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TRATADO DE
TRATADO DE
ANESTESIOLOGIA
ANESTESIOLOGIA
9a edição
Editores
volume 3
Luiz Marciano Cangiani
Maria José Carvalho Carmona
David Ferez
Carlos Othon Bastos
Leonardo Teixeira Domingues Duarte
Luis Henrique Cangiani
Luiz Fernando dos Reis Falcão
Maria Angela Tardelli
Rita de Cássia Rodrigues
volume 3
eE
editora dos
eE
editora dos
Editores Editores
Publicação Oficial da
Sociedade de Anestesiologia
do Estado de São Paulo
Editores
Luiz Marciano Cangiani
Maria José Carvalho Carmona
David Ferez
Carlos Othon Bastos
Leonardo Teixeira Domingues Duarte
Luis Henrique Cangiani
Luiz Fernando dos Reis Falcão
Maria Angela Tardelli
Rita de Cássia Rodrigues
eE
editora dos
Editores
ISBN: 978-65-86098-32-7
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
1a impressão – 2021 (11) 98308-0227
Este livro foi criteriosamente selecionado e aprovado por um Editor científico da área em que se inclui. A Editora dos
Editores assume o compromisso de delegar a decisão da publicação de seus livros a professores e formadores de opinião
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e gestores, cujo objetivo é lhe entregar o melhor conteúdo para sua formação e atualização profissional.
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Vários editores.
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ISBN 978-65-86098-32-7
21-57182 CDD-617.96
NLM-WO 200
David Ferez
Professor Adjunto da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Medicina Intensiva da Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Coordenador da Residência em
Anestesiologia MEC/SBA do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Anestesiologista
do Serviço Médico AMD do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Ex-Presidente da
Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo – SAESP (2002-2003).
Ademir Bonassa
Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do Hospital do Campo Limpo, São Paulo-SP.
Adilson Hamaji
Doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP. Supervisor de Anestesiologia e
Analgesia Pós-operatória do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo – IOT/HC-FMUSP. Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do
HC-FMUSP.
Adilson Toro Feitosa
Membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular – SBACV.
Adriana Erica Yamamoto Rabelo
Anestesiologista pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP. Anestesiologista do Grupo de Transplante
de Fígado do Hospital de Base da Fundação Faculdade Regional de Medicina de São José do Rio Preto – FUNFARME.
Adriana Lima Valério
Médica Anestesiologista do Hospital Pequeno Príncipe, Curitiba-PR.
Adriel Franco de Mattos
Instrutor do Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do Centro Médico Campinas. Anestesiologista do Departa-
mento de Anestesiologia e Terapia da Dor da Fundação Centro Médico Campinas e do Hospital Santa Sofia, Campinas-SP.
Adriene Stahlschmidt
Médica Anestesiologista do Serviço de Anestesia e Medicina Perioperatória do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – SAM-
PE/HCPA. Doutoranda em Ciências Médicas pelo Programa de Pós-graduação em Ciência Médicas da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Airton Bagatini
Responsável pelo Centro de Ensino e Treinamento da Sociedade de Anestesiologia – SANE. Coordenador da Perspectiva
Assistencial do Hospital Ernesto Dornelles, Porto Alegre-RS. Membro do Comitê de Segurança da Confederação Latino-
-americana de Sociedades de Anestesiologia – CLASA. Membro do Comitê de Qualidade e Segurança na Prática da World
Federation of Societies of Anaesthesiologists – WFSA. Membro da Câmara Técnica de Anestesiologia do Conselho Federal
de Medicina – CFM.
Alberto Vasconcelos
Doutor pela na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP. MBA em Gestão em Saúde. Médico Aneste-
sista do Hospital e Maternidade Pro Matre Paulista, São Paulo-SP.
Alex Madeira Vieira
Intensivista Pediátrico e Anestesiologista. Médico Titular do Departamento de Anestesiologia do A. C. Camargo Cancer
Center.
Alexandra Rezende Assad
Professora Associada de Anestesiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense – FM/UFF. Aneste-
siologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro – HUCFF/UFRJ.
Alexandre Fabricio Martucci
Mestre e Doutor em Anestesiologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo – FMB-
-UNESP.
vii
Cláudia Lütke
Mestre em Cirurgia Vascular, Cardíaca, Torácica e Anestesiologia pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal
de São Paulo – EPM-UNIFESP. Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia da Disciplina Anes-
tesiologia, Dor e Terapia Intensiva da EPM-UNIFESP. Coordenadora do VAS – Via Aérea Segura, Grupo de Ensino e Pesquisa
em Vias Aéreas, da Disciplina Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da EPM-UNIFESP.
Daniel de Carli
Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia da Disciplina Anestesiologia da Faculdade de Medi-
cina de Jundiaí – FMJ. Mestre em Ciências da Saúde pela FMJ. Doutor em Ciências da Saúde pela FMJ.
David Ferez
Professor Adjunto da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Medicina Intensiva da Escola Paulista de Medicina da Universidade
Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Coordenador da Residência em Anestesiologia MEC/SBA do Hospital da Beneficência
Portuguesa de São Paulo. Anestesiologista do Serviço Médico AMD do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Ex-Presidente da Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo – SAESP (2002-2003).
