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DisUN

a algumas
obras
oferece
mbém aos esciton
A
"iegibilidade"atribuída
conterir
a si
m e s m o s

uma.
ilitar por meio das
nidade mediane
obras textos
de de ao
reabil.
ealistas com os Can,tos de Maldorara
inéditas,
filhaçóes surreal
de os
stituião fizeram
assim
ulo de um trabalho
d e
história

s q u a l i f
da
t i c a d o
literatura

s :
oferece o
espetáculo
iderados
c o n s i d e r a d o s

ininterrupto
defeituosos ou,
de:
inversamente
legitimação
de texto
antes
momento consagrados.A
dado m o
s.Aproduãoliu
até u m
de textos
dearquivo e as obra:
obras de
deslegitimação
arua,,com
efeito, na
fronteira
e n t r e as
formaçaio.
cessidade de reavaliar certas
necessi
obrad
co
de modogeral,
formam tem, quadro her.
quese são dignas
de um
arquivo,
isto é, de legitimar a si mesmasS.
decretar que
-eni
-para
leitura filológica
apenas
de uma entre o conhecimento
reconheci de t
ja como
for, há contradição
digressões..) ea tend 1sgressivg
a tudo
obscuridades,
(reperições, inscreva plenamente
legitimar
numa
obra caso ela se
princípio de unicidade e m a
quadr
de um
Aintrodução
d

hermenêutico.
quais as aparências
de
conhecimento.

parecemheterogêneas
A eliminar as

nclinação natural de todo


é a in.
transgressões, o analista most
Paratop1a
bl como os filósofos que escrevem céias pa
engenhosidade, um pouco
di e c o n o m i a superior da criação divina.
integrar o mal em alguma
ur
se
pa
ce
SI
lir
86
Um impossível lugar

A doxa advinda da estérica romântica privilegia a singularidade do criador


e minimiza o papel dos destinatários, bem como o caráter institucional do
exercício da literatura, sendo a instituição da maioria das vezes considerada
um universo hostil à criação. E a própria estrurura do ato de comunicação
literária que se vê negada dessa maneira. Contudo, para produzir enunciados
reconhecidos como literários, é preciso apresentar-se como escritor, definir-
se com relação às representaçóes e aos comportamentos associados a essa
condição. Claro que muitos escritores, e não os menos importantes, retiram-
deserto, recusando todo pertencimento à "vida literária"'; mas seu
se para o
afastamento só tem sentido no âmbito do espaço literário a partir do qual
eles adquirem sua identidade: a fuga para o deserto é um dos gestos
protoripicos que legitimam o produtor de um texto consituinte. Eles não
podem situar-se no exterior de um campo literário, que, seja como tor, vive
do fato de não ter um verdadeiro lugar.

Os TRÊS PLANOS

Os trabalhos de sociologia da literatura inspirados por Pierre Bourdieu


têm o grande mérito de mostrar que a
produção da obra literária não deve
ser remetida em
primeiro lugar à sociedade considerada em sua globalidade
89
D i u r s liltrUi

Um inpOSSIvel lugar

no seculo IX tomou a
Xix tomou
dessa
socicdade, que forma
regras especific.
limitado
mas a
um sctor
unificado que segue cas. L
relativamente
de trés Dlan. cncontrando-se serm dúvida prestes
de "campo"
um obra participa nose a perder sua força em funçao das
dizer que toda
modo mais amplo, pode-se relaçöes e n t r e esses planos
novas
tecnologias, faz-se necessário flexibilizá-la para estende-la a
definir as pois diversidade de regimes de
literário. E dificil, porém, produção literária". Há por exemplo
cpaço dois.
deles é atravessado pelos outros
regimes que não opõem escolas com manifestos e doutrinas, mas
cada um

rde deaparelhos que


em os
indivíduos podem
indivíduos Jugares de exercício (diferentes
trajetórias, diferentes regióes...); nesse
Esse espaço é
uma
são garantido caso, os
-

constituir-se em escritores ou püblico,


em que
diterentes grupos en concorréncia partilham da maioria dos
contratos genéricos
considerados literários, em
que
pressupostos estéticos, investem os mesmos
géneros, mas diferem em
estabilizados os
avaliadoe termos de "estilos"
de temáticas...
e

intervem mediadores (editores, livrarias.., 1nterpretes ou Esse espaço é, por fim, um


cânons (que podem assumir a formama arquivo em que se combinam intertextoe
legítimos(criucos,protessores..., sem dúvida não
lendas: só existe atividade criadora inserida
O termo aparelhos
numa memória, que, em
de manuais, antologias...). contrapartida, é ela
mesmo mediante
o artigo de Althusser
mesma
aprendida pelos conflitos do campo, que
muito feliz: pode autorizar a si não cessam de retrabalhá-la. A noção de arquivo
de história
"Ideologia e aparelhos ideológicos Estado"
tem uma na
publicado em 1970, análise do discurso. De minha
teórico e de modo particular parte, empreguei-a antes com um
ainda que não partilhemos de seu quadro sentido próximo do de
"posicionamento, destacando que os enunciados
da concepção de subjetividade que ele implica. Althusser já dava então que vêm de
o termo remetia a um
um
posicionamento são inseparáveis de uma memória e

a "aparelho" grande extensão, porque


uma de instituições que lhes conferem sua autoridade ao mesmo
sistema que integra instàncias tão diversas quanto a familia, os partidos
tempo em
que se legiimam por meio deles. Aqui, arquivo
em suma, o conjunto
designa
politicos, a imprensa, o sistema jurídico, a escola, apenas a memória interna da literarura. memória que, para além do

