Você está na página 1de 5

A IMPORTÂNCIA DO TURISMO RELIGIOSO DE MASSA PARA O

DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO DE BASE LOCAL1

Márcio Monteiro Rocha2

O turismo é entendido como o movimento de pessoas que buscam entretenimento,


descanso, experiências religiosas, culturais ou ecológicas em lugares considerados
adequados para estes fins. O turismo surgiu como atividade organizada no século XIX,
projetou-se como fenômeno de massa a partir da Segunda Guerra Mundial, tornou-se uma
atividade propulsora do desenvolvimento econômico e social em vários países do mundo,
representando um mercado que movimenta bilhões de dólares todos os anos
(PORTUGUEZ, p. 169).
De acordo com Silva3, no processo de desenvolvimento da atividade turística são
identificados cinco principais períodos. Ao longo das cinco décadas compreendidas entre
os anos 1790 e 1840 destacou-se o primeiro tipo de turismo, praticado especialmente por
integrantes de pequenas elites inglesas. Já o segundo tipo de turismo compreendeu o
período de 1840 e 1870, caracterizado por três décadas de desenvolvimento dos mercados
de transporte ferroviário e marítimo, além da multiplicação e diversificação dos meios de
hospedagem e alimentação.
O terceiro tipo de turismo compreendeu os anos de 1870 e 1900 marcados pela
expansão das redes hoteleiras construídas para atender ao turismo gerado pelo
crescimento exponencial da classe média e pelo surgimento dos centros turísticos
europeus. Já o quarto tipo de turismo destacou-se pelas três décadas de atividades
massivas compreendidas no período de 1900 a 1930 para atender à demanda turística
gerada pela promoção dos esportes de inverno. Este fenômeno do Turismo de Massa, com
vistas ao Turismo Religioso, será o principal objeto de estudo nesta breve dissertação.
O quinto tipo de turismo surge a partir dos anos 1930 com a intensificação das
atividades das agências de viagens que proporcionaram a diversificação dos pacotes
turísticos, aumentando significativamente a oferta e a procura de novos destinos (SILVA,

1
Dissertação solicitada na disciplina Gestão de Turismo, Turismo Religioso e Desenvolvimento Local II,
pelo Prof. Marcus José Takahashi Selonk, curso de Especialização em Ciências da Religião e Ensino
Religioso, 30/11/2022, Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP.
2
Pós-Graduando em Ciências da Religião e Ensino Religioso. E-mail: marcio.mrocha@hotmail.com
3
Sylvio Bandeira de Mello e Silva tem doutorado em Geografia, atuou como professor de Mestrado em
Geografia na Universidade Federal da Bahia - UFBA e pesquisador do CNPq. Caixa Postal 7127-4181 -
970 Salvador-BA-Brasil.
p. 10). O turismo também passou a se desenvolver a partir da perspectiva de bases
comunitárias com forte tendência à territorialização, a fim de evitar os impactos negativos
no meio ambiente, a perda de identidades culturais, a evasão de divisas, sustentando o
desenvolvimento socioeconômico local, para o qual o Turismo de Massa, considerado
isoladamente, poderia representar uma ameaça.
O Turismo de Massa tende a ser agressivo, podendo resultar na redução da
participação comunitária predominante no Turismo de Base Local, em que pequenas
empresas podem gerar mais benefícios econômicos diretos e menos impactos ambientais
e culturais. Projetos turísticos que promovem empresas locais contribuem mais com a
redução da fuga de divisas e com a diminuição da dependência dos operadores turísticos
nacionais e internacionais (PORTUGUEZ, p. 128).
O Turismo de Massa pode elevar a pressão imobiliária por meio de médios e
grandes investimentos em infraestrutura hoteleira de médio e grande porte, ameaçando a
cultura tradicional das comunidades locais, tanto mais quanto se constata o potencial
turístico de uma determinada região, seja pelo encanto encontrado nos refúgios naturais,
pelo conforto oferecido pelos paraísos artificiais ou pela renovação espiritual
proporcionada pelos espaços sagrados.
No âmbito religioso, o aumento na incidência de diversas formas de hierofania4
constatadas ao longo do tempo tem levado, desde a criação de inúmeras rotas de
peregrinação até o surgimento de hierópolis5 de abrangência regional, nacional e
internacional, promovendo deslocamentos de milhões de pessoas provenientes de todas
as partes do mundo, motivadas pela busca da experiência religiosa. Pode-se, portanto,
observar no fenômeno religioso uma oportunidade ímpar para o desenvolvimento
socioeconômico de base comunitária em locais que disponham de atrativos de natureza
religiosa.
O Turismo Religioso deve ser desenvolvido na perspectiva da sustentabilidade em
todos os aspectos, mantendo em seu escopo o firme compromisso de proporcionar ao
turista, não só a oportunidade de encontro com a experiência sagrada, mas a garantia de
controle sobre os impactos ambientais e culturais produzidos por este tipo de