Edela Puricelli
Doutora pela Universidade de Düsseldorf, Alemanha. Professora Titular do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Fa-
culdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Docente do Programa de Pós-graduação
strictu sensu em Pediatria e Atenção à Saúde da Criança e ao Adolescente pela Universidade Federal de Ciências da Saúde
de Porto Alegre – UFCSPA.
Eduardo Helfenstein
Corresponsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia da Santa Casa de Misericórdia de Ribeirão Preto.
2º Tesoureiro da Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo – SAESP (2018-2019). Membro da Comissão Ensino e
Treinamento da SAESP.
Émerson Carlos
Membro do Serviço Anestesia e Analgesia de Araraquara – SAARA. Mestre em Anestesiologia pela Universidade Estadual
de São Paulo – UNESP. Professor-assistente I do Centro Universitário de Araraquara – UNIARA. Especialista em Gestão em
Clínicas de Saúde pelo Hospital Sírio-Libanês – HSL.
Estevão Bassi
Médico Intensivista Diarista da Unidade de Terapia Intensiva das Emergências Cirúrgicas do Hospital das Clínicas da Facul-
dade de Medicina da Universidade de São Paulo – HC-FMUSP. Médico Intensivista Diarista da Unidade de Terapia Intensiva
do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, São Paulo-SP. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina Intensiva
Brasileira – AMIB.
Flávio Takaoka
Doutor em Anestesia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo –FMUSP. Coordenador da Residência em
Anestesia do Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia do Hospital Israelita Albert Einstein.
Guilherme Moura
Gerente Médico do Departamento de Qualidade e Segurança da da São Paulo Serviços Médicos de Anestesia – SPSMA. Co-
ordenador do Serviço de Anestesia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, São Paulo-SP. Coordenador do Serviço de Anestesia
do Hospital e Maternidade Metropolitano, São Paulo-SP. Coordenador do Núcleo de Qualidade e Segurança da Sociedade
de Anestesiologia do Estado de São Paulo – SAESP.
Gustavo Meurer
Instrutor do Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia Integrado da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Cata-
rina – SES-SC.
Masashi Munechika
Professor Adjunto da Disciplina Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva Cirúrgica do Departamento de Cirurgia da
Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM-UNIFESP.
Milton Gotardo
Médico Anestesiologista do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo – HC-FMUSP. Médico da Equipe de Anestesiologia em Trauma e Emergências do HC-FMUSP.
Nelson Mizumoto
Doutor em Anestesiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP. Mestre em Farmacologia
pelo instituto de Ciências Biomédicas da FMUSP. Médico Supervisor do Serviço de Anestesia do Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HC-FMUSP.
Paula Nocera
Anestesiologista da São Paulo Serviços Médicos de Anestesia – SPSMA. Coordenadora do Curso de Ultrassonografia Point of
Care do Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa.
Pedro Rotava
Médico Anestesiologista do Instituto Nacional do Câncer – INCA. Mestre em Ciências Cirúrgicas pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro – UFRJ.
xxxiii
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xxxvii
TRATADO DE
ANESTESIOLOGIA 7a edição
EDITORES
VOLUME
Volume 1
xxxix
Capítulo 17 Sistema Nervoso Central: Aprendizado, Memória, Mecanismos Comportamentais e Motivacionais......... 291
Fabio Escalhão Renato Sena Fusari Adriel Franco de Mattos Caio Funck Colucci
Sumário xli
Sumário xliii
Capítulo 90 Avaliação do Paciente com Câncer. Influência das Técnicas e de Fármacos Anestésicos........................... 1391
Marcelo Sperandio Ramos Eduardo Henrique Giroud Joaquim Bruna Moraes Cabreira
Volume 2
Capítulo 115 Elementos de Anatomia. Tomografia Computadorizada e Ressonância Nuclear Magnética..................... 1821
Luciano de Andrade Silva Carlos Eduardo Esqueapatti Sandrin Alexandre Peroni Borges
Sumário xlv
Capítulo 137 Estágios da Recuperação da Anestesia. Aspectos Clínicos e Critérios de Alta........................................... 2433
André de Moraes Porto
Capítulo 157 Anestesia para Cirurgia de Correção das Malformações Congênitas do Recém-nascido.......................... 2791
Norma Sueli Pinheiro Módolo Lais Helena Navarro e Lima Rodrigo Moreira e Lima
Sumário xlvii
Volume 3
Capítulo 183 Anestesia para Litotripsia Extracorpórea por Ondas de Choque............................................................... 3263
Tulio Antonio Martarello Gonçalves
Capítulo 184 Anestesia para Cirurgia dos Rins e das Vias Urinárias................................................................................ 3269
Marcelo Negrão Lutti Tulio Antonio Martarello Gonçalves
Carlos Eduardo Esqueapatti Sandrin
Capítulo 187 Anestesia para Cirurgias Ortopédicas dos Membros Inferiores................................................................. 3313
Leonardo Teixeira Domingues Duarte Joel Gianelli Paschoal Filho
Sumário xlix
Capítulo 189 Fatores Determinantes da Pressão Intracraniana e da Pressão de Perfusão Cerebral............................... 3415
Ronaldo Contreiras de Oliveira Vinagre
Capítulo 199 Anestesia em Oftalmologia. Fisiologia Ocular, Interações e Técnicas Anestésicas..................................... 3571
Luiz Fernando Alencar Vanetti
Capítulo 201 Anestesia para Cirurgias Orais, Nasais, Seios da Face e Ouvidos............................................................... 3609
Carlos Eduardo Esqueapatti Sandrin Martin Affonso Ferreira
Capítulo 202 Anestesia para Microcirurgia da Laringe e para Retirada de Corpos Estranhos das Vias Aéreas............... 3625
Luis Henrique Cangiani
Sumário li
Capítulo 224 Indicações de Permanência na Unidade de Terapia Intensiva no Pós-operatório de Cirurgias não
Cardíacas.................................................................................................................................................... 4013
Suzana Margareth Lobo Loraine de Oliveira Fernandes Marina Ajeje Lobo
Índice Remissivo..................................................................................................................................................... I1
Sumário liii
Fisiopatologia do Choque
Introdução
O choque é uma condição caracterizada pela insuficiência circulatória associada ao risco de morte.
