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A Vida como Política

Política. Uma palavra que você conhece, e talvez até fale dela achando que tenha
uma certa propriedade, mas realmente conhece o peso do seu significado?

Gabriel Bueno e Kais Husein


Frederico Westphalen

“Primeiramente, a Maynara Nafe é uma mulher, então esse foi o primeiro desafio e
a primeira luta que eu encontrei”. Quando as pessoas falam sobre política, ou
quando o assunto é política, geralmente se pensa nela como algo ruim e distante,
como se fosse apenas um assunto para especialistas, ou então, pensamos que nela
está restringido um grupo determinado. Mas será que é isso mesmo? Afinal, o que
você tem a ver com a política? Você acha que está distante dela, mas não está.

A política governa as nossas vidas. Ela é um fenômeno humano presente em todas


as nossas interações. Talvez, o único momento em que não exista esse fenômeno,
é se você estiver em uma ilha deserta, como no filme Náufrago. Mas todas as outras
vezes que a gente estiver em uma interação humana entre duas ou mais pessoas,
manifestando a suas vontades, desejos e interesses, estaremos fazendo política.
Com isso, ela não se resume aos noticiários que assistimos na televisão, nas rádios
e na internet. Ela está presente no dia a dia das nossas vidas, e quando você
entender que a política é parte do que você é, irá começar a gostar mais dela.

Para que você não se confunda, vamos dar um exemplo de outras manifestações,
ou o jeito mais organizado de entender a política. Primeiro, a política que todo
mundo está acostumado a falar, é a política de Estado, que envolve o Governo,
Partidos Políticos, Eleições e as Ideologias (esquerda ou direita). Vamos mais
fundo? Agora, imagina você, no seu nível pessoal, íntimo, como que a política se
apresenta? … Ela se apresenta através dos seus valores, das suas crenças, dos
seus desejos, daquilo que você acredita, não só do que é certo ou errado, mas
daquilo que você quer viver. Isso, é uma segunda maneira de entender a política,
algo que acontece o tempo inteiro com você, estando junto com os amigos, ou no
trabalho, no relacionamento, e assim por diante.

O terceiro entendimento sobre a política, é interpretá-la pela manifestação da


Nação. Existe uma diferença entre o Estado e a Nação. Estado é o território, e as
instituições que fazem aquele País existir. Já a Nação, é um conjunto de pessoas
que compartilham uma história, uma cultura em comum. Sendo assim, a
manifestação da política na Nação, está relacionada com questões culturais, de
tradição - quais são os heróis daquele povo? quais são os anseios dessa
sociedade?
Assim, levando em consideração essas três manifestações da política (Estado,
indivíduo e Nação) precisamos agora compreender o que são as Lutas Políticas.
Lembra que dissemos que a política tem a ver com aquilo que você acredita, junto
com seus valores e crenças? Então, quando um grupo de pessoas, que
compartilham de um mesmo sentimento ou ideologias, se posiciona contra ou a
favor de um acontecimento que esteja em vigor na sociedade, aí nasce uma luta
política.

Sendo assim, as lutas políticas objetiva reivindicar direitos, respeito e


representatividade, opondo-se sobre os privilégios que os grupos dominantes
detêm. Busca questionar a instauração de padrões definidos, como: etnicidade,
gênero, comportamento, características físicas (corpos magros e não deficientes),
entre outros, para que a diversidade humana seja valorizada na sociedade. Mas que
nessa valorização, se constituem outras condutas sociais e culturais de
enaltecimento dessa diferença. E nessa configuração, surgem movimentos como:
LGBTQIA+, Feminismo, Trabalhadores Sem Terra (MST), Ambientais (ex: WWF),
Antirracista, entre outros.

“Quando eu era criança, a minha luta diária era me proteger, enquanto mulher, de
assediadores. Então até a minha adolescência essa era a minha luta diária,
sobrevivência. Para nós, que não estamos naquele local privilegiado, a cada dia as
coisas ficam mais complexas e a cada dia lutar se torna mais complicado.” comenta
a ativista social Maynara Nafe, da Secretaria de Juventude da FEPAL (Federação
Árabe Palestina do Brasil).

