1.4 - Resultado de biopsia renal anormal.
1 - Imagem renal anormal
- Perda da reserva renal

- Azotemia renal leve


- Concentração de creatinina plasmática próxima do limite mais
2 alto
1.4 – 2.0 - Perda de 66% de néfrons ou mais
- Inicio da insuficiência renal
- Manifestações clínicas podem ou não estar presentes
- Azotemia renal moderada
- Os rins não conseguem excretrar substâncias indesejáveis da
2.1 – 5.0 corrente sanguínea de maneira eficiente e a doença se manifesta.
3 - Perda de 75% de néfrons ou mais
- Muitas manifestações clínicas estão presentes
- Azotemia renal severa
- Síndrome urêmica severa
4 >5.0 - Falência renal
- Perda de néfrons igual ou superior a 90%
- Manifestações clínicas graves evoluindo para o óbito
Fonte: (ELLIOT, 2008).
23

4.1 Faixa etária dos cães acometidos

A doença renal crônica é bastante freqüente na população de cães idosos, porém


pode ocorrer em cães de variadas idades. A idade média é em torno de 6.5 e 7 anos de idade
(ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004).

4.2 Etiologia

A etiologia da doença renal crônica pode ser congênita, familiar e adquirida


(Quadro 2). Suspeita-se de etiologia congênita e familiar; com base no histórico familiar do
animal; predisposição racial; idade em que a doença teve início; achados radiográficos e
ultrassonograficos, em exames de rotina como, por exemplo, rim policístico. A doença adquirida
pode ocorrer, em função de qualquer alteração que desencadeie uma lesão irreversível a qualquer
estrutura do néfron, tendo como resultado final a doença renal crônica (ETTINGER, S. J;
FELDMAN, E. C, 2004).
As causas da doença renal crônica não necessariamente são originadas
exatamente nos rins. As alterações que causam a doença podem ter origem: renal intrínseca, ou
seja, a alteração está presente no rim; pré-renal, que são alterações que antecedem o rim
(desidratação, cardiopatia, hipertensão), ou seja, fatores relacionados à perfusão renal e pós-renal,
que são alterações posteriores ao rim como processos obstrutivos (ANDRADE, S. F, 2008).
24

Quadro 2 Possíveis causas da doença renal crônica em cães


Neoplasia
• Primária
• Secundária
Doenças imunológicas
• Lúpus eritematoso sistêmico
• Glomérulonefrite
Nefrotoxinas
Isquemia renal
Causas Inflamatórias ou infecciosas
• Pielonefrite
• Leptospirose
• Cálculo renal
• Doenças hereditárias ou congênitas
• Hipoplasia ou displasia renal
• Rins policisticos
Nefropatia familiar: (Lhasa apso, Shih tzu, Rottweiller, Bernese
montain dog, Chow chow, Terra nova, Bull terrier, Shar-pei
chinês, Pinscher, Samoieda, Golden retriever, Poodle standard,
Cocker spaniel, Beagle, Bedlington terrier, Cairn terrier).
Obstrução do fluxo urinário
Idiopático
Fonte: (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
25

4.3 Fisiopatogenia

A fisiopatogenia da doença renal crônica pode ter natureza orgânica e sistêmica.


A principal alteração patológica que ocorre é a perda de néfrons e a diminuição da taxa de
filtração glomerular (TFG). Essa diminuição da TFG irá resultar em um aumento das
concentrações de determinadas substâncias que normalmente são excretadas do organismo
através dos rins e assim no decorrer da doença muitas dessas substâncias se acumulam no plasma.
Em decorrência da presença dessas substâncias no plasma em quantidade elevada, ocorre um
conjunto de manifestações clínicas, conhecida como síndrome urêmica caracterizada por um
desequilíbrio hídrico e eletrolítico, anemia, distúrbios neurológicos, distúrbios do trato
gastrointestinal, osteodistrofia, incompetência imunológica e alterações metabólicas (COUTO, C.
G; NELSON, R. W, 2005).
As substâncias cujas concentrações plasmáticas podem estar aumentadas em
cães com doença renal crônica, são basicamente, aminoácidos, amônia, aminas alifáticas e
aromáticas, creatinina, adenosina monofosfato cíclica, gastrina, glucagon, hormônio do cresci
mento, compostos de guanidina, indóis, hormônio paratireoideano, peptídeos, fenóis, fosfato,
polióis, derivados de purina e pirimidina, renina, ribonuclease e uréia (COUTO, C. G; NELSON,
R. W, 2005).
Além das funções excretora e reguladora, os rins também funcionam como
órgãos endócrinos e catabolizam variados hormônios peptídicos. Desse modo em função da
evolução da doença, alguns distúrbios hormonais também podem ocorrer. (COUTO, C. G;
NELSON, R. W, 2005).
A TFG dos néfrons hipertrofiados aumenta em animais com doença renal
crônica, na tentativa de manter uma função renal adequada. Em contrapartida a proteinúria e a
gloméruesclerose, ocorrem em função dessa hiperfiltração. (COUTO,C. G; NELSON, R. W,
2005).
A progressão da doença está relacionada a vários fatores. Um deles é
principalmente o próprio mecanismo compensatório, que promove a manutenção da função renal
até certo ponto. A hipertensão intraglomerular, hiperparatireoidismo secundário renal,
hipertensão sistêmica, acidose metabólica, dislipidemias e infecções urinárias são consideradas
alterações importantes que contribuem para a progressão da doença (CASTRO, 2005).
26

5 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E CONSEQUENCIAS DA DOENÇA

A doença renal crônica inicialmente se manifesta como uma diminuição da


função renal, porém não é diagnosticada pois os mecanismos adaptativos e compensatórios
mascaram tanto as lesões quanto seus efeitos no animal (CASTRO 2005).
O aparecimento das manifestações clínicas dependem da gravidade da doença
renal e da sua causa primária e são relativamente discretos conforme a magnitude da azotemia
(COUTO,C. G; NELSON, R. W, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
As manifestações clínicas são decorrentes da incapacidade dos rins, em excretar
resíduos metabólicos e controlar adequadamente o equilíbrio hidroeletrolítico e acido-básico
(BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

5.1 Azotemia e uremia

A azotemia é o principal achado laboratorial, presente em animais com doença


renal crônica. É definida como um aumento das concentrações de creatinina, nitrogênio uréico e
outros produtos metabólicos não protéicos presentes no sangue (COUTO, C. G; NELSON, R. W,
2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
Após a detecção da azotemia é extremante importante identificar se suas causas
são pré-renais, renais ou pós-renais. A azotemia pré-renal ocorre em decorrência de alterações
que reduzem a perfusão renal como, por exemplo, desidratação, insuficiência cardíaca ou
hipovolemia. Azotemia renal é secundária a alterações no próprio parênquima renal e a azotemia
pós-renal ocorre em decorrência de processos obstrutivos no trato urinário (BIRCHARD, S. J;
SHERDING, R. G, 2008).
Os animais que apresentam doença renal crônica irão desenvolver a uremia. Em
decorrência da uremia, começa a surgir um conjunto de manifestações clínicas como,
gastroenterite, úlceras bucais, acidose metabólica, pneumonite, osteodistrofia, encefalopatia
dentre outros. Esse conjunto de manifestações clínicas é denominado de “síndrome urêmica”
(ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004; COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
27

Também podem ocorrer alterações neurológicas, como confusão mental,


letargia, tremores, andar alterado, mioclonias, convulsões, esturpor e coma. A maioria dos sinais
neurológicos são decorrentes da uremia, ou secundários ao hiperparatireoidismo (HOSKINS, J.
D, 2008).

5.2 Alterações físicas

Inicialmente cães com doença renal crônica não apresentam alterações físicas,
porém quando passam para o estágio em que as manifestações clínicas se tornam aparentes, é
possível observar algumas alterações. O aspecto do pelame se torna opaco e sem brilho e
principalmente a perda de massa muscular torna o animal cada vez mais caquético (HOSKINS, J.
D, 2008).