Os efeitos do choque são inicialmente reversíveis se forem rapidamente reconhecidos e tratados,
porém, quanto mais se prolonga o início do tratamento, maior serão as chances de se tornarem
irreversíveis, e progredir para falência de múltiplos órgãos e morte. Quando se identifica o estado
de choque, é importante o início imediato da terapia para reverter o choque e evitar a progressão
para disfunção de múltiplos órgãos e morte.1
Muitas vezes, os sinais clínicos de disfunção orgânica, como oligúria, alterações do sensório e
taquipneia, são as primeiras manifestações clínicas nos estados de choque.1
4043
DO2 crítica
Dependência fisiológica
ica
SvO2
óg
Gap CO2
tol
pa
VO2
cia
ên
nd
TEO2
pe
De
Lactato
DO2
Figura 227.1 Dependência fisiológica da oferta de O2. Quando a diminuição da DO2 atinge o ponto de DO2 crítico, o VO2
começa a declinar com relação linear à queda da DO2. A partir deste ponto, como a célula já alcançou a máxima capacidade
de compensação pela TEO2, a demanda metabólica pela síntese de oxigênio não é mais atendida; o que leva ao início do
metabolismo anaeróbico para produzir energia pela síntese do lactato. Em condições patológicas, estas curvas sofrem
alterações com maior dependência do VO2 em relação a DO2.
Fonte: adaptado de Vincent JL, De Backer D. Circulatory shock. N Engl J Med. 2013; 369:1726.
DO2 (mL.min–1)
aos tecidos, entre eles as variáveis que compõem o VS: pré- Hb
-carga, contratilidade e pós-carga (Figura 218.2).1-3 600 FiO2
A maior parte do oxigênio dentro dos vasos está ligada
400
à hemoglobina, sendo que apenas uma pequena parte se
encontra dissolvida no plasma. Cada molécula de hemoglo-
200
bina consegue se ligar a quatro moléculas de oxigênio, pelo 22% 9% 50%
48%
heme ligado às cadeias de globina que são quatro (Figura 0
227.3). O principal componente que consegue levar a gran-
des variações da DO2 é o débito cardíaco (Figura 227.4). Figura 227.4 Efeitos relativos das mudanças na DO2 pela
A queda da DO2 promove várias respostas compensa- otimização dos componentes do CaO2 (SaO2 e hemoglobina)
tórias com objetivo de atender a elevadas demandas teci- e DC em um paciente grave. DO2 em um indivíduo normal
duais de O2. Com a liberação de catecolaminas, a frequência de 75 kg em repouso é mostrado na barra branca, e DO2
cardíaca e a contratilidade do miocárdio aumentam, além em um paciente com hipoxemia, anemia e redução de DC
disso, promovem vasoconstrição para recrutar o volume é mostrado na barra preta. As barras coloridas mostram o
não estressado que se encontra no território venoso e con- efeito de intervenções sequenciais na DO2. Os números em
cada barra representam o aumento calculado da DO2 em
tribuir para aumento do débito cardíaco pelo aumento da
comparação com o valor anterior.
pressão média circulatória sistêmica e, por conseguinte, Fio2: fração de oxigênio inspirado; Hb: hemoglobina; DC: débito cardíaco;
aumento do retorno venoso. A liberação de hormônio anti- CaO2: conteúdo arterial de oxigênio.
Fonte: modificado de Huang. Huang, Y. C. Monitoring oxygen delivery in
diurético, assim como a ativação do sistema renina-angio- the critically ill. Chest. 2005; 128(5 Suppl 2):554S-560S.
tensina-aldosterona, também corroboram para a retenção
O2 dissolvido
no plasma
Pré-carga Contratilidade Pós-carga
β2 Hem β1
α2 α1
Figura 227.3 Molécula de hemoglobina com quatro sítios de ligação (heme) ao oxigênio.
Fonte: adaptado Amabis, J. M. & Martho, G. R. 2006. Fundamentos da Biologia Moderna: Volume único. 4ª Ed. Editora Moderna: São Paulo, 839 p.