4
Nos estudos religiosos, uma hierofania é considerada como uma manifestação ou revelação do sagrado.
(Infopédia)
5
Hierópolis são cidades-santuários construídas a partir de preceitos religiosos ou que assim se tornaram em
função de uma ou mais hierofanias. (Rosendahl)
deslocamento massivo, gerado não somente pelos diversos calendários religiosos, mas
pela oferta agressiva de pacotes turísticos que exploram o mercado religioso.
A instrumentalização do Turismo de Base Comunitária com seu planejamento
participativo, tem sido a forma mais adequada para evitar impactos ambientais e culturais,
promovendo o desenvolvimento socioeconômico local por meio de uma estrutura
extremamente simples, como a adaptação das próprias casas e comércios locais para
atender às necessidades básicas de hospedagem e alimentação (PORTUGUEZ, p. 129,
130)
O Turismo de Massa proporciona o desenvolvimento de uma indústria que atende
às necessidades atuais de um público amplo e exigente que faz parte de uma população
que demanda abrangência e eficiência dos serviços turísticos diversos. De acordo com
Burns, as principais características do Turismo de Massa são a ampla disponibilidade de
serviços, investimentos elevados em infraestrutura, baixos custos oriundos da economia
de escala, emprego massivo de tecnologias e padronização de pacotes turísticos e de férias
(PORTUGUEZ, apud BURNS, p. 170)
De acordo com Burns, o Turismo de Massa é caracterizado pelo fluxo constante
de visitantes de classe média, exigindo um padrão de atendimento que atenda às
necessidades de hospedagem e alimentação, de acordo com os valores próprios desse
público (BURNS, p. 65). De acordo com Barreto, o Turismo de Massa procura a fuga do
cotidiano em lugares que ofereçam recreação e relaxamento físico e espiritual para um
público que representa a maioria dos turistas (BARRETTO, pp. 20-23). As altas
temporadas coincidem com o cronograma das férias escolares e dos feriados prolongados,
portanto os turistas de massa têm como destino preferencial lugares onde o
entretenimento programado representa uma vantagem cronológica para eles.
Pelo fato das programações do Turismo de Massa serem previamente organizadas,
intermediadas ou agenciadas, os turistas estabelecem pouco contato com a população
local. No entanto, sua presença pode provocar significativas alterações nos usos e
costumes da comunidade visitada, porque ela tem que adaptar os seus modos de produção
e os tipos de relação social para garantir o atendimento da demanda turística, que vê na
comunidade visitada uma mera prestadora de serviços.
A exploração do Turismo de Massa a partir da ótica meramente capitalista
degenera as possibilidades de desenvolvimento de uma cultura turística que impeça a
alienação dos visitantes - e consequentemente dos visitados – em relação aos
ecossistemas, culturas, religiões e filosofias de vida.
O Turismo de Massa pode produzir efeitos devastadores à comunidade por meio
de uma especulação imobiliária predatória, principalmente quando ainda não existe
infraestrutura adequada nas localidades visitadas para o desenvolvimento de um turismo
sustentável que desperte o interesse e a colaboração das comunidades locais para atrair
turistas nacionais e estrangeiros (PORTUGUEZ, p. 280)
Por outro lado, o Turismo de Base Comunitária demanda um atendimento turístico
não institucionalizado, apreciado por turistas de exploração e de peregrinação,
provocando impactos ambientais e culturais muito menores, valorizando os modos de
vida comunitários através da alteridade nos processos de interação (PORTUGUEZ, p.
