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Editorial..................................................................04
Introdução..............................................................07
Carmesim.................................................................11
Carmesim.................................................................15
Valhalla....................................................................56
Valhalla....................................................................63
Besta”....................................................................157
Despidas”..............................................................159
Apoiadores............................................................165
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Por Marco Antonio Collares
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devido tratamento sobre as influências do escritor texano, bem
como sobre os aspectos nodais inscritos em suas narrativas. Pois
bem, o leitor terá diante de si, a partir de agora, uma revista
quinzenal, na qual serão apresentadas duas resenhas para dois
contos traduzidos, fechando com dois poemas escritos por
Howard, de preferência sobre temas próximos aos contos da
presente edição. Para isso, nos utilizaremos de versões originais
em inglês ou traduções em espanhol, com o labor de Marcelo
Alves, um dos membros do Fórum, mais Fernando Neeser de
Aragão, do site “Crônicas da Ciméria”, e com os auxílios do
estudioso acadêmico em Howard, também escriba do Fórum,
Marco Antonio Collares e do incrível escritor e editor de fantasia,
Jean Gabriel Álamo. Isso sem falar nas ilustrações originais que
pretendemos trazer nas próximas edições, com a participação de
artistas nacionais. Mas que critério será escolhido para os contos a
serem traduzidos e publicados em cada edição dessa revista
quinzenal? Em teoria, nenhum. Não, melhor dizendo, de
preferência, os contos daqueles ciclos howardianos não tão
conhecidos ou que, talvez, possam ser (re) pensados a partir de um
olhar mais aprofundado, expressando a grandiosidade das linhas
escritas. Na primeira edição, a escolha recaiu sobre dois
personagens interessantíssimos: James Allison, dos ciclos de
“Memórias Raciais” e Kirby O’Donnel, dos ciclos de aventura e
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ficção histórica de Howard, o primeiro conto denominado de “A
Maldição do Deus Carmesim”, o segundo, intitulado de
“Caminhantes de Valhalla”. O primeiro, traduzido por Marcelo
Alves e o segundo, por Neeser. Provavelmente o leitor e fã do
cimério Conan não conhece tais contos, conhece pouco ou sequer
sabe que Howard era um escritor prolífico que muito ultrapassou
seu mais famoso personagem, sendo um gênio da escrita pulp de
sua época histórica, os anos 1920/1930. Com essa revista,
esperamos então ajudar a divulgar ainda mais esse grande escritor
da contemporaneidade, desvelando outros tantos personagens e
narrativas vibrantes que certamente irão conquistar ainda mais o
público brasileiro. Nossa intenção, podemos afirmar, é apenas
essa. Nos damos por satisfeitos caso o mestre de Cross Plains seja
finalmente reconhecido por seu gênio criativo e visto para além de
suas mais famosas criaturas.
6
Por Marcelo Souza e Marco Antonio Collares
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“seara” inédita e trazer o melhor da literatura howardiana tanto ao
público em geral, quanto aos apoiadores do Forum Conan o
Bárbaro e, quem sabe, um dia essas edições serão impressas.
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século XX e que vive uma vida tediosa no Texas. Aleijado e
amargurado, James Allison carrega uma doença terminal que o
consome. Vive uma vida solitária que só é esquecida quando ele
se lembra de suas vidas passadas antes dessa Era Contemporânea.
Aqui temos um tipo de narrativa que os especialistas na obra de
Howard chamarão de “memória racial” em que um personagem,
viajando no tempo em Eras passadas, recorda que nasceu, cresceu,
guerreou, amou e envelheceu em uma determinada etnia tribal
bárbara de povos proto-europeus, chamados, dentro do universo
mitológico de Howard, de aesires e vanires.
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vontade humana marcado por deuses e deusa ancestrais
envolvidos na trama. Mas, já resenhamos muito aqui e deixaremos
para o leitor o melhor , que é a leitura, ou como alguns dizem, “o
prazer da leitura” de um autor como Robert E. Howard.
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Por Marcelo Souza
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Ilustração da capa do livro de Robert E. Howard, “Kirby O’Donnell,
Caçador de Tesouros”, feita pea PROVIDENCE Press e publicada em
fevereiro de 2018 na Itália.
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nova versão da história, como se ele tivesse feito algo de bom
com ela). O resultado, «The Blood-Stained God» ("O Deus
manchado de sangue") foi publicado no volume «Tales of
Conan» ("Contos de Conan") em 1955. A versão original teria
que esperar quase vinte anos antes de aparecer como ela
realmente é, e é por isso que, na maioria das edições
publicadas em outros países, esse conto aparece como a terceira
história da saga de Kirby O’Donnell, o que é incongruente
quando se lê os três romances: no final de "A Maldição do Deus
Carmesim", O'Donnell fará amizade com Yar Mohammed, que
se torna seu irmão de sangue. O guerreiro Waziri reaparecerá em
"As Espadas de Shahrazar", reconhecendo O'Donnell com
alegria ao encontrá-lo novamente.
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14
Tradução e Revisão: Marcelo Souza
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CAPÍTULO 1
No Beco de Satã
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Obedecendo aos seus instintos, ele se virou para um raio de
luz que, concidentemente ao lado dele, atravessava a escuridão.
E no instante seguinte, estava espiando por uma fenda em uma
janela fechada numa parede de pedra. O que viram seus olhos
despertou uma maré vermelha de fúria em sua mente, apesar do
fato de que sua alma já estivesse endurecida depois de tantos
anos de aventuras nas terras mais cruéis do mundo.
Ele olhava para uma ampla sala, com paredes cobertas por
cortinas de veludo e o chão repleto de tapetes e divãs caros. Ao
redor de um desses divãs estava agrupado quase uma dúzia de
homens... Sete bravos yusufzai de pele escura, e mais dois, que
eram difíceis de identificar. No divã estava estendido outro
homem, um nativo da tribo Waziri, nu até a cintura. Era um
homem corpulento, mas os rufiões, tão grandes e musculosos
como ele, seguravam seus tornozelos e pulsos. Quatro deles
forçaram-no a permanecer deitado no divã, incapaz de se mover,
embora seus músculos se debatessem, sofrendo violentos
espasmos nos membros e na altura dos ombros. Seus olhos
resplandeciam com um brilho avermelhado e seu peito largo
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brilhava de suor. Havia uma boa razão para isso. O'Donnell viu
um homem grande, com um turbante de seda vermelha, usando
uma pinça de prata, puxando um pedaço de carvão incandescente
dentro de um braseiro, para trazê-lo ao peito nu do cativo, que
mostrava queimaduras de brasas anteriores.
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peludo, arrancando um brado desumano do homem torturado. E,
nesse mesmo momento, O'Donnell se jogou, com todo o seu
peso, contra a janela.
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golpe vindo de cima para baixo, atingindo o pulso que
empunhava o terrível aço. A mão, ainda segurando o punhal,
voou para longe do pulso com um banho de sangue, e a longa e
estreita lâmina que O'Donnell segurava na mão esquerda
deslizou pela garganta do assassino, causando-lhe um engasgo
de agonia.
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evitou o contra-ataque com uma agilidade que poderia ter
envergonhado uma pantera faminta e, com o mesmo movimento,
aproximou-se do homem de turbante vermelho novamente, que
estendeu a adaga para se defender. O homem de turbante
vermelho uivou e deu um salto para trás, evitando o kindhjal de
O’Donnell por uma margem tão estreita que a lâmina cortou sua
roupa de seda, arranhando a pele abaixo. Ele tropeçou em um
divã e perdeu o equilíbrio, caindo atrás do móvel. Mas antes que
O'Donnell pudesse aproveitar sua vantagem, Jallad lançou-se
sobre ele, desferindo uma chuva de estocadas de seu sabre.
Havia tanta força quanto habilidade no braço do homem alto, e
por um instante O'Donnell teve que ficar na defensiva.