Maynara luta pela causa palestina no Brasil, acreditando que “O Brasil, é um


pedacinho do Oriente Médio à parte”. Visando defender os imigrantes palestinos,
bem como a sua cultura, e a sua história nas relações de poder na sociedade
brasileira, ela argumenta: “É preciso nós falarmos disso em um País que tem uma
relação de comércio muito bem sucedida com países árabes, é preciso a gente falar
disso em um país em que as “nossas balas” vem de um País que oprime o povo
palestino. É preciso falar disso em um País que assinou, a pouquíssimo tempo, um
acordo militar com Israel. Quando a gente fala que as mesmas armas que matam
os palestinos, são as mesmas armas que matam os pobres, os negros, os
favelados aqui no Brasil, é a mais pura verdade. Quem faz o treinamento dos
militares israelenses, é uma força militar brasileira que se chama BOP, e isso não é
falado.”

“Eu acho que tudo começa lá na infância, quando eu tinha… enfim, desde
pequenininha, porque a gente cresce, nós Palestinos da diáspora, muitas vezes não
falam pra gente “você é Palestino”, mas você cresce tomando chá de maramia,
comendo hummus e kinefeh (doce Palestino) de sobremesa e no final de semana
tem makluba enfim, eu já entendia que existia algo que era diferente, porque na
família da minha Mãe não era assim. Então, “cheiro de casa” pra mim é o cheiro de
maramia, é cheiro de tempero árabe, então eu sempre soube, a gente tem um
subconsciente que avisa pra gente que tem alguma coisa diferente.” comenta
Maynara Nafe da FEPAL (Federação Árabe Palestina do Brasil)
Como falamos um pouco acima, a política não está somente vinculada a estratégias
políticas de cunho governamental mas, ela está intrínseca de maneira íntima e
sigilosa em nossas vidas e que muitas vezes nem percebemos, você sabia disso?
Em entrevista a Maynara Nafe ( Secretária da Juventude pela Federação Árabe
Palestina do Brasil) comenta como sua relação com suas duas identidades
transparecem no dia a dia, a mesma comenta como a cultura Palestina continua
conectada a sua família mesmo nascida no Brasil, somente a sensação de
saborear, sentir e saborear um alimento que relembra sua natividade como comer
um prato de Kneffeh (doce Palestino feito com uma massa fina chamda vermicelli e
recheada com queijo e nozes), se torna um ato político.

Em momento descontraído Maynara comenta sobre a história do famoso chá de


“Maramiah” ela diz, “Então, “Maria” em árabe se fala “Mariam” , e existe uma
história de que quando Jesus estava doente Maria dava para Jesus chá de
maramiah, e é por isso que “maramiah” se chama “maramiah” porque vem de
Mária. Aqui no Brasil, existe uma espécie que é parente da maramiah, se eu não
me engano, não sou bióloga (risos) assim, são parecidos mas não são iguais, que é
a sálvia. Então chá de sálvia, molho de sálvia com ervas, eu conheço algumas
pessoas que gostam de fazer, mas a maramiah é muito simbólica para os
palestinos e realmente tem esse sentido de “melhorar tudo” , porque lá na Palestina
é assim, “tô com cólica” - “chá de maramiah”, “tô com dor de cabeça” - “chá de
maramiah”, “sei lá, minha perna quebrou” - “chá de maramiah” , é basicamente isso.

Interessante notar como pequenos atos memoráveis, tornam-se políticos, Maynara


identifica-se com suas duas identidades que marcam fortemente sua trajetória de
vida, aquele sentimento forte de se sentir em casa e relembrar da sua pátria ao
mesmo tempo que traz o sentido e a esperança de justiça para seu povo que vive
atualmente em diáspora, saber que seu papel no Brasil é de extrema importância e
que a mesma se iguala a outras minorias e luta constantemente junto a outros
injustiçados, sua cultura como muitas outras tornam o Brasil na sua mais bela
imagem, a diversidade.