discursos mediante o assujeitamento dos indivíduos intertexto no sentido estrito, isto é, obras, presentes em alguma
de práticas e que, outras
à ideologia dominante, garantiria, de acordo com ele, a reprodução biblioteca imaginaria, inclui também. como vamos ver, "lendas.
das relações sociais.
Trata-se igualmente de um campo, lugar de confronto entre
A PARATOPIA
posicionamentos estéticos que investem de maneira especifica gêneros
e idiomas. A análise do discurso foi levada a recortar espaços em que Quando se trata de criação literária. metátoras ropográficas como as de
diferentes posicionamentos, para deter o máximo de autoridade "campo ou "espaço" só têm validade entre aspas. Claro que o espaço literário
enunciativa, se acham em relação de concorrência em sentido amplo, faz, num certo sentido, parte da sociedade, mas a enunciação literária
delimitando-se mutuamente. "Campo" é, portanto, usado aqui com
o valor restrito de "campo discursivo", solidário de primazia do 8
Em Anhéologie du savoir (p. 171; ediç+o brasileira: .drzcologiu do sbr,. ed. Rio
interdiscurso com relação ao discurso. Um campo discursivo nao de Janeiro, Forense Universitäria.
2004), Foucault lhe confere um alcance bem amplo. i ponto de
consistencia: "Situado
iutorizar o questionamento de sua
entre a lingua que sistema de
uma estrutura estável, mas uma dinámica em equilibrio instável. De deine o construçao d trises passiveis, e o corpus
que reune passivamente as palavras pronunciadas, o Tquiro define um nivel cspecifico, o de uma
prática que faz surgir uma multiplicidade de enuncndos como eventos regulares, como coSas oferecidas ao
igual forma, o campo não é
homogêneo: há posicionamento tratamento e à manipulação |..| entre i
tradiçio c o squeaimento, ie raz Surgirem as regras de uma prátuia que
dominantes e dominados, posicionamentos centrais e permite aos enunciados subsistir e moditicar-se regularmente. Trata-se do sisema geral de formação e' de
peritéricos. runsformação de cnunciados". Prolongando esi perspetIva. . Guilhaumou e D. Maldidier fundam a análise
posicionamento "dominado" não é necessariamente "periterico mas do discurso "em dois
suportes materiais, o arquivo e a bgua tsse irqund nao e o conjunto de textos que uma
.

5ociedade deixou", nem "o quadro insticuciona que pernitiu conservar os vestigios", mas cada dispositivo de
todo posicionamento "periférico" é "dominado". De todo modo *
arquivo estabelece sua própria ordenação. Asim, do lado do arquno, o sentido è convocado a partir de uma
noção de campo traz um
problema, dado que não ser trans*
diversidade máxima de textos, de dispositivos de arquivo speciticas de um tema, de um evento, de um itinerário"
não pode
o
pode sc 0. Guillhamou, D. Malklidier, R. Robin, Disun et arhite, Ejermentaios en analhyse du discours,
Liège,
histórica. Como Mardaga, 1994, p. 195).
a
existência de um campo autônomo e
90 91
Discuro liter.rio. Um ipossivel lugar

de um
de um
. lugar,
normalmente

desestabiliza a
que
representação
se tem
"meios" literários sãoio na verdade algo
fora. Os literário da sociedade, o autor cria, na verdade, as condiçocs de sua propria
e de
um
dentro a0 mesmo
dotado de u m l i t e r a t u r a supoe

existência social
da
a de se
confund..Poa criação; há obras cuja autolegitimação passa pelo afastamento solitario ae
fronteiras. A mesma e
fechar em si scu criador que cexigem sua
e outras
participação em empreendimentos
de ela se eer
impossibilidade com esse meio-termo oe em seu
necessidade de jogar coletivos: Sartre, animando revistas politicas, desfilando en maniBestaçÕes,
a
sociedade "comum, i
literatura tenha
um
funcionamento
incompatível e Thomas Bernhard, vituperando de sua cidade contra os ambientes cultrurais
àmbito. Nao que a
falar em seu
âmbito de estrarden vienenses, dizem, cada qual à sua maneira, o que é para eles a literarura
domínios de atividade (pode-se coneid
é preciso
outros

carreiras, de
faturamento etc.), mas
legítima. E chega a haver obras que supõem, de um lado, a absorção do
promoção, de Enquanto discurso
constis Kafka ou Pessoa levam uma vida de
igualmente seus poderes
de excesso. inte, a autor na
banalidade: empregados
plenament
ente ao espaço social, modelo, mas não rém uma família e escrevem.
instituição literária
não pode de fato pertencer
funcionamer
mantendo-se antes na
fronteira entre a inscriçao em seus
nentos
toda economi
No
séculodeyvi, proteçãodos grandes fz do parasita
a a figura prorotipica
do letras. No século xv1l,
tópicos e o abandono a forças que
excedem por natureza
om homem o que recebeu o nome de "República
a alimentar-se de lugares, grunos das Letras designava unma rede paratópica, parasitária dos estados reais,
humana. Isso obriga os processos criadores
impossível, uma "República" que se sobrepunha a fronteiras geográticas e sociais. tal
são tomados hum pertencimento
comportamentos que
como o podia fazer na mesma época a
Não é, portanto, possível falar de uma corporação
dos escritores coma se franco-maçonaria. Esse "Estado
dos engenheiros. A literatura, coma parasita julgava-se sujeito apenas à regra da igualdade e da livre discussão
fala de uma corporação dos hoteleiros ou

ser comparada a uma rede de lugares na


entre seres dotados de razão. Essa República "se estende por toda a terra e se
todo discurso constituinte, pode compõe de gente de toda nação, de toda condição, de toda idade e de todos
em nenhum território,
sociedade, mas não pode encerrar-se verdadeiramente
O esforço constante de certos príncipes de antanho ou de certos regimes os estando excluídas nem as mulheres, nem as crianças"."
sexos, náo

totalitários para proporcionar uma condição de empregados domésticos ou Como explica Bayle no verbete cário de seu Dicionirio histórico e
assalariados permite manter uma produção literária, mas não produzir obras, a critico (1696),