60
↑ H+ conc. Esta é a forma anaeróbia de produção de energia para
↑ Temp. atender a demanda metabólica. A falta de oxigênio faz com
40 ↑ PCO2 que o piruvato não seja transformado em Acetil-COa para
↑ 2,3-DPG entrar no ciclo de Krebs (Figura 227.6), o que faz com que
20 seja transformado em lactato para adquirir energia.6
Este processo pode ocorrer não somente nas situações
em que exista falta de oxigênio, mas pode ocorrer em outras
20 40 60 80 1000 situações como descrita na Tabela 227.2. Chama-se de hi-
PO2 mmHg perlactatemia tipo A as situações em que a causa é a hipóxia
tecidual, e hiperlactatemia tipo B todas as outras causas.6,7
Figura 227.5 Deslocamentos da curva de dissociação O lactato pode ser utilizado como marcador de disfun-
da oxi-hemoglobina. O desvio para a esquerda mostra ção orgânica, como prognóstico e guia terapêutico na fase
aumento da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio. O aguda dos estados de choque. Na fase inicial do estado de
desvio para a direita ilustra a redução da afinidade. choque, devido aos mecanismos compensatórios para ten-
2,3 – difosfoglicerato; PCO2 – pressão parcial arterial de CO2; H+ - íons de
hidrogênio; Temp – temperatura; SATO2 – saturação arterial de oxigênio; tar manter a perfusão tecidual, a avaliação dos parâmetros
PO2 – pressão parcial arterial de oxigênio. clínicos pode se encontrar dentro dos valores da normali-
Fonte: Boveris DL, Boveris A. Oxygen Delivery to the tissues and mito- dade ou discretamente alterados, sendo que para detectar
chondrial respiration. Front Biosci. 2007; 12:1014-23.
a hipoperfusão tecidual, utiliza-se da propedêutica armada
Ciclo de
Mitocôndria Krebs ADP + H+ + Pi
ATP
= 36 ATP H2O
Figura 227.6 Cinética do lactato. Em condições de anaerobiose, onde o piruvato não entra na mitocôndria para
metabolização aeróbica, pode ocorrer o excesso de piruvato que consequentemente será metabolizado em lactato. Por este
motivo dosa-se o lactato sérico, que normalmente está relacionado à disóxia celular.
Fontes: adaptado Mizock BA, Falk JL. Lactic acidosis in critical illness. Crit Care Med. 1992; 20(1):80-93; Boveris DL, Boveris A. Oxygen Delivery to the tissues and
mitochondrial respiration. Front Biosci. 2007; 12:1014-23.
Síndrome compartimental
Infecções necrotizantes de 0
tecido mole Início +8h +16h +24h Final
Tempo
Pós-parada cardiorrespiratória Deficiência de tiamina
Cetoacidose diabética Insuficiência hepática Figura 227.7 Níveis de lactato ao longo do tempo
entre 33 pacientes sobreviventes e 41 pacientes não
Drogas/toxinas Disfunção mitocondrial sobreviventes. Os valores iniciais foram dosados no
início do choque, e os valores finais no momento da
Álcool
recuperação ou antes do óbito (média +/– dp).
Cocaína * p~0,05; **p<0,01 (sobreviventes x não sobreviventes); #p~0.05 entre os
Monóxido de carbono níveis iniciais de lactato sérico.
Cianeto Fonte: adaptado de Bakker J, et al. Am J Surg. 1996; 171:221-228.
Probabilidade de sobrevida
panhar por medidas consecutivas do lactato e avaliar o cla- 0,8 Clearance de lactato > 10%
reamento do lactato. Quando o clareamento do lactato atinge
valor superior a 10% em 6 horas, o paciente apresenta maior 0,6
chance de sobreviver. Durante o período perioperatório, o
acompanhamento dos marcadores de perfusão tecidual é im- 0,4
portante, pois além de responder sobre adequação da perfu- 0,2
são tecidual, também auxilia na gravidade e no prognóstico
dos pacientes cirúrgicos de alto risco. Um estudo demonstrou 0,0
que a utilização de estratégia terapêutica para reduzir o nível 0 10 20 30 40 50 60
de lactato sérico em 20% a cada duas horas, nas primeiras 8 Dias
horas no pós-operatório na UTI, diminuiu de maneira significa-
tiva o tempo de internação e a taxa de mortalidade.6,7 Figura 227.10 Probabilidade de sobrevida em pacientes
Entre os pacientes cirúrgicos que apresentam aumen- com choque séptico, conforme clearance de lactato.