5.3 Poliúria e polidipsia

A poliúria e polidipsia são as primeiras manifestações clínicas que os


proprietários referem. Ambas ocorrem como resposta compensatória à incapacidade de
concentração urinária. A diminuição da concentração sérica de potássio e das vitaminas do
complexo B são secundárias a poliúria (CASTRO, 2005).
A polidipsia é compensatória a poliúria. Caso a ingestão de fluidos não
acompanhe a perda de líquidos pelo urina o animal irá desenvolver uma desidratação, em
decorrência da incapacidade dos rins em reter líquidos e eliminar metabólicos (ETTINGER, S. J;
FELDMAN, E. C, 2004).
28

5.4 Alterações gastrointestinais

As alterações gastrointestinais são bastante freqüentes em animais com síndrome


urêmica. Inicialmente o animal apresenta apetite seletivo para determinados tipos de alimento e
pode evoluir para uma anorexia e subseqüente perda de peso (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E.
C, 2004).
O vômito e a anorexia são decorrentes dos efeitos das toxinas urêmicas em
contato com a mucosa do trato gastrointestinal, pela estimulação de quimiorreceptores por
toxinas urêmicas e pela sensibilização do trato gastrointestinal decorrente da vasculite urêmica.
O aumento na freqüência dos vômitos está relacionada com a magnitude da azotemia. Em
decorrência da gravidade da uremia pode ocorrer uma gastrite ulcerativa, que resulta em
hematêmese (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004; COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
Em conseqüência da perda da função renal, pode haver uma hipergastrinemia.
Cerca de 40% da gastrina circulante é metabolizada pelos rins. Em decorrência da perda da
função renal, as concentrações de gastrina permanecem elevadas. A gastrina induz a produção da
secreção acido gástrico favorecendo a formação de úlceras em decorrência da acidez em excesso.
Essa hiperacidez pode causar hemorragia gastrointestinal, náuseas e vômitos.(ETTINGER, S. J;
FELDMAN, E. C, 2004).
Os efeitos das toxinas urêmicas juntamente com a gastrite e o vômito podem
gerar úlceras orais, estomatite e glossite (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
Cães com síndrome urêmica grave desenvolvem enterocolite, sob a forma de
diarréia, sendo hemorrágica na maioria das vezes (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. J, 2004).
29

5.5 Alterações metabólicas

5.5.1 Acidose Metabólica

É uma anormalidade bastante freqüente em cães com doença renal crônica.


Ocorre em decorrência da incapacidade do rim em manter a regulação do equilíbrio ácido-básico,
através da eliminação urinária de íons hidrogênio. Como conseqüência da retenção do íon
hidrogênio ocorre uma diminuição da taxa de bicarbonato plasmático (ETTINGER, S. J;
FELDMAN, E. C, 2004; FERREIRA, et al, 2005).
As manifestações clínicas secundárias à acidose metabólica podem ser
caracterizadas por hiperventilação, anorexia, náusea, vômito, letargia, fraqueza, desgaste
muscular, perda de peso e má nutrição (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004).

5.5.2 Hiperfosfatemia

A hiperfosfatemia ocorre em decorrência da diminuição da excreção renal de


fosfato e também em função de dietas ricas em proteínas, uma vez que essa possui mais fósforo.
Essa hiperfosfatemia pode gerar algumas conseqüências como hipocalcemia,
hiperparatireiodismo secundário renal, calcificação de tecidos moles e principalmente um
agravamento na progressão da doença (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; ANDRADE, S. F,
2008).
30

5.5.3 Hipocalemia

A hipocalemia está associada à poliúria e anorexia. Cães que apresentam poliúria e


anorexia perdem potássio através da urina e pela carência nutricional. É considerada uma
hipocalemia severa quando as concentrações séricas de potássio estiverem abaixo de 2,5 mEq/L
(ANDRADE, S. F, 2008).

5.5.4 Hipercalemia

A hipercalemia, definida como a retenção de potássio no plasma, é comum em


pacientes que apresentam oligúria. Os rins afuncionais, por não estarem produzindo urina, não
permitem que a excreção dos excessos de potássio ocorra, sendo considerada severa quando o
potássio sérico for superior a 8 mEq/L. Alterações cardiovasculares podem ocorrer, como
variações no eletrocardiograma e anormalidade de condução cardíaca. Trata-se do principal
distúrbio eletrolítico, representando risco de morte aos cães (ANDRADE, S. F, 2008).

5.6 Proteinúria

A proteinúria nada mais é do que um aumento na excreção urinária de proteínas,


sendo considerada como um dos principais indicadores de lesão e disfunção glomerular. Sabe - se
que dietas ricas em proteínas contribuem para o aumento da excreção protéica através da urina.
Em decorrência disso o ideal é que pacientes que apresentam doença renal crônica tenham uma
dieta restrita em proteínas, com o objetivo de diminuir a concentração sérica de uréia e também a
proteinúria (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004).
31

5.7 Hipertensão arterial

A hipertensão arterial esta presente na maioria dos cães que apresentam doença
renal crônica. Trata-se de uma complicação bastante freqüente no decorrer da doença. Ainda não
se sabe exatamente que mecanismos estão envolvidos em relação à hipertensão. Sabe-se que a
diminuição da capacidade renal em excretar sódio e alterações no sistema renina-angiotensina-
aldosterona estão intimamente ligados à hipertensão (CASTRO, 2005).
Segundo Couto (2005) “embora o exato mecanismo responsável por causar
a hipertensão seja desconhecido, pode haver envolvimento de uma combinação da
cicatrização capilar e arteriolar glomerular, uma diminuição da produção de
prostaglandinas vasodilatadoras renais, uma responsividade aumentada aos mecanismos
normais de pressão e ativação do sistema renina – angiotensina”.
Cães que apresentam doença renal crônica associada com hipertensão arterial
apresentam maior risco em desenvolver a crise urêmica e maior índice de mortalidade. O controle
da pressão arterial está relacionado com a diminuição do tempo de evolução da doença
(CASTRO, 2005).
Algumas manifestações clínicas podem ocorrer, em conseqüência à hipertensão
arterial, como deslocamento de retina, cegueira, hifema, hemorragia retiniana e alterações
neurológicas (ANDRADE, S. F, 2008).
Segundo Andrade (2008) “a elevação da pressão arterial sistólica acima de
180mmHg em cães, em pelo menos três visitas hospitalares diferentes indica uma
hipertensão arterial sistólica, havendo indicação de terapêutica”.

5.8 Anemia

Cães com doença renal crônica moderada a avançada desenvolvem uma anemia
do tipo não regenerativa progressiva, decorrente da incapacidade funcional do rim em produzir o
hormônio eritropoetina. Conforme a anemia vai se agravando, cada vez mais, a doença vai
progredindo. Apesar da diminuição na produção de eritropoetina ser considerada a causa primária
32

da anemia, outros fatores estão envolvidos como efeito das toxinas urêmicas gerando um menor
tempo de sobrevida das hemácias e perda de sangue pelo trato gastrointestinal (COUTO, C. G;
NELSON, R. W, 2005; HOSKINS, J. D, 2008).