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cimitarra, parado no último momento, enviou Jallad
cambaleando para trás e O'Donnell girou como um gato
assustado e saltou em direção a Achmet. O yusufzai uivou,
erguendo o mosquete, mas a velocidade ofuscante do ataque do
americano o pegou desprevenido. Antes que ele pudesse dar um
único golpe, já estava caído no chão, assistindo seu sangue e seu
interior vazarem através de um grande golpe em seu abdômen.
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—Saia daqui! Vá em frente! Rápido!
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homem de turbante vermelho, atrás de seus homens suados,
estava empenhado em incentivá-los, aproveitando para dedicar
ao intruso curdo todos os insultos que conhecia. Jallad estava
tentando fazer um bom corte na direção de O'Donnell, mas seus
próprios homens estavam bloqueando seu caminho. Então, com a
velocidade de uma cobra, a cimitarra de O'Donnell deslizou entre
a lâmina de um tulwar, e um yusufzai, depois de sentir o aço frio
em suas entranhas, caiu no chão moribundo. Jallad, que estava
investindo fundo em uma estocada, tropeçou no homem morto e
caiu no chão. Instantaneamente, a porta foi bloqueada por
diferentes atacantes, que lançavam maldições e xingavam
enquanto tentavam se organizar. Mas antes que pudessem fazê-
lo, O'Donnell virou-se e correu pelo pátio em direção ao muro
pelo qual o Waziri havia desaparecido.
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CAPÍTULO 2
Os caminhos da suspeita
Foi a fraca luminescência de uma lanterna sobre seu rosto
que tirou O'Donnell da inconsciência. Ele sentou-se, piscando e
sobressaltado, tateando em busca de sua espada. Então a luz se
apagou e, na escuridão reinante, uma voz soou:
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algo para ele. O'Donnell captou o brilho do aço sob a luz
estrelada, mas antes que pudesse atacar, como pretendia, viu que
era seu próprio kindhjal, que Hassan havia apanhado do chão e
que agora lhe entregava, oferecendo-o pela empunhadura do
cabo.
—Você é tão desconfiado quanto um lobo faminto, Ali el
Ghazi —Hassan riu—. Mas é melhor você guardar o aço para seus
inimigos.
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—Sei o seguinte —disse Hassan, imperturbável—. Eu sei que
você veio a Medina el Harami seguindo alguns ladrões que
roubaram seu mapa que leva a um tesouro maior que o da horda
de Akbar. Eu também vim aqui procurando por algo. Estava
escondido aqui perto, olhando através de um buraco na parede,
quando você invadiu a sala onde o waziri estava sendo torturado.
Como você sabia que foram eles que roubaram seu mapa?
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mas foi esfaqueado em Cabul por um fanático e morreu lá. Mas,
antes de morrer, deu o mapa a um curdo chamado Ali el Ghazi.
—Você lutou com eles sem saber que eram os homens que
você estava procurando! — disse Hassan—. O waziri é Yar
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Mohammed, um espião de Yakub Khan, o chefe Jowaki
proscrito. Eles o reconheceram e o convenceram a acompanhá-
los até essa casa, e estavam queimando-o para forçá-lo a revelar
os caminhos secretos para atravessar as montanhas, conhecidos
apenas pelos espiões de Yakub. Então você apareceu e já sabe o
resto.
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—Estava disfarçado de afegão ... ele era o homem que
chamavam de Jallad, o Executor, pois matou muitos homens.
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—Muito bem —O'Donnell tomou a decisão rapidamente—.
Mas te matarei se você tentar algum truque, Hassan!
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sonolento. Os homens vão e vêm nas horas mais inoportunas de
Medina el Harami (que, nos mapas, aparece com outro nome,
embora as pessoas jurem que seu primitivo nome muçulmano se
encaixa muito melhor).
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—Foi aqui que eles deixaram o caminho —disse Hassan—.
Até aqui é a trilha deixada por Hawklin. Não seremos capazes de
segui-lo por essas rochas. Você estudou o mapa quando estava
em sua posse... Para onde avança a rota a partir daqui?
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deve ter conhecido esse nome antigo, e o colocou no mapa para
confundir quem pudesse roubá-lo! Vamos! Jehungir Khan
certamente deve saber tudo isso também. Estamos há apenas
uma hora deles e nossos cavalos são melhores que os seus.
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Os olhos de Hassan brilharam de alegria; tal estratégia era
muito agradável à sua natureza oriental.
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CAPÍTULO 3
Espadas nos penhascos
Ao meio-dia eles ainda estavam seguindo o caminho antigo
que serpenteava incansavelmente ... e, obviamente, era tudo o
que restava de uma estrada velha e esquecida.
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bravo chefe. Cavalgamos sozinhos.
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—Cavalgue em direção ao desfiladeiro! —Ele uivou—. É uma
emboscada!
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Um momento depois, O'Donnell estava de frente para o
espadachim, que o atacou brandindo seu pesado tulwar. O
americano levantou a cimitarra e as lâminas encontraram-se em
um estrondo metálico, enquanto os cavalos galopavam lado a
lado. A montaria do homem da tribo recuou de novo com o
impacto, e O'Donnell, levantando-se nos estribos e golpeando
com toda a força, quebrou a lâmina de tulwar, rompendo o
crânio daquele que o empunhava. No momento seguinte, o
americano estava galopando em direção ao desfiladeiro. Ele
esperava que estivesse cheio de guerreiros armados, mas não
tinha escolha. Lá fora, balas choveram ao seu redor, colidindo
com pedras e ricocheteando em árvores secas.
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E Hassan, com o rifle na mão, pulou para a traseira da sela.
Um toque de esporas nos flancos do cavalo carregado o forçou a
galopar pelo estreito desfiladeiro. Os gritos selvagens atrás deles
indicaram que os homens da tribo estavam indo para as
montarias do lado de fora, sem dúvida escondidos atrás do
primeiro penhasco. Então o caminho da garganta girou
bruscamente, e os sons de perseguição foram abafados. Mas eles
sabiam que os selvagens homens das montanhas logo entrariam
no desfiladeiro, procurando por ele, como lobos seguindo uma
trilha.
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levar muito mais longe. Ele se cansa rapidamente. Suas
montarias devem estar mais descansadas. É melhor encontrarmos
um lugar onde possamos dar a volta para lutar. Se conseguirmos
segurá-los até o anoitecer, talvez possamos fugir mais tarde.
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parede e balas assobiaram ao redor deles, colidindo com o toco
de rochas que serviam de refúgio. Eles se entreolharam com um
sorriso sombrio e irônico.
—Saia daí, para levar um tiro, seu canalha! —Hawklin não fez
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nenhuma tentativa de esconder que era britânico—. Eu te conheço,
Hassan! Quem é esse curdo que está com você? Pensei que o
tivesse quebrado na noite passada!
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—É melhor nos deixar juntar a você! —Hassan acrescentou,
reconhecendo, como O'Donnell havia feito antes, que essa era
sua única chance—. Uma grande luta está chegando, e você
precisará de toda a ajuda que puder, se quiser sair vivo dela!
Hawklin fez um sinal por cima do muro com sua cabeça com
um turbante. Evidentemente, confiava no senso de honra dos
dois homens que odiava e não tinha medo de um tiro de traição.
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Realmente não era hora de pensar no tesouro, nem mesmo no
Deus Carmesim! Suas próprias vidas estavam em risco.
O'Donnell e Hassan se levantaram, com rifles na mão e correram
ladeira abaixo em direção à parede de pedra. Assim que
chegaram, os primeiros cavaleiros invadiram a entrada do
desfiladeiro e começaram a atirar. Agachado atrás do muro,
Hawklin e seus homens devolveram o fogo. Meia dúzia de selas
foram deixadas vazias, e os jowakis, desmoralizados pelo
inesperado granizo de balas, viraram-se e retornaram ao
desfiladeiro.
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perto da entrada do desfiladeiro. Os jowakis haviam desmontado
e estavam rastejando pela clareira, aproveitando cada pequeno
espaço coberto. Os rifles deles brilhavam por trás de todo toco de
pedra e cada arbusto frondoso.