Fonte: modificado de Nguyen HB, Rivers EP, Knoblich BP, Jacobsen G,
to progressivo do lactato sérico nas primeiras 24 horas do Muzzin A, Ressler JÁ, et al. Early lactate clearance is associated with im-
pós-operatório, têm tempo de permanência na UTI prolon- proved outcome in severe sepsis and septic shock. Crit Care Med. 2004
Aug 1; 32(8):1.637-42.
gado, e também menor sobrevida, apresentando maiores
níveis em não sobreviventes em relação aos sobreviventes,
como exibido na Figura 227.8.8
A diminuição dos níveis de mediadores inflamatórios Saturação Venosa Central ou Mista de Oxigênio
apresenta grande associação com o clareamento do lactato
superior a 10%, entre o início do tratamento do choque e A perfusão tecidual pode ser avaliada pela saturação
a 6ª hora, com consequente aumento de sobrevida (Figuras venosa mista ou central como estimativa do balanço en-
227.9 e 227.10). Assim, nos estados de choque, é necessário tre oferta e consumo de oxigênio, e também este pode se
a dosagem seriada desse marcador de perfusão para avalia- relacionar ao tipo de choque, se de alto ou baixo fluxo. A
ção da resposta terapêutica às intervenções realizadas.9 saturação venosa mista (SvO2) é definida pela quantidade
de oxigênio de todo o organismo que retorna ao coração di-
reito. É o resultado da homogeneização do sangue que de-
Lactato = 3,2 semboca no átrio direito oriundo da veia cava superior, que
80 Lactato < 3,2 drena a parte superior do corpo compreendendo os mem-
70 bros superiores; cabeça, incluído o cérebro; a veia cava
inferior que drena a região esplâncnica; as vísceras abdo-
60 minais e os membros inferiores; o sangue oriundo do seio
50 coronário e também da rede de Tebesius, que drena a árvo-
re brônquica. O sangue drenado destas regiões se encontra
% 40
no átrio direito, começa a se homogeneizar no ventrículo
30 direito, e chega totalmente homogeneizado na artéria pul-
20 monar. Então, nesta região denomina-se de sangue venoso
misto, que vem misturado de todo o organismo. Assim se
10
explica o que representa o sangue venoso misto, que é a
0 amostra da quantidade de oxigênio na artéria pulmonar, e
Não sobreviventes Sobreviventes
retrata o gradiente arteriovenoso de oxigênio pela SvO2. A
SvO2 apresenta valores entre 68% e 77%, como limites de
Figura 227.8 Nível de lactato se associa com maior
normalidade.10,11
mortalidade entre pacientes cirúrgicos não cardíacos de
alto risco. A saturação de oxigênio na desembocadura da veia cava
Fonte: adaptado de Jones AE, Craddock PA, Tayal VS, Kline JA. Diagnostic superior no átrio direito, chamada de saturação venosa
accuracy of left ventricular function for identifying sepsis among emer- central de oxigênio (SvcO2), retrata a quantidade de oxigê-
gency department patients with nontraumatic symptomatic undifferen-
tiated hypotension. Shock. 2005; 24:513. nio oriunda da cabeça, cérebro e membros superiores, e
pode ser utilizada como alternativa para SvO2. Entretanto,
pode apresentar variações entre 8 e 10% pontos percen-
tuais. Em número absoluto, a SvcO2 não representa a SvO2,
(Lactato basal – lactato após 6h) × 100 porém apresenta o mesmo comportamento que SvO2, ou
Clearence de lactato =
Lactato basal seja, quando a SvO2 cai, a SvcO2 também cai, ou quando a
SvO2 se eleva, a SvcO2 também se elevará, porém a SvcO2
não traduz numericamente a SvO2.11
Figura 227.9 Cálculo do clearance de lactato.
ΔPCO2/C(a-v)
O2 relação?
Ou Lactato?
ΔPCO2/C(a-v)
O2 >1,8 mmHg.mL–1 Normal
Ou lactato > 2 mMol.L–1
Sem mais
ScvO2 intervenções
Fluidorresponsivo?
SaO2 < 95% SaO2 > 95%
Suporte de Transfusão de
Dobutamina Fluido
oxigênio Hemácias
Figura 227. 11 Exemplo de protocolo para guia terapêutico no choque séptico.
SvcO2: saturação venosa central de oxigênio; Gap PCO2: diferença de tensão de dióxido de carbono venoso-arterial central; SaO2: saturação arterial de oxigênio;
C(a-v) O2: diferença do conteúdo de oxigênio arteriovenoso central; DO2: oferte de oxigênio. ∆PCO2/Ca-VO2 – quociente respiratório.12
Lúmen gastrintestinal
Mucosa gástrica
Muscular gástrica
Figura 227.12 Sonda de tonometria gástrica. O método da tonometria consiste no uso de uma sonda nasogástrica
específica que possui um balão de silicone permeável ao CO2 em sua extremidade distal. A extremidade proximal da
sonda é conectada ao tonômetro, um monitor da pressão parcial de CO2 presente na luz da sonda nasogástrica cujo valor
corresponde à pressão parcial de CO2 da mucosa gástrica (PCO2 regional – PrCO2). Com a obtenção da pressão parcial de CO2
arterial (PaCO2), calcula-se a diferença entre o PrCO2 e a PaCO2. Esta diferença, que em condições normais tem valor entre
4 e 8 mm Hg, pode estar aumentada nos estados de choque. O método de inserção da sonda nasogástrica para tonometria
é idêntico ao da sonda nasogástrica comum. Além de servir como conduto para o PrCO2, esta sonda também possui um
conduto para as funções das sondas comuns, como nutrição enteral e drenagem de conteúdo gástrico.
Fonte: adaptado de Monthomery A, Hartmann M, Jonsson K, Haglund U. Intramucosal ph measurement with tonometers for detecting gastrointestinal ischemia
in porcine hemorrhagic shock. Circ Shock. Research Support. 1989 Dec; 29(4):319-27.