5.9 Hiperparatireoidismo secundário renal

Em decorrência da diminuição da excreção renal de fosfato, cães com doença


renal crônica desenvolvem hiperfosfatemia. Juntamente com a hiperfosfatemia, ocorre uma
diminuição na concentração da forma ativa da vitamina D. Com consequente redução da
absorção de cálcio através da mucosa intestinal, o que juntamente com a reabsorção tubular
prejudicada, leva à diminuição da concentração de cálcio plasmático (ETTINGER, S. J;
FELDMAN, E. C, 2004; COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
Em resposta a diminuição da forma ativa de vitamina D e subseqüente
hipocalcemia, a glândula paratireóide estimula a liberação do hormônio paratireoideano. O
paratormônio (PTH) facilita a excreção renal de fósforo, com o objetivo de diminuir a
hiperfosfatemia e aumenta a absorção de cálcio dos ossos, do trato gastrointestinal e a reabsorção
renal (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
O paratormônio é considerado a principal toxina urêmica que contribui para a
progressão da doença (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
O hiperparatireoidismo secundário renal pode trazer algumas conseqüências, que
favorecem a progressão da doença como osteodistrofia, neuropatia, supressão da medula óssea e
mineralização de tecidos moles. O acometimento de tecidos moles em decorrência da
mineralização pode gerar alterações irreversíveis nos néfrons e a função renal tende a diminuir
cada vez mais. O animal corre riscos de sofrer uma mineralização de tecidos moles, quando as
concentrações de cálcio e fósforo excederem 50 a 70 mg/dl para ambos (COUTO, C. G;
NELSON, R. W, 2005).
33

6 DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da doença renal crônica pode ser estabelecido através de uma


variedade de métodos, capazes de identificar os estágios da doença. Embora a doença possa
acometer cães de todas as idades, sabe-se que cães idosos são a maioria dos pacientes renais
crônicos, e que somente irão apresentar manifestações clínicas, quando a doença estiver
avançada, sendo que no inicio não existem alterações perceptíveis ao proprietário. Em
decorrência disso, é importante que cães com idade entre 6.5 e 7 anos, realizem consultas de
rotina anualmente, avaliando sempre a função renal. Através das consultas de rotina, é possível
diagnosticar a doença em seu estagio inicial. A doença renal crônica quando diagnosticada
precocemente, evolui de forma muito mais lenta prolongando ainda mais a vida do animal
(CASTRO, 2005).

6.1 Histórico e exame físico

As informações provenientes dos proprietários são extremante importante para o


diagnóstico. Os proprietários são a principal fonte de informação, pois são eles que convivem
com o animal diariamente, avaliando sempre o que estão habituados a fazer. Através do histórico
do animal é possível esclarecer informações como a quanto tempo o animal apresenta
determinadas manifestações clínicas, se está tomando muita ou pouca água, se está urinando
muito ou pouco e se apresenta alterações de apetite. Além das informações relacionadas às
manifestações clínicas, com base no histórico, é possível identificar uma provável causa que
possa estar gerando uma lesão renal (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
O exame físico também é extremante importante, pois avalia as condições físicas
do animal, como hidratação, que pode ser avaliada através da elasticidade cutânea e da umidade
das membranas mucosas. Presença de úlceras na cavidade bucal também podem ser vistas. Deve-
se avaliar ainda alterações oftálmicas como deslocamento de retina e vasos tortuosos, palidez,
temperatura retal, tempo de preenchimento capilar, entre outros (BIRCHARD, S. J; SHERDING,
R. G, 2008).
34

6.2 Avaliação laboratorial

A avaliação laboratorial juntamente com a anamnese e o exame físico possibilita


a detecção das alterações e conseqüências da doença renal crônica. Os exames laboratoriais de
eleição para o diagnóstico da doença são basicamente hemograma completo, bioquímica sérica,
hemogasometria (detecta acidose metabólica), exame de urina tipo 1 e urocultura (CASTRO,
2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
No hemograma completo, a alteração mais freqüentemente encontrada é uma
anemia não regenerativa normocítica normocrômica. A hiperproteinemia, também pode estar
presente em função de possíveis doenças inflamatórias, infecciosas ou neoplásicas, que podem
estar presentes concomitantemente a doença renal. Alterações nos glóbulos brancos, também
podem indicar infecções (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
No perfil bioquímico é possível detectar alterações metabólicas como
hiperfosfatemia, hipocalemia, hipercalcemia ou hipocalcemia. Além de alterações metabólicas é
possível avaliar a taxa de filtração glomerular através das dosagens de uréia e creatinina sérica. A
interpretação dos resultados referente às concentrações de uréia e creatinina sérica devem ser
muito criteriosa. Ambas podem estar aumentadas indicando uma azôtemia do tipo pré-renal, renal
ou pós-renal. A creatinina sérica é a principal indicadora da taxa de filtração glomerular, estando
alterada na grande maioria dos pacientes com doença renal crônica. Os parâmetros considerados
normais na concentração de creatinina sérica no cão é de 1.0 a 2.0 mg/dl. A uréia não é uma boa
indicadora do funcionamento renal quando comparada a creatinina, já que pode sofrer alterações
em função da ingestão de proteína da dieta. A contração sérica normal de uréia no cão é de 10 a
30 mg/dl. A partir do momento que os níveis de uréia e creatinina estão acima dos valores
normais, pode –se considerar como uma azotemia (CASTRO, 2005; LOPES, et al, 2007).
O exame de urina tipo 1 fornece alguns dados importantes no diagnóstico da
doença renal crônica, sendo os mais importantes densidade urinária e proteinúria. A densidade
urinária é o principal indicador relacionado à incapacidade de concentração urinária e
consequente isostenúria (densidade urinária de 1,008 a 1,013). Os valores da densidade urinária
considerados normais são de 1016 a 1046 (CASTRO, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R.
G, 2008).
35

A proteinúria também detectada através do exame de urina tipo 1, deve ser


analisada correlacionada à densidade urinária, e pode estar associada a diferentes causas de lesão
renal, como por exemplo hipertensão arterial, glomerulonefrite e outras causas pós – renais, como
inflamação ou infecção (CASTRO, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
A urocultura pode detectar infecções bacterianas inaparentes, no trato urinário
inferior e o antibiograma determina a sensibilidade das bactérias aos antimicrobianos (CASTRO,
2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

6.3 Exame radiográfico e urografia excretora

Através de um simples exame radiográfico de abdômen, pode ser possível


avaliar o tamanho reduzido dos rins, contornos irregulares e outras anormalidades como urólitos
radiopacos (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; HOSKINS, J. H, 2008).
A urografia excretora não é muito utilizada em pacientes que sofrem de doença
renal crônica, justamente por apresentarem uma diminuição da excreção renal, em decorrência da
incapacidade funcional dos rins. Através da urografia excretora é possível detectar alterações
como hidronefrose e uropatia obstrutiva (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

6.4 Exame ultrassonográfico

O exame ultrassonográfico é capaz de demonstrar anormalidades de tamanho,


arquitetura interna, aspecto do parênquima renal, presença de neoplasias, nefropatia obstrutiva,
nefrolitíase, rins policísticos ou displasia renal. Geralmente o exame ultrassonográfico, revela as
corticais renais difusamente hiperecóicas, com perda do limite corticomedular normal. Esse
aumento da ecogenicidade da cortical indica a substituição dos néfrons lesionados por tecido
fibroso cicatricial, sendo esta uma lesão irreversível (CASTRO, 2005; COUTO, C. G; NELSON,
R. W, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
36

6.5 Pressão sanguínea sistólica

A pressão sanguínea sistólica deve sempre ser mensurada em pacientes com


doença renal crônica, pois 50 a 90% dos cães apresentam hipertensão arterial. Devem ser feitas
três mensurações consecutivas das pressões sistólica, média e diastólica, obtendo sempre a média
desses valores. A hipertensão é caracterizada por apresentar uma pressão sistólica superior a 180
mmHg, pressão média superior a 150 mmHg ou pressão diastólica superior a 120 mmHg
(BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

6.6 Biópsia renal

A biópsia renal não é muito realizada em pacientes com doença renal crônica.
Apesar de não ser muito praticada, pode ser indicada nos casos em que os resultados encontrados
possam permitir modificações no tratamento, ou esclarecer a gravidade da lesão, definindo um
prognóstico mais preciso. Com base no histopatológico é possível encontrar alterações como
glomeruloesclerose, atrofia glomerular, presença de células mononucleares (linfócitos,
plasmócitos e macrófagos), perda de túbulos renais em decorrência da substituição por tecido
fibroso ou mineralização tecidual (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; BIRCHARD, S. J;
SHERDING, R. G, 2008).
37

7 TRATAMENTO

Apesar da doença renal crônica ser irreversível, é possível amenizar a gravidade


das manifestações clínicas e prolongar a vida do animal. O objetivo do tratamento é amenizar os
distúrbios responsáveis pela progressão da doença (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
O tratamento é considerado como de suporte e conservativo, minimizando as
conseqüências da redução das funções renais, como vômitos, anorexia, anemia,
hiperparatireoidismo secundário renal, hipertensão arterial, acidose metabólica, infecções
urinárias dentre outros. Além de amenizar as manifestações clínicas da doença, o combate das
possíveis causas que eventualmente forem diagnosticas também são de extrema importância
(CASTRO, 2005; HOSKINS, J. H, 2008).
O tratamento engloba diversas medidas terapêuticas como, correção de
distúrbios metabólicos, correção de distúrbios gastrointestinais, remoção de possíveis tumores ou
urólitos, administração de agentes antibióticos para o tratamento de pielonefrite bacteriana,
administração de agentes antifúngicos para o tratamento das infecções fúngicas entre outras
(HOSKINS, J. H, 2008).
É extremante importante que os proprietários estejam conscientes de que o
tratamento irá se prolongar pelo resto da vida do animal, que deve ser acompanhado e tratado
diariamente (CASTRO, 2005).