menos que o escritor se afaste do que éesperado dele, torne problemático seu Essa República é um Estado extremamente livTe. Nela só se
próprio perencimento a um lugar, a uma função. O pertencimento a0 campo reconhece o dominio da verdade e da razão; e. sob seus auspicios
literárionãoé, portanto, ausência de todo lugar, mas, como dissemos, uma combate-se inocentemente qualquer um . . Cada um é. nela., 2o
mesmo tempo soberano e sujeito a todos.
negociação entre o lugar e o não-lugar, um pertencimento parasitário que se
alimenta de sua inclusão impossível. Trata-se daquilo que antes denominamos Todo escritor das Luzes inha assim de
gerir à sua mancira um duplo
paratopia' (ver anteriormente, capítulo "O discurso literário como discurso pertencimento: pertencimento à sociedade tópica, no caso monárquica, e às
constituinte, seção "Alguns aspectos dos discursos constituintes ). redes dessa "República". Era ao memo tempo o "Eu" e o "Ele", do Sobrinho
As modalidades dessa paratopia variam de acordo com as épocas e3 de Rameau, um debate sem saída entre a "topia de "Eu' e o nomadismo de
sociedades: os menestréis nomades da
Antigüidade, os parasitas protegao Ele", que atravessa todas as topias.
pelos grandes na época clássica, os boêmios em
etc. Numa
oposição aos "burguescses A paratopia, invariante em seu principio, assume assim faces sempre
produção literária fundada na conformidade aos cânones estet mutantes, dado que explora as fendas que não cessam de abrir-se nasociedade
Sao
paratópicas principalmente as comunidades de "artistas" mais ou meno
marginais (os menestréis ou trovadores...). Quando e
questão profundamente individual, a produção u a

de um paratopia elabora-se na singulariu de "Vigneul-Marville (pseudónimo de Bonaventure d'Argonne), Melanges d'histoire et de lirénarure, Rouen, 1700,
vol. , p. 60.
atastamento biográfico. Por sua maneira de aço
"inserçáo" no
pey
92 93
L
Diuro litci.to

a trustração
do darilho queéé propícia àc
andarilho quc

reza livre
uia

x 1,é
sobretudo
livre do
uma natureza
japoneses se reune para elaborar renku, quando um Oronte compoe
Nosiulo
incita
Rousscau a
evocar

se fazer cham: domin urm

galante,éproduzido um tipode
literatura
frustração que François-Marie
"M. soncto paraos tamiliares em urn salão
essa incita Trata-se
a-se do a identidade criadora é indissociável de pequenas
comunidades em
aristocratico,
mas

Caron, "M. de Beaumarchais". homem do em que


sociabilidade. Mas importinaa assim
atribuida
e Pierre num
quese combinavam criação
a
energias processo e
oltaire"
Estado", que
nobiliza, então,
as

ista bem distan


de vist criador, aos modos de vida, aos ritos de grupos que produzem
ou geram certo
discurso
Terceiro
está desse ponto
constiruintes. A obra
Beaumarchais, por
exemplo,
No caso dele, o motos
vai bem além: ela vale para o conjunto dos discursos
no
r o m a n t i s m o .

literário: ela só pode


protótipos que
prevalec1am andarilho queP literária surge através das tensões do campo propriamente
condiçío do
homem detalento ordem dizer alguma coisa sobre o mundo pondo em jogo
enunciaçao os em sua
é a insuportável
à obscuridade. Ao contrário da
. criação dos advindos da impossivel inscrição social (na sociedade e no espaço
condena
com um mundo . problemas
modermo
aristocrática
nenhuma ruptura à literatura, mutatis
a sua não implica literário) dessa mesma enunciação. Podemos aplicar
parnasianos, ele
transgressora daquele que
pretende qualque
a
mudandis, aquilo que Michel de Certeau disse da historiografia:
mas a agitação
desencantado,
universo em que a escrita deseja aprec
num

preço riunfar. Elecircula Um século depois, o poetaparna1asiano O discurso- cogupo que o


produz -jo historador. 20 msmo

movimentos da sociedade.
diretamente os tdeologa atomista de una pToiio H a l antim
posição de "artiSta que se opõe ao resto
esto da
tempo em que a
Heredia assumirá a
auror e deia crer que a busa indvida ons1rói
a

losé Maria de sujeito


a ficção do
adiante, capítulo sonetos"); ele se ausena
"Dois históna .]Assim como o automóvd produzido pela täbiaosudo
sociedade industrial (ver
deve ausentar-se do mundo buroi histórico é algo mais relacionado ao complezs de uma abniação
ostensivamente de sua obra, poesia como a
e coletiva do que o cfeito de uma ilosoia pssoal
ou o

trabalha nas fronteiras,


inclusive a que o separa de especifica
um Beaumarchais ressurgimento de uma "realidade passeda. E o produzo de m lhugar.
enquanto
primordialmente Figaro.
suas personagens,
tudo: de uma paratopia de andarilh das ciencias do que no da literarura,
Assim, criação se alimenta de
a Contudo, mais facilmente no caso

de textosa
Ihe pretende impor um mundo dominado peh aceita-se dar lugar às instituições no processo criador: a produção
recusao lugar que
que
nobreza e, ao mesmo tempo, de uma paratopia de nobre que não encontra científicos é dificilmente concebível como atividade solitária e apartada do
lugar num mundo de burgueses. Ela
se alimenta de um afastamento metódico ambiente tecnológico.
se distribuemn pelo
mundo, bem do estorço permanente de nele se inseri, A vida literária é estruturada por essas "tribos, que
e rirualizado do como
estéticas: academia,
do trabalho da imobilidade e do trabalho do movimento. campo literário com base em distintas reivindicações
literária não se define
círculo, grupo, escola, cenáculo, bando... Uma tribo
reconhece
de acordo com os critérios da divisão social canonica, que
LuGARES E COMUNIDADES PARATÓPICOS na filiação e
essencialmente duas espécies de grupos: os que se fundam
estão unidos por uma tareta
Como foi dito, ainda que a obra tenha a pretensão de ser universal, sua aqueles (empresas, equipes, batalhões...) que
emergencia é um fenômeno fundamentalmente local,e ela só se constirun
por meio das normas e relações de força dos lugares em que surge. E nesses
menos dois autores ao longo
de uma
no século xvin; elaborado por ao
um gènero poético fixado
lugares que ocorrem verdadeiramente as relações entre o escritor e
a S0O rnku é
nmais clássica de 36 versos, divididos em 6
12+ 12+6. Difere do
+
reunião anmigivel, compöe-se em sua torma as alusões, as paródias,
sociedade, o escritor e sua obra, a obra e a sociedade. baiku porque se estrutura por
continudade de seu desenvolvimento, privilegiando
meio da