No geral, o Gap PCO2 sistêmico, deve ser agregado a Desta forma, quando ocorrer hipoperfusão tecidual e
outros parâmetros de perfusão para melhor compreender consequente hipóxia celular, a falta de ATP causará a dis-
os distúrbios que possam estar ocorrendo na perfusão te- função da bomba de íons da membrana celular, que acar-
cidual, além de auxiliar no acompanhamento das medidas retará na formação de edema intracelular provocando
terapêuticas para correção de alterações patológicas. vazamento de conteúdo intracelular para o espaço extra-
celular, tornando inadequada a regulação do pH intracelu-
Fisiopatologia da hipoperfusão tecidual lar. Esses processos bioquímicos, quando não controlados
e revertidos pelo restabelecimento da oxigenação celular,
e disfunção de órgãos
evoluem com comprometimento sistêmico, resultando em
O objetivo principal da perfusão (fluxo + oxigênio) é en- acidemia e disfunção endotelial, exacerbando as cascatas
tregar substrato, o oxigênio, para produção de ATP. A partir de respostas inflamatórias e anti-inflamatórias, além de
da oxidação da glicose pela via aeróbica, é possível realizar ativar a coagulação. Assim, a disfunção orgânica se agrava,
a produção de 36 moléculas de ATP (Figura 227.13). Isto pois outros mecanismos começam a agregar para a contri-
é imprescindível, pois o ATP é utilizado para a síntese de buição da disfunção celular secundária à disóxia tecidual,
todas as moléculas do organismo e para o funcionamento como a formação de microtrombos na microcirculação e a
adequado das bombas dos canais de íons, como por exem- liberação de óxido nítrico, que contribuem com o desen-
plo a bomba Na/K+ ATPase. Quando se instala a hipoper- volvimento da síndrome de disfunção da microcirculação e
fusão tecidual, ou quando as células já estão produzindo mitocondrial (SDMM).14
ATP na capacidade máxima pela via aeróbica, mesmo com a A lacuna entre monitoração hemodinâmica e monitora-
DO2 elevada, e essa produção não consegue atender as ne- ção da disóxia celular (parâmetros do balanço entre oferta
cessidades metabólicas do organismo, o organismo passa a e demanda globais de oxigênio) é completada por marca-
ativar a via anaeróbica de produção de ATP. A via anaeróbia dores de adequação da perfusão tecidual (lactato, SvO2,
faz com que o piruvato seja oxidado e produza lactato, e TEO2, Gap PCO2). Eles são facilmente aferidos por meio da
mais duas moléculas de ATP, o que é uma quantidade muito coleta de amostras sanguíneas arterial, venosa mista ou ve-
inferior daquela produzida pela via aeróbica.14 nosa central.6,8
Fosfoenolpiruvato Prolina
Oxalacetato Citrato
(PEP) Arginina
PEP
caroxicilase
Malato
α-cetoglutarato Glutamato
Serina Aspartato
Enzima
Glicina Asparagina málica
Cisteina Purinas
Piruvato
Pirimidinas Succinil – CoA
Tirosina
Triptofano
Fenilalanina
Porfirinas, heme
Figura 227.13 Mapa da glicólise + ciclo de Krebs + Ciclo de Cori. A glicólise é um processo que envolve dez reações enzimáticas
e resulta na formação de piruvato a partir da glicose (não é necessário a utilização de oxigênio neste processo). Para que ele
ocorra, é necessário que a molécula de glicose seja inicialmente ativada pela adição de fosfatos, os quais são provenientes de
duas moléculas de ATP. Apesar do uso de ATP, o processo de glicólise é vantajoso, uma vez que é produzido um total de quatro
moléculas de ATP ao final das reações. Assim sendo, o saldo líquido da glicólise é de 2 ATP’s. No ciclo de Krebs, o piruvato
proveniente da glicólise sofre descarboxilação oxidativa pela ação da enzima piruvato desidrogenase, existente no interior das
mitocôndrias, e reage com a Acetil-coenzima A (CoA). A partir deste ponto ocorrem oito etapas, e cada etapa é catalisada por
uma enzima específica. O ciclo de Cori ou via glicose-lactato-glicose consiste na conversão da glicose em lactato, produzido
pelos tecidos durante um período de privação de oxigénio, seguida da conversão do lactato em glicose, no fígado.
Fonte: Kornberg, H.; Williamson, D. H. November 1981. Biographical Memoirs of Fellows of the Royal Society.