174, 175). Esta forma de turismo vê no tombamento de centros históricos, conjuntos
urbanos e monumentos, um importante instrumento regulatório que garante a preservação
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional que inclui igrejas, templos, santuários, artes
sacras e o delicado tecido cultural e religioso que define os traços da comunidade visitada.
No Turismo de Massa os visitantes não se preocupam com o espírito comunitário
das populações locais. Este público estará satisfeito com a beleza e a sofisticação dos
atrativos turísticos, mesmo que sejam artificialmente constituídos. É a partir deste
interesse que o processo de desenvolvimento turístico massivo se movimentará na direção
da especulação imobiliária invasiva e dos altos investimentos em infraestrutura para
determinar os parâmetros desejáveis de desenvolvimento local. Nessa modalidade, os
turistas passam a maior parte do tempo hospedados em hotéis e resorts, visitando a região
do entorno apenas por meio das excursões programadas, geralmente com aventuras
encenadas, em ambientes controlados, sem riscos para os visitantes (RODRIGUES, p.19).
De acordo com Loiola, a importância do Turismo de Massa para o
desenvolvimento socioeconômico de base local, se define por sua abrangência, já que as
formas de turismo alternativo de baixo impacto ambiental e cultural disponíveis como o
agroturismo, o turismo rural, o turismo verde, o turismo natural, o ecoturismo e o turismo
responsável podem se apresentar como artigos acessórios ao Turismo de Massa. Dessa
forma, este segmento consegue inovar e diversificar a oferta turística por meio de pacotes
adicionais, totalmente modeláveis ao gosto, desejo, preferência e expectativa dos
visitantes.
Portanto, a associação “massiva” destas formas de turismo alternativo de baixo
impacto ambiental e cultural, na qualidade de anexos do Turismo de Massa, contribui
tanto para a formação da própria imagem de autenticidade, quanto para redução dos
impactos negativos que acompanham a agressividade do Turismo de Massa quando
considerado isoladamente.
A associação entre Turismo de Massa e Turismo de Base Comunitária cria uma
sinergia capaz de elevar o respeito aos limites de absorção dos espaços de recepção,
estimular a conservação dos recursos locais, físicos e humanos, reduzir os custos
operacionais, aumentar a qualidade e a quantidade de benefícios turísticos ao passo que
diminui a fuga de divisas e suplementa a renda da população do entorno, possibilitando o
gerenciamento de um Turismo Religioso de Massa que atenda às necessidades de
desenvolvimento social e econômico das comunidades locais. (LOIOLA, p. 831).

Referências
BARRETTO, M. Turismo e legado cultural: as possibilidades do planejamento. Rio de
Janeiro: Papirus, 2000.
BURNS, P.M. Turismo e antropologia – uma introdução. São Paulo: Chronos, 2002.
D'AGOSTINI, F.F., ABASCAL, E.H.S. Turismo e Desenvolvimento Local. Estratégias
de Projeto e Intervenção: Experiências e Perspectivas. 4º Colóquio Brasil-Portugal. 2016.
PORTUGUEZ, A.P. et. Al (org.) Turismo, Espaço e Desenvolvimento local. João
Pessoa: Ed. Universitária da UFPB, 2012.
RODRIGUES, A. A. B. Desafios para os estudiosos do turismo. In: RODRIGUES, A. B
(Org.). Turismo e geografia — reflexões teóricas e enfoques regionais. São Paulo:
Hucitec, 1996.
SILVA, S.B.M. Metropolização e raízes da periferização turística. Revista Turismo em
Análise, [S. l.], v. 7, n. 2, p. 7-16, 1996. DOI: 10.11606/issn.1984-4867.v7i2p7-16.
Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rta/article/view/63300. Acesso em: 23 jan.
2023.

Você também pode gostar