Isso parece evidente quando se buscam apreender outros regimes da o humor.


do discurso uma teoria da"comunidade discursiva", que
a desenvolver em análise
De nossa parte, fomos levados de produtores e gestores que as fazem
literatura que não o de
formações discursivas com o huncionamento grupos
imposto pelo romantismo: quando um grupo de letrau tenta articular as

viver e que vivem delas (ver nossa obra


Genèses du Discours, Liège, Mardaga, 1984 [edição brasileira: A génese
ou LAnalyse du discours, Hachette, 1991).
do discurso, trad. S. Possenti, Curitiba, Criar, 2005

s Pp. 72-73.
N.T:"Voltaire" e"Beaumarchais" são palavras que, em francés, sugerem mOVimento.
95
94
Discurso hterario-
-Um impossivel lugar

vêm de famd
membros
das tribos
literárias

'tribos"
lias aque
realizar. Os tempo,
tais

ativas torçam
comum a ao
mesmo

pertencer,
enquanto, transterências ativas No teatro de Molière, o salão de Celimena (O misantropo) ou o deAraminta
continuama intensidade
das
que nelas (Escola de mulberes) não são, portanto, um lugar social qualquer por nelo d
tornar
família; a
indecidiveis
com a estrur
rurura Bamiliar.
não se
para relações freqüenta. qualodramaturgo denunciaria algumas faltas.A cena não mostra um salão como
as leva
a manter
n e c e s s a r l a m e n t e

tar so
se produzem implica
tribo não Pe mostraria um albergue ou um quarto de dormir, ela mostra um lugar que remete
existência de correspondência, de e n
uma
A trocas de

lugares. Ela pode


resultar de
s convergentes.
de projetos
contros certa literatura às suas próprias condições de possibilidade. A irreduibilidade
modos de vida,
mesmos
os reatral da vida, intolerável para Alceste e um elemento nanural para Celimena, é
ocasionais, de
semelhanças nos
desempenham papel um n
levada a seu paroxismo nesse "mundo da mundanidade de que a literatura
assim certo número
de"tribosinvisíveis,que constituído, Ale
de um grupo ém disso, francesa clássica se acha, queira ou não, saturada. Claro que a maioria dos
isso assumirem a toFma
literária, s e m por
situa numa tribo escolhida,
a dos escritores pasSad.
ados
en
escritores da época, cada qual em seu registro, denuncia os fingimentos e as
todo escritor se
ou inclui
nao, que ele máscaras do salão, mas é desses fingimentos e máscaras quese sustenta o seu
conhecidos pessoalmente seu
contemporâneos, obras Ihe permitem legitimar
modo de vida e cujas sua discurso. O que liga Alceste e Celimena, o homem de fala direta e a mulher de
panteão pessoal cujo
e
que usa o espaço e o tem palavras inapreensiveis, é ambém aquilo que liga essa literarura a um lugar de
Essa comunidade espiritual, empo,
própria enunciação. não se distingud que ela tira sua força, mas do qual deve sem cessar apartar-se.
cuja singularidade
associa nomes n u m a configuração
Osalao ya conservar um papel importante no século xx, mas será
reivindicaço estética do
autor.
em sociedades restrite acompanhado pelos lugares protoupicos da boemia, como o café dos aristas,
desenvolve particularmente
A criação literária se que está vinculado com uma população mais diversificada. O café é um dos
relativa autonomia, Fee
zonas totalmente francas, gozam de Esse
que, sem
ser
ou dos salQes. O escrito
principais lugares da vida de boêmio de que são exemplo as Cenas da vida
durante séculos o caso das cortes principescas
foi de Boémia, de Henry Murger (1852), ou A obra, de Zola (1886), implicando
instavel
pessoa
-
conviva tolerado,
ocupava aí posiço profundamente
uma um contronto ambivalente entre o mundo burguês do trabalho e a
ou lisonjeava seu anfitrião fazendo desse lugar ambivalente
que divertia
,
reivindicação daqueles que eram na época chamados "os artistas:
a condição de sua criação. O
salão dos séculos XVIl e XVl e, em menor
-

Eram cinco horas; bando pediu mais cerveja. Freqüentadores


ao escritor uma relação indispensável
o
século seguinte ofereciam
-

grau, no assiduas do bairro haviam invadido as mesas vizinhas, e esses


com isso encerrá-lo em algum lugar
com o corpo social e com o poder, sem burgueses lançavam para o canto dos artistas olhares de soslaio em
O salão tem, tal como a literatura, um lugar que, para além das famílias e que o desdém se mesclava a uma deferência inquieta
das corporações, atenua a dominaçáo das mulheres, dedica-se a atividades
O café se acha na fronteira do espaço social. Lugar de dissipação de tempo e
ritualizadas, aparentemente avessas a toda urilidade, ao exercício do pode,
de dinheiro, de consumo de álcoole tabaco,ele permite que mundos distintos se
àprodução ou ao comércio. Disso advém provavelmente a extrema afinidade encontremlado alado.Osartistas podem reunir-se nele em "bandos", comungar
entre o parasitismo da mundanidade e o da literatura. Ao escritor que trabalha na rejeição dessa sociedade burguesa que não os inclui nem exclui. Pois o artista
na fronteira móvel entre a sociedadee um espaço literário paratópico, o éo perpétuo andarilho que acampa às margens da cidade:
salão oferece a possibilidade de estruturar o que há de insustentável em sua
Flanando, os quatro pareciam ocupar toda a largura do Boulevard
"posição. Espécie de zona franca na sociedade, oferece ao escritor uma
des Invalides. Ocorria a expansão habitual, o bando aos poucos
forma de pertencimento desarraigada. Mas freqüentar esses lugares nao e aumentado por companheiros que se agregavam pelo caminho, a
Suficiente para suscitar um trabalho criador. E maneira marcha livre de uma horda que partia para a guerra. Esses fanfarrões,
a
singular_ae
escritor se
relacionar ao mesmo tempo com a sociedade fortemente)tópica
com os
espaços fracamente tópicos que são a corte e o salão, os qua LOcuvre, cap. 11, Livre de Poche, p. 91. Para um estudo da boemia, ver ). Siegel, Paris-Bohème 1830-1930,
alimentam o trabalho criador. Paris, Gallimard, 1991.