Ainda que o lactato seja um marcador bem estabeleci- Onde TEO2 – taxa de extração de oxigênio; SatO2 – sa-
do no choque séptico, não é bem estudado como alvo para turação arterial de oxigênio e; SvcO2 – saturação venosa
terapia guiada por metas no perioperatório, pois apresenta central de oxigênio.
dinâmica de alteração e resposta terapêutica dependente Para produção de energia (adenosina trifosfato – ATP),
do tempo, às vezes prolongado. Quanto a SvcO2, foi en- as células do organismo utilizam a via aeróbica, essencial à
contrada correlação entre “baixa SvcO2” perioperatória e presença de oxigênio em quantidade suficiente na mitocôn-
aumento do risco de complicações pós-operatórias em es- dria.7,8 Quando a disponibilidade de oxigênio é reduzida, o
tudo multicêntrico europeu, que a analisou no intraopera- VO2 diminui e tornando-o dependente da suplementação
tório em pacientes cirúrgicos de alto risco.7,8 de oxigênio, ocorre disfunção celular acarretando disfun-
A taxa de extração de oxigênio (TEO2) é facilmente me- ção de órgãos e, com a exacerbação deste cenário, altera-
dida pela coleta de sangue arterial (SatO2) e de cateter ve- ções irreversíveis podem se desenvolver.6
noso central (SvcO2) e determinada pela fórmula: Desta forma, é essencial a preservação da adequada
DO2 para a célula, pois a disóxia é nociva, causando dis-
função e morte celular. Como exemplo do que foi citado
SatO2 – SvcO2
TEO2 = anteriormente, nos estados de choque ocorre inadequada
SatO2
perfusão tecidual, causando diminuição da DO2 e conse-
De forma didática, a circulação pode ser associada a Na Tabela 227.4 encontra-se um resumo dos padrões
um sistema ferroviário, no qual a locomotiva é o débito hemodinâmicos encontrados nos estados de choque.
cardíaco, os vagões que carregam a carga (oxigênio) repre-
sentam o conteúdo arterial de oxigênio, através da hemo-
Tabela 227.4
globina/hemácia; a estação central, que oferta oxigênio Padrões hemodinâmicos nos estados de choque.
aos vagões, é constituída pelos pulmões; os consumidores,
Hemorragia
que utilizam o oxigênio, são as células dos tecidos; e os
Hipovolêmico Desidratação
trilhos representam os vasos.20 Sequestro de líquidos
Desta maneira, o contexto de alto fluxo é identificado
Falência ventricular esquerda
pela SvO2 elevada, isto é, retorno de mais sangue oxigena- Infarto agudo do miocárdio
do para o coração direito. Entende-se pelo fato da compo- Cardiogênico Miocardite
sição transitar rapidamente pelos tecidos e, portanto, não Disfunção miocárdica da sepse
há tempo hábil para as células removerem o oxigênio dos Lesões valvares
vagões. Assim, a composição volta para a estação central Embolia pulmonar
com maior quantia de oxigênio.20 Obstrutivo Tamponamento cardíaco
No entanto, os cenários de baixo fluxo são reconheci- Pneumotórax hipertensivo
dos pela redução da velocidade da composição, que pro- Vasoplégico (choque séptico, intoxicação por
move maior tempo para extração de oxigênio pelas células monóxido de carbono)
e tecidos. Desse modo, retorna menor quantidade de san- Neurogênico
Distributivo
gue oxigenado para o lado direito do coração, que resulta Anafilaxia
em SvO2 diminuída. Ou a composição carreia uma menor Hipotireoidismo/Hipocortisolismo
quantidade de vagões e por conseguinte uma menor quan- Síndrome de hiperviscosidade
tidade de O2. Nesta situação, como a quantidade que che-
ga ao consumidor final, célula, já está reduzida, a mesma Choque Hipovolêmico
retira o máximo de O2 para tentar suprir suas necessida-
des. Como já chega pouco O2 para as células, a quantidade É o tipo de choque mais comum no cenário do poli-
que retorna para o coração será menor ainda, logo, a SvO2 trauma, em decorrência de sangramento. Neste caso,
estará bem reduzida. Com isso, compreende-se que a SvO2 em outras, palavras, o choque hemorrágico é um tipo de
tem relação direta com o fluxo e a quantidade de oxigênio choque hipovolêmico. A gravidade da hipovolemia decor-
carreada pela composição.20 rente do sangramento pode ser classificada pelos dados
clínicos nos pacientes politraumatizados (Tabela 227.5).
Qualquer transtorno que resulte em perda de fluidos
Hemodinâmica pode causar choque hipovolêmico, portanto, é uma re-
De acordo com seu padrão hemodinâmico, os estados dução do conteúdo intravascular caracterizado pela dimi-
de choque também podem ser classificados em quatro nuição das pressões e volumes de enchimento diastólico
grupos (Tabela 227.4), mas pode haver sobreposição entre (Tabela 227.6).21
eles. Muitos autores defendem que a nomenclatura cho- Nesse tipo de choque a diminuição do débito cardíaco
que misto não existe, pois a interposição entre os tipos de também será acentuada devido à redução do estiramento
choque se deve ao predomínio de algum tipo com conse- da fibra muscular cardíaca, distúrbio consequente à queda
quente componente secundário, o que torna mais racional das pressões de enchimento das câmaras cardíacas, como
o entendimento da situação e distúrbio presente. Como ilustrado na Figura 227.14.
exemplo cita-se a sepse, a qual se manifesta pelo estado de O choque hipovolêmico pode se apresentar por dois ti-
choque distributivo, mas pode conter: pos de hipóxia tecidual:1
1. componente hipovolêmico secundário à venodilatação; Anêmico: quando há perda sanguínea secundária ao san-
2. componente cardiogênico decorrente à depressão mio- gramento.
cárdica induzida pela sepse; Estagnantes: pela diminuição do débito cardíaco em
3. componente obstrutivo devido à hipertensão pulmonar detrimento da redução do volume sistólico e, portanto,
resultante da ação de mediadores inflamatórios.16,20 baixo fluxo.