7.1 Fluidoterapia

A fluidoterapia parenteral trata-se da alternativa terapêutica mais importante


para cães que estão em crise urêmica. Os objetivos da fluidoterapia envolvem correção dos
distúrbios eletrolíticos e ácido - básicos, expansão do volume extracelular, estimulação da diurese
em pacientes oligúricos e principalmente redução da azotemia (ANDRADE, S. F, 2008).
As vias de administração da fluidoterapia podem ser intravenosa ou subcutânea,
sendo que a via de escolha no inicio da terapia é a intravenosa já que sua absorção é mais rápida
38

do que pela via subcutânea. A via subcutânea é utilizada com maior freqüência em pacientes
mais estáveis, auxiliando na hidratação e reposição de eletrólitos (ANDRADE, S. F, 2008).
Em decorrência da polidipsia compensatória a poliúria, é extremamente
importante que o animal tenha sempre disponível água limpa e fresca. Caso o animal não consiga
compensar a poliúria através da polidipsia ficará desidratado. Essa desidratação terá como
conseqüência uma queda rápida e grave na função renal. Neste caso é indicada a fluidoterapia
subcutânea diária, tomando sempre o cuidado de não exceder as necessidades de manutenção,
podendo haver uma sobrecarga de fluidos (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; ANDRADE,
S. F, 2008).
A quantidade de fluido necessária está relacionada com o grau de desidratação
do animal e requerimentos para a manutenção e perdas continuas de líquidos como vômitos,
diarréia e volume urinário. Na maioria dos casos, os proprietários aprendem a realizar a
fluidoterapia subcutânea diariamente (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; ANDRADE, S. F,
2008).
Os fluidos de escolha na fase inicial da reidratação podem ser Ringer-lactato ou
solução de NaCl 0.9%. Na manutenção podem ser utilizados os fluidos NaCl 0.45% ou glicose
5% (ANDRADE, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
A eficácia da fluidoterapia pode ser notada quando a creatinina e a uréia sérica
se estabilizarem em um nível inferior, devendo a concentração de uréia permanecer abaixo de
100 mg/ dl. O vômito e a diarréia devem estar controlados, e o animal deve estar comendo e
bebendo. A resposta positiva aparece em torno de cinco ou seis dias de intensa fluidoterapia, no
entanto podem ser necessários mais dias de tratamento (ANDRADE, S.F, 2008).
A fluidoterapia não deve ser interrompida de forma brusca e sim diminuir sua
freqüência de forma gradativa. O ideal é a aplicação a cada 48 a 78 horas, com diminuição na
quantidade a cada dia. Caso haja perda de peso, aumento do hematócrito,concomitante com
aumento de proteína total, uréia ou creatinina recomenda-se voltar a administrar fluidos
diariamente (ANDRADE, S. F, 2008).

Pacientes oligúricos necessitam de outros tipos de avaliação, como monitoração


do débito urinário nas 24 a 48 horas iniciais da fluidoterapia, através da cateterização uretral. A
oligúria pode não estar presente no início, podendo surgir conforme a evolução da doença. A
39

oligúria absoluta ocorre quando a produção urinária é menor do que 1mL/kg/h, em cães
azotêmicos. Já a oligúria relativa ocorre quando a produção urinaria está em torno de 1 a
2mL/kg/h (ANDRADE, S. F, 2008).
A oligúria deve ser tratada logo após ser identificada pois pacientes oligúricos
possuem um prognóstico ruim. A estimulação da diurese através da utilização de diuréticos dever
ser feita somente em pacientes oligúricos que não estejam desidratados. Pacientes desidratados
não podem receber diuréticos, pois estes causam piora de desidratação e geram anormalidades
eletrolíticas que comprometem a função renal. A oligúria persistente após a correção da
desidratação pode ser tratada com diuréticos para estimular a produção de urina. É extremante
importante a monitoração do débito urinário durante o tratamento com diurético (ANDRADE,
2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
Tanto o manitol quanto a furosemida são utilizados em pacientes oligúricos
juntamente com a fluidoterapia. O manitol é um diurético osmótico, bastante utilizado na terapia
inicial. Não deve ser utilizado em pacientes com sobrecarga de fluido, edema pulmonar,
desidratado e animais com insuficiência cardíaca congestiva. Seus principais efeitos são aumentar
a perfusão sanguínea renal e eliminar radicais livres tóxicos. Se houver efetividade o débito
urinário deve aumentar em 1 hora aproximadamente. A dose recomendada é em torno de 0.25 a
1g/kg, por via intravenosa (ANDRADE, 2008; BIRCHARD, 2008).
A furosemida é um diurético de alça muito utilizado podendo ser associado com
o manitol e dopamina ou usado isoladamente. É utilizado pela via intravenosa nas doses de 2 a 6
mg/kg variando de acordo com o débito urinário. Normalmente é utilizado quando o diurético
osmótico não é efetivo (ANDRADE, S. F, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
A dopamina pode ser utilizada em associação com a furosemida. Trata-se de um
agonista adrenérgico, que promove vasodilatação renal. A dopamina é utilizada como última
tentativa na reversão da oligúria (ANDRADE, S. F, 2008).
A oligúria pode ser controlada até certo ponto. Caso o organismo do animal não
responda a mais nenhuma medida terapêutica, a única terapia alternativa seria a dialítica,
incluindo diálise peritonial ou hemodiálise, entretanto em cães com doença renal crônica, esse
tipo de terapia não é eficiente a longo prazo (ANDRADE, S. F, 2008).
40

7.2 Alterações gastrointestinais

Alterações gastrointestinais como náuseas, anorexia, vômitos, hematemese,


diarréia e ulcerações devem ser tratadas com o uso de bloqueadores de receptores H2 com
objetivo de reduzir a produção de ácido gástrico hidroclorídrico ou com o uso de bloqueadores da
bomba de hidrogênio. Em relação aos vômitos, podem ser controlados com o uso de antieméticos
como metoclopramida entre outros (Quadro 3). Tanto a náusea quanto a anorexia podem ser
controladas com uma alimentação mais palatável, associada a estimulantes de apetite como
ciproeptadina (Quadro 3) (ANDRADE, S. F, 2008).
Em relação às alterações bucais como estomatite e úlceras orais, podem ser
tratadas inicialmente através da manutenção higiênica bucal, promovendo lavagens com soluções
de clorexidina a 0.1% ou 0.2 % a cada 6 ou 8 horas. A dor secundaria a necrose de língua, pode
ser amenizada com analgésicos tópicos como lidocaína, aplicando sempre antes das refeições
(ANDRADE, S. F, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
41

Quadro 3 Fármacos utilizados na terapêutica das alterações gastrointestinais


Princípio ativo Indicação Nome comercial Dose
Cimetidina Gastrite - Cimetidina  2.5 -5 mg/kg, VO, 3x / dia
Ciproeptadina Anorexia - Cobactin  0.5mg/kg, VO, 1 - 2x/dia
- Cobavital 
Clorpromazina Antiemético - Amplictil  0.25 - 0.5mg/kg, VO, SC, IM, 3 - 4x/dia
Famotidina Gastrite - Famotil · 0.5mg/kg, VO, SC, IM, 1 - 2x/dia
- Famox 
Metoclopramida Antiemético - Plasil  0.2 - 0.5mg/kg, VO, SC, 1 - 3x/dia
- Metopram  Infusão: 1 mg/kg

- Vetol 
Omeprazol Gastrite - Petprazol  0.5 - 1mg/kg, VO, 1x/dia
- Gastrozol 
- Losec 
Ondasedrona Antiemético - Zofran  0.5- 1mg/kg, IV lenta, 2 - 4x/dia
Infusão: 1 mg/kg
Ranitidina Gastrite - Antak  1 - 2mg/kg, VO, SC, IM, 1 - 2x/dia
Infusão: 1 mg/kg
Sucralfato Úlcera gástrica - Sucralfilm  0.5 - 1g/cão, VO, 1- 3x/dia
Fonte: (ANDRADE, S. F, 2008).