96 97
Discurso literario-

Um impossivel lugar

tomavam posse da calcada


v i n t e anos,
de seus

com a
bela robustez soavam diante deles, aue
ue
fantarras
se viam juntos,
Assim que
com uma mao
e a colocavam trangüilamenre
hte judeus, mulheres, palhaços, aventureiros, índios americanos.. a depender
Paris
empunhavam duvida; eles passeavam seus
sSeis
não era uma das circunstâncias. Basta que seja estabelecida na sociedade uma zon2
bolso. A vitória já
no
cansados,
desdenhando essas misérias
velhos calçados e seus paletós
serem os senhores. E isso não percebida como potencialmente paratópica para que a criação literria a

bastando-lhes apenas querer


para possa explorar. Nesse sentido, Bakhtin mostrou o importante papel que
o que não fosse sua
desprezo
imenso por r u d o
sem um
acontecia desempenhou para a criação literária a contracultura "carnavalesca, que
dinheiro, desprezo pelo mundo, desprezo
arte, desprezo pelo os sublevava. visava subverter a cultura oficial por meio do escárnio. Os excessos regulares
Uma magnífica injustiça
sobretudo pela política...
das necessidades da vida social, o sonho da festa dos loucos e a literatura que nela se apóia não tém verdadeiramente
uma ignoráncia proposital
louco de não ser mais que artistas na terra.*
um lugar atribuído na sociedade, retirando força de sua inserção/exclusão.
No século xDx, foi sobretudo a figura do boémio que serviu de ponto de
bando de artistas vaga pelas ruas
Eis umacena exemplar, em queo
con
omo
sonho contraditório de conquista do mundo burguês e de "não ser maisaque identificação privilegiada à inserção impossível do artista. No verbete
"Boêmio, o Littré cita a seguinte estrofe de Béranger, que condensa bom
artistas".Comcfeito, a arte não dispõe de outro lugar além desse movimento
número de estereótipos então associados à personagem:
a impossibilidade de se encerrar em si
mesma e deixar-se absorver por ece

Feiticeiros, saltimbancos ou
marginais
Outro que se deve rejeitar mas de que se espera o reconhecimento.
Resto imundo
Essa maneira de atribuir um papel-chave aos modos de sociabilidade D'um velho mundo
literária vai de encontro à doxa romântica, de que o Contra Sainte-Beue de Feiuceiros, saltimbancos ou marginas
Prousté um testemunho privilegiado. Ele recusa aí, em primeiro lugat, Alegres Boèmios, de onde brotais?

conivèncias no âmbito das sociedades restritas: o verdadeiro gênio criadoré Querosjulguemos originários das Indias ou do Egito, o boémio romântico
soliirio, oestiloécoisade"profundezas"'enãode "bate-papo" ocorido numa provém, dequalquer modo, do Oriente lendário. Tal como o artista, ele é menos
ribo literária qualquer ou nalgum salão. Uma análise do discurso literário é, "natural desse ou daquele lugar" do que "natural". Mais próximo de uma
vez disso, Natureza perdida da qual encarna o "resto" na sociedade industrial, o boêmio
em
obrigada a introduzir um terceiro, que é a Instituição, para
contestar essas unidades ilusoriamente compactas, que são o criador ou a é feiticeiro. Ele participa espontaneamente das forças com as quais o escritor
sociedade; não para enfraquecer a parte da criaço em favor de determinismos retoma contato por meio do sofrimento e do trabalho criador.
Sociais, maspara A mitologia proreiforme da troupe dos boèmios permite que os escritores
remeter a obra aos territórios, aos ritos, aos papéis quea torna
possivel e que ela torna possíveis. Em vez de considerar a obra
reftlitam sobre seu pertencimento a uma tribo que passa entre as malhas da
que, nos termos de Mallarmé,
apenas aq rede social. Mas, ao contrário do boèmio, o artista no vai de cidade em cidade;
deve "dar um sentido mais puro às palavra
tribo, é pelas "tribos" literárias seu nomadismo é mais radical. C artista boêmio é menos um nômade no
que devemos também nos
interessar sentido habitualdoqueum contrabandista que atravessa as divisões sociais.
Seja ele precepror numa família rica, bibliotecário de algum príncipe ou de
BoEMIOS ESOLITÁRIOS algum ministério, capitalista, professor de colégio.., o escritor ocupa seu lugar
A
Situação
sem
ocupá-lo, no compromisso instável de umjogoduplo. Stéphane Mallarmé
PaiCcem não
paratópica do escritor o leva a
identificar-se con ensina inglês no colégio, mas é também o autorde poemas estranhos eomestre
ser incluídos nas linhas divisórias da sociedade: io que recebe seus fiéis na terça-teira em seu apartamento da rua Roma.
Do A estrofe de Béranger estorça-se por pensaro boêmio como o "resto de um
Op. cit.,
pp. 84-85. velho mundo". Mas esse "resto é rambém excedente que,
um
paradoxalmente,
98
99
Discurso literario- _Um impossivel lugar

-se uma
aa uma socied
sociedade
éo excedente. O escritorjunta-se que
de
faz parte daquilo que fechar sem a representacão
que lh Se necessario, sabem também praticar a abstinéncia com toda a
não pode se
completa, mas que
n u m passado
lendário é associ Virtude de um anacoreta: mas se lhes cai um pouco de dinheiro
se julga projetado
oferecida pela Arte. Esse "resto ser
pode
entendido de duas maneir
nas mãos, vemo-los de imediato perseguir as fantasias mais ruinosas,

Béranger ao adjetivo "imundo', que amar as mais belas e as mais jovens... Depos, quando seu úlümo
antónimo do adjetivo "m
de acordo com a etimologia,
comoo
ndo centavo está morto e enterrado, voltam a jantar à mesa do acaso."

"elegante"); Trata-se de uma descrição que repete a de muitas "cigarras,


do latim mundus ("limpo",
outras
oposto como o
do substantivo "mind. sobrinho de Rameau, por exemplo:
-

de maneira pouco etinmológica, assim à sociedade, constind.