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A conversa deles seguia o ritmo dos firmes estampidos de
seus rifles. Os Jowakis, bem escondidos, deixaram de sofrer
vítimas com o tiroteio.
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lançou uma série de maldições quando uma bala bateu em seu
ombro. Lá atrás, na foz do desfiladeiro, O'Donnell distinguiu a
barba ruiva de Yakub Khan, mas o chefe se protegeu antes que
pudesse atirar nele. Tão evasivo quanto uma raposa, Yakub não
estava disposto a liderar o ataque pessoalmente.
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brilhando, espumando nas barbas e os largos punhais brilhando
nos punhos peludos.
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colocou a ponta do cano de um velho mosquete contra o rosto de
Akbar, e a descarga explodiu a cabeça do yusufzai. Um uivante
jowaki deslizou pela abertura estreita deixada pelo cadáver,
subindo a parede antes que O'Donnell pudesse evitá-lo. O
americano recuou com a intenção de carregar o rifle, mas
descobriu que não havia cartuchos no cinto. Só então ele viu o
jowaki selvagem subindo na parede. Ele correu em direção ao
homem, segurando o rifle como um taco, enquanto o beduíno
largou o mosquete para brandir uma faca comprida. Antes que
ele pudesse tirá-la da bainha, O'Donnell golpeou nele com o
rifle, esmagando seu crânio.
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americano com as mãos de gorila e o abraçou, tão perto que ele
foi incapaz de usar seu bastão improvisado. Meio sufocado por
aqueles dedos peludos na garganta, O'Donnell puxou seu
kindhjal e cravou-o cegamente, várias vezes, até que o sangue
escorreu por sua mão e, com um rugido, o jowaki o soltou e
precipitou-se pela beira do muro.
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—Nasci em um palácio —ele sussurrou — e vou morrer atrás
de um muro de pedra! Não importa ... é o Kismet. Há uma
maldição flutuando neste tesouro... Os homens sempre morrem
quando seguem a trilha do Deus manchado de sangue ... —e ele
morreu enquanto falava.
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—Há muita verdade no que você diz — rosnou O'Donnell—.
Mas é melhor você me devolver o mapa para começar.
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O persa assentiu, colocando as duas armas no cinto.
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CAPÍTULO 4
O Tributo do deus carmesim
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que o autor do mapa havia tentado lhe dizer antes. A morte levou
Pembroke mais rápido do que ele esperava. Quando ele estava
imerso na descrição do templo, sua boca se encheu de sangue e
sua cabeça afundou para trás, enquanto se debatia
desesperadamente para sussurrar mais algumas palavras, antes de
morrer. Pareciam algum tipo de aviso... Mas do que?
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estrada calçada que levava à sua porta assombrosa.
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portal. Eles o ouviram gritar exultantemente enquanto alguns
deles se moviam sob suas mãos... Mas então seu grito se
transformou em um uivo de terror quando a porta, uma tonelada
de bronze esculpido, se inclinou e caiu com um estrondo. O
persa não teve tempo de evitá-la. Ele foi esmagado como uma
formiga. Seu cadáver preso permaneceu escondido sob a enorme
laje de bronze, sob a qual agora havia uma grande poça
carmesim de sangue.
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—Obviamente, de alguma forma, conseguiu acionar a porta
sem que ela se soltasse de seus suportes —respondeu
O'Donnell—. Foi o que aconteceu quando Hassan ativou esses
mecanismos. Deve ser o que Pembroke estava tentando me dizer
antes de morrer... quais mecanismos devia acionar e quais evitar.
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existência, um terremoto havia dividido o chão de rocha, e não
havia como saber até onde suas profundidades ressonantes
desciam. Muitas Eras atrás, inúmeras vítimas vociferantes
haviam sido lançadas naquele abismo negro pelas mãos de
terríveis sacerdotes, para servir como sacrifício humano ao Deus
Carmesim. As paredes do templo eram altas e tinham uma
escultura fantástica. O teto estava envolto em sombras
enevoadas.
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paralisado como estava pela contemplação daquele ídolo ímpio.
Ele virou a cabeça, captou o brilho do sabre de Hawklin e se
afastou bem a tempo. A lâmina sussurrando cortou um pedaço
do pano ao lado de sua cabeça. Amaldiçoando seu descuido, pois
deveria esperar tal traição, ele pulou para trás, desembainhando
sua cimitarra.
Hawklin era mais alto que O'Donnell, e seus braços eram mais
longos, mas O'Donnell era igualmente forte e ágil. Hawklin temia
o kindhjal que ele empunhava mais do que a cimitarra na mão
esquerda, e conseguiu manter a luta o mais longe possível, para
que seu maior alcance pudesse ser decisivo. Ele também tinha
uma adaga na mão esquerda, mas sabia que não poderia competir
com O'Donnell no manuseio do punhal. Mas ele conhecia um
grande número de truques sujos e os praticou com seu aço
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comprido. Vez após vez, O'Donnell evitou a morte por uma
margem tão pequena quanto um fio de cabelo e, por enquanto,
nem mesmo sua grande habilidade e velocidade haviam rompido
a excelente defesa do inglês.
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enquanto simultaneamente o kindhjal que O'Donnell segurava na
mão esquerda afundava entre as costelas de Hawklin.
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sair dali antes que a vingança de Yakub Khan pudesse alcançá-
lo. Não retornaria pelo caminho que viera. Estaria cheio de
jowakis. Ele deveria escapar cegamente, avançando por
montanhas desconhecidas, confiando na sorte para chegar a um
lugar seguro.
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Estúpido! Enviei todos os meus homens para lá, exceto um, que
foi o único que não foi ferido. Eles avisariam a tribo, enquanto
eu te seguiria, acompanhado por este homem. Eu segui sua trilha
a noite toda, e cheguei até aqui enquanto lutava com aquele ali,
estirado no chão. Chegou a sua hora, cão curdo! Para trás! Para
Trás! Para tras!
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Ao ouvir esse nome, a identidade do corpulento companheiro
de Yakub foi esclarecida. O homem se abaixou para pegar a
espada e depois exclamou:
—Alá!
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—Cachorro! —Rugiu o chefe, virando-se contra Yar
Mohammed, que recuou por falta de armas de fogo. Yakub Khan
disparou e a bala arrancou uma mecha de cabelo da barba do
waziri. Yar Mohammed uivou uma maldição e correu para ficar
atrás do pedestal do ídolo.
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cima da borda, examinando as profundezas negras. Ele ficou
olhando e ouvindo por um longo tempo, mas nem sequer
conseguiu percebeu o som da queda. Ele estremeceu com a
profundidade horripilante à sua frente e se afastou rapidamente.
Uma mão firme em seu ombro o fez se virar para olhar o rosto
barbudo e sorridente de Yar Mohammed.
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sair daqui rápido! Os Jowakis chegarão a este lugar antes que
passem muitas horas e não devem nos encontrar aqui! Mas existe
um caminho secreto, além deste templo, que desce ao vale, e
conheço caminhos ocultos que podem nos tirar dele e nos levar
muito mais longe, antes que nossos inimigos apareçam. Vamos
lá!