7.3 Alterações metabólicas

7.3.1 Acidose metabólica

A acidose metabólica é considerada severa quando o pH sanguíneo for inferior a


7,15 ou quando o teor total de gás carbônico estiver inferior a 12 mEq/L, sendo extremante
necessário iniciar o tratamento. A acidose metabólica pode ser diagnosticada através da
42

gasometria, sendo possível também avaliar o déficit de bicarbonato (ANDRADE, S. F, 2008;


BIECHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
O tratamento pode ser realizado tanto com bicarbonato de sódio quanto com
citrato de potássio, sendo ambos administrados pela via oral (VO) ou intravenosa (IV). As doses
variam de acordo com a severidade da acidose. A dose oral do bicarbonato pode variar de 8 a 12
mEq/kg, podendo ser administrada duas vezes ao dia, iniciando sempre com uma dose baixa e ir
aumentando gradativamente de acordo com a severidade da acidose. Já a dose do citrato de
potássio pode variar de 8 a 12 mEq/kg, a cada doze horas. O citrato pode ser utilizado também no
tratamento da hipocalemia (Quadro 4) (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
Juntamente com a administração dos fármacos citados acima, é importante evitar
o uso de substancias acidificantes de urina que contribuem para o agravamento da acidose, e
também monitorar o teor de gás carbônico total, procurando mantê-lo dentro da faixa de
normalidade (18 a 24 mEq/ L) (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

Quadro 4 Fármacos utilizados na terapêutica da acidose metabólica


Princípio ativo Apresentação Dose
Bicarbonato de Bicarbonato de sódio a 8.4% IV: 1 – 5 mEq/ kg lento ou de acordo
sódio Ampolas 10 e 20 mL (1 mL= 1 com o déficit
mEq) VO: 8 – 12 mEq/ kg, a cada 12 horas.
Citrato de potássio Citrolit - Comprimidos de 540
mg VO: 8 – 12 mEq/ kg, a cada 12 horas.
Litocit - Comprimidos de 5 e
10 mEq
Fonte: (ANDRADE, 2008).
43

7.3.2 Hiperfosfatemia

O controle de a hiperfosfatemia dever ser feito inicialmente obedecendo a uma


dieta restrita em fósforo, porém somente esta medida terapêutica não é eficiente. O ideal é
associar a restrição de fósforo na dieta com quelantes entéricos de fósforo, com o objetivo de
promover um controle adicional (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; ANDRADE, S. F,
2008).
Os quelantes entéricos auxiliam na redução da hiperfosfatemia, pois evitam a
absorção de fósforo pelo trato intestinal. É importante considerar que a utilização de quelantes
entéricos não é eficiente caso o animal possua uma alimentação rica em fósforo. Em decorrência
disso, é necessário reduzir sua ingestão. Os quelantes entéricos utilizados em cães com doença
renal crônica são carbonato de alumínio ou hidróxido de alumínio. Ambos podem ser utilizados
nas doses de 10 a 30 mg/kg a cada 8 horas, pela via oral (VO) juntamente com a alimentação para
aumentar sua efetividade. Os quelantes á base de alumínio são utilizados inicialmente, pois
diminuem as chances de ocorrer a mineralização de tecidos moles. A concentração ideal de
fósforo sérico deve se manter abaixo de 6mg/dl (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005;
ANDRADE, S. F, 2008).
Mensurações a cada 15 dias das concentrações séricas de cálcio e fósforo,
devem ser feitas no intuito de permitir a avaliação da eficácia da terapia (HOSKINS, J. D, 2008).

7.3.3 Hipocalemia

Para pacientes que apresentam hipocalemia e não vomitam, é preferível que o


fornecimento de potássio seja pela via oral (VO). Também pode ser utilizada a via intravenosa
(IV), porém o que vai determinar a via que será utilizada em um primeiro momento é a
severidade da hipocalemia. A reposição oral de potássio pode ser realizada com a utilização do
gluconato de potássio (Tumil - K) de uma a duas vezes ao dia. Caso a severidade da hipocalemia
44

seja elevada, o ideal é realizar a administração de cloreto de potássio adicionado a fluidoterapia


pela via intravenosa (IV) (ANDRADE, S. F, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

7.4 Hiperparatireoidismo secundário renal

O tratamento para o hiperparatireoidismo secundário renal consiste em realizar


uma suplementação com calcitriol que nada mais é do que a forma ativa da vitamina D e manter
uma dieta restrita em fósforo, tendo como principal objetivo diminuir a liberação de
paratormônio (PTH) (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; ANDRADE, S. F, 2008).
A administração de baixas doses de calcitriol juntamente com o controle das
concentrações séricas de fosfato contribuem muito para a redução do hiperparatireoidismo
secundário renal (HOSKINS, J. D, 2008).
O tratamento com calcitriol só pode ser iniciado após a confirmação do
hiperparatireoidismo, e o animal deve estar hidratado e sendo alimentado a base de uma dieta
com teores reduzidos de fósforo. Antes e durante a administração da suplementação com o
calcitriol é necessário manter as concentrações de fósforo menores que 6.0 mg/dL, sendo que o
produto das concentrações de cálcio e fósforo deve ser menor que 70 mg/dl (COUTO,C. G;
NELSON, R. W, 2005; HOSKINS, J. D, 2008).
O calcitriol promove uma redução da liberação do paratormônio (PTH),
diminuindo as manifestações clínicas geradas pelo hiperparatireoidismo secundário renal. As
doses variam de 1.5 a 3.5 ng/kg sendo administras na fase inicial do hiperparatireoidismo, quando
a creatinina sérica estiver superior a 2mg/dl. O calcitriol pode ser administrado pela via oral
(VO), diariamente ou em pulso nos casos de hiperparatireoidismo avançado. As dosagens
adequadas para os cães devem ser formuladas por farmácia de manipulação, pois as
apresentações do calcitriol de uso humano não são adequadas para a espécie canina. É importante
realizar a mensuração da concentração basal de paratormônio sérico antes e durante a
suplementação, com o objetivo de avaliar a eficiência da suplementação com calcitriol associado
à dieta reduzida em fósforo. Dependendo da concentração sérica de paratormônio, ajustes na dose
de calcitriol podem ser feitos. A mensuração das concentrações séricas de cálcio e fósforo
45

também deve ser feita antes e durante a suplementação, avaliando sempre a eficiência da
suplementação (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; HOSKINS, J. D, 2008).
Durante o acompanhamento clínico um perfil bioquímico sérico deve ser feito
na primeira semana e depois mensalmente após o inicio do tratamento, com o objetivo de
prevenir uma hipercalcemia ou uma hiperfosfatemia. Caso ocorra uma hipercalcemia, mesmo
com doses baixas de calcitriol, basta suspender sua administração. Em relação a uma eventual
hiperfosfatemia, basta reduzia ainda mais o teor de fósforo na dieta e aumentar a dose dos
quelantes entéricos de fosfato (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).
A concentração sérica do paratormônio (PTH), deve ser mensurada, um mês,
três e seis meses depois do tratamento, avaliando se sua concentração esta dentro da faixa
normalidade, confirmando a eficiência da suplementação com o calcitriol (COUTO, C. G;
NELSON, R. W, 2005).