"i-mundo" opée
empregado na rima. O "mundo" daqueles
Hoje com a roupa suja, as calças rasgadas, coberto de farrapos. quase
"mundos, o impensável que sem saparos, ei-lo que vai, cabisbaixo, esquivando-se é-se rentado a
por vários pequenos
e n t r e os mundos. chamá-lo para lhe dar esmola. Amanhä, cmpoado, calçado, cabelos
passam
trisados, bem vesido, caminha, de cabeça erguida, exibe-se, e quase
contaminam: é impuro aquele que não se acha
Esses dois valores se poderieis tomá-lo por um homem de bem. Vive o dia-a-dia.
mundo, de sua casa, de nossa casa. O
estabelecido na clausura de um
Assim, a boemia ruidosa proporciona apenas uma visão redutora da
mundos que tendem a identiticar sua clausur
'artista ameaça estabilidade de
a
condição de escritor, que é sempre um debate entre a integração e a
da paratopia do escritor: é ao
à sua saúde. Nisso reside toda a ambigüidade
mesmo tempo o impuro e a fonte de todo valor, o pária e o
gênio, nos marginalidade. Uma obra como O sobrinho de Ramezu o mostra de maneira
termos da ambivalência do sacer latino, maldito e sagrado. Estando na
exemplar mediante o debate entre "Ele", o boêmio sem teto nem lei, e
fronteira da sociedade organizada, o artista é aquele em que se mesclam "Eu, o escritor com casa própria. O autor não é de fato nem "Ele" nem
"Eu, mantendo-se numa irredutível tensão entre os dois.
perigosamente as forças maléficas e as forças benéficas. A tribo esfarrapada
O mesmo ocorre coma representação que se costuma fazer da condição
dos "boêmios em viagem" baudelairianos é também aquela para quem "está
deescritor; eleéorao marginal queacampa nas cercanias da ordem estabelecida,
aberto o império familiar das trevas futuras" *5 Parasita e pária, o boêmio
ora aquele que descobriu um bom meio de fazer carreira: muitos escritores
pode transformar orgulhosamente sua objeção em meio de acesso ao sagrado:
não consideram errado mendigar pensões ou discutir o montante de seus
Eis-vos de volta, professor. Temos um dever perante a Sociedade, direitos autorais. A literatura tem necessidade de institucionalização (prêmios,
dissestes-me; fazeis parte do corpo de professores; caminhais no
trilho certo. - Eu também, sou o principio: deixo cinicamente
academias, antologias, lugares ao sol..), mas legitima-se, sobrerudo, através
que me sustentem, exumo antigos imbecis de colégio: tudo o que de seus frarnco-atiradores, aqueles que escapam a suasinsutuições. Naliteratura,
posso inventar de bobo, de sujo, de mau, èm atos e palavras, eu tal como na religião, há sempre clérigos e profetas. A enunciação literária
Ihes entrego; pagam-me de
cerveja e mulheres . .
em canecas .

alimenta-se dessa instabilidade irredutível: a miséria não é mais um brev de


No momento, torno-me o mais
crápula possível. Por quê? Quero talento do que a riqueza, um atestado de mediocridade.
poeta trabalho para me tornar vidente 86
ser e

A vida boêmia
parece às pessoas bem-situadas a negação de toda gestao
razoável do dinheiro, de todo Os "soLITÁRIOS" DE PORT-ROYAL
patrimônio. Da mesma maneira como
transgride as fronteiras dos ambientes, o boêmio
gestão das
transgrideos hábitoS A necessidade que tem a criação de explorat as fendas da cartografia social
despesas, estando ora de bolsos cheios, ora sem dinheiro alguu explica em larga medida o fato de a literatura francesa da segunda metade do

85
Baudelaire,
"Spleen et idéal", Les Fleurs du Ma, XII.
Letre à G. Izambard Henri Muger, Scènes de la vie de bohème, Paris, M. Lévy, 1852, p. au.
du 13 mai 1871", in
Euvres, Paris, Gallimard, "La Pléiade", 1954, p. 20/
100
101
-Um impossivel lugar
Discurso literärio