FIM
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55
Por Etienne Navarre e Marco Antonio Collares
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fictícios ... Um único parágrafo pode ser saturado com ação e
drama suficientes para preencher todo um volume ficticio". O
interesse de Howard pela história, por maior que fosse, não se
estendeu, no entanto, aos povos "civilizados". Vejamos outro
enunciado do texano:
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fantasia ou senso de grandiosidade narrativa. Howard sabia que o
verdadeiro épico deveria ser habitado por toques de lirismo, e ele
tinha um senso de poesia capaz de imaginar situações de extrema
beleza que, em princípio, não podiam parecer menos poéticas. O
conceito de civilização que Howard usa como base dramática
essencial da maioria de seus ciclos literários deve muito às teorias
darwinianas na moda de seu contexto histórico. Sabe-se, por
exemplo, que ele leu a famosa obra de Oswald Spengler, “A
decadência do Ocidente”, muito influente na época com seus
toques de darwinismo social. Assim, o escritor texano identificou-
se com o conceito cíclico defendido por esse incrível pensador
alemão: uma vez superado o zênite, cada cidade ou reino ou povo
iniciaria inevitavelmente um declínio que levaria ao se ocaso, a
sua decadência, até a seu desaparecimento. Esse desaparecimento
poderia ser acelerado pela competição e pela invasão de outras
nações que iniciariam assim um caminho inverso, ou poderiam
sofrer um lento definhamento, o que se traduziria em uma
degradação que Howard comumente associava ao vício sensual e
até, em alguns casos, a perversão sexual. Todos sabem que ele
escreveu em, "Além do Rio Negro" que “a barbárie é o estado
natural da humanidade”. Quanto mais as cidades ou reinos ou
povos permanecessem em estados civilizados, mais as mesmas
estariam se afastando de sua poderosa origem, forjadas pelo elo do
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homem com a natureza, tornando-o as mesmas corruptas e
decadentes. Como Xuthal, em Conan ou Neegari em Kane, por
exemplo. Nesse sentido, cidades ou reinos antigos como a
poderosa Estígia ou mesmo Zamora eram notadamente colmeias
de escória e vilania, e seus portões se abriam de “par em par” para
os bárbaros que invadiam de tempos em tempos. Quem não
lembra da queda de Acheron pela força primal dos Hiborianos em
suas vagas expansionistas, naquela época ainda bárbaros e
selvagens. O mérito de Howard, e o que torna sua literatura
atemporal reside, em parte, na transcendência que consegue
conceder a fusão do espírito épico crepuscular e do lirismo
selvagem, com um dinamismo de tirar o fôlego de qualquer leitor
voraz. Howard chegou a conceber um ciclo - apelidado por
especialistas como "memória racial ou ancestral" - no qual um
indivíduo específico, James Allison por exemplo, um homem
aleijado, recordava suas encarnações passadas, normalmente de
homens em contraste com seu atual estado de impotência, sendo
ele no passado comumente algum poderoso guerreiro selvagem.
Em vida, Howard publicou dois contos desse personagem
(deixando alguns outros inéditos), nos quais o ancestral de Allison
era normalmente um guerreiro proto nórdico que vivia em uma era
inconcebivelmente distante no tempo e que realizava várias
aventuras no curso das migrações que seu povo fazia para o sul.
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Sim, tal passado pode ser até mesmo a famosa Era Hiboriana do
personagem Conan, perfeitamente reconhecível na narrativa. O
contato com outras civilizações, mais primitivas ou até em
declínio, tornou essas tramas dos ciclos de memórias raciais
pontos de entrada ideal para estudar como Howard aplicou o
conceito de auge e decadência civilizacional à sua literatura
vibrante. “Caminhantes do Valhalla” é um desses contos e foi
publicado postumamente. Trata-se de um conto que apoia todos os
pontos de Howard sobre barbárie versus civilização, sendo esta
última, uma armadilha antinatural que poderia enfraquecer os
homens e suas respectivas sociedades históricas. Temos aqui uma
narrativa de guerreiros bárbaros, cidades decadentes e combates
sangrentos. Temos ação de início ao fim, com sangue e espadas,
em uma mistura intrigante feita com perfeição pela máquina
insaciável de Howard. "Caminhantes" desvela-se como um sonho
de Allison, como uma rememoração de seu passado, quando ele
era o aesir de nome Hialmar, numa época esquecida da
humanidade, vagando pelos ermos do mundo ao lado de sua raça,
ao final daquela era em que viveu um certo cimério famoso. Muito
do poder da história está nas descrições de Howard dos aesires, os
protagonistas da trama. Eles são "gigantes além da compreensão
dos modernos", e hoje “nenhum homem é tão forte quanto o mais
fraco dos irmãos de guerra de Hialmar”. No entanto, sua força não
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é apenas física. Os aesires são "uma raça de lobos" e anos de
peregrinação e luta "incutiram nas suas almas o espírito da
natureza: o poder intangível que treme no lobo cinzento, que ruge
ao vento norte, que dorme no poderoso tumulto dos rios
turbulentos, que soa na fricção do granizo gelado, no bater das
asas da águia e se esconde no silêncio melancólico dos vastos
lugares ". Essa narrativa chega ao cerne do melhor em Howard,
que não é somente contar apenas uma boa trama, mas mostrar
como homens ficam na frente de todos os seus oponentes e da
fúria sem sentido da natureza. Howard sugere que há algo
enterrado no fundo da alma dos humanos modernos (mesmo sem
eles compreenderem do que se trata), lembrando uma luta
atemporal pela sobrevivência, na qual suas naturezas foram
enterradas por anos e anos de civilização, esperando emergir do
caos e da guerra primal. Se o leitor quer se surpreender com a luta
vigorosa de povos civilizados contra bárbaros errantes em sua
total potência destruidora, representados aqui pelos aesires e pelo
protagonista de nome Hialmar, bem, esse conto é um dos mais
profícuos para gerar tal comoção ante suas linhas escritas. Trata-se
de Howard em toda a sua essência e brutalidade, não perdendo em
nada para as melhores narrativas de seus ciclos mais famosos.
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Tradução: Fernando Nesser de Aragão
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CAPÍTULO 1
O céu estava lívido, melancólico e repulsivo, como o azul
do aço embaçado, riscado por tiras de pálido carmesim.
Delineadas contra esse fundo marrom avermelhado erguiam-se
as baixas montanhas que coroam as áridas terras altas em uma
extensão macabra de areias movediças e florestas ressecadas,
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repletas por terrenos baldios nos quais os agricultores passam
suas vidas de uma maneira assustadora e inútil, amargurados
pelo trabalho estéril.
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A esmagadora melancolia e desolação monótona da paisagem
diante de mim pareceu transformarem minha alma em uma
massa de poeira e cinzas. Depois de deixar-me sentar em um
tronco podre, senti como a tristeza moribunda daquela terra
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pesava sobre mim.
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Eu a observei em assombroso silêncio. Havia tão pouca
beleza em minha vida que mal conseguia distingui-la, mas sabia
que essa mulher tinha uma beleza inconcebível. De estatura
média, era esbelta e bem formada. Esqueci como ela estava
vestida, embora me pareça que sua roupa era modesta, mas
elegante. O que lembro é a beleza curiosa de seu rosto, que se
destacava no meio de gloriosos cabelos ondulados escuros. Seus
olhos atraíram os meus como um ímã; não sabia dizer a cor
deles, mas eram escuros e brilhantes, com uma luz que nunca
tinha contemplado antes. Ela falou comigo com um sotaque
curioso em sua voz, desconhecido para mim, mas tão musical
como sinos distantes.
68
—Não a compreendo — insisti. Nós nunca nos vimos. Você
nasceu neste país? Você não tem sotaque texano.
69
desconhecidos: sem implorar sua empatia, mas em um mudo
silêncio gritando desesperados pela tortura insuportável que suas
almas sofrem.
70
—Se é assim, eu não compartilho dessas lembranças. Eu
poderia ter vivido uma vida plena até aqui, servindo como cowboy
nos dias dos primeiros colonos, que transformaram uma vasta terra
desconhecida em um grupo de fazendas espalhadas. Mesmo
nessas terras, minha vida poderia ter sido plena como caçador de
bisão, guerreiro índio ou até mesmo explorador. Mas eu nasci fora
do meu tempo, e até os poucos feitos dessa época cansativa me
foram negados.
71
—Mas, o que tenho eu para sentir, sonhar ou recordar?
Eu estremeci.
72
—Ou você está louca, ou eu estou. O Texas tem recordações
gloriosas de guerras, conquista e tragédias... mas, o que são seus
escassos séculos de história, comparados com a antiguidade do
Egito...? Isso sim é antiguidade.