7.5 Hipertensão arterial

Em decorrência das complicações geradas pela hipertensão, é extremamente


importante promover sua monitoração e controle. Dietas com baixo teor de sódio e proteínas
representam um controle não farmacológico da hipertensão, porém não é possível manter a
pressão arterial dentro da normalidade, somente com uma dieta balanceada e sim associa –lá aos
fármacos anti-hipertensivos. Atualmente existem rações elaboradas para cães com doença renal
crônica, que já possuem em sua formulação uma restrição tanto em proteínas quanto em sódio
(HOSKINS, J. D, 2008).
Os fármacos anti-hipetensivos atualmente utilizados são basicamente os
inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), bloqueadores dos canais de cálcio,
betabloqueadores e diuréticos (BICHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; HOSKINS, J. D,
2008).
Os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), são os fármacos
anti-hipertensivos de escolha utilizados em cães hipertensos, sendo os mais utilizados o enalapril
ou benazepril. Suas doses variam de (0.25 a 0.5 mg/kg a cada 12 a 24 horas). Seu efeito consiste
em inibir a formação da angiotensina II, impedindo a vasoconstricção da arteríola eferente
46

permitindo uma vasodilatação da arteríola eferente, tendo como resposta uma diminuição da
pressão sanguínea. É importante iniciar o tratamento com doses baixas, pois os (IECA) podem
agravar a função renal. O captopril deve ser evitado justamente pelo fato de possuir uma maior
capacidade de lesionar os rins, em comparação aos outros (IECA) (BIRCHARD, S. J;
SHERDING, R. G, 2008; ANDRADE, S. F, 2008).
Os bloqueadores dos canais de cálcio promovem uma vasodilatação e redução
da pressão sanguínea. O anlodipino (Norvasc), possui longa duração sendo bastante efetivo,
porém é mais utilizado em gatos (ANDRADE, S. F, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G,
2008).
Os betabloqueadores também auxiliam no controlo da pressão sanguínea por
meio da redução da atividade simpática, diminuindo o débito cardíaco, tendo como conseqüência
a redução da pressão sanguínea. São basicamente o atenolol e propanalol, sendo ambos
administrados nas doses de 0.25 a 1mg/kg pela via oral (VO) (ANDRADE, S. F, 2008).
Diuréticos também podem ser utilizados em associação aos fármacos anti -
hipertensivos, porém geram muitos efeitos colaterais como desidratação, diminuição da perfusão
renal, levando à progressão da doença (ANDRADE, S. F, 2008).
Espera - se que a pressão arterial diminua nas primeiras 12 a 48 horas, após a
administração dos fármacos anti - hipertensivos. O principal objetivo da utilização desses
fármacos é manter a pressão sanguínea sistêmica dentro da normalidade (sistólica inferior a 160
mmHg e diastólica inferior a 90 mmHg. Em relação aos efeitos colaterais, podem ocorrer
alterações como hipotensão, fraqueza, letargia ou anorexia (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R.
G, 2008; HOSKINS, J. D, 2008).
Para realmente avaliar a eficácia da terapia é importante realizar a monitoração
da pressão sanguínea a cada uma ou duas semanas, até que ela se estabilize, e em seguida espaçar
para cada um ou três meses (BICHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; ANDRADE, S. F, 2008).

7.6 Anemia

Alguns fatores devem ser considerados em relação ao manejo terapêutico da


anemia não regenerativa. É importante considerar que o controle das manifestações clínicas
47

decorrentes da anemia está intimamente relacionado com a melhora no quadro clínico e na


qualidade de vida. Inicia -se o tratamento quando o animal começa a apresentar manifestações
clínicas como fadiga, depressão, fraqueza ou angustia respiratória tendo seu hematócrito inferior
a 30 % (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
Cães que apresentam uremia grave podem necessitar de uma transfusão de
sangue total para correção rápida da sua anemia. Geralmente realiza –se uma transfusão em
pacientes com manifestações clínicas graves como dispnéia e letargia extrema, tendo um volume
globular inferior a 17 %. Alguns animais acabam necessitando de mais de uma transfusão
(ANDRADE, S. F, 2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R.G, 2008).
É extremante importante realizar o teste de compatibilidade sanguínea antes do
inicio da transfusão minimizando os riscos de incompatibilidade com consequente reação
transfusional, lembrando que os cães apresentam uma variedade de tipos sanguíneos. Espera-se
um hematócrito pós transfusional no limite inferior da faixa de variação normal, evitando um
aumento súbito no volume sanguíneo. A transfusão sanguínea é eficiente em curto prazo tirando
o animal da uma anemia severa, porém a longo prazo necessita ser associada a eritropoetina,
sendo um estimulo para a produção de hemácias endógenas (ANDRADE, S. F, 2008; HOSKINS,
J. D, 2008).
Há tempos atrás anabolizantes esteróides eram muito utilizados na terapêutica da
anemia, porém atualmente seu uso é desapontador em comparação com a eritropoetina humana.
Os efeitos dos esteróides são mínimos podendo demorar até meses (COUTO, C. G; NELSON, R.
W, 2005; HOSKINS, J. D, 2008).
Atualmente a terapia de escolha para anemia não regenerativa em cães com
doença renal crônica é a eritropoetina humana recombinante (Epogen) associada à reposição de
ferro. A eritropoetina trás uma variedade de efeitos benéficos. Além de aumentar a contagem de
hemácias, hematócrito e concentração de hemoglobina, causa também um aumento de energia
apetite e vigor. Sua resposta é relativamente rápida e efetiva no primeiro mês de tratamento
(ANDRADE, S. F, 2008; HOSKINS, J. D, 2008).
Existe um ponto negativo relacionado com o fato de sua forma comercial
disponível ser humana, aumentando as chances de cerca de 20 a 40% dos pacientes em produzir
anticorpos antieritropoetina humana após 30 a 90 dias de sua administração, tendo como
conseqüência a dependência da transfusão sanguínea. Quando inicia a produção de anticorpos
48

antieritropoetina, como resposta ocorre um declínio progressivo no hematócrito, porém após a


interrupção da administração, os títulos de anticorpos antieritropoetina tendem a diminuir
(ANDRADE, S. F, 2008).
Antes de iniciar o tratamento com a eritropoetina humana recombinante, é
necessária a mensuração da pressão sanguínea sistólica, e se necessário promover o controle de
uma possível hipertensão. Também é importante avaliar as concentrações de ferro sérico, pois
caso o paciente apresente uma deficiência deste mineral, deve ser corrigida antes da
administração da eritropoetina. Essa deficiência de ferro é bastante freqüente em pacientes com
doença renal crônica, sendo corrigida com suplementos a base de sulfato ferroso, antes e durante
o tratamento com eritropoetina. A suplementação é feita diariamente pela via oral (VO) ou
parenteral, nas doses de 100 a 300 mg/kg. Alguns efeitos colaterais como vômitos e diarréias são
esperadas. Essa suplementação é necessária em decorrência da intensa demanda de ferro para que
ocorra a hematopoiese (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; ANDRADE, S. F, 2008).
Inicia-se a terapia com eritropoetina em cães com hematócrito entre 20 a 25 %,
tendo como principal objetivo mantê-lo entre 30 e 40%. A dose inicial varia de 50 a 100 UI/ kg,
sendo administrada pela via subcutânea, três vezes por semana. Sua administração é feita com
essa freqüência até que o hematócrito desejado seja alcançado. Na medida em que o hematócrito
desejado vai sendo atingido, recomenda-se diminuir a freqüência das administrações para duas
vezes por semana e posteriormente ir diminuindo também a dosagem. Caso o hematócrito
desejado não seja alcançado em torno de 6 a 12 semanas, recomenda-se aumentar a dose inicial e
a freqüência para três vezes por semana novamente. A resposta a essa terapia varia de animal
para animal, e deve ser monitorada com hemogramas freqüentes (COUTO, C. G; NELSON, R.
W, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; ANDRADE, S. F, 2008).
Alguns cuidados devem ser tomados durante a terapia com eritropoetina, como a
monitoração do paciente em relação aos possíveis efeitos colaterais; avaliar a porcentagem de
hematócrito semanalmente até que se atinja o valor esperado e posteriormente manter somente
uma dose de manutenção; avaliar as concentrações de ferro uma vez por mês e sempre
suplementar o paciente caso o teor sérico do mineral esteja inferior a 84 µL/dL e mensurar a
pressão sangüínea uma vês por mês no inicio do tratamento e caso se mantenha estável,
mensurar somente uma vez a cada dois meses (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2008;
BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
49

7.7 Antibioticoterapia

Paciente que apresentam doença renal crônica, possuem uma diminuição da


resistência a agentes infecciosos, decorrentes da imunidade baixa e como conseqüência se tornam
mais predispostos às infecções. (COUTO, 2005).
A antibioticoterapia realizada em cães com doença renal crônica deve ser
cuidadosa, evitando antibióticos nefrotóxicos como a gentamicina. Esse cuidado deve ser
tomado, pois muitos fármacos são excretados através dos rins, tendo como conseqüência um
acúmulo do fármaco na circulação sanguínea do animal (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005).