Tabela 227.6
Choque hipovolêmico: aspectos hemodinâmicos e de oxigenação.
PA normal em estágios iniciais. Evolução do quadro: hipotensão arterial;
DC baixo ou normal. Fase inicial: DC pode estar normal devido a mecanismos de compensação. Evolução do quadro: DC diminuído;
Hiperlactatemia.
PA – pressão arterial; DC - débito cardíaco; DO2 – oferta de oxigênio; Gap PCO2 - gradiente veno-arterial de PCO2.
Inotrópico
Infarto
ventrículo
Disfunção
Reperfusão: direito
ventrículo
• Trombólise esquerdo Excesso de infusão
• Angioplastia
de líquidos
• Cirurgia
↑ PDFVD (>15)
↓ Complacência Diminuição ↑ PVC
VE do retorno
↑ POAP venoso
↑ VDFVD
Isquemia
miocárdica Redistribuição de ↓ Volemia
volume intravascular efetiva e Desvio do septo
aos pulmões ↓ Pressão de interventricular
perfusão para esquerda
Edema
pulmonar
Síndrome de disfunção
de múltiplos órgãos
excesso na pré-carga (volume diastólico final do ventrí- As alterações hemodinâmicas decorrentes do choque
culo esquerdo) provoca hiperestiramento das fibras mio- cardiogênico são citadas na Tabela 227.7.1,15
cárdicas, acometendo o mecanismo compensatório de Os achados hemodinâmicos dependem da etiologia
Starling. Já a elevação da pós-carga (resistência vascular do choque cardiogênico. Como exemplo: o choque car-
sistêmica) sob o ventrículo esquerdo, promove aumento diogênico secundário ao infarto agudo do miocárdio do
do trabalho do miocárdio; quando há função ventricular ventrículo direito apresenta POAP diminuída ou normal e
diminuída, proporciona queda do DC.1,15 IC diminuído.1,15
Tabela 227.8
Definições evolutivas secundárias a quadro infeccioso.
Invasão microbiana tecidual promovendo
Infecção resposta inflamatória reacional à presença
Volume
de microrganismos.
Figura 227.16 Elevação anormal da pressão diante Ocorre devido a várias insultos clínicos
graves.
do aumento do volume (pré-carga). Para uma mesma
É identificada por duas ou mais das
quantidade de volume há duas variações de pressão. Síndrome condições a seguir:
Esse comportamento ocorre devido à alteração da da resposta Temperatura > 38oC ou < 36oC;
complacência ventricular. inflamatória Frequência cardíaca > 90bpm;
Fonte: modificado de Pinsky, et al. Pinsky MR, Brophy P, Padilla J, Pagani-
ni E, Pannu N. Fluid and volume monitoring. Int J Artif Organs. 2008; 31 sistêmica Frequência respiratória > 20 irpm ou PaCo2
(2):111-26. < 32 mmHg;
Leucócitos >12 mil ou < 4 mil ou > 10%
formas jovens (bastões).
↓ ATP ↑ H+
↑ atividade óxido
Aumento lactato no ↑ vasopressina
nítrico sintetase
músculo liso vascular
↓ Cálcio ↓ vasopressina
↑ GMPc
citoplasmático plasmática
Abertura dos
canais K Vasodilatação
↓ miosina
fosforilada
Tabela 227.9
Choque séptico: aspectos gerais dos padrões hemodinâmicos.
PA normal ou reduzida;
PVC reduzida ou aumentada (se alteração de complacência ventricular);
PAOP reduzida;
DC valor normal ou aumentado (isto não significa adequado);
Hiperdinâmico
Resistência vascular pulmonar normal (aumentada se síndrome do desconforto respiratório do adulto);
SvO2 aumentada (>75%);
Gap PCO2 diminuído ou normal
Lactato normal ou aumentado.
PA reduzida;
PVC reduzida (se hipovolemia), aumentada (se alteração de complacência ventricular);
PAOP reduzida (se hipovolemia), pode estar normal ou aumentada;
DC reduzido (depressão miocárdica da sepse);
Hipodinâmico
Resistência vascular pulmonar normal (aumentada se síndrome do desconforto respiratório do adulto);
SvO2 reduzida (< 65%);
Gap PCO2 elevado
Lactato aumentado.
Choque
neurogênico
Componente neuroendócrino
Devido a disfunção pituitária ou
adrenérgica após lesão no SNC
Tabela 227.11
Características hemodinâmicas e de perfusão tecidual na embolia pulmonar.
Embolia pulmonar não maciça Embolia pulmonar maciça
Frequência cardíaca Normal ou aumentada Muito aumentada
Pressão arterial média Normal Diminuída
Pressão venosa central Normal Aumentada
Pressão de oclusão da artéria pulmonar Normal Normal
Índice cardíaco Normal Diminuído
Resistência vascular pulmonar Aumentada Aumentada
Pressão de artéria pulmonar Normal Aumentada
Saturação venosa mista de oxigênio (SvO2) Normal ou diminuída Diminuída
Lactato arterial Normal Aumentado
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