73
—Em uma outra Era, aquelas Grandes Planícies se estendiam
até o Golfo —disse ela—. Há muito tempo, o que hoje
conhecemos como o estado do Texas nada mais era do que um
vasto platô que descia suavemente até a costa, embora sem as
encostas íngremes de hoje. Um terrível cataclismo dividiu o
rochedo do Caprock, permitindo que o oceano passasse rugindo,
tornando-o num novo litoral. Depois disso, Era após Era, as águas
gradualmente recuaram, deixando para trás aqueles degraus que
74
você conhece. Mas, ao recuarem, arrastaram muitas coisas
estranhas para as profundezas do Golfo... Você não se lembra das
imensas planícies, estendendo-se ao crepúsculo até os penhascos
que se erguiam em frente ao mar resplandecente? Ou a grande
cidade construída sobre esses penhascos?
75
Contemplei-a, perplexo. Ela se inclinou até mim em um gesto
repentino, e me senti rendido à sua estranha e gloriosa beleza.
Meus sentidos vacilaram. Ela colocou as mãos na frente dos meus
olhos, em um gesto estanho.
76
e então vislumbrei algumas nuvens, ilusórias e luminescentes, que
se retorciam para cristalizar-se em uma paisagem curiosa ... que
era familiar e estranha para mim ao mesmo tempo.
77
do céu do pôr-do-sol e, além, brilhavam as águas azuis de um mar
calmo.
78
Um deles era diferente... ele era mais baixo, apesar de ter
uma compleição forte e o cabelo escuro. E quanto ao enorme
guerreiro loiro caminhando ao lado dele... foi aí que, por um
momento fugaz, senti uma clara sensação de dualidade. Eu, James
Allison, do século 20, me reconheci no homem que eu era naquela
época remota e naquele estranho lugar. Esse sentimento
desapareceu quase imediatamente, e então eu era Hialmar,
descendente das tribos loiras e sem conhecimento de qualquer
outra existência, seja ela futura ou passada.
80
CAPÍTULO 2
Éramos quinhentos homens os quais passaram a encarar as
torres negras que desafiavam o azul do céu e do mar. Marchamos
durante todo o dia, desde que os primeiros raios carmesins do
amanhecer as mostraram aos nossos olhos atônitos. Podíamos vê-
las a distância naquelas descobertas planícies verdes; a princípio,
pensávamos que a cidade estava perto, mas, depois de marchar o
dia todo, ainda estávamos a quilômetros dela.
81
82
Temíamos que pudesse ser uma cidade fantasma... uma
daquelas ilusões que nos atormentaram durante nossa longa
marcha pelos desertos empoeirados do oeste, onde, refletidos no
céu escaldante, acreditávamos ver lagos calmos ladeados por
palmeiras, rios e grandes cidades, que desapareciam quando nos
aproximávamos. Mas agora não era uma miragem causada pelo
sol, poeira ou quietude. Pois, contra o céu claro da tarde, os
contrafortes ciclópicos, as enormes torres com ameias e a colossal
muralha foram distinguidas com clareza de detalhes.
Ah! Quão longa foi aquela jornada! Não houve migração que
pudesse se comparar a ela; nem mesmo as do meu povo, que
foram épicas. Tínhamos atravessado o mundo do norte gelado para
83
as vastas planícies e vales das montanhas férteis, cultivadas por
um povo pacífico e moreno, até as selvas quentes e sufocantes,
que fediam a podridão e fervilhavam de vida através das terras
do leste, que brilhavam com cores vivas sob as graciosas
palmeiras, e nas quais raças muito antigas viviam em cidades de
pedra esculpida... e depois voltamos às terras congeladas e
cruzamos um estreito istmo congelado junto ao mar para descer,
finalmente, por algumas estepes nevadas em que os pequenos
comedores de gordura de baleia fugiam, entre gritos, de nossas
espadas; descemos para o sul e leste, atravessando colossais
montanhas e florestas enormes, gigantescas e desabitadas como o
Éden após a expulsão do homem ...
84
não é capaz de conceber. Atualmente, não há homem tão forte
quanto o mais fraco em nosso grupo, e nossos tendões robustos
eram capazes de uma velocidade ofuscante que os melhores
movimentos dos atletas modernos pareceriam desajeitados, lentos
e pesados em comparação. Nossa força não era apenas física;
nascidos de uma raça lupina, com anos peregrinando pela terra e
lutando contra homens, animais e todos os tipos de elementos,
forjaram nossas almas com o espírito selvagem ... aquele poder
intangível que é visto no uivo do lobo cinza quando ruge no vento
norte, e que subjuga à força dos rios turbulentos, que ressoa nos
açoites do granizo gelado, no bater das asas da águia e no silêncio
dos grandes espaços.
85
mundo. Muitos foram os líderes que nos guiaram e morreram.
Agora nosso líder era Asgrimm, envelhecido por aquela jornada
interminável... um guerreiro delgado, amargo e caolho, semelhante
a um lobo e que costumava morder sua barba acinzentada.
86
Ah, éramos uma hoste brutal e deixamos para trás um rastro
de sangue e cinzas fumegantes em muitas terras! Não me atrevo a
contar sobre os massacres, as carnificinas e as rapinagens que
deixamos para trás, pois você recuaria horrorizado. Você pertence
a uma Era mais suave e pacífica, e não conseguiria entender
aqueles tempos selvagens em que um bando de lobos estripava
outro, e a moral e os costumes da vida eram tão diferentes dos de
hoje quanto o comportamento de um lobo cinza letal e o de um
cachorro de colo viscoso que cochila junto à lareira.
87
Se por ventura alonguei demais minha explicação, foi para
você entender que tipos de homens atravessaram a planície em
direção à cidade e assimilar o que aconteceu a seguir. Sem esse
entendimento, a saga Hialmar não passaria de caos vociferante,
sem ordem ou significado.
89
fileiras levantando as mãos, e as palmas abertas, porque ele queria
negociar. Mas uma flecha traçou uma parábola das torres,
colidindo com o chão ao lado dele, de modo que fez ele voltar às
nossas fileiras.
90
91
Não houve conversa. Enquanto se aproximavam, o velho
Asgrimm gritou como um lobo na caçada e nos preparamos para
enfrentar o ataque. Não íamos em formação; corremos em
direção a eles como lobos, e vimos o desprezo em seus rostos de
falcão, ao nos aproximarmos. Não tínhamos arcos e nenhuma
flecha foi disparada de nossas fileiras que corriam, nem se
arremessou uma lança. Só queríamos chegar ao corpo-a-corpo.
Quando estávamos a um tiro de dardo, enviaram-nos uma chuva
de lanças, a maioria das quais ricocheteavam em nossos escudos
e cotas-de-malha, e depois, com um rugido gutural, nosso ataque
lançou-se ao alvo.
92
martelantes, rompendo suas linhas e pisoteando seus mortos
enquanto prosseguíamos inexoravelmente adiante. Sua formação
de batalha se dissolveu; lutaram contra nós homem a homem, e a
batalha tornou-se uma carnificina. Pois em força individual e
ferocidade, não conseguiam comparar-se a nós.
93
nas paredes, disparando-nos flechas sem grande habilidade.
94
não ser mais que um brilho vermelho, dissipando-se no
amanhecer.
95
não a usasse há muitos anos.
96
mulheres... e vagamos durante várias luas sem possuir uma
mulher sequer.
97
acampamento.
98
—O ouro falso e o brilho são pós de vaidade e dissipam-se
com o passar dos anos, mas o fio da matança jamais fica cego, e o
odor do sangue recém-derramado é bom para o olfato de um
velho.
99
Mas os únicos homens que saíram da cidade vieram apenas
recolher os corpos de seus mortos e, com grandes e estranhos
rituais, cremaram-nos num grande promontório de frente para o
mar.
100
seu rosto cheio de rugas, ensombrecido pelas negras plumas de
seu novo elmo que agitavam-se sobre ele. E pensei em quão
natural aspecto de rei ele tinha, em pé entre seus gigantescos
guerreiros e de espada na mão, comparado com o homem que
repousava estendido na liteira levada por escravos.