7.8 Manejo nutricional

Algumas alterações devem ser feitas em relação à alimentação de cães que


apresentam doença renal crônica. Sabe - se que uma dieta balanceada é extremante importante no
tratamento, pois a alimentação sem restrição moderada de determinados minerais pode ser um
fator contribuinte para progressão da doença, gerando um acúmulo de catabólitos protéicos
tóxicos e falhas na excreção renal. A restrição alimentar pode ser iniciada assim que a doença for
diagnosticada, pois os cães aceitam mais fácil a mudança da alimentação no inicio da doença em
decorrência de não estarem apresentando alterações gastrointestinais como vômitos e anorexia
(BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; HOSKINS, J. D, 2008).
A dieta deve ser balanceada e não totalmente restrita. Deve ser feita uma
moderada restrição no teor de proteína, sódio e fósforo basicamente. O manejo dietético contribui
muito para a redução das manifestações clínicas geradas pela uremia e prolonga a vida do animal
prevenindo a progressão da doença (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008; ANDRADE, S.
F, 2008).
Existem rações no mercado já formuladas que contém quantidades reduzidas de
proteínas, sódio e fósforo, porém é possível também oferecer uma dieta balanceada através da
alimentação caseira (Quadro 6) (HOSKINS, J. D, 2008).
50

Quadro 5 Dietas comerciais e exemplo de dietas caseiras


Dietas • Canine u/d, h/d, k/d (Hills)
comerciais • NF Kidney faliure canine formula (Purina)
• Renal program – dogs (Royal canin)
Dieta caseira 125 g de carne ou frango + 1 ovo grande cozido +
2 xícaras de arroz cozido sem sal + 3 fatias de pão branco picado + 1 colher de
chá de carbonato de cálcio + suplemento vitamínico – cerca de 500 g/dia para um
cão de 10 kg.
Fonte: (ANDRADE, S. F, 2008).

7.8.1 Restrição protéica

A dieta parcialmente restrita em proteínas possui o beneficio de controlar as


manifestações clínicas geradas pela uremia, em decorrência da redução de resíduos nitrogenados
gerados pelo catabolismo protéico. Os teores de proteínas recomendados para cães com doença
renal crônica variam de 2 a 2.2 g/kg ao dia, podendo ser oferecido tanto através de dietas
comerciais, como dietas caseiras (BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).
A dieta hipoproteica deve ser iniciada obrigatoriamente quando a uréia sérica
estiver acima de 75 mg/dl e a creatinina sérica estiver acima de 2.5 mg/dl (ANDRADE, 2008).
Restrições severas de proteína podem gerar conseqüências como má nutrição,
perda de peso, hipoalbuminemia e agravamento da anemia. Em função disso as dietas
hipoproteicas para cães devem conter cerca de 13 % de conteúdo protéico (ANDRADE, S. F,
2008; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

Segundo COUTO, (2005) em animais alimentados com dietas com redução


de proteína, deve - se ter em mente que os requerimentos energéticos do organismo tem
maior prioridade em relação ao anabolismo protéico; portanto, se os carboidratos e as
51

gorduras forem insuficientes para completar as necessidades calóricas, as proteínas


endógenas provavelmente serão quebradas e utilizadas como fonte de energia. O
catabolismo de proteínas endógenas para este propósito aumenta os produtos nitrogenados
que o rim deve excretar e axacerba as manifestações clínicas da doença renal.
A proteína oferecida a pacientes que sofrem de doença renal crônica, deve ser de
alto valor biológico com alta qualidade contendo apenas aminoácidos essenciais. A redução da
ingestão de proteínas esta relacionada com diminuição da ingestão de proteínas comparada a
ingestão normal (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2005; BIRCHAR, S. J; SHERDING, R. G,
2008).
Uma dieta restrita em proteínas, proporciona para o animal um peso corpóreo
estável, concentrações séricas de creatinina e albumina também estáveis e uma diminuição das
concentrações séricas de nitrogênio uréico e fósforo (COUTO, C. G; NELSON, R. W, 2008).

7.8.2 Cetoanálogos

O cetoanálogos são α- cetoácidos de aminoácidos desaminados, ou seja, suas


cadeias carbônicas não apresentam o grupo amino. Esses cetoácidos não possuem nitrogênio, não
gerando co – produtos nitrogenados, que teoricamente teriam que ser eliminados pelos rins. Os
cetoácidos além de diminuir os teores de uréia sérica, também servem como complemento
nutricional, pois fornecem aminoácidos de alto valor biológico.Os cetoanálogos captam o
nitrogênio da circulação e são transformados em aminoácidos essenciais. A administração de
cetoanálogos deve estar associada a uma dieta com baixa quantidade em proteínas. A forma
comercial dos cetoanálogos é o Ketosteril  ( da Fresenius Kabi de uso humano) podendo ser
utilizado em cães. Deve ser administrado na dose de um comprimido para cada 5 kg, dividindo a
dosagem em duas tomadas diárias. Deve ser administrado juntamente com as refeições
permitindo uma adequada absorção e metabolismo dos aminoácidos correspondentes. Seu efeito
demora alguns dias, e seu principal fator limitante é o custo (ANDRADE, S. F, 2008; G.
ZACAR, 2008).
52

7.8.3 Restrição de fósforo

O principal efeito esperado de uma dieta restrita em fósforo é a diminuição da


progressão do hiperparatireoidismo secundário renal, reduzindo também a mineralização de
tecidos moles. Além disso, proporciona uma redução das manifestações clínicas geradas pela
uremia. A própria dieta restrita em proteínas já contém menos fósforo, uma vez que a proteína é a
principal fonte de fósforo. Juntamente com uma dieta restrita em proteína, podem ser utilizados
quelantes entéricos de fósforo, conforme citado anteriormente (ANDRADE, S. F, 2008;
BIRCHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

7.8.4 Restrição de sódio

A restrição de sódio a princípio auxilia no controle da hipertensão arterial. Em


decorrência da diminuição da função do parênquima renal, os rins apresentam dificuldades em
manter a homeostasia do sódio tendo como conseqüência sua retenção, gerando um aumento na
pressão arterial. Essa restrição deve ser feita de forma gradativa e não de forma súbita, pois é
necessário que os rins tenham tempo para se adaptar as alterações na ingestão deste eletrólito. A
restrição de sódio não deve ser excessiva como na dieta de animais com insuficiência cardíaca
congestiva, e sim respeitar os requisitos mínimos do eletrólito (BICHARD, S. J; SHERDING, R.
G, 2008; ELLIOT, 2008).
Conclui – se que a composiçao da dieta é extremante importante para a
manutenção da homeostasia em pacientes que sofrem de doença renal crônica, ajudando também
a melhorar a qualidade de vida. As formulações dietéticas, juntamente com outras formas de
tratamento, devem sempre ser adaptadas as necessidades de cada paciente, baseando – se sempre
nas manifestações clínicas e alterações laboratoriais apresentadas (ELLIOT, 2008).
53