Rochetfoucauld,
timas Boilcau etc.) terem tida fn.
Pascal, La inserção problemática dos jansenistas na sociedade. Por outro lado, a histórna
século xvin (Racine, a si u m a comunidad.ad
de Port-Royal. Ao agregar idade de ulterior confirmou amplamente isso; a imagem de uma minoria de escritores
relações c o m o jansenisno separados da
tamília, que renunci
1avam
leigos ("os
solitários dePort-Royal")
mesmo tempo em Pa. religiosos que se colocam voluntariamente à margem de uma sociedade
sociedade,(esse
convento que esta ao arise inautêntica que os persegue oferece um cômodo espelho à paratopia literárna.
a posições na 0 corpo soCiale introduziu i m
ma
.
A partir do romantismo, muitos escritores buscaram se projetar no
é central e peritéico, solapou
no campo, que criativos dos disctire. .
investimentos
sos jansenismo;foi o caso, no século xx, de H. de Montherland, com suas duas
zona de propícia aos
turbulência
filosóficos ou literários. Duplo inverido
do peças: Port-Royal e O mestre de Santiago.
constiruintes, fossem estes religiosos,
ao "mundo pecador em geral nem
não se opõe nem
dos salões, Port-Royal
ele o 'mundo", isto é, a alta
do pecado que é para
extrema UMA LITERATURA DE SALÃO
manifestação
absoluta. Port-Royal constitui um luear
sociedade", a Corte da monarquia
divisões sociais, inclusive da própria lgreja, lugar em quese A existência no século xIX de um campo literário relaivamente autónomo
para além das supõe uma ruptura entre o mundo profano "burguês" e o mundo sagrado
encontram o profano (os leigos)
e o sagrado (as religiosas),
em
que o mundo
dele retiraram. Irata-se de uma família por da criação. Retomando à sua maneira a denúncia evangélica dos "mornos,
se comunica com aqueles que se
no âmbito da Igrejae fora a doxa, a parir do romanismo, levou ao auge aqueles considerados a melhor
escolha oposta às famílias de sangue, a um sótempo
como à margem dele, Port-Royal preconizao
encarnação dessa ruprura, sob todo e qualquer aspecto: loucura, droga,
dela, tanto no mundo profano irreverência, doença... Basta pensar na maneira como Proust evoca a figura
afastamento de um mundo que seus escritos não atravessar como cessam de
de Nerval no Contra Sainte-Beuve (ver adiante, capírulo "Posicionamento,
com seus debates.
um vírus e que, em compensação, o atravessa
arquivo e gêneros', seção "O posicionamento na lenda").
Lugar por excelència da crítica aos talsos valores, esse jansenismo Mas essa configuração ainda dominante em nossa cultura nada tem de
dificilmente deixaria de contaminar a literatura e ser por ela contaminado.
universal nem de intemporal. Desse ponto de vista, a produção "galante" do
Uma contaminação tanto mais fácil porque a denúncia jansenista da século xvn francês tem paricular interesse. Esse úpo de prática literária está,
aristocracia passa por uma desqualificação dos laços de sangue: tanto o escritor
por outro lado, em diversos países e em diversas épocas. E uma literatura de
como o jansenista reivindicam como único valor as "obras" que cada um
deles realizou, e um e outro atirmam a primazia da realeza espiritua do
autores que não assinam necessariamente seus textos, literatura de "obras"
raramente publicadas que circulam primordialmente no ambiente em que
justo sobre o poder conferido pelo nascimento. Para um jansenista foram elaboradas, uma produção que tem como principal objeto os próprios
conseqüente, os únicos reis verdadeiros são os eleitos de Deus: lugares em que nascem elou circulam: mapas metaföricos do espaço mundano,
Todos
conversações sobre os valores, Os comportamentos, os modos de falar aí
os Bem-Aventurados possuem um trono
[..]. Para conhecer
a
grandeza desse trono, só épreciso compará-lo ao dos reis da
requeridos. Não há nesse caso uma verdadeira tensão entre a literatura e o
terra, e considerar suas diferenças |..|. Basta
considerar o contrário
pequeno mundo em que ela aparece: todo produtor de textos galantes é
de todos esses deteitos e de todas essas misérias para conceber o
potencialmente leitore autor de madrigais, sonetos, perfis... Cada um deles
que é esse Reino divino que Deus preparou para todos os Eleitos.88 produzsaberndo dirige a outros produtores de textos do mesmo tipo, com
quese
os quais ele parilha normas estéticas indissociáveis de normas de
Seria, contudo, absurdo
Boa
julgar que literatura clássica fosse ja
a
parte dela simplesmente insinuou-se nas aberturas que Ihe o erecia a

Pode-se ler quanto a isso o livro de Delphine Denis, Le Paruse galant, bnstitution d'une carégorie lbittéraire au

AVUesiècle, Paris, H. Champion, 2001.


P. Nicole, Essais de
morale, Paris, 1714-1715, vol. IV, p.
281
103
102
-Um impossivel lugar
Discurso literario

Poden-
ede n o r m a s
literárias para
uma
microssOCiedade.
demosv
como uma "mundanizaez Que faz o Amori Sem ruro ali pairara
comportamento mundana
vida
"estetização" de rinde"..) que Esa jovem riança sem nenhum enigma
aí tanto uma

estética.
Osnomes depastoral
("Tircis", "Clorin
testemunham
os
galant E brincando, ao tods tão bem organizata.
produção
salão e em
seus textos
de ficção esa Que superara do Saber a face digra. (..
ficções sobre na tores,
no
atribuem a si mesmos
mediante
travam
debates de um dado salão se Essa proposta sobre o tédio suscitado pela uniformidade constirui tanto
mescla: os metafora da pragmática.
ítica da
mesmo tempo se faz o papel de pastor..A um posicionamento estéico explicitado no poema como uma regra de saber
mas ao todo o seu valor: é
e o território assume aqui ssível viver para aqucle que conversa na boa sociedade não se pode ser desagradável,
mapa
representado S
confusão entre o
mundo
a ficção literária
e o São pedante ("importuno", diz o texto)... Uma maneira de se exprimir que se
estabelecer a separação entre chaves. Esse tino
romances preciosOs,
c o m suas mostra e se legitima através da própria leitura. A "tecedura" das estrofes que
testemunhas disso os grandes
"real".
a um sótempo
"literárioe seguem valida uma enunciação "brincalhona" que não é v tagarelice, mas
desalão é um espaço é Os amores de Psique e Cupido (1669), de la uma força que permite instaurar a harmonia, superar a "massa contusa" do
característico
Um texto
narrativa não é assumida pelo narrador, mas Dor "Caos e a
guerra entre os elementos.
Fontaine, r o m a n c e em que a Aíreside sem dúvidaa principal razão da dificuldade que tem essa enorme
Politilo. Sua narrativa não
personagem
de contador de histórias galante,
produção para se constituir em literarura e o estatuto inferior que lhe costuma
uma

é somente a história de Psique (já


conhecida grandes linhas pelo leitor
em suas
ser atribuído: a adequação de um lugar a um discurso e de um discurso a um
cultivado), mas também a "mostração |m0nstration|, por meio dessa lugar atenua de alguma maneira o afastamento paratópico que o espaço do
mundano, dos modos de falar e se
enunciação de contador de histórias "ser galante" implica. Os textos não são obras que se apartam das mundanidades
Assim, a história contada, as persona-
comportar típicos do mundo galante. e das belas conversações, integrando-se antes ao fluxo contínuo das
gens e a cena de narração participam do mesmo universo. Expõem-se, dessa "civilidades". Não se sai por isso do discurso literário, mas se está longe das
maneira, obras literárias ou plásticas que correspondem à sua estética, à formas protoupicas da literatura, em que os escritores geram um pertencimento
arquiterura, à decoração de que gostam os galantes, o modo galante de impossível à sua sociedade e à instituição literária simultaneamente. Os
conversar num salão. Exemplo significativo é a seguinte passagem, em que "grandes escritores" dessa época também freqüentavam os salões, mas sua
Polifilo se interrompe depois de descrever as belezas do Palácio do Amor: relação com esse espaço é antes de negociaçãoconfliruosa do que de absorção:
Se tentasse escrever a mera quarta parte dessas maravilhas, eu semm
um La Bruyère freqüentava os grandes, mas sua escrita se alimentade uma
dúvida seria inoportuno; porque no final rudo nos dá tédio, tanto
impossível renúncia dos pérfidos encantos dessa alta sociedade (ver adiante,
as belas coisas como o resto. Vou me contentar, assim, em falar de capítulo "Uma paratopia criadora", seção "O insustentável").
um tapete de fios de ouro, que Vinculamos principalmente com