101
de Ishtar e rei de Khemu. Que reine a amizade entre nós. Nós
precisamos uns dos outros, pois vocês são homens que vagam
cegamente numa terra desolada, como disse minha bruxaria, e a
cidade de Khemu precisa de espadas afiadas e braços poderosos,
pois vem contra nós um inimigo, vindo do mar, que não podemos
rechaçar sozinhos. Permaneçam nesta terra, emprestem suas
espadas, tomem nossos presentes para o vosso prazer e nossas
jovens como esposas. Nossos escravos trabalharão por vocês, e a
cada dia lhes sentarão diante de mesas que rangerão sob as carnes,
os pescados, os cereais, o pão branco, os vinhos e as frutas. Usarão
belas roupas e morarão em palácios de mármore com leitos de
seda e fontes brilhantes”.
102
sua delgada cabeça.
103
deuses, pois, do contrário, quem poderia erguer esses muros de
basalto, com 24 metros de altura e 12 metros de base? Ou
construir essa grande cúpula dourada, que se erguia a mais de 150
metros por cima das ruas pavimentadas de mármore?
104
inclinado de pedra, cuidadosamente talhado, abrupto e empinado,
que se erguia sobre todos os outros pináculos da cidade, com
exceção da cúpula dourada. A beirada desta ladeira de tijolos
estava apenas alguns pés acima do estrado, e nenhum aesir jamais
viu o que esta ala continha; o povo dizia que era o harém de
Akkheba.
105
procurava ansiosamente, o tempo todo, a jovem de cabelos
dourados, mas não a via em parte alguma. Não mais necessária
como intérprete, o silêncio da cidade havia engolido-a.
106
Mas tudo isto levou tempo. No primeiro dia após visitarmos a
cidade, alguns de nós voltamos a ela, e Shakkaru nos guiou ao
palácio dos altos sacerdotes, que estava unido ao templo de Ishtar.
Ao entrar, vi a moça dos cabelos dourados, polindo um
rechonchudo ídolo de cobre com um pedaço de seda. Asgrimm
pôs uma pesada mão no ombro de um dos jovens príncipes.
107
—Não, meus senhores, Aluna não é para nenhum de vocês,
nem para qualquer outro homem. É a donzela da deusa Ishtar.
Peçam qualquer outra mulher da cidade e ela será de vocês, até
mesmo a favorita do rei; mas esta mulher está consagrada à deusa.
108
relatos de batalha e massacres me atrairiam a mais esquiva das
mais selvagens belezas de Nordheim. Mas Aluna era delicada e
amável, e crescera no templo e no palácio, ao invés da choça de
bambu e do campo gelado! Minhas ferozes fanfarrices
assustavam-na; não as entendia. E, por uma estranha perversidade
da Natureza, era esta mesma falta de compreensão que a tornava
mais atraente para mim. Ao mesmo tempo, a selvageria que ela
temia em mim fazia-a me olhar com mais interesse do que tinha
para com os homens suaves de Khemu.
109
tampouco os egípcios. Não posso fazer mais do que supor que
eram homens de alguma raça antiga, sobreviventes de outra Era,
como o povo de Khemu... destruídos e esquecidos diante da
ascensão de raças mais jovens.
110
homem, exceto os sacerdotes, podiam tocá-la. Era, de fato, uma
simples criada, sujeita à fria crueldade dos sacerdotes aquilinos.
Para eles, não era bela; para eles, sua alva pele e sua brilhante
cabeleira dourada não eram mais que as marcas de uma raça
inferior. E até eu, que não era muito inclinado a exercitar meu
cérebro, tive a vaga ideia de que, se uma garota loira era tão
desprezível a seus olhos, a traição devia espionar por trás das
honras que rendiam a homens da mesma raça.
111
tropical ao sul.
112
matando os pescadores que dormiam em choças ao longo da praia,
massacrando os trabalhadores que se preparavam para lavrar os
campos e atacando os portões. Contudo, os grandes muros
resistiram e os atacantes cansaram-se do assalto e se retiraram.
Mas o rei ruivo permanecera diante dos portões, balançando pelos
longos cabelos a cabeça decepada de uma mulher, e gritou seu
sangrento juramento de regressar com uma pequena frota de
canoas de guerra que faria o mar enegrecer, e derrubar as torres de
Khemu no pó manchado de vermelho. Ele e seus assassinos eram
os inimigos que tínhamos sido pagos para combater, e
aguardávamos sua chegada com selvagem impaciência.
113
sacerdotes guiar-nos à silenciosa caverna em penumbra de um
edifício, que era o templo de Ishtar. Fomos inclusive ao altar
secreto, cujos fogos sagrados queimavam suavemente nas trevas
perfumadas. Ali, uma uivante escrava foi sacrificada no grande
altar negro com veios avermelhados, ao pé das escadarias de
mármore que ascendiam na escuridão, até se perderem de vista.
Essas escadas levavam à morada de Ishtar, nos disseram, e por
elas subia o espírito do sacrifício para servir à deusa. História que
acreditei que era realmente de fato, pois quando o cadáver do altar
ficou imóvel e os cânticos de adoração morreram num murmúrio
de gelar o sangue, ouvi sons de pranto bem acima de nós, e soube
que a alma nua da vítima contemplava, aterrorizada, a sua deusa.
114
cansaram-se da comodidade, do luxo e até das mulheres de pele
escura, pois, na estranha alma dos aesires, só a sede da batalha
escarlate e a vagabundagem permanecem constantes. Asgrimm
conversava diariamente com Shakkaru e Akkheba sobre os tempos
antigos; eu estava acorrentado pelo desejo por Aluna, e Kelka se
embriagava todo dia nas tabernas, até cair inconsciente na rua.
Mas os outros bradavam contra a vida que levávamos, e
perguntavam a Akkheba sobre o inimigo que deveriam aniquilar.
115
CAPÍTULO 3
116
A porta estava bem fortalecida, era de mogno reforçado com
prata, mas arrebentei-a como se fosse uma frágil placa de madeira.
Aluna encolhia-se no chão, com sua curta túnica revolta, diante de
um sacerdote de rosto afilado que, com fria maldade, açoitava-a
com um cruel chicote que deixava vergões vermelhos em sua
carne nua. Quando entrei, ele virou-se e seu rosto ficou
acinzentado. Antes que pudesse mover-se, cerrei o punho e lhe dei
tal golpe que esmaguei-lhe o crânio como uma casca de ovo, além
de quebrar-lhe o pescoço.
117
consegui-la, que percebe a diferença entre raça e laço. Assim, eu,
que apertara em meus braços mulheres de muitas raças, que era
irmão de sangue de um selvagem picto, enlouqueci de fúria diante
da visão de um estranho pondo as mãos sobre uma mulher aesir.
118
Com um olhar para Aluna e uma desajeitada incoerência
lutando para expressar-se, me virei para seguir com o picto, mas a
moça se ergueu cambaleante e correu em minha direção, com as
lágrimas rolando por seu rosto e seus braços estendidos numa
súplica.
119
Havíamos tirado os alegres enfeites do corpo e da cabeça, os quais
usávamos na cidade. O sol nascente faiscava em nossos capacetes
com chifres, nas couraças desgastadas e espadas nuas. Esquecidos
os meses de ócio e libertinagem, nossas almas ardiam com a
selvagem exultação da matança vindoura. Íamos a ela como a um
banquete e, ao marchar, fazíamos entrechocar a espada e o escudo
num ritmo frenético e trovejante, e cantávamos a canção de morte
de Niord, que comeu o vermelho e fumegante coração de
Heimdul. Os guerreiros de Khemu nos contemplavam,
assombrados; e as pessoas que abarrotavam os muros da cidade,
agitavam suas cabeças, perplexas, e intercambiavam murmúrios.
120
penhascos até a praia, e por eles deviam subir os invasores, pois os
precipícios dos outros lados eram impossíveis de escalar.