Em entrevista, Maynara expressa um sentimento de raiva. “O quanto nós


brasileiros, estamos contribuindo para um genocídio de um povo? O quanto nós
brasileiros estamos contribuindo para um sistema de apartheid no século XXI? São
lutas intrínsecas.” E agora te convidamos a uma reflexão. Você acha que as lutas
políticas mencionadas no texto estão relacionadas com a sua vida? Acha que faz
parte dela? Que te influencia? Acha que faz sentido para a sua vida? Se a sua
resposta for “não”, sentimos muito. Precisamos lhe dizer que, assim como a política,
essas lutas estão intrínsecas a sociedade, da qual como sujeito, você faz parte.“
porque a luta dos povos oprimidos do mundo, ela é intrínseca uma à outra.
Geralmente, se você for observar, as histórias se conversam”.

É preciso que, a partir dessas noções, tenhamos consciência para entender que as
lutas políticas fazem parte de nossa história. Independente, se você estiver na
vanguarda (na linha de frente, ao combate) de um movimento social ou não, as
ações tomadas por esse grupo, irão interferir na estrutura da comunidade, e
consequentemente na vida de sua família. Observe o exemplo de Maynara e reflita,
quantas pessoas não estão sendo influenciadas pelo discurso que ela propagada
nas redes sociais? Quantas famílias de imigrantes estão apoiando o seu ativismo?
Quantas crianças palestinas-brasileiras usam de Maynara como inspiração de vida?
É por consequência dessas e outras lutas políticas e movimentos sociais que hoje
podemos observar transformações significativas na sociedade. Por exemplo: hoje o
seu filho(a) terá mais liberdade para se expressar em relação à sexualidade,
comparado a 50 anos atrás, onde a OMS (Organização Mundial da Saúde) ainda
considerava a homossexualidade como doença. Sabemos que o preconceito
sempre irá existir, seja com a etnia, sexo, cor, roupa, comida, entre outros. Mas são
por causa desses movimentos sociais, dessas lutas políticas, que podemos
conseguir acessibilidade, respeito e igualdade em nossa singularidade humana.

“O pior analfabeto é o analfabeto político [...] Ele não sabe que o custo de vida, o
preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem
das decisões políticas [...] é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que
odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a
prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político
vigarista, pilantra, corrupto e lacaio dos exploradores do povo.” Diz o poeta e
dramaturgo alemão, Bertolt Brecht.

“Meu sonho?…meu sonho…sabe que essa palavra pra mim sempre teve um
sentido meio inexplicado. Mas eu entendo que ter um sonho significa para as
pessoas, e hoje eu digo que meu sonho, é primeiro, não ter brasileiros passando
fome e não ter mais uma Palestina tão oprimida. Meu sonho é um Brasil sem fome,
e uma Palestina livre.” Para que a nossa civilização caminhe ao progresso, e
enquanto humanidade os nossos direitos e a nossa integridade seja respeitada,
assim como sonha Maynara, precisamos participar das lutas políticas que se
manifestam em nossa terra.

A cada dia você tem uma nova chance. A cada dia você tem um recomeço, uma
nova oportunidade, um novo papel de uma história que você pode escrever. Não
desperdice isso. O seu tempo de vida é muito valioso para não lutar por aquilo que
acredita, assim como diz o rapper, Gabriel O Pensador. “Chega! Que mundo é
esse? Eu me pergunto! Chega! Quero sorrir, mudar de assunto! Falar de coisa boa,
mas minha alma ecoa agora um grito, e eu acredito que você vai gritar junto!”.

Alguns dizem existir o sentido da vida, seja por um ângulo religioso ou científico,
mas será que isso realmente existe? não espere respostas prontas, produzem-as.
Construa você o sentido que você procura para a sua vida, e para aquelas pessoas
que você ama. Use a política ao seu favor, para lutar e reivindicar tudo aquilo que
você acredita que merece ter, e não possui. Procure conhecimento e tenha coragem
para enfrentar as adversidades que apareceram em seu caminho. Para que um dia,
em seus últimos suspiros, você possa dizer “eu tentei, lutei e vivi”.

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