Psique, não tanto pela obra em si, por mais rara que seja, quanto
pelo objeto. A
RUMO A UM NOVO REGIME DA PARATOPLA?
tapeçaria se compunha de seis peças:
Na
primeira, via-se um Caos, O próprio regime da paratopia criadora tal como fixado no século xIx é
Massa confusa em cuja composição questionado pela evolução recente da sociedade. A estética que opunha
Combatiam o orgulho das ondas
"artistas" a "burgueses supunha um mundo de pertencimentos sólidos,
Turbilhoes de caprichosa paixão. mundo em que havia as pessoas de classe e os "artistas", mundo em que as
Nio longe dai, numa mesma pilha,
O gemia sob o peso da tera:
ar

E
fogo, 0 ar, a terra, com a água,
o
La Amous de P'zyché et de Cupidon, Livre de Poche clasique, 1991, Pp. 83-84.
Empenbavanm-se em cruel guerra

104 105
Discus hterdi
-L'm iTpossiel lugar

a
s o b r e t u d o
união c o m os inf
feriores e aa
solapaua
um mundopo que exdad
temiam

posiç:ão "burgués",
de ao
ssoas

status.
O
artista,
com
relação

Mas,
no
começo éculo
do século XXl,
Os grupo_ Seguc nessa mesma dircção a gencralização da atividade da escrita, sua
estabilizado.

vez
menos
os
indivíduoc
Os, que
deem imersão sempre crescente nas
práticas da sociabilidade. Trata-se de um
base na conf
julgava cada
enquadram
lhes escapa, seja fenomeno que não deixa de evocar as práticas de escrita dos salóes galan tes
pertencimento

m e s m o s
uma
identidade que
no
lazer, na confis. o etnia, na
religiosa,
de outrora. Não estamos aqui na órbita de uma literatura em que um arista
si
a
sexuais,
no esporte,
pertencimentos"
ine.. solitário podia elevar a posição de autor à majestade. Produziu-se, asim,
de
preterências

engajamento
político...
Trata-se

que
condena ada vez mais as
cad múltip
pes 025 au
uma espécie de laicização da criação, que se dissemína numa criatividade
fundamental
na qual entram, cm proporções variáveis, uma parte de expressão de si e
uma
"mobilidade"

crônico.
Claro que
essa
mobilic bilidade social não é uma Dar uma parte de integração num grupo.
nomadismo
ser o
motor de um processo de
de criação, mas.
s
Essa imprecisão das tronteiras entre o público e os escritores converge com
é a de
característica
em que
em
que o
escrito
momento
cuja criação.
No
outra, a que aproxima escritores de editores. A literatura a partir do século xn
efeitos sobre a
deixa de ter
com um mundo estabilizado, supunha uma distinçãoentreo manuscritoproduzido peloescritor eo produto
impoe
como
antes
uma

intensamente
obrigada
ruprura
a inventar para si outros camir
aratopu de sua transformação, oferecido a um público: o livro. Houve em nossos dias
criadora ve-se
os
criadores que abalham com
trabalham os novos
meios ofereci uma considerável redução da cadeia que separa editor e auror. Podemos
De sua parte,
de digitalização
generalizada lizacão generalizada ddas informações dificilme acumular as funçQes de autor, editor, impressor, na medida em que é
pelas tecnologias tradicionais. Numa soci iedade que atribui relativamente fácil produzir textos cuja apresentação tem qualidade próxima
podem ser marginais escritor
já não marca e da que um editor pode conseguir. O escritor pode inclusive fazer sua própria
diferençe
dos signos, 0
tratamento
dominante ao

mundo em que a maioria das pessoas era iletrada.


da ou en promoção, bastando para isso saber administrar um site da internet.
como o fazia num
Acombinação desses fenómenos contribui paratormarindistintaa divisão
A diferença entre um engenheiro mes
construíam máquinas. entre o mundo da criação eo mundo do consumo literários. A disseminação,
que se
um escritorsópode ser aque há entre mcriador de programas de computado
avários tírulos, das atividades de escrita, de umlado,eaconcentração da cadeia
uns e outros man1puladores de linono
ou de sites da internete um escritor, inguagen de produção e de difusão nas mãos do próprio "autor ou sua integração a um
A internet oferece alguns podere
mesmo a seus usuarios mais comuns
coletivo técnico, de outro, contribuem para a proliferação de textos, com
No antigo regme da literatura, o acesn
do espaço literário tradicional. relação aos quais hesitamosemfalar
de publicações,de*ocorrèncias" cujo peso
produçãode enunciados oferecidos a um público era drasticamente limiade dificilmente lhes permite aceder à condiço de eventos. E isso provoca em
com a web, consideráveis populaçoes podem participar de dois espaça contrapartida uma sacralização das formas de literarura anteriores. que de
horas comunicando-se no âmbito de distinguem cada vez mais do processo comum da produção.
passar todos os dias algumas
modalidades que não recorrem à interação comum, oral ou escrita, aque
em que indivíduos socialmente identificáveis se comunicavam em espaçus
sujeitos a restrições temporais e espaciais. Tal como na literatura, em que o
próprio enunciado impÑe seu contexto, aquele enviado pela web definea
Identidade de seu locutor, o lugar e o momento de sua emissão: já não i
acesso a um contexto dado, mas a uma
enunciação que instutui suas propne
coordenadas. A possibilidade de ter uma identidade de autor,
pseudónimes
de dispor de uma página pessoal, de enviar mensagens a um puolico
desconhecido se acha alcance de
ao um considerável número de
Pe
106 107

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