Alinhamo-nos diante desses caminhos e os homens de Khemu
ficaram atrás de nós. Pouco poderiam fazer nessa batalha,
mantendo-se na reserva para uma ajuda que não pedimos.
121
recuaram vacilantes, logo se agruparam e voltaram novamente.
Quebramos um ataque após outro, e um ataque após outro se
lançou pelas passagens com ferocidade cega. Os atacantes não
usavam armadura, e nossas longas setas penetravam os escudos
cobertos de pele como se fossem de pano. Não sabiam usar arco e
flecha. Ao chegarem suficientemente perto de nós, atiraram suas
lanças numa chuva uivante e alguns dos nossos morreram. Mas
poucos deles chegaram a um tiro de lança, e menos ainda
chegaram ao fim das passagens. Lembro de um guerreiro enorme,
que chegou arrastando-se pelo desfiladeiro, feito uma serpente,
espuma rubra escorrendo de seus lábios e as extremidades
emplumadas das flechas sobressaindo de seu ventre, costela,
pescoço e membros. Uivava como um cão raivoso e sua mordida
agonizante arrancou o calcanhar de minha sandália, enquanto eu
transformava sua cabeça numa ruína vermelha a pisadas.
122
penhascos e o sol poente teria iluminado as ruínas fumegantes de
Khemu.
123
penhascos. O rei se encontrava num terreno plano, onde a ladeira
inclinada corria horizontal num curto trecho antes de lançar-se
novamente para cima. As flechas haviam-no ferido e as espadas,
cortado-o, mas a enlouquecida labareda de seus olhos não havia se
apagado, e sua voz de trovão continuava ameaçando seus
ofegantes, cansados e cambaleantes guerreiros a seguirem adiante.
Mas agora, embora a batalha continuasse raivosamente em outros
desfiladeiros, ele se erguia entre um exército de mortos e só havia,
junto a ele, dois enormes guerreiros, com as lanças cheias de
sangue e miolos.
124
despedaçaram. Antes que eu pudesse golpear de novo, ele largou o
cabo quebrado e me agarrou como o faria um urso. Soltei minha
espada, inútil a tão curta distância e, abraçados, lutamos no alto do
penhasco.
125
impedi.
126
aclamando-nos, e colocando, aos nossos pés, tapetes de seda
cobertos de rosas e pó de ouro. Carregamos nossos feridos em
liteiras. Mas, primeiro levamos nossos mortos à praia e quebramos
canoas de guerra para fazer uma grande jangada, carregamos-na e
ateamos fogo nelas. E levamos o rei ruivo dos invasores,
estendendo-o em sua grande canoa de guerra, com os cadáveres de
seus chefes mais valentes a seu redor para servirem-no na terra das
sombras, e lhe rendemos as mesmas honras que a nossos próprios
homens.
127
guerreiros de Khemu... trezentos, para render mais honras aos
aliados, disse Akkheba.
128
forçada. Mas não vi Aluna. Assim que dei a volta, entrei por uma
das portas arcadas de mogno, cruzei uma câmara e entrei na outra.
Estava tenuemente iluminada e quase esbarrei no velho Shakkaru.
Recuou e pareceu muito incomodado por me encontrar, por algum
motivo. Notei que sua mão agarrava sua túnica, a qual, segundo
Akkheba, todos os sacerdotes usavam essa noite em nossa honra.
—Ela está ocupada com suas tarefas, então agora ela não
pode vê-lo, disse ele. — Vá ao templo amanhã...
129
Pendia de minha mão feito um boneco, seus pés agitando-se
longe do chão, sua cabeça jogada para trás até quase quebrar o
pescoço. Com o medo da morte em seus olhos arregalados,
sacudiu violentamente a cabeça, e eu afrouxei um pouco minha
mão.
130
feridos.
131
pelos escravos. Entrei correndo no pórtico de altos pilares do
templo... atravessei, correndo, as trevas profundas, tateando no
escuro... irrompi na luz tênue do altar secreto... e parei, gelado.
Sacerdotes menores e mulheres nuas cercavam o altar em posição
de adoração, entoando o cântico do sacrifício, segurando taças de
ouro para recolher o sangue que fluía pelos sulcos manchados na
pedra. E nesse altar, gemendo em voz baixa, como um cervo
agonizante, estava Aluna.
132
avermelhado de loucura, uma esbelta mulher nua que estava
próxima ao altar, imobilizada de terror. Uma taça nos lábios, seus
olhos relampejantes, peguei-a com a mão esquerda e estatelei-a
contra as escadas de mármore, com uma fúria que deve ter
despedaçado todos os ossos de seu corpo. O resto, não me lembro
bem. Houve uma breve e louca explosão redemoinhante de
ferocidade, que semeou o altar de corpos mutilados. Depois me
ergui solitário entre os mortos, num altar que era uma confusão
total, com poças, manchas e regos de sangue, e fragmentos
humanos espalhados horrível e obscenamente pelo escuro chão
polido.
133
Toda minha alma agonizante gritava em meu interior, mas
meus lábios permaneciam mudos com a falta de articulação do
bárbaro. Caí de joelhos, junto ao altar, e, tocando vacilante sua
forma delgada com meus braços, beijei lento e vacilante – como
faria um jovem inexperiente – seus lábios moribundos. Esse ato –
esse único e vacilante beijo – foi o único traço de ternura em toda
a dura vida de Hialmar dos aesires.
134
Ishtar! Haviam enviado seu espírito trêmulo à deusa e, seguindo
esse espírito de perto, chegaria o vingador! Só a deusa sangrenta
poderia pagar por Aluna. Meu culto eram os rituais simples do
bárbaro. Os sacerdotes haviam me dito que Ishtar morava nas
alturas e que os degraus levavam à sua residência. Eu supunha
vagamente que subiam através de reinos nebulosos de estrelas e
sombras. Mas subi até uma altura que fazia a mente vacilar, até o
altar debaixo de mim tornar-se um vago jogo de tênues luzes e
sombras, e a escuridão me envolveu completamente.
135
Louco de fúria, agarrei as barras que se torceram e partiram-
se em minhas mãos. Afastei-as como fibras de palha e cruzei-as de
um salto, com meu grito de matança tremendo na garganta. Na
tênue luz, vinda de uma tocha num nicho alto, vi que eu estava
numa câmara circular com uma cúpula, cujos muros e teto
pareciam ser de ouro. Havia ali leitos de veludo e almofadas de
seda, e entre eles jazia uma mulher nua, chorando. Vi as marcas
de um chicote em seu corpo alvo e parei, assombrado. Onde
estava a deusa Ishtar?
136
você seja... conceda-me um pouco de clemência, se ainda resta
clemência no mundo! Corte minha cabeça e acabe com esta longa
agonia!
137
Poseidon se cansou da Lemúria e da Atlântida. Ergueu-se e
sacudiu sua cabeleira espumante, e seus brancos corcéis correram
sobre os muros, os pináculos e as torres escarlates. Mas me
levantou suavemente sobre seu seio e me levou intacta a uma terra
distante, onde vivi durante muitos séculos entre uma raça estranha
e benevolente.
138
meio oculta pela fumaça do sacrifício, ou lhes permitiam ouvir
minha voz, falando numa língua estranha como um oráculo. Mas
os sacerdotes... oh, deuses de Mu, como tenho sofrido em suas
mãos! Deusa do povo... escrava dos sacerdotes!".
139
Vocês destruíram os inimigos que temiam... agora, voltam-se
contra vocês!
140
vazias.
141
contra gigantes seminus de cabelos amarelos, que golpeavam e
dilaceravam como leões feridos, embora suas únicas armas fossem
bancos quebrados, armas arrebatadas de inimigos agonizantes ou
suas mãos nuas, e cujos lábios estavam manchados com a espuma
da agonia que inundavam suas entranhas. Juro por Ymir que não
morreram sós; seus pés pisavam corpos mutilados, e eram como
bestas selvagens cuja ferocidade não é satisfeita até extinguir-se a
última e diminuta faísca de vida.