7.9 Hemodiálise

A hemodiálise é definida como um sistema de filtragem do sangue, realizado


através de um dialisador, ou “rim artificial”, que tem capacidade semelhante a de um rim normal.
Sua função é remover as toxinas acumuladas na corrente sanguínea. (WINGFIELD, 1998, apud:
CORSI, 2007; BERNSTEN, 2008, apud: HAAS, 2008).
É um recurso disponível em algumas regiões do Brasil, e seu principal objetivo é
manter por mais tempo a vida de pacientes que já não respondem mais ao tratamento
conservativo (CASTRO, 2005).
A hemodiálise é mais eficiente em pacientes com doença renal aguda, pois as
lesões presentes no parênquima renal podem ser revertidas. Em pacientes com doença renal
crônica, o uso da hemodiálise não tem a mesma eficiência do que em pacientes com doença renal
aguda, pois suas lesões são irreversíveis. A hemodiálise em pacientes crônicos retira o animal de
um quando agudo, limita a evolução da doença até certo ponto podendo aumentar o tempo de
sobrevida, porém não reverte as alterações estruturais e funcionais presentes em ambos os rins
(WINGFIELD, 1998, apud, CORSI, 2007).
Deve ser iniciada quando a concentração sérica de uréia exceder 90 mg/dl e a
concentração sérica de creatinina exceder 8 mg/dl. Pacientes que apresentam esses valores nas
concentrações séricas de uréia e creatinina, estão no limite eficaz do tratamento clínico
conservador, ou seja, todo tratamento aplicado já não é eficiente (ETTINGER, S. J; FELDMAN,
E. C, 2004).
Cães que apresentam concentrações séricas de creatinina entre 8 e 10 mg/dl,
necessitam de um esquema de diálise de duas vezes por semana. Já cães que apresentam
concentrações séricas de uréia e creatinina maior que 10 mg/dl, necessitam de três diálises por
semana (ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004).
54

7.10 Transplante renal

Essa técnica é considerada a melhor opção terapeutica para tratar pacientes com
doença renal crônica, embora seja difícil a aceitação do organismo ao órgão transplantado. O
transplante renal em cães não é muito praticado, em decorrência de um sucesso relativamente
baixo, quando comparado com transplante em gatos, além do custo ser bem maior do que em
gatos. Sabe – se que os cães não vivem mais do que um ano após o transplante (SALOMÃO,
2000, apud, HAAS, 2008; BICHARD, S. J; SHERDING, R. G, 2008).

7.11 Monitoração do paciente

Um acompanhamento clínico dos pacientes deve ser feito, avaliando a eficácia


do tratamento e as necessidades de ajustes da terapia. A freqüência de avaliação vai depender das
condições clínicas do paciente, podendo ser mais ou menos freqüente (COUTO, C.G; NELSON
R.W, 2005; BIRCHARD, S. J; SHERDING, R.G, 2008).
É importante avaliar as condições físicas do animal, como ingestão de água e
comida, ganho de peso e hidratação. Exames laboratoriais também devem ser feitos
regularmente, como hemograma completo, perfil bioquímico e urinálise basicamente.
Dependendo dos resultados, alguns ajustes no tratamento podem ser feitos conforme a doença vai
evoluindo (BICHARD, S. J; SHERDING, R.G, 2008).
55

8 PROGNÓSTICO

O prognóstico de pacientes que apresentam doença renal crônica é de reservado


a mau. Apesar dos avanços na ciência em relação ao tratamento da doença, a mortalidade e a
morbidade permanecem bem altas (ROMBEAU, 2005; PLUNKETT, 2006).
Embora esta enfermidade seja incurável, é possível que o animal conviva com a
doença, por determinado tempo, sendo submetido a uma variedade de medidas terapêuticas, com
o objetivo de amenizar as manifestações clínicas e prolongar a vida por meses e até anos
(ETTINGER, S. J; FELDMAN, E. C, 2004).
A melhor forma de controlar a progressão da doença, é através de um
diagnóstico precoce, onde as manifestações clínicas presentes ainda são brandas ou moderadas,
sendo mais fácil de serem controladas. É extremamente importante que o tratamento seja iniciado
o mais rápido possível. O entendimento dos fatores que contribuem para a progressão da doença,
também são importantes, para a decisão do tipo de tratamento ao qual o animal deverá ser
submetido (CASTRO, 2005).
A terapeutica da doença renal crônica é individual ou seja, varia de paciente para
paciente, tendo sempre como base as manifestações clínicas presentes no momento. Quanto mais
cedo o animal por submetido às medidas terapêuticas, maior será seu tempo de sobrevida,
priorizando sempre a qualidade de vida (CASTRO, 2005).
O diagnóstico precoce seguido do tratamento é a única forma de manter o
paciente vivo por mais tempo. Pode ser obtido através de consultas anuais, realizando exame
físico bem detalhado, juntamente com exames laboratoriais de rotina como, hemograma
completo, perfil bioquímico, urina tipo 1 e exame ultrassonográfico (CASTRO, 2005).
56

9 CONCLUSÃO

Com base nesta revisão bibliográfica, pude concluir que embora o paciente com
doença renal crônica receba todas as formas de tratamento, a doença continuará evoluindo de
forma progressiva, até que o paciente não resista as conseqüências da doença, vindo a óbito. Em
contrapartida apesar da doença continuar evoluindo de maneira progressiva, o tratamento, pode
ser eficiente amenizando as manifestações clinicas e as conseqüências da enfermidade, tornando
possível que a doença progrida de forma mais lenta, quando comparada a pacientes que não
receberam nenhum tipo de tratamento ou que receberam tratamento tardio.
Embora a doença seja incurável, é possível que o animal consiga conviver por
longos períodos de tempo, variando de meses e até anos, desde que ocorra o controle das
manifestações clínicas e das conseqüências da doença.
O tratamento da doença renal crônica deve ser iniciado o quanto antes, pois
quanto mais precocemente for diagnosticada, mais tempo de vida o paciente terá. O principal
objetivo do tratamento, além do controle das manifestações clínicas e conseqüências da doença, é
proporcionar para o paciente uma boa qualidade de vida. A partir do momento que o paciente
começa a demonstrar qualquer tipo de estresse ou sofrimento, é importante avaliar se realmente
vale a pena mantê-lo vivo, mesmo sofrendo. Parto do princípio de que não basta somente manter
o paciente vivo, mas sim mantê-lo vivo, com uma condição de vida próxima do normal. É
importante que animal, ande, coma, urine, defeque, e brinque; do contrário não vale a pena
mantê–lo vivo, somente por manter. Neste caso, a melhor conduta a ser tomada, é orientar o
proprietário, até que ponto é saudável manter seu cão vivo.
Além de a doença ser extremante grave e incurável, seu tratamento possui um
custo bastante elevado, conforme os problemas vão aparecendo. Muitos proprietários acabam
desistindo de tratar seus animais, em decorrência do custo elevado do tratamento, e também por
necessitar muito de sua disponibilidade, em relação a administração das medicações e realização
de exames de rotina.
A melhor conduta a ser feita em pacientes com doença renal crônica é iniciar o
tratamento, o mais cedo possível e prolongar a vida do paciente, mantendo sempre sua qualidade
57

de vida. A partir do momento que o animal começa a demonstrar sofrimento e piora clínica, a
melhor opção é a eutanásia.
58

REFERÊNCIAS

ANDRADE, S F. Manual de Terapeutica Veterinária. 3a ed. São Paulo: Ed. Roca, 2008
(p 348 355).

BIRCHARD, S. J; SHERDING, R.G. Manual Saunders Clínica de Pequenos Animais. 3a ed.


São Paulo: Ed. Roca, 2008 (p 888 – 894).

CASTRO, M. C. N. Prolongando a vida do paciente com doença renal crônica. Revista


Clínica Veterinária. São Paulo, ano 20 n.58, p. 50 – 56, set/out 2005.

CORSI, Vanessa. Doença renal crônica em pequenos animais. f.37. Monografia – Faculdade
UCB, Medicina veterinária, São Paulo, 2007.

COUTO, C. G; NELSON, R. W. Medicina interna de pequenos animais. 3a ed. Rio de Janeiro:


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