142
143
CAPÍTULO 4
O grande salão do banquete ardia. À sua luz, vi sobre o
estrado que se erguia acima do combate, o velho Akkheba
estremecendo-se de terror ante sua própria traição, com dois
guardas robustos nos degraus sob ele. A luta havia se espalhado
por todo o pátio e eu vi Kelka. Estava bêbado, mas isso não
mudava suas qualidades mortíferas. Era o centro de um nó
convulso de figuras que lutavam e cortavam, e sua longa faca se
movia velozmente à luz do fogo, enquanto destroçava gargantas e
ventres, derramando sangue e vísceras sobre o piso de mármore.
145
dedos. Retorcendo, em seguida, a lança e atirando-a para um lado,
corri na direção de Akkheba, que gritou e ergueu-se de um salto,
agarrando a beirada lavrada do curvo teto de pedra atrás do
estrado. A loucura do terror deu forças e qualidade ao velho.
Trepou pela inclinação feito um macaco, agarrando-se, com mãos
e pés, aos adornos esculpidos e uivando o tempo todo, feito um
cão espancado.
146
escapado da prisão dourada que eu quebrara. Agora erguia-se
sobre a cúpula, chamando o deus de seus pais, Poseidon!
147
Mas eu tinha minha própria vingança para consumar.
Preparei-me para o salto que levaria a nós dois numa queda de
cento e cinqüenta metros, para nos esborracharmos na morte... e,
sob meus pés, a sólida construção se moveu. Um novo frenesi
soou nos gritos de Akkheba. Com um estrondo de trovões, os
distantes penhascos caíram ao mar. Houve um longo e
cataclísmico choque, como se o mundo se despedaçasse, e, diante
dos meus olhos assombrados, toda a vasta planície ondulou, cedeu
e afundou em direção ao sul.
148
A cúpula ainda cavalgava sobre a catástrofe, sobre ela a
figura alva continuava gritando e gesticulando. Logo, com um
rugido espantoso, o mar se deslocou e se ergueu, e grandes
tentáculos de espuma verde se curvaram, altos como montanhas, e
caíram rugindo sobre as ruínas que deslizavam, subindo cada vez
mais alto, até que todo o lado sul da cidade esmagada foi
escondido pelas águas verdes que se revolviam.
149
sobre as ruínas, mantendo sua posição. E, nesse momento, saltei e
agarrei o velho Akkheba. Seu grito de morte ressoou em meus
ouvidos enquanto, sob meus dedos de ferro, senti sua carne ser
esmagada como polpa apodrecida, seus tendões saltarem-lhe dos
ossos e os próprios se estilhaçarem.
150
Levantei-me, com um grito, as mãos estendidas como que
151
para afastar as ondas trovejantes. Hesitei, atordoado pela surpresa.
Khemu e o passado haviam se desvanecido. Eu estava na colina
coberta de carvalhos e o sol pendia à altura de uma mão sobre os
carvalhais ressecados. Só se passaram segundos desde que a
mulher fizera aquele gesto diante dos meus olhos. Agora
continuava me olhando com esse enigmático sorriso, que tinha
menos de zombaria que de compaixão.
152
depois da terra abrir-se, antes que as águas recuassem e deixassem
estas longas estepes ondulantes.
153
"Se transformou em Ishtar dos assírios e Ashtoreth dos
fenícios; foi Militta e Belit dos babilônios, e Derketa dos filisteus.
Sim, e ela foi Ísis dos egípcios e Astarté de Cartago; foi Freya dos
saxões, Afrodite dos gregos e Vênus dos romanos. As raças
chamam-na com muitos nomes e adoram-na de muitos modos,
mas é uma só e os fogos de seus altares não se apagaram".
154
Hialmar!
Então a noite caiu, e não sei pra onde ela foi, mas eu me
sentei solitário na espessura da colina e o vento noturno subiu
sussurrando das dunas arenosas e dos pequenos bosques
ressecados, e murmurou entre os galhos tristes dos carvalhos
murchos.
FIM
155
Segundo Rusty Burke, editor e estudioso em
Robert Howard, o poema que se segue seria “das
melhores expressões da crença de Howard de que
somos, por natureza, bestas. Podemos construir
civilizações, mas ainda somos apenas macacos”.
156
Tradução de Marco Antonio Collares
157
O poema, a seguir, nas considerações de Burke,
trata dos ciclos das civilizações, ascendendo e
decaindo, sendo substituídas pelas vagas e hordas
bárbaras que então constroem uma nova civilização.
Ela novamente surge e então declina e cai novamente
perante novos bárbaros, num ciclo ininterrupto de
civilização e barbárie.
158
Tradução de Marco Antonio Collares
160
Isso rolou na página escrita,
Não poderia virar o aço acionado,
Apoiado pela raiva primitiva.
De que valem a harpa e o alaúde,
Cinto com gemas e capa roxa,
Quando o machado pingando estava atingindo a casa
Na chama e na fumaça ofuscante?
O sangue manchava seu cetim, seda e renda.
Você ouviu seus filhos gemer,
E seus anciãos uivaram no mercado
Onde retiramos a pele do osso.
E onde seus juízes barbudos sentaram
Ordenando aos homens que vivessem ou morressem,
Um assassino nu rugiu e acenou
Um couro cabeludo ensanguentado no alto.
Sobre as ruínas arqueadas e espiraladas
As ondas ondulantes da nuvem de fumaça;
E você que viveu quando a espada estava cansada,
Você vive, mas como nossos escravos.
Nossas mãos duras agarram suas taças de ouro,
Nossos pés ásperos esmagam suas flores;
Nós colocamos nossos cavalos em estábulos em seus
corredores,
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E toda a sua riqueza é nossa.
Nós trocamos nossos troncos de pele de lobo por sedas,
Nós os usamos desajeitadamente,
Nossos olhos estão sombrios, nossas barbas não aparadas,
Nossos bloqueios emaranhados fluem livremente.
Mas nossos filhos vão aparar suas barbas e cabelos,
Usarão capas de tom carmesim;
Eles vão levar suas filhas para suas camas,
Até que fiquem macios como você.
Eles vão trocar sua liberdade por harpas e alaúdes,
Descartar o arco e o dardo;
Eles vão construir uma prisão de cetim e ouro,
E chamá-las de Cultura e Arte.
Eles vão deitar no colo de uma terra sorridente,
Até que sua ferrugem desfaça e apodreça,
E eles desprezarão seu sangue e a mão calejada,
E os pais que os geraram.
Mas nossos irmãos ainda vivem no deserto escaldado pelo
sol
E seus filhos são duros e magros;
Eles vão caçar a matilha de lobos que perseguimos,
E beber a água que bebemos.
As fomes que sabíamos, eles também saberão,
162
As cicatrizes de presas e sarças;
Nas rochas onde eles se agacham quando as tempestades de
areia sopram
Eles encontrarão as marcas de nossos fogos.
Eles conhecerão as fomes que uma vez tivemos,
Enquanto corre o fluxo dos séculos,
Até que eles explodirão no deserto, loucos de fome,
Para massacrar nossos filhos preguiçosos.
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164
Adeson Moraes
Afrânio Willian Tegão
Alexsandre de Lira Silva
Corwin Gothcrom
Edgar Rupel
Endeusa Marius
Eliezer Martins
Emerson Silva
Fabio Moreira de Melo
Fernando Donizetti
Gustavo Henrique Lemos
Henry Bernardo
Jonatas Faria Rossetti
João Dinardi de Castro
Karolyne da Rocha Bastos
Leonardo Franco Miranda
Leone Lúcio
Luiz Alfredo Bexiga
Marco Antonio Collares
Marcos Flávio Rodrigues
Mariana Bernardes
Mateus Martinbianco Bauer
Pedro Henrique Gonçalves Ferreira
Robilam Corrêa Júnior
Rodrigo Chiesa
Ronan Barros
Sebastião Alves
Valter